número 33 | jul./dez. 2009
planejamento e políticas
públicas ppp
Brasília, 2009
© Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – ipea 2009
Planejamento e Políticas Públicas v. 1−, n. 1−, jun. 1989 – Brasília:
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada.
semestral.
Editor anterior: de 1989 a março de 1990, Instituto de
Planejamento Econômico e Social.
ISSN 0103-4138
1. Economia. 2. Políticas Públicas. 3. Brasil. 4. Periódicos.
I. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada.
CDD 330.05
As opiniões emitidas nesta publicação são de exclusiva e de inteira responsabilidade dos autores,
não exprimindo, necessariamente, o ponto de vista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
ou da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República.
É permitida a reprodução deste texto e dos dados nele contidos, desde que citada a fonte.
Reproduções para fins comerciais são proibidas.
Nota dos EDITORES
O número 33 da revista Planejamento e Políticas Públicas (PPP) oferece sequência
à discussão de sua temática central: o planejamento e as políticas públicas.
No presente número, trazemos para nossos leitores 11 artigos, completando, assim, a publicação de 20 artigos em 2009. Em sua composição, podem-se
identificar temáticas que concentram um maior número de artigos, como meio
ambiente e mercado de trabalho.
Em relação ao tema meio ambiente, a revista contém três artigos. O primeiro
destes avalia uma política pública de desenvolvimento rural na região do Alentejo, em Portugal; mais especificamente, avalia a execução da Medida Agroambiental Proteção Integrada (MAA/PI), aplicada ao setor vitivinícola.
O segundo artigo aborda o padrão de desenvolvimento das sociedades urbanas e sua relação com o meio ambiente, por meio do caso de uma cidade da
macrorregião Centro-Oeste, a Barra do Bugres.
No terceiro artigo, os autores discutem as resoluções do Conselho Nacional
de Meio Ambiente (Conama) referentes à responsabilidade pós-consumo, especificamente para pilhas e baterias, na perspectiva de indicar a necessidade de adequar a legislação à capacidade ambiental brasileira.
Por sua vez, quanto ao tema mercado de trabalho, há também três artigos.
Um dos artigos aborda as características do absenteísmo por morbidade na área da
saúde, em Mato Grosso, no período 2005-2006; o segundo artigo estima a incidência e a evolução recente da discriminação racial e por gênero nos mercados de
trabalho formal e informal no Brasil entre 2002 e 2006; já o terceiro artigo analisa as
características regionais do mercado de trabalho, segundo as diferenças entre gêneros.
Os demais artigos abordam questões igualmente importantes. Um destes avalia
a política pública brasileira de incentivo a polos e parques tecnológicos, utilizando o
enfoque da análise de políticas para o exemplo do parque da cidade de Campinas, no
estado de São Paulo. Outro artigo aborda o papel dos programas de alimentação escolar na execução de políticas públicas de segurança alimentar para a América Latina.
No âmbito da análise regional, um estudo mensura o tamanho das transferências de renda realizadas pelo governo federal para o semiárido nordestino, no
período 1997-2005. Nesta temática, os autores analisam a relação entre desigualdades regionais e bem-estar no período 1991-2000. Finalmente, um artigo apresenta as experiências concretas dos orçamentos participativos (OP) na internet
como possíveis projetos de governança eletrônica, avaliando em que medida tais
práticas podem promover valores democráticos na sociedade.
Nesta edição, tal como na anterior, todos os artigos publicados estão automaticamente inscritos no prêmio João Paulo dos Reis Velloso. Também publicizamos nossos agradecimentos aos pareceristas que contribuíram decisiva e
generosamente com a qualidade final de todos os artigos divulgados em 2009 e
cujos nomes estão referidos no fim desta publicação.
Finalmente, agradecemos a todos os autores que, com suas análises, oferecem subsídios teóricos e empíricos para a reflexão, o aperfeiçoamento e a tomada
de decisão no âmbito do planejamento e das políticas públicas.
Liana Maria da Frota Carleial
Bruno de Oliveira Cruz
Editores
Sumário
Território e Políticas Públicas: O CASO DA AVALIAÇÃO ECONÔMICA INTERCALAR
DA EXECUÇÃO DA MEDIDA AGROAMBIENTAL PROTEÇÃO INTEGRADA, APLICADA
AO SETOR VITIVINÍCOLA NA REGIÃO DO ALENTEJO, EM PORTUGAL.......................................... 9
Fábio José Nunes Bazilio
Paulo Alexandre Neves Martinho Neto
TRANSFERÊNCIAS DE RENDA E EMPREGOS PÚBLICOS NA ECONOMIA
SEM PRODUÇÃO DO SEMIÁRIDO NORDESTINO....................................................................... 45
Leonardo Alves de Araújo
João Policarpo R. Lima
PROBLEMAS AMBIENTAIS DE UMA CIDADE MÉDIA DE MATO GROSSO:
O CASO DE BARRA DO BUGRES................................................................................................ 79
Loiva Zanon de Magalhães
Hugo Scheuer Werle
ALGUMAS REFLEXÕES SOBRE OS PROGRAMAS DE ALIMENTAÇÃO
ESCOLAR NA AMÉRICA LATINA.............................................................................................. 103
Walter Belik
Luciana Rosa de Souza
GOVERNANÇA ELETRÔNICA NO BRASIL: LIMITES E POSSIBILIDADES
INTRODUZIDOS PELO ORÇAMENTO PARTICIPATIVO NA INTERNET......................................... 123
Rafael Cardoso Sampaio
Polos e Parques de Alta Tecnologia: uma alternativa?............................................. 145
Rogério Bezerra da Silva
Renato Dagnino
CARACTERÍSTICAS DE ABSENTEÍSMO ENTRE TRABALHADORES DA SAÚDE:
NÍVEL CENTRAL DA SECRETARIA DE ESTADO DE SAÚDE/MT DE 2005 A 2006....................... 173
Maritza Muzzi Cardozo Pawlina
Antonieta Fernandez de Campos
Larissa Slhessarenko Ribeiro
ESTREITAMENTO DOS DIFERENCIAIS DE SALÁRIOS E AUMENTO DO GRAU
DE DISCRIMINAÇÃO: LIMITAÇÕES DA MENSURAÇÃO PADRÃO?............................................ 195
Maria Cristina Cacciamali
Fábio Tatei
Jackson William Rosalino
Brazilian Labor Market REGIONAL patterns:
an Approach to Gender Divergences............................................................................. 223
Anita Kon
CAPACIDADE AMBIENTAL E EMULAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS: O CASO DA
RESPONSABILIDADE PÓS-CONSUMO PARA RESÍDUOS DE PILHAS E BATERIAS NO BRASIL........257
Bruno Milanez
Ton Bührs
DESIGUALDADES REGIONAIS E BEM-ESTAR NO BRASIL: QUÃO EFICIENTE
TEM SIDO A ATIVIDADE TRIBUTÁRIA DOS ESTADOS PARA A SOCIEDADE?............................. 291
Vladimir Fernandes Maciel
Caio Cícero de Toledo Piza
Roberto Nicolai Penoff
Summary
TERRITORY AND PUBLIC POLICIES: THE CASE OF THE INTERCALARY ECONOMIC EVALUATION
STUDY OF THE INTEGRATED AGRO – ENVIRONMENTAL PROTECTION
MEASURE ACCOMPLISHMENT APPLIED TO THE VITICULTURE AND
VINICULTURE SECTORS IN THE AREA OF ALENTEJO IN PORTUGAL............................................. 9
Fábio José Nunes Bazilio
Paulo Alexandre Neves Martinho Neto
Income transfers and public employment in the economy
without production of Brazil´s Northeast semi-arid................................................. 45
Leonardo Alves de Araújo
João Policarpo R. Lima
PROBLEMS OF A MEDIUM SIZE CITY: THE CASE OF BARRA DO BUGRES................................... 79
Loiva Zanon de Magalhães
Hugo Scheuer Werle
SOME REFLECTIONS ON THE SCHOOL FEEDING PROGRAMS IN LATIN AMERICA................... 103
Walter Belik
Luciana Rosa de Souza
Eletronic Governance in Brazil: limits and possibilities
with the introduction of Internet in the Participatory Budget............................. 123
Rafael Cardoso Sampaio
Science Parks: an alternative?........................................................................................ 145
Rogério Bezerra da Silva
Renato Dagnino
CHARACTERISTICS OF ABSENTEEISM AMONG WORKERS FROM THE HEALTH:
CENTRAL LEVEL OF THE SECRETARY OF HEALTH FROM THE STATE OF
MATO GROSSO, IN THE PERIOD FROM 2005 TO 2006............................................................. 173
Maritza Muzzi Cardozo Pawlina
Antonieta Fernandez de Campos
Larissa Slhessarenko Ribeiro
WAGES GAP DECREASED AND HIGHER DISCRIMINATION DEGREE:
RESTRAINT OF THE STANDARD MEASURES?........................................................................... 195
Maria Cristina Cacciamali
Fábio Tatei
Jackson William Rosalino
Brazilian Labor Market REGIONAL patterns:
an Approach to Gender Divergences............................................................................. 223
Anita Kon
ENVIRONMENTAL CAPACITY AND PUBLIC POLICY EMULATION: THE CASE
OF EXTENDED PRODUCER RESPONSIBILITY FOR BATTERY WASTE IN BRAZIL........................ 257
Bruno Milanez
Ton Bührs
Regional Inequalities and Welfare in Brazil: How Efficient
Has Been the States Taxation Activity for Society?.................................................... 291
Vladimir Fernandes Maciel
Caio Cícero de Toledo Piza
Roberto Nicolai Penoff
sumario
TERRITORIO Y POLÍTICAS PÚBLICAS: EL CASO DE LA MEDICIÓN ECONÓMICA INTERCALAR
DE LA APLICACIÓN DE LA MEDIDA AGROAMBIENTAL PROTECCIÓN INTEGRADA
APLICADA AL SECTOR VITIVINÍCOLA EN LA REGIÓN DEL ALENTEJO EN PORTUGAL................. 10
Fábio José Nunes Bazilio
Paulo Alexandre Neves Martinho Neto
Las transferencias de ingresos y el empleo público en la economía
sin producción de la región árida del Nordeste brasileño...................................... 46
Leonardo Alves de Araújo
João Policarpo R. Lima
PROBLEMAS AMBIENTALES DE UNA CIUDAD DE TAMAÑO MEDIANO
EN MATO GROSSO, BRASIL: EL CASO DE BARRA DO BUGRES................................................... 79
Loiva Zanon de Magalhães
Hugo Scheuer Werle
ALGUNAS REFLEXIONES SOBRE LOS PROGRAMAS DE ALIMENTACIÓN
ESCOLAR EN AMÉRICA LATINA............................................................................................... 103
Walter Belik
Luciana Rosa de Souza
GOVERNACIÓN ELECTRÓNICA EN BRASIL: LIMITES Y POSIBILIDADES
INTRODUCIDAS POR EL PRESUPUESTO PARTICIPATIVO EN INTERNET.................................... 123
Rafael Cardoso Sampaio
Polos y Parques de Alta Tecnologia: una alternativa?............................................. 145
Rogério Bezerra da Silva
Renato Dagnino
CARACTERÍSTICAS DE ABSENTISMO ENTRE TRABAJADORES DE SALUD: NIVEL CENTRAL
DE LA SECRETARÍA DE ESTADO DE SALUD DE MATO GROSSO, EN EL PERÍODO 2005-2006.......... 174
Maritza Muzzi Cardozo Pawlina
Antonieta Fernandez de Campos
Larissa Slhessarenko Ribeiro
DISMINUCIÓN DE LOS DIFERENCIALES SALARIALES E AUMENTO
DEL GRADO DE DISCRIMINACIÓN: LIMITACIONES DEL MÉTODO?.......................................... 196
Maria Cristina Cacciamali
Fábio Tatei
Jackson William Rosalino
LOS PATRONES REGIONALES del MERCADO DE TRABAJO DE BRASIL:
UNA APROXIMACIÓN DE LAS DIFERENCIAS ENTRE GÉNEROS................................................ 223
Anita Kon
CAPACIDAD AMBIENTAL Y LA EMULACIÓN DE POLÍTICAS PÚBLICAS:
EL CASO DE LA RESPONSABILIDAD EXTENDIDA DEL PRODUCTOR
PARA RESIDUOS DE PILAS Y BATERÍAS EN EL BRASIL............................................................. 257
Bruno Milanez
Ton Bührs
¿Las desigualdades regionales y el bienestar en Brasil: cómo eficaz
ha sido la actividad fiscal de los estados para la sociedad?................................ 291
Vladimir Fernandes Maciel
Caio Cícero de Toledo Piza
Roberto Nicolai Penoff
Sommaire
Territoire et Politique Públique: LE CAS DE L‘ÉVALUATION ÉCONOMIQUE INTERCALAIRE
DE L’EXECUTION DE LA MESURE AGROENVIRONNEMENTALE PROTECTION INTEGRE
APPLIQUEE AU SECTEUR VINICOLE DANS LA REGION DE L’ALENTEJO AU PORTUGAL.............. 10
Fábio José Nunes Bazilio
Paulo Alexandre Neves Martinho Neto
Transfers de revenus et emplois publiques dans l´économie
sans production au semi-aride du nord-est du Brésil................................................ 46
Leonardo Alves de Araújo
João Policarpo R. Lima
Les Problèmes Environnementales d’une Ville Moyenne de l’etat
de Mato Grosso, Brésil: Le Cas de la Ville de Barra do Bugres.................................. 79
Loiva Zanon de Magalhães
Hugo Scheuer Werle
QUELQUES RÉFLEXIONS SUR LES PROGRAMMES D’ALIMENTATION
SCOLAIRE EN AMÉRIQUE LATINE............................................................................................ 103
Walter Belik
Luciana Rosa de Souza
GOUVERNANCE ÉLECTRONIQUE AU BRÉSIL: LIMITES ET POSSIBILITÉS
INTRODUITES PAR LE BUDGET PARTICIPATIF DANS INTERNET............................................... 124
Rafael Cardoso Sampaio
Pôles et Parcs de Haute Technologie: une alternative?............................................ 146
Rogério Bezerra da Silva
Renato Dagnino
CARACTÉRISTIQUES D’ABSENTÉISME ENTRE TRAVAILLEURS DE SANTÉ: “NIVEAU CENTRAL
DU BUREAU DE SANTÉ DE MATO GROSSO”, DANS LA PÉRIODE DE 2005-2006..................... 174
Maritza Muzzi Cardozo Pawlina
Antonieta Fernandez de Campos
Larissa Slhessarenko Ribeiro
REDUCTION DES DIFFERENTIELS DE SALAIRE ET AUGMENTE DE LA DISCRIMINATION:
LIMITES DE LA METHODE?...................................................................................................... 196
Maria Cristina Cacciamali
Fábio Tatei
Jackson William Rosalino
LES VARIATIONS RÉGIONALES DU MARCHÉ DU TRAVAIL BRÉSILIEN:
UNE APPROCHE DES DIFFÉRENCES ENTRE LES SEXES............................................................ 224
Anita Kon
CAPACITE ENVIRONNEMENTALE ET EMULATION DE POLITIQUES PUBLIQUES:
LE CAS DE LA RESPONSABILITE ELARGIE DES PRODUCTEURS POUR RESIDUS
DE PILES ET DE BATTERIES AU BRESIL.................................................................................... 258
Bruno Milanez
Ton Bührs
Inégalités régionales et le bien-être au Brésil: comment efficace
a été l’activité fiscale des états pour la société?...................................................... 292
Vladimir Fernandes Maciel
Caio Cícero de Toledo Piza
Roberto Nicolai Penoff
Território e Políticas Públicas: O CASO DA AVALIAÇÃO
ECONÔMICA INTERCALAR DA EXECUÇÃO DA MEDIDA
AGROAMBIENTAL PROTEÇÃO INTEGRADA, APLICADA AO SETOR
VITIVINÍCOLA NA REGIÃO DO ALENTEJO, EM PORTUGAL
Fábio José Nunes Bazilio*
Paulo Alexandre Neves Martinho Neto**
Este artigo tem como objetivo, na ótica do território e das políticas públicas, avaliar economicamente
a execução da Medida Agroambiental Proteção Integrada (MAA/PI), aplicada ao setor vitivinícola,
na região do Alentejo, em Portugal. O estudo encontra-se dividido em quatro seções principais.
Na primeira, é abordada a relevância e os objetivos deste estudo, procurando também sua
contextualização. A segunda é dedicada a expor toda a “arquitetura” utilizada para a avaliação
da MAA/PI nos seus vários domínios, contemplando também a avaliação de dados e indicadores
territoriais. A terceira seção é dedicada a georreferenciar e avaliar os resultados de execução,
sendo, portanto, também um suporte para a avaliação global. Finalmente, na quarta seção, serão
agrupadas as conclusões e sugestões.
Palavras-chave: Avaliação Econômica; Avaliação de Políticas Públicas; Indicadores Territoriais;
Medida; Políticas Públicas; Setor Vitivinícola; Território; Territorialização.
TERRITORY AND PUBLIC POLICIES: THE CASE OF THE INTERCALARY ECONOMIC
EVALUATION STUDY OF THE INTEGRATED AGRO – ENVIRONMENTAL
PROTECTION MEASURE ACCOMPLISHMENT APPLIED TO THE VITICULTURE AND
VINICULTURE SECTORS IN THE AREA OF ALENTEJO IN PORTUGAL
The present dissertation, in what concerns the territory and public policies, to evaluate economically
the accomplishment of the Integrated Agro – Environmental Protection Measure accomplishment
applied to the Viticulture and Viniculture sectors in the area of Alentejo. This study is divided in four main points. In the first point it is referred the relevance and the study
objectives, trying to achieve also the contextualization of it. The second point is used to present
the whole “arquitecture” of the Integrated Agro – Environmental Protection Measure in its several
domains making also the data evaluation and territorial indicators. The third point is dedicated
to “cartograph” and evaluate the accomplishment results, being therefore, also a support for the
global evaluation. Finally, in the fourth point the conclusions and suggestions will be grouped.
Key words: Economic Evaluation; Public Politics Evaluation; Rural Development; Territorial
Indicators; Measures; Public Politics; Viticulture and Viniculture Sectors; Territory; Territorialization.
* Mestre em Economia e coordenador comercial no banco Caja de Badajoz, Sucursal de Portugal – Évora, Portugal.
E-mail: [email protected]
** Professor auxiliar com agregação e diretor do Departamento de Economia da Universidade de Évora, Portugal, e
investigador do Centro de Estudos e Formação Avançada em Gestão e Economia (Cefage), da Universidade de Évora.
E-mail: [email protected]
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
10
TERRITORIO Y POLÍTICAS PÚBLICAS: EL CASO DE LA MEDICIÓN ECONÓMICA
INTERCALAR DE LA APLICACIÓN DE LA MEDIDA AGROAMBIENTAL
PROTECCIÓN INTEGRADA APLICADA AL SECTOR VITIVINÍCOLA EN LA
REGIÓN DEL ALENTEJO EN PORTUGAL
El presente artículo tiene como objetivo, desde la óptica del Territorio e Políticas Publicas, medir
económicamente la aplicación de la medida agroambiental denominada “Protecção Integrada”
aplicada al sector vitivinícola en la Región del Alentejo en Portugal. Este artículo se encuentra
dividido en cuatro puntos. En el primer punto se aborda la validez y objetivos de este estudio
buscando una puesta en contexto del mismo. El segundo punto se dedica a exponer toda la
“arquitectura” utilizada para la medición de la medida agroambiental denominada “Protecção
Integrada” en sus diversos dominios contemplando también la medición de datos e indicadores
territoriales. El tercer punto es dedicado a referenciar geográficamente e medir los resultados de
la aplicación, siendo por tanto, también un soporte para la medición total. Finalmente en el cuarto
punto son agrupadas las conclusiones e sugerencias.
Palabras-clave: Medición Económica; Evaluación de Políticas Públicas; Indicadores Territoriales;
Medida; Políticas Públicas; Sector Vitivinícola; Territorio; Territorialización.
Territoire et Politique Públique: LE CAS DE L‘ÉVALUATION
ÉCONOMIQUE INTERCALAIRE DE L’EXECUTION DE LA MESURE
AGROENVIRONNEMENTALE PROTECTION INTEGRE APPLIQUEE AU SECTEUR
VINICOLE DANS LA REGION DE L’ALENTEJO AU PORTUGAL
Le présent article a pour objet, dans l’optique du Territoire et des Politiques Publiques, évaluer
économiquement l’exécution de la Mesure Agroenvironnementale Protection Intégrée appliquée au
Secteur Vinicole dans la Région de l’Alentejo au le Portugal. Cet article se trouve divisé en quatre points
principaux. Au premier point est abordée l’importance et objectifs de cette étude en cherchant aussi un
report au contexte du même. Le second point est dévoué à exposer toute l’“architecture” utilisée pour
l’évaluation de la Mesure Agroenvironnementale Protection Intégrée dans leurs plusieurs domaines en
envisageant aussi l’évaluation de données et les indicateurs territoriaux. Le troisième point est dévoué à
géo référencer et évaluer les résultats d’exécution, en étant donc, aussi un a supporté pour l’évaluation
globale. Finalement, au quatrième point seront regroupées les conclusions et les suggestions.
Mots-clés: Évaluation Économique; Évaluation des Politiques Publiques; Indicateurs Territoriaux;
Mesure; Politiques Publiques; Secteur Vinicole; Territoire; Territorialisation.
1 Introdução
É no âmbito do Fundo Europeu de Orientação e Garantia Agrícola (Feoga), em
implementação até 2006, e das medidas da Política Agrícola Comum (PAC), da
União Europeia (UE), que surgem as medidas agroambientais (MAAs). A questão
agroambiental é essencialmente econômica e tem efeitos sobre terceiros. Mas não
podemos esquecer que também é uma questão ecológica, tecnológica, política
e, até mesmo, cultural com implicações territoriais. Um problema agroambiental é, sobretudo, um conflito provocado por mudanças no ambiente rural, que
resultam das mudanças tecnológicas, que, por sua vez, provêm das alterações na
atividade econômica e das políticas aplicadas em determinado país e região.
Território e Políticas Públicas...
11
A aprovação das MAAs ocorreu no Regulamento da Comunidade Econômica Europeia (CEE) no 2.078/1992. Este regulamento
(...) relativo a métodos de produção agrícola compatíveis com as exigências da protecção do ambiente e da preservação do espaço rural representou um importante passo na
caminhada para a (re)conciliação da agricultura comunitária com a conservação e valorização do ambiente e do espaço rural e para a (re)legitimação da PAC perante a opinião pública Europeia e perante os parceiros internacionais da UE (DGDR, 1997a).
Dessa forma, as MAAs não mais eram um “aspecto menor” e de aplicação
facultativa da política agrícola de estruturas,1 ou um aspecto subordinado da política comunitária de conservação da natureza,2 e tornaram-se instrumento de
aplicação pelos estados membros3 “na totalidade dos seus territórios e em função
das suas necessidades específicas” (DGDR, 1997a).
As MAAs apresentam um extraordinário interesse para Portugal, na dupla
vertente da sustentabilidade e valorização da agricultura e do ambiente, não tanto
para resolver problemas já existentes, mas, sobretudo, prevenir seu futuro surgimento. Procura-se, desse modo, reforçar uma aliança sólida entre os interesses
da agricultura, a sustentabilidade e qualidade ecoambiental e o desenvolvimento
regional e rural, contribuindo simultaneamente para a manutenção da biodiversidade e da paisagem rural. Este interesse ainda é reforçado pelo impacto positivo
apresentado na defesa do ambiente, conservação do espaço rural, melhoria da
qualidade das produções agrícolas e manutenção do rendimento dos agricultores.
Essas medidas pretendem, dessa forma, motivar os agricultores a utilizar
práticas agrícolas mais adequadas à proteção do meio ambiente, nomeadamente
no que relaciona-se à correta utilização de adubos e produtos fitofarmacêuticos,4
bem como à promoção de agricultura biológica.5
1. Cf. Regulamentos CEE nos 797/1985, 1.760/1987 e 2.328/1991.
2. Cf. Regulamentos CEE nos 1.973/1992 e 1.404/1996.
3. A aplicação das MAAs na UE efetuou-se por meio do Programa de Desenvolvimento Rural (Ruris), no âmbito do
Quadro Comunitário de Apoio III (QCA-III) 2000-2006, que incluía todas as medidas e abrangia todo o território nacional. Estas medidas eram cofinanciadas pelo Feoga, seção Garantia, que foi decisivo para garantir a suficiência dos
meios necessários à sua implementação, tendo sido também comparticipadas financeiramente por cada estado membro.
No atual período 2007-2013, as MAAs estão contempladas no Programa de Desenvolvimento Rural (Proder) – Cf. a
Portaria no 964-A/2008 e o Diário da República (DR) no 166, 1a série.
4. Para maiores desenvolvimentos sobre fitofarmacologia, ver Amaro (2003a).
5. As MAAs, no âmbito do QCA III 2000-2006, procuravam também apoiar as explorações e os sistemas produtivos
nos territórios em que estes aparentam ser indispensáveis para a manutenção das características paisagísticas e
ambientais. Foi também atribuída relevância à manutenção do patrimônio florestal, bem como pretendeu-se apoiar
agricultores que desempenhavam funções importantes na proteção do ambiente e conservação da paisagem rural.
Por fim, procurou-se também direcionar esforços para aumentar a informação e a formação dos agricultores no que
se refere à introdução de métodos de produção agrícola e florestal compatíveis com as exigências da proteção do
ambiente e dos recursos naturais e preservação do espaço natural e da paisagem.
12
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
Da aplicação das MAAs a Portugal, este artigo vai incidir sobre a Medida
Agroambiental Proteção Integrada (MAA/PI) e sua aplicação ao setor vitivinícola na região do Alentejo. Esta medida contribui para a racionalização do uso
de produtos fitofarmacêuticos,6 em clara sintonia com o objetivo de compatibilizar padrões de produção com a proteção do ambiente e dos recursos naturais.
Dessa forma, a medida pretende ser uma estratégia de proteção a privilegiar em
agricultura sustentável e, atendendo à sua relevância7 para o setor vitivinícola
na região do Alentejo, será desenvolvido o estudo sempre na ótica do território
e das políticas públicas.
Este estudo está enquadrado na região do Alentejo, em Portugal, área geográfica equivalente à delimitada institucionalmente pelo Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas – Direção Regional de Agricultura
do Alentejo (MADRP – Draal). Para a área delimitada, foi considerado o período
intercalar entre 1996 e 2003.8
Nesse contexto, o presente artigo tem como objetivo, na ótica do território e das políticas públicas, avaliar economicamente a execução da MAA/PI
aplicada ao setor vitivinícola na região do Alentejo, em Portugal. Para atingir
este objetivo e proporcionar a melhor informação, procurou-se utilizar uma
solução criativa que consistiu na utilização de um mix de métodos (entrevistas, cartografia conceitual de impactos, “micro-SIG” e revisão de documentos). Paralelamente, para avaliar as diferentes categorias de indicadores, bem
como os indicadores por níveis de intervenção da política, foi utilizada uma
análise multicritério.
Dessa forma, esta avaliação do desempenho da MAA/PI pretende ser um
instrumento estratégico, fornecendo elementos que possam potencializar melhorias de resultados, contribuindo para atingir níveis de desempenho mais elevados, sendo também uma fonte de informação útil para desencadear novas
visões de desenvolvimento no nível da aplicação da medida ao setor vitivinícola.
A avaliação pretende também ser uma ferramenta que possa colaborar com uma
nova cultura de gestão no nível da MAA/PI, direcionando os resultados para
o território, podendo, até mesmo, suas conclusões e sugestões contribuírem
modestamente para uma base com vista a rever novos objetivos ou estratégias a
aplicar às novas candidaturas.
6. Para maiores desenvolvimentos sobre fitofarmacologia na proteção integrada, ver Amaro (2003a).
7. Uma vez que se trata de uma das medidas agroambientais que movimenta um elevado volume de apoios comunitários, sendo o setor vitivinícola um dos que mais se beneficia destes apoios.
8. Esse período situa-se entre dois períodos de programação distintos: o Regulamento (CEE) no 2.078/1992 comporta
um período de programação das medidas agroambientais entre 1994 e 1999, enquanto o período de programação
referente a 2000 a 2006 é considerado pelo Ruris.
Território e Políticas Públicas...
13
2 desenho de avaliação da política Pública
2.1 Metodologia
Dada a complexa exigência de especificidade dos dados referentes à MAA/PI
em estudo, aplicada ao setor vitivinícola e delimitada à região do Alentejo, em
Portugal, foi necessário definir e localizar as fontes de dados.
Para a realização dessa investigação, era crucial criar uma base de dados
que possibilitasse, quando finalizada, contribuir para oferecer resposta à avaliação pretendida. Para tal, em fase inicial, foi fundamental apurar quais os
indicadores necessários a este tipo de avaliação e quais os existentes ou os que
pudéssemos, de alguma forma, aplicar ou adaptar, aferindo seguidamente sobre
sua qualidade e disponibilidade.
A identificação e avaliação da qualidade dos indicadores para este estudo teve em conta os critérios que constam na Coleção Means (COMISSÃO
EUROPEIA, 1999a, v.2, p. 210-213), fornecidos pela Comissão Europeia
(1999a), que, juntamente com todo o enquadramento teórico relacionado com
a avaliação de políticas públicas, possibilitaram, assim, o desenvolver desta avaliação. O apoio bibliográfico analisado, alicerçado na experiência dos técnicos
do MADRP – Draal e da Associação Técnica de Vitivinicultores do Alentejo
(Ateva), que generosamente auxiliaram nesta tarefa, foi um passo fundamental
para iniciar a construção da base de dados desta avaliação, e, desde o início,
apurou-se que seriam necessários dados agregados de várias fontes. Se fossem
dados com um grau de agregação relevante, poder-se-ia encontrá-los em escassa
informação publicada ou, até mesmo, acedendo às bases de dados das instituições que os comportam; para o nível de desagregação desejado nesta avaliação,9
o resultado já não era tão direto. Os dados encontrados que satisfizeram as
nossas necessidades de investigação tinham apenas em vista o controle e a fiscalização da medida, e não foram recolhidos ou tratados com outro objetivo,
menos ainda o de serem direcionados para responder ao tipo de indicadores
territoriais pretendidos.10 Dessa forma, após solicitação às hierarquias das várias
instituições que comportam os dados, ficamos autorizados à constituição de
uma base de dados para solucionar nosso problema e que também pudesse ser
tornada pública neste artigo.11
9. Indicadores desagregados, que contemplassem a medida pretendida, confinada apenas ao setor vitivinícola, de
forma a possibilitarem observar cada território “à lupa”, ou seja, em amplitude de distritos, concelhos e até freguesias
caso se justifique.
10. A verdade é que o poderiam fazer após tratamento adequado, uma vez que não existia nenhuma plataforma de
dados definida.
11. Com a condição de em nenhum caso referir os nomes dos beneficiários.
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planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
A informação encontrava-se em bases de dados comportando informação
agroambiental, das quais foi necessário extrair a MAA/PI. De 1996 a 1999, no
âmbito do Regulamento CEE no 2.078/1992, foi realmente necessário recorrer
a dados ainda em suporte processual de papel, contemplando nestes a informação no nível de cada candidatura e, uma a uma, selecionando o enquadramento
ou não de acordo com as necessidades específicas de informação. Para os anos
posteriores, embora a informação já se encontrasse em plataforma informática
exequível, teve de se efetuar igual procedimento. Após selecionada a informação
de base, esta foi estruturada e tratada em bases de dados em formato excel com
diferentes níveis de desagregação e agregação, consoante as nossas necessidades.
Os dados deste estudo foram provenientes de fontes distintas, tais como:
MADRP (1996, 1997 e 1998), Direção Geral de Desenvolvimento Rural
(DGDR) e Instituto Nacional de Intervenção e Garantia Agrícola (Inga) (1999 e
2000), Instituto de Financiamento e Apoio ao Desenvolvimento da Agricultura
e Pescas (IFADAP), Instituto de Desenvolvimento Rural e Hidráulica (IDRHa)
(2001 e 2002) e, por fim, Ateva (2003), que só no seu conjunto possibilitaram
criar uma plataforma de trabalho adaptada às necessidades de avaliação deste estudo. As constantes mudanças verificadas no circuito de funcionamento, nomeadamente, as transferências para diferentes bases de dados, contribuíram para
que a obtenção de informação consolidada sobre a evolução da sua aplicação no
período pretendido fosse bastante complicada e morosa.
No que concerne à informação utilizada a um nível mais agregado, houve
necessidade de obter-se dados coerentes, compatíveis com os recolhidos in loco,
pelo que se optou por utilizar os dados publicados no Plano de Desenvolvimento
Rural (PDRu) 2000-2006, nas campanhas promovidas pelo IFADAP e Inga e
nas publicações do IDRHa e MADRP, bem como informação disponibilizada
pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) e Gabinete de Estatísticas da União
Europeia (EUROSTAT).
Para melhor apoiar todo o trabalho de avaliação desenvolvido, foram utilizados vários instrumentos de avaliação geral de políticas públicas, para salientar
a cartografia conceitual de impactos, da qual resultaram mapas sem escala real,
contemplando os vários territórios, a fim de se identificar mais facilmente os indicadores e suas variações. Toda a base de processamento da informação geográfica
utilizada foi concebida exclusivamente para este estudo em suporte AUTOCAD.
Em alguns casos, este foi, na verdade, apoiado por software ARCVIEW GIS a fim
de possibilitar um melhor cruzamento da informação geográfica com dados e
indicadores territoriais. Ao final, foi possível obter uma pequena aproximação ao
Sistema de Informação Geográfica (SIG), que, por simplificação, denominamos
de “micro-SIG”, tornando-se, assim, uma mais-valia para este estudo.
Território e Políticas Públicas...
15
2.2 Principais instrumentos de avaliação geral de políticas públicas
utilizados neste estudo
De acordo com Armstrong e Wells (2006), desde o início dos anos 1990, as iniciativas políticas para o desenvolvimento econômico da Comunidade Europeia
têm registrado uma rápida expansão. Os instrumentos de avaliação têm lutado
para adaptarem-se ao que foi um novo “e mais radical” tipo de políticas públicas.
Ainda que se estejam a verificar progressos em adaptar os instrumentos
de avaliação a esse desenvolvimento verificado nas políticas públicas, muitos
desafios ainda se apresentam para os avaliadores e investigadores, quer ao nível
dos períodos de programação anteriores, quer para o novo período 2007-2013
(ARMSTRONG; WELLS, 2006).
A natureza das políticas e avanços na sua concepção (políticas de inclusão
social ou de desenvolvimento rural) confrontaram os avaliadores e investigadores
com uma série de novos requisitos, tais como: a necessidade de combinar em avaliação resultados econômicos, sociais e ambientais em simultâneo, muito comum
quando da avaliação de programas de desenvolvimento rural ou, até mesmo, da
necessidade de avaliar a sensibilidade dos agricultores diante do desenvolvimento
rural ou do ambiente (ROSÁRIO, 2003).
No que concerne à avaliação, as políticas públicas com objetivos de desenvolvimento rural, de forma genérica, não são muito diferentes das políticas restantes financiadas pelos fundos europeus. O que torna a avaliação desta forma de
política com vista ao desenvolvimento rural mais complexa ainda é a dificuldade
de encontrar e aplicar os instrumentos standard de avaliação.
As políticas públicas europeias apresentam uma panóplia de vários tipos
de iniciativas.12 Estas “novas” políticas públicas variam em vários aspectos dos
denominados “tradicionais tipos de política” (ARMSTRONG; WELLS, 2006),
uma vez que oferecem uma maior ênfase ao compromisso ativo comunitário em
todos os aspectos da iniciativa, percorrendo desde o design até sua avaliação.13
O controle de ativos e recursos assume um papel de supremacia.
É de notar-se também que, do ponto de vista da avaliação, as políticas públicas podem ser bastante distintas, e é por este fato que merecem uma examinação
específica ­– cada caso é um caso. As políticas públicas expõem vários problemas
12. Políticas de formação profissional, educação, apoio às pequenas e médias empresas, desenvolvimento rural e/ou
ambiental, apoio ao networking comunitário, entre outras.
13. A sua natureza a longo prazo e a fase inicial do design antes dos seus objetivos, principalmente econômicos, e
outros efeitos sejam atingidos poderão ser também um problema para a avaliação.
16
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
particulares para sua avaliação.14 Apesar de os problemas colocados serem completamente diversificados, as políticas públicas “são altamente complexas, com múltiplos
objetivos (apenas alguns dos quais são económicos), com múltiplos grupos de beneficiários e frequentemente utilizando muitos fluxos de fundos” (ARMSTRONG;
WELLS, 2006). Para Bachtler e Wren (2006), alguma complexidade adicional ainda
pode resultar da natureza da política que está a ser avaliada. As políticas europeias são
implementadas em plataforma regulamentar muito idêntica, mas significativamente
diferente pelas circunstâncias nacionais e regionais com diferentes formas de gestão e
implementação das políticas de desenvolvimento regional.
É, portanto, nesses cenários que foram selecionados alguns instrumentos de
avaliação de políticas públicas para atuarem, isoladamente ou em conjunto, a fim
de oferecerem a melhor resposta às necessidades desta avaliação.
2.2.1 Cartografia conceitual de impactos
A cartografia conceitual de impactos é uma adaptação da técnica chamada de
concept mapping ,15 utilizada há uma década para a avaliação das políticas.16 Esta
foi primeiramente utilizada como ajuda à definição de estratégias ou à reorganização das empresas antes de ser aplicada à concepção de políticas públicas, e tem
como objetivo obter uma imagem gráfica das representações que os atores têm da
realidade socioeconômica em geral e dos impactos esperados em particular.
Essa técnica possibilita uma melhor clarificação – e, por vezes, hierarquização –
dos impactos esperados de uma intervenção pública17 e presta uma ajuda preciosa
em matéria de avaliação sempre que é necessário reforçar a avaliação de um programa, ou seja, tornar os objetivos de um programa mais explícitos. Este instrumento
revela-se particularmente bem adaptado ao contexto das políticas públicas e, em
particular, das políticas promovidas pela UE. Este tipo de política prossegue os objetivos definidos por tal bloco político e adaptados em função das características do
estado-membro ou da região beneficiária. Como os documentos de programação
são produtos de negociações, é frequente que os objetivos das políticas não sejam
14. Segundo Armstrong e Wells (2006), à avaliação moderna de políticas públicas são ainda adicionadas três características: 1. A avaliação é um ongoing process. A Comissão Europeia, por meio de requisitos regulamentares para as avaliações
ex ante, intercalar ou ex post, impõe um certo grau de ordem em todo o processo. No entanto, estes procedimentos são
desenhados com o objetivo de aumentar, e não romper com, um processo de aprendizagem ongoing. 2. A avaliação e a
monitorização são tidas em consideração. Estas não são completamente separadas, uma vez que os requerimentos para
uma avaliação formal também abarcam a interpretação da evidência monitorizada disponível na altura da avaliação. 3.
A avaliação e a monitorização são levadas a cabo em diferentes escalas, para avaliar um projeto individual ou programa.
15. Para Trochin e Cabrera (2005), “Concept Mapping é uma mistura de metodologias participativas que possibilita a
diversos grupos participantes desenvolver plataformas conceituais partilhadas que podem ser utilizadas em variados
contextos políticos”; dessa forma, é possível visualizar “as relações específicas entre conceitos e a estrutura hierárquica e organizacional dessas relações” (CROASDELL; FREEMAN; URBACZEWSKI, 2003).
16. Para maiores desenvolvimentos, ver Poole e Davis (2006), Trochin e Cabrera (2005), Mclay e Brown (2003), Croasdell, Freeman e Urbaczewski (2003) e Kane e McMahon (2002).
17. A técnica do mapa conceitual de impactos permite, por exemplo, em contexto ex ante, determinar os objetivos visados e as
prioridades, ou, em contexto ex post, elaborar o referencial da avaliação – principalmente para critérios de eficácia e indicadores.
Território e Políticas Públicas...
17
suficientemente precisos para poder construir uma avaliação fiável.18 O recurso a
este instrumento é um apoio para a realização da primeira etapa de clarificação, pois
permite o esclarecimento das perguntas de avaliação, a hierarquização dos efeitos e a
definição dos critérios de avaliação, facilitando a apropriação dos resultados desta.19
Neste estudo, a cartografia conceitual de impactos revelou-se um instrumento
fundamental para obter resposta às questões de avaliação. Para tal, inicialmente,
foram descritos e hierarquizados para cada indicador territorial utilizado seus
respectivos impactos na região em estudo (Portugal – Alentejo); seguidamente,
foram agrupados por famílias (distritos) e, por sua vez, foram reagrupados em
novas famílias (concelhos20). Dessa forma, foi possível criar – e georreferenciar –
uma plataforma conceitual com os impactos pretendidos, a fim de contribuir para
responder às questões desta avaliação.
FIGURA 1
Descritor de impactos¹
Elaboração dos autores.
Nota: ¹ Exemplo de um descritor de impactos – concebido exclusivamente para oferecer apoio à elaboração da cartografia
conceitual de impactos deste estudo, que tem como objetivo reagrupar o número de hectares abrangidos pela MAA/PI
no distrito de Évora em famílias, ou seja, em concelhos.
18. Duas características usuais dos programas podem, assim, fundamentar o recurso à cartografia conceitual de impactos: por um lado, a falta de clareza e precisão dos objetivos de um programa e os impactos esperados e, por outro,
a insuficiência de indicadores de impacto previstos pelo programa.
19. O mapa conceitual de impactos mostra-se, portanto, precioso para preparar as avaliações intercalares dos programas, pois permite estabelecer, de forma sistemática, famílias de impactos transversais de várias medidas e, assim,
construir critérios relevantes para a avaliação do programa no seu todo.
20. Uma vez que em Portugal a palavra concelho é de utilização comum para se referir a uma circunscrição administrativa, neste estudo esta palavra é frequentemente empregada para traduzir as menores circunscrições administrativas
e geográficas analisadas.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
18
2.2.2 Entrevista individual
A técnica da entrevista individual21 permite recolher informações qualitativas e as
opiniões das pessoas referidas por um programa ou projeto específico, seu contexto, sua execução, seus resultados ou seu impacto, selecionando para tal vários
destinatários ou gestores, em função das características da ação que se pretende
desenvolver e do público em causa.22
Dessa forma, utilizar como instrumento de análise a entrevista é um dos
únicos instrumentos que permite “dar uma rápida vista de olhos” aos programas a avaliar, ou seja, as entrevistas menos estruturadas23 poderão ser utilizadas
para identificar as partes do programa que deverão ser aprofundadas. As entrevistas com as instâncias de decisão podem representar uma etapa importante
no desenvolvimento da avaliação e na determinação dos resultados-chave esperados por estas instâncias.
No âmbito deste estudo, foram desenvolvidas entrevistas por conversação informal com ou sem guia aos vários níveis de operacionalização e hierarquia da MAA/PI.24 Foi possível, dessa forma, recolher informação qualitativa,
nomeadamente: opiniões, experiências, informações relativas a contexto e execução, validação de dados e indicadores, bem como novas direções de pesquisa.
2.2.3 Sistema de Informação Geográfica (SIG)
Os SIGs,25 de uma forma simplista, são instrumentos que permitem trabalhar com os dados que podem referir-se a uma unidade localizada (ponto,
zona, limite etc.). Originalmente, este instrumento foi desenvolvido nos anos
1970 para armazenar e tratar a informação ligada ao ambiente físico (ambientes natural e construído). Mais recentemente, o interesse dos utilizadores deste instrumento estendeu-se às informações socioeconômicas, ao passar
a ser o SIG um ponto de encontro entre todas as informações26 que podem
estar referidas, direta ou indiretamente, a um lugar geográfico. Geralmente, um SIG permite reunir todas as espécies de informações de caráter espacial e apresentá-las sob uma forma que otimiza sua legibilidade. O SIG pode
21. Segundo Comissão Europeia (1999a), várias formas de entrevista merecem ser distinguidas: a por conversação
informal, a semidiretiva com guia e a diretiva, que é a mais rígida.
22. As técnicas de entrevista são muito utilizadas no âmbito da avaliação das políticas públicas e, em especial, para
a avaliação dos programas, permanecendo a entrevista com os gestores e destinatários um dos instrumentos mais
utilizados na avaliação intercalar (AI) dos programas.
23. Ex.: conversação informal com os gestores e outras pessoas referidas pelo programa.
24. Ex.: beneficiários, especialistas e técnicos.
25. “O SIG permite recolher, reunir, acumular, analisar, explorar, expor e atualizar todos os dados e informações espacialmente referenciadas” (COMISSÃO EUROPEIA, 1999a).
26. Provenientes das três dimensões temáticas, espaciais e temporais.
Território e Políticas Públicas...
19
integrar dados socioeconômicos e provenientes dos recenseamentos, resultados de sondagens e inquéritos, bem como dados de acompanhamento.27
No que diz respeito à avaliação, a principal mais-valia do SIG é permitir cruzamentos de dados que as outras técnicas não permitem.28
Neste estudo, em particular, embora em sede de programação esteja previsto a criação de SIG único para a gestão do Ruris29 e, consequentemente,
comportando as MAAs, sua não operacionalização até o momento constitui
uma grave deficiência do modelo de gestão e uma grande dificuldade no que
concerne às avaliações. Motivados por todas as vantagens que um SIG comportaria para este e outros estudos que desta base possam ser desenvolvidos,
optou-se por criar um “micro-SIG,”30 ou seja, embora seguindo igual ideologia de base, é bem mais limitado do que os SIGs convencionais, tendo sido
concebido com o objetivo de responder às questões desta avaliação, e tendo
como principal mais-valia permitir cruzamentos de informação geográfica da
área delimitada com os dados e indicadores territoriais utilizados e, até mesmo, com as informações provenientes de outras técnicas utilizadas, o que em
nenhuma das outras técnicas seria possível.
27. A representação espacial pode ser direta (coordenadas cartográficas e endereço postal preciso) ou indireta (código postal e área de recenseamento). De forma geral, este instrumento pode aproximar informações
cujas referências geográficas são de natureza diferente (endereço das empresas ajudadas e zonas urbanas
em dificuldade, ou de zonas passíveis de serem ajudadas e zonas sensíveis do ponto de vista do ambiente).
O SIG permite igualmente estimar o valor de um indicador para dada zona, quando se conhece seu valor em
escalas estatísticas diferentes.
28. De acordo com Comissão Europeia (1999a), este instrumento tem uma grande capacidade de integração e síntese
das informações. Sua capacidade de integrar a dimensão territorial é relevante para as políticas públicas. Permite centralizar os resultados provenientes dos serviços estatísticos, trabalhos de acompanhamento e inquéritos de avaliação
efetuados no território que se escolher.
29. Representa o PDRu no qual se efetua a aplicação das MAAs. Para maiores desenvolvimentos sobre o Ruris,
ver PDRu (2000-2006). Detectamos, no entanto, para este programa, a existência de alguns SIGs “independentes”, geridos por diferentes organismos e incompatíveis entre si, em termos da informação disponível e das metodologias de funcionamento utilizadas. No entanto, foram concebidos com objetivos distintos, fora do âmbito
desta avaliação, e nenhum comportava sequer uma pequena parte da informação que se pretendia apurar para
desenvolver este estudo.
30. Denominação específica utilizada para representar o que, de uma forma genérica, seria uma aproximação a um SIG.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
20
FIGURA 2
Diagrama do “micro-SIG” desenvolvido para este estudo
Elaboração dos autores.
2.2.4 Análise multicritério
A análise multicritério é utilizada para realizar um julgamento comparativo em
projetos alternativos ou heterogêneos. Permite ter em conta, simultaneamente,
vários critérios que intervêm em situações complexas e, assim, ajudar as “instâncias de decisão/avaliação” a integrar, em quadro prospectivo ou retrospectivo, as
diferentes opções que refletem as opiniões dos atores implicados em processo de
decisão. Esta técnica conduz a conselhos operacionais ou recomendações.
Foram efetuadas várias experiências no sentido de apurar uma possível utilização da técnica pela Comissão Europeia no âmbito da avaliação de fundos, 31
31. Ver Experiência Hainaut, cf. Comissão Europeia (1999a).
Território e Políticas Públicas...
21
das quais resultaram conclusões animadoras quanto à eventual execução e que
permitiram nomeadamente desenvolver uma alternativa do método chamado
multicritére-multijuge (multicrítério-multijulgamento32), possibilitando a cada um
dos parceiros construir seu julgamento a partir dos critérios e pesos que deseja.
Neste estudo, em particular, foi utilizada uma análise multicritério como
instrumento de apoio à avaliação dos indicadores territoriais levada a cabo na
subseção 2.5. Dessa forma, foi possível não só avaliar cada um dos indicadores
territoriais, mas também possibilitar uma comparação entre a avaliação efetuada
a cada um destes indicadores, bem como aos vários níveis da intervenção.
2.2.5 Aplicabilidade e adaptabilidade de alguns instrumentos ao estudo efetuado
Na realização desta avaliação, foi utilizado um mix de métodos (entrevistas,
cartografia conceitual de impactos, “micro-SIG” e revisão de documentos)
a fim de proporcionar a melhor informação para o estudo desenvolvido.
Para avaliar as diferentes categorias de indicadores (realização, resultados e
impactos), bem como a avaliação dos indicadores por níveis de intervenção
da política (proteção integrada vitivinícola, MAAs e Ruris), foi utilizada uma
análise multicritério.
FIGURA 3
Principais instrumentos utilizados
Elaboração dos autores.
Notas: 1 Embora não considerados, por definição, como instrumentos de avaliação de políticas públicas, neste estudo, optou-se
por proporcionar-lhes um tratamento idêntico, juntamente com a revisão de documentos associados à medida em si.
2
Como já referenciado na subsubseção 2.2.3, optou-se por criar um “micro-SIG”, ou seja, um SIG bastante mais
limitado que os SIGs convencionais, concebido para oferecer resposta às questões desta avaliação.
32. Ver Comissão Europeia (1999a).
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
22
Estes métodos envolvem um leque de dificuldades metodológicas e de medida. Com uma grande importância anexada à avaliação, a metodologia para a
avaliação de políticas públicas tem sido objeto de escrutínio e debate. Segundo
Bachtler e Wren (2006), “isso não é surpreendente dado o acréscimo no papel e
escala das políticas, mas é claro que não existe nenhuma abordagem uniforme”.
A abordagem escolhida parece-nos estar bem adaptada e aplicada ao objeto
deste estudo, ficando, no entanto, a nota de que muitos outros caminhos poderiam ser seguidos para responder às questões desta avaliação. Ao escolher um
instrumento ou uma abordagem de avaliação, devemos ter consciência de que
“dependendo da função da avaliação, diferentes abordagens metodológicas à avaliação podem ser preferidas, tendo presente que todas as abordagens têm forças e
fraquezas” (ESER; NUSSMUELLER, 2006).
2.3 Tratamento de dados e indicadores
A recolha dos indicadores teve como base os definidos no programa e a metodologia
apresentada pela Comissão Europeia (1999a). A apreciação da qualidade dos indicadores teve também em conta a já referida metodologia que revela que, em termos
médios, os indicadores apresentam uma boa classificação na generalidade dos critérios
de qualidade. Destaca-se também o fato de não terem sido previstos, em sede de programação, indicadores de impacto e de realização que não apresentam, na sua maioria, uma meta quantificada. A respectiva não quantificação coloca em causa o critério
da Comissão Europeia (1999a) da normatividade e a aferição da eficácia da medida.
2.4 Os principais indicadores territoriais utilizados
Para este estudo, na recolha de informação, optou-se pela seleção dos indicadores
definidos em sede de programação para acompanhar-se a execução da MAA/PI.
Toda a recolha e o tratamento de informação foram direcionados nesta base.
Inicialmente, optou-se por tentar obter três grupos de indicadores territoriais,
denominados de indicadores de realização, de resultados e de impacto; no entanto, uma vez que não foram definidos indicadores de impacto em sede de
programação para as MAAs, analisou-se os indicadores somente no nível dos de
realização e de resultados.
QUADRO 1
Indicadores territoriais utilizados
Indicadores territoriais
Indicadores de realização
Indicadores de resultados
Número total de beneficiários
Variação do número de beneficiários aderentes
Número de hectares abrangidos
Variação do número de hectares abrangidos
Totais de ajudas
Variação do valor total de ajudas
(Continua)
Território e Políticas Públicas...
23
(Continuação)
Indicadores territoriais
Indicadores de realização
Indicadores de resultados
Nível médio das ajudas por hectare
Variação na cobertura da SAU1 de vinha
Nível médio de ajudas por beneficiário
Nível médio de hectares por beneficiário
Elaboração dos autores.
Nota: 1 SAU – Superfície Agrícola Útil.
2.5 Avaliação dos indicadores territoriais
A avaliação da qualidade dos indicadores para este estudo teve em conta os critérios de
qualidade – que constam na Comissão Europeia (1999a) em La Collection MEANS:
Évaluer les programmes socio-économiques. Conception et conduite d’une évaluaation,
v. 2, p. 210-213 – de referir disponibilidade, atualidade, sensibilidade, confiabilidade,
comparabilidade, normatividade e significado.33 Para efetuar esta análise e proporcionar uma forma de interação com os dados agregados disponíveis, optou-se por seguir
critério idêntico ao utilizado no PDRu AI 2000-2006, ou seja, cada indicador foi
classificado de 0 a 2, sendo apresentado seguidamente os respectivos quadros com a
classificação individual de cada um dos indicadores deste estudo.34
QUADRO 2
Indicadores de realização
Indicador previsto
Quantificação
publicada
Critérios1
[1]
[2]
[3]
[4]
[5]
[6]
[7]
Classificação
global
Número total de beneficiários
N
2
1,5
2
1,5
2
0,5
2
1,64
Número de hectares abrangidos
N
2
1,5
2
1,5
2
0,5
2
1,64
Totais de ajudas
N
2
1,5
2
1,5
2
0,5
2
1,64
Nível médio de ajudas por
hectare
N
1,5
1,5
2
1,5
2
0,5
2
1,57
Nível médio de ajudas porbeneficiário
N
1,5
1,5
2
1,5
2
0,5
2
1,57
Nível médio de hectares por
beneficiário
N
1,5
1,5
2
1,5
2
0,5
2
1,57
1,75
1,5
2
1,5
2
0,5
2
1,61
Média de classificação por critério de avaliação
do indicador
Número de indicadores
6
Fontes: Dados recolhidos no âmbito desta avaliação referentes à MAA/PI aplicada ao setor vitivinícola na região do Alentejo,
em Portugal. Avaliação dos autores referente aos dados recolhidos. Metodologia adaptada de: Comissão Europeia
(1999a), Tavistock Institute (2003) e DGDR (1999).
Nota: 1 [1] Disponibilidade; [2] Atualidade; [3] Sensibilidade; [4] Confiabilidade; [5] Comparabilidade; [6] Normatividade; e
[7] Significado.
33. Para maiores desenvolvimentos, ver subseção 2.2, Comissão Europeia (1999a), e Tavistock Institute (2003).
34. Estes indicadores têm, na sua base de avaliação, os dados recolhidos referentes à MAA/PI, aplicados ao setor
vitivinícola na região do Alentejo, em Portugal.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
24
QUADRO 3
Indicadores de resultados
Critérios1
Indicador previsto
Quantificação
publicada
[1]
[2]
[3]
[4]
[5]
[6]
[7]
Classificação
global
Variação do número de beneficiários
aderentes
N
1
1,5
2
1,5
1
–
1,5
1,21
Variação do número de hectares
abrangidos
N
1
1,5
2
1,5
1
–
1,5
1,21
Variação do valor total de ajudas
N
1
1,5
2
1,5
1
–
1,5
1,21
Variação na cobertura da SAU de vinha
N
1
1,5
2
1,5
1,5
0,5
1,5
1,36
Média de classificação por critério de avaliação
do indicador
1
1,5
2
1,5
1,13
0,5
1,5
1,25
Número de indicadores
4
Fontes: Dados recolhidos no âmbito desta avaliação referentes à MAA/PI aplicada ao setor vitivinícola na região do Alentejo,
em Portugal. Avaliação dos autores referente aos dados recolhidos. Metodologia adaptada de: Comissão Europeia
(1999a), Tavistock Institute (2003) e DGDR (1999).
Nota: 1 [1] Disponibilidade; [2] Atualidade; [3] Sensibilidade; [4] Confiabilidade; [5] Comparabilidade; [6] Normatividade; e
[7] Significado.
QUADRO 4
Análise multicritério dos indicadores
Categoria dos indicadores
Número de
indicadores
[1]
[2]
[3]
[4]
[5]
[6]
[7]
Classificação
global por
categoria
6
1,75
1,5
2
1,5
2
0,5
2
1,61
1,25
Realização
Critérios1
Resultados
4
1
1,5
2
1,5
1,13
0,5
1,5
Impacto2
–
–
–
–
–
–
–
–
–
0,92
1
1,33
1
1,04
0,33
1,17
0,95
Média
Número total de indicadores
10
Fontes: Dados recolhidos no âmbito desta avaliação referentes à MAA/PI aplicada ao setor vitivinícola na região do Alentejo,
em Portugal. Avaliação dos autores referente aos dados recolhidos. Metodologia adaptada de: Comissão Europeia
(1999a), Tavistock Institute (2003) e DGDR (1999).
Notas: 1 [1] Disponibilidade; [2] Atualidade; [3] Sensibilidade; [4] Confiabilidade; [5] Comparabilidade; [6] Normatividade; e
[7] Significado.
2
Não foram definidos indicadores de impacto em sede de programação para as MAAs.
QUADRO 5
Síntese da avaliação dos indicadores por níveis de intervenção
Níveis de
intervenção
Proteção
integrada (PI)
Número de indicadores
Critérios1
[1]
[2]
[3]
[4]
[5]
[6]
[7]
Classificação
global
0,92
1
1,33
1
1,04
0,33
1,17
0,95
Realização
Resultados
Impacto
6
4
–
MAAs
1,2
1,2
1,2
0,6
1,2
0,5
1
0,96
4
4
–
Ruris
1,2
1,2
1,2
1,1
1,1
0,7
1,2
1,1
17
15
–
Fontes: Dados recolhidos no âmbito desta avaliação referentes à MAA/PI aplicada ao setor vitivinícola na região do Alentejo,
em Portugal. Avaliação dos autores referente aos dados recolhidos. MAAs e Ruris – PDRu AI 2000-2006.
Nota: 1 [1] Disponibilidade; [2] Atualidade; [3] Sensibilidade; [4] Confiabilidade; [5] Comparabilidade; [6] Normatividade; e
[7] Significado.
Território e Políticas Públicas...
25
De uma forma global, na primeira abordagem aos indicadores, é de referir a
ausência de indicadores de impacto. Tal fato deve-se a que no documento de programação não ter sido previsto e quantificado este tipo de indicadores, e sua classificação global é claramente prejudicada por esta situação. Os indicadores de realização,
de uma forma geral, apresentam uma boa classificação em termos médios, apresentando uma classificação global de 1,61 pontos. Foram classificados com nota máxima no
critério de sensibilidade e comparabilidade, uma vez que, além de refletirem, diretamente, com clareza e de forma significativa, variações no nível dos efeitos do programa, possibilitam de imediato uma comparabilidade significativa, quer a nível interno,
quer a nível externo. A classificação global dos indicadores de resultados apresenta-se
ligeiramente mais atenuada (1,25), sendo de referir o fato do critério de normatividade apresentar classificações reduzidas, já que se torna complexo encontrar quaisquer
referências ou padrões que possibilitassem um tipo de julgamento, diante do valor
que estes indicadores assumem. Da avaliação comparativa com outros indicadores por
níveis de intervenção, é perceptível que, quer a nível de cada critério, quer a nível da
classificação global, os indicadores deste estudo apresentam valores de avaliação muito
próximos dos apresentados nos indicadores das MAAs e do Ruris.
De uma forma geral, podemos considerar que os indicadores utilizados segundo o critério escolhido apresentam uma boa classificação em termos médios.
3 avaliação da execução da política pública
3.1 Avaliação da execução física
3.1.1 Síntese de evolução da política
O estudo da evolução da execução apresenta-se como um aspecto-chave a ter em
conta na orientação da política. Dessa forma, pretende-se conhecer a evolução de
alguns indicadores territoriais ao longo do período em análise, de modo a apurar-se
a forma como a execução da política tem sido orientada. Em todos os indicadores,
verifica-se uma tendência crescente até 1998, assim como o total de ajudas atinge
seu máximo durante a aplicação do Regulamento CEE no 2.078/1992, em 1998.
A aprovação de um programa intercalar que vigorou de 1998 a 1999 acabou por
registrar uma quebra acentuada em todos os indicadores. Em 2000, tendo em conta
os atrasos verificados na aplicação do novo quadro de política de desenvolvimento
rural, e com o objetivo de não prejudicar os agricultores beneficiários das MAAs,
por meio da Portaria no 108, de 25 de fevereiro de 2000, foi possível que, embora
não fossem aceitas novas candidaturas para aquele ano, os contratos cujo termo
ocorreram em 1999 puderam ser prorrogados por mais um ano. A efetiva aplicação
do Ruris veio responder aos baixos níveis de execução observados, nos quais, em
2003, já se verificavam níveis de execução muito mais elevados. Saliente-se que,
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
26
em 2003, verifica-se os valores máximos atingidos no período em estudo para os
indicadores número total de beneficiários e número total de hectares abrangidos e
um valor para o total de ajudas bastante próximo do máximo atingido em 1998.35
3.1.2 Avaliação comparativa dos indicadores territoriais em nível dos distritos
FIGURA 4
Execução da PI nos distritos do Alentejo – 2003
Fonte: Dados apurados para 2003 (Ateva).
Elaboração dos autores.
35. Para maiores desenvolvimentos sobre a evolução da política, ver Bazílio (2007).
Território e Políticas Públicas...
27
Com base na figura 4, é possível identificar facilmente o distrito de Évora como
sendo o que apresenta melhores níveis de execução, seguido dos distritos de Beja e
Portalegre, tendo o distrito de Setúbal uma representatividade quase insignificante.
Tendo também em consideração os dados de Ateva (2003),36 foi possível
constatar que o distrito de Évora em 2003 foi responsável por 66,15% dos beneficiários, absorvendo 69,21% das ajudas e abrangendo uma área de execução
de 69,43% de toda a região do Alentejo, sendo, portanto, o distrito com maior
impacto a nível da execução.
Pelo apurado, os vitivinicultores do distrito de Beja são, em média, os que
conseguem os melhores níveis de ajuda por hectare, mais concretamente, na ordem dos 146,86 euros. No entanto, neste indicador, não se verificaram grandes
desvios para os vitivinicultores dos outros distritos.
3.1.3 Avaliação comparativa dos indicadores territoriais a nível de concelhos
Com base em Bazílio (2007), o distrito de Évora é o distrito com maior impacto
a nível de execução da política, seguido dos distritos de Beja e Portalegre, não registando o distrito de Setúbal uma execução relevante. No entanto, se efetuarmos
uma análise mais aproximada aos concelhos, podemos constatar que toda a base de
execução da política está alicerçada principalmente em cinco concelhos, nomeadamente: Vidigueira, Reguengos de Monsaraz, Borba, Redondo, Évora e Portalegre.
As figuras 5 e 6 traduzem uma visão mais aproximada a cada um destes concelhos.
36. Ver Bazílio (2007).
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
28
FIGURA 5
Concelhos com melhores níveis de execução – distrito de Évora – 2003
Fonte: Dados apurados para 2003 (Ateva).
Elaboração dos autores.
Estes concelhos do distrito de Évora, já com uma longa tradição vitivinícola,
registam em conjunto níveis de ajudas que absorvem 63,89% das ajudas de toda a
região do Alentejo e uma contribuição para a área de execução da política na região
de 63,51%, ocupando, até mesmo, 47,27% de toda a SAU de vinha do Alentejo.
Entre 1996 e 2003, o concelho de Vidigueira registou um acréscimo no
número de beneficiários de 402%, e, em 2003, foi o concelho que apresentou o
maior número de beneficiários. O concelho de Portalegre domina a execução da
política no Alto Alentejo. Embora com execuções mais modestas que grande parte
Território e Políticas Públicas...
29
dos concelhos já abordados, é de salientar-se o trabalho desenvolvido no nível
do acréscimo de execução da política, principalmente nos hectares abrangidos.
Como resultado deste trabalho, passou de uma área de execução de apenas 20
hectares, em 1996, para uma área de 899,49 hectares, em 2003, tendo por implicação um acréscimo significativo no total de ajudas recebidas.
FIGURA 6
Concelhos com melhores níveis de execução – distritos de Beja e Portalegre – 2003
Fonte: Dados apurados em 2003 (Ateva).
Elaboração dos autores.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
30
Em forma de resumo, podemos referir que, no seu conjunto, os concelhos de
Vidigueira, Reguengos de Monsaraz, Borba, Redondo, Évora e Portalegre são responsáveis por 93,85% do número de beneficiários e 89,96% da área abrangida, e absorvem 91,03% das ajudas de toda a região do Alentejo. Nesta fase, importa também
apurar se todas as reconhecidas sub-regiões vitivinícolas do Alentejo (SRVA) estão
a beneficiar-se da política. Para tal, uma vez que a Comissão Vitivinícola Regional
Alentejana (CVRA) e a Ateva reconhecem como SRVA os territórios de: Portalegre,
Borba, Redondo, Évora, Reguengos, Granja/Amareleja, Vidigueira e Moura, é possível, facilmente, uma comparação entre tais sub-regiões com os resultados obtidos.37
Assim sendo, podemos constatar que os concelhos de Mourão (Granja) e concelho de
Moura (Amareleja) são os únicos que, apesar de terem reconhecido todo um potencial
vitivinícola, não têm se beneficiado de forma relevante da MAA/PI. Dessa forma, e
tendo presente que a execução da política também pode ser regionalmente influenciada por fatores como as características dos sistemas vitivinícolas predominantes, sua
rentabilidade, competitividade, diversidade e adaptabilidade à medida, pelo nível das
ajudas e de outras ajudas concorrentes e pelas limitações das condições de acesso, tudo
indica-nos que uma eventual intervenção mais direcionada a estes territórios, no sentido de incrementar a execução da política, poderia ter resultados bastante satisfatórios.
3.2 Avaliação da execução financeira
Nesta subseção, pretende-se aferir sobre a afetação financeira da política. Para tal,
iremos-nos situar no período de programação, entre 2000 e 2003, e analisar a
afetação no nível do Ruris. Esta foi balizada por vários fatores, é de importância
salientar: a necessidade de oferecer continuidade às intervenções do período anterior e efetuar os compromissos já assumidos, a escassez de recursos financeiros
e a concentração de recursos nas intervenções que demonstravam um maior potencial de intervenção “em matéria de ocupação do território e coesão social e de
prevenção dos recursos naturais e do ambiente” (DGDR, 1999).
QUADRO 6
Programação financeira inicial do Ruris
Despesa pública programada1
(€$ mil)
Ruris
2004
2005
2006
Total
RA2
3.437
5.187
7.120
9.760
12.297
14.800
17.241
69.842
3,8
IC3
49.863
70.327
68.773
68.984
71.313
72.307
72.160
473.727
25,9
132.720
114.271
116.373
115.816
110.620
110.947
114.235
814.982
44,6
2000
MAA4
2001
2002
2003
Percentual
(Continua)
37. Tendo em conta que são consideradas sub-regiões autonômas, e que na análise efetuada apenas tem-se em consideração
os distritos e concelhos, o que nem sempre se mostra equivalente. Por esta razão, e para possibilitar uma melhor comparação,
são consideradas as sub-regiões de Granja e Amareleja agregadas respectivamente nos seus concelhos e distritos correspondentes, ou seja, Granja – Concelho, Mourão – Distrito de Évora e Amareleja – Concelho de Moura – Distrito de Beja
Território e Políticas Públicas...
31
(Continuação)
Despesa pública programada 1
(€$ mil)
Ruris
FTA 5
Total no
ano 6
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
Total
60.627
63.053
64.364
66.311
70.593
72.087
73.157
470.192
25,7
246.647
252.838
256.630
260.871
264.823
270.141
276.793
1.828.743
100
Percentual
Fontes: Decisão da Comissão Europeia C no 3.368, de 22 de novembro de 2000, e PDRu 2000-2006.
Notas: 1 Despesa pública programada = comparticipação da UE + comparticipação nacional.
2
RA – reforma antecipada.
3
IC – indenizações compensatórias.
4
MAA – medidas agroambientais.
5
FTA – florestação de terras agrícolas.
6
Não contempla despesas programadas com avaliações.
Com base no quadro 7, verifica-se que a Comissão Europeia aprovou uma
afetação financeira inicial que foi preferencial, sobretudo, às MAAs, cuja dotação era de 44,60% do total do programa. Seguem-se as ICs (25,90%) e FTAs
(25,70%), e a RA representa a intervenção com menos dotação afeta (3,80%).
No entanto, ao longo do período de execução, foram necessários alguns
ajustamentos à programação financeira inicial, principalmente direcionada na
desafetação de verbas por todas as intervenções, embora sem grandes alterações
significativas ao seu peso relativo.
QUADRO 7
Programação financeira do Ruris revista em 2002
Despesa pública programada1
(€$ mil )
Ruris
2000
RA
3.437
2001
3.978
2002
7.120
2003
9.760
2004
2005
2006
Total
12.297
14.800
17.241
69.842
4
Percentual
–
83.844
68.773
68.984
71.313
72.307
72.160
437.381
25,3
MAA
113.845
85.768
116.373
115.816
110.620
110.947
114.235
767.604
44,4
FTA
48.621
56.721
63.033
64.980
69.263
70.756
71.827
445.201
25,8
166.854
231.698
256.630
260.870
264.824
270.141
276.793 1.727.810
100
IC
Total no
ano2
Fontes: Decisão da Comissão Europeia C no 1.630, de 21 de maio de 2002, e PDRu 2000-2006.
Notas: 1 Despesa pública programada = comparticipação da UE + comparticipação nacional.
2
Não contempla despesas programadas com avaliações.
QUADRO 8
Programação financeira do Ruris revista em 2003
Despesa pública programada 1
(€$ mil)
Ruris
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
Total
Percentual
RA
3.576
3.978
2.707
9.760
12.297
14.800
17.241
64.359
3,8
IC
–
83.844
60.504
68.984
71.313
72.307
72.160
429.112
25,6
113.845
85.768
96.521
115.816
110.620
110.947
114.235
747.752
MAA
44,6
(Continua)
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
32
(Continuação)
Despesa pública programada 1
(€$ mil)
Ruris
FTA
Outras 2
Total no
ano 3
Total
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
Percentual
48.621
56.721
42.637
64.980
69.263
70.756
71.827
424.805
25,4
812
1.387
744
1.400
1.421
1.431
1.770
8.965
0,5
166.854
231.698
203.113
260.940
264.914
270.241
277.233 1.674.993
100
Fontes: Decisão da Comissão Europeia C no 2.665, de 16 de julho de 2003, e PDRu 2000-2006.
Notas: 1 Despesa pública programada = comparticipação da UE + comparticipação nacional.
2
Antigas medidas anteriores a 1992.
3
Não contempla despesas programadas com avaliações.
O ajuste financeiro efetuado em 2003 representa um corte de 9% do total
da dotação inicial prevista, sendo mais relevante no caso da FTA, com um corte
de aproximadamente 10% diante da decisão inicial do programa.
Por meio do cálculo de uma taxa de execução financeira (TEF) para a contribuição da UE,38 pode-se verificar que, para o total de 2003, atingiu-se uma
TEF de 83,53%, e no período 2000-2003, a TEF foi de 75,16%. Assim sendo,
tudo leva-nos a crer que as dotações financeiras previstas pela UE como apoio à
política não estão a ser plenamente utilizadas.
QUADRO 9
MAAs – execução comparativa com base em diferentes decisões
(Em €)
MAA –
Despesa
pública
Período
Execução
Programação da
Decisão C no 3.368, de 2000
2000-2003
Taxa de execução1
diante da Decisão
C no 3.368, de 2000
Taxa de execução1 diante
da Decisão
C no 2.665, de 2003 (%)
2000-2003
2000-2003 2000-2006
2000-2003
2000-2006
Ruris
126.256.584
–
–
–
–
163.917.000 499.719.000
77,02
25,27
Compromissos
anteriores
250.176.499
–
–
–
–
248.033.000 248.032.000
100,86
100,86
78,56
46,19 411.950.000 747.751.000
91,38
50,34
Total no
ano
376.433.083 479.180.000 814.982.000
2000-2003 2000-2006
Programação da
Decisão C no 2.665, de 2003
2000-2006
Fontes: IDRHa e PDRu 2000-2006.
Nota: 1 Despesa pública executada (incluindo adiantamentos)/Despesa pública programada.
Obs.: Montantes referentes ao ano Feoga – Garantia. No caso da Decisão C (2000), a informação não está discriminada por
Ruris e compromissos anteriores; por isso, só é possível efetuar a taxa de execução para o valor agregado.
Com base no quadro 10, pode-se concluir que a execução financeira da
Intervenção das Medidas Agroambientais (IMAAs) encontra-se abaixo do programado. É, no entanto, provável que as alterações introduzidas pela Portaria
no 1.212/2003 39 possibilitem atenuar a situação nos anos seguintes.
38. Ver Bazílio (2007).
39. A Portaria no 1.212/2003 (DR no 240, 1a Série-B, de 16 de outubro de 2003) aprova o Regulamento de Aplicação da IMAA,
do Ruris. Este apresenta alterações relativas ao aumento do montante de ajudas às pequenas explorações, ao aumento das majorações em caso de cumprimento de compromissos adicionais, à ajuda à comercialização e ao alargamento de novas culturas
(PI, produção integrada e agricultura biológica), à supressão de alguns compromissos e ao reforço de outros, à simplificação de
procedimentos e medidas, à aplicação de novas medidas e novos planos zonais e à supressão de algumas medidas.
Território e Políticas Públicas...
33
3.3 Avaliação da cobertura da SAU de vinha do Alentejo
Nesta subseção, pretende-se apurar a forma como a execução da política tem evoluído no que interessa à cobertura da SAU de vinha do Alentejo.
GRÁFICO 1
SAU de vinha – região agrária do Alentejo
20.000,00
15.000,00
Hectares 10.000,00
5.000,00
0,00
1996
2003
Alentejo
Alentejo – PI
Fontes: INE – Estatísticas Regionais da Produção Vegetal e Animal 1990-2000 e Inquérito à Estrutura das Explorações Agrícolas 2003, MADRP-Draal, DGDR e Ateva.
Elaboração dos autores.
Como é possível verificar com o auxílio do gráfico 1, a própria SAU de
vinha do Alentejo sofreu durante o período em análise um acréscimo de 5.361
hectares. É, no entanto, notório que a MAA/PI no decorrer do período tem demonstrado um bom nível de aceitação por parte dos vitivinicultores, uma vez que
conseguiu evoluir de uma taxa de cobertura40 da SAU de vinha do Alentejo pela
PI de 9,03%, em 1996, para uma de 74,43%, em 2003. Estes resultados mostram
que, de fato, têm sido relevantes os esforços desenvolvidos para melhorar a execução da medida, mas também transmitem a ideia de que ainda existe um potencial
para crescimento e que devem ser realizados esforços no sentido de o explorar.
3.4 Avaliação da contribuição da MAA/PI no contexto global da política
Segundo a PDRu 2000-2006, o valor previsto para o período 2001-2003, na
região do Alentejo, indicava um total de 2.681 beneficiários para a PI e um de
4.529 beneficiários para as MAAs. Contudo, pelos dados efetivamente apurados,
refletidos no quadro seguinte, tais valores não foram completamente atingidos.
40. Taxa de cobertura = (no de hectares abrangidos pela PI/SAU de vinha do Alentejo) *100.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
34
QUADRO 10
Número total de beneficiários – 2001, 2002 e 2003 – NUTS II
Medida
Total das MAAs1
PI Vitininícula3
PI1,2
Norte
–
6.945
40.029
Centro
–
2.460
15.236
Lisboa e Vale do Tejo
–
108
165
Alentejo
1.348
2.130
3.773
Algarve
–
176
2.015
Continente
–
11.819
61.218
Elaboração dos autores.
Notas: 1 PDRu 2000-2006, IFADAP e Inga. Dados disponibilizados respeitantes à campanha de 2003 – 2a confirmação de
2001, 1a confirmação de 2002 e candidaturas de 2003; ou seja, em 2003, os dados não estão estabilizados.
2
PI – proteção integrada.
3
IFADAP, IDRHa e Ateva. Dados apurados neste estudo (estabilizados).
No entanto, é de referir que, para o período e a região considerada, o número total de beneficiários da PI vitivinícola representava 63,28% de seu total e
35,73% do das MAAs. Nesta base, podemos assumir como relevante a contribuição da execução da PI vitivinícola para o resultado final deste indicador.
No que concerne ao número de hectares abrangidos, mais uma vez, a previsão
efetuada no PDRu 2000-2006, que indicava a direção de se atingir para a PI como
uma superfície de 37.869,07 hectares e para as MAAs, uma superfície de 137.316,19
hectares, foi um pouco aquém do que efetivamente conseguimos apurar.
QUADRO 11
Número de hectares abrangidos – 2001, 2002 e 2003 – NUTS II
PI vitivinícula2
PI1
Total das MAAs1
Norte
–
34.507,19
134.471,48
Centro
–
12.711,51
54.441,80
Medida
–
1.099,01
1.995,95
Alentejo
16.560,55
30.082,98
114.395,28
Algarve
–
1.697,53
12.713,74
Continente
–
80.098,22
318.018,25
Lisboa e Vale do Tejo
Elaboração dos autores.
Notas: 1 PDRu 2000-2006, IFADAP e Inga. Dados disponibilizados respeitantes à campanha de 2003 – 2a confirmação de 2001,
1a confirmação de 2002 e candidaturas de 2003; ou seja, em 2003, os dados não estão estabilizados.
2
IFADAP, IDRHa e Ateva. Dados apurados neste estudo (estabilizados).
À semelhança do verificado com o número total de beneficiários, o peso relativo do número de hectares abrangidos pela PI vitivinícola na região do Alentejo
apresenta-se relevante, atingido uma cobertura de 55,05% da área de PI e uma de
14,48% da área total das MAAs nesta região. Referente ao nível médio da ajuda
por beneficiário, não foram encontradas previsões para estes valores, sendo de referir que os valores registados para a PI vitivinícola mostram que os vitivinicultores do Alentejo receberam abaixo da média verificada para a MAA/PI e as MAAs.
Território e Políticas Públicas...
35
QUADRO 12
Nível médio da ajuda por beneficiário –­ 2001, 2002 e 2003
(Em €)
PI vitivinícula2
PI1
Total das MAAs1
Norte
–
1.037,57
617,51
Centro
–
1.302,97
717,44
Medida
–
2.140,50
2.272,40
Alentejo
1.343,59
1.999,58
2.559,83
Algarve
–
3.418,02
852,83
Continente
–
1.311,71
774,29
Lisboa e Vale do Tejo
Elaboração dos autores.
Notas: 1 PDRu 2000-2006, IFADAP e Inga. Dados disponibilizados respeitantes à campanha de 2003 – 2a confirmação de
2001, 1a confirmação de 2002 e candidaturas de 2003; ou seja, em 2003, os dados não estão estabilizados.
2
FADAP, IDRHa e Ateva. Dados apurados neste estudo (estabilizados).
No entanto, é de salientar-se que embora o indicador em termos médios possa-se mostrar inferior, este é resultado de uma média aritmética simples dos valores
obtidos nos últimos três anos, e que, no caso da PI vitivinícola, quando apenas
analisamos o nível médio de cada ano individualmente, apuramos que se verifica
uma tendência crescente, na qual o valor deste indicador apenas em 2003 indica
um nível médio de €$ 1.991,30, ou seja, quase idêntico ao nível médio da PI.
4 Conclusões
As políticas públicas de desenvolvimento rural representam um pilar da nova
utilidade que a Europa reconhece ao seu espaço rural, nomeadamente, no nível
da conservação do ambiente.
A forma como os objetivos da política em estudo são definidos nos documentos preparatórios, na regulamentação e em toda sua “arquitetura” indicam
uma preocupação crescente com o aumento de eficácia ambiental da política;
particularmente, na conservação da natureza e do espaço rural.
No decorrer do estudo de avaliação orientado para o setor vitivinícola da região
do Alentejo, em Portugal, presente neste artigo, não foram detectadas orientações genéricas da política que contemplassem diretamente e especificamente cada território.
Esta situação não se altera sequer para os territórios na região estudada, classificados
como sub-regiões vitivinícolas. Dessa forma, tudo indica que a diversidade dos territórios e a especialização produtiva em questão não correspondam a objetivos específicos relativos à melhoria da competitividade territorial e ao desenvolvimento rural.
No que se refere à distribuição territorial da medida, foi possível verificar
que o distrito de Évora é o distrito com maior impacto a nível de execução da
política, seguido dos distritos de Beja e Portalegre. O distrito de Setúbal, por seu
vez, não regista bons níveis de execução.
36
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
No distrito de Évora, é também possível verificar que a execução é bastante
mais dispersa e equilibrada por todos os concelhos, dos quais apenas quatro de
catorze não registram quaisquer níveis de execução. No caso dos distritos de Beja
e Portalegre, a execução aparece principalmente concentrada nos seus respectivos
concelhos, registrando, aos restantes concelhos destes distritos, níveis de execução
muito modestos ou inexistentes.
Para a MAA/PI, ao longo do período estudado, foi possível verificar que as
tendências registadas no nível da execução mostraram-se bastante idênticas nos
distritos de Beja, Évora e Portalegre.
Para além de um contexto de expectativas dos beneficiários constantemente
em alteração, verificou-se que a estrutura da política e sua gestão têm condicionado de certa forma a execução.
Contudo, esta avaliação de execução intercalar é marcada por resultados
importantes e positivos no estímulo da PI. Estes resultados de execução são portadores de potencial de transformação e impactos ambientais importantes.
É de referir-se, também, que as organizações de agricultores (OA) confirmaram sua importância para o aumento da adesão, sendo de salientar-se a via da
promoção e os esclarecimentos.
Essa intervenção das MAAs foi também marcada por uma aplicação, por
vezes até preferencial, nas zonas da Rede Natura 2000, o que significa que o design
da política também orientou-se para territórios de maior importância do ponto
de vista ambiental.
Apesar dos objetivos serem formalmente de natureza ambiental, pode-se
também constatar com esta avaliação que a política tem poucos referenciais territoriais de eficácia ambiental, não tendo por isto sido definidas referências que
permitiriam uma avaliação da eficácia e eficiência devidamente quantificadas.
Da análise efetuada por meio dos indicadores territoriais selecionados, foi possível reconhecer a incidência territorial da MAA/PI. Assim sendo, os territórios mais
beneficiados pela medida são os concelhos de Vidigueira, Reguengos de Monsaraz,
Borba, Redondo, Évora e Portalegre, sendo o somatório da sua execução responsável por 93,85% do número total de beneficiários, 89,96% do total da área abrangida e absorvendo 91,03% do total de ajudas de toda a região do Alentejo.
Desses concelhos, já com uma longa tradição vitivinícola, é de salientar-se que
o concelho da Vidigueira é o concelho que apresenta o maior número de beneficiários e o concelho de Borba é o que tem a maior área de execução e que se beneficia de
mais ajudas, seguido de muito próximo pelo concelho de Reguengos de Monsaraz.
Território e Políticas Públicas...
37
Foi possível verificar que, na grande maioria das regiões agrícolas, são normalmente predominantes explorações de pequena dimensão e com atividades
acentuadamente diversificadas para além da vitivinicultura.41 Este fato originou
que a distribuição das ajudas pelas explorações agrícolas seja fortemente influenciada pelas suas maiores ou menores vocações vitivinícolas, existindo, portanto,
territórios na raia alentejana que não registraram quaisquer níveis de execução.
No entanto, é de salientar-se que foram detectados territórios, nomeadamente
nos concelhos de Mourão (Granja) e Moura (Amareleja), classificados como subregiões vitivinícolas, que nos levam a crer não terem se beneficiado de forma relevante da política quando comparados com seu potencial vitivinícola implícito.
É notório que, no decorrer do período estudado, a política tem demonstrado um bom nível de aceitação por parte dos vitivinicultores, uma vez que
conseguiu evoluir de uma taxa de cobertura da SAU de vinha do Alentejo pela PI
de 9,03%, em 1996, para uma de 74,43%, em 2003. Do exposto, parece lícito
referir a existência de um elevado interesse relativamente à política, mas também
sugere que ainda existe a possibilidade de ser incrementada sua respectiva execução, o que poderá passar, em alguns casos, pelo aumento da sua atratividade, pelo
repensar dos valores de ajuda e, até mesmo, pela reformulação pontual ou global
em perspectiva mais territorializada.
4.1 Sugestões
Com este estudo, pretendeu-se contribuir para uma visão diferente e inovadora
sobre a MAA/PI e, até mesmo, possibilitar que decisões políticas utilizem investigação acadêmica, uma vez que, à luz dos resultados obtidos, é possível contribuir
para avaliar a pertinência da estratégia adotada e ter uma base de orientação para
futuras negociações no nível da revisão de novos objetivos e estratégias a aplicar
às novas candidaturas. Neste sentido, no quadro 13, são apresentadas algumas
sugestões relevantes, para que possam ser tidas em consideração em momentos
futuros de revisão desta política pública.
QUADRO 13
Linhas nas quais se assentam as principais sugestões do estudo
Sugestões
Comentários
É importante procurar o aumento da respectiva eficácia por via de uma definição
1. Iniciar um trajeto de territorialização da
mais precisa, coordenada e até georreferenciada dos objetivos ambientais e de
MAA/PI para o setor vitivinícola
desenvolvimento rural específicos da região e do setor, adotando também uma
coerência de integração com as restantes MAAs
2. Criar condições para uma renovação da
Esta renovação teria na sua base quer a simplificação, quer a territorialização dire-
estrutura operacional da medida
cionadas para a obtenção de efeitos nos níveis ambiental, setorial, rural e regional
(Continua)
41. Cf. INE.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
38
(Continuação)
Sugestões
3. Complementar processos de gestão e
Comentários
Dessa forma, seria possível incluir no processo de tomada de decisão mais do que
decisão da medida, com base na renovação/ as atuais condições de elegibilidade, conduzindo, assim, a uma aferição sobre a
simplificação e territorialização
valia de cada candidatura para cada região
4. Otimizar o papel das organizações e asso- Principalmente na gestão processual do programa, aproveitando a dinâmica já
ciações de agricultores do setor vitivinícola
5. Analisar a viabilidade para aumentar a
atratividade das ajudas
criada por estas entidades no nível da promoção da MAA/PI
Por meio do seu aumento para níveis superiores
6. Analisar a viabilidade de ser considerado
o papel da PI no quadro de objetivos dos
Preferencialmente quando da revisão dos objetivos de conservação destas zonas
planos zonais
7. Reestruturar a informação associada à
medida
É importante que seja recolhida, tratada e disponibilizada mais rapidamente e
frequentemente, bem como estar associada a formas de comunicação e interação
com os beneficiários
Disponibilizar, atualizar e aumentar o nível de informação relativa à execução da
8. Melhorar a informação disponível para a
medida que permita conhecer, em qualquer momento, o estado das candidaturas
gestão e execução da MAA/PI
e os valores desagregados dos vários indicadores territoriais por unidade administrativa ou território
Elaboração dos autores.
Território e Políticas Públicas...
39
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TRANSFERÊNCIAS DE RENDA E EMPREGOS PÚBLICOS NA
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Leonardo Alves de Araújo*
João Policarpo R. Lima**
Este artigo procura mensurar qual seria o tamanho das transferências de renda diretas para
a região do semiárido nordestino, a chamada economia sem produção. O capítulo 5 do livro
Velhas secas em novos sertões, de Gustavo Maia Gomes (2001), é a referência para esta obra,
em que se atualizou os dados encontrados por Gomes em 1997. Naquele trabalho, definia-se a
economia sem produção como formada pelos salários dos aposentados e funcionários públicos.
Posteriormente, foi criado o Programa Bolsa Família (PBF), tendo o valor dos benefícios pagos
às famílias sido incluído neste trabalho como mais um agente constitutivo da economia sem
produção. Estas três fontes representam a maior fonte de renda do semiárido, muito superiores
ao tradicional setor agropecuário da região. Chegamos, assim, ao mesmo resultado encontrado
por Gomes em seu livro. Entretanto, constatamos que houve considerável crescimento das
transferências em relação a outros indicadores como a massa salarial total, transferência por
habitante, emprego público em relação ao emprego formal total, entre outros indicadores
econômicos e sociais, no período 1997-2005. Corrigindo pela inflação os valores encontrados
para os aposentados e funcionários públicos para 2007, e somando-os ao valor dos benefícios
do PBF, observa-se que a economia sem produção praticamente dobrou de tamanho em relação
à primeira estimativa feita dez anos antes.
Palavras-chave: Economia sem Produção; Semiárido; Programa Bolsa Família.
Income transfers and public employment in the economy without
production of Brazil´s Northeast semi-arid
This paper attempts to estimate income transfers to Northeastern semi-arid region in Brazil,
which constitutes an “economy without production”. It departures from a previous work by
Gomes (1997) and makes an actualization of both data basis and analysis. The income transfers
considered by Gomes included civil servants and pensions and in this paper it was added
those represented by the “Bolsa Familia” Program. These three income sources represent an
amount which is greater than the traditional primary sector of the region. During the period
1997-2005 the income transfers increased meaningfully and nowadays the “economy without
production” practically doubled.
Key words: Economy without Production; Brazil’s Northeast Semi-arid; Programme “Bolsa Familia”.
* Graduado em Economia pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). E-mail: [email protected]
** Professor associado do Departamento de Economia da UFPE e pesquisador do Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico (CNPq). E-mail: [email protected]
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46
Las transferencias de ingresos y el empleo público en la economía
sin producción de la región árida del Nordeste brasileño
Este artículo busca medir el tamaño de los ingresos de las transferencias directas de renta por el
Gobierno Federal para la región árida del Nordeste Brasileño. El capitulo 5 del libro “ Velhas Secas
em Novos Sertões” (2001) de Gustavo Maia Gomes es la principal referencia para este trabajo que
busco actualizar los datos encontrados por Gomes en 1997. En ese trabajo se definía la “economía
sin producción” como compuesta por los rendimientos de los jubilados y de los empleados del
sector público. Más tarde fue criado el Programa “Bolsa Família” (Becas para las Famílias de
Bajo rendimiento), que constituye mas un elemento de esta economía sin producción. Estas tres
fuentes representan la mayor entrada de ingresos en la región en foco, mucho mayor que el sector
tradicional agropecuario. El trabajo ratifica los mismos resultados encontrados por Gomes en su libro.
Sin embargo, se constata que hubo un considerable crecimiento de estas transferencias con relación
al crecimiento de la población y al empleo formalizado, en el período de 1997 al 2005. Si se hace
la corrección de la inflación, los valores encontrados para los jubilados y para los empleados en
instituciones del sector público, para 2007, acrecido del valor de las “ Bolsas Famílias”, casi se
duplicó en tamaño el valor con relación a la primera estimación realizada diez años antes.
Palabras-clave: Economía sin Producción; Región Árida del Nordeste Brasileño; Programa “Becas
para las Famílias”.
Transfers de revenus et emplois publiques dans l´économie sans
production au semi-aride du nord-est du Brésil
Cet article essaye de mesurer la quantité de revenus transferés pour la région semi-aride du nordest, qui est connue comme “l´economie sans production”. Il a pour reference le livre “Vidas secas em
novos sertões” de Gustavo Maia Gomes (1997). Dans le travail de Gomes, on définissait “l´economie
sans production” comme celle constituée par les salaries des retraités et des fonctionnaires publics.
Mais ensuite, on a crée le programme “bolsa família”, et les valeurs payées pour les familles ont
eté prises em consideration comme un facteur qui constitue l´economie sans production. Ces
trois sources sont les plus importantes du nord-est, plus importantes que l´agriculture et l´élevage.
Alors, on a trouvé le meme resultat final que Gomes dans son travail. Mais nous constatons que
il y a eu une croissance considerable des tranferts en relation à d´autres indicateurs, comme la
masse salarial total, transfert par habitant, emploi public en relation a l´emploi formel total parmi
d´autres indicateurs economiques ou sociaux, entre 1997 et 2005.L´economie sans production a
pratiquement doublé par rapport à la premiere estimacion faite il y a dix ans.
Mots-clés: Économie sans Production; Semi-aride du Nord-est du Brésil; Programme Bourse Famille.
1 INTRODUÇÃO
O semiárido nordestino é uma região que ao longo do século XX não conseguiu
deixar de ser uma zona com baixa renda e diversos problemas sociais e econômicos, recebendo investimentos muitas vezes de caráter pouco produtivo e emergencial nas frentes de trabalho toda vez que ocorria uma grande estiagem. Mesmo
com a criação da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene),
os investimentos ficaram mais concentrados na região litorânea. Consequência da
maior atenção dada à criação de indústrias, em que as grandes regiões metropolitanas da região Nordeste foram grandes beneficiadas.
Transferências de Renda e Empregos Públicos....
47
Durante a década de 1980, houve um aumento significativo de transferências de
renda direta para a região, com o aumento na criação de municípios e, consequentemente, o aumento do emprego público e a regulamentação das aposentadorias rurais
estabelecidas pela Constituição Federal de 1988. Estas transferências tiveram novo
aumento no fim dos anos 1990 com a criação de programas de transferências de renda
direta que hoje estão agrupados no que chamamos de Programa Bolsa Família (PBF).
A região semiárida recebe quantia significativa em forma de transferências de renda direta se comparada com o tamanho do seu produto interno
bruto (PIB); porém, ainda é a região com os piores indicadores sociais do país
e economia atrasada, exceto por alguns polos de desenvolvimento isolados.
Boa parte do dinheiro arrecadado com os tributos do país destina-se exatamente para uma destas vias de renda: o salário dos funcionários públicos, as
aposentadorias e os benefícios pagos pelo Programa Bolsa Família.
Esses meios de aplicação da verba não são exclusivos do Nordeste, ou seja,
as transferências intergovernamentais, o emprego público, as aposentadorias e o
Bolsa Família abrangem todo o país; então por que estudar seu tamanho na região
do semiárido? Porque, em razão da natureza econômica e social da região, essas
fontes de renda assumem tamanho considerável se comparadas com o restante do
PIB do semiárido, fazendo que sejam a maior fonte de renda da economia local, e
como estas não têm, ou têm muito pouca, contrapartida produtiva, pode-se dizer
que são os principais agentes constitutivos da economia sem produção.
E o que seria economia sem produção? Renda e produto têm uma relação
estreita; definidos de maneira correta, são idênticos. Porém, na prática, estes não
apenas podem diferir como frequentemente o fazem em determinados espaços
geográficos, como no exemplo histórico da Espanha colonial, quando lá havia
muita renda, por causa do ouro trazido da América e da pouca produção.
No caso do semiárido, existe pouca renda e quase nenhuma produção, pois
a região recebe quantidade significativa de recursos, sem contrapartidas produtivas
significantes, por intermédio dos meios já citados. Ou seja, continua a receber mais
recursos de caráter não produtivo, ou pouco produtivo, do que de outro tipo. Porém,
continua tendo péssimos indicadores sociais, apesar de alguns recentes avanços.
Tais transferências não sustentam pessoas com padrões de vida elevados. Porém,
provavelmente, não é a melhor escolha para promover-se um desenvolvimento econômico e sustentável da região. Como mostram-nos casos do polo de fruticultura do
São Francisco, do polo de calçados de Sobral, entre outros poucos exemplos, que estão
incrustados no meio do sertão, em que incentivos fiscais e investimentos em infraestrutura geraram polos econômicos modernos e dinâmicos. Assim, parece mais vantajoso
para o semiárido receber mais incentivos à produção do que transferências de renda
que têm pouca capacidade de gerar desdobramentos sustentáveis de renda e emprego.
48
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
Enfim, o desafio deste trabalho será mensurar qual a proporção dessas transferências em relação ao produto econômico da região, procurando atualizar os dados já
encontrados por Gustavo Maia Gomes (2001) no livro Velhas secas em novos sertões, a
grande inspiração para este trabalho que será frequentemente citado no seu decorrer.
Vale notar que, além da atualização, faz-se também a inclusão do Programa Bolsa
Família, que não estava presente, por então não existir no trabalho de Gomes.
Este trabalho esta dividido em cinco seções, a seção um é esta introdução;
em seguida, na seção dois, será realizada uma breve recuperação de visões teóricas
sobre estratégias de desenvolvimento regional. Na seção três, será apresentada a
região semiárida com breve contexto histórico e a situação em relação aos diversos
índices econômicos, geográficos e sociais para o ano de 2005. Na seção quatro, será
analisada os quatro agentes constituintes da economia sem produção, o Programa
Bolsa Família, os aposentados, as transferências intergovernamentais e o emprego
público. Na seção cinco, serão efetuadas as conclusões. No anexo deste trabalho,
encontra-se uma descrição dos dados utilizados e de suas respectivas fontes.
2 ESTRATÉGIAS DE DESENVOLVIMENTO REGIONAL: BREVES CONSIDERAÇÕES
Na literatura econômica, encontra-se, de forma relativamente bem sedimentada, a discussão sobre estratégias de desenvolvimento regional a partir da
utilização de políticas regionais. As ideias básicas que justificam a adoção de
tais políticas encontram-se nos trabalhos de autores como G. Myrdal, F. Perroux e A. Hirschmam, entre vários outros. Emana daí princípios conhecidos
como os de causação circular, polos de desenvolvimento, efeitos de encadeamento etc. De tais estudos e proposições derivou-se a ideia de que a industrialização teria um papel importante a desempenhar no processo de expansão econômica pelos seus efeitos dinâmicos sobre a estrutura produtiva. Daí
a importância atribuída às políticas voltadas ao fomento da industrialização,
notadamente a partir dos anos 1950. Segundo Uderman (2008, p. 235).
As proposições de Perroux (1977); Myrdal (1960) e Hirschman (1958), evidenciando
a relevância da complementaridade dos projetos instalados, apóiam-se na compreensão
da importância dos requisitos de escala para o êxito dos projetos industrializantes. O
argumento em defesa da incisiva ação pública dirigida para o desenvolvimento regional,
por sua vez, parte da crença na necessidade de um impulso desenvolvimentista inicial.
De forma articulada com essas visões teóricas e proposições, alinha-se a concepção desenvolvimentista que busca a superação do subdesenvolvimento por
meio da industrialização capitalista coordenada pelo planejamento estatal. Isto
porque seria difícil atingir um nível eficiente de industrialização espontaneamente, por meio das forças do mercado, em vista das limitações das bases técnicas e
financeiras das regiões e dos países menos desenvolvidos.
Transferências de Renda e Empregos Públicos....
49
Nos anos mais recentes, em uma conjuntura em que a intervenção estatal
perde força em favor do mercado, ganha relevância a formulação de políticas de
competitividade, em que o Estado passa a combinar novos papéis e estratégias,
incluindo a regulação, que facilitem o desenvolvimento industrial. Neste sentido,
o ambiente econômico e a melhoria de suas condições tornam-se variáveis importantes para favorecer o investimento.
Os elevados índices de desemprego, a crescente concentração de renda e os resultados pífios alcançados em termos de crescimento econômico indicam a necessidade
de avançar na formulação de estratégias de desenvolvimento integradas, em que o
Estado desempenha um papel de grande relevância (UDERMAN, 2008, p. 242).
Com isso, as políticas estatais assumem caráter mais abrangente, superando
a ênfase no apoio à atração de investimentos industriais, em que o conceito de
capital social é difundido.
Essa nova forma de entender as políticas de desenvolvimento regional, no
entanto, não negligenciam a importância do estímulo ao investimento produtivo
público e privado, seja em novos empreendimentos, seja em infraestrutura. Na
verdade, incorpora esta preocupação com o apoio à formação de capital humano
por meio da constituição de mão de obra e da melhoria das condições sanitárias
e do desenvolvimento de “(...) instituições locais (normas formais e informais
que regulam o ambiente de negócios local) que conduzem a um ambiente mais
favorável ao empreendedorismo, pesquisa e inovação” (ALMEIDA, 2009).
Em meio a esse entendimento com relação às políticas de desenvolvimento regional, que priorizam a busca de uma melhor distribuição da produção no
espaço, há autores que argumentam que o Estado deve buscar a igualdade de
oportunidades para as pessoas e, com isto, a chamada questão regional deveria
mudar de foco. Nesta linha de entendimento, as políticas deveriam priorizar
uma melhoria no nível educacional das regiões mais carentes, em vez de atuar
com subsídios ao investimento produtivo para favorecer a distribuição regional
da produção. Argumenta-se que uma maior equidade, a longo prazo, favorece
um maior nível de crescimento econômico, conforme pode ser visto, por exemplo, no World Development Report 2006: equity and development.
Tendo em conta os argumentos anteriores e entendendo como mais
apropriada à linha teórica que defende a adoção de políticas regionais, este
trabalho vai discutir a chamada economia sem produção no semiárido nordestino, em que as transferências de renda e o emprego público assumem
elevada importância, tentando mostrar que tal estratégia é menos sustentável
do que outra que combine de melhor forma e preponderantemente a estruturação de atividades produtivas, incluindo a promoção de inovações com
programas assistencialistas.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
50
3 O SEMIÁRIDO
Desde as primeiras incursões portuguesas pelo interior do Nordeste já se percebia
a dureza do clima da região, já que o nome sertão deriva do apelido desertão que
os primeiros colonos deram ao semiárido. A primeira atividade econômica da
região foi a pecuária, que era subsidiária da atividade produtora de açúcar que
ficava no litoral, produzindo alimentos para esta última.
A pecuária era de caráter predominantemente extensivo, não havia necessidade de grandes contingentes de força de trabalho. Não havia, nesta atividade, a
prática disseminada do assalariamento, recebendo o vaqueiro uma parte da produção da fazenda. O longo período de atrofiamento pelo qual passou a economia
nordestina, do fim do século XVII e começo do século XIX, teve como resultado
o afrouxamento do efeito dinâmico externo sobre a pecuária, o que a levou a apoiarse cada vez mais no setor de subsistência.
Na segunda metade do século XVIII, houve mudanças profundas na economia semiárida com o início da produção do algodão. O cultivo deste transformou as relações sociais da região, levando a certo dinamismo e monetarização da
economia. Porém, o auge das exportações foi muito curto, assim que terminou a
guerra da secessão americana, a produção do Sul dos Estados Unidos reapareceu
no mercado externo, diminuindo consideravelmente o espaço do algodão nordestino, ficando este mais restrito ao mercado interno. A partir daí, a cultura do
algodão continuou importante para o semiárido, mas não era pujante o suficiente
para desenvolver toda a região.
Até meados do século XX, não houve grandes transformações na economia
da região semiárida, apesar de que, em alguns estados como o Rio Grande do
Norte (RN), a mineração tenha se tornado uma atividade importante. Tanto que
Celso Furtado descreveu que a economia do semiárido, no relatório do Grupo de
Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste (GTDN), ainda era constituída
por estas três atividades: a pecuária, a produção de alimentos e o algodão.
O que houve foi uma certa estagnação econômica, que em parte pode
ser creditada às adversidades climáticas da região “De acordo com os registros históricos, houve 85 anos de seca nos séculos XVIII, XIX e XX. Isso significa pouco mais de dois anos e meio de inverno normal, para um de seca”
(GOMES, 2001, p. 70).
A cada nova seca, a produção agropecuária, em certo grau, era prejudicada; em algumas secas, chegou a ser praticamente dizimada. Isto agravava a
pobreza e a miséria da região, gerando também fluxos migratórios. O subsídio
governamental à emigração de nordestinos para outras regiões chegou a ser
prática corrente na seca de 1888-1889. A cada nova seca, eram criadas frentes
Transferências de Renda e Empregos Públicos....
51
de trabalho para obras emergenciais como construções de açudes e reservatórios de água. Porém, na verdade, estas obras eram mais uma ajuda financeira
para que a população, que perdera tudo na seca, tivesse alguma renda que
permitisse pelo menos a compra de alimentos.
Em 1959, foi criada a Sudene, que visava diminuir as diferenças regionais existentes no país. De forma geral, a Sudene alcançou resultados satisfatórios; a economia nordestina cresceu a um ritmo maior do que a economia
brasileira, diminuindo um pouco a diferença entre a média dos produtos per
capita regional e nacional.
Porém, os esforços da Sudene foram concentradores de renda, tanto do
ponto de vista das classes sociais como do ponto de vista espacial. Dando
preferência ao desenvolvimento de indústrias no Nordeste, acabou deixando
um pouco de lado a questão rural, que só teve mais atenção a partir do fim da
década de 1970. Ao priorizar indústrias, principalmente de bens complementares, a Sudene ajudou a tornar as regiões metropolitanas de Fortaleza, Recife
e Salvador, mais ainda, os grandes polos econômicos dos respectivos estados e
com área de influência que atingia outros.
Para o semiárido, os investimentos e incentivos fiscais concentraram-se em
alguns poucos polos de desenvolvimento como o polo de fruticultura irrigada
de Petrolina e de Mossoró-Açu e o polo de calçados de Sobral. Nestas cidades,
desenvolveu-se um setor privado com alta produtividade que em pouco lembra o
setor privado das outras cidades da região.
Ainda na década de 1980, o algodão teve sua participação na economia
bastante reduzida. Foram determinantes para a crise na economia algodoeira a
desorganização provocada pela grande seca de 1979-1983, a ocorrência da praga
do bicudo do algodoeiro e o subsídio à produção de algodão em outros países
como o Egito, em que o setor têxtil do Nordeste passou a importar o produto.
Nessa década, o setor de mineração também passou por problemas em razão das
oscilações dos preços no mercado externo.
Atualmente, a economia do semiárido passa por processo de reorganização
econômica. Novas atividades começam a aparecer no cenário econômico da região como indústrias leves que vão sendo interiorizadas, atividades centradas na
agricultura irrigada, exploradas nas regiões que tem melhor dotação de recursos e
água. Porém, as atividades tradicionais de baixa eficiência e produtividade ainda
predominam na região como um todo. No mapa 1, temos a nova delimitação
da região semiárida, determinada pelo Ministério da Integração Nacional (MI).
Como este trabalho analisa o semiárido nordestino, os municípios de Minas
Gerais (MG) serão excluídos.
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52
MAPA 1
Mapa da região semiárida
Fonte: Brasil (2007a).
Nas tabelas 1 e 2, estão alguns dados geográficos, populacionais e econômicos sobre a região semiárida em relação ao Nordeste, para 2005, por estados.
TABELA 1
Indicadores demográficos e geográficos do Nordeste e de sua região semiárida –
unidades de Federação (UFs) do Nordeste, região Nordeste, 2005
População (1.000)
UF
Total
RSA
2
Número de municípios
Estado
(%)
Total
RSA
Área (km²)
Estado
(%)
2
Total
RSA2
Estado
(%)
AL
3.016
885
29,3
101
38
37,6
27.819
12.687
45,6
BA
13.815
6.686
48,4
415
265
63,9
564.273
393.056
69,7
56
184
81,5
145.712
126.515
CE
8.097
4.538
MA1
6.103
–
PB
3.596
2.012
223
–
56
223
150
–
–
170
76,2
331.983
56.341
–
48.758
86,8
–
86,5
(Continua)
Transferências de Renda e Empregos Públicos....
53
(Continuação)
População (1.000)
UF
Total
Número de municípios
Estado
(%)
RSA2
Total
Área (km²)
Estado
(%)
RSA2
Total
RSA2
Estado
(%)
PE
8.414
3.423
40,7
185
122
65,9
98.527
86.710
88
PI
3.007
1.008
33,5
221
127
57,5
251.312
150.454
59,9
RN
3.003
1.681
56
166
147
88,6
53.077
49.590
93,4
SE
1.968
430
21,8
75
29
38,7
21.962
11.176
50,9
51.019
20.662
40,5
1.793
1048
58,4 1.551.006
878.946
56,7
NE
Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Elaboração dos autores.
Notas: 1 O Maranhão (MA) não apresenta nenhum município na região semiárida.
2
Região semiárida (RSA).
TABELA 2
Indicadores econômicos do Nordeste e de sua região semiárida – unidades federativas
do Nordeste, região Nordeste, 2005
PIB per capita (R$)
PIB (milhões)
UF
Estado
RSA2
Estado
(%)
Estado
RSA2
Estado
(%)
AL
14.135
2.897
20,5
4.686,69
3.275,19
69,9
BA
90.943
23.888
26,3
6.582,76
3.572,97
54,3
CE
40.923
15.351
37,5
5.053,98
3.382,97
66,9
MA1
25.326
–
–
4.149,52
–
–
PB
16.864
6.777
40,2
4.689,86
3.368,29
71,8
PE
49.904
12.234
24,5
5.931,33
3.573,68
60,3
PI
11.125
2.593
23,3
3.699,81
2.572,98
69,5
RN
17.862
7.716
43,2
5.947,97
4.590,36
77,2
SE
13.422
2.496
18,6
6.820,93
5.808,03
85,2
NE
280.504
73.954
26,4
5.498,03
3.579,17
65,1
Fonte: IBGE.
Elaboração dos autores.
Notas: 1 MA não apresenta nenhum município na região semiárida.
2
Região semiárida (RSA).
Pela tabela 1, a população na região semiárida corresponde a 40% da população total, 58,4% dos municípios do Nordeste estão na região semiárida, e isto corresponde a 56,7% de toda a área da região. Os estados do Ceará (CE), RN, Paraíba
(PB) e Pernambuco (PE) têm mais de 80% do seu território na região semiárida.
Na tabela 2, temos os valores do PIB e do PIB per capita da região Nordeste e
do seu semiárido. Podemos ver que no caso do Rio Grande do Norte, por exemplo,
43,2% das riquezas geradas pelo estado ficam na região semiárida. O que sugere forte
concentração espacial do PIB, já que os outros 56,8% da produção ficam em uma
área que corresponde a apenas 6,6% do território Potiguar. O Rio Grande do Norte
é o exemplo mais claro desta desigualdade, mas está presente, em maior ou menor
grau, para todos os outros estados da região que possuem municípios no semiárido.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
54
Na tabela 3, temos o Nordeste (NE) não mais dividido em estados, mas nas
regiões semiárida e fora do semiárido, além dos valores para toda a região Nordeste e o Brasil. Esta será a divisão de regiões predominante neste trabalho.
TABELA 3
Indicadores geográficos e populacionais – Nordeste semiárido, Nordeste fora do
semiárido, Nordeste e Brasil, 2005
Região
População (1.000)
Número de municípios
Área (km²)
Densidade demográfica
(hab/km²)
NE semiárido
20.662
1.048
878.973,3
23,51
NE fora do semiárido
30.357
745
672.032,7
45,17
Nordeste
51.019
1.793
1.551.006,0
32,89
184.184
5.564
8.514.676,5
21,63
Brasil
Fonte: IBGE.
Elaboração dos autores.
Na tabela 3, podemos observar que a densidade demográfica da região fora
do semiárido é maior do que a da região semiárida e do Brasil, o que nos mostra
que há uma concentração populacional elevada na pequena faixa territorial que
fica localizada próxima ao litoral.
A densidade demográfica da região fora do semiárido, dos estados que possuem
municípios no semiárido, ou seja, excluindo o Maranhão do cálculo, seria de 89,27
hab/km². Quase quatro vezes maior que a densidade demográfica do semiárido e do
Brasil. Ou seja, nestes estados, fica clara a forte concentração da população na pequena parte do território livre das condições climáticas adversas do semiárido nordestino.
Na tabela 4, temos o PIB e o PIB per capita das quatro regiões, o PIB do Nordeste
corresponde a 13% do Brasil e a região é responsável por 28% da população do país.
O produto do semiárido corresponde a 3% do PIB nacional e a região é responsável
por 11% da população total do país. Podemos, assim, ver a desigualdade regional da
região Nordeste em relação ao Brasil e da região semiárida em relação ao Nordeste.
Na tabela 5, vemos o PIB, em valores absolutos, desagregado pelo valor adicionado do setor agrícola, valor adicionado do setor industrial, valor adicionado do setor
de serviços, em que está incluído o valor adicionado da administração pública, e valor
adicionado dos impostos sobre produtos líquidos de subsídios, para o ano de 2005.
TABELA 4
PIBs – Nordeste semiárido, Nordeste fora do semiárido, Nordeste e Brasil, 2005
Valor total
Brasil (%)
Valor total
Brasil (%)
73.954
3,44
3.579,17
30,70
206.551
9,62
6.804,08
58,36
280.504
13,06
5.498,03
47,16
2.147.239
100
11.658,10
100
NE semiárido
NE fora do semiárido
Nordeste
Brasil
PIB per capita (R$ milhões)
PIB (R$ milhões)
Região
Fonte: IBGE.
Elaboração dos autores.
Transferências de Renda e Empregos Públicos....
55
TABELA 5
Valor adicionado do PIB – Nordeste semiárido, Nordeste fora do semiárido, Nordeste e Brasil, 2005
Região
NE semiárido
NE fora do
semiárido
Nordeste
Brasil
Valor adicionado (R$ milhões)
PIB (R$ milhões)
Agrícola
Industrial
Serviços
Impostos
8.342
14.851
44.977
5.784
73.954
11.545
48.727
117.302
28.976
206.551
19.888
63.578
162.278
34.761
280.504
105.163
539.316
1.197.774
304.986
2.147.239
Fonte: IBGE.
Elaboração dos autores.
Na tabela 6, temos o valor adicionado dos setores como porcentagem
do PIB. O que se pode ver nesta tabela é que o setor de serviços, em que está
incluído o valor adicionado da administração pública, é um pouco maior para
o semiárido do que para as outras regiões. E que o setor agrícola corresponde a
pouco mais de 10% do PIB da região, o que fica significativamente acima dos
valores adicionados pelo setor agrícola das outras regiões. Isto mostra a importância do setor para a formação do PIB da região semiárida.
TABELA 6
Valor adicionado dos setores como porcentagem do PIB – Nordeste semiárido,
Nordeste fora do semiárido, Nordeste e Brasil, 2005
Região
NE semiárido
Agrícola (%)
Industrial (%)
Serviços (%)
Impostos (%)
11,28
20,08
60,82
7,82
NE fora do semiárido
5,59
23,59
56,79
14,03
Nordeste
7,09
22,67
57,85
12,39
Brasil
4,9
25,12
55,78
14,2
Fonte: IBGE.
Elaboração dos autores.
E, na tabela 7, temos o valor total da administração pública como porcentagem do setor de serviços e porcentagem do PIB. A administração pública
é responsável por quase metade do valor adicionado pelo setor de serviços, um
valor bem maior que o das outras regiões. Podemos ver que a participação no PIB
do valor adicionado do setor público da região é bem maior se comparada com o
restante do Nordeste e o Brasil.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
56
TABELA 7
Valor adicionado da administração em relação ao valor adicionado dos setores de
serviços e em relação ao PIB – Nordeste semiárido, Nordeste fora do semiárido,
Nordeste e Brasil, 2005
Valor adicionado da administração pública
Região
Valor total
Como porcentagem do setor
de serviços
Como porcentagem do PIB
20.912
46,5
NE fora do semiárido
30.277
25,81
14,66
Nordeste
51.189
31,54
18,25
277.196
23,14
12,91
NE semiárido
Brasil
28,28
Fonte: IBGE.
Elaboração dos autores.
Por fim, pelos dados apresentados até aqui, vimos uma desigualdade
regional entre o PIB do Brasil com o do Nordeste e, também, uma desigualdade na região Nordeste, em que 40% da população espalhada em 56,7%
do território da região são responsáveis por apenas 26% do PIB.
Vimos que o setor agrícola ainda mantém sua importância no semiárido,
sendo responsável por 11% do PIB. Isto faz que a economia da região seja mais
vulnerável às condições climáticas do que o Nordeste fora do semiárido, por
exemplo. E uma seca de grandes proporções ainda teria um impacto significativo
no PIB da região.
Também vimos a importância da administração pública na região semiárida. O valor adicionado desta é equivalente a 28% do produto da região, valor
bem mais elevado do que o para o restante do Nordeste e o Brasil. E esta é 45%
do total do valor adicionado do setor de serviços. É também uma relação bem
mais elevada do que o restante do país, o que deixa bem claro a importância da
administração pública para a região. E, como veremos no decorrer deste trabalho,
grande parte deste valor adicionado vem das prefeituras, que são responsáveis por
94% do emprego público da região.
4 A ECONOMIA SEM PRODUÇÃO
Por que economia sem produção? Economia sem produção seria o termo utilizado para caracterizar um aspecto peculiar do semiárido nordestino, o de ter renda,
mas não ter, ou ter pouco, produto.
Guardadas proporções, uma parte da economia do semi-árido é como a da Espanha
dos séculos XVI e XVII (que no apogeu de seu império colonial, vivia em grande
estilo, pilhando o ouro da América); tem muita renda e pouco produto. (Ou talvez,
no caso nordestino, fosse melhor dizer: pouca renda e quase nenhum produto.).
Transferências de Renda e Empregos Públicos....
57
Os três principais agentes constitutivos dessa economia são os aposentados, os funcionários públicos e as prefeituras. Os aposentados com seus benefícios, os funcionários públicos com seus empregos e seus salários e as prefeituras (assim como as
câmaras de vereadores), com seus funcionários permanentes e temporários, com as
empresas locais que lhes prestam serviços ou fornecem mercadorias e com os seus
recursos financeiros, especialmente, a cota do fundo de participação dos municípios
(FPM) (GOMES, 2001, p. 148-149).
No período analisado por Gomes, os programas de transferência de renda
direta eram dispersos e não eram abrangentes como o Bolsa Família, que é a unificação de programas que já existiam. O presente trabalho incluirá o programa
como agente constitutivo da economia sem produção, pois, afinal, seus beneficiários não contribuem produtivamente para receber o benefício.
Este estudo será feito para a região do semiárido por causa das características econômicas e sociais da região que fazem que a economia sem produção
tome proporção muito grande em relação à economia produtiva. O NE tem
uma renda per capita que é pouco menos da metade da renda per capita do
país, mas, por sua vez, a região do semiárido tem uma renda per capita que é
só um pouco maior do que a metade da renda per capita do NE, em uma matemática simples, é praticamente um quarto da renda nacional. Além disso,
40% da população do semiárido vivem na zona rural, contra um índice de
19% da do Brasil como um todo.
Essas duas características fazem que o número de aposentadorias rurais
e de benefícios de transferência de renda direta sejam bastante elevados em
relação à economia formal da região semiárida, que abrange 21 milhões de
pessoas, espalhadas em 1.048 municípios no NE, em uma área de 880 mil km²,
equivalente à área da Venezuela, com um PIB de 73 bilhões e renda per capita
de 3.580 reais em 2005.
4.1 O Programa Bolsa Família
Está escrito na Constituição brasileira: “Assistência social será prestada a quem
dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social” (BRASIL, 1988, caput do Artigo 203). Continuando, “A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante
recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal
e dos Municípios” (BRASIL, 1988, Artigo 205). E, por fim, no Artigo 194, §
primeiro, está garantida a “universalidade da cobertura e do atendimento”.
Os programas de assistência social cobrem todo o país; porém, no Nordeste,
estes têm um peso muito grande na economia em virtude da situação econômica
e social da região.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
58
O Nordeste dispõe de mais de 50% de sua população vivendo abaixo da linha
de pobreza, de acordo com a PNUD (2000); sua renda per capita chega a apenas
pouco mais da metade da média nacional, os índices de analfabetismo, mortalidade
infantil e saneamento básico são os piores do país. Outros indicadores de natureza
econômica ou social poderiam ser citados, pois, em praticamente todos, o Nordeste
detém os piores, se comparados aos de outras regiões ou com a média nacional
(ALENCAR JUNIOR; ALVES, 2006 p. 237).
Isso para a região como um todo. Partindo para a parte mais central, o
semiárido, a situação de pobreza agrava-se. Este ambiente de penúria é exatamente o alvo das políticas sociais. A região que tem mais pessoas pobres será,
obviamente, a mais assistida, a que receberá mais verbas. E o meio mais utilizado
para assistir esta população é o Programa Bolsa Família.
A definição do programa, pelo Ministério do Desenvolvimento Social e
Combate à Fome (MDS) é: “O Bolsa Família (PBF) é um programa de transferência direta de renda com condicionalidades que beneficia famílias pobres (com
renda mensal por pessoa de 60,01 a 120 reais) e extremamente pobres (com renda
mensal pessoal de até 60 reais)” (BRASIL, 2007a).
Como podemos ver na tabela 8, a metade das famílias beneficiadas com
o Programa Bolsa Família é da região Nordeste, e 53% de todo o gasto com o
programa destina-se à região. A região, que possui 27% da população brasileira,
recebe mais da metade de todo o valor destinado ao principal programa de transferência direta de renda do governo federal.
TABELA 8
Número de benefícios e valores do Programa Bolsa Família – Nordeste semiárido,
Nordeste fora do semiárido, Nordeste e Brasil, 2007
Região
NE semiárido
Famílias beneficiadas (R$ 1.000)
Total liberado (R$ 1.000)
2.678
2.551.000
NE fora do semiárido
2.907
2.768.000
Nordeste
5.587
5.319.000
11.043
9.984.000
Brasil
Fonte: Brasil (2007b).
Elaboração dos autores.
Se multiplicarmos o número de famílias pelo número médio de pessoas por
família dado pelo IBGE, que é de 3,6 para a região Nordeste, teremos 20 milhões
de pessoas sendo beneficiadas em um universo de 50 milhões, ou seja, 40% da
população nordestina recebem o benefício.
Para a região do semiárido, com este cálculo, teríamos um número de cerca
de 10 milhões de pessoas beneficiadas, que já daria 50% de toda a população,
Transferências de Renda e Empregos Públicos....
59
mas este número tende a ser subestimado, pois não seria uma hipótese absurda
acreditar que lá as famílias são maiores do que as da região litorânea e que estas
últimas puxam a média regional de pessoas por família para baixo.
Porém, como o valor máximo do benefício é de R$ 120,00 por família, o benefício per capita é baixo. Pelos valores da tabela 8, o benefício médio por família no
Nordeste seria de aproximadamente R$ 950,00 por ano, o que dá R$ 263,00 por
pessoa, considerando o número médio de pessoas por família já apresentado. Isto dá
algo em torno de R$ 22,00 por mês por cada pessoa da família.
Ou seja, a renda do Programa Bolsa Família garante alguma segurança
alimentar para seus beneficiários, mas não faz ninguém ascender socialmente.
Não promove grandes transformações na estrutura social da região, sendo seu
benefício mais provavelmente uma complementação da renda dos trabalhadores
informais da região.
4.2 Os aposentados
Falar em aposentados como agentes constitutivos da economia sem produção
pode soar estranho aos economistas. Afinal, a definição macroeconômica
de aposentadoria seria o período que o indivíduo que parou de trabalhar
passa a gastar o que poupou durante sua vida produtiva. Portanto, falar de
aposentadoria como um todo como agente formador de uma economia sem
produção seria um equívoco. Afinal, não é um assistencialismo, pois existe a
contrapartida dos beneficiários.
Porém, no Brasil, a partir dos anos 1980, com ênfase na Constituição
Federal de 1988, houve uma série de transformações na área da Previdência
Social. Como cita Gomes:
Para o Nordeste, e ainda mais para o Nordeste da seca, o aspecto mais importante
dessas transformações ocorreu na esfera das aposentadorias rurais. Isso, por duas
razões. Uma, aritmética; como a participação da população rural do nordeste na
população rural do Brasil muito maior do que a relação entre as populações totais
do Nordeste e do Brasil, a expansão acelerada das aposentadorias rurais, que se
verificou entre 1991 e 1994 teria de ter um impacto especialmente significativo no
Nordeste e com ainda maior força, no semi-árido.
A segunda razão porque a expansão das aposentadorias rurais teve importância especial
para o Nordeste é que, tendo a sua concessão sido feita sem levar em conta a exigência
de uma contribuição anterior, os inativos que haviam sido sempre trabalhadores do
setor informal (muito mais comuns no Nordeste, sobretudo no sertão, do que em todo
o país) terminariam sendo os grandes beneficiados, outra vez com reflexos desproporcionalmente altos no Nordeste e ainda mais no semi-árido (GOMES, 2001 p. 159).
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
60
Além das aposentadorias rurais, também foi criada a Lei Orgânica de Assistência Social (Loas), que concede benefícios a idosos e portadores de deficiência,
que não tenham contribuído para a Previdência Social. Somando isto às aposentadorias rurais, que tiveram seu acesso facilitado pela Constituição Federal de
1988, houve um crescimento significativo dos aposentados pela população da
região no início dos anos 1990, na região semiárida.
Em razão disso, a maioria dos aposentados da região provavelmente nunca
contribuiu para a Previdência Social, o que caracteriza uma transferência de renda
sem contrapartidas e, por isto, contabilizada na economia sem produção. Como
a informalidade é característica da região, é bem provável que as aposentadorias
constituam um sistema de transferência de renda de outras regiões do país para a
região do semiárido.
Na tabela 9, temos a comparação dos dados de 2005 com os números encontrados por Gomes em sua obra, mas antes a comparação merece a ressalva de
que ele considerou o Nordeste da seca, os 1.122 municípios que foram diagnosticados como em situação crítica na seca de 1998 pela Sudene, e este trabalho
considera o semiárido como os 1.048 municípios assim definidos pelo Ministério
da Integração Nacional, a comparação é valida porque todos, ou quase todos, os
1.048 municípios estão nos 1.122 municípios.
TABELA 9
Quantidade de benefícios concedidos em milhares – Nordeste semiárido, Nordeste
fora do semiárido, Nordeste e Brasil, 1997 e 2005
1997
Como porcentagem da população
2005
Como porcentagem da população
Variação absoluta
(%)
NE semiárido
2.205
11,64
3.057
14,80
38
NE fora do
semiárido
2.210
8,37
3.391
11,17
53
Nordeste
4.415
9,74
6.448
12,64
46
16.107
10,09
23.951
13,00
48
Região
Brasil
Fontes: Para 1997, Gomes (2001); para 2005, Brasil (2007c).
Elaboração dos autores.
Podemos ver que a região que apresentou o menor crescimento do número
de aposentados foi o semiárido e o crescimento do NE ficou abaixo do da média
nacional. O destaque vai para o NE fora da seca, que teve crescimento acima da
média nacional, aumentando a diferença que antes era de 5 mil para mais de 300
mil beneficiados em relação ao semiárido.
Se analisarmos o número de beneficiados em relação aos empregados
do setor formal, na tabela 10, vemos que os índices para o semiárido diminuíram um pouco, indo contra a tendência nacional; porém, para o resto
Transferências de Renda e Empregos Públicos....
61
da região, a situação praticamente não mudou. Para o semiárido, isto quer
dizer que há mais empregados formais em relação aos aposentados em 2005
do que havia em 1997, mas a relação, apesar da queda, ainda é muito alta,
de 2,26 aposentados para cada trabalhador no semiárido e de praticamente
um para um no Nordeste como um todo.
Aqui cabe outra ressalva, pois tem de se levar em conta o fato de que
o semiárido tem uma forte presença do trabalho informal, de comerciantes
e agricultores, que não tem carteira assinada e, portanto, não são contabilizados nos dados da Relação Anual de Informações Sociais (Rais), em que
foram extraídos estes números. Apesar de impreciso, a Rais é o único banco
de dados que apresenta informações para o ano de 2005 e desagregadas por
municípios, o que possibilita a separação entre semiárido nordestino e Nordeste fora do semiárido.
TABELA 10
Relação aposentados/trabalhadores formais – Nordeste semiárido, Nordeste fora do
semiárido, Nordeste e Brasil
1997
2005
NE semiárido
Região
2,52
2,26
NE fora do semiárido
0,73
0,75
Nordeste
1,13
1,10
Brasil
0,67
0,72
Fontes: Para 1997, Gomes (2001); para 2005, Brasil (2007c); Brasil (2009).
Elaboração dos autores.
Em termos monetários, os valores deram um salto considerável. Na tabela 11,
vemos os valores de 1997 e 2005, sendo os valores de 1997 corrigidos pela
inflação do período.
TABELA 11
Valores totais dos benefícios e variação no período – Nordeste semiárido, Nordeste
fora do semiárido, Nordeste e Brasil
Região
Valor dos benefícios de 1997
corrigidos para 2005
(R$ milhões)
Valor dos benefícios de 2005
(R$ milhões)
Variação (%)
NE semiárido
7.388
11.980
62
NE fora do semiárido
9.437
16.828
78
Nordeste
Brasil
16.826
28.809
71
80.685
142.439
77
Fontes: Para valores de 1997, Gomes (2001); para valores de 2005, Brasil (2007c); para a inflação de 1997-2005, IBGE e Índice
Nacional de Preços ao Consumidor (INPC).
Elaboração dos autores.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
62
O valor gasto com os benefícios aumentou consideravelmente em todas
as regiões; porém, no Nordeste, o crescimento ficou abaixo da média nacional.
Tal valor mais baixo foi puxado pelo semiárido que cresceu apenas 62%, enquanto a região fora da seca cresceu 78%, mais do que a média nacional. Pelas
tabelas 11 e 12, podemos ver que na região fora do semiárido aumentou tanto o
número de aposentados como o valor transferido, em relação ao semiárido. Portanto, nestes aspectos, a diferença entre as regiões aumentou. Em 1997, tanto
o número de aposentados como o valor dos benefícios pagos eram semelhantes
para as duas regiões.
Quando esses valores são confrontados com a massa salarial formal das regiões analisadas, podemos ver que há diminuição significativa nesta relação para a
região do semiárido. Para as outras regiões, o quadro permanece quase o mesmo
de 1997, exceto por uma suave diminuição na região Nordeste, ocasionada pela
queda do índice do semiárido. Porém, como o peso da massa salarial formal da
região não é tão significante como o da região litorânea, esta queda gera apenas
uma pequena variação negativa no índice da região como um todo. Como podemos ver na tabela 12.
TABELA 12
Relação entre valor dos benefícios e massa salarial formal privada – Nordeste semiárido, Nordeste fora do semiárido, Nordeste e Brasil, 2005
Valor dos benefícios
(R$ milhões)
Massa salarial formal
privada (R$ milhões)
Como porcentagem da
massa salarial formal
em 1997
Como porcentagem da
massa salarial formal
privada
NE semiárido
11.980
10.939
132,8
109,5
NE fora do semiárido
16.828
59.039
28,7
28,5
Nordeste
28.809
69.988
43,8
41,1
142.439
575.248
23,6
24,7
Região
Brasil
Fontes: Para valores dos benefícios em 2005, Brasil (2007c); para massa salarial formal privada de 2005, Brasil (2009).
Elaboração dos autores.
Esse resultado leva-nos a crer que a economia sem produção diminuiu sua
dimensão no semiárido, já que o principal pilar desta era o dinheiro dos aposentados. Entretanto, em 1997, ainda não havia o Bolsa Família, que, de certo
modo, compensou tais índices menores para a região semiárida, de modo que,
provavelmente, o valor dos benefícios dos aposentados somado aos benefícios
do Programa Bolsa Família fazem que os índices de hoje sejam praticamente os
mesmos de dez anos atrás; infelizmente, ainda não é possível afirmar isto com
precisão, pois, afinal, os dados estatísticos de 2007 para a Previdência Social e a
massa salarial não estão disponíveis.
Transferências de Renda e Empregos Públicos....
63
E usar os dados de 2005 do Programa Bolsa Família talvez também
não fosse uma boa escolha para fazer-se uma comparação, pois em 2005 o
programa ainda estava longe de alcançar todos os seus possíveis beneficiários.
Hoje, é improvável que o número de famílias beneficiadas aumente significativamente, entre 2005 e 2007 praticamente dobrou; afinal, agora já são mais
de 40 milhões de beneficiados.
Portanto, fazendo o exercício de trazer para preços de 2007 os valores
gastos com os aposentados e a massa salarial formal privada – desconsiderando, assim, qualquer alteração nas posições relativas dos municípios, no
que diz respeito a estas duas variáveis nesses últimos dois anos – e, então,
relacionando-os com os benefícios do Programa Bolsa Família em 2007,
temos a tabela 13.
Isso nos mostra que os índices são praticamente os mesmos de 1997. Aliás,
até aumentaram um pouco para o Nordeste e o país, exceto para o semiárido;
porém, para esta região, a variação foi tão pequena que poderia estar em uma
margem de erro, ocasionada pelas definições diferentes de região semiárida do
Ministério da Integração Nacional e o Nordeste da seca da Sudene.
O que podemos deduzir é que as transferências de renda direta, sem contrapartidas, cresceram sobre a atividade produtiva nesses últimos anos em todo
o país. Na região semiárida, as transferências tomam proporção bem maior se
comparadas às outras regiões analisadas. Isto por causa da informalidade da região, do baixo produto local e da estrutura social. Assim, no Brasil, 19% das
aposentadorias são rurais e no semiárido, 64%, reflexo da maior proporção da
população rural sobre a total na região.
TABELA 13
Valor dos benefícios totais em relação ao setor privado em milhões – Nordeste
semiárido, Nordeste fora do semiárido, Nordeste e Brasil, 1997 e 2005
Valor Bolsa
Família 2007
Valor das
aposentadorias
à preços de 2007
Soma total
Como porcentagem
da massa salarial
formal em 1997
Como porcentagem
da massa salarial
formal de 2005 à
preços de 2007
NE semiárido
2.551
12.952
15.503
132,8
131,08
NE fora do
semiárido
2.768
18.193
20.961
28,7
32,8
Nordeste
5.319
31.146
36.465
43,8
48,1
9.984
153.996
163.980
23,6
26,3
Região
Brasil
Fontes: Para valores do Bolsa Família, Brasil (2007b); para valores dos benefícios dos aposentados, Brasil (2007c); para massa
salarial formal, Brasil (2009); para os dados de 1997, Gomes (2001); para a inflação de 2006 e 2007, IBGE e INPC.
Elaboração dos autores.
64
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
4.3 Transferências intergovernamentais
A partir de meados da década de 1980 e, mais ainda, da Constituição Federal de
1988, houve grande crescimento no número de municípios no país. Este fenômeno também repetiu-se no Nordeste, ainda que a uma taxa inferior ao resto do país,
e a maior parte dos municípios criados era de pequeno porte, o que acarreta maiores dificuldades de arrecadação de receita própria. Esta febre de criação de municípios acabou em meados da década de 1990, quando se dificultou a criação destes.
Isto quer dizer que o número de municípios hoje e para o ano de referência deste
trabalho, 2005, é praticamente o mesmo de 1997, época do trabalho de Gomes.
Gomes identificou que os principais efeitos desse fenômeno, a criação de
municípios, foram o aumento do emprego público e o aumento da dependência dos municípios das transferências de recursos fiscais do Estado e da União.
Os dados de Gomes, que iam de 1989 até 1997, mostravam que este aumento da
dependência era uma tendência em todo o país, mas que o grau de dependência dos
municípios do semiárido era superior ao restante do país e ao restante do Nordeste.
Ao atualizar os dados da tabela 14, vemos que a situação para todas as regiões ficou estabilizada, a receita própria das prefeituras em relação à sua receita
total é de cerca de 10%. Porém, este resultado merece algumas considerações.
Os dados do Tesouro Nacional apresentam falhas, faltam registros de vários
municípios. Em 2005, por exemplo, só havia dados para 4.355 municípios dos
mais de 5.500 que constituem o Brasil. As comparações ano a ano também
ficam comprometidas, porque alguns anos estão mais completos, como 2001,
em que havia 5.339 municípios.
Porém, como não se registrou nenhuma variação realmente significativa,
podemos concluir que estas pequenas variações estariam em uma margem de erro
ocasionadas pela qualidade dos dados disponíveis. E como faltam municípios em
proporção muito parecida para todas as regiões, não há um viés muito grande
que distorça significativamente o resultado de uma região em relação à outra.
Os números para as outras regiões também permaneceram estáveis; porém, no
semiárido é que se constata maior dependência de tais verbas.
Na tabela 15, comparamos as transferências intergovernamentais com outras
variáveis demográficas e absolutas e com os dados encontrados por Gomes para
1996, corrigidos pela inflação do período. Observamos que as transferências praticamente dobraram em todas as regiões, mas para o Nordeste e as duas subrregiões
o aumento relativo foi maior do que para o Brasil. Como a população e o PIB não
cresceram no mesmo ritmo, os outros indicadores também praticamente dobraram. Analisando a tabela, percebe-se que para a região semiárida o aumento foi
bastante significativo, tendo inclusive as transferências por habitante, que em 1996
eram as mais baixas, ultrapassado a média da área litorânea e da região Nordeste.
Transferências de Renda e Empregos Públicos....
65
Também chama atenção as transferências intergovernamentais como porcentagem
do PIB. O dinheiro enviado pela União e pelos estados para os municípios correspondeu a 16,7% do PIB da região semiárida.
TABELA 14
Transferências intergovernamentais para os municípios como porcentagens de sua
receita corrente total – Nordeste semiárido, Nordeste total e Brasil, 1989-2005
Ano
Brasil
Semiárido
Nordeste
1989
86
76,4
61,6
1990
89,8
81
64,1
1991
91,1
77,2
60,3
1993
89,5
79,5
62,8
1995
92,7
83
65,9
1996
92,7
82,1
66,2
1997
92,3
80,3
66,4
1998
93,3
80,9
65,5
1999
93,5
81,3
67,3
2000
92,8
82,7
69,1
2001
93,5
83,7
69,3
2002
90,2
81,5
67,6
2003
90,3
81,8
66,2
2004
90,5
80,5
66,2
2005
91
81,2
67,1
Fontes: Para os dados de 1989-1997, Gomes (2001); para os dados 1998-2005, Brasil (2008).
Elaboração dos autores.
Para a tabela 15, também há o problema dos dados incompletos para o
ano de 2005 do Tesouro Nacional. Como só havia dados para as transferências
de 4.355 municípios, a população e o PIB usados para calcular os índices foi
a destes municípios, e não de todos os 5.564 municípios do país. Como a variação foi muito significativa, podemos dizer que houve de fato um aumento
nos índices; porém, mensurar sua real dimensão só seria possível com os dados
completos do Tesouro Nacional.
A contribuição dessa dependência das transferências intergovernamentais
para a economia sem produção é
Que o aumento do número de municípios provoca o aumento das despesas administrativas, em relação a gastos sociais ou de investimento, fortemente sugere que
a criação de municípios em um ritmo mais rápido do que o de crescimento das receitas fiscais próprias (provocando, portanto, o aumento da dependência financeira
das prefeituras) pode estar se constituindo em um processo socialmente perverso.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
66
No semi-árido, a proliferação de municípios inteiramente dependentes de recursos
vindos de fora tem tido o efeito principal de ampliar os limites da economia sem
produção (GOMES, 2001, p. 189).
TABELA 15
Transferências de receitas fiscais para os municípios – valores absolutos e em relação a outras variáveis demográficas e econômicas – Nordeste semiárido, Nordeste
fora do semiárido, Nordeste e Brasil
Transferências brutas
Indicadores/Área
Regiões
NE semiárido
NE fora do semiárido
Nordeste
Brasil
Valor
(R$ milhões)
Por habitante
(R$ milhões/hab.)
Como porcentagem
do PIB
Como porcentagem da
receita corrente total
das prefeituras
1996
2005
1996
2005
1996
2005
1996
2005
4.616
9.048
252,57
594,75
8,3
16,7
92,7
91
6.081
13.622
276,34
537,30
3,7
8
75,5
75,8
10.697
22.671
265,59
558,84
4,8
10,1
82,1
81,2
52.157
99.853
359,14
640,75
3,2
5,4
66,4
67,1
Fontes: P ara os dados de 1996, Gomes (2001); para os dados sobre população e o PIB, IBGE; para os valores das transferências,
Brasil (2009).
Elaboração dos autores.
Portanto, conclui-se que o legado da criação de municípios nos anos 1980
ainda está bastante forte na região. Os anos que passaram não foram suficientes
para que os municípios aumentassem suas receitas fiscais a ponto de diminuir
de maneira significativa sua dependência das transferências intergovernamentais.
4.4 O emprego público
Por que incluir o emprego público como formador da economia sem produção? Os salários dos funcionários públicos não constituem o pagamento
pela sua produção? Sim. Isto é fato; porém, é difícil mensurar diretamente
o quanto se produz. Uma maneira que se utiliza é somar todos os salários
pagos e considerar isto o produto público. Calculando deste modo, podem
ocorrer discrepâncias significativas entre o que é gasto com o salário e o que
é realmente produzido.
Não se precisa ir a esses extremos para concluir que as estimativas dos produtos
públicos municipais, inclusive do semi-árido, devem ser vistas com extrema cautela. Ainda mais porque, com a proliferação de municípios politicamente úteis,
mas economicamente nulos e fiscalmente inviáveis, e com a tradição local de usar a
expansão do emprego público como política sócio-eleitoral, o tamanho da folha de
salários das prefeituras deve guardar não mais do que uma pálida relação com o volume do produto efetivamente ofertado pelos municípios às respectivas populações.
Em síntese, a única coisa do que se pode estar certo é que a primeira (a folha) é
Transferências de Renda e Empregos Públicos....
67
maior do que o segundo (o produto). Como não se dispõe ainda de metodologia
alternativa para o cálculo direto do produto público municipal, não é possível determinar que percentagem do pagamento dos funcionários constitui a contrapartida
pela geração de um produto e que parcela representa, na verdade, apenas uma transferência de renda, disfarçada em salários. Essa ultima constitui parte da economia
sem produção – e deveria ser contada como tal (GOMES, 2001, p. 150).
TABELA 16
Distribuição do emprego público por setores – Nordeste semiárido, Nordeste fora
do semiárido, Nordeste e Brasil, 2005
Municipal (%)
Estatais (%)
NE semiárido
Região
Federal (%)
1,7
Estadual (%)
1,1
93,8
3,3
NE fora do semiárido
7,1
46,3
39,6
7
Nordeste
5,6
33,7
54,7
6
Brasil
9,1
35,9
46,2
8,7
Fonte: Brasil (2009).
Elaboração dos autores.
Na tabela 16, vemos a porcentagem do emprego público em suas quatro
instâncias, em relação ao emprego público total nas diferentes regiões, para o ano
de 2005. Como podemos ver, o emprego público federal, estadual e estatal é praticamente insignificante na região do semiárido. Enquanto para as outras regiões,
há uma melhor distribuição, apesar de o emprego municipal ser responsável pela
maior parte dos empregos públicos em todo o país.
No período 1997-2005, houve um crescimento bastante significativo do
emprego público. Na tabela 17, podemos ver isto. O emprego público cresceu
bem mais na região Nordeste do que no resto do Brasil. Na região semiárida,
houve crescimento significativo, mas abaixo da média regional, que foi puxada
para cima pelo restante da região Nordeste.
TABELA 17
Quantidade de empregos públicos, valores absolutos – Nordeste semiárido,
Nordeste fora do semiárido, Nordeste e Brasil, 1997 e 2005
Região
Emprego público (1997)
Emprego público
(2005)
Variação (%)
NE semiárido
349.394
610.114
74,6
NE fora do semiárido
889.487
1.585.522
78,2
123.8891
2.195.636
77,2
5.422.002
8.567.916
58
Nordeste
Brasil
Fontes: Para valores de emprego de 1997, Gomes (2001); para valores de 2005, Brasil (2009).
Elaboração dos autores.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
68
Na tabela 18, podemos ver o que já foi comentado anteriormente, que o
aumento das transferências correntes para a região foi seguido de um forte aumento no emprego público, indicando que há uma relação entre as duas variáveis.
Na região fora do semiárido foi onde se apresentou tanto o maior crescimento
das transferências quanto o do emprego público. Há, assim, uma relação sugerida entre as transferências intergovernamentais e o emprego público, e não seria
absurdo acreditar que as prefeituras usaram o aumento das transferências para
inchar a folha salarial.
TABELA 18
Variação das transferências intergovernamentais e do emprego público – Nordeste
semiárido, Nordeste fora do semiárido, Nordeste e Brasil, 1997-2005
Região
Variação das transferências intergovernamentais
(%)
NE semiárido
Variação do emprego público
(%)
96
74,6
NE fora do semiárido
124
78,2
Nordeste
112
77,2
91
58
Brasil
Fontes: P ara valores de 1997, Gomes (2001); para valores das transferências intergovernamentais, Brasil (2008); para variação
do emprego público, Brasil (2009).
Elaboração dos autores.
O crescimento mais elevado das transferências em relação ao crescimento
do emprego público pode ser explicado, em parte, pelo aumento dos salários do
setor. Como podemos ver na tabela 19, o salário médio do funcionário público
aumentou para todas as regiões analisadas, sendo este aumento bem maior para a
região semiárida do que para as outras regiões do país.
TABELA 19
Valor dos salários médios públicos e sua variação – Nordeste semiárido, Nordeste
fora do semiárido, Nordeste e Brasil, 1997-2005
Região
NE semiárido
NE fora do semiárido
Nordeste
Brasil
Valor dos salários 1997 (R$)
Valor dos salários 2005 (R$)
Variação (%)
388,68
602,50
55
1.053,95
1.292,49
22,6
865,94
1.099,68
27
1.332,35
1.530,96
14,9
Fonte: Para os valores de 1997, Gomes (2001); para os valores de 2005, Brasil (2009).
Elaboração dos autores.
Em termos relativos, em 1997, o salário médio da região semiárida era de
36% do salário médio da região litorânea; em 2005, 46%. Isto mostra que as
diferenças de salário diminuíram. Em 1997, o salário público médio da região da
seca era de 45% da média do Nordeste; em 2005, 54%. Em relação ao país é que
Transferências de Renda e Empregos Públicos....
69
o aumento foi mais significativo. Em 1997, o salário público médio do semiárido
era apenas de 29% da média nacional; em 2005, passou a ser de 39%, aumento
bastante significativo. O fenômeno registrou-se para todo o Nordeste; em 1997,
o salário médio público da região era de 64% do salário nacional; em 2005, 74%.
Como os números já mostram, esse fenômeno foi mais forte para o semiárido do que para o restante da região. E já que vimos pela tabela 16 que o emprego
público federal, estadual e de empresas estatais é praticamente insignificante no
semiárido, podemos afirmar que salários municipais tiveram aumentos maiores em
relação aos outros setores do emprego público. Tanto que na região que este reina
absoluto, foi onde se observou os maiores aumentos nos salários públicos médios.
TABELA 20
Relação entre emprego e salários da administração pública e o restante da economia –
Nordeste semiárido, Nordeste fora do semiárido, Nordeste e Brasil, 1997-2005
Emprego público/emprego formal total (%)
Região
NE semiárido
NE fora do semiárido
Nordeste
Brasil
Massa salarial pública/massa salarial formal
total (%)
1997
2005
1997
2005
40
45
29,2
42,5
29,3
35,1
34,1
43,6
31
37,4
33,4
43,4
22,5
25,8
25,3
30,3
Fontes: Para valores de 1997, Gomes (2001); para o emprego público e a massa salarial de 2005, Brasil (2009).
Elaboração dos autores.
E comparando o setor público com o setor privado temos a tabela 20. Podemos ver que houve um crescimento do setor público sobre o setor privado, tanto
em relação ao emprego como em relação à massa salarial. Tal crescimento foi
observado para todas as regiões em questão, para o semiárido quase metade dos
trabalhadores com carteira assinada são funcionários públicos; porém, é preciso
lembrar novamente que a região apresenta maior informalidade do que a região
litorânea e o Brasil como um todo.
A diminuição da distância entre os salários dos funcionários públicos do
semiárido e do restante do Nordeste também fica evidente nesta tabela. Já que,
com aumentos maiores em relação aos funcionários do litoral, a massa salarial
pública em relação à massa salarial total ficou mais próxima da média da região
do que em 1997.
Por fim, podemos concluir que houve um crescimento do emprego público em todo o país. Para o semiárido, 93% do emprego público são formados
por funcionários das prefeituras. Não podemos dizer categoricamente que eles
não produzem nada, mas não é absurdo acreditar que eles não produzam muito.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
70
A diferença entre a folha salarial e o que é efetivamente produzido constitui transferência de renda disfarçada em salários como diz Gomes, e, por isto, deve ser
contada como parte da economia sem produção.
Essa linha de raciocínio de Gomes é um tanto quanto extremada; porém, será
que é equivocada? De 1997 a 2005, os municípios ganharam mais atribuições e
tiveram mesmo que contratar.1 Mas em que medida este cenário mudou? Em que
medida cresceu o emprego produtivo na região? É uma questão muito delicada por
que teríamos que definir qual área do setor público municipal é ou não é produtiva. Para tentar não polemizar, escolhemos os setores que comprovadamente são
extremamente benéficos para a sociedade, que são as áreas de educação e saúde.
Podemos ver na tabela 21 que foram empregados muitos servidores das áreas de
educação e saúde; a incremento médio para o NE, as subrregiões analisadas foram
de 92%, enquanto para o Brasil, nesse período, aumentou 49% o número de servidores ligados a estas áreas. Porém, como o emprego público como um todo também
teve um aumento alto no período, a participação proporcional dos setores de saúde e
educação no setor público teve apenas um pequeno incremento. É curioso observar
que, para o país, proporcionalmente, a participação dos servidores ligados a estas áreas
diminuiu em relação ao emprego público total.
TABELA 21
Relação entre emprego público total e emprego público nos setores de educação e
saúde – Nordeste semiárido, Nordeste fora do semiárido, Nordeste e Brasil, 1997-2005
Emprego público 1997
Região
Emprego público 2005
Saúde + educação/emprego
público total
Total
Educação e
saúde
Total
Educação e
saúde
1997
2005
NE semiárido
349.394
101.516
610.114
195.441
29,05
32,03
NE fora do
semiárido
889.487
251.128
1.585.522
483.734
28,23
30,51
Nordeste
1.238.891
352.644
2.195.636
679.175
28,46
30,93
Brasil
5.422.002
1.601.205
8.567.916
2.387.244
29,53
27,86
Fonte: Brasil (2009).
Elaboração dos autores.
Comparando as tabelas 21 e 22, podemos ver que, nas áreas de educação
e saúde, a maior parte dos novos servidores foi para a área de educação. É difícil
saber em que medida tal aumento foi produtivo ou se apenas acompanhou o
crescimento do emprego como um todo, mantendo o status quo.
1. Em parte, pelo menos, houve nesse período a descentralização do Sistema Único de Saúde (SUS) e a implementação do
Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEF),
que devem ter exigido a contratação de um número maior de funcionários nas áreas de saúde e educação.
Transferências de Renda e Empregos Públicos....
71
TABELA 22
Emprego público no setor de educação – Nordeste semiárido, Nordeste fora do
semiárido, Nordeste e Brasil, 1997-2005
Região
NE semiárido
NE fora do semiárido
Nordeste
Brasil
Educação municipal 1997
Educação municipal 2005
92.914
180.020
89.372
170.741
182.286
350.761
573.068
1.040.806
Fonte: Brasil (2009).
Elaboração dos autores.
O número dos alunos matriculados deve ter aumentado bastante em virtude
dos incentivos que foram criados no período, e o número maior de professores
deve ter a ver com este crescimento. Porém, não se tem notícia de grande mudança
qualitativa no sistema educacional da região e nem no do Brasil. A situação observada em 2005 não deve ser muito diferente da de 1997, com o que se pode manter
o argumento de produto se não nulo, reduzido, gerado por estes funcionários.
E, analisando pelo aspecto isolado dos salários dos funcionários públicos, a
economia sem produção cresceu bastante na região. Tanto o número de empregados, que subiu 74% enquanto a população cresceu aproximadamente 10%, como
o valor dos salários pagos, que cresceu mais do que as remunerações do restante
da região. Assim, é mais fácil acreditar que a diferença entre os salários e o que é
efetivamente produzido tenha aumentado bastante do que acreditar que o exército de novos funcionários tenha aumentado sua produtividade; afinal, a população
atendida por estes servidores cresceu muito pouco, e agora existem 75% funcionários a mais para atender um incremento de 10% na população.
5 CONCLUSÕES
Qual seria o tamanho da economia sem produção no semiárido? Gomes estimoua somando a renda dos aposentados com a massa salarial do setor público, alcançando o valor de R$ 5.021 bilhões para 1998. Uma estimativa grosseira; afinal, os
funcionários públicos devem produzir alguma coisa.
Se repetirmos o processo, chegaremos ao valor de R$ 16.633 bilhões para
2005, um aumento bastante significativo, mas lembrando que, corrigindo R$ 5.021
bilhões pela inflação entre 1997 e 2005, temos algo em torno de R$ 9.3 bilhões.
Mesmo assim, um aumento real de mais de 50%. Porém, ainda não incluímos o
Programa Bolsa Família no cálculo. Ao fazer isto, corrigindo os valores das aposentadorias e dos salários de 2005 para 2007 e somando com o Bolsa Família, o valor total
sobe para R$ 20.5 bilhões.
72
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
Entretanto, a contribuição do Programa Bolsa Família é pequena para a
economia sem produção, cerca de 13%, tendo esta crescido em razão dos seus
agentes constitutivos originais, que cresceram significativamente no período.
O valor gasto com os benefícios dos aposentados, principal agente constituinte da
economia sem produção responsável por 64% do total, teve um crescimento real
de 62%. Já o setor público, em que se aumentou tanto o número de funcionários
quanto o dos salários destes, corresponde a 24% do total.
Se, por um lado, o Programa Bolsa Família é o que menos pesa nos cofres
públicos; por outro, é de longe o mais abrangente para as famílias da região semiárida, já que apresenta 2.6 milhões de famílias beneficiadas, o que significa algo em
torno de 10 milhões de pessoas em 2007. Isto contra 3 milhões de aposentados e
600 mil funcionários públicos.
Considerando essas fontes de rendas como assistencialistas, com as ressalvas já referidas para o caso dos funcionários públicos, o Programa Bolsa
Família é, de longe, o mais eficiente, pois é o mais barato e que atende mais
pessoas. Como o beneficio é muito baixo, não é um desincentivo ao trabalho
ou a ganhos de produtividade. Muitos dos beneficiários são agricultores e complementam sua renda com o programa.
Já os outros dois agentes constitutivos da economia sem produção são concentrados em uma minoria e custam bem mais caro aos cofres públicos do que o
Programa Bolsa Família.
O emprego público e as aposentadorias cresceram em relação ao restante da
economia. O emprego público cresceu tanto em quantidade quanto em salários
pagos, e as aposentadorias tiveram um aumento mais substancial nos salários pagos do que na quantidade de novos aposentados.
As três fontes de renda agrupadas tomam dimensão muito grande em
relação à economia do semiárido, pois R$ 20,5 bilhões é pouco mais de 25%
do PIB total da região e mais que o dobro do PIB agrícola. Se, décadas atrás,
o semiárido só recebia verbas emergenciais e assistencialistas, nas frentes de
trabalho em períodos de seca, esta verba deixou de ser esporádica e passou a
ser contínua e institucionalizada.
E, como já foi dito neste trabalho, para desenvolvimento sustentável de uma
região, investimentos fazem-se necessários. A região semiárida ainda é muito carente de infraestrutura básica como estradas de boa qualidade, o abastecimento de
água também é precário e escolas e universidades de referência regional e nacional
praticamente inexistem, por exemplo. Portanto, R$ 20 bilhões em investimentos,
Transferências de Renda e Empregos Públicos....
73
25% do PIB da região, com certeza, fariam transformações na economia semiárida, ainda que apenas uma parcela de tal montante fosse investida,2 já que não se
poderia abandonar uma população já tão dependente das transferências.
Apenas para se ter um padrão de comparação, vale lembrar que o Fundo
de Desenvolvimento do Nordeste (FDNE), a principal fonte de renda da Sudene para 2008, situou-se no valor de 1,2 bilhão, quatro vezes menos que o
orçamento do Bolsa Família para todo o Nordeste. E não se pode deixar de notar a quase coincidência de datas, pouco tempo depois da Sudene ser extinta,
as transferências de renda diretas foram unificadas e massificadas no Programa
Bolsa Família. Estas verbas chegam hoje a região por meio das transferências
de renda direta, houve uma melhoria de vida da população, isto é inegável.
Porém, uma economia baseada em transferências de renda nunca deixará de
ser uma economia de baixa renda por habitante, nunca levará a um desenvolvimento sustentável e a uma independência econômica.
2. Entenda-se investimento em um sentido abrangente, não apenas físico, incluindo educação, reforço do sistema de
inovação etc.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
74
REFERÊNCIAS
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de uma estratégia de desenvolvimento para o Nordeste. In: BERNAL, M. C. C.
(Org.). A economia do Nordeste na fase contemporânea. Fortaleza: Banco do Nordeste
do Brasil, Universidade Federal do Ceará, 2006.
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Brasília, n. 48, mar. 2009.
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Disponível em: <http://www.integracao.gov.br>. Acesso em: 25 nov. 2007a.
______. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Dados do
Programa Bolsa Família – 2007. Disponível em: <http://www.mds.gov.br>.
Acesso em: 29 nov. 2007b.
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2005. Disponível em: < http://www.mpas.gov.br>. Acesso em: 20 dez. 2007c.
______. Ministério da Fazenda. Secretaria do Tesouro Nacional. Para receitas e
transferências intergovernamentais dos municípios – 1998-2005. Disponível em:
<http://www.tesouro.fazenda.gov.br>. Acesso em: 7 jan. 2008.
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Acesso em: 4 mar. 2009.
CARVALHO, J. O.; ALVES, J. A. Oficina do semi-árido: contribuição da “nova
Sudene” para o desenvolvimento da região semi-árida do Nordeste. Recife, 2003.
Mimeografado.
GOMES, G. M. Velhas secas em novos sertões: continuidade e mudanças na economia
do semi-árido e dos cerrados nordestinos. Brasília: Ipea, 2001.
GUIMARAES NETO, L. Introdução à formação econômica do Nordeste. Recife:
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JORNAL DO COMÉRCIO. Governos pedem fundo nacional de desenvolvimento.
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______. Pacote ajuda cidades pobres. Pernambuco, 26 fev. 2008b. Caderno
Cidades, p. 1.
Transferências de Renda e Empregos Públicos....
75
SCHWARZER, H. Impactos socioeconômicos do sistema de aposentadorias rurais
no Brasil: evidencias empíricas de um estudo de caso no estado do Pará. Rio de
Janeiro: Ipea, jun. 2000 (Texto para Discussão, n. 729).
SCHWARTZMAN, J. Economia regional: textos escolhidos. Belo Horizonte:
Cedeplar, 1977.
UDERMAN, S. O Estado e a formulação de políticas de desenvolvimento regional.
Revista Econômica do Nordeste, Fortaleza, v. 39, n. 2, abr./jun. 2008.
VANDERBORGHT, Y.; VAN PARIJS, P. Renda básica de cidadania, argumentos
éticos e econômicos. Rio de Janeiro: Record, 2006.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
76
ANEXO
OS DADOS E AS RESPECTIVAS FONTES
O semiárido nordestino é a área geográfica formada pelos 1.048 municípios
do Nordeste; portanto, excluindo os municípios de Minas Gerais, que seguem
requisitos relativos à precipitação pluviométrica ao índice de aridez e risco de
seca determinados pelo Ministério da Integração Nacional. E o NE fora do
semiárido é o restante da região.
Para 1997, o Nordeste da seca é a área geográfica formada pelos 1.122 municípios diagnosticados em situação crítica na seca de 1998, e nos quais foram abertas
frentes de trabalho pela Sudene. E o Nordeste fora da seca é o restante da região.
Todos os dados relativos a 1996 e 1997 foram extraídos do livro Velhas secas
em novos sertões, Gomes (2001). O índice de inflação utilizado para corrigir os
valores foi o INPC, disponível no site do IBGE.
Todos os dados do capítulo sobre o semiárido foram extraídos do IBGE.
BOLSA FAMÍLIA
Os dados de número de famílias por município e os valores totais gastos por estado e para o país foi extraído do site do Ministério do Desenvolvimento Social e
Combate à Fome.
Para o cálculo do valor total dos benefícios da região semiárida e a região fora
do semiárido, foi calculada a transferência média por família do Nordeste, multiplicando, então, este valor pela quantidade de famílias beneficiadas até dezembro de
2007 nas duas regiões, já que o valor transferido por município não está disponível.
Para a estimação da população beneficiada pelo programa, foi multiplicado
o número de famílias pelo número de pessoas por família para a região Nordeste,
dado disponível no site do IBGE.
APOSENTADOS
Os dados para aposentados, valores e quantidades, foram todos extraídos do site
do Ministério da Previdência Social, para 2005. Os dados para os trabalhadores
e a massa salarial formal privada foram extraídos da Rais, banco de dados do
Ministério do Trabalho, para 2005.
Aqui foram considerados aqueles com vínculo empregatício em dezembro
de 2005, pois os dados sobre o número de aposentados também era válido para
os benefícios liberados em dezembro de 2005. A massa salarial formal privada foi
calculada sem distinção de vínculo, pois o valor dos gastos com aposentadorias
era o de todo o acumulado do ano.
Transferências de Renda e Empregos Públicos....
77
TRANSFERÊNCIAS INTERGOVERNAMENTAIS
Os dados foram extraídos do Relatório de Finanças do Brasil (Finbra) para o período
1998-2005, disponíveis no site da Secretaria do Tesouro Nacional. Os dados disponibilizados estão incompletos, faltando registros de vários municípios. Há dados de
4.270 municípios para 1998 e 4.322, 5.174, 5.339, 5.156, 5.012, 4.285 e 4.355
para cada ano subsequente.
Na tabela 15, a população e o PIB considerados são a dos 4.355 municípios
para os quais se tem dados de transferências intergovernamentais. Isto foi feito para
não se dividir os valores transferidos com o PIB e a população de municípios para
os quais os dados sobre transferências intergovernamentais não estavam disponíveis.
EMPREGO PÚBLICO
Todos os dados foram extraídos do banco de dados do Ministério do Trabalho,
Rais, 2005.
PROBLEMAS AMBIENTAIS DE UMA CIDADE MÉDIA DE MATO
GROSSO: O CASO DE BARRA DO BUGRES*
Loiva Zanon de Magalhães**
Hugo Scheuer Werle***
Nos últimos 30 anos, Mato Grosso sofreu um intenso processo de urbanização. Após iniciada a
Marcha para o Oeste, ocorrida na década de 1940 durante o governo de Getúlio Vargas, para
incentivar o progresso e a ocupação do Centro-Oeste, onde havia ainda muitas terras desocupadas.
Com este processo de urbanização acelerado, diversos problemas ambientais surgiram ou se
agravaram e são objeto de análise por este artigo.
Palavras-chave: Problemas Ambientais; Qualidade de Vida Urbana; Urbanização; Mato Grosso.
PROBLEMS OF A MEDIUM SIZE CITY: THE CASE OF BARRA DO BUGRES
Over the past thirty years, Mato Grosso has suffered an intense process of urbanization. Once started
the March to the West, which took place in the 40’s decade, during the Getúlio Vargas government, to
stimulate progress and occupation of the Center-West, where there were still many vacated land. With
this accelerated urbanization process, many environmental problems have arisen or have worsened.
Key words: Environmental Problems; Quality of Urban Life; Urbanization; Mato Grosso.
PROBLEMAS AMBIENTALES DE UNA CIUDAD DE TAMAÑO MEDIANO EN
MATO GROSSO, BRASIL: EL CASO DE BARRA DO BUGRES
En los últimos treinta años, Mato Grosso sufrió un proceso intenso de urbanización. Después de la Marcha
al Oeste, que ocurrió en la década de los, 40, durante el gobierno de Getulio Vargas, para estimular el
progreso y la ocupación del Centro-Oeste, donde todavía había muchas tierras desocupadas. Con este
proceso de urbanización acelerada, diversos problemas ambientales han surgido o se han agravado.
Palabras-clave: Problemas Ambientales; Calidad de Vida Urbana; Urbanización; Mato Grosso.
Les Problèmes Environnementales d’une Ville Moyenne de l’etat
de Mato Grosso, Brésil: Le Cas de la Ville de Barra do Bugres
Dans les derniers trente ans, l’etat de Mato Grosso, situé dans la Région Centre-Ouest du Brésil, a
suffert un intense processus d’urbanisacion. Après le commecement de la Marche vers l’Ouest, qui a eu
lieu, dans la décade 1940, pendant le gouvernement de le Président Getulio Vargas, pour promouvoir
le progrès et l’occupacion du Centre-Ouest, où il yavait encore beaucoup de terres liberées. Avec ce
processus d’urbanisacion accéleré, plusieurs problèmes environnementales ont arrivé.
Mots-clés: Problèmes Environnementales; Qualité de Vie Urbaine; Urbanisation; Mato Grosso.
* Resultado de dissertação defendida no curso de Pós-Graduação Strictu Sensu em Geografia na Universidade Federal
do Mato Grosso (UFMT) – Cuiabá (MT), em 26/11/2008.
** Professora, mestre e coordenadora do Programa de Educação Ambiental da BR-163 – Trecho Guarantã do Norte à
Divisa do Pará. E-mail: [email protected]
*** Professor doutor adjunto IV do Departamento de Geografia da UFMT – Cuiabá (MT). E-mail: [email protected]
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
80
1 INTRODUÇÃO
À medida que a preocupação com as questões ambientais vem adquirindo peso
nas discussões mundiais, nas últimas décadas, o padrão de desenvolvimento das
sociedades urbanas e as relações que se estabelecem entre estas sociedades e o meio
ambiente vem sendo profundamente questionados. O modelo industrial e o consumismo estabeleceram uma sociedade consumista, criando inúmeros problemas
ambientais, problemas estes vinculados à forma como os espaços são produzidos
e a sociedade se apropria da natureza.
A partir do último século, o desenvolvimento industrial e tecnológico fez
que as usinas brasileiras, que antes fabricavam apenas o álcool, colocassem produtos diferenciados no mercado, como o açúcar e a energia elétrica, estimulando
ainda mais o consumismo, associado ao crescimento populacional acentuado nos
centros urbanos; gerando, assim, uma degradação do meio ambiente.
Isto porque o homem, durante a sua trajetória, estabeleceu a ocupação e o
uso espacial da terra, apossando-se dos recursos naturais renováveis e não renováveis. Com o decorrer do tempo, passou a adotar um comportamento predatório
em relação à natureza.
Para Andrade (2001),
Com a evolução da ciência, o pensamento ambiental atenuou-se devido às degradações e alterações ambientais processadas no planeta. É interessante salientar
que tais alterações não ocorreram em um só país, surgiu em diferentes países,
em diferentes épocas, e foram se formando e sendo construídos, à medida que as
várias correntes do pensamento científico fossem surgindo e amadurecendo, juntamente com a demanda populacional e o aparecimento de problemas ambientais
que envolviam a opinião pública.
A organização urbana, representada pelas construções de grandes cidades, a
maioria delas sem nenhum planejamento e ordenamento (ANDRADE, 2001).
Problemas como as queimadas, a destinação dos resíduos sólidos e o saneamento básico precário são ameaças à qualidade de vida de toda sociedade,
tornando-se uma questão não apenas ambiental, mas também social.
Na atualidade, todo e qualquer espaço urbano apresenta problemas ambientais decorrentes de seu crescimento populacional. O município de Barra
do Bugres, como centro urbano com características e potencial turístico,
também apresenta problemas ambientais, que se agravam no período entre
os meses de abril a novembro, em que o número populacional “cresce” por
causa das usinas de álcool e açúcar, trazendo ao município, em média, segundo os administradores da usina, 2 mil trabalhadores sazonais vindos da
região Nordeste do país.
Problemas Ambientais de uma Cidade Média de Mato Grosso...
81
1.1 Os problemas ambientais de Barra do Bugres (MT)
A temática ambiental tem sido foco de atenção e estudo para vários campos do
conhecimento científico, além de ser uma área interdisciplinar, dada a necessidade de compreensão de aspectos políticos, científicos, sociais e econômicos, incluindo, assim, aspectos relativos ao meio ambiente.
O município de Barra do Bugres inicia também os contrastes desta problemática
ambiental. Pois, com o aceleramento do crescimento populacional, vários são os problemas que começam a surgir de forma desenfreada; entre estes, os de saneamento básico, destinação dos resíduos sólidos, plantação da cana-de-açúcar, queimadas e erosão.
Em Barra do Bugres, o desafio ambiental está no centro das contradições do mundo moderno, já que o progresso e o desenvolvimento são rigorosamente sinônimo de dominação da natureza (BECK; GIDDENS apud
PORTO-GONÇALVES, 2004).
GRÁFICO 1
Maior problema ambiental em Barra do Bugres
15%
Residuos sólidos
37%
Queimada de cana
18%
Erosão
30%
Saneamento básico
Fonte: Secretaria do Estado de Meio Ambiente de Mato Grosso (Sema)/Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
Elaboração dos autores.
Pode-se perceber que, nos últimos anos, a problemática no município vem aumentando e, com isto, acarretando danos à saúde tanto da população na zona urbana,
como a dos índios Umutina que moram na aldeia localizada a 9,6 km do município.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
82
1.2 Resíduos sólidos
O resíduo conhecido popularmente como lixo é definido como:
Resíduos sólidos e semi-sólidos resultantes de toda e qualquer atividade natural,
humana e animal considerados sem valor ou utilidade para serem conservados,
incluindo porções de materiais sem significação econômica, sobras de processamentos industriais e domésticos, a serem descartados. (LEME, 1984 apud
RESENDE, 1991).
A ABNT (1989), por meio da NBR-10004, define:
(...) resíduos sólidos como os resíduos nos estados sólido e semi-sólido que resultam
de atividades da comunidade de origem industrial, doméstica, de serviços de saúde,
comercial, agrícola, de serviços de varrição, além de lodos provenientes de sistemas
de tratamento de água, inviáveis de lançamento na rede pública de esgotos ou corpo
d’água (ORSATI, 2006).
A produção do lixo urbano, segundo Grossi (1993), está relacionada a dois
fatores que, basicamente, são o aumento populacional e a intensidade da industrialização, já que o lixo resulta da atividade diária do homem na sociedade.
Para Naime (2005),
(...) toda atividade humana produz rejeitos. O crescimento constante das populações, a forte industrialização, a melhoria no poder aquisitivo e os padrões de
consumo aceleram a geração de grandes volumes de resíduos. Os resíduos quando
misturados e sem possibilidade de reutilização e reciclagem, são denominados lixo.
Uma das principais fontes de contaminação ambiental do município é proveniente do manejo e disposição inadequados de resíduos sólidos urbanos e industriais (PORTO; SISINNO, 2000).
Segundo a Secretaria Municipal de Obras, Viação e Serviços Públicos de
Barra do Bugres, as atividades econômicas do município estão relacionadas à agricultura, como à cana-de-açúcar, à pecuária e ao comércio agroindustrial. O comércio e os domicílios geram um montante equivalente a 14 t diárias de resíduos
sólidos urbanos.
Em razão da curva de crescimento populacional e o surgimento de novos bairros, no fim da década de 1990, houve a necessidade de organizar
uma área afastada das residências para o recebimento e o tratamento do lixo
produzido no município. A área destinada aos resíduos sólidos, entre a década de 1980 e início da de 1990, trouxe problemas à população que morava
próximo, pois o lixo a céu aberto e em decomposição trazia animais e mau
cheiro ao local (figuras 1 e 2).
Problemas Ambientais de uma Cidade Média de Mato Grosso...
83
FIGURA 1
Área destinada aos resíduos sólidos no Jardim Paraguai – décadas de 1980 e 1990
Elaboração dos autores.
Após a mudança, a nova área destinada aos resíduos sólidos situa-se há dez
anos no Parque Industrial, a cerca de 6 km da cidade. Ali, residem seis pessoas,
entre elas, quatro adultos e duas crianças que sobrevivem exclusivamente do então
chamado lixão. Esta família realiza um trabalho que no país não é recente, o de separação dos resíduos sólidos e a sua revenda. É interessante, pois todos, inclusive
as crianças, auxiliam nesta separação, fazendo o papel da coleta seletiva que ainda
é inexistente no município (figuras 1 e 2).
FIGURA 2
Lixão de Barra do Bugres – Parque Industrial
Elaboração dos autores.
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A composição dos resíduos sólidos está relacionada com fatores que influenciam
a origem e formação do lixo no ambiente urbano de Barra do Bugres, tais como:
•
número de habitantes do município;
•
área relativa à produção;
•
variações sazonais;
•
condições climáticas;
•
hábitos e costumes da população;
•
nível educacional;
•
poder aquisitivo;
•
tempo de coleta;
•
eficiência da coleta;
•
tipo de equipamento da coleta;
•
disciplina e controle dos pontos produtores; e
•
leis e regulamentações específicas.
A variação econômica apresenta reflexos nos locais de disposição e tratamento
do lixo. Com o desaquecimento na economia e o término da safra canavieira, as fábricas e o comércio reduziram suas atividades, produzindo menores quantidades de
lixo. Pode acontecer o contrário também; porém, após determinado tempo, a tendência é a estabilização (INSTITUTO DO AÇÚCAR E DO ÁLCOOL, 1988).
Segundo Orsati (2006),
(...) a disposição inadequada dos resíduos sólidos urbanos leva a contaminação do
meio ambiente, sendo um problema comum em diversos municípios brasileiros.
O índice de qualidade, determinado pela relação entre os critérios funcionais e os
impactos ambientais.
A disposição dos resíduos nas áreas urbanas constitui um grande desafio
para a administração pública e a sociedade. Trata-se de um problema de saúde
pública, como demonstram os surtos epidêmicos relacionados à ausência ou carência de saneamento básico. Sua composição qualitativa apresenta os resíduos
biodegradáveis, recicláveis e combustíveis como borracha, couro, madeira, matéria orgânica, metais ferrosos, metais não ferrosos, papel, papelão, plástico duro,
plástico filme, trapos e vidro.
Barra do Bugres coleta atualmente 14 t/dia de resíduos sólidos, distribuídos em materiais orgânicos, papel, plásticos, madeira, trapos, entre outros.
A coleta acontece nos bairros duas vezes por semana e é feita por quatro caminhões
Problemas Ambientais de uma Cidade Média de Mato Grosso...
85
apropriados, da Secretaria de Obras, Viação e Serviços Públicos, e são destinados
à área conhecida como “lixão” a céu aberto. Algumas vezes, pode-se constatar que,
por manutenção, outros caminhões, estes comuns de caçamba, realizaram a coleta
do lixo na cidade. A coleta do lixo na aldeia Umutina ainda é insuficiente, segundo
líderes umutinas, pois a coleta não é regular.
Os resíduos sólidos urbanos têm destinação inadequada em mais de 80%
dos municípios do Brasil, assim como no município de Barra do Bugres, estes
resíduos são destinados a céu aberto em lixões (NAIME apud JACOBI, 2006).
As diretrizes internacionais para a questão de resíduos sólidos têm orientado
a redução em sua geração. Para tanto, criaram a ordem 3R, nomenclatura que
significa redução, reutilização e reciclagem dos resíduos sólidos.
Esses resíduos sem tratamento adequado causam danos ao meio ambiente
físico, uma consequência do lixo, jogado no terreno que os abriga. Segundo Naime citado por Jacobi (2006), em razão da decomposição e queimada, ocorrem
não apenas danos ao solo e a água, mas também à vegetação e aos animais, seguidos de danos à sociedade local.
Sob uma ótica mais ampla, resíduo é um descontrole entre fluxos de certos
elementos em dado sistema ecológico, implicando na instabilidade deste sistema
(FIGUEIREDO, 1995).
1.3 Saneamento básico
Para Diniz (2007), saneamento básico compreende:
(...) o tratamento de água em suas sucessivas fases: a captação, o tratamento, a
adução, a distribuição e a disposição final dos esgotos, bem como requer a instalação de infraestrutura compatível com o transporte da água a ser fornecida e
de coleta do esgoto para tratamento em locais próprios, definidos no Decreto
no 82.587, de 6/11/1978.
O princípio fundamental do serviço de saneamento básico é o abastecimento de água, esgotamento sanitário, limpeza urbana e manejo dos resíduos sólidos,
realizados de forma a atender a Lei no 11.445, de 5 de janeiro de 2007.
Segundo o Decreto no 82.587, de 6 de novembro de 1978, Artigo 2o, são
serviços públicos de saneamento básico, integrados ao Plano Nacional de Saneamento (Planasa), os administrados e operados por companhias de saneamento
básico, constituídas pelos governos estaduais que, em convênio com o Banco
Nacional da Habitação (BNH), estabelecem as condições de execução do plano,
nos respectivos estados, observados os objetivos e as metas fixadas pelo governo
federal (BRASIL, 1978). E define:
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§ 2o ­– Os serviços públicos de saneamento básico compreendem:
a) os sistemas de abastecimento de água, definidos como conjunto de obras,
instalações e equipamentos, que têm por finalidade captar, aduzir, tratar e
distribuir água;
b) os sistemas de esgotos, definidos como o conjunto de obras, instalações e
equipamentos, que têm por finalidade coletar, transportar e dar destino final
adequado às águas residuárias ou servidas (BRASIL, 1978).
A problemática com o saneamento básico deve integrar as medidas governamentais, no que concerne à Política Nacional de Meio Ambiente que objetiva
a preservação e a recuperação da qualidade ambiental, na racionalização do uso
do solo, do subsolo e da água, definida pela Lei no 6.938/1981. As diretrizes nacionais para o saneamento básico e a política federal de saneamento básico são
estabelecidas na Lei no 11.445/2007.
Hoje, Barra do Bugres apresenta um sistema de saneamento básico precário;
a grande maioria do esgotamento sanitário é feito por meio de fossas sépticas,
o que pode sinalizar graves problemas ambientais, principalmente no tocante à
captação de água, realizada por meio de poços semiartesianos, por parte da população residente em bairros onde a água é insuficiente. Como é o caso dos bairros
Maracanã, Jardim Alvorecer e Pronav.
A população ainda tem dificuldades; em muitos bairros, a rede de esgoto é
inexistente; por consequência, há casos de esgoto a céu aberto, que ainda é um sério problema ambiental no Brasil. É assustador que; em ruas centrais da cidade, o
problema persiste, muitas vezes por causa do fator econômico e pela comodidade
de alguns moradores.
A prestação do serviço de saneamento básico no Brasil é ainda bastante
falha, em virtude do aceleramento do processo de urbanização. Nas últimas décadas, algumas melhorias foram apresentadas à população. Em Barra do Bugres,
o serviço que se refere à coleta de esgoto ainda está longe de uma universalização.
No Brasil, o déficit é de 50% do material coletado (tabela 1).
TABELA 1
População atendida pela rede de esgoto em Barra do Bugres e Brasil
(Em %)
1980
1990
2000
Barra do Bugres
Brasil
Barrado Bugres
Brasil
Barra do Bugres
Brasil
21,9
37
34,2
47,9
42,1
56
Fontes: C
ensos Demográficos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e Departamento de Água e Esgoto (DAE)
de Barra do Bugres.
Elaboração dos autores.
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1.4 Erosão
Os primeiros escritos acerca da erosão foram produzidos, de acordo com Corrêa
(2004), por volta de 1887, pelo cientista alemão Ewald Wollny; mas, apenas em
1944, a erosão foi definida por W. D. Elisson como resultante da ação do impacto
das gotas de chuva no solo desprovido de sua vegetação natural (BASTOS, 2006).
Segundo Lepsch (1976), a erosão é um processo mecânico que atua simultaneamente na superfície e na profundidade do perfil do solo, tornando-se crítica
em função da intensidade das atividades humanas desordenadas.
A erosão urbana é um dos problemas ambientais que afetam a cidade de
Barra do Bugres e está diretamente relacionada com o processo de rápida urbanização, sem planejamento e práticas de parcelamento do solo inadequadas e
deficientes (TUCCI; COLLISCHONN, 2000).
Guy (1967) mostra que os sedimentos nas áreas urbanas muitas vezes são
gerados em um grande número de áreas particulares, mas, quando atingem o leito
do rio ou canal, passam a ser encarados como um problema público.
A ocupação do espaço desencadeada pelas ações de desmatamento, cultivo
de solo, implantação de estradas, criação e expansão da cidade efetuada de modo
inadequado é o fator fundamental para a aceleração da erosão em Barra do Bugres.
A maior quantidade de erosões observadas no município está localizada na área
urbana, onde se encontram áreas de implantação de loteamentos, derrubada da vegetação original para o plantio da cana-de-açúcar e ruas abertas sem estudo e estrutura.
FIGURA 3
Erosão da Avenida Tropical
Elaboração dos autores.
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Lepsch (1976) afirma que o solo, quando desprovido de sua vegetação natural, fica sujeito a uma série de fatores que tendem a degradá-lo; em que a erosão
torna-se uma das principais causas da degradação ambiental (BASTOS, 2006).
1.5 Impactos ambientais causados pelas queimadas
Nas últimas décadas, o estado do Mato Grosso assumiu um papel de destaque no
cenário nacional, ora por apresentar elevados índices de crescimento econômico,
produção agrícola e pecuária, ora por ser apontado como o responsável por uma
das maiores taxas de erradicação da cobertura vegetal natural, sobretudo no cerrado e na floresta tropical úmida. Segundo Coutinho (2002), vale lembrar que o
estado destaca-se, ainda, por possuir os maiores índices anuais de ocorrência de
queimadas do país, no período 1999-2004.
As queimadas reduzem o custo do setor canavieiro e aumentam os seus
lucros; no entanto, a sociedade sofre os prejuízos causados por estas. As pessoas ficam doentes, pois respiram as partículas finas e ultrafinas provenientes das
queimadas, que penetram no sistema respiratório, provocando reações alérgicas
e inflamatórias.
Barra do Bugres vem sofrendo com as queimadas da cana-de-açúcar, pois,
na época de safra da usina Barrálcool, os problemas respiratórios surgem de forma crescente. Neste período, a poluição atmosférica atinge seu estágio máximo.
A umidade do ar, segundo o Inpe, fica em torno de 11%, ocasionando um alto
índice de gripes alérgicas e doenças pulmonares como bronquite, asma e alergias.
A população sofre com a fumaça, pois o tempo seco e poluído nos meses de
julho a setembro dificulta a respiração, havendo a necessidade do uso de umidificadores de ar ou recipientes de água nos cômodos das residências.
FIGURA 4
Queimada de cana-de-açúcar em Barra do Bugres
Elaboração dos autores.
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As queimadas são uma significativa fonte global de vários gases de “efeito
estufa” como CO2 (dióxido de carbono), CH4 (metano) e N2O (óxido nitroso),
NO2 (dióxido de nitrogênio), HCNM (hidrocarbonetos não metano), cloreto
e brometo de metila, compostos orgânicos voláteis (VOCs) e outros gases (ANDREAE; ARTAXO; FISCHER, 2001). Estes gases fazem parte de todo processo
da queimada da cana-de-açúcar, agravando a poluição atmosférica no município.
Para Viana, Cruz e Waquil (2006), outro agravante está relacionado ao clima:
(...) um efeito drástico do desmatamento; elevando a sensação térmica. Nesse período, a radiação solar na superfície, provocada pelo excesso de partículas em suspensão, pode ainda puxar para baixo a taxa de fotossíntese das árvores.
Podemos verificar que o número de queimadas, segundo a Sema/Inpe, oscila
a cada nova safra (gráfico 2).
GRÁFICO 2
Queimadas em Barra do Bugres – 1996 a 2004
2004
126
2003
114
2002
250
2001
215
2000
144
1999
364
1998
207
1997
104
1996
131
0
50
100
150
200
250
300
350
400
Fonte: Sema/Inpe (2004).
Elaboração dos autores.
Segundo a Superintendência de Defesa Civil/Sema, a incidência de queimadas aumentou nos últimos três anos. Utilizando todos os satélites no período 20062007, houve um aumento em torno de 107% no número de focos de calor em
Barra do Bugres. A população pôde sentir este aumento em razão do alto índice de
fumaça e fuligem durante todo o período, com agravantes entre abril e setembro.
Outro dado cedido pela Sema é sobre o período proibitivo de queimadas em
Mato Grosso, que ocorre de 15 de julho a 15 de setembro, podendo ser prorrogado
por mais 15 dias; nos dois últimos anos, houve a prorrogação. Neste período, podese identificar que não houve um aumento do número das queimadas, mas, sim, o
não cumprimento da lei, ou seja, não houve interrupções de queimadas no município; por isso, a Sema apresenta um número constando como aumento de 106%.
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2 CONCLUSÕES
A atração que as cidades provocam nas populações de áreas rurais é uma das
razões do crescimento urbano. Contudo, as cidades não conseguem acomodar
nem empregar todas estas pessoas que procuram nestas uma vida melhor, como
escolas para os filhos, locais de trabalho, lojas e supermercados; antes distantes da
realidade da zona rural.
O crescimento populacional brasileiro, especificamente no município de
Barra do Bugres, representou uma conjunção de problemas típicos do acelerado
processo de urbanização, como a proliferação de favelas e degradação das condições de vida, por falta de planejamento e acompanhamento de políticas públicas
de bem-estar social. Esta população, em sua maioria, ocupa áreas de risco, tanto
no que tange à conservação ambiental quanto às condições de insalubridade que
se submetem estas populações.
Todos estes problemas contribuem diretamente com a degradação do meio
ambiente urbano e, consequentemente, a degradação da qualidade de vida das
pessoas que ali vivem.
A problemática ambiental urbana, tão discutida entre pesquisadores, assim
como pela mídia que vem se apropriando desta discussão, tem chamado a atenção da população ainda em pequena escala para um fato relevante na sociedade
moderna: a preocupação com o mundo em que vivemos.
Diante dos problemas socioambientais vivenciados pela sociedade barrabugrense, como a erosão, a destinação adequada dos resíduos sólidos, o saneamento básico
insuficiente e as queimadas da cana-de-açúcar, hoje, é essencial criar e reinventar novas
formas de relação entre os seres humanos e a natureza e entre os próprios seres humanos com a finalidade de controlar ou amenizar a problemática ambiental na cidade.
As políticas socioambientais devem permear todas as ações do poder público, superando o desafio de transformar os discursos em práticas, pautadas em
conceitos como pluralidade cultural, diversidade social e ética, fundamentais à
democracia e à cidadania (LAHAM, 2006).
A preservação ecológica, a econômica e a justiça social mostram-se elementos fundamentais na criação de formas de desenvolvimento, como as sociedades sustentáveis, associadas às formas democráticas, nas quais a participação da
sociedade civil é indispensável para a criação de uma consciência ecológica da
sociedade em geral.
Em síntese, pelo que foram constatados, os problemas socioambientais no
município de Barra do Bugres são complexos e demandam esforços permanentes
para serem devidamente enfrentados. As políticas de meio ambiente e das estruturas municipais correspondentes ficam muito aquém da realidade que se espera.
Problemas Ambientais de uma Cidade Média de Mato Grosso...
91
Observa-se que essa situação é decorrente da inoperância e ineficácia do
poder público municipal e estadual que não conhecem ou reconhecem os problemas ambientais urbanos e as precárias condições de vida de parte da população,
negando-lhes, inclusive, a possibilidade de participação, em parceria com os gestores públicos e privados, na busca de soluções para que a problemática ambiental
seja resolvida no município de Barra do Bugres.
É imprescindível que se façam audiências públicas, para que todos tenham
conhecimento do que está e vem acontecendo, para que seja possível um trabalho
que atenda não só aos bairros afastados do centro da cidade, mas também a todo o
município. Equipes capacitadas podem auxiliar no trabalho de planejamento, elaborando de maneira adequada as mudanças e transformações para os problemas
ambientais atuais; já que alguns dos problemas aqui relatados dependem apenas
de planejamento adequado à sua localização.
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ALGUMAS REFLEXÕES SOBRE OS PROGRAMAS DE
ALIMENTAÇÃO ESCOLAR NA AMÉRICA LATINA
Walter Belik*
Luciana Rosa de Souza**
Este estudo visa discutir o papel dos programas de alimentação escolar, na execução de políticas
de segurança alimentar. Analisa as inter-relações entre os programas de alimentação escolar
no âmbito educacional e os aspectos vinculados ao desenvolvimento local, além de traçar um
panorama da situação dos programas de alimentação escolar na América Latina. O objetivo direto
deste trabalho é sugerir que os programas de alimentação escolar podem ser mais bem utilizados
como instrumento de promoção da segurança alimentar e nutricional.
Palavras-chave: Programa de Alimentação Escolar; América Latina; Desenvolvimento Local; Educação.
SOME REFLECTIONS ON THE SCHOOL FEEDING PROGRAMS IN LATIN AMERICA
This study examines the role of school meals programs in the context of Food Security policy. The paper
presents the relationship between school meals and nutrition, school attendance and local development.
As seen, the school meals programs could be applied in many aspects to promote the food security.
Key words: School Meals Programs; Latin America; Local Development; Education.
ALGUNAS REFLEXIONES SOBRE LOS PROGRAMAS DE ALIMENTACIÓN
ESCOLAR EN AMÉRICA LATINA
Este estudio tiene como objetivo examinar el rol de los programas de alimentación escolar en la
ejecución de las políticas de seguridad alimentaria. Examina la relación entre los programas de
alimentación escolar en los aspectos educativos y relacionados con el desarrollo local, además de
hacer una evaluación de la situación de la Merienda Escolar en América Latina. El objetivo directo
de este trabajo es sugerir que los programas de alimentación escolar pueden ser mejor utilizados
como herramienta para promover la Seguridad Alimentaria y Nutrición.
Palabras-clave: Programa de Alimentación Escolar; América Latina; Desarrollo Local; Educación.
QUELQUES RÉFLEXIONS SUR LES PROGRAMMES D’ALIMENTATION SCOLAIRE
EN AMÉRIQUE LATINE
Cette étude s’agit à discuter le rôle des Programmes d’Alimentation Scolaire dans l’exécution de
politiques de Sécurité Alimentaire. Il analyse les interrelations entre les Programmes d’Alimentation
Scolaire dans les contextes scolaire et les aspects liés au développement local, au-delà de tracer un
* Professor associado do Instituto de Economia (IE) e coordenador do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Alimentação
(Nepa) da Universidade de Campinas (UNICAMP). E-mail: [email protected]
** Doutoranda do IE da UNICAMP. E-mail: [email protected]
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
104
panorama de la situation des programmes d’Alimentation Scolaire en l’Amérique latine. L’objectif
direct de ce texte est suggérer que les Programmes d’Alimentation Scolaire puissent mieux être
utilisés comme instruments de promotion de la Sécurité Alimentaire et Nutritionnelle.
Mots-clés: Programme D’alimentation Scolaire; Amérique Latine; Développement Local; Éducation.
1 INTRODUÇÃO
Este artigo discute a importância dos programas de alimentação escolar (PAEs),
enquanto ações privilegiadas de política social no âmbito da segurança alimentar e
nutricional, considerando os seus transbordamentos para a área educacional e para
o desenvolvimento das localidades. A preocupação que motivou este estudo deriva
da observação de estudos de caso e de estudos generalizados que indicam que os
programas de alimentação escolar têm sua implementação frágil e não têm chegado à população que mais necessita. Conforme dados da Comissão Econômica
para a América Latina e o Caribe (CEPAL, 2007a), apenas 1,1% do gasto social
associado ao produto interno bruto (PIB) tem sido direcionado aos programas
de alimentação, nos quais se insere a alimentação escolar. Na realidade, podemos
inferir que, caso estes programas pudessem ser aplicados de forma universal, seus
efeitos poderiam ir além do simples aporte alimentar.
As políticas sociais, quando dirigidas de forma intensiva para o apoio a programas de alimentação escolar, podem gerar enormes ganhos, não apenas em termos de eficiência na gestão dos recursos públicos, mas também para a educação, a
saúde e o desenvolvimento local, além dos seus impactos diretos sobre a segurança alimentar. Estes aspectos particulares foram demonstrados por Infante Barros
(2005) em levantamento realizado no Chile, México e Brasil, além de outros estudos englobando as experiências locais no Brasil que apontaram na mesma direção.
Vale lembrar que, por reforçar os aspectos da produção e do consumo local, preservando hábitos alimentares, os PAEs têm capacidade de promover o que se costuma
denominar soberania alimentar das comunidades (CHONCHOL, 2005).
De fato, os PAEs são capazes de gerar meios para desenvolver a produção
local, desvinculando-a de crises setoriais e mantendo regularidade nas rendas da
comunidade, ao mesmo tempo em que se garante o abastecimento alimentar.
Em cenários de alta nos preços dos alimentos, a dinamização local por meio da
agricultura familiar pode ser um caminho para evitar crises de abastecimento e
falta de produtos essenciais à alimentação. Ademais, “(esses programas) podem
cumprir um papel relevante na rede de proteção social devido a sua alta capacidade de responder em momentos de crise” (DUKE UNIVERSITY, 2005, p. 26).
Este artigo usará o caso do Brasil como exemplo bem sucedido – mas não acabado – de um programa de alimentação escolar que serve como referência para toda
a região, já que possui um desenho mais avançado, além de ter cobertura universal.
Algumas Reflexões sobre os Programas de Alimentação Escolar na América Latina
105
Um total de quase 20 países da América possui programas de alimentação escolar;
porém, muitos programas não passam de pequenas ajudas que são transferidas a
certas escolas de regiões carentes em algumas épocas do ano. Em outros casos, a
quantidade de alimentos utilizada nas merendas é tão pequena que proporciona
baixos resultados em termos nutricionais.
O objetivo mais direto deste trabalho é sugerir que os programas de alimentação
escolar podem ser mais bem utilizados como instrumento de promoção da segurança
alimentar e nutricional. Argumentamos que na América Latina tal instrumento não
tem sido bem aproveitado em função do seu baixo alcance sobre a população mais
necessitada e do valor relativamente reduzido das suas transferências. Mesmo no Brasil,
considerado exemplo na implementação dos PAEs, os resultados medidos em termos
de impacto direto ou na percepção da segurança alimentar são reduzidos ou não foram
avaliados (FAO, 2006, p. 4). As constatações a respeito do impacto do PAE no Brasil
são provenientes de levantamentos realizados com base na aplicação de questionários
segundo a Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (Ebia), na Pesquisa Nacional por
Amostras de Domicílios (PNAD), feita em 2006.1 De toda forma, o poder que estes
programas possuem para dinamizar a renda dos produtores locais, e outros elementos
ligados à educação e à saúde nas comunidades, enseja a sua grande capacidade de atuar
como política social conforme apontado por estudo de Belik e Chaim (2009).
O presente artigo foi dividido em cinco seções: a primeira seção é esta introdução; a segunda analisa a literatura buscando identificar os impactos dos PAEs nas
economias locais; a terceira discute os pontos de contato que podem ser estabelecidos entre educação e alimentação escolar; a quarta traça um panorama geral dos
programas de alimentação escolar na América Latina, desde a década dos 1990.
Ressalta-se que o exemplo do PAE brasileiro perpassará todo o texto, devido a seus
aspectos de universalidade na oferta do serviço e seu desenho orientado para a dinamização da economia em nível local. Por fim, na quinta seção, temos a conclusão.
2 A ALIMENTAÇÃO ESCOLAR E O DESENVOLVIMENTO LOCAL: EVIDÊNCIAS
DO CASO BRASILEIRO
O fornecimento de alimentação nas escolas é um processo descentralizado por definição, pois a matéria-prima ou mesmo as refeições prontas precisam chegar até
as escolas, as quais estão distribuídas em um amplo espaço geográfico. A alimentação se dá em um espaço de grande dispersão, procurando atender o seu público
1. A Ebia foi adotada na PNAD aplicada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2006. Esta escala
está baseada nos estudos de K. Radimer, da Universidade de Cornell nos Estados Unidos dos anos 1990. A escala de
Radimer foi utilizada em diversos estudos patrocinados pelo Departamento de Agricultura dos Estados Unidos, conhecida como Household Food Security Survey Module (HFSSM), tendo sido aplicada, com adaptações e após validação,
em várias comunidades na Venezuela, na Colômbia, na República Dominicana, no México, na Bolívia, na Guatemala,
no Brasil, no Burkina Fasso, em Gana, na Malásia e nas Filipinas (MELGAR-QUINOMEZ et al., 2007).
106
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
beneficiário e, ao mesmo tempo, resguardar aspectos ligados aos hábitos alimentares de cada grupo envolvido. São muitas as dificuldades presentes no processo
de obtenção dos alimentos utilizados e sua posterior distribuição para as escolas.
Evidentemente, para países que dependem de doações da cooperação internacional para atender as necessidades de alimentação diárias dos estudantes,
torna-se difícil levar em conta a importância da preservação dos hábitos alimentares locais. O mesmo se passa no que se refere às estruturas centralizadas de
compra e gestão dos recursos públicos. Em países mais burocratizados e com
controles mais rígidos, quanto aos poderes provinciais ou municipais, são menores as possibilidades de descentralização destas compras. Como resultado, temos
compras centralizadas, muitas vezes concentradas em algumas poucas empresas
fornecedoras, o que termina por reduzir a capacidade de compras de alimentos
nas próprias localidades.
Analisar o caso do Brasil nos permite entender como o sistema de alimentação escolar transitou de um formato focalizado em termos sociais e geográficos,
com a compra centralizada, para um formato universal, com a aquisição de alimentos via compra descentralizada com base em sistemas locais de fornecimento.
No Brasil, o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) sofreu
grande evolução em seus mais de 50 anos de vida. Em seu início, o PNAE era
uma simples campanha voltada para algumas escolas durante alguns dias da
semana. Seus suprimentos tinham relação direta com a disponibilidade proporcionada pelas doações de gêneros, provenientes da ajuda alimentar internacional e de programas como o Public Law (PL) 480 norte-americano.2 Em 1979,
este apoio assumiu caráter universal e ampliou-se por todo o território nacional.
No início da década de 1990, o PNAE começou a estruturar-se estabelecendo
algumas regras referentes às quantidades a serem fornecidas aos escolares, aos
valores nutricionais e ao sistema de compras envolvido no fornecimento. Finalmente, em 1994, adotou-se a descentralização da gestão do programa, promovendo o seu controle por parte da sociedade civil e as compras por meio de
sistemas locais de abastecimento.
Em 1994, o mesmo projeto de lei que descentralizou e municipalizou3 a
merenda escolar recomendava a preferência de compra por produtos in natura
e a priorização da produção local para reduzir custos. No ano de 1996, uma
nova portaria passou a definir os critérios para aquisição de alimentos para
2. A PL 480 foi aprovada em 1954, nos Estados Unidos, e visava à compra de excedentes alimentares dos produtores
para doação a países pobres. Internamente, a PL 480 representava um subsídio ao agricultor e uma forma de estabilizar os preços de mercado.
3. Essa lei tornou os municípios unidade responsável pela oferta da alimentação escolar, este fato foi um divisor de
águas, pois foi por meio desta medida que se descentralizou a gestão da alimentação escolar no Brasil, colocando
os seus mais de 5 mil municípios como responsáveis pela gestão e oferta da alimentação escolar.
Algumas Reflexões sobre os Programas de Alimentação Escolar na América Latina
107
a merenda escolar. Esta portaria acentuou a importância da comercialização
de alimentos produzidos na região para incentivar a produção local, além de
recomendar a aquisição de produtos que estivessem em período de safra na
região. Ademais, indicava-se a necessidade de evitar a compra de alimentos de
empresas do setor de alimentação.
As ações vinculadas ao PNAE, no modelo descentralizado, ou seja, após a
municipalização da merenda escolar, centravam-se no estímulo ao associativismo
e à profissionalização dos produtores agrícolas familiares. Neste modelo de administração, a prefeitura seria o agente promotor da associação entre alimentação
escolar e desenvolvimento local. Entendemos que este desenho descentralizado do
PNAE para promover o desenvolvimento local é o que apresenta maior funcionalidade, especialmente, para pequenos municípios. Com isso, é possível gerar estímulos sobre a pequena produção agropecuária que leva vantagens no que se refere
à logística e ao preço/qualidade dos produtos para negociação local. Vale dizer, no
entanto, que esta regra não se aplica à gestão da alimentação escolar nos grandes
municípios e também para a compra de gêneros não perecíveis para os quais as
aquisições em grandes quantidades podem representar uma redução de custos.
Informações recolhidas nas quatro edições do Prêmio Gestor Eficiente da
Merenda Escolar, organizado pela organização não governamental (ONG) Ação
Fome Zero,4 mostram que naqueles municípios que promoveram a compra de
alimentos junto à agricultura e à agroindústria familiar ou ao pequeno comércio, ocorreram vantagens em termos de renda e emprego, além de propiciar uma
alimentação saudável com manutenção dos hábitos alimentares regionais. Entretanto, esta opção por privilegiar os fornecedores locais sempre implicou grande
esforço, seja no que se refere aos trâmites administrativos, ou mesmo no que diz
respeito à reorientação das decisões de cunho político.
Em alguns casos bem sucedidos de municípios analisados pelo Prêmio
Gestor Eficiente da Merenda Escolar, já se possuía uma estrutura produtiva
estabelecida e um sistema de distribuição constituído. Nestes casos, a gestão
da merenda escolar era feita de forma rotineira e burocrática, até que, por
algum motivo de crise, – como uma baixa nos preços de mercado pagos aos
produtores locais, mudança nos fluxos dos mercados, ou mesmo por pressão
exercida pelos produtores locais – a opção pela utilização das compras locais
passou a ser adotada. Estes foram os casos da adoção do suco de laranja na
merenda escolar na região de Bebedouro em São Paulo, do leite no oeste de
Santa Catarina, do leite de cabra em Sergipe, da castanha do Pará em alguns
municípios da Amazônia, do doce de coco em Quissamã no Rio de Janeiro e
dos alimentos orgânicos em vários municípios analisados.
4. As informações sobre o prêmio podem ser verificadas no site: <www.premiomerenda.org.br>.
108
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Corroborando com a perspectiva aqui levantada citamos estudos realizados
por Infante Barros (2005, p. 12) nos quais há destaque para o sistema descentralizado de compras, praticado no nível da própria escola e os seus bons resultados
junto à produção local, encontrados em países como a Colômbia, a Guatemala
e a Costa Rica.
Em outros casos analisados, o avanço de programas de compra da agricultura familiar ocorreu de forma mais lenta, pois envolveu o que chamamos de
desenvolvimento de fornecedores. Nestas situações, torna-se necessário identificar
produtores, capacitá-los para atender aos requisitos de qualidade exigida, auxiliálos na preparação de documentação e estabelecer rotinas de atendimento e de
entrega. Normalmente, o desenvolvimento de fornecedores inicia-se na escola,
com programas de educação alimentar e recuperação de tradições e hábitos locais apoiados ou incentivados pelo Conselho Municipal de Alimentação Escolar
(CAE). Em momento posterior, há o envolvimento de agrônomos, de assistentes
sociais e do pessoal administrativo da prefeitura nas compras escolares.
Devido ao fato da legislação brasileira ser muito rígida, dificultando que
os pequenos produtores participem dos processos licitatórios, cabe aos funcionários administrativos da prefeitura encontrar meios de contornar esta legislação para torná-la mais adequada ao regime de compras locais. Evidentemente,
as possibilidades abertas pela legislação brasileira para a compra sem licitação
são pequenas,5 mas sempre é possível utilizar o sistema de registro de preços,6
ou mesmo utilizar outras verbas orçamentárias ou extraorçamentárias para o
desenvolvimento de programas e a compra da agricultura familiar, com repasses
de outros programas estaduais e federais.
Em 2003, o governo brasileiro lançou o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), com uma modalidade para a compra da agricultura familiar – sem
licitação em montante de até R$ 5 mil/ano – e posterior doação deste alimento
para a merenda escolar. Mais tarde, esta modalidade foi subdividida em outras;
entretanto, podemos resumir a atuação do governo neste particular em dois tipos:
a compra de gêneros para doação simultânea e o programa de compra do leite,
também orientado para doação. Em ambos os casos, as estatísticas não fazem
diferenciação sobre o destino das compras, podendo ser utilizadas para a merenda
escolar como também para doação a instituições de assistência social.
5. A Lei no 8.666/1993 dispensa de licitação a compra de até R$ 8.000,00 a partir da consulta de, no mínimo,
três orçamentos.
6. Por um lado, esse sistema permite a compra de grandes quantidades, feita de forma paulatina e regular, a partir
da escolha de um fornecedor com preço registrado mais baixo em período anterior, facilita a atuação do pequeno
produtor, que não tem grandes quantidades a entregar de uma só vez, e torna desinteressante a participação do
grande fornecedor, que tem de fazer várias entregas e prover a prefeitura de forma desagregada. Por outro lado, o
sistema faculta ao órgão público comprar de outro fornecedor, caso o preço de registro apresente-se mais elevado em
determinadas épocas do ano – períodos de safras, por exemplo.
Algumas Reflexões sobre os Programas de Alimentação Escolar na América Latina
109
Segundo Turpin (2008), foram gastos R$ 619 milhões entre 2003 e 2008
com estes dois programas7 nos estados e municípios; porém, não se sabe ao certo
quanto foi destinado à alimentação escolar. Em adição a estas cifras, vale mencionar que há ainda outro montante, operado diretamente pela Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB), que pode também ter recebido algum recurso
dirigido para a merenda escolar.
O modelo ideal de utilização de fundos para a merenda escolar deve considerar
dois aspectos importantes, a saber: i) preservar a capacidade de manter as compras
da merenda escolar sob o controle do município – ou da escola; e ii) permitir que as
compras de alimentos de pequenos produtores cadastrados e desenvolvidos para o fornecimento da merenda escolar possam alcançar valores maiores e mais significativos
do ponto de vista comercial.
Para que essas medidas possam ser concretizadas, é preciso melhorar o aporte de alimentos destinados à merenda escolar. Atualmente, a legislação brasileira
prevê que a merenda deve atender a 15 % das necessidades calóricas diárias e
prover 9 g de proteína para a criança durante os 200 dias letivos do calendário
escolar. Sabemos que estes valores reduzidos não poderiam alterar significativamente o quadro nutricional do público infantil. No entanto, com mais refeições
e alimentação de melhor qualidade, as municipalidades necessitariam comprar
mais, permitindo, assim, a manutenção de um volume significativo de alimentos
a serem adquiridos da agricultura familiar.
Outra providência importante poderia ser o incentivo à criação de hortas
escolares – administradas por famílias ou cooperativas de produtores – para oferta
local. Para tanto, o poder público deveria disponibilizar áreas ociosas em terrenos
municipais e áreas contíguas às escolas. Este é um elemento importante para o
funcionamento de uma relação direta entre fornecedores e compradores, no que
se refere à qualidade dos alimentos fornecidos. Ao mesmo tempo, a proximidade
das áreas de produção permite o desenvolvimento de atividades escolares tendo a
merenda – produção, relações de trabalho, conteúdo nutricional e outros elementos – como ponto de destaque.
Atualmente, o programa brasileiro atende um total de 37 milhões de crianças – pré-escola, ensino infantil e fundamental – com gastos da União, superiores
a R$ 1,5 bilhão. Estima-se que, com a incorporação dos estudantes do ensino médio – previsto para 2009 – ao PNAE, o gasto do governo federal deverá superar
os R$ 2 bilhões, atendendo a 45 milhões de alunos. Outra inovação importante
deverá ser introduzida também em 2009, que é a diretriz estabelecendo percentuais para a compra local. Isto porque a legislação atual prevê que 70% do valor
7. Compra com doação simultânea e programa de compra do leite, ambos participam do Programa de Aquisição
de Alimentos.
110
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
repassado devem ser utilizados para compra de produtos básicos, o que por si não
é uma garantia de compra junto aos agricultores locais. Primeiramente, porque
nem todos os municípios produzem tudo que é necessário, existem vários municípios urbanos. Em segundo lugar, muitos produtos básicos são industrializados,
como queijos, carnes, farinhas, óleo de soja etc., na maioria dos casos os produtores locais não têm condições de fornecer estes bens em condições adequadas.
Finalmente, há um problema de preços praticados; muitas vezes, a compra de
produtos – mesmo aqueles da produção local – é mais barata quando feita por
meio de empresas fornecedoras. Isto sem contar custos de transação envolvidos na
operação com pequenos produtores.
Nesta seção, procuramos estudar os pontos de contato entre a alimentação
escolar e a dinamização local, com base no exemplo brasileiro, cuja importância
em termos de PAE na América Latina ainda será explorada na sequência deste
estudo. A próxima seção busca traçar uma relação entre os programas de alimentação escolar e o aproveitamento educacional dos escolares beneficiados.
3 EDUCAÇÃO E ALIMENTAÇÃO
A valorização do espaço escolar como elemento para atração das comunidades e
participação democrática provoca efeitos que vão além dos objetivos iniciais de
criar uma unidade administrativa de menor tamanho para a gestão e o acompanhamento das políticas públicas. Nesses municípios, a escola funciona como
ponto de encontro da comunidade promovendo a educação, a boa nutrição e a
integração dos grupos mais vulneráveis. Dessa maneira, vislumbrar a escola como
um verdadeiro centro de referência em segurança alimentar, tendo os programas
de educação alimentar – municipais, estaduais ou federais – como seus condutores, poderia abrir um novo horizonte para que as comunidades pudessem participar de um novo desenho das políticas de segurança alimentar. A participação
popular faculta o “empoderamento” dos atores e tem se tornado a “nova política
da política pública” que, embora tenha raízes na preocupação neoliberal de reduzir a tutela do Estado nas decisões de política, promove a cidadania e tem grande
potencial de revitalizar a democracia (GAVENTA, 2007). Portanto, não podemos vislumbrar os PAEs como unicamente voltados para alimentação e nutrição.
Muitas pesquisas foram realizadas sobre a efetividade dos programas de alimentação escolar em termos nutricionais, e a pergunta que tem balizado tais
pesquisas é: qual seria o impacto da alimentação escolar em termos nutricionais?
Segundo levantamento de Kristjansson et al. (2007), não seria possível apontar
dados conclusivos a respeito do impacto da merenda escolar sobre a nutrição
das crianças. Um mapeamento de 18 estudos realizados desde a década de 1920,
nos países desenvolvidos e em desenvolvimento, mostra que os resultados variam
Algumas Reflexões sobre os Programas de Alimentação Escolar na América Latina
111
dependendo do grupo que está sendo analisado, da qualidade e da frequência dos
alimentos fornecidos e de outras variáveis da conjuntura econômica envolvidas
no processo. Pode-se concluir, entretanto, que, do ponto de vista da frequência
escolar e da redução da repetência e/ou do abandono escolar, os programas de
alimentação escolar representam um grande avanço.
No estudo de Kristjansson et al. foram analisados os impactos da alimentação escolar tanto em países de baixa renda como em países de alta renda:
Results for height from High Income countries were mixed, but generally positive.
In low income countries, children who were fed at school attended school more
frequently than those in control groups; this finding translated to an average
increase of 4 to 6 days a year per child. For educational and cognitive outcomes,
children who were fed at school gained more than controls on math achievement,
and on some short-term cognitive tasks. School meals may have small physical and
psychosocial benefits for disadvantaged children (2007, p. 8).
É bastante comum a associação das dificuldades de aprendizagem em crianças
em idade escolar com insuficiência na aquisição de micronutrientes. No trabalho de
Kristjansson et al. (2007), ficou clara a capacidade dos programas de alimentação
escolar em ajudar a minimizar os impactos negativos da desnutrição sobre o
processo de aprendizagem. Os autores consideram que os programas de alimentação
escolar podem ter como objetivos: aliviar a fome no curto prazo (ALLEN, 2001
apud KRIJSTJANSSON et al., 2007); ofertar os micronutrientes essenciais ao
desenvolvimento saudável da criança; facultar o crescimento das crianças (ALLEN,
2001; LEVINGER, 1986 apud KRIJSTJANSSON et al., 2007); promover o
desenvolvimento cognitivo das crianças; e melhorar sua performance acadêmica
(LEVINGER, 1986 apud KRIJSTJANSSON et al., 2007). O estudo de Krijstjansson
et al. também afirma que “nos países em desenvolvimento a alimentação escolar visa
melhorar a frequência escolar, a participação e encorajar os estudantes”.
A conclusão mencionada válida para países em desenvolvimento pode ser
corroborada pela análise do programa de merenda escolar norte-americano.
Segundo evidências, a partir do National School Luch Program (NSLP) em atividade desde 1946, quando foi transformado em um programa de alcance nacional, o programa de alimentação escolar norte-americano cumpre o papel de
ampliar a frequência escolar. Atualmente, o NSLP atende a todas as crianças e
aos jovens do ensino elementar e secundário, cujas famílias possuam uma renda
máxima entre 131% e 185% da linha da pobreza. As refeições para os alunos são
subsidiadas, sendo que o Estado cobre até US$ 1,14 do valor da refeição, dependendo do tipo de alimentação e da família beneficiária8 (ROSSI, 1998, p. 67).
8. Dados de 1997-1998.
112
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
Segundo estudos realizados em diversas escolas norte-americanas nos anos 1980,
observa-se um aumento claro de frequência e pontualidade entre os alunos participantes do NSLP; entretanto, não foi possível concluir sobre a melhoria no
rendimento destes estudantes em disciplinas como linguagem, matemática e leitura. Por outro lado, existem evidências de que os almoços dos estudantes beneficiários continham calorias e nutrientes em excesso com evidentes implicações
sobre a situação de obesidade destas crianças e jovens (ROSSI, 1998, p. 76).
Um estudo mais abrangente foi realizado pelo Programa Mundial de Alimentos (PMA), segundo este organismo das Organiazação das Nações Unidas
(ONU), quando a alimentação foi oferecida nas escolas além da fome ter sido
aliviada imediatamente em um ano, a frequência escolar praticamente dobrou
(WFB, 2005). Logo, no que se refere a ampliação da frequência escolar há indícios claros de pontos de contato com o programa de alimentação, embora os seus
efeitos objetivos na nutrição não tenham sido constatados.
De acordo com Krijstajansson et al.(2007), pesquisas apresentadas em encontro realizado no ano de 2000, a respeito do impacto da alimentação escolar
indicaram que existe baixa evidência dos benefícios nutricionais da alimentação
escolar, muito embora se possa apresentar fortes indícios de melhorias no processo de aprendizagem. Ao mesmo tempo, é preciso ressaltar, tal como afirma
MacIntyre (1992), citado por Krijstjansson et al., que a alimentação escolar
direciona-se muito mais aos sintomas da fome que às suas causas subjacentes.
Ou seja, embora o alimento possa dar uma satisfação imediata ao estudante, as
raízes da desnutrição nas crianças beneficiadas podem persistir.
O mesmo estudo encontrou efeitos positivos da alimentação escolar sobre o crescimento da massa muscular da criança em algumas situações especiais.
Já em relação à capacidade cognitiva das crianças, os testes mostraram que existem
efeitos de longo prazo, além de outros impactos de curto prazo como mudanças
metabólicas que aumentam a oferta de energia para as crianças (KRIJSTJANSSON
et al., 2007, p. 23). Em termos de comportamento, a pesquisa dos autores referidos
indica que houve melhoria na interação das crianças nas atividades da escola após a
oferta da alimentação escolar.
Para resumir, o estudo dos autores referenciados indica que os impactos
são pequenos em termos antropométricos. No entanto, ressaltamos as evidências de que a alimentação escolar trouxe uma melhoria nos indicadores relativos
a inteligência, capacidade de compreensão e comportamento. Assumimos que a
magnitude dos benefícios depende do desenho do programa.
Greenhalgh, Kristjansson e Robinson (2007, p. 858) em artigo publicado no
British Medical Journal, corroboram com essas afirmações e reforçam o fato de que:
Algumas Reflexões sobre os Programas de Alimentação Escolar na América Latina
113
(...) apesar de se verificar que os programas têm um efeito significativo no crescimento e no desempenho cognitivo das crianças, as pesquisas realizadas tiveram muitos
desenhos diferentes e foram implementadas em contextos sociais e sistemas educacionais variados, por pessoas das mais diferentes formações, culturas e crenças; e com
uma ampla variação no ambiente econômico e contexto político.
As autoras mostram que uma pesquisa realizada com o fornecimento de suplementos à base de leite para estudantes na Grã-Bretanha em 1920, período de
recessão, mostrou um efeito evidente sobre o crescimento das crianças. A mesma
pesquisa, com o mesmo suplemento a base de leite, foi aplicada em crianças britânicas em 1970, quando não apresentou benefício significativo (GREENHALGH;
KRISTJANSSON; ROBINSON, 2007, p. 859).
Ainda que reconheçamos a necessidade de uma avaliação mais detalhada
a respeito dos impactos dos programas de alimentação escolar sobre variáveis
como: peso, altura, desenvolvimento cognitivo e melhorias nutricionais em geral,
é importante reconhecer que os impactos existem e que os desenhos das políticas devem abrir possibilidades que permitam maximizar estes efeitos positivos
almejados pela alimentação escolar. Vale lembrar que em muitos casos uma boa
alimentação escolar pode influenciar a mudança de hábitos alimentares da família, mas também pode acontecer de a alimentação na escolar induzir uma redução
da quantidade de alimento servido a esta criança em seu lar (GREENHALGH;
KRISTJANSSON; ROBINSON, 2007, p. 860).
Na próxima seção, faremos um panorama das características principais dos
programas de alimentação escolar em diferentes países da América Latina.
4 O “ESTADO DA ARTE” DOS PROGRAMAS DE ALIMENTAÇÃO ESCOLAR NA
AMÉRICA LATINA
Na América Latina, os programas de alimentação escolar já possuem algumas
décadas de existência. O Uruguai apresenta o mais antigo, com o surgimento
datado do começo do século XX, sendo que os demais pertencem aos anos 1950 e
1960 (COHEN; FRANCO, 2005). Apesar do caráter pioneiro destes programas,
a desnutrição ainda se apresenta com alta incidência na região como um verdadeiro problema de saúde pública ainda não solucionado.
Os eixos gerais perseguidos pelos PAEs são: o alívio da pobreza no curto
prazo associado à melhoria nos níveis nutricionais e a manutenção das crianças
na escola. Ao mesmo tempo, estes programas, para terem efetividade, demandam
fortemente investimentos em infraestrutura – saneamento básico, energia elétrica,
meios de transporte etc. – além de serem dependentes de uma coordenação institucional que pode estar nos âmbitos da sociedade civil, governo ou mesmo de
organismos internacionais.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
114
Segundo a FAO (2007), os PAEs são fundamentais para reduzir a pobreza e
a desigualdade econômica e social, tendo em vista que:
•
Provém alimento seguro e sustentável aos menores em idade escolar,
incentivam maior participação das crianças na escola e auxiliam na redução do abandono escolar e das dificuldades de aprendizagem.
•
Oferecem um percentual importante de calorias, proteínas e vitaminas
que as crianças necessitam para obter melhor nutrição.
•
Auxiliam a integração social e comunitária, contribuindo com a formação de capital social via participação de pais, professores e autoridades
locais no processo de distribuição, armazenamento, preparação e entrega de alimentos.
•
Oferecem oportunidade de aprendizagem e inovação pedagógica ao envolver diferentes atores no processo.
•
Contribuem para mobilização de recursos locais por meio da compra
de alimentos de pequenos produtores e utilização de recursos originários da comunidade.
•
Promovem a inserção de crianças e indígenas na escola e comunidade,
integrando enfoques de gênero sem discriminação por raça.
•
Nos casos em que estão associados aos programas de saúde, contribuem
para maior participação da comunidade em programas de saúde e nutrição.
Em relação a esta lista, podemos acrescentar mais dois aspectos de grande
importância para o desenvolvimento regional. Em primeiro lugar, do ponto de
vista econômico, os programas de alimentação escolar, quando bem desenhados, permitem o fechamento do circuito de geração de renda e distribuição dos
benefícios, promovendo o desenvolvimento local e evitando transbordamentos
desta renda. Em segundo lugar, do ponto de vista do “empoderamento”, estes
programas promovem a transparência nas relações sociais aproximando o poder público com os pais de alunos e a sociedade civil organizada. Em resumo,
a gestão local dos recursos da alimentação escolar reforça o sentimento de
pertencimento comunitário.9
Na América Latina, os programas de alimentação escolar generalizaram-se
nos anos 1950, a partir de repasses de recursos e alimentos provenientes da ajuda
humanitária internacional, por exemplo, o programa PL 480 dos Estados Unidos.
9. Conforme definição apresentada por Cepal (2007b, p. 39), o sentimento de pertencimento pode ser medido
objetivamente por cinco indicadores, a saber: reconhecimento multicultural por parte da sociedade, confiança nas
instituições do Estado, espaços de participação, expectativas sobre o futuro e solidariedade.
Algumas Reflexões sobre os Programas de Alimentação Escolar na América Latina
115
Segundo Levine (2008), a doação de alimentos tinha como objetivo reduzir o
superávit de produção dos agricultores norte-americanos e já havia sido aplicada
durante os anos 1930, nos Estados Unidos, para garantir a alimentação escolar.
Nos anos 1950, no contexto da Guerra Fria e visando alimentar o terceiro mundo, o Congresso norte-americano aprovou a doação de alimentos como forma de
conter os movimentos revolucionários que começavam a emergir em vários países
da região. Milhares de toneladas de trigo, milho e leite em pó foram enviados aos
países com nomes de sugestivos programas como Aliança para o Progresso e Alimentos para a Paz. Relatórios do governo Johnson, nos anos 1960, mencionados
por Levine, indicam que praticamente nada se sabia entre os doadores acerca dos
hábitos alimentares das populações que iriam receber os alimentos doados.
Em 1962, a ONU criou o Programa Mundial de Alimentos, organismo
voltado para o desenvolvimento de programas emergenciais de doação. Em pouco
tempo, o PMA passou a administrar uma parte importante dos excedentes norteamericanos, sendo que os Estados Unidos transformaram-se no principal doador.
Segundo Marchione (2002), aproximadamente metade do que o PMA faz como
doação atualmente vem dos Estados Unidos. Muito embora o PL 480 tenha um
orçamento anual aprovado pelo Congresso, a ajuda alimentar norte-americana
pode extrapolar este total sempre que houver excedentes agrícolas sem colocação no mercado (MARCHIONE, 2002, p. 210). Os programas de alimentação
escolar em boa parte da América Central foram estruturados com base nos excedentes americanos, à semelhança dos programas dos anos 1930. Mais tarde, em
1946, os países da América Central passaram a orientar-se no programa nacional
norte-americano, após a institucionalização do National School Lunch Program
nos Estados Unidos (BICKEL & ANDREWS, 2002). Posteriormente, estes programas foram transferidos para a administração do PMA. Atualmente, o PMA
sustenta programas de alimentação escolar em 74 países atendendo 21,7 milhões
de estudantes em 2005.10
A partir do documento Programas de Alimentación Escolar en América
Latina y el Caribe,11 é possível reter que, entre os países analisados,12 o Brasil
é o único que apresenta um desenho de PAE de caráter puramente universal,
em que todas as crianças que frequentam escolas da rede pública nos níveis da
pré-escola e educação primária recebem refeições, cujo fornecimento tem frequência anual, embora a lei garanta a alimentação para apenas e tão somente
os 200 dias letivos.
10. Disponível em: <http://www.wfp.org/food_aid/school_feeding/Docs/WFP%20SFfactsheet%20SP06.pdf>.
Acesso em: 31 jul. 2008.
11. Preparado para o escritório regional da FAO para a América Latina e o Caribe, com nossa participação durante o
ano de 2007.
12. Os países analisados pelo documento foram: Argentina, Bolívia, Brasil, Colômbia, Chile, Equador, Guatemala,
Honduras e México.
116
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
Os demais países apresentam programas focalizados, seja no quesito renda ou em termos geográficos. Dessa maneira, apenas os grupos mais pobres
ou de regiões escolhidas recebem a merenda escolar. Por exemplo, a Bolívia
focaliza seus programas em duas províncias, já a Colômbia focaliza o programa em áreas rurais e em localidades em que existe maior diversidade étnica.
Outros países oferecem a merenda escolar por poucos dias durante um ano
e, ao mesmo tempo, oferecem exclusivamente o café da manhã ou almoço –
quase não oferecendo ambos –, como podemos verificar no caso do Equador.
Já o Chile apresenta um programa de caráter universal em termos territoriais,
mas com seleção baseada na renda das famílias dos estudantes. O Chile parte
de um PAE com uma proposta universal; porém, com desenho focalizado em
que somente os estudantes de renda mais baixa obtêm o acesso à alimentação.
Este programa é administrado de forma centralizada pela Junta Nacional de
Auxilio Escolar e Becas (JUNAEB), encarregada de fazer as compras da merenda e definir os beneficiários do programa.
Conforme dados do inventário realizado pela América Latina Red de
Alimentación Escolar (LA-RAE),13 em dezembro de 2005, entre os países
latino-americanos, somente o Peru – além do Brasil – deixou de ter ajuda internacional para os seus PAEs. Ao mesmo tempo, este levantamento
aponta que somente o Brasil possui um programa de atendimento universal,
que funciona com recursos integrais originários de orçamentos públicos.
Os demais países têm estratégias diferenciadas de focalização, as quais priorizam um ou mais critérios, como municípios com alto índice de pobreza,
presença de escolas, locais em que os níveis de frequência escolar são baixos,
áreas rurais e regiões com populações originárias. Nos países que optaram
pela focalização, a seleção dos beneficiários é feita por meio de indicadores
de pobreza e carências materiais. De modo geral, comparando-se a situação
dos países na América Latina, os PAEs alcançam uma cobertura em torno
de 40% para alunos da pré-escola e ensino básico (TURPIN, 2008), o que
pode ser considerado muito baixo.
A respeito dos programas internos de cada país, Abreu (1995) apresentou
uma classificação em três grupos de países da América Latina:
1. Aqueles com economias menos complexas, de baixa industrialização,
em que não há tradição de intervenção do Estado na área social e a
execução do programa de merenda escolar é focalizada e centralizada,
existindo grande dependência externa, em que se enquadravam Bolívia,
Equador, Peru, Nicarágua e Guatemala.
13. Rede de pesquisadores, empresas e gestores envolvidos na alimentação escolar com a América Latina.
Algumas Reflexões sobre os Programas de Alimentação Escolar na América Latina
117
2. Os países com uma economia mais desenvolvida, cujos exemplos são a
Colômbia, a Venezuela e o Chile, em que a merenda ainda é administrada de forma altamente focalizada e centralizada, embora com maior
flexibilidade de gestão que os primeiros.
3. Os países que, assim como o Brasil, possuíam já no momento do estudo economias mais diversificadas, com significativa industrialização,
em que as políticas de alimentação escolar decorriam de uma longa história de atuação do Estado na área social, caracterizando-se por baixo
financiamento externo.
Na América Latina, tornou-se unânime o estabelecimento do objetivo
principal dos programas como sendo a promoção da equidade no sistema educacional. O objetivo de equidade poderia ser alcançado a partir dos
PAEs, uma vez que estes contribuem para a melhoria no acesso, a permanência e as habilidades de aprendizagem dos escolares mais vulneráveis,
bem como a garantia das suas necessidades nutricionais, particularmente de
carências específicas – ferro, vitamina A, iodo e cálcio. Com isso, estes alunos estariam em igualdade de condições com os outros escolares que se alimentam regularmente, desde que os programas se estabelecessem de forma
regular e com um aporte alimentar significativo. O México, por exemplo,
enfatiza a equidade de gênero no desenho do seu PAE. Bolívia e Colômbia
almejam o fortalecimento da pequena produção agrícola com a compra local, enquanto outros visam ao desenvolvimento de hortas escolares, como é
o caso da Argentina.
Em resumo, são poucos os países do mundo que possuem programas de
merenda escolar de alcance verdadeiramente universal. Na América Latina,
apenas três países possuem programas de merenda escolar com expressão nacional
e ampla cobertura: Brasil, Chile e Panamá. Embora no Chile, assim como nos
Estados Unidos, a alimentação escolar não possua características universais, pois
só está disponível para os alunos que se declaram ou são considerados pobres.
Nos demais países da América Latina, a merenda escolar não tem cobertura
nacional – são programas localizados, não atendem todos os dias do ano letivo e
também não dispõem de fontes de financiamento fixas e constantes ao longo do
tempo, com base em legislação.
Em seguida, apresentamos um quadro resumindo as principais características dos PAEs em países da América Latina, segundo os últimos dados disponíveis.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
118
QUADRO 1
Caracterização dos programas de alimentação escolar na América Latina1
País
Ano de
início
Focalizado/
universal
Alunos beneficiados (103)
Argentina
1964
F
1.978
Bolívia
1996
F3
1.274
Cobertura
Gasto anual
(US$106)2
Gasto dia/
aluno (US$)
Tipo de
alimentos
Dias/ano
200 dias
Básica
75
0,15
Desjejum e
almoço
Básica
20,2
0,08
Desjejum
Sem inf.
1.490
5
0,13
Lanches ou
almoços
200 dias
1954
U
34.600
Pré-escolar
e básica
Colômbia
1941
F
2.612
Pré-escolar
e básica
39,2
0,08
Desjejum,
lanche e
almoço
1426
Costa Rica
Sem inf.
F
666
Pré-escolar
e básica
20,9
0,30
Desjejum e
almoço
Sem inf.
1964
U7
2.835
Pré-escolar
e básica
165,7
0,50
Desjejum e
almoço
180 dias
Brasil
4
Chile
Equador
1987
F
2.189
Básica
30,1
0,12
Desjejum e Apenas parte
almoço
do ano escolar8
Guatemala
1956
F
2.706
Pré-escolar
e básica
27,2
0,09
Lanche
Sem inf.
Honduras
1970
F
1.826
Básica
9,9
0,57
Desjejum
200 dias
México
1960
F
18.351
Básica
286,4
0,26
Desjejum
Sem inf.
Nicarágua
1994
4,9
0,06
Lanche
Sem inf.
Leite e
bolachas e
almoços
150 dias
9
F
938
Pré-escolar
e básica
Panamá10
Sem inf.
U
473
Básica
18,711
0,26
Paraguai
Sem inf.
F
1.384
Básica
5,0
0,05
Peru
1950
F
4.508
Pré-escolar
e básica
75,4
Uruguai
1910
F
405
Básica
Sem inf.
F
5.427
Básica
Venezuela
12
Sem inf.
0,13
Desjejum e
almoço
Sem inf.
16,6
0,39
Desjejum,
lanche e
almoço
Sem inf.
55,8
0,38
Desjejum,
lanche e
almoço
Sem inf.
Elaboração dos autores.
Notas: 1 Esta tabela foi construída com base em estudo desenvolvido por Zepeda (2008), Infante Barros (2005) e FAO (2007).
Os dados foram compilados basicamente a partir de dados de 2007, apenas o caso do Brasil é que apresentou dados
atualizados para 2008.
2
Do governo central, exceto Brasil, com estimativa de contribuição dos estados e municípios.
3
Em artigo retirado do site <http://www.oei.es/noticias/spip.php?article1303>, tem-se que a Bolívia irá promover a
universalização do PAE. O artigo é datado de 5 de novembro de 2007.
4
PNAE do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE)/Ministério da Educação (MEC) para 2008. Disponível em: <http://www.fnde.gov.br/>. Acesso em: 21 jul. 2009.
5
Considerando-se o gasto de R$1,6 bilhão do governo federal com uma complementação integral deste valor, segundo
a lei, cumprido por apenas 50% dos municípios. Transformado em dólares ao câmbio médio de 2008 de R$ 1,90/US$.
6
Dados para 2006, informação retirada do documento da FAO (2007).
7
O programa é considerado universal porque qualquer aluno da rede de ensino do Chile tem direito de pedir a alimentação escolar; entretanto, existe um critério de seletividade que coloca que apenas os alunos carentes, com renda
abaixo de um determinado patamar, terão acesso à alimentação escolar. Portanto, o programa pode ser classificado
como universal com critério de seletividade.
8
O dado mais recente coloca a oferta de 88 dias de desjejum e 54 dias de almoço, este dado foi coletado para o ano
de 2004 (FAO, 2007).
9
Disponível em: <http://emaberto.inep.gov.br/index.php/emaberto/article/viewFile/1010/912>. Acesso em: 25 ago. 2008.
10
Ministério de Educação do Panamá (Meduca) para 2007.
11
Média dos anos 2005-2007.
12
Nasceu com ajuda da United States Agency for International Development (USAID), via programa Alimentos para o
Desenvolvimento. Ver Martinez (2005).
Algumas Reflexões sobre os Programas de Alimentação Escolar na América Latina
119
Acompanhando a situação dos programas de alimentação escolar na América Latina, observamos alguns movimentos recentes que poderão alterar o quadro apresentado:
Há informações que, no caso da Bolívia,14 o governo haveria encaminhado uma
lei que garantiria a universalização do Programa de Alimentação Escolar, a partir de
2007. Os recursos para o financiamento desta expansão viriam das rendas decorrentes
do aumento dos preços do gás natural extraído do solo boliviano. Entretanto, não há informações sobre os desdobramentos desta lei nem de seus impactos no período recente.
No caso da Nicarágua, em 1994, foi iniciado o Programa Integral de Nutrición Escolar,15 o qual deu um caráter permanente com temporalidade indefinida
ao PAE na Nicarágua. Este programa procura reunir as várias ações pulverizadas
existentes na Nicarágua, com objetivos semelhantes ao PAE, mas que tiveram seu
surgimento datado de 25 a 30 anos atrás.
Recentemente no Uruguai, o governo anunciou uma diferenciação na alimentação servida por tipo de escola e região. A alimentação escolar teria oferta
universal, mas ocorreriam distinções.16 Por exemplo, nas escolas rurais, todas as
crianças receberiam almoço diário; já nas escolas especiais, com jornada de oito
horas diárias, todos os alunos receberiam desjejum, almoço e merenda, enquanto
nas escolas urbanas, o almoço seria servido de acordo com a demanda.
O objetivo do quadro 1 foi apresentar um breve panorama das ações para alimentação escolar na América Latina, cujo objetivo maior foi a descrição da situação
destas intervenções e a demonstração da enorme heterogeneidade que existe entre
estes países no que se refere à cobertura, valores de refeição escolar e público beneficiado. Além disso, o quadro visou corroborar com os objetivos deste artigo, qual seja,
o de apontar as características centrais dos PAEs em praticamente todos os países da
região e indicar que, dado o caráter generalizado destes programas, muito embora a
sua heterogeneidade, estes poderiam ser utilizados como ferramenta para promover
melhorias nutricionais às crianças latino-americanas e dinamizar as economias locais.
5 CONCLUSÕES
Este artigo procurou demonstrar a abrangência dos programas de alimentação escolar na América Latina e suas possibilidades enquanto instrumentos de melhoria na
educação de crianças e adolescentes. O artigo apresentou evidências de que a alimentação escolar tem potencial para melhorar a situação nutricional do público escolar,
desde que as refeições sejam oferecidas em número e quantidade suficientes. Ademais,
observou-se, tendo em vista os casos estudados, que, quando articulada à produção
local, a alimentação escolar pode ser um poderoso instrumento de dinamização local.
14. Disponível em: <http://www.oei.es/noticias/spip.php?article1303>. Acesso em: 31 jul. 2008.
15. Disponível em: <http://emaberto.inep.gov.br/index.php/emaberto/article/viewFile/1010/912>. Acesso em:
31 jul. 2008.
16. Disponível em: <http://emaberto.inep.gov.br/index.php/emaberto/article/viewFile/1003/906>. Acesso em: 31 jul. 2008.
120
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
Existem muitos modelos de programas adaptados às realidades locais e restritos à capacidade financeira dos governos. Entretanto, para enfrentamento da
questão da pobreza e fome na América Latina, é essencial que haja uma complementação de esforços entre as comunidades, entidades governamentais e agências
multilaterais, de maneira a avançar no sentido da promoção de melhorias nos
sistemas educacionais incluindo o apoio à saúde e à infraestrutura. Os PAEs poderiam ser o motor e a pedra de toque destas mudanças.
Outro aspecto essencial dos PAEs refere-se à sua gestão. A observação dos
casos latino-americanos mostrou que são majoritariamente focalizados, indicando que poucos destes programas são descentralizados ao nível de região e geridos
democraticamente. A descentralização faculta o atendimento diferenciado dos
diversos grupos sociais, a promoção da capacitação e a educação nutricional; e
incorpora os programas de saúde e nutrição por meio de uma dieta rica e capaz
de manter o respeito às tradições locais.
Os levantamentos já realizados sobre o tema na América Latina destacam o
caso do Brasil com um programa de alimentação escolar de desenho universal e
descentralizado, cujos aportes de recursos são completamente definidos por orçamento do governo federal com perenidade garantida por lei. Outros países como
Panamá e Chile possuem programas de abrangência nacional, mas no caso do
Chile, sua ação é direcionada, ou seja, há um processo de seletividade e focalização na oferta do programa de alimentação escolar.
Tendo em vista o cenário de um permanente aumento nos preços dos alimentos, a alimentação escolar apresenta-se como elemento crucial e um dos pilares de
uma política social para os países de baixa renda. Como observamos, a alimentação
escolar garante o acesso mínimo das crianças à alimentação combatendo a fome
imediata, ao mesmo tempo em que pode permitir a dinamização das economias
locais. No longo prazo, a melhoria nos níveis nutricionais das crianças depende de
outros fatores, como a renda das famílias, a saúde e outros investimentos em infraestrutura. Ainda que não existam dados consolidados a respeito dos impactos da
alimentação escolar sobre nutrição e rendimento escolar das crianças, é importante
utilizar a alimentação escolar para aumentar os efeitos positivos sobre os três eixos
que a política pode afetar, quais sejam: desenvolvimento local, aproveitamento
escolar e ampliação da segurança alimentar da população.
Os PAEs aplicados na América Latina são muito heterogêneos e, com isso,
seus resultados dependem em muito dos seus desenhos. O texto buscou indicar a
importância de um programa de alimentação escolar em países nos quais persistem
a mortalidade infantil e a fome. Em termos de resultados, demonstramos que os
PAEs promovem ampliação da frequência escolar, mas efeitos nutricionais precisam
ainda ser melhor investigados. No que se refere à dinamização local, podemos perceber que os municípios que fizeram localmente as compras para a merenda escolar
conseguiram ampliar a renda da sua população e dinamizaram o comércio regional.
Algumas Reflexões sobre os Programas de Alimentação Escolar na América Latina
121
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GOVERNANÇA ELETRÔNICA NO BRASIL: LIMITES E POSSIBILIDADES
INTRODUZIDOS PELO ORÇAMENTO PARTICIPATIVO NA INTERNET
Rafael Cardoso Sampaio*
Este artigo busca inicialmente comparar os conceitos de governo eletrônico e governança
eletrônica. O primeiro, em nossa concepção, está relacionado à oferta de serviços eficientes e
cômodos ao cidadão pela internet. Há controvérsias no conceito de governança eletrônica, mas o
caracterizamos como estando ligado a políticas públicas, participação popular e interações diversas
entre sociedade civil e Estado. Em um segundo momento do artigo, apresentamos modelos de
orçamento participativo na internet como possíveis exemplos brasileiros de governança eletrônica.
O Orçamento Participativo de Porto Alegre apresentou fortes características informativas e de
monitoramento do Estado. O modelo de Belo Horizonte focou-se na participação direta dos
cidadãos. Na parte final do artigo, tentamos demonstrar que o modelo desejável de governança
eletrônica pode ser alcançado por um amálgama dos dois processos.
Palavras-chave: Governo Eletrônico; Governança Eletrônica; Orçamento Participativo; Internet;
Participação Política.
Eletronic Governance in Brazil: limits and possibilities with the
introduction of Internet in the Participatory Budget
This paper looks after a comparison between the concepts of electronic government and electronic
governance. The first one, in my view is related to an offer of efficient and confortable services given
to the citizen through the internet. There are some controversies between the concept of electronic
governance, but I define it as connected to public politics, popular participation and several interactions
between society and the State. In a second moment of the article, I present models of Participatory
Budgeting in the internet as examples of electronic governance in Brazil. The Participatory Budgeting
of Porto Alegre presented strong informative e state monitoring characteristics. The Belo Horizonte’s
model focused on the direct participation of the citizens. In the last part of the study, I try to show that
the desirable model of electronic governance can be achieved by a fusion between the two process.
Key words: Electronic Government; Electronic Governance; Participatory Budgeting; Political Participation.
GOVERNACIÓN ELECTRÓNICA EN BRASIL: LIMITES Y POSIBILIDADES
INTRODUCIDAS POR EL PRESUPUESTO PARTICIPATIVO EN INTERNET
El artículo inicialmente compara los conceptos de gobierno electrónico y gobernación electrónica. El
primero, según nuestra concepción, está relacionado con la oferta de servicios eficientes y cómodos a los
ciudadanos por Internet. El segundo, aunque haya controversias en torno su concepto, lo relacionamos
con las políticas públicas, participación popular e interacciones diversas entre la sociedad civil y el Estado.
En un segundo momento, presentamos en el artículo modelos de Presupuesto Participativo Virtual como
ejemplos brasileños de gobernación electrónica. El Presupuesto Participativo de Porto Alegre indica fuertes
* Jornalista, especialista em Comunicação e Política pelo Uni-BH e mestrando em Comunicação Social pela Universidade
Federal de Minas Gerais (UFMG). E-mail: [email protected]
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
124
características informativas y de control del Estado, mientras el modelo de Belo Horizonte se enfocó en la
participación directa de los ciudadanos. Al final del artículo, intentamos enseñar que el modelo deseable
de gobernación electrónica puede ser obtenido por medio de una fusión de los dos procesos.
Palabras-clave: Gobierno Electrónico; Gobernación Electrónica; Presupuesto Participativo; Internet;
Participación Política.
GOUVERNANCE ÉLECTRONIQUE AU BRÉSIL: LIMITES ET POSSIBILITÉS
INTRODUITES PAR LE BUDGET PARTICIPATIF DANS INTERNET
Cet article vise d’abord à comparer les concepts de l’administration électronique et la gouvernance
électronique. Le premier, dans notre design, est liée à la fourniture de services au public, des
chambres et l’Internet. Il existe des controverses sur la notion de la gouvernance électronique, mais
se caractérise comme étant liées à des politiques publiques, la participation populaire et l’interaction
entre les divers de la société civile et l’État. Deuxièmement, l’article présente des modèles de
budget participatif brésilien Internet que possible des exemples de gouvernance électronique. Le
budget participatif de Porto Alegre ont montré des caractéristiques fortes de l’information et de
surveillance de l’état. Le modèle de Belo Horizonte porté sur la participation directe des citoyens.
À la fin de l’article, nous montrons que le modèle souhaitable de la gouvernance électronique peut
être obtenu par une fusion des deux processus.
Mots-clés: Administration Électronique; Gouvernance Électronique; Budget Participatif; Participation
Politique.
1 INTRODUÇÃO
A internet foi inicialmente considerada por uma gama de pesquisadores1 como
a solução para os problemas da apatia política da população e também da crise
de representação democrática. Primeiramente, os governantes passaram a ter em
mãos uma ferramenta que permitia informar a população de suas realizações e
também abrir espaço para que o cidadão relatasse seus anseios e necessidades,
ambos dispensando o uso de intermediários como a mídia massiva e os partidos
políticos (COLEMAN et al., 2008; GOMES, 2005a; BENTIVEGNA, 2006).
Outros autores consideram o próprio caráter anárquico e mais fluido da internet
como catalisador da participação popular.
Enquanto instituições territoriais tradicionais eram mais hierárquicas e rígidas, a
Internet tende a privilegiar modos de relacionamento transversais e estruturas mais
fluidas, mais alinhadas com as estruturas de rede que caracterizam os processos
sociais e políticos nas sociedades democráticas modernas. O potencial democrático
específico da Internet baseia-se em sua estrutura não-hierárquica e cibernética que,
em princípio, favorece a interatividade (FREY, 2000, p. 37).
1. Diversos textos traçam divisão entre uma linha otimista e outra cética em relação à internet e suas possibilidades
democráticas, buscando-se compreender o debate e inserir-se em uma linha intermediária mais preocupada com a
questão dos efetivos usos da internet e suas consequências, a citar: Coleman et al. (2008); Dahlgren (2005); Gomes
(2005a, 2005b); Maia (2007); Marques (2006); Wright e Street (2007).
Governança Eletrônica no Brasil...
125
A participação política da sociedade civil também seria facilitada pela internet,
uma vez que o cidadão pode participar de qualquer ponto conectado à rede, não necessitando de sua presença física. A própria questão temporal se torna relativa, visto
que a internet permite uma comunicação assíncrona em que os participantes não
precisam estar em copresença temporal para realizarem um diálogo. Finalmente, a
internet – diferentemente de ferramentas antigas como o envio de cartas aos representantes – abre possibilidades interativas, haja vista que o cidadão também passa
a ser emissor, criador de mensagens e de conteúdo no mundo virtual. A velocidade
desta criação e seu baixo custo permitem respostas mais rápidas de ambos os lados
e maior interlocução entre Estado e sociedade (GOMES, 2005a; MAIA, 2007).
Uma gama de pesquisadores foca seus estudos nas potencialidades de uso da internet pela instituição governamental, ou seja, como a internet pode ser usada para
criar serviços públicos mais personalizados e direcionados ao povo, que além de mais
efetivos, sejam capazes de criar redes sociais e novas formas de participação democrática, além de maior interação entre população e Estado (FREY, 2000). Tal uso da internet é tanto tratado como governo eletrônico (CHADWICK, 2003; JAEGER, 2005)
quanto governança eletrônica (FREY, 2000; FREY; REZENDE, 2005).
Mas qual a diferença entre os termos? E como a governança eletrônica tem
sido desenvolvida no Brasil? O objetivo do artigo é apresentar as experiências concretas dos orçamentos participativos (OP) na internet como possíveis projetos de
governança eletrônica, evidenciando as características fortes e fracas dos processos
no que diz respeito à promoção de valores democráticos.
Na segunda seção do estudo, fazemos a diferenciação entre os conceitos de
governo eletrônico e governança eletrônica. Evidenciamos que se tratam de conceitos
similares ou até idênticos de acordo com o pesquisador e apresentamos assim uma
síntese da governança eletrônica que almejamos. Na terceira seção, apresentamos e
avaliamos os sites do Orçamento Participativo Eletrônico (E-OP) de Porto Alegre
e do Orçamento Participativo Digital (OPD) de Belo Horizonte. Apesar do primeiro
se tratar de expansão do processo presencial para a internet e o segundo se apresentar
como programa totalmente realizado pela internet, a comparação mostra-se frutífera.
Primeiramente, porque o programa porto-alegrense permite realizar determinadas
funções exclusivamente pelo ambiente online. Segundo, porque o programa apresenta determinadas características fortes exatamente por estar vinculado ao processo
presencial, o que, como evidenciaremos, não acontece no OPD de Belo Horizonte.
Apresentamos indícios de que o E-OP apresenta duas fortes características: ambiente informativo denso para consulta popular e ferramentas que fortalecem a accountability governamental ao permitir acompanhamento de obras do OP. O OPD,
por sua vez, apresenta diversas ferramentas participativas como fórum, chat e mural
de recados, mas se foca na participação direta do cidadão pela votação eletrônica.
126
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
Na quarta seção, retomamos o conceito de governança eletrônica desejável e mostramos que ela é alcançável se mesclarmos os pontos fortes dos dois casos apresentados.
Na quinta seção encontram-se as conclusões do presente artigo.
2 GOVERNO ELETRÔNICO VERSUS GOVERNANÇA ELETRÔNICA: DISTINÇÕES
E SIMILARIDADES
Para melhor compreender a inserção dos orçamentos participativos na internet
utilizaremos algumas teorias a respeito de governança eletrônica. O termo, todavia,
não exprime conceito único ou aceito de maneira abrangente, mas possui inúmeras definições, que variam de acordo com o ponto de partida do pesquisador.
Outro problema constante é o conflito com o conceito de governo eletrônico.
O erro conceitual, todavia, é esperado, uma vez que diferentes pesquisadores ora atribuem características distintas a cada um dos conceitos, ora tratam os
termos como sinônimos. Pode-se afirmar que governo eletrônico é um conceito
mais abrangente, no qual as novas tecnologias de informação e comunicação são
aplicadas às funções de governo, que podem visar a diferentes setores, o cidadão
ou o mercado. Tem o potencial de diminuir custos, desenvolvimento econômico, redução da redundância, maior transparência e accountability e aprimorar
serviços para os cidadãos como melhores condições de acesso à informação e
a serviços governamentais, ampliando a qualidade destes serviços e garantindo
maiores oportunidades de participação social no processo democrático (FREY;
REZENDE, 2005; JARDIM, 2004; JAEGER, 2005; RUEDIGER, 2002).
Entre as possíveis abordagens sobre a internet e em especial sobre governo eletrônico, alguns autores destacam uma linha, que tenderia a enfatizar a questão informacional ou clientelista,2 ou ainda, uma relação de cima para baixo – top-down – ou vertical entre representantes e representados (CHADWICK, 2003; DAHLGREN, 2005;
GOMES, 2005a). Nesta visão, os cidadãos pouco podem interferir no meio político.
É a blindagem antipúblico caracterizada por Gomes (2005a) e Bentivegna
(2006) na qual o sistema político arma barreiras contra a participação dos cidadãos. Mesmo quando há ferramentas e possibilidades participativas e interativas,
elas não são efetivamente capazes de alterar a lógica de tomada de decisões ou o
funcionamento do sistema político.
Entretanto o cidadão não é ignorado. As tecnologias de informação e comunicação (TICs) permitem um governo mais próximo às pessoas por meio das
consultas online. A informação pode ser usada para aprimoramento das políticas e
administração na forma de guia, logo o cidadão pode influenciar as decisões políticas por intermédio do ambiente virtual, em especial pelas ferramentas oferecidas
nos sites governamentais (CHADWICK, 2003).
2. O termo não visa criticar determinadas práticas. No caso, o cidadão é tratado como cliente.
Governança Eletrônica no Brasil...
127
Nessa linha, o bom governo eletrônico seria caracterizado essencialmente por
reduzir custos estatais por um lado e prover melhores serviços ao cidadão por outro.
O cidadão é um cliente ao qual o governo deve fornecer serviços. O uso das novas
tecnologias seria uma forma de maximizar esta entrega de serviços, que poderá ser feita de maneira mais rápida e eficiente (GOMES, 2005a; FREY; REZENDE, 2005;
JARDIM, 2004). Assim, a excelência é essencialmente caracterizada por transparência e
accountability, ambos alcançados por sites que permitam a vasta utilização de serviços do
governo e que estejam repletos de informações governamentais relevantes aos cidadãos.
A segunda linha tende a caracterizar o governo eletrônico como um experimento em construção, um produto inacabado. Desta forma, “considerando
sua natureza eminentemente política, bem como pública, deve necessariamente ser percebido como um processo em constante desenvolvimento” (FREY,
REZENDE, 2005, p. 55).
O foco é a participação social no processo democrático e a intervenção direta
da vontade civil no interior das instâncias decisórias do Estado (GOMES, 2005a;3
JARDIM, 2004). Este modelo considerado forte, deliberativo, transformador ou
mesmo radical (CHADWICK, 2003; FREY, 2000; GOMES, 2007) implica em
mudanças profundas na própria forma de administração, que passará a ser permeada por informações fornecidas pela população, criando assim uma interatividade
“mais complexa, horizontal e multidirecional” (CHADWICK, 2003).
Nessa visão, surgem algumas definições para governança eletrônica. Aqui os
dois conceitos se imbricam e até se confundem. Fica difícil caracterizar o limite
do e-governo e o começo da e-governança. O segundo acaba aparecendo como
parte ou mesmo como um estágio do primeiro, “seria um passo fundamental para
uma gestão moderna e eficiente, porém, sobretudo efetivamente promotora de
preferenciais democráticos na sociedade” (RUEDIGER, 2002, p.1). Ou ainda,
como definido por Jardim:
O termo e-governance (governança eletrônica) centra-se em uma visão ampla de governabilidade, sinalizando como opera, trabalha e se organiza a sociedade à qual o governo
deve assegurar o acesso e a participação em diversas redes de informação. Possui um
sentido mais amplo e abarca o conceito de e-government, o qual teria como foco as
tarefas gerenciais que conduzem à interação cidadania-governo. Do ponto de vista estritamente tecnológico, o E-gov visaria o cidadão como um ponto a conectar dentro de
uma rede, enquanto a governabilidade eletrônica asseguraria o acesso e participação dos
cidadãos individual e coletivamente dentro das redes governamentais (2004, p. 6-7).
3. Gomes (2005a) não trata exatamente sobre governo eletrônico ou governança eletrônica, mas sim de problemas
existentes no verbete democracia digital. Não desejamos mesclar os termos ou tomá-los como sinônimos. Ao longo do
texto, apenas usamos algumas referências a ações governamentais no ambiente online e características da internet
destacadas por Gomes para auxiliar nossa argumentação. Para uma discussão mais profunda a respeito de democracia
digital, ver também Gomes (2007).
128
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
De modo semelhante ou complementar, a governança eletrônica corresponde ao modo ou ao processo de conduzir uma sociedade para melhor atingir suas
metas e interesses, sendo a participação civil uma das possibilidades de se realizar
uma renovação dentro do aparato estatal e uma rearticulação entre Estado e sociedade (FILHO; CARNEIRO, 2008).
Todavia o melhor provimento de serviços públicos aos cidadãos não implica
necessariamente em mudanças estruturais do Estado. Tais mudanças implicam
em uma “governança social negociada” com base na criação de canais de participação popular e parcerias entre público e privado; “a ênfase está no aumento de
poder social, ou seja, a inclusão e o fortalecimento dos não poderosos nos processos de tomada de decisão política, enquanto que a eficiência administrativa é
considerada um objetivo subordinado” (FREY, 2000, p. 35).
Para Frey, as TICs acabam sendo catalisadores do processo, pois oferecem
ferramentas que permitem a criação de novos modelos de redes sociais e políticas,
além de permitirem novas formas de participação democrática. A internet privilegia modos de relacionamentos transversais e estruturas mais fluidas, semelhantes
às estruturas de rede que caracterizam os processos sociais e políticos das sociedades modernas (FREY, 2000, p. 37).
Ruediger apresenta uma proposta semelhante ao afirmar que se constitui
um Estado virtual, extensão do real, facilitador das mudanças institucionais e capaz de promover um Estado para reinvenção do governo real.
Isso, tanto pela articulação em rede dos diversos segmentos da administração, como
pela introdução de mudanças estruturais do Estado, incluindo a transparência de
processos e sua maior eficiência e permeabilidade, induzindo a uma reforma estrutural da esfera pública. Impossível, portanto, nessa perspectiva, deixar de insistir
aqui na sociedade civil, e na possibilidade desta de acessar de forma abrangente,
por meios eletrônicos, o governo, e interferir positivamente na agenda pública,
resgatando por uma perspectiva republicana a esfera estatal (2002, p. 3).
Os dois autores, todavia, concordam que essas transformações do Estado
não se darão unicamente pela introdução das TICs no governo. A internet não
foi criada para promover cidadania. Por outro lado, ela tem potencialidades democráticas e pode ser usada para renovar os modos de participação popular e
de tomada de decisões governamentais (FREY, 2000). É preciso antes de tudo
vontade política. O Estado deve considerar os novos recursos tecnológicos como
elementos fundamentais em suas estratégias de reforma administrativa, participação política e desenvolvimento urbano (FREY; REZENDE, 2005, p. 10).
A questão dos problemas da democratização e reestruturação do estado, passa pela superação da dicotomia entre membros do estamento de governo e sociedade civil, e pode ser
alcançado no campo da utilização das novas mídias interativas, a partir de uma abertura
Governança Eletrônica no Brasil...
129
planejada do projeto para a inclusão de percepções diversas, que organizadas, ampliem
a responsabilidade dos sistemas e, mesmo, alterem sua relação hierárquica, promovendo
mecanismos de participação nos processos de formulação e feedback da administração,
transformando, notadamente, os mecanismos de serviços ad hoc de governo eletrônico
em mecanismos políticos e sistêmicos de governança (RUEDIGER, 2002, p. 22)
Agora, não apenas a questão institucional será suficiente para a governança
eletrônica ser implementada, uma vez que logicamente ela depende da população e é voltada para a mesma. Frey e Rezende (2005) – apesar de afirmar que há
necessidade de um Estado engajado, disposto a permitir contribuições da população local para influenciar a tomada de decisões –, afirma a necessidade de uma
vontade política da população em confiar no investimento do governo e assim
empregar as novas tecnologias para atingir seus objetivos particulares.
Ou ainda, não basta apenas disponibilizar ferramentas online para participação
cívica. É necessário que elas sejam efetivadas, ou seja, que elas possam romper a blindagem antipúblico descrita por Gomes (2005a) e Bentivegna (2006). Ferramentas
capazes de influenciar as decisões políticas, e que tenham efeitos concretos no planejamento e desenvolvimento das políticas públicas (FILHO; CARNEIRO, 2008;
FREY; REZENDE, 2005; JARDIM, 2004; RUEDIGER, 2002). Estudos acerca
de programas participativos, em especial OPs (AVRITZER, 2005, 2006), apontam
existir uma relação direta dos índices de participação popular com a efetividade dos
processos em uma espécie de efeito demonstração.
Podemos então resumir a governança eletrônica desejável,4 transformadora do Estado em três pontos básicos: primeiramente, i) é preciso vontade
política. Um Estado engajado disposto a desafiar as hierarquias tradicionais
de poder e assim permitir contribuições da população local para influenciar
tomada de decisões. Para tanto, a internet apresenta-se como ferramenta interessante para auxiliar esta renovação do Estado. Neste ponto, é importante
a oferta de ferramentas online; ii) que permitam a procura de informações
políticas qualificadas sobre o governo, que possibilitem monitoramento das
obras e realizações do Estado, que propiciem discussões públicas de qualidade,
capazes de facilitar a definição das políticas públicas necessárias aos cidadãos, e
principalmente que possibilitem uma participação civil ágil, viável, sem limites
de tempo e espaço, oferecendo comodidade, conforto, conveniência ao participante (GOMES, 2005a, 2005b). Finalmente, as ferramentas criadas para
estes fins devem ter efeitos reais, iii) no sistema político, que sejam percebidos
pelo cidadão, incentivando-o a continuar discutindo, votando e participando.
4. A governança eletrônica defendida ao longo do texto almeja fomentar diversos valores democráticos como
accountability, transparência, informação ampla ao cidadão e participação política, o que é tratado por alguns
pesquisadores como componentes da ideia de democracia digital. Optamos por não diferenciar os termos para não
criar um emaranhado desnecessário, mas a aproximação dos conceitos certamente é válida e interessante.
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No caso brasileiro, vários autores (FILHO; CARNEIRO, 2008; FREY,
2000; GOMES, 2005a, RUEDIGER, 2002) apontam o predomínio de sites governamentais focados na entrega de serviços públicos aos cidadãos, que ainda não
exibem nem ambientes informativos densos, nem efetivas ferramentas de participação popular. Ou seja, os sites do governo estariam mais próximos ao primeiro
modelo de governo eletrônico e ainda distantes da governança eletrônica, capaz
de reestruturar as relações entre sociedade civil e governantes.
A introdução dos orçamentos participativos na internet mostra-se como
possibilidade desta governança eletrônica. Na próxima seção, descreveremos
os programas online de Porto Alegre e Belo Horizonte e tentaremos evidenciar as características que os tornam próximos ou distantes da governança
eletrônica aqui definida.
3 ORÇAMENTO PARTICIPATIVO NA INTERNET E O POTENCIAL PARA
A GOVERNANÇA ELETRÔNICA
3.1 O E-OP: informação e transparência ao cidadão
O orçamento participativo foi criado em 1989 na cidade de Porto Alegre, fruto de
convergência de diversos fatores como: movimentos sociais organizados demandando por maior participação popular; a Constituição de 1988, que facilitava tal
participação nas decisões municipais e a vitória do Partido dos Trabalhadores (PT),
que montou sua plataforma política exatamente nesta abertura da prefeitura a uma
maior participação civil (AVRITZER, 2005).
Todavia, não dispomos do espaço ou mesmo da necessidade de se apontar
todo o histórico ou procedimentos5 do processo, que alternou entre momentos
de extrema euforia ou ceticismo (NAVARRO, 2005). O OP firmou-se na cidade
e alcançou proeminência entre população, meio político e meio acadêmico, sendo reconhecido como renovação institucional e governança popular com poder
efetivo para intervir no rumo das políticas públicas (AVRITZER, 2005, 2006;
NAVARRO, 2005; FUNG; WRIGHT, 2000).
O primeiro endereço eletrônico do OP de Porto Alegre foi elaborado em
1995 e apresentava informações simples como agenda de reuniões dos grupos e
o funcionamento básico do programa. Inicialmente, o site apenas replicava informações contidas em outras mídias como a imprensa, rádio, TV, folhetos da
prefeitura, jornais de comunidades etc. (PESSI, 2003). Não havia disponibilidade
de e-mail ou outras ferramentas de participação.
5. Ver Avritzer (2005, 2006) e Navarro (2005) para mais informações sobre o processo do OP de Porto Alegre.
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Em 2000, é inserida a ferramenta para prestação de contas, que permitia
ao cidadão acompanhar a contratação e execução de obras e a implementação de
serviços municipais. Tal ferramenta permitiu monitoramento constante sobre o
estágio das obras e dos serviços sendo realizados pelo OP presencial.
Em 2001 inicia-se o processo que podemos chamar de orçamento participativo eletrônico,6 no qual foi introduzida a ferramenta para inserção de sugestões
de obras pela internet. Tal possibilidade aproxima-se a um projeto de governança
eletrônica, ligada ao OP, por parte da prefeitura de Porto Alegre. Por intermédio
do site do E-OP – <http://www2.portoalegre.rs.gov.br/op/> – era possível enviar
demandas de obras a serem realizadas pelo OP presencial. Tais demandas eram
avaliadas por técnicos da prefeitura e retornadas aos cidadãos com as adaptações
necessárias. No caso de aprovação da demanda, as sugestões enviadas pela internet
eram inseridas e avaliadas nas assembleias do OP presencial. O cidadão – através
da internet – era constantemente informado sobre o processo, o envio da demanda para as assembleias regionais e as datas destas.
O objetivo, portanto, não era substituir o processo presencial, mas sim
reforçá-lo (PESSI, 2003). Depois de ter sua demanda incluída pela internet, o
cidadão precisava comparecer nas assembleias regionais para defender sua proposta, ou ela acabaria tendo poucas chances de ir adiante. O próprio site do E-OP
incentivava tal atitude após a aprovação da demanda.
Todavia, grande parte das demandas digitais não se enquadrava no tipo de
obras realizadas pelo OP ou ainda no padrão exigido pela prefeitura, assim, mais
de 70% não chegou às assembleias regionais (PORRAS, 2004). Desta forma,
grande parte das indicações realizadas pela internet eram devolvidas ao usuário
para revisão e muitas acabavam não sendo enviadas novamente. Para Pessi (2003)
e Porras (2004), este foi um fator fundamental para a queda no número de envio
de demandas. O número de sugestões foi de 600 em 2001, caiu para 193 em
2002 e depois para 100 em 2003. “Estes números são o maior reflexo da falta de
motivação que os internautas encontraram em participar ao perceberem a baixa
ou nula incidência que sua participação poderia chegar a ter no processo decisório” (PORRAS, 2004, tradução nossa). O que condiz com a hipótese de que é
vital efetivar as ferramentas para manter e incentivar a participação popular.
No atual site do OP de Porto Alegre, não é mais possível inserir demandas de
obras. Podemos dizer que o atual site é carente de ferramentas participativas. A inserção de obras online foi retirada, não temos chats, fóruns, weblogs ou ferramentas
semelhantes como veremos, que são oferecidas no OPD 2008 de Belo Horizonte.
A única forma de participar é através dos endereços eletrônicos.
6. Denominado E-OP por Pessi (2003), classificação que também iremos adotar.
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Entretanto o site apresenta duas fortes características: informação política e
accountability. No primeiro quesito, você é capaz de encontrar a história do OP,
a estrutura e as regras de funcionamento, a divisão das temáticas (características
do OP de Porto Alegre), a divisão das regiões da cidade, os delegados titulares e
suplentes de cada região, representantes da prefeitura relacionados ao OP com
seus respectivos telefones e e-mails, o calendário de assembleias e um vasto histórico sobre as prioridades decididas no OP presencial 2005-2009. Finalmente, ele
apresenta uma estrutura de notícias na página principal, que geralmente é alimentada por dados da prefeitura não relacionados ao programa, mas que se foca em
notícias do processo, quando o mesmo está ocorrendo.
No segundo quesito, foi mantida a ferramenta para prestação de contas.
Por meio desta, é possível não apenas acompanhar as obras, mas também acessar
as despesas orçamentárias da prefeitura, o plano plurianual da cidade e relatórios
da prefeitura sobre as finanças públicas. Interessante notar que os relatórios não
se restringem ao Poder Executivo. Também podem ser acessados dados a respeito
do Poder Legislativo.
Uma crítica que é vigente em todas as versões do site é a falta de utilização
dos recursos multimidiáticos da internet. O site essencialmente resume-se a textos
e fotos. Não há sons, vídeos, wikis ou outras ferramentas interativas à disposição.
Apesar de ser um site funcional no quesito de procura de informações, ele é pouco
atrativo e pode inibir o retorno do visitante.7
No atual momento, é possível avaliar que o site do OP de Porto Alegre
cumpre bem a função de apresentar informações diversas ao cidadão seja sobre o
programa participativo, seja sobre a prefeitura que o realiza. Por outro lado, o site
falha em possibilitar maior interlocução entre sociedade civil e Estado, que possa
melhor atender às demandas do primeiro ou permitir reformulação estrutural do
segundo. Se em determinado momento, o site apresentou um projeto de governança eletrônica – ao permitir a participação popular pela internet –, ele volta ao
seu estágio inicial e apenas complementa basicamente o OP presencial.
Todavia, não podemos considerar, que apenas de participação vive o cidadão. Segundo Jensen e Venkatesh (2007), o cidadão realiza três atividades principais ao utilizar sites governamentais: procurar por informação, contatar representantes políticos ou engajar em discussão online sobre políticas locais. Por sua vez,
Gomes (2005a) nos alerta que para a participação política é preciso informação
atualizada e de qualidade.
7. Coleman et al. (2008) afirmam que há forte evidência entre atratividade, utilidade e uso do site e o retorno do
internauta ao mesmo. Sites que se utilizam de ferramentas multimidiáticas também são cotados mais positivamente
pelos usuários, aumentando a chance de um novo acesso.
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Logo, temos um ambiente denso de informações, que é um dos prerrequisitos para participação efetiva e autêntica (GOMES, 2005a). Podemos afirmar que
o site do E-OP apresenta-se como opção simples, fácil e conveniente para coleta
de informações sobre o processo presencial, seu histórico, procedimentos para
participar, datas de reuniões e afins.
Além disso, o site do OP de Porto Alegre apresenta muita efetividade no
quesito de transparência e, consequentemente, accountability. Qualquer cidadão
é capaz de acessar dados sobre a realização das obras do OP, sobre o andamento
das mesmas; pode acessar os dados orçamentários do Executivo e Legislativo, e
assim manter um monitoramento online tanto sobre o processo do OP quanto
do próprio órgão municipal.
Avritzer (2005) afirma que há forte ligação entre órgãos de monitoramento no OP presencial e maior eficiência administrativa. Outra consequência do
acompanhamento civil é a menor possibilidade de corrupção e/ou gastos desnecessários pelo órgão estatal. O site mostra-se como ferramenta adicional para este
acompanhamento da população e certamente pode representar os mesmos benefícios ou até maiores, devido às diversas facilidades apresentadas pela internet.
3.2 Orçamento Participativo Digital: participação direta do cidadão
O orçamento participativo foi implementado em Belo Horizonte em 1994, também
após o PT ganhar as eleições municipais. O modelo adotado na cidade foi diferente
em vários quesitos daquele criado em Porto Alegre,8 todavia também foi bem sucedido
em alcançar grande participação popular e tornar-se um programa constante no governo.
Em Belo Horizonte, a prefeitura optou pela criação de um processo à parte.
Em 2006, nascia o orçamento participativo digital, um programa totalmente distinto dos OP regional e da habilitação já existentes. O OPD ganhou site, calendário e até orçamento próprio. O site foi implementado como um bloco, ou seja,
em certo momento foi divulgado o OPD e hospedado todo o site na internet.
A grande inovação do OPD foi permitir à população votar diretamente nas
obras a serem realizadas. A votação foi integralmente realizada pela internet, sendo preciso apenas o título de eleitor da cidade para participar do processo. Foram
escolhidas pela prefeitura 36 obras divididas entre as nove regionais. O eleitor
poderia votar em uma obra de cada regional. Para diminuir a dificuldade das
barreiras digitais, foram implementados quiosques de votação em toda a cidade,
nos quais existiam agentes da prefeitura treinados para orientar o cidadão a votar
nas obras. Além disso, foram indicados locais com acesso público à internet como
escolas, bibliotecas, secretarias municipais e outros órgãos ligados à prefeitura.
8. Ver Sampaio (2008) para informações detalhadas sobre o funcionamento do OP regional de Belo Horizonte.
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Outro grande avanço do OPD foi a abertura de um fórum online para participação popular. A ferramenta é considerada pela literatura de participação na
internet como ideal para os pressupostos da deliberação pública. Ela representa o
modo de comunicação de três vias, no qual um cidadão não posta a mensagem apenas para o representante do Estado, mas também para outros cidadãos (FERBER;
FOLTZ; PUGLIESE, 2008). Tal modo de comunicação permitiria inclusive que a
informação fosse construída coletivamente por sociedade civil e Estado, de maneira
semelhante à descrita por Avritzer (2005) sobre o OP presencial.
Entretanto, o fórum não foi tornado efetivo pela prefeitura. Além de não ser
prerrequisito para votação, ele não foi divulgado na grande mídia junto da ferramenta de participação. Não houve nenhuma evidência, pelo poder institucional,
de que as discussões que ali ocorreram teriam algum aproveitamento posterior.
O fórum, por sinal, acabou sendo desativado após as votações.
Além disso, outra crítica que podemos tecer ao OPD 2006 é ao seu ambiente informativo extremamente pobre. Se seguirmos o preceito de Gomes (2005a),
a participação popular na internet não se limita a ferramentas de interação, mas
necessita de informação de qualidade. O site preocupou-se muito com a ferramenta de participação e pouco em fornecer informações relevantes à população.
Em cada obra no site, havia apenas informações básicas como localização, custo
e previsão da obra. Não houve preocupação em esclarecer aos moradores sobre a
necessidade da obra, os impactos positivos e negativos de sua realização para cada
região e para a cidade. Assim, pode se concluir que a participação popular foi
fraca no OPD, ao menos se levarmos em conta os pressupostos deliberativos para
um debate político de qualidade.9
Após o processo do OPD em 2006, o site foi mantido no ar, mas foram retirados o fórum e as informações sobre as obras. Foram mantidos os dados da participação – número de votantes, número de votos por pessoas, bairros e regionais –,
as obras vencedoras e depoimentos diversos da população sobre o sentimento de
ter participado no OPD.
Dessa forma, o site permaneceu até meados de setembro de 2008, quando
o novo OPD foi iniciado. Novamente, um novo site foi instaurado como bloco.
Este novo site se diferenciava notadamente daquele apresentado em 2006.
No quesito da participação direta, a principal mudança é que ao invés de obras
por regionais, foram escolhidas cinco grandes obras viárias, que afetam o trânsito de
várias regiões da cidade. Os eleitores deveriam votar entre as cinco obras e apenas uma
seria realizada pelo OPD 2008. Além dos quiosques, a prefeitura deu outro passo
importante para diminuir a exclusão digital. Além dos pontos indicados para acesso à
9. Pressupostos enumerados por Cohen (1997) e Habermas (1997).
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internet, a prefeitura disponibilizou telefone gratuito para se votar. Novamente, apenas o título de eleitor de Belo Horizonte foi requisito para participar.
No aspecto da eleição, é possível apontar um problema com o novo método
de votação. No OPD 2006, as obras eram escolhidas por regionais. Dentro de cada
regional há bairros com diferentes níveis de desenvolvimento urbano, todavia, as
diferenças tendem a ser menores e as regionais costumam apresentar características
em comum. Ao propor votação que elege uma única obra em toda a cidade, a
prefeitura cria uma situação de disputa. E com o fator agravante de jogar regiões
com vasto acesso a internet contra regiões mais simples e carentes, ou seja, há uma
grande desconsideração sobre o fator das barreiras digitais e de sua possível influência na votação. Uma possibilidade seria criar algum tipo de critério de justiça
semelhante ao que acontece no OP.10
No aspecto da participação argumentativa, houve duas interessantes novidades. Além do fórum, que foi reativado, criou-se a possibilidade de se deixar
recados na página referente a cada uma das obras – sem a necessidade de registrar.
Também criou-se um chat que era aberto para debates com representantes da prefeitura para fazer divulgações, discutir entre os cidadãos, retirar dúvidas e afins.
A primeira ressalva é o fato do chat ser aberto unicamente quando há agente da
prefeitura agendado para conversar com a população, ou seja, o chat não é aberto
para discussões dos cidadãos e ele não apresenta nenhuma forma de recuperação
da conversação realizada. A segunda ressalva é o fórum pré-moderado. Ao testarmos a ferramenta,11 ficou comprovado que uma mensagem poderia demorar até
dois dias para ser liberada e que tal liberação nunca ocorria nos fins de semana.
Esta limitação pode inibir a participação popular, principalmente se considerarmos o aspecto de conversação livre na internet.12
No aspecto informacional, houve maior evolução. As informações sobre
cada obra tornaram-se muito mais abrangentes e principalmente próximas aos cidadãos. Primeiramente, foram disponibilizadas imagens que comparam as atuais
vias com ilustrações de como as vias ficarão após a reforma. Depois, foram adicionados vídeos, nos quais são explicados os benefícios esperados com as reformas,
evidenciando-se a importância da obra para a região em questão.
Outra inovação no site do OPD 2008 é a possibilidade de se acompanhar
as obras escolhidas no OPD 2006. O site mostra quais são as obras e o estágio de
execução no qual elas se encontram. Nas obras concluídas, há comparações entre
10. No OP regional de Belo Horizonte, parte dos recursos é distribuído pelo índice de desenvolvimento humano (IDH)
das regionais, ou seja, as regiões mais carentes recebem maior porcentagem da verba.
11. Teste realizado nos dias 28 de novembro de 2008 e 5 de dezembro de 2008.
12. Por outro lado, autores como Jensen (2003), Wright e Street (2007) e Papacharissi (2004) encontraram evidências
que fóruns pré-moderados e/ou sob controle/incentivo estatal apresentam discussões políticas mais balanceadas,
sérias e embasadas.
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a região antes e depois por meio de fotos. Nas obras em execução, há fotos do atual
estágio e comparativos com o momento inicial. Todavia, não é uma ferramenta
dinâmica como aquela encontrada no OP de Porto Alegre. As informações são
fixas, estáticas. O internauta não pode se aprofundar nas mesmas ou mesmo se
cadastrar para receber informações posteriores.
Agora, se por um lado podemos afirmar que houve clara evolução entre o
processo de 2006 e 2008, no quesito de informações relevantes ao eleitor, por
outro lado ainda não podemos dizer que este modelo alcança o ambiente informacional denso do OP de Porto Alegre. Não temos planos e/ou relatórios
orçamentários disponíveis. O histórico do processo resume-se a uma página e não
explica os pormenores do OPD 2006. De maneira contraditória, há um histórico
maior a respeito da criação do OP13 em Belo Horizonte, que em relação ao OPD.
A contradição está no fato do OP regional e do OP habitacional não possuírem sites próprios. Geralmente, a divulgação dos dois processos ocorre no próprio
site da prefeitura. O OPD, desde a criação, apresentou-se como um segundo
processo totalmente paralelo aos programas presenciais. Desta forma, cria-se um
site no qual nem somos capazes de ver detalhes a respeito do OPD 2006, nem
podemos nos aprofundar na estrutura de funcionamento do OP presencial.
Uma característica marcante do site do OPD 2008 é o uso de recursos
multimidiáticos. Além de fotos, vídeos e ilustrações, o site faz uso de tecnologia de localização na internet,14 que permitem o internauta navegar pelo mapa
de Belo Horizonte e localizar exatamente a posição das obras. O próprio site
incentiva descobrir Belo Horizonte, conhecer as obras e a cidade de maneira
diferente e divertida!15 Isto é uma forma de incentivar o internauta a retornar
ao site (COLEMAN et al, 2008).
O site do OPD 2008 apresenta-se próximo aos ideais da governança eletrônica mencionada. Primeiramente, existiu vontade política: i) por parte da
prefeitura para criar todo um programa de governança eletrônica, com base
em programa de reconhecida participação popular; depois, ii) foi criado um
site exclusivo para tal programa, que incentivava participação civil ágil, viável,
sem limites de tempo e espaço, oferecendo o máximo de conveniência ao cidadão; por fim, iii) as ferramentas de participação tiveram efeitos reais no sistema político, pois as obras escolhidas pelos cidadãos estavam sendo realizadas.
O sentimento de efetividade certamente pode incentivar o eleitor a voltar ao
site do OPD em 2008 e votar novamente, uma vez que as obras de 2006 foram
iniciadas conforme o prometido.
13. Devido à comemoração dos 15 anos de implementação do OP presencial na cidade.
14. Google mapas. Disponível em: <http://maps.google.com.br/maps?hl=pt-BR&tab=wl>.
15. Slogan no site do OPD. Disponível em: <http://opdigital.pbh.gov.br/>. Acesso em: 26 nov. 2008.
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Entretanto, sob outros critérios, a participação política no processo do OPD
é limitada e essencialmente plebiscitária, sendo que o poder do cidadão está limitado à parte final do processo, ou seja, o poder efetivo para causar mudanças na
administração é limitado ou nulo. Na próxima seção, fazemos uma comparação
entre os dois programas e tentamos aprofundar os motivos pelos quais o OPD se
afasta do modelo apresentado de governança eletrônica.
4 E-OP versus OPD: UMA POSSIBILIDADE DE GOVERNANÇA ELETRÔNICA
Primeiramente, o OPD ainda se afasta de uma governança eletrônica desejável pela
forma de participação escolhida. Mesmo a versão de 2008, que ampliou o leque de
ferramentas deliberativas, ainda as relegou a um papel secundário. Novamente, não
havia garantia de que as discussões ocorridas no chat, fórum ou nos comentários,
seriam aproveitadas. Nenhuma destas ferramentas foi prerrequisito para a votação
online. Se no modelo de Ferber, Foltz e Pugliese (2008), tais ferramentas são consideradas capazes de propiciar comunicação de três vias, é importante notar que o
agente estatal precisa estar interessado e participar ativamente. No OPD, houve
comunicação de duas vias, mas apenas entre cidadãos. Os internautas postaram
suas opiniões apenas para outros usuários. O Estado esteve à parte de todo processo.
Gomes (2005b), alerta para duas necessidades para um processo realmente
inovador. Primeiramente, é preciso que o processo seja construído em duas mãos
entre Estado e sociedade civil. A própria lógica do OPD é contrária a isto. A prefeitura escolhe as obras, determina quando se dará a votação e nomeia os critérios.
É um cardápio restrito demais e totalmente controlado pela prefeitura. O OPD
acaba se configurando no formato de uma simples enquete – Qual a sua obra
favorita? Este controle ou gatekeeping por parte do Estado impediu que houvesse
discussão pública capaz de satisfazer os requisitos de autenticidade e efetividade
necessários para a governança eletrônica.
Em segundo lugar, esse excessivo controle da prefeitura, permitiu ao cidadão
apenas votar. Falta mais inclusão da sociedade no planejamento e na execução de
tais processos. Além disso, não há ferramentas que permitam acessar os gastos do
OPD ou realizar acompanhamento próximo às obras como acontece no E-OP.
Tais ferramentas estão diretamente ligadas ao accountability do Estado e, em consequência, à confiança do cidadão no processo e em seu proponente.
Em terceiro lugar, como dito anteriormente, informações políticas relevantes são vitais para participação de qualidade, já que quanto mais informado o
cidadão, maiores as chances de realizar um voto consciente. Apesar da melhoria
entre os dois processos, o OPD ainda fica aquém, principalmente se comparado
com o E-OP. Os vídeos podem sanar as dúvidas básicas, mas certamente não permitem o eleitor se aprofundar na questão antes de realizar o seu voto.
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Logo, o OP Digital de Belo Horizonte – apesar de seus vários avanços –
não apresenta características importantes de um modelo de governança eletrônica
capaz de estreitar as relações entre esfera civil e representantes políticos. Reconhecemos que qualquer modelo a ser apresentado é difícil ou impossível de ser
inteiramente reproduzido. Em diversos casos, o modelo serve como o padrão
comparativo, como a forma ideal de realizar-se determinado evento.
Entretanto, que nosso modelo de governança eletrônica não esteja tão afastado dos casos empíricos ou que seja impossível de ser alcançado. Afirmamos – ao
contrário – que ele já se encontra nos dois programas apresentados, o que justifica
a comparação proposta por este estudo.
O modelo desejável deve estar próximo de um governo comprometido em
oferecer ferramentas participativas como acontece no OPD. Oferecer chats, fóruns, murais virtuais e afins são prerrequisitos necessários para alcançarmos o
governo eletrônico deliberativo proposto por Chadwick (2003), que estamos
classificando como governança eletrônica. Tais ferramentas são essenciais para
a comunicação de três vias (FERBER; FOLTZ; PUGLIESE, 2008), essenciais
para a constituição de públicos capazes de agir na esfera pública. Tal comunicação possibilitará processos de discussão aberta, voltados para realizar o consenso
motivado racionalmente (DAHLGREN, 2005, p. 156) da teoria habermasiana.
O público, assim, deve ser livre – sem o gatekeeping do Estado ou do jornalismo –
para produzir sua própria informação política e disponibilizá-la tanto para o governo quanto para os outros cidadãos (BENTIVEGNA, 2006; COLEMAN et
al., 2008; GOMES, 2005b; FERBER; FOLTZ; PUGLIESE, 2008).
Entretanto, essa oferta não é válida se não houver disposição verdadeira
do governo. Opções prontas, restritas e com total controle do agente estatal
(GOMES, 2005b; FERBER; FOLTZ; PUGLIESE, 2008) tendem a produzir resultados simples e incapazes de gerar mudanças estruturais seja entre a
população, seja na forma como são tomadas as decisões políticas. A comunicação de três vias que estamos enfatizando necessita da participação do
agente estatal, mas de modo a realmente levar em consideração as demandas
e sugestões dos cidadãos.
Insistimos, todavia, na necessidade de informações de qualidade estarem
disponíveis no site governamental. O OP presencial apresenta evidências empíricas de que o cidadão é capaz de lidar com conhecimento técnico, que geralmente
é restrito aos especialistas (AVRITZER, 2005). Tal conhecimento, aliado às experiências do cidadão, que é o mais próximo dos problemas a serem enfrentados,
torna o público capacitado para influenciar e participar das decisões políticas em
igualdade com os experts estatais.
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Um segundo aspecto do modelo de governança eletrônica defendido no
texto pede maior comprometimento governamental, pois não basta informação
de qualidade e participação política. A democracia tem outros valores fortes e
os governos também podem se esforçar para atendê-los. A abertura das contas
públicas e ferramentas de monitoramento online de políticas públicas são outras possibilidades – apresentadas no E-OP –, que certamente são louváveis em
qualquer projeto de governança eletrônica. Esta possibilidade de fiscalizar os atos
governamentais implica em maior controle civil e tende a produzir resultados
políticos mais eficientes e distantes de corrupção e clientelismo.
O OP em ambas as cidades já conta com institutos populares que realizam
esse monitoramento das obras, mas a possibilidade de fazer tal fiscalização pela
internet tende a acrescentar todas as facilidades e comodidades da participação
política online. Tal controle das realizações do Estado é outro fator para elevar a
confiança da população em seus representantes.
Ao realizar tais ações, o Estado se mostrará comprometido a desafiar as estruturas
antigas, hierárquicas e burocráticas de poder. Um governo capaz de não apenas receber
as informações por parte dos cidadãos, mas efetivamente utilizá-las para melhorar sua
gestão administrativa e fazer políticas públicas mais eficazes e próximas às necessidades
da população. Um representante disposto a permitir a participação civil não apenas no
final das políticas públicas, mas durante o planejamento e a execução destas.
Como importantes pontos de ressalva, frisamos que o objetivo do artigo
foi apresentar possíveis utilizações da internet pelo Estado para alcançar a governança eletrônica almejável acima descrita. Ao longo deste trabalho, pontuamos
diversas vezes que a participação civil é vital no processo. Notamos que há fortes
evidências que um Estado engajado e disposto a fornecer informações relevantes,
ferramentas de participação e accountability tende a gerar confiança na esfera civil,
que se sentirá mais segura para participar de tais ações estatais.
Todavia, é importante observar, que mesmo se criando ferramentas perfeitas para governança eletrônica, e ainda que exista um governo disposto a aceitar
todas as mudanças necessárias para tanto, também é vital que as pessoas estejam
dispostas a se engajar. Portanto, a cultura política é um fator que nunca pode ser
desprezado (DAHLGREN, 2005; GOMES, 2005a). Se vivenciamos uma cultura
política de apatia e desconfiança, então não apenas ferramentas online ideais bastarão para as reformulações propostas. Será preciso divulgação e principalmente
incentivo ao cidadão para que ele também esteja disposto a se engajar, conhecer,
utilizar as novas ferramentas e passar a ter maior interação com seus representantes. Devido ao nosso foco na questão institucional, optamos por não aprofundar
nesta importante questão, que de forma alguma deve ser desconsiderada ao se
criar projetos de governo ou governança eletrônica.
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Outro ponto importante é a questão das barreiras digitais. Também tecemos
alguns comentários ao longo do trabalho, mas novamente não se tratou de nosso
argumento principal. Frey (2000) acredita que não possamos falar de um verdadeiro projeto de governança eletrônica se não houver amplos pontos de acesso
público e o devido treinamento à população para utilizar as novas tecnologias.
Trata-se de um ponto capital para qualquer projeto de governança eletrônica, mas
não uma questão que deva impedir sua realização.
De tal maneira, não é preciso ignorar todos os possíveis benefícios advindos
da governança eletrônica, enquanto 100% da população não estiver conectada.
Seria o mesmo que desconsiderar todas as vantagens da escrita e dos livros, por
exemplo, enquanto existirem analfabetos. As ações não precisam ser sequenciais.
Elas podem ser simultâneas, ou seja, investimentos em educação, estrutura básica
e em governança eletrônica. Acreditamos que quiosques e pontos públicos de
acesso já se mostram como grande evolução. O telefone gratuito para votação do
OPD expôs-se ainda como outra opção fácil e viável.
“Alguém pode dizer que eu estou falando de um segmento muito pequeno
da classe média. Não é verdade. Você vai na favela e está cheia de lan house” –
afirmou o então prefeito Fernando Pimentel16 após a realização do primeiro OPD
em 2006. O fenômeno de lan houses a preços populares certamente poderia acrescentar à questão da exclusão digital. Talvez os índices que avaliam o acesso à internet em casa, trabalho e escola não sejam o suficiente para análise da participação
online, especialmente ao tratarmos de questões de necessidade do cidadão carente.
5 CONCLUSÕES
Buscamos inicialmente esclarecer a diferença entre governo eletrônico e governança eletrônica. Concluímos que os termos tendem a ser confundidos e que
diversas características podem ser atribuídas tanto ao primeiro termo quanto ao
segundo. Todavia, a governança eletrônica na literatura é geralmente relacionada
a políticas públicas e/ou políticas focadas no cidadão.
Elaboramos uma definição da governança eletrônica emancipatória, capaz
de modificar a relação entre sociedade civil e governo; um dos passos fundamentais para reestruturação do Estado e o avanço de diversos valores democráticos.
Em nossa análise, esta governança eletrônica depende essencialmente de três
passos. O primeiro e mais importante está relacionado à vontade política. A internet
não será capaz de realizar modificação profunda no Estado, se os agentes governamentais não estiverem dispostos a permitir tais alterações. Em segundo lugar, são necessárias ferramentas digitais que estejam de acordo com estas transformações e avanços.
16. Disponível em: <http://www.politicavoz.com.br/politicadigital/artigo_08.asp>.
Governança Eletrônica no Brasil...
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Almejamos por instrumentos que permitam a procura por informações qualificadas,
que permitam e incentivem a participação política, a deliberação pública e que possam trazer ganhos de accountability e/ou permitir monitoramento do Estado, entre
outras possibilidades. Em terceiro lugar, tais ferramentas devem ter efeitos reais no
sistema político. Não basta chats para discussões políticas, se elas não são consideradas
pelos governantes. Não adianta um muro de recados, se eles não são lidos e colocados
como questionamentos às ações do Estado.
Assim, apresentamos dois OPs na internet como opção viável de governança
eletrônico. O E-OP de Porto Alegre mostrou-se um ambiente rico para pesquisa e
coleta de informações, seja para se inteirar do orçamento participativo da cidade, de
suas realizações, de como interagir com este, seja para pesquisar documentos e relatórios de orçamento do governo. Tais informações, aliadas a possibilidade de fiscalizar
as obras e realizações da prefeitura, criaram poderosa ferramenta de accountability.
Já o OPD de Belo Horizonte apresentou importantes ferramentas participativas e deliberativas, que são passos essenciais para discussões políticas, deliberações públicas de qualidade e efetiva participação do cidadão. O site do OPD
também apresentou a vantagem de utilizar-se melhor dos vastos recursos multimidiáticos da internet, tornando-se mais atrativo para os usuários.
Em nossa concepção, um amálgama entre os dois sites produziria algo muito
próximo de uma governança eletrônica desejável, ao menos no que tange às ferramentas disponíveis aos internautas. Se a disposição política é um prerrequisito
vital para esta governança eletrônica, acreditamos que elaborar um bom site para
busca de informação, participação civil, transparência e monitoramento seja um
ótimo ponto de partida.
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142
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Polos e Parques de Alta Tecnologia: uma alternativa?
Rogério Bezerra da Silva*
Renato Dagnino**
Este artigo avalia as políticas públicas de Polos e Parques de Alta Tecnologia (PATs) no Brasil,
cujos processos de elaboração iniciaram-se em fins dos anos de 1970. Para isto, utiliza o Enfoque
de Análise de Políticas (EAn). Este enfoque não exige apenas a comparação entre os objetivos
da política e os resultados logrados com sua implementação. Ele busca explicar as falhas na
consecução dos objetivos a partir do exame do seu momento de formulação. Isto é, do processo
decisório, dos projetos políticos e dos modelos cognitivos dos atores com esta envolvidos. Atenção
especial é dada à política pública do Polo e Parque de Alta Tecnologia de Campinas (PATC), por ser
considerada por muitos como bem-sucedida. A análise realizada aponta que após três décadas do
início destas políticas os seus resultados têm sido bastante modestos e os explica pelo fato destas
terem sido emulações de experiências similares ocorridas em países de capitalismo avançado por
iniciativa de integrantes da comunidade de pesquisa nacional.
Palavras-chave: Polo e Parque de Alta Tecnologia; Política Pública; Enfoque de Análise de Políticas;
Avaliação de Política; Política Simbólica.
Science Parks: an alternative?
The paper evaluates the science parks’ policy in Brazil, which have been elaborated since the
end of the 1970s. In order to do so, it employs the Policy Analysis framework. This approach
not only involves a comparison between policy objectives and expected results and the policy’s
implementation process. It also seeks to explain policy flaws based on its formulation, that is,
on the decision-making process and on the political projects and cognitive models of the actors
involved with it. The case of the Science Park of Campinas (PATC) is emphasized, since it is often
considered to be a benchmark for other similar policies. The analysis points out that after three
decades this policy’s results have been rather modest and explains this by stressing the negative
aspects of the emulation of experiences from developed countries by the initiative of members of
the Brazilian research community.
Key words: Science Parks; Public Policy; Policy Analysis Framework; Policy Evaluation; Symbolic Policy.
Polos y Parques de Alta Tecnologia: una alternativa?
Este artículo evalúa las políticas públicas de Polos y Parques de Alta Tecnología (PATs) en Brasil, que
comenzó el proceso de toma de decisión al final de la década de 1970. Ello use el Enfoque de Análisis
de Políticas (EAn). Este enfoque no sólo requiere una comparación entre los objetivos de la política
y los resultados obtenidos con su aplicación. Se trata de explicar los fracasos en la consecución de
* Doutorando em Política Científica e Tecnológica do Departamento de Política Científica e Tecnológica do Instituto de
Geociências da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). E-mail: [email protected]
** Professor titular do Departamento de Política Científica e Tecnológica do Instituto de Geociências da Universidade
Estadual de Campinas (UNICAMP). E-mail: [email protected]
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
146
los objetivos del examen de su tiempo de elaboración. Es decir, el proceso y los proyectos políticos
y modelos cognitivos de los actores involucrados con ella. Se presta especial atención a la política
pública de Polo y el Parque de Alta Tecnología de Campinas (PATC), por ser considerado por muchos
como un éxito. El análisis indica que tres décadas después del comienzo de estas políticas de sus
resultados han sido bastante modestas y la explica por el hecho de que fueron las emulaciones de
experiencias similares que ocurren en los países de capitalismo avanzado sobre la iniciativa de los
miembros de la comunidad de la encuesta nacional.
Palabras-clave: Polo y el Parque de Alta Tecnología; Política Pública; Enfoque de Análisis de
Políticas; Evaluación de las Políticas; Política Simbólica.
Pôles et Parcs de Haute Technologie: une alternative?
Cet article évalue les politiques publiques des Pôles et des Parcs de Haute Technologie (PATs),
au Brésil, qui a débuté les processus d’élaboration à la fin des années 1970. Pour cela, utilisez
la mise au Point de L’analyse des Politiques (EAn). Cette approche nécessite non seulement une
comparaison entre les objectifs de la politique et les résultats obtenus avec la mise en œuvre. Il
cherche à expliquer les échecs dans la réalisation des objectifs de l’examen de son temps de la
formulation. C’est à dire, le processus et les projets politiques et des modèles cognitifs des acteurs
avec lui. Une attention particulière est accordée à la politique du Pôle de Haute Technologie et le
Parc de Campinas (PATC), qui doit être considéré par beaucoup comme un succès. L’analyse donne
à penser que trois décennies après le début de ces politiques, leurs résultats ont été assez modestes
et expliqué par le fait qu’ils étaient des émulations d’expériences similaires se produisent dans les
pays de capitalisme avancé, à l’initiative des membres de la communauté d’enquête nationale.
Mots-clés: Pôle et le Parc de Haute Technologie; Politiques Publiques; Focus de L’analyse des
Politiques; Évaluation de la Politique; Politique Symbolique.
1 Introdução
O artigo, por meio do Enfoque da Análise de Políticas, avalia as políticas públicas
de Polos e Parques de Alta Tecnologia, que começaram a ser elaboradas no país
no fim dos anos de 1970. Destaque especial é dado à política do Polo e Parque de
Alta Tecnologia de Campinas, que é considerada por muitos como bem-sucedida.
Essa avaliação está orientada a responder a duas perguntas: as políticas públicas dos PATs conseguiram alcançar os objetivos e metas estipuladas? Por que
estas políticas apresentam tais resultados?
Isso porque o viés metodológico do EAn, distinto do Enfoque de Avaliação
de Políticas (EAv), conduz o analista de políticas não somente a verificar se suas
metas e objetivos foram logrados, mas, fundamentalmente, como o processo de
elaboração da política conduziu aos seus resultados.
O trabalho está dividido em cinco seções mais as conclusões. A primeira é
esta introdução. A segunda apresenta o EAn e alguns de seus fundamentos conceituais. A terceira expõe fatos estilizados e indicadores sobre a relação pesquisaprodução no país. Embora estes fatos e indicadores não se restrinjam às políticas
Polos e Parques de Alta Tecnologia: uma alternativa?
147
dos PATs – são fatos e indicadores da Política Científica e Tecnológica (PCT) de
forma geral – eles permitem avaliar esta relação, que é a que as políticas dos PATs
pretendiam estimular.
A quarta seção apresenta os resultados da política do PATC. Eles são abordados sob duas perspectivas: a primeira considera o desempenho das empresas do
setor de informática e telecomunicações instaladas no PATC. A segunda considera o desempenho das instituições de pesquisa e desenvolvimento (P&D) locais,
em especial o da UNICAMP.
Na quinta seção são destacados dois aspectos que ajudam a compreender o
porquê dos modestos resultados destas políticas passados trinta anos do início do
processo de suas elaborações. O primeiro é o fato de elas terem sido emuladas –
transferidas acriticamente – dos países de capitalismo avançado para um contexto
de capitalismo periférico.
O segundo aspecto, que possui estreita relação com o primeiro, é elas terem
sido formuladas sem que as condições necessárias para suas implementações estivessem presentes na realidade do país e, consequentemente, na de Campinas. Isto
caracteriza os PATs como políticas simbólicas.
A emulação desses arranjos institucionais como proposta de política pública, tal como a política do PATC, implicava os policy makers conceberem que
os elementos que, se supunha, permitiam o desenvolvimento destas experiências
nos países de capitalismo avançado estivessem presentes na realidade brasileira e,
invariavelmente, na de Campinas.
Uma análise mais detida sobre a realidade brasileira mostraria que esses elementos possuem origens e trajetórias bastante distintas daquelas supostamente
verificadas nos países de capitalismo avançado. Supostamente, pois, como destacado por Gomes (2001), mesmo nestes países surgiram diversas considerações
críticas de alguns autores acerca de tais elementos, suas interconexões e relevância
para o desenvolvimento social.
2 ANALISTA Versus AVALIADOR DE políticas públicas
As políticas públicas podem ser avaliadas segundo dois enfoques: o Enfoque de
Análise de Políticas e, aquele que é mais utilizado no estudos das políticas públicas, o Enfoque de Avaliação de Políticas.
Embora os termos avaliação e análise apareçam, na literatura, ora com sentidos distintos, ora como sinônimos – ou ainda denotando o mesmo significado,
mas sugerindo práticas distintas – eles possuem percursos e características distintas (CAVALCANTI, 2007).
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planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
Esses enfoques foram concebidos para estudar ou dar resposta a distintos
aspectos da política – como o de policy e o de politics. Por isso, possuem naturezas
distintas, associadas a significados, sentidos, funções, ideologias etc., também distintos (CAVALCANTI, 2007).
A ambiguidade no uso das expressões avaliação e análise sugere que elas,
ou melhor, que os enfoques a elas correspondentes, sejam equivalentes. Todavia,
existem dois elementos que tornam estes dois enfoques distintos. O primeiro
é o ambiente técnico, de neutralidade, que cerca o EAv. O segundo refere-se ao
fato de que o EAn entende a avaliação como inserida no processo mais amplo da
elaboração da política.
O EAv centra-se no exame do processo de implementação – ou execução –
da política e em seus resultados. Ele detém-se sobre a forma como se dá a implementação: na consecução das metas e objetivos; no processo de alocação de recursos materiais, financeiros e humanos; nos prazos etc.; e sobretudo, na avaliação
do impacto da política ou dos programas que ela abarca. Ele limita-se, por isso,
a considerar um conjunto de elementos e indicadores, preferencialmente de tipo
quantitativo, a partir dos quais se faz a aferição do sucesso ou fracasso da política.
O avaliador EAv possui como foco a implementação da política e concentra-se na comparação do resultado observado com o que desta era esperado. Por
isso, preocupa-se em elucidar os desajustes entre o resultado esperado da política
e a realidade que ele observa.
A utilização do EAn possui uma particularidade: o analista de políticas não
se detém apenas na sua implementação e nos resultados destas advindos, como
é o caso do avaliador. A avaliação feita desde o EAn contempla a análise do processo de elaboração da política, que começa no momento em que se discute qual
problema público que deve ser enfrentado pelo governo (CAVALCANTI, 2007).
A avaliação de uma política segundo o EAn pode ser entendida como uma
prática de argumentação fundamentada em informações a respeito dos resultados
da política pública e o porquê de tais resultados. Assim, nela busca-se responder
as seguintes perguntas: a política pública conseguiu alcançar os objetivos e metas
estipuladas? Por que a política pública apresenta tais resultados?
Ao limitar a avaliação às metas, objetivos e resultados, o EAv relaciona o
insucesso de uma política pública à possibilidade de que tenha ocorrido algum
problema em sua implementação (CAVALCANTI, 2007).
Segundo o EAn, embora o insucesso da política somente materialize-se
quando ela é implementada, as razões que o explicam remetem a momentos anteriores do processo de sua elaboração. Por mais que possam estar asseguradas as
condições para a implementação perfeita, uma política mal formulada – apoiada
Polos e Parques de Alta Tecnologia: uma alternativa?
149
em um modelo cognitivo pouco coerente com a realidade, um modelo cognitivo
irrealista – jamais poderá ser bem implementada (DIAS; DAGNINO, 2006).
Tal como exposto por Ham e Hill (1993), há casos em que as políticas
são formuladas sem que as condições para sua implementação estejam presentes. Neles, as políticas elaboradas podem ser consideradas políticas simbólicas.
Qualquer sistema no qual a formulação de políticas e as condições necessárias
para sua implementação estejam claramente separadas, ou ausentes, – uma
divergência entre Legislativo e Executivo; um desacordo entre os atores envolvidos no processo; uma proposta de política pública em que não há recursos
financeiros suficientes para sua implementação – provê oportunidades para
que estas se tornem simbólicas (HAM; HILL, 1993).
Adotando uma perspectiva um tanto distinta da apresentada por Ham e Hill
(1993), consideram-se políticas simbólicas também aquelas que são formuladas sem
que se tenha clareza da separação entre a formulação e as condições necessárias
para sua implementação. Pois, tal como ocorre quando se há clareza desta separação, naqueles casos em que esta não é evidente, o fato da política ser formulada
acaba levando a sociedade a acreditar que o governo – ou o ator dominante – está
tomando atitudes diante de um problema público. Neste sentido, a política acaba
servindo mais para que a sociedade mantenha o apoio político ao governo, ou ao
ator dominante no processo, do que para atuar sobre os problemas sociais.
Há casos em que o ator que formula uma política tem por propósito, não a
sua implementação e muito menos o seu êxito, mas a obtenção do apoio político
que a declaração de que a política será implementada pode causar, o que também
a caracteriza como uma política simbólica. O efeito buscado com as políticas simbólicas é, então, a repercussão que o simples enunciado de sua existência pode
causar (ROTH, 2006). E seu impacto, em termos do apoio político obtido pelo
ator que a formula, é tanto maior quanto maior a capacidade de criar um fato
político, a qual depende de seu acesso aos meios de comunicação e de formação da
opinião pública – ou de setores específicos da sociedade.
3 PoLOS E PARQUES DE ALTA TECNOLOGIA NO BRASIL: QUAIS OS RESULTADOS
DESSAS POLÍTICAS PÚBLICAS?
As políticas públicas apoiadas na concepção de PATs surgidas no Brasil no fim
dos anos de 1970 buscavam, basicamente, transformar aqueles municípios com
algum potencial de ciência e tecnologia (C&T) instalado – como Campinas e São
Carlos, em São Paulo; Campina Grande, na Paraíba; e Florianópolis, em Santa
Catarina – em um centro de atração ou de criação de empresas de alta tecnologia.
Os atores favoráveis a estas políticas argumentavam que com a implantação destas
seriam gerados empregos mais bem qualificados e remunerados. Também seriam
150
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
gerados efeitos indiretos de encadeamento industrial, o que melhoraria a arrecadação de impostos por estes municípios.
Todavia, após três décadas do início da elaboração dessas políticas públicas,
seus resultados têm sido bastante modestos. Existe um grau razoável de concordância entre o pensamento oficial e aquele alternativo acerca do diagnóstico da
permanência da situação de debilidade da interação entre o potencial de C&T e
o desenvolvimento econômico associado destes municípios, ou mesmo do país.
A permanência dessa debilidade pode ser observada por meio de seis fatos
estilizados e indicadores (DAGNINO, 2007a) apresentados:
1. A baixa intensidade tecnológica da indústria brasileira.
Segundo dados das Pesquisas Industriais de Inovações Tecnológicas (PINTECs)
(IBGE, 2000, 2003, 2005), a intensidade de P&D média da indústria nacional é baixa, 0,64% em 2000, 0,53% em 2003 e 0,77% em 2005. Dados da Organização para
a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) indicam que a intensidade de
P&D das indústrias dos 12 países que a compõem foi em média de 2,5%, entre 1990
e 1999 (FURTADO; QUADROS; DOMINGUES, 2007).
Alguns setores produtivos vêm apresentando queda constante dos investimentos, nos três anos analisados, são eles: eletrônica, aparelhos e equipamentos para telecomunicações; máquinas e equipamentos e produtos do fumo. Os dois primeiros
geraram maior surpresa, principalmente por serem aqueles com maior intensidade
em P&D no Brasil (FURTADO; QUADROS; DOMINGUES, 2007).
2. A baixa capacidade de absorção de pessoal pós-graduado pela empresa privada.
No Brasil são formados anualmente cerca de 30 mil mestres e doutores nas
áreas de ciências duras e engenharias. Número que cresce a uma taxa de 10% ao
ano. Porém, as empresas — privadas e públicas — localizadas no país possuem
apenas 3 mil mestres e doutores atuando em atividades de P&D (IBGE, 2005).
Caso este estoque de mestres e doutores nas empresas apresente um aumento de
10%, no ano seguinte haveria uma demanda adicional de 300 mestres e doutores
para uma oferta de 30 mil.
A despeito do senso comum, que propugna a expansão da oferta de mestres
e doutores como estratégia para o incremento da P&D empresarial, o analista de
políticas tenderia a ficar preocupado com este desequilíbrio.
3. A baixa capacidade de utilização do potencial científico para a inovação
tecnológica.
Enquanto que em 1980 o Brasil publicava cerca de oito vezes mais artigos
científicos que a Coreia do Sul, em periódicos indexados, em 2000 este país superou
Polos e Parques de Alta Tecnologia: uma alternativa?
151
o Brasil, publicando 1,25 vezes mais artigos científicos. O Brasil passou de 1.900
para 9.500 artigos e a Coreia de 230 para 12.200 artigos científicos em periódicos
indexados (BRITO CRUZ, 2004).
Embora o Brasil tenha tido uma evolução inferior a da Coreia, os dois países
foram os que mais incrementaram sua produção científica entre 1980 e 2000.
Esta evolução colocou o Brasil no patamar de 1% do total mundial de artigos
publicados (TERRA; WEISSS, 2002).
No plano tecnológico, em 1980 o Brasil superava a Coreia em número de
patentes concedidas pelo United States Patent Office (USPO) dos EUA. Nesse ano
o país tinha 28 patentes concedidas nos EUA e a Coreia apenas oito. Todavia,
em 2004 a Coreia já havia se tornado um dos grandes patenteadores, chegando à
quinta colocação do ranking mundial. Nesse ano, o Brasil estava na última colocação (PAIM; NICOLSKY, 2006).
4. A propriedade estrangeira das empresas de maior intensidade tecnológica e sua baixa propensão a inovar.
Em relação às suas matrizes, é relativamente pequeno o esforço tecnológico
das filiais das empresas estrangeiras localizadas no Brasil. Observando cinco setores industriais brasileiros com maior participação estrangeira, constata-se que, os
esforços tecnológicos das filiais são 70% menores do que os da matriz no segmento farmacêutico: 10% no de máquinas e equipamentos, 60% no de materiais e
equipamentos eletrônicos, 31% no de instrumentos médicos, óticos e de precisão
e 62,5% no de veículos automotores e autopeças (COSTA, 2003).
5. O baixo potencial de mobilização da capacidade de P&D pública pela
empresa privada.
Um mito segue fundamentando grande parte das medidas da PCT nacional. Este mito diz respeito à mobilização do potencial de P&D pública que se
pode esperar da empresa privada doméstica e estrangeira.
Nos EUA, entre 1994 e 2004, apenas 1,1% do que a empresa privada investiu em P&D foi contratado com as instituições de P&D públicas mais especificamente com as universidades (SCIENCE AND ENGINEERING INDICATORS,
2006). Este índice, associado aos anteriormente apresentados, evidencia que o que
é importante para as empresas dos países de capitalismo avançado, na sua relação
com as instituições de P&D, não é o conhecimento intangível ou incorporado em
equipamentos. O importante é o conhecimento incorporado em pessoas que, ao serem absorvidas pelas empresas, irão realizar a P&D que garanta sua produtividade.
6. O baixo potencial de captação de recursos pelas instituições de P&D
via contratação de projetos de pesquisa com a empresa privada.
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planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
Nos EUA, o estado foi responsável, entre 1994 e 2004, em média por 87%
da receita de P&D das instituições públicas. Nesse mesmo período, a empresa privada foi responsável em média por apenas 6,7% desta receita (SCIENCE
AND ENGINEERING INDICATORS, 2006).
Esse fato sugere que o potencial de captação de recursos pela universidade
brasileira é ainda menor do que o observado em países como os EUA. Das universidades públicas do estado de São Paulo, a UNICAMP e a Universidade de
São Paulo (USP) possuem, cada uma, 1% de suas receitas anuais provenientes
de contratos com empresas privadas (UNICAMP, 2007; USP, 2007). Estando
elas entre as maiores instituições de P&D públicas do país é razoável ponderar
que o potencial de captação de recursos privados pelo conjunto das universidades e institutos de P&D brasileiros é muito menor do que o observado em
países como os EUA.
Esses fatos estilizados revelam as características dos arranjos institucionais
brasileiros e os comportamentos dos atores presentes no cenário da relação pesquisa – produção vis-à-vis ao panorama internacional.
4 os resultados de uma POLÍTICA DE DESTAQUE no país: o Polo e Parque
de Alta Tecnologia de Campinas
4.1 A relevância da P&D para os setores produtivos
Souza e Garcia (1998) realizaram um estudo sobre o arranjo produtivo de indústrias de alta tecnologia de Campinas e região. Segundo eles, Campinas e região possuem um conjunto de empresas de alta tecnologia pertencentes, principalmente,
aos setores destacados na tabela 1.
Como observado na tabela 1, as empresas consideradas de alta tecnologia não se destacam na estrutura industrial local. Se considerado o número
total de estabelecimentos industriais, que é de 4.620 em 1996, em Campinas e região, somados os setores destacados, eles correspondem a 4,2%
deste total. A mesma consideração para 2005 se observará, o número de
estabelecimentos industriais é 15.864, ou seja, 3,5 vezes maior do que o de
1996. Porém o peso relativo dos setores destacados, em 2005, foi reduzido
para 3,5% do total.
Polos e Parques de Alta Tecnologia: uma alternativa?
153
TABELA 1
Número de estabelecimentos e pessoal ocupado na região de Campinas em setores
selecionados – 1996-2005
Setor CNAE
Estabelecimentos
da indústria
Percentual de
estabelecimentos
Pessoal ocupado
1996
2005
1996
1996
2005
16
33
0,3
0,20
8
28
0,2
Fabricação de material eletrônico básico
20
68
Fabricação de aparelhos e equipamentos de
telefonia e radiotelefonia e de transmissores de
televisão e rádio
17
Fabricação de aparelhos e instrumentos para usos
médicos-hospitalares, odontológicos
Percentual de
pessoal
ocupado
2005
1996
2005
712
3.599
0,5
0,58
0,17
1.227
3.827
0,8
0,62
0,4
0,42
626
3.577
0,4
0,58
25
0,4
0,15
550
5.621
0,4
0,91
19
82
0,4
0,51
631
2.251
0,4
0,36
Fabricação de aparelhos e instrumentos de
medida, teste e controle
7
7
0,2
0,04
620
205
0,4
0,03
Fabricação de máquinas, aparelhos e equipamentos de sistemas eletrônicos dedicados à automação industrial e controle do processo produtivo
4
40
0,1
0,25
17
567
–
0,09
Fabricação de aparelhos, instrumentos e materiais
ópticos, fotográficos e cinematográficos
34
29
0,7
0,18
973
2.211
0,7
0,35
Fabricação de peças e acessórios para veículos
automotores
70
234
1,5
1,47
13.948
56.921
9,5
9,25
15.864 100
100
146.203 615.276
100
100
Fabricação de máquinas e equipamentos de sistemas eletrônicos para processamento de dados
Fabricação de material elétrico para veículos –
exceto baterias
Total da indústria de transformação
4.620
Fontes: Para 1996, Souza e Garcia (1998); para 2005, Atlas da Competitividade da Indústria Paulista (SEADE, 2006).
Mesmo em 2005 esses setores não possuíam grande destaque na estrutura industrial local. Ainda que alguns setores tenham dobrado o número de estabelecimentos entre 1998 e 2005, o peso relativo destes decaiu ou, em alguns casos, manteve-se
constante. O mesmo ocorreu em relação ao peso relativo do pessoal ocupado.
Dos setores destacados por Souza e Garcia (1998), os que mais englobam
as empresas de alta tecnologia de Campinas e região são os de fabricação de
máquinas e equipamentos de sistemas eletrônicos para processamento de dados;
fabricação de material eletrônico básico; fabricação de aparelhos e equipamentos de telefonia e radiotelefonia e de transmissores de televisão e rádio; e fabricação de máquinas, aparelhos e equipamentos de sistemas eletrônicos dedicados
à automação industrial.
Uma avaliação desses setores, feita por Souza e Garcia (1998), envolveu
13 empresas que atuavam nos ramos da prestação de serviços e de fabricação de
equipamentos para telecomunicações e informática. No que tange ao ano de
estabelecimento das unidades produtivas, verificou-se que seis das 13 empresas
foram estabelecidas em um período anterior à década de 1990. Mesmo assim,
154
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
foi grande – cinco das 13 – o número de empresas que se estabeleceram em
Campinas, ou região, a partir de 1995.
Em relação à origem do capital, os autores incorporaram na amostra tanto
empresas domésticas como estrangeiras. Das 13 empresas pesquisadas, oito eram
subsidiárias de empresas estrangeiras, enquanto que as cinco restantes eram domésticas. Em relação ao porte das empresas, seis eram empresas de grande porte,
quatro de médio porte e três eram pequenas empresas. Não coincidentemente,
o porte das empresas estrangeiras foi, em geral, maior do que o das domésticas
que atuam na região nos setores selecionados. Muitas destas empresas de médio e
pequeno porte, especialmente entre as prestadoras de serviços, resultaram de spinoffs das instituições de P&D locais (SOUZA; GARCIA, 1998).
Um aspecto que marca a interação das pequenas e médias empresas localizadas em Campinas com as instituições de P&D está relacionado às filhas da UNICAMP, que é como são chamadas as empresas spin-offs da UNICAMP. Segundo
dados do Programa Pesquisa Inovativa na Pequena e Micro Empresa (Pipe)1 da
FAPESP, de 1997 a 2007, o programa concedeu financiamento à 330 pequenas
e médias empresas2 do estado de São Paulo. Destas, 64 localizavam-se em Campinas, o que correspondem a 19,4% do total de empresas. Das 64 empresas, 31
eram filhas da UNICAMP (FAPESP, 2008). Ou seja, 48,5% das empresas beneficiadas com os financiamentos do Pipe, já tinham suas atividades de pesquisa
diretamente ligadas à UNICAMP.
Foram repassados a essas 64 empresas R$ 11,2 milhões no período, o que representa 17% dos recursos do Pipe (FAPESP, 2008). Se dividido o montante de R$
11,2 milhões igualitariamente entre estas, cada uma teria recebido R$ 175 mil. Neste caso, se somadas as filhas da UNICAMP, estas teriam recebido R$ 5,4 milhões,
o que representa 48,3% dos recursos do Pipe destinados às empresas de Campinas.
Já entre as subsidiárias das empresas estrangeiras, muitas delas resultaram
do processo de desnacionalização da indústria brasileira. Se antes do processo
de liberalização da economia brasileira, iniciado na primeira metade dos anos de
1990, as empresas domésticas tinham uma participação relevante nos setores investigados, no período recente, esta participação vem diminuindo aceleradamente. Aumentou a importância do capital estrangeiro em Campinas e região, o que
ocorreu por meio de fusões e aquisições e devido aos novos investimentos diretos
das empresas estrangeiras (SOUZA; GARCIA, 1998).
1. O Pipe existe desde 1997 e destina-se a apoiar o desenvolvimento de pesquisas inovadoras, a serem executadas
em pequenas empresas sediadas no estado de São Paulo, sobre importantes problemas em ciência e tecnologia que
tenham alto potencial de retorno comercial ou social (FAPESP, 2008).
2. As empresas a que se refere o Pipe não são as mesmas do estudo de Souza e Garcia (1998).
Polos e Parques de Alta Tecnologia: uma alternativa?
155
Os fatores que levaram as empresas estrangeiras a instalarem-se em Campinas
e região estavam vinculados, principalmente, com a vasta infraestrutura logística
que cerca a região e com um complexo e integrado sistema viário. Devido, inclusive a existência do Aeroporto Internacional de Viracopos, que recebe grande parte
do movimento de cargas provenientes do exterior (SOUZA; GARCIA, 1998).
As grandes empresas também investiram em processos internos de treinamento de pessoal. Isto levou à formação de um contingente razoável de trabalhadores especializados, com habilidades tácitas e específicas a estes setores
(SOUZA; GARCIA, 1998). É provável que isto tenha ocorrido porque o perfil
do profissional formado pelas universidades, que eram destacadas como o lócus
para a formação de mão de obra qualificada, não correspondia ao perfil requerido pelas empresas.
Para as empresas, o principal diferencial da região de Campinas era sua
estrutura logística e não o potencial de P&D instalado no município. As interações entre as empresas de capital estrangeiro – aquelas que mantinham alguma
atividade de P&D – com as instituições de P&D locais eram de caráter eminentemente formal, para atender as contrapartidas ou exigências legais como as da
lei de informática (SOUZA; GARCIA, 1998).
Outro ponto importante destacado na pesquisa de Souza e Garcia
(1998) é o de que entre os principais investimentos anunciados para a cidade de Campinas, entre os anos de 1997 e 1998, 12 deles eram de empresas
estrangeiras e um de uma empresa doméstica, que iriam instalar suas plantas industriais no município. Entre estas empresas, podem-se destacar Lucent Technologies, Nortel Telecomm, Compaq, Motorola, DEC, Avex, SCI
Systems e GE Plastics, que são consideradas exemplos de empresas de alta
tecnologia. Como destacam Souza e Garcia (1998), também para estas empresas – além das 13 investigadas – os principais fatores para sua instalação
em Campinas estavam ligados à infraestrutura viária da região e à presença
do Aeroporto de Viracopos.
Nesse sentido, também para essas empresas a presença de um complexo
aparato de C&T na região tinha claramente uma importância secundária. Para
estas, o principal diferencial da região de Campinas era sua estrutura logística
(SOUZA; GARCIA, 1998).
4.2 A relevância dos setores produtivos para a universidade
Campinas destaca-se na produção de C&T nacional se consideradas as estatísticas
de patentes e artigos científicos produzidos por município. Apenas quatro municípios – São Paulo, Rio de Janeiro, Campinas e Joinville – detinham mais de 500
patentes entre os anos de 1990 e 2000. E apenas dois municípios – São Paulo e
156
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
Rio de Janeiro – ultrapassavam, entre estes anos, a marca de 3 mil artigos, e outros
quatro – Campinas, São Carlos, Belo Horizonte e Porto Alegre – ultrapassavam a
marca de mil artigos (ALBUQUERQUE et al., 2001).
Entre as instituições de P&D localizadas em Campinas, a UNICAMP é que
mais se destaca na produção de patentes e artigos científicos. Todavia, apesar do
destaque da UNICAMP, sua importância para os setores produtivos – excetuando
as empresas estatais, ao longo dos anos 1970 e 1980 – enquanto transferência
de tecnologia e por meio da realização de projetos de pesquisas nas empresas,
tem sido modesta como observado nos dados sobre concessão e licenciamento de
patentes, nos dados do Programa de Apoio à Pesquisa em Parceria para Inovação
(Pite) da FAPESP e no estudo de Brisolla et al. (1997).
Embora a transferência de tecnologia de uma instituição de P&D não se
restrinja à produção de patentes e seus licenciamentos, este pode ser um indicador
desta atividade. De 1989 a 2006, a UNICAMP solicitou o registro de 460 patentes ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi). Nesse mesmo período
foram concedidos 50 dos registros solicitados (INOVA UNICAMP, 2006).
Em 2004, 2005 e 2006 a UNICAMP assinou 16, 28 e 30 contratos de
licenciamento de patentes, respectivamente. Em 2004, havia 16 contratos de licenciamento entre a UNICAMP com atores externos. No ano seguinte foram
firmados mais 12 contratos, totalizando 28 naquele ano. Em 2006, foram firmados mais dois contratos, chegando a 30 vigentes neste ano (INOVA UNICAMP,
2006). Estes contratos foram firmados com 24 empresas, de pequeno e médio
porte, gerando uma média anual de R$ 250 mil em royalties para a UNICAMP
(AGÊNCIA FAPESP, 2007), aproximadamente 0,02% da receita3 total da universidade e 0,13% de sua receita de pesquisa.4
Embora o número de pedidos de patentes concedidas seja igual a 50 e o
de contratos de licenciamento, em 2006, igual a 30, isso não implica que mais
da metade das patentes concedidas foram licenciadas. Há contratos de licenciamento de uma mesma patente que foram firmados com mais de uma empresa
(INOVA UNICAMP, 2006).
Ainda sobre indicadores de transferência de tecnologia da UNICAMP para
os setores privados, o Pite,5 criado em 1995, ajuda a analisar como este processo
vem se desenvolvendo nesta universidade.
3. A média da receita da UNICAMP entre 2000 e 2007 é de R$ 950 milhões.
4. A média da receita de pesquisa da UNICAMP entre 2000 e 2007 é de R$ 187 milhões (ver tabela 2).
5. Programa que busca promover a interação entre instituições de P&D e empresas, por meio da realização de projetos
de pesquisa cooperativos e cofinanciados. Os projetos aprovados são contratados pela FAPESP diretamente com os
pesquisadores das instituições de P&D (FAPESP, 2008).
Polos e Parques de Alta Tecnologia: uma alternativa?
157
O Pite, de 1995 a 2007, cofinanciou 87 projetos de pesquisa. Estes projetos
foram desenvolvidos por 15 instituições de P&D públicas e privadas do estado de
São Paulo em parceria6 com 60 empresas, que em sua quase totalidade eram grandes
empresas domésticas e estrangeiras (FAPESP, 2008). Os resultados destes projetos,
como direitos sobre patentes7 e direitos de comercialização, pertencem às entidades
proponentes e, em alguns dos casos, também à FAPESP (FAPESP, 2008).
Desses 87 projetos, 35 foram desenvolvidos na USP, 15 na UNICAMP, oito
na Universidade Estadual Paulista (UNESP) e os demais (29 projetos) em outras
12 instituições de P&D públicas e privadas. Ou seja, do montante de projetos
cofinanciados pela FAPESP entre 1995 e 2007, a USP, a UNICAMP e a UNESP
foram responsáveis por 40,2%, 17,2% e 9,2%, respectivamente (FAPESP, 2008).
Foram investidos nesses projetos R$ 54,9 milhões. Do total de investimentos, a FAPESP foi responsável por 29% – R$ 15,9 milhões – e as empresas
pelos 70% restantes – R$ 38,9 milhões (FAPESP, 2008). Do total dos investimentos, a USP recebeu R$ 15,3 milhões, a UNICAMP R$ 5,1 milhões e a
UNESP R$ 1,1 milhão. Divididos estes investimentos entre os anos de 1995
e 2007, a USP teria recebido R$ 1,1 milhão, a UNICAMP R$ 390 mil e a
UNESP R$ 80 mil por ano.
Como constatado, embora a UNICAMP seja a segunda instituição de P&D
do estado de São Paulo em número de projetos financiados pelo Pite, no decorrer
dos 13 anos que trata o programa, isto representou uma média de 1,15 projetos
por ano desenvolvidos pelos pesquisadores desta instituição em cooperação com as
grandes empresas. Os recursos destinados a estes projetos representaram, aproximadamente, 0,04% da receita da UNICAMP e 0,20% de sua receita de pesquisa.
Um estudo, concluído em 1997 por Brisolla et al.(1997), buscou contribuir
para ampliar a compreensão da problemática envolvendo a interação entre a universidade e o setor empresarial no Brasil, considerando, para isto, as condições
estruturais das localidades em que ocorreriam estas interações.
O estudo teve como base uma pesquisa realizada na UNICAMP, no período
de julho de 1995 a julho de 1997. A escolha da UNICAMP foi devido ao seu
destaque na produção de pesquisas e formação de recursos humanos qualificados
no Brasil. O estudo, por meio dos indicadores evolução dos contratos por período
de tempo, composição dos contratos segundo a categoria do financiador, avaliação da
interação, segundo os participantes e a aproximação entre os atores, mostra a modesta
interação entre a UNICAMP e os setores produtivos.
6. A ini­ciativa para o estabelecimento destas parcerias em 70% dos casos partiu das universidades e nos 30% restantes das empresas (AGÊNCIA FAPESP, 2008).
7. As patentes geradas por estas parcerias não são registradas pelas instituições de P&D. Desta forma, elas não constam na lista de patentes requeridas pelas instituições de P&D.
158
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
A evolução dos contratos, que compreende 1981 a 1995, foi separada em
três períodos de cinco anos cada, sendo que no primeiro foi somada a média aritmética dos contratos do período, para sua uniformização.
Entre os períodos 1981-1985 e 1986-1990, acompanhando a tendência
de recuperação econômica promovida pelo Plano Cruzado – implementado
em 1986 –, cresceu 240% o número de contratos da universidade. Como resultado deste crescimento, o montante dos recursos captados elevou-se cerca
de 50% neste período.
Esse aumento deveu-se, principalmente, aos contratos com empresas privadas. Todavia, o valor médio destes contratos foi inferior ao dos celebrados com
empresas públicas ou com as agências governamentais. A diferença de composição por categoria de financiador produziu um portfólio de contratos com valores
cerca de 20% inferiores entre os períodos de 1986-1990 e o anterior.
O período 1991-1995 foi marcado por um resultado altamente negativo
no que se refere ao número e ao valor médio dos contratos da universidade.
Além de ter se acentuado – de 20% entre 1981-1985 e 1986-1990 para 43%
de redução entre 1986-1990 e 1991-1995 – a queda no valor médio, verificouse uma redução de aproximadamente 20% no número dos contratos. O volume total de recursos captados na primeira metade dos anos 1990 equivalia a
60% do valor conseguido no primeiro período analisado e a 40% do obtido
no segundo período.
Quando analisada a composição dos contratos, segundo a categoria do financiador, os autores verificaram que do total de 732 contratos, 27,5% foram
firmados com agências de financiamento do governo, 26,6% com empresas privadas e 22,4% com empresas estatais. Estas três categorias respondiam por mais
de três quartos do número de projetos da universidade. De outra perspectiva,
quase 70% dos contratos foram financiados por instituições públicas – somando
agências, administração pública federal, estadual e municipal.
O maior valor médio dos projetos foi financiado pelas agências governamentais, com R$ 588 mil, aproximadamente. O segundo maior valor médio
foi o das empresas estatais, com R$ 316 mil, aproximadamente. Os contratos
de menor valor foram celebrados com os institutos públicos de pesquisa, com
R$ 27 mil em média. As empresas privadas ocuparam a penúltima posição
entre as categorias de financiadores, com um valor médio de R$ 82,5 mil por
contrato (conforme tabela 2).
Polos e Parques de Alta Tecnologia: uma alternativa?
159
TABELA 2
Financiamento da P&D na UNICAMP, nos períodos de 1981-1995 e 2000-2007
Categoria do financiador
Frequência
Períodos
Duração média (meses)
Valor médio
(R$ mil)
1981-1995
2000-20071
Agências de financiamento
201
30,7
588
118,2
117,3
Empresa privada
195
16,3
82,6
16,1
13,8
Empresa estatal
164
21,1
315,9
51,8
10,3
Institutos públicos de P&D
55
13
27,2
1,5
–
Administração pública federal
39
12,6
102
34
15,6
Administração pública estadual
35
12,3
277,5
9,7
5,8
Administração pública municipal
15
13,8
130,6
2
3,2
Instituições internacionais
14
32,4
148,5
2,1
2,5
Universidades e ONGs nacionais
14
17,4
180
2,5
–
–
–
–
–
2,5
Financiamento próprio
Fundos de C&T
Total
1981-1995
Volume médio de recursos
(R$ milhões)
–
–
–
–
16,2
732
21
325
237,9
187,2
Fontes: Para 1981-1995, Brisolla et al. (1997); para 2000-2007, UNICAMP (2007).
Elaboração dos autores, a partir do Anuário de Pesquisa da UNICAMP 2007.
Nota: 1O volume médio de recursos no período 2000-2007 foi calculado com base nos recursos alocados em P&D na UNICAMP.
A duração média dos contratos foi maior com as instituições internacionais,
com média de 32,5 meses de duração. Porém, quando considerados os recursos
financeiros, estes convênios foram bastante modestos. Eles se referiam, geralmente, ao apoio institucional de pequena monta, como a compra de material de consumo de laboratórios, bolsas de estudos e outras atividades que, por sua natureza,
desenvolvem-se por períodos mais longos.
As agências de financiamento – principalmente a Financiadora de Estudos e
Projetos (FINEP) – contrataram projetos por um período médio de 30,7 meses e
as empresas estatais, por 21 meses em média, que são períodos bastante elevados.
Os contratos com empresas privadas duraram, em média, 16 meses.
As agências de financiamento foram responsáveis, no período de 1981-1995,
por um montante de R$ 118 milhões destinados à universidade, o que corresponde a
50% dos recursos extraorçamentários que entraram na UNICAMP. No segundo período analisado elas continuaram sendo os maiores financiadores da P&D da UNICAMP, tendo inclusive sua participação se elevado para 63% do total de recursos.
Excetuando-se as agências de financiamento, foram as empresas estatais, no
período 1981-1995, as que mais contribuíram para o financiamento da P&D da
universidade. Isto se expressa no volume total de recursos, segundo a categoria do
financiador. Porém, no período 2000-2007 verifica-se uma significativa redução
do volume de recursos destinados à P&D na UNICAMP pelas empresas estatais.
No primeiro período, as empresas estatais respondiam por 21% do financiamento da P&D da UNICAMP. Já no segundo período sua participação foi reduzida a
5,5% do total de recursos de financiamento à P&D da universidade.
160
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
A administração pública federal também teve importância de destaque no
financiamento à P&D da UNICAMP no primeiro período analisado. Nele, a administração pública federal foi responsável por 14% do total de financiamento. Porém, no segundo período sua participação foi igual a 8% do total de financiamento.
No período 1981-1995, as empresas privadas representavam 26,6% do número
de contratos da universidade, porém somavam apenas 6,8% do volume médio de recursos. No segundo período sua participação não sofreu grande alteração, pois esta foi
elevada para 7,3% do financiamento à P&D da UNICAMP. Mesmo a participação
das empresas privadas, em termos relativos, tendo se elevado, em termos absolutos
esta teve uma queda de 15% – 2,3 milhões de reais a menos destinados ao financiamento à P&D da UNICAMP – no período 2000-2007, em relação ao anterior.
Se somados o financiamento público,8 eles representavam no primeiro
período 92% do total da P&D da UNICAMP. No segundo período estes representavam 93% do total do financiamento à P&D da UNICAMP.
Outro dado importante, que pode ser visto no tabela 2, é que houve redução
no financiamento à P&D da UNICAMP entre os dois períodos. Esta redução
deve-se em maior medida a queda na participação das empresas estatais, que foi
de 80% entre os dois períodos, o que representou 41 milhões de reais a menos no
financiamento à P&D da UNICAMP.
Sobre a categoria avaliação da interação, segundo Brisolla et al. (1997), a
grande maioria dos contratos realizados com o setor produtivo estavam voltados
à pesquisa e ao desenvolvimento – 68% – sendo que 41% foram projetos de
desenvolvimento, 14% de pesquisa e 13% de cunho exclusivamente tecnológico.
Atividades de prestação de serviços corresponderam a 19% e cursos e treinamentos responderam por apenas 6% dos contratos. Contratos envolvendo
consultorias e assessorias, projetos de engenharia, análises de rotina, informações
técnico-científicas, representaram apenas 5%.
Cerca de 60% dos contratos tiveram relações de cooperação envolvendo
membros da entidade financiadora e equipes de pesquisadores. Isto foi especialmente verdadeiro para os contratos de P&D, embora nas prestações de serviço,
nas quais era esperada uma baixa interação entre as equipes, as relações de cooperação foram também significativas.
Quanto à aproximação entre os atores, os motivos que levaram os pesquisadores a interagirem com o setor empresarial foram a busca de recursos financeiros
e a identificação de temas de pesquisa. É interessante notar que a informalidade
8. Agências de financiamento, empresas estatais, institutos públicos de P&D, administração pública federal, administração pública estadual, administração pública municipal, financiamento próprio e fundos de C&T.
Polos e Parques de Alta Tecnologia: uma alternativa?
161
marcou os contatos iniciais. Em mais de 50% dos contratos estudados, os contatos pessoais informais foram a principal via de acesso utilizada pelos atores.
Ex-alunos, participação em congressos, organização de workshops, foram mencionadas como situações que favoreceram o estabelecimento de contatos, não apenas
de iniciativa das empresas, mas também, de membros da comunidade de pesquisa.
Ao passo que, ao longo dos anos 1980 e 1990, foi bastante tímido o desempenho das
instituições de enlace9 entre a UNICAMP e os setores produtivos privados.
Apesar de ter um grande destaque quanto à produção de C&T no Brasil,
isto se considerados os indicadores apresentados acima, a relação da UNICAMP
com os setores produtivos tem sido bastante modesta em termos de transferência
de tecnologia para os setores produtivos. Esta instituição vem produzindo C&T,
que, no limite, não tem relevância para estes setores.
5 Respondendo À segunda pergunta: por que aS políticaS públicaS
apresentaraM tais resultados?
Na tentativa de se responder a essa pergunta, evidencia-se dois aspectos fundamentais
que ajudam a entender o porquê dos modestos resultados da política de PATs. O primeiro aspecto é a emulação das experiências de PATs dos países de capitalismo avançado, o qual está ligado com a concepção que a comunidade de pesquisa e mesmo a
sociedade de forma geral, possui acerca da C&T. O segundo aspecto é a política pública constituir-se como uma política simbólica, o qual está relacionado com as especificidades da sociedade em que esta foi formulada e que a impedem de ser implementada.
O fenômeno da emulação, ou geração de mecanismos de interface que tentam
imitar as experiências de sucesso dos países de capitalismo avançado (THOMAS;
DAVYT; DAGNINO, 1997), não se restringe à política de PATs. Ele perpassa as
diversas propostas de arranjos institucionais elaboradas no Brasil e, em geral, as
políticas que buscam estimular a interação universidade – empresa.
Os argumentos da comunidade de pesquisa, de que a debilidade da interação entre o potencial de C&T e o desenvolvimento econômico é um problema
grave nos países de capitalismo periférico e que ele deve ser enfrentado, são amplamente aceitos pelos policy makers.
Ainda que não haja um consenso entre os membros da comunidade de pesquisa sobre as causas e possíveis soluções desse problema público, a alternativa
efetivamente aceita no momento da formulação dos PATs, que continua vigente
até hoje, para sua resolução foi a que buscava fazer com que o potencial de C&T
fosse utilizado pelo sistema produtivo.
9. São elas: Companhia para o Desenvolvimento Tecnológico (CODETEC), Centro de Tecnologia (CT), Centro de Incentivo à Parceria Empresarial (Cipe) e Escritório de Transferência de Tecnologia (ETT).
162
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
A alternativa partiu da concepção de membros da comunidade de pesquisa
de que as demandas por conhecimento – seja ele incorporado em pessoas ou desincorporado – poderiam, tal como observado nos países de capitalismo avançado, ser reduzidas àquelas exercidas pelas empresas. Nesta alternativa, as empresas
constituíram-se em um polo a ser conectado. O outro polo, cuja função seria
produzir conhecimento, e que para isto contava com o apoio do estado, seria as
universidades (DAGNINO, 2004).
Essa concepção da comunidade de pesquisa brasileira tem sua base no modelo ofertista institucional linear. Este modelo surgiu nos países de capitalismo
avançado, inicialmente nos Estados Unidos, depois que a comunidade científica
ganhou a guerra contra o fascismo, com o projeto Manhattan e a bomba atômica. Nesse período se estabelece um novo contrato social entre a comunidade de
pesquisa e o Estado. Contrato que garantiria que a sociedade pudesse ser sempre
beneficiada pelos frutos do conhecimento custeado pelo Estado e que, em retribuição, seriam oferecidos pelos homens de ciência (DAGNINO, 2002).
Nos países de capitalismo avançado, há uma teia de relações sociais formada por
empresas, Estado e sociedade em geral, para a qual o conhecimento gerado a partir deste modelo é funcional. Esta teia vai evidenciando e sinalizando, ao longo do tempo, os
campos de conhecimento que são mais relevantes para aquela sociedade (DAGNINO,
2002). Campos de relevância que podem ser entendidos como resultante dos projetos
que seus atores dominantes – as elites econômicas e políticas – apontam enquanto demanda por conhecimento que deve ser gerado pela comunidade de pesquisa.
Esses sinais de relevância, em geral difusamente emitidos, são captados pela
comunidade de pesquisa, que os decodificam a partir de modelos descritivos, normativos e institucionais, preconceitos, mitos e verdades de sentido comum. Estes
sinais vão conformando o caldo de cultura da pesquisa por meio do qual o sinal
de relevância – substantivo e ex ante – é decodificado pela comunidade de pesquisa
e que leva à construção de um sinal de qualidade – adjetivo e ex post. E é este sinal
que, finalmente, pode ser processado e operacionalizado mediante a formação do
critério de qualidade e do juízo dos pares, que orientam a ação da comunidade de
pesquisa dos países de capitalismo avançado. O resultado é um mecanismo que
reduz o compromisso social da comunidade de pesquisa a uma mera garantia de
qualidade da pesquisa que vai ser feita com o dinheiro público, uma vez que a
relevância está garantida pela teia social de atores.
Os conceitos de teia de relações e de campo de relevância, que no caso dos
países de capitalismo avançado aparecem como evidentes, permitem perceber o
efeito do modelo institucional ofertista linear na América Latina. Em particular
porque a comunidade de pesquisa latino-americana considera que qualidade em
pesquisa – um conceito que nos países de capitalismo avançado depreende-se
Polos e Parques de Alta Tecnologia: uma alternativa?
163
daqueles dois outros – é não apenas neutra, a histórica e universal, mas, vale a
redundância, a única possível (DAGNINO, 2002).
São poucos os que se dão conta de que o conceito de qualidade que a comunidade de pesquisa brasileira adota é, na realidade, historicamente e socialmente
construído nos países de capitalismo avançado. Isto é, que pertence a outro campo
de relevância estabelecido por uma outra teia de relações. Por ser datado e formado
no interior de outro contexto econômico, social e político, este conceito é funcional aos interesses dos atores sociais que nele manifestam-se de forma hegemônica.
Devido à concepção que os atores sociais (incluindo a comunidade de pesquisa) possuem acerca da C&T – de que ela é neutra –, tornou-se amplamente
aceito que a comunidade de pesquisa deva ser o ator dominante na elaboração
da PCT (DAGNINO, 2007b). Política esta, percebida pelos atores como policy
e não como politics, segue, tal como o modelo de C&T dos países de capitalismo
avançado, sendo emulada pelos países de capitalismo periférico.
A proposta que se tornou relativamente frequente entre os atores dominantes no processo de elaboração da PCT diz respeito ao estímulo à formação de
PATs, com o intuito de criar um ambiente institucional favorável ao surgimento
de inovações tecnológicas tal como nos países de capitalismo avançado.
A prática da importação de modelos constitui um processo comum entre
os países de capitalismo avançado. Entre eles esta prática não se mostra muito
problemática, uma vez que suas características estruturais não apresentam disparidades muito relevantes (DIAS, 2005).
No caso da emulação de experiências realizadas no contexto dos países de
capitalismo avançado por um país de capitalismo periférico, como o Brasil, devido às discrepâncias estruturais existentes entre estes dois conjuntos de países, esta
prática pode gerar graves consequências.
Além da emulação de arranjos institucionais dos países de capitalismo avançado, outro aspecto que ajuda a compreender o porquê dos modestos resultados
do PATC diz respeito a ele ter se constituído como uma política simbólica.
A emulação dos PATs como proposta de política pública, tal como ocorreu
no caso do PATC, implicava os policy makers, além de conceberem a C&T como
neutra e universal, acreditarem que três elementos, que se supunha permitir o desenvolvimento destas experiências nos países de capitalismo avançado, estivessem
presentes no Brasil e, invariavelmente, em Campinas. São eles: i) ator empresa
altamente demandante de P&D, desenvolvida localmente como elemento central
de sua competitividade; ii) o ator universidade formador dos pesquisadores que
desenvolveriam P&D nas empresas; e iii) o ator Estado com o poder de articular
e coordenar os atores empresa e universidade com vista à inovação tecnológica.
164
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
Sobre o primeiro elemento – ator empresa altamente demandante de inovações tecnológicas –, uma olhada mais atenta para a realidade brasileira, e consequentemente na de Campinas, mostraria que o ator econômico que aqui é
chamado de empresa não é exatamente o que nos países de capitalismo avançado
recebe este nome. Isto é, não cumpre as mesmas funções. Ao adotar acriticamente o marco de referência gerado nestes países para tratar sua realidade, a comunidade de pesquisa brasileira incorreu no pecado epistemológico de chamar pelo
mesmo nome – usar o mesmo significante: empresa – coisas com significados
diferentes (DAGNINO, 2004).
Nos países de capitalismo avançado, as empresas – as grandes empresas –
nacionais é que controlavam a inovação, tanto com a produção de novos produtos quanto de processos, dentro de suas economias. Estas empresas também
eram as responsáveis por grande parte das transações internacionais e detinham a
iniciativa neste terreno (FURTADO, 1974).
Como destacado por Furtado (1972), as empresas localizadas no Brasil não
atuavam da mesma forma. Segundo este autor, no país existiriam três categorias de empresas: um setor privado nacional, formado por um limitado número
de grandes firmas que sobreviviam com maior ou menor grau de autonomia e
por um número considerável de pequenos empresários; um poderoso setor privado estrangeiro, orientado por dirigentes estrangeiros ou brasileiros, formado
por filiais ou empresas subsidiárias de consórcios internacionais; e outro setor de
importância crescente que era formado pelas empresas públicas, quase sempre
originárias da administração civil ou militar (FURTADO, 1972).
As atividades dirigidas por esses três grupos tendiam a ser mais complementares
do que competitivas. As empresas controladas diretamente pelo Estado tinham a exclusividade de certas áreas. Elas dominavam as atividades infraestruturais ou criadoras de economias externas, as quais requeriam grandes imobilizações de capital e não
eram afetadas pelo progresso técnico – inovações tecnológicas (FURTADO, 1972).
O grupo privado nacional controlava as atividades de construção e certas
manufaturas tradicionais. Ele também operava como subcontratista das empresas
estatais e das estrangeiras. O grupo das empresas estrangeiras tinha o controle quase que absoluto das indústrias de bens de consumo duráveis, químico-farmacêutica
e equipamentos em geral, que em conjunto eram as que mais se expandiam e as
que mais inseriam o progresso técnico na sua produção (FURTADO, 1972).
O dinamismo econômico dos países de capitalismo avançado decorria do
fluxo de inovações tecnológicas e da elevação dos salários reais da população,
o que lhes permitia a expansão do consumo de massa. No Brasil, todavia, o dinamismo econômico desenvolvia-se com base em um mimetismo cultural e na
permanente concentração de renda, o que fazia com que uma minoria da popula-
Polos e Parques de Alta Tecnologia: uma alternativa?
165
ção pudesse reproduzir o padrão de consumo dos países de capitalismo avançado
enquanto que a grande maioria estava vivendo na pobreza (FURTADO, 1974).
Dado a isso, as empresas brasileiras voltavam sua produção para atender à
progressiva satisfação do consumo desta minoria com poder de consumo. Como
o processo de diferenciação e criação de novos produtos apoiava-se, do lado da
demanda, na adoção dos hábitos de consumo dos países de capitalismo avançado,
as empresas brasileiras – estrangeiras e domésticas – utilizavam tecnologias transferidas do exterior para produzi-los. Neste caso, a inovação constituía-se apenas
em produzir internamente o bem já fabricado nos países de capitalismo avançado
(BIATO; GUIMARÃES; FIGUEIREDO, 1973).
Outro fator que diferenciaria as empresas, ou melhor, as economias, dos países
de capitalismo avançado das empresas dos países de capitalismo periférico seria a dinamização do desenvolvimento tecnológico. A diminuição da oferta de mão de obra nos
países de capitalismo avançado elevaria o valor da remuneração salarial. Em resposta
a isto, os capitalistas – empresários – destes países tenderiam a desenvolver inovações
tecnológicas poupadoras de mão de obra, mas capazes de manter a taxa de lucro com
a obtenção de mais-valia relativa (FURTADO, 1989 apud CEPÊDA, 2008).
Nos países de capitalismo periférico, devido a sua grande oferta de mão de
obra, as empresas não percorreriam o mesmo caminho dos países de capitalismo avançado. Por não sofrerem pressão salarial, não necessitariam de renovações
tecnológicas. Sua taxa de lucro seria mantida por meio da extração de mais-valia
absoluta com a redução dos salários (FURTADO, 1989 apud CEPÊDA, 2008).
Mesmo na atualidade as estratégias de inovação das empresas brasileiras não
estão fundamentadas no investimento em P&D. Suas estratégias continuam calcadas na transferência de tecnologia e não no desenvolvimento de P&D interno a elas.
Segundo dados da PINTEC (IBGE, 2005), em 2005, 32.800 empresas brasileiras fizeram inovação tecnológica em produto ou processo. Deste total, 30.377
são industriais e 2.418 são prestadoras de serviços de alta tecnologia – nos setores
de telecomunicações, informática e pesquisa e desenvolvimento. Do total de empresas que inovaram, 20% – 6.560 empresas – fizeram isto por meio de investimento de parte de sua receita em P&D. Ao passo que 48,4% – 15.875 empresas –
inovaram por meio da aquisição de máquinas e equipamentos.
Caso se some as demais modalidades de inovação – aquisição externa de
P&D; outros conhecimentos externos; introdução de inovação tecnológica já
existente no mercado; projeto industrial; treinamento – que juntos correspondem a 31,4% das atividades de inovação, com a aquisição de máquinas e equipamentos, o percentual de inovação das empresas feito por meio da aquisição de
produtos ou processos já existentes no mercado seria igual a 80% (IBGE, 2005).
166
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Sobre o segundo elemento – o ator universidade formador dos pesquisadores
que desenvolveriam P&D nas empresas –, a comunidade de pesquisa brasileira
concebia que, tal como nos países de capitalismo avançado, o lugar da ciência e da
educação seria a universidade e o lugar do desenvolvimento ou da demanda de tecnologia seria a empresa. O elemento criador de inovação seria o cientista ou engenheiro trabalhando em atividades de P&D nas empresas (BRITO CRUZ, 2005).
Todavia, uma análise mais crítica sobre a estrutura produtiva brasileira mostraria que, distinto do que se observava nos países de capitalismo avançado, as universidades não viriam a desempenhar um papel fundamental nesta. Estas, diferentemente
do que se pretendia, não seriam formadoras dos cientistas e engenheiros e, também,
não geriam as inovações tecnológicas demandadas pelas empresas brasileiras.
As empresas brasileiras eram – e continuam sendo – em sua maioria, filiais de
firmas estrangeiras, que possuem seus próprios programas de lucro e investimentos. Por isto mesmo, a influência de tais empresas no desenvolvimento da C&T
no Brasil tem sido praticamente nula. Na verdade, estas corporações possuem laboratórios próprios de pesquisa, em seus países de origem (LEITE LOPES, 1981).
Por sua vez, as empresas domésticas utilizam conhecimento científico e
tecnológico provenientes dos países de capitalismo avançado (LEITE LOPES,
1981). Uma vez que a demanda da sociedade brasileira – aquela minoria que
pode consumir – por novos produtos ou processos reproduz o padrão de consumo dos países de capitalismo avançado, esta é satisfeita com transferência de tecnologias importadas. Ou seja, para atender esta demanda, as empresas domésticas
não necessitariam investir em P&D.
Admitindo que a comunidade de pesquisa aconselhasse o governo brasileiro a
adotar uma política de manutenção e estímulo às universidades, à pesquisa científica
e à cultura, paralelamente a um indispensável programa intensivo de educação básica, ainda permaneceria uma dificuldade fundamental. A saber: a utilização (a colocação) dos cientistas (pesquisadores) pelas empresas brasileiras (LEITE LOPES, 1981).
Se essas empresas estavam operando com base nos trabalhos científicos e
tecnológicos realizados no exterior, tornava-se claro que os pesquisadores formados pelas universidades locais não teriam muita oportunidade de emprego em
hipotéticos laboratórios de pesquisa destas corporações – estrangeiras ou domésticas. As empresas não estavam, portanto, interessadas em estabelecer vínculos
com os laboratórios e universidades brasileiras (LEITE LOPES, 1981).
Mesmo hoje permanece baixa a importância da interação das empresas com
outras instituições, em especial com as universidades como estratégia de inovação
tecnológica. Segundo dados da PINTEC (IBGE, 2005), a cooperação com outras
organizações no desenvolvimento de atividades inovadoras foi pouco utilizada
pelas empresas brasileiras (RAPINI, 2007).
Polos e Parques de Alta Tecnologia: uma alternativa?
167
Do conjunto das firmas inovadoras – aquele universo de 32.800 empresas – somente 11% valeram-se da estratégia de interagir com outras organizações como meio
de desenvolver inovações. Em termos de parcerias, a maior proporção de relações de
cooperação ocorreu entre fornecedores e clientes – 6% e 5%, respectivamente – das
empresas inovadoras, e apenas 3,7% com universidades (RAPINI, 2007).
Sobre o terceiro elemento – o ator Estado com o poder de articular e coordenar os atores empresa e universidade com vista à inovação tecnológica –, pretendia-se que o Estado brasileiro adotasse o mesmo modelo dos países de capitalismo
avançado. Ou seja, um Estado responsável por administrar as regras de interação
entre os atores, regulamentar as informações que eles poderiam ter acesso e orientar seus comportamentos para promover o desenvolvimento industrial com base
na inovação tecnológica (CIMOLI et al., 2007).
Todavia, uma olhada mais atenta sobre a política industrial brasileira mostraria o qual distante esta estava, já na década de 1970, de uma coordenação nacional. Como apontado por Furtado (1974), o dado mais importante a assinalar, no
que concernia aos países de capitalismo periférico em mais avançado processo de
industrialização, era a considerável dificuldade de coordenação de suas economias
no plano interno. Isto era devido à forma como vinha sendo articulada a economia
nacional com a internacional, fortemente influenciada pelas grandes empresas.
A debilidade do Estado como instrumento de direção e coordenação das
atividades econômicas, em função de algo que se possa definir como interesse da
coletividade local, passou a ser um fator significativo no seu processo de desenvolvimento (FURTADO, 1974).
Outro ponto importante que impossibilitaria a coordenação do Estado sobre os atores e as atividades de inovação era a correlação de forças políticas na
sociedade brasileira. A correlação de forças políticas, que sancionou uma crescente e brutal concentração de poder econômico, muito pouco espaço deixaria
para que o conhecimento e os recursos humanos qualificados, que o complexo
de C&T poderia produzir, pudessem ser utilizados para o desenvolvimento de
inovações tecnológicas (DAGNINO; THOMAS, 1999).
Esses três elementos seriam suficientes para apontar que as propostas de solução para o problema público da debilidade da interação do potencial de C&T
com o complexo produtivo local não levariam à sua resolução. Os formuladores
das propostas de emular as experiências norte-americanas de Polos e Parques de
Alta Tecnologia – que vigoram até hoje – e vincular os setores produtivos ao desenvolvimento da C&T, tendo como centrais as empresas de alta tecnologia, não
consideraram estas especificidades da sociedade brasileira.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
168
6 Conclusões
Se considerada a política pública como um curso de ação, que envolve as definições de metas, objetivos e, principalmente, de diretrizes para focalizar um
problema público (HAM; HILL, 1993; ROTH, 2006; CAVALCANTI, 2007),
as políticas dos PATs não poderiam, de modo estrito, ser consideradas como tal.
As políticas dos PATs correspondem a políticas simbólicas. Por terem sido
formuladas para emular as experiências de PATs dos países de capitalismo avançado, não encontraram aqui as mesmas condições sociais que permitiam o desenvolvimento delas nos países de origem. Formulação que está relacionada com a
concepção que a comunidade de pesquisa e os policy makers – e mesmo a sociedade em geral – possuem acerca da C&T fundada na ideia de neutralidade.
Após quase três décadas do início das políticas dos PATs, seus resultados
têm sido bastante modestos. Os apontamentos críticos de autores dos países de
capitalismo avançado acerca dos PATs – de que a formação e o estreitamento da
relação universidade – empresa não demandavam proximidade física; de que a
criação de infraestrutura não era condição suficiente para promover uma eficiente
rede de comunicação e relacionamento; de que a criação de empresas, atribuída à
vinculação com as universidades, apresentava-se mais como exceção do que como
regra; de que as empresas de alta tecnologia não tenderiam a deixar os PATs para
se transformarem em unidades produtivas e que não demandariam significativamente mão de obra especializada; e de que as empresas de grande porte não eram
propensas a relacionarem-se com as universidades (GOMES, 2001) – não foram
levados em conta na formulação da política dos PATs.
É provável que se fosse feita uma análise mais detida sobre a realidade brasileira no momento da construção do problema público que originou estas políticas, elas não teriam sido escolhidas como centrais para a promoção da interação
entre o potencial de C&T e o desenvolvimento econômico do país.
Polos e Parques de Alta Tecnologia: uma alternativa?
169
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CARACTERÍSTICAS DE ABSENTEÍSMO ENTRE TRABALHADORES
DA SAÚDE: NÍVEL CENTRAL DA SECRETARIA DE ESTADO DE
SAÚDE/MT DE 2005 A 2006*
Maritza Muzzi Cardozo Pawlina**
Antonieta Fernandez de Campos***
Larissa Slhessarenko Ribeiro****
Este estudo descritivo/exploratório objetiva analisar características de absenteísmo por morbidades
entre 923 trabalhadores do Nível Central da Secretaria de Estado de Saúde de Mato Grosso (SES/
MT), no período 2005-2006, para subsidiar políticas públicas que venham a reduzir os impactos
na vida dos trabalhadores bem como dos serviços prestados à população. Utilizou-se formulário
para a coleta de dados nos prontuários da coordenadoria de perícia médica do estado de Mato
Grosso e efetuou-se análise de frequência simples. Os resultados indicam que as doenças do
sistema osteomuscular e do tecido conjuntivo, os fatores que influenciam o estado de saúde e o
contato com os serviços de saúde foram, respectivamente, as nosologias que mais acometeram
os trabalhadores nesse período, com maior proporção entre o gênero feminino, casados, na faixa
etária acima de 46 anos e com mais de 20 anos de trabalho. Conclui-se que o absenteísmo
por morbidade, entre os trabalhadores em estudo, impactou financeiramente a instituição.
Há necessidade de implementar ações de prevenção à saúde do trabalhador que possam contribuir
com a qualidade e a produtividade nos serviços oferecidos à população.
Palavras-chave: Absenteísmo; Morbidades; Saúde do Trabalhador; Sistema Único de Saúde.
CHARACTERISTICS OF ABSENTEEISM AMONG WORKERS FROM THE HEALTH:
CENTRAL LEVEL OF THE SECRETARY OF HEALTH FROM THE STATE OF MATO
GROSSO, IN THE PERIOD FROM 2005 TO 2006
This descriptive/exploratory study objectives to analyze characteristics of absenteeism for
morbidities among 923 workers from the Central Level of the Secretary of Health from the State
of Mato Grosso, in the period from 2005 to 2006 to subsidize public politics that comes to reduce
the impacts in the life of the workers as well as of the services given to the population. It was used
form for the collect of data on the handbooks of the Coordenation of Medical Skill from the State
of Mato Grosso and effected analysis of simple frequency. The results indicate that the Illnesses of
* Os autores são gratos ao corpo técnico da Gerência de Desenvolvimento e Qualidade de Vida da Secretaria de Estado
de Saúde de Mato Grosso (SES/MT), especialmente aos servidores Elisabeth de Oliveira Ramos da Rosa, Jorge Luiz de
Arruda e Juliana Furquim Rodrigues Alves Martins, ao Coordenador da Perícia Médica, Sr. Avelino Caetano da Silva,
bem como à colaboração de Delma Perpétua Oliveira de Souza, doutora em Ciências da Saúde do Programa de PósGraduação de Saúde Coletiva do Instituto de Saúde Coletiva (ISC) da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), e
Geonir Paulo Schnorr, matemático da Secretaria de Planejamento do Estado de Mato Grosso.
** Profissional de nível superior do Sistema Único de Saúde (SUS), psicóloga da SES/MT e mestre em Administração de
Empresas. E-mail: [email protected]
*** Profissional de nível superior do SUS, assistente social da SES/MT e especialista em Gestão Pública e Gestão em
Saúde Coletiva. E-mail: [email protected]
**** Profissional de nível superior do SUS, psicóloga da SES/MT e mestre em Administração de Empresas. E-mail:
[email protected]
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planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
the Osteomuscular System and the Conjunctive Tissue and the Factors that influence the state of
Health and the Contact with the Services of Health were, respectively the nosologies that more the
workers in this period assailed, with bigger ratio between the feminine sort, married, age-group
over the 46 years old, and with more than 20 years of work. It is concluded that the absenteeism
by morbidity between the workers in study, financially impacted in the institution. There is the
necessity to implement actions of prevention to the workers’health, that can contribute to the
quality and the productivity on the services offered to the population.
Key words: Absenteeism; Morbidities; Workers’health; Unique System of Health.
CARACTERÍSTICAS DE ABSENTISMO ENTRE TRABAJADORES DE SALUD:
NIVEL CENTRAL DE LA SECRETARÍA DE ESTADO DE SALUD DE MATO
GROSSO, EN EL PERÍODO 2005-2006
Este estudio descriptivo/exploratório tiene por objetivo examinar las características de absentismo
por morbilidades entre 923 trabajadores del nivel central de la Secretaría de Estado de Salud de
Mato Grosso, en el período 2005-2006 para subvencionar las políticas públicas que reduzcan los
impactos en la vida de los trabajadores y los servicios a la población. Fue utilizado formulario para
colectar datos en los registros de la Coordinadoría Médica de la Destreza del Estado de Mato
Grosso y de análisis de frecuencia simple. Los resultados indican que las enfermedades del sistema
osteomuscular y del tejido conjuntivo y de los factores que influyen en el estado de salud y el
contacto con los servicios de salud fueron, respectivamente las nosologías que más acometieron a
los trabajadores en ese período, con mayor proporción entre el genero feminino, casadas , de más
de 46 años, con más de 20 años de trabajo. Se concluye que el absentismo por morbilidad entre
los trabajadores en el estudio impactó financeramente en la instituición.Tenemos que ejecutar
acciones para la prevención de la salud de los trabajadores que puedan contribuir a la calidad y la
productividad de los servicios ofrecidos a las personas.
Palabras-clave: Absentismo; La Morbilidad; La Salud; Sistema Único de Salud.
CARACTÉRISTIQUES D’ABSENTÉISME ENTRE TRAVAILLEURS DE SANTÉ: “NIVEAU CENTRAL DU BUREAU DE SANTÉ DE MATO GROSSO”, DANS LA
PÉRIODE DE 2005-2006
Cette étude, descriptif/exploratoire, a pour objectif analyser les caractéristiques d’absentéisme par
morbidité entre 923 travailleurs du “Niveau Central du Bureau de Santé de Mato Grosso”, dans
la période de 2005/2006, pour subventionner des politiques publiques que viennent à reduire
l’impact dans la vie des travailleurs, ainsi comme les services rendus à la population. On a utilisé
des formulaires pour recueillir des donnés aux dossiers médicaux de la Coordination d’Expertise
Medicale de Mato Grosso et on a effectué l’analyse de la fréquence simple. Selon les résultats,
les maladies du Système Ostéomusculaire, du Tissu Conjonctif et les facteurs qu’influencent l’état
de santé et le contact aux Services de Santé, ont été, respectivement, les nosologies qui ont
compromis le plus les travailleurs dans cette période, avec une proportion majeure entre le genre
féminin, mariés, l’âge au-dessus de 46 ans et avec plus de 20 ans de travail. On a conclu, que
l’absentéisme par morbidité, entre les travailleurs en étude, a eu fort impact financier à l’institution.
Il faut mettre en œuvre des actions de prévention de la santé du travailleur que puissent collaborer
pour la qualité et productivité dans les services offerts à la population.
Mots-clés: Absentéisme; Morbidité; Santé du Travailleur; Système Unique de Santé.
Características de Absenteísmo entre Trabalhadores da Saúde...
175
1 INTRODUÇÃO
Atualmente as organizações vêm passando por transformações que afetam o ser
humano em vários aspectos e as pessoas estão vivendo em um ritmo de vida cada
vez mais acelerado, se dedicando muito ao trabalho, tendo que se adaptar às
exigências do mercado e ainda conseguir conciliar a dupla ou tripla jornada de
trabalho, perdendo a qualidade de vida, com dificuldades para realizar atividades
como esporte, cultura e lazer. E, sobretudo, comprometendo a saúde.
Dejours (1992) afirmava que o trabalho além de ser fonte de prazer e de
formação de identidade, causa insatisfação e até exaustão. Percebe-se que o ambiente de trabalho também acarreta agravos à saúde, refletindo no ser humano e
inclusive influenciando no seu comportamento.
O problema é que muitas vezes o ambiente de trabalho também é desgastante e desmotivador, contribuindo, como ressalta Vasques-Menezes (2004), para
o surgimento de problemas físicos ou psíquicos que podem vir a desencadear ou
determinar adoecimentos e/ou enfermidades. Estes, inclusive, podem ser os responsáveis pelo elevado número de absenteísmo nas organizações.
O termo absenteísmo originou-se da palavra absentismo, que por sua vez deriva do latim absens, ausente, de ab + esse (MALTEZ, 2003). A palavra absentismo
era utilizada quando proprietários rurais deixavam o campo para viver na cidade.
No período industrial, este termo foi designado aos trabalhadores que faltavam
ao serviço (QUICK; LAPERTOSA, 1982). Atualmente, este é concebido como:
Incapacidade temporária, prolongada ou permanente para trabalhar, em resultado
de doença ou de enfermidade. E o absenteísmo trabalhista é o não cumprimento,
por parte do trabalhador da jornada trabalhista, tanto por atrasar ou adiantar sua
saída diária, como por não fazer o trabalho em uma jornada completa, ou em várias (FUNDAÇÃO EUROPEIA PARA A MELHORIA DAS CONDIÇÕES DE
VIDA E DE TRABALHO, 1997).
Dessa forma, o absenteísmo trabalhista implica na ausência do trabalhador da
jornada de trabalho, independentemente da justificativa, e salienta-se que neste trabalho serão abordadas as ausências oriundas da incapacidade de se trabalhar em virtude
de patologias que estejam justificadas por atestado ou laudo médico e que sejam relacionadas ou não ao trabalho, conforme legislação em vigor (MATO GROSSO, 2002).
No Brasil, ainda há escassez de pesquisas em relação aos dados do absenteísmo e aos ônus econômico acarretado por ausências ao trabalho. O que existe
referem-se a estudos isolados como os realizados por Nascimento (2003) com
enfermeiros em uma unidade básica e distrital de saúde de Ribeirão Preto (SILVA,
2004), trabalhadores em um banco estatal de Minas Gerais (RIBEIRO, 2004),
bancários da Bahia, entre outros.
176
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
O governo do estado de São Paulo percebeu com os resultados da pesquisa,
em 2006, um crescimento no absenteísmo; que de 5,09 milhões de dias, em 2003,
passou para 6,3 milhões de dias, em 2006, ou seja, um aumento da ordem de 25%
em três anos. Entre os tipos de absenteísmo, o campeão é a licença saúde com
65,68% do total (SÃO PAULO, 2008). Outras pesquisas como a de Silva e Marziale (2000), Nascimento (2003) e Appolinário (2008) confirmam estes resultados.
Os dados da Previdência Social mostram que, no Brasil, existe um total
de 9.162 benefícios concedidos por auxílios doenças, totalizando um custo de
R$ 5.406.851,00 para os cofres públicos, com pagamentos de salários/benefícios
decorrentes de afastamentos do trabalho (BRASIL, 2004).
Segundo Danatro (1997) os custos com o absenteísmo são muito difíceis de
determinar, porém estima-se que são similares ao custo total do Serviço Nacional
de Saúde. Na indústria, representa mais de 10% de todas as despesas, salários e
horas extras pagos, e estudos comprovam tendências similares em outros países.
Em 1994, no Reino Unido, perdeu-se 117 milhões de dias de trabalho, em
resultado de faltas por doenças, o equivalente em produtividade a 11 bilhões de
libras esterlinas. As duas mil maiores empresas de Portugal perderam 5,5% da totalidade de dias de trabalho (FUNDAÇÃO EUROPEIA PARA A MELHORIA
DAS CONDIÇÕES DE VIDA E DE TRABALHO, 1997).
Quanto aos tipos de ausências, Midorikawa (2000), as descreve em absenteísmo pela falta ao trabalho (falta pura e simples do empregado ao trabalho) e o de
corpo presente (é aquele que apesar de não faltar ao trabalho, não desenvolve seu
melhor desempenho, levando à diminuição da produtividade, que ocorre devido
ao fato do trabalhador apresentar algum problema de saúde). Nascimento (2003)
as classifica em não previstas (as que caracterizam o absenteísmo, pelo seu caráter
imprevisível, como as licenças médicas, faltas abonadas e justificadas) e as previstas (as de direito do trabalhador, podendo ser planejadas com antecedência como
férias, folgas e feriados).
Em relação às causas do absenteísmo, percebe-se que também não existe um
consenso entre os autores. McDonald e Shever (1981 apud DALL”INHA, 2006)
citam as causas intrínsecas, extrínsecas e de personalidade; enquanto Meira (1982)
cita as naturais, socioeconômicas e as inerentes à própria empresa. Couto (1987)
reforça a multifatoriedade das causas, classificando-as em fatores de doença, de
trabalho, sociais, culturais e de personalidade e Souto (1998) relata que na causa
do absenteísmo, há muito mais fatores do que a simples doença.
Salienta-se que o fato das causas do absenteísmo estarem ligadas a múltiplos
fatores, faz com que este problema se torne crucial, complexo e de difícil gerenciamento tanto para os gestores de organizações públicas quanto aos das privadas.
Características de Absenteísmo entre Trabalhadores da Saúde...
177
Dessa forma, este estudo tem por escopo investigar características de absenteísmo por morbidades entre trabalhadores do Sistema Único de Saúde (SUS) do
Nível Central da SES/MT. Foram investigados fatores como sexo, estado civil,
faixa etária, tempo de serviço, local de trabalho, cargo ocupado e o impacto financeiro gerado pelas ausências.
A seção seguinte traz a metodologia de trabalho adotada, ou seja, sujeitos,
tipo de estudo, instrumento, população e os procedimentos para a realização. Na
terceira seção, são apresentados os resultados obtidos por meio do instrumento
diagnóstico. A análise e discussão dos resultados tanto do ponto de vista quantitativo como qualitativo estão contemplados na quarta seção. Na quinta seção estão
as conclusões com base em toda a trajetória desenvolvida.
2 MÉTODO
O desenho deste estudo é descritivo/exploratório realizado na Coordenadoria de
Perícia Médica do estado de Mato Grosso. O universo da população estudada foi
constituído por todos os trabalhadores do SUS concursados, inclusive em estágio
probatório, no período de janeiro de 2005 a dezembro de 2006, totalizando 923
trabalhadores, sendo que destes, 204 somente em 2005, 559 trabalhadores, nos
dois anos e 160 somente em 2006, todos lotados no Nível Central da SES/MT.
A designação Nível Central refere-se ao prédio da SES situado no Centro Político Administrativo em Cuiabá. É o núcleo da administração que tem a missão de prestar serviços sistêmicos de apoio aos órgãos e entidades do Poder Executivo estadual.
Estabeleceu-se como critério de inclusão, os trabalhadores que estiveram
afastados de suas funções laborais, pela Coordenadoria de Perícia Médica da Secretaria de Estado de Administração (SAD), em um período superior a três dias,
por motivo de licença para tratamento de saúde.
Esse período delimitado foi considerado pelo fato de que até três dias de
afastamento, não há diminuição ou exclusão do pagamento de acordo com o Decreto no 5.263, de outubro de 2002, Artigos 22 e 23, que institui o Regulamento
de Perícias Médicas do estado de Mato Grosso (MATO GROSSO, 2002).
Para a coleta de dados desta pesquisa foi elaborado um formulário denominado Caracterização do Absenteísmo – Perícia Médica (anexo 1), o qual foi preenchido pelas técnicas da Gerência de Desenvolvimento e Qualidade de Vida na
Coordenadoria de Perícia Médica da SAD, contendo as variáveis:
•
sexo: masculino e feminino;
•
estado civil: casado, solteiro, divorciado, desquitado, separado e viúvo;
•
cargo do SUS: de acordo com o plano de carreira dos profissionais
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
178
habilitados em curso de nível superior, nas áreas específicas correspondentes aos perfis profissionais do cargo e registro no conselho de classe;
técnico do SUS (habilitados em ensino médio profissionalizante, em
área específica, correspondente aos perfis profissionais deste cargo); assistente do SUS (comprovado ensino médio completo ou não); apoio
do SUS (ensino fundamental completo ou não);
•
carga horária de trabalho: 30 e 40 horas;
•
faixa etária: ≤ 25 anos, 26 a 35 anos, 36 a 45 anos e > de 45 anos;
•
tempo de trabalho na secretaria: até 3 anos, 3 a 5 anos, 5 a 8 anos, 8 a
12 anos, 12 a 15 anos, 15 a 20 anos e acima de 20 anos; e
•
superintendência: local de trabalho, onde está lotado atualmente, no
prédio do nível central da SES.
Cabe ressaltar que foi registrada somente a matrícula do trabalhador com
referência numérica, com a finalidade de preservar a identificação dele.
A segunda parte do formulário consistia em definir o mês do ano em que
o trabalhador passou na perícia para homologação do laudo médico, bem como
a quantidade de dias que foram autorizados e a justificativa (patologia de acordo
com a Classificação Internacional de Doenças (CID-10). E por último, um espaço destinado às observações que pudessem existir.
Os dados foram tabulados e analisados pelos programas Microsoft Excel
2003 e SPSS versão nove. Para análise estatística, utilizou-se a frequência simples.
O projeto deste estudo foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa com
seres humanos da SES/MT, segundo a Resolução no 196/1996 do Conselho Nacional de Saúde, sendo aprovado pelo Protocolo no 304/2007 (anexo 2).
3 RESULTADOS
Observa-se na tabela 1 que o número de trabalhadores do SUS lotados na SES
Central, em 2005, foi de 763 e, deste total, 135 tiveram seus afastamentos registrados junto à perícia médica. Os dados mostram que o número total de ausências
autorizadas pela perícia médica, independente do motivo causal, foi de 9.053 dias,
com a média de 67 dias/trabalhador ausente, ao longo do ano. Considerando a população de risco (total de trabalhadores do SUS lotados na SES Central em 2005),
a média é de 12 dias por trabalhador. Já em 2006, verificou-se que o número de
trabalhadores era de 719 e deste total, 168 tiveram seus afastamentos registrados
junto à perícia médica. O número total de ausências autorizadas, independente do
motivo causal, foi de 10.627 dias, com a média de 65 dias/trabalhador ausente, ao
longo do ano. Considerando a população de risco (total de trabalhadores do SUS
lotados na SES Central em 2005), a média é de 15 dias por trabalhador.
Características de Absenteísmo entre Trabalhadores da Saúde...
179
TABELA 1
Distribuição dos trabalhadores afastados por licença médica, lotados no Nível
Central da SES/MT – 2005-2006
Ano
Distribuição
Total de trabalhadores afastados
2005
2006
135
1681
1
Total de trabalhadores não afastados
628
551
Total
763
719
Fonte: Dados da Coordenadoria de Perícia Médica da SAD.
Nota: 1 Deste total, 75 são trabalhadores cuja licença médica abrangeu o período de 2005-2006.
Constatou-se aumento na razão dos dias de ausência pela população de risco.
Em 2005, registrou-se aproximadamente 12 dias de ausência por trabalhador e,
em 2006, este número aumentou para aproximadamente 15 dias de ausência por
trabalhador, representando aumento de 25%. Também pode-se verificar que houve
uma pequena redução (3%) no número de ausências pelo número de trabalhadores
com passagem pela perícia (tabela 2).
TABELA 2
Razão do número de dias de ausência dos trabalhadores afastados pelos trabalhadores periciados e pela população de risco – 2005-2006
Descrição
Razão 1: número de dias de ausência/número de trabalhadores
com passagem pela perícia
Razão 2: número de dias de ausência/população de risco
Ano
2005
2006
Taxa de crescimento
(%)
67
65
-3
12
15
25
Fonte: Dados da Coordenadoria de Perícia Médica da SAD.
A investigação absenteísmo/doença constatou que dos 135 trabalhadores
que passaram na perícia alguns retornaram mais de uma vez e, inclusive, em
certos casos com o CID diferenciado. Dessa forma, cada vez que o mesmo trabalhador se submeteu à perícia, este foi computado, perfazendo um total de 309
passagens pela perícia médica da SAD em 2005. E, em 2006, os 168 trabalhadores totalizaram 332 passagens por esta perícia.
A despeito de várias patologias terem aparecido como principais motivos
dos afastamentos registrados, de acordo com os grandes grupos da 10a revisão,
da CID 10 (OMS, 1995), somente as três que mais sobressaíram serão citadas.
Em 2005, em primeiro lugar, apareceram as doenças do sistema osteomuscular e do
tecido conjuntivo (M00-M99) com 15,7%, seguido dos fatores que influenciam o
estado de saúde e o contato com os serviços de saúde (Z00-Z99), com 12,1% e em
terceiro lugar os transtornos mentais e comportamentais (F00-F99), com 9,3%.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
180
Em 2006, alteraram-se as ordens, sendo que os fatores que influenciam o estado
de saúde e o contato com os serviços de saúde (Z00-Z99) apareceram em primeiro
lugar, com 26,8%, seguido das doenças do sistema osteomuscular e do tecido conjuntivo (M00-M99), com 12,8% e em terceiro os transtornos mentais e comportamentais (F00-F99), com 9,3% (gráfico 1).
GRÁFICO 1
Distribuição dos trabalhadores segundo a CID com passagens pela perícia médica –
2005-2006
(Em %)
26,8
15,7
2005
12,1
12,8
10,1
2006
9,3
Z
M
F
Fonte: Coordenadoria de Perícia Médica da SAD.
Observa-se que na letra Z, da CID, estão incluídos, segmento cirúrgico
especificado, convalescença após cirurgia, consultas, realização de exames, exame
de seguimento (após cirurgia por outras afecções), supervisão de gravidez, rim
transplantado, presença de implante otológico e audiológico, mobilidade reduzida e que o Z76.3 (pessoa em boa saúde acompanhando pessoa doente) não foi
considerado em nenhum momento neste estudo por não representar enfermidade
do próprio trabalhador.
Em relação aos números de dias de afastamento, constata-se que a grande maioria dos trabalhadores teve somente uma passagem pela perícia, sendo
que em 2005 foram 45,93% e, em 2006, 59,52% dos trabalhadores que obtiveram apenas uma ausência no ano. Da mesma forma, o percentual de pessoas
com até três ausências também é grande, 82,96% em 2005 e 84,52% em
2006. Tais dados mostram que poucos trabalhadores se ausentam por várias
vezes – quatro ou mais (tabela 3).
Características de Absenteísmo entre Trabalhadores da Saúde...
181
TABELA 3
Percentual de trabalhadores com passagens pela perícia em relação ao número de
dias de licenças – 2005-2006
Ano
Número de ausências
2005
2006
Valores
Percentual
Percentual acumulado
Valores
Percentual
1
62
45,93
45,93
100
59,52
Percentual acumulado
59,52
2
34
25,19
71,11
31
18,45
77,98
3
16
11,85
82,96
11
6,55
84,52
4
9
6,67
89,63
12
7,14
91,67
5
4
2,96
92,59
7
4,17
95,83
6
4
2,96
95,56
1
0,60
96,43
7
3
2,22
97,78
3
1,79
98,21
8
–
–
97,78
1
0,60
98,81
9
1
0,74
98,52
–
–
98,81
10
1
0,74
99,26
2
1,19
100
11
1
0,74
100
–
–
100
Total
135
168
Fonte: Dados da Coordenadoria de Perícia Médica da SAD.
No que diz respeito ao perfil sociodemográfico (tabela 4), percebe-se que o
percentual de trabalhadores com passagens pela perícia em relação ao número de
trabalhadores da SES, por gênero, nos anos de 2005-2006 é de, respectivamente,
22% e 28% para o sexo feminino e de 10% e 15% para o sexo masculino. Observa-se também que os trabalhadores casados têm maior participação proporcional
em relação ao total de trabalhadores, com 20% em 2005 e 32% em 2006, seguido
dos solteiros, com 15% e 25%, respectivamente.
TABELA 4
Percentual de trabalhadores com passagens pela perícia médica em relação ao total
de trabalhadores por características demográficas – 2005-2006
Descrição
Trabalhadores com passagem
pela perícia (1)
Total de trabalhadores da SES (2)
Percentual de (1) em (2)
2005
2006
2005
2006
2005
2006
Feminino
111
130
513
458
22
28
Masculino
25
38
250
261
10
15
Casado
71
84
353
260
20
32
Solteiro
56
68
365
271
15
25
Outros
8
16
45
28
18
57
Gênero
Estado civil
Fonte: Dados da Coordenadoria de Perícia Médica da SAD.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
182
No que diz respeito à faixa etária, verificou-se que a frequência relativa foi
maior nos trabalhadores na faixa etária acima de 46 anos, com 39,1% e 34,5%,
em 2005 e 2006, e em segundo lugar veio a faixa etária de 26 a 35 anos, com
33,3% e 33,9%, respectivamente.
Analisando os trabalhadores com passagens pela perícia, em relação ao total
de trabalhadores por cargo (tabela 5), verificou-se que a maior proporção encontrada está entre os trabalhadores que ocupam o cargo de apoio do SUS, com
31% em 2005 e 41% em 2006, e técnico com 31% e 25%, respectivamente.
Observa-se também, proporcionalmente, a participação em relação ao número de
trabalhadores por tempo de serviço, em 2005-2006, foi maior nos acima de 20
anos de serviço, com 26% e 46%, respectivamente, em relação aos trabalhadores
com menos tempo de serviço.
Quanto à carga horária, os dados permitiram concluir que os trabalhadores
que realizam 30 horas tiveram maior participação percentual nas passagens pela
perícia médica em relação ao total de trabalhadores com a mesma carga horária,
com 24% e 25%, respectivamente, em 2005 e 2006, do que os de 40 horas, que
tiveram 13% e 22%.
TABELA 5
Percentual dos trabalhadores com passagem pela perícia médica em relação ao
total por cargo, tempo de serviço e carga horária – 2005-2006
Descrição
Trabalhadores com passagem pela
perícia (1)
Total de trabalhadores da SES (2)
2006
2005
2006
36
37
31
41
259
271
14
18
415
372
18
25
12
53
39
25
31
35
53
348
218
10
24
35
40
197
129
18
31
29
31
113
67
26
46
30 horas
79
100
332
407
24
25
40 horas
56
68
431
312
13
22
2005
2006
Apoio do SUS
11
15
Assistente do SUS
36
49
PNS do SUS
75
92
Técnico do SUS
13
Até 3 anos
3 a 5 anos
Acima de 20 anos
2005
Percentual de (1) em (2)
Cargo
Tempo de serviço
Carga horária
Fonte: Dados da Coordenadoria de Perícia Médica da SAD.
Em relação ao local de trabalho, nos dois anos consecutivos, a participação
relativa por ano da Superintendência de Desenvolvimento de Recursos Humanos (SUDRH) foi maior, com 36% e 42% dos trabalhadores, respectivamente.
Características de Absenteísmo entre Trabalhadores da Saúde...
183
Em segundo lugar, em 2005, ficou a Superintendência de Atenção Integral a
Saúde (Sai), com 19,1% e em terceiro a Superintendência de Saúde Coletiva
(SUSAC) com 17,8%, inversamente a 2006, em que a SUSAC apareceu em
segundo lugar com 20,4% e a SAI com 12,3%.
Percebeu-se certa sazonalidade nos meses dos dois anos estudados (gráfico 2).
Observa-se que os meses de novembro de 2005 a janeiro de 2006 concentram o
menor número de passagens pela perícia e, por contraponto, no período de março
a junho de cada ano, o maior número de passagens.
A sazonalidade pode ser elucidada no gráfico abaixo, em que se calculou os
pontos médios das participações (2005-2006) com o auxílio da linha de tendência inserida: sazonalidade nos meses dos dois anos estudados.
GRÁFICO 2
Pontos médios das participações de trabalhadores com passagens na perícia médica
em relação aos meses de 2005 e 2006
(Em %)
14
12
10
8
6
4
2
iro
Ja
ne
o
br
ez
em
D
br
o
o
ov
em
N
ub
r
O
ut
br
o
m
te
Se
go
st
o
o
A
lh
Ju
nh
o
Ju
o
M
ai
il
br
A
o
ar
ç
M
Fe
ve
re
i
ro
0
Fonte: Coordenadoria de Perícia Médica da SAD.
3.1 Despesas com pessoal
Averiguou-se que o referencial financeiro teve aumento nos cargos de apoio, assistente
e PNS e queda no cargo técnico, se comparados a 2005 e 2006 (tabela 6).
Os dados mostram que do gasto com os trabalhadores da SES, 2,9% foi
destinado àqueles trabalhadores com passagem pela perícia em 2005, passando
para 4% em 2006, o que representa aumento de 39,1% de um ano para outro.
Essa alta se deve principalmente ao aumento do gasto com PNS (de 3,1%
para 4,4%) e de assistente (2% para 2,9%), justamente os cargos com maior representatividade no orçamento.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
184
Para a confecção do referencial financeiro considerou-se o salário da classe
A, nível 1, para todos os trabalhadores, atentando somente para a carga horária
devida, isto porque estes dados (classe e nível) não constam no instrumento
analisado da perícia médica.
Destarte, o aumento no gasto justificou-se devido ao aumento do número
de dias de licença (tabela 6).
TABELA 6
Referencial financeiro dos gastos anuais – trabalhadores da SES Central e os que
passaram na perícia médica – 2005-2006
Referencial financeiro
Gasto anual com o total de
trabalhadores da SES (1)
(R$)
Cargo
2005
2005
2006
2005
2006
Taxa de aumento
240.654,05
9.085,39
10.005,62
3,7
4,2
13,7
2.913.513,59
2.968.066,40
57.501,46
86.106,17
2
2,9
47
12.800.585,72
11.037.975,00
390.787,50
484.160,05
3,1
4,4
43,7
Assistente
Técnico
Total
2006
Percentual de (2) em (1)
248.353,56
Apoio
PNS
Gasto anual dos trabalhadores
com passagem pela perícia (2)
(R$)
700.033,62
482.914,38
27.596,82
15.885,89
3,9
3,3
-16,6
16.662.486,49
14.729.609,83
484.971,18
596.157,73
2,9
4
39,1
Fonte: Dados da Coordenadoria de Perícia Médica da SAD.
Esse aumento foi mais expressivo nos cargos de assistente (51,8%) e profissionais de nível superior (16,3%), que são também os cargos em que se percebe
maior número de dias de ausência (tabela 7).
TABELA 7
Distribuição da quantidade de dias de licença médica por cargo – 2005-2006
(Em %)
Cargo
Apoio do SUS
Ano
2005
2006
Taxa de aumento
602
666
10,6
Assistente do SUS
2.141
3.251
51,8
PNS do SUS
5.515
6.414
16,3
Técnico do SUS
Total geral
795
501
-37
9.053
10.832
19,7
Fonte: Coordenadoria de Perícia Médica da SAD.
Características de Absenteísmo entre Trabalhadores da Saúde...
185
4 DISCUSSÃO
Em relação às patologias que mais acometeram os trabalhadores do SUS do Nível Central, percebe-se que os dados deste estudo corroboram com o resultado de
outros, tais como o da Associação Brasileira para Prevenção de Acidentes, em que
a segunda causa de afastamento no trabalho, no Brasil, é a doença ocupacional:
“afecções músculo-esquelético relacionadas ao trabalho” (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA PARA PREVENÇÃO DE ACIDENTES, 2000); os da Organização Internacional do Trabalho (OIT), em que os transtornos mentais (depressão, ansiedade
e síndrome do pânico), distúrbios osteomusculares (lesão por esforço repetitivo –
LER), cardiopatias, dores crônicas e problemas circulatórios são as patologias que
mais acometem os trabalhadores (BARROS; SILVA; FERREIRA, 2007) e com o
de Primo (2007), em que, em relação aos dias de afastamento, as doenças que mais
afastaram os trabalhadores foram os transtornos mentais, totalizando quase 8 mil
dias no ano (22%) e com mais de 6 mil dias (16,7%) as doenças osteomusculares.
Ainda em relação às morbidades, no estudo de Godoy (2001), as doenças osteomusculares apareceram como maior responsável pelos afastamentos do trabalho
na população do setor bancário, seguidas pelas doenças do aparelho respiratório.
No de Silva (2004), os distúrbios osteomusculares representaram cerca
de 56% (168.697 dias) do número total de dias de afastamentos do trabalho,
no período 1998-2003, seguido pelos distúrbios mentais e comportamentais
com cerca de 19% (58.395 dias).
É interessante constatar que a letra Z do CID, que significa os fatores que
influenciam o estado de saúde e o contato com os serviços de saúde, que despontaram nos dois anos consecutivos como uma das patologias que mais acometeu os
trabalhadores na SES Central, apareceu em um dos últimos colocados no estudo
de Godoy com os funcionários de um hospital universitário em 2001.
Outro ponto de concordância com a literatura diz respeito ao crescimento de 25% no absenteísmo, em razão dos dias de ausência pela população de
risco de 2005 para 2006 na SES/MT, com o do estado de São Paulo, que no
período 2003-2006 teve um aumento de 25%, sendo que a licença saúde apareceu em primeiro lugar com 65,68% do total (SÃO PAULO, 2008).
Analisando os dias de afastamento entre os trabalhadores, constata-se que
no estudo de Silva (2004), houve um crescimento no número de absenteísmo,
porém, a grande maioria dos trabalhadores obteve apenas uma ausência no ano,
assim como o resultado desta pesquisa.
Relacionando o perfil sociodemográfico com absenteísmo, existe um consenso entre a maioria dos autores, tais como Gomes (1986), Reis et al. (2003)
e Silva (2004), de que os trabalhadores do sexo feminino se ausentam mais por
186
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
doença do que os do sexo masculino. O resultado desta pesquisa corroborou com
as causas antes citadas e inúmeras podem ser atribuídas, a este fator inclusive:
as duplas ou triplas jornadas de trabalho, associadas ao trabalho em casa e às cobranças/pressões a que as mulheres são submetidas entre outras.
A dupla atividade, nas organizações e no lar, implica sobrecarga física, preocupações e pouco repouso, desencadeando doenças nervosas e mentais em mulheres, segundo Nogueira e Azevedo (1982).
Primo (2007) evidencia esses fatores quando relata que a maior ausência das mulheres se deve a fatores físicos e culturais; e que “as mulheres são submetidas às mesmas
sobrecargas dos homens, desconsiderando-se as diferenças físicas e hormonais (...)”.
Miller e Norton (1986) enfatizam em estudo realizado para identificar as
variáveis que contribuem para o absenteísmo, que 80% das ausências ao trabalho
relatadas pelas mulheres são decorrentes da necessidade de cuidar dos filhos, da
precariedade da infraestrutura doméstica e por não ter com quem deixá-los, principalmente quando eles adoecem.
Porém, Nogueira e Laurenti (1975) divergem do que é referido nos países
altamente industrializados e pontuam que no grupo de trabalhadores têxteis, por
eles estudado, o absenteísmo por doença nos sexos masculino e feminino praticamente se equivalem, contrariando autores que preconizam a necessidade de
manutenção de uma força de reserva maior.
Relacionando a variável estado civil com absenteísmo, esta pesquisa no Nível
Central da SES coadunou com outros estudos como o de Silva (2004), Ribeiro
(2004) e Primo (2007), em que os casados sobressaíram, divergindo de Cartaxo
(1982), que verificou maior número de faltas de mulheres solteiras, geralmente
livres de preocupações com a família e com o lar.
Em relação à faixa etária, o resultado deste estudo evidencia que os acima
de 46 anos se sobressaíram, corroborando com a pesquisa de Silva (2004), cuja
média de idade situou-se em 40,16 anos e a moda foi de 47 anos, e com a análise
de Primo (2007), em que o absenteísmo está diretamente relacionado à idade
(pessoas mais velhas tendem a se afastar mais do trabalho).
Porém, essa variável consiste em um ponto de divergência entre os autores,
pois, como destacam Quick e Lapertosa (1982), alguns estudos trazem o predomínio de afastamento entre os trabalhadores mais jovens enquanto outros o
relacionam com o envelhecimento.
Entretanto, Ribeiro (2004) salienta que fatores de risco, tais como: tabagismo, hipertensão arterial, obesidade e categoria profissional em que o trabalhador
encontra-se inserido, devem ser avaliados, pois podem também estar relacionados
com o absenteísmo.
Características de Absenteísmo entre Trabalhadores da Saúde...
187
Quanto ao tempo de serviço na secretaria, em que se constatou que os acima de 20 anos, estatisticamente, tiveram mais passagens pela perícia, Reis et al.
(2003) salienta que a estabilidade no emprego acaba sendo um fator agravante do
absenteísmo, pois esta deixa os empregados mais propensos a faltarem ao trabalho
por qualquer motivo, diferentemente de trabalhadores contratados, que podem
ter seus vínculos reincididos a qualquer momento.
Esse resultado coaduna com a pesquisa de Alves e Godoy (2001), que constatou, em uma análise em hospitais públicos e privados, que os índices mais elevados de absenteísmo foram encontrados em instituições públicas de saúde, devido
à estabilidade do funcionário público concursado que se julga estar mais protegido pelas leis trabalhistas.
Porém, diverge do estudo de Martins et al. (2005) que comparou o índice de
absenteísmo por motivos odontológico e médico nos serviços públicos e privados.
Constatou-se que houve maior número de atestados (faltas) no serviço privado,
proporcionalmente ao número de empregados.
Em relação aos cargos ocupados no SUS, no Nível Central da SES/MT,
os de apoio e técnico do SUS foram os que mais passaram pela perícia. Nos
resultados de outros estudos, concluiu-se que os autores em regra analisam categorias isoladas da área de saúde ou os profissionais de saúde, o que torna inviável
a comparação deste resultado. Entretanto, Primo (2007) é categórico ao afirmar
que “os profissionais da área da saúde sofrem atualmente da precarização do trabalho, que é o estresse, a sobrecarga de trabalho e os baixos salários”.
Cabe mencionar que uma pesquisa feita pelo Dr. Michael Smith, chefe de
Pesquisa de Motivação e Estresse do Instituto Nacional de Segurança e Saúde
Ocupacional (NIOSH), em 1977, coloca que, entre as dez profissões mais estressantes, em primeiro lugar aparecem os técnicos da área de saúde, em terceiro
os enfermeiros, em sétimo os técnicos de laboratórios clínicos e em décimo os
auxiliares de enfermagem, ou seja, quatro são da área de saúde (ALBRECHT,
1990). Isto não significa que estes trabalhos provoquem o estresse, mas não há
como negar a forte ligação entre ambos.
Outra variável, citada por Danatro (1997), que intensifica esse problema é
o fato do profissional possuir múltiplos empregos, realidade esta, condizente com
os profissionais de saúde desta pesquisa.
Em relação à carga horária de trabalho, note-se a incidência maior de trabalhadores ausentes nos locais onde se trabalha 30 horas. Esta questão desencadeia
questionamentos da existência de relação do absenteísmo com a má qualidade de
vida, desencadeada inclusive, conforme citado anteriormente, por possuírem dois
ou mais empregos e consequentemente, uma alimentação inadequada no almoço.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
188
Há ênfase de que longas jornadas de trabalho, condições de insalubridade
do ambiente de trabalho, duplo emprego, entre outros, são razões que acarretam
o absenteísmo em larga escala (SCHMIDT, 1986).
No que se refere à sazonalidade, o resultado deste estudo evidenciou que os
pontos médios de participações de afastamento foi nos meses de março a junho de
cada ano, divergindo do encontrado por Oliveira, Ahrens e Ahrens (2004), em que
o período de julho (férias escolares) foi registrado como o maior e o de abril o menor.
Algumas dificuldades foram encontradas em relação às causas das licenças,
pois 32 pastas referentes ao período 2005-2006 não incluíam o diagnóstico ou
o código da CID 10 (OMS, 1995), bem como, devido à mudança de local de
atendimento da perícia médica, 38 pastas não foram encontradas em tempo hábil
para tabular os dados. Porém, estes pequenos obstáculos não invalidam a relevância dos achados deste estudo que muito contribuirá para ações estratégicas dos
gestores para com a saúde do trabalhador, propiciando assim a possibilidade de
decréscimo de absenteísmo na organização.
5 CONCLUSÕES
Ao longo deste estudo, pôde-se concluir que o absenteísmo é entendido como a
falta do trabalhador às atividades laborais por inúmeros fatores, mas também foi
analisada a incapacidade para o trabalho desencadeado por morbidades.
Sabe-se que o trabalho pode engendrar o absenteísmo, por isso seria profícuo uma análise mais aprofundada sobre a multiplicidade de fatores objetivos
e subjetivos que atuam na relação trabalho – trabalhador, inclusive porque este
tema ainda é pouco explorado no Brasil.
Ademais, existe todo o aspecto nefasto desse processo, começando pelo próprio
trabalhador, que necessita de cuidados, passando pelos colegas de trabalho, pois estes
ficam desmotivados e sobrecarregados, até a população que se torna carente do atendimento e, consequentemente, a organização que tem gastos com o pessoal.
É interessante salientar que os trabalhadores antes de passarem na perícia
médica do estado de Mato Grosso, comparecem à Gerência de Desenvolvimento
e Qualidade de Vida para buscarem a guia de encaminhamento pericial, em que
são submetidos à entrevista pelos técnicos que em muitos casos constatam causas
latentes, como fatores desencadeadores do absenteísmo e dos atrasos, tais como
problemas com chefias imediatas, insatisfação no clima organizacional, desmotivação, dificuldade de relacionamento entre outros.
Malgrado essas questões latentes estarem ocorrendo, o trabalhador não consegue e não se permite visualizá-las, mascarando problemas que são o cerne da
questão. Neste momento, o trabalhador começa a somatizar, permitindo assim
Características de Absenteísmo entre Trabalhadores da Saúde...
189
o desencadeamento de doenças como depressão, síndrome de Burnout (estresse
ocupacional crônico), úlcera, gastrite, entre outros, que o impedem de trabalhar
e de lidar com questões subjetivas.
Percebe-se que os profissionais da área de saúde encontram resistência em
visualizar que algo não está bem, pois estes não aceitam que tem suas próprias
limitações e que o cuidador também necessita de cuidados para continuar realizando de maneira produtiva o seu trabalho. Em relação a isto, seria interessante
um trabalho de pesquisa que pudesse analisar a correlação das causas latentes
com o absenteísmo.
Destarte, vale ressaltar que, em alguns casos, antes de ocorrer o afastamento
do seu local de trabalho, acontece o que é designado de presenteísmo, ou seja,
quando a pessoa continua a comparecer no local de trabalho, mas está impossibilitada de produzir ou não produz como deveria. Esta questão também é um
problema sério e de difícil identificação para os gerentes/líderes.
Conclui-se que esta pesquisa quantitativa com a identificação das causas do
absenteísmo possibilitará delinear estratégias de intervenção objetivando manter
a qualidade e a produtividade nos serviços oferecidos pelos trabalhadores do SUS
do Nível Central.
Entretanto, é preciso aclarar que o problema de saúde não pode ser resumido somente ao monitoramento de doenças, mas sim ao planejamento, programação e execução de ações que visem enfrentar os problemas. Este processo
de construção e de consolidação de ações é lento e cabe também aos gestores o
papel de fomentar um ambiente de trabalho em condições de contribuir para a
melhoria da qualidade de vida de seus trabalhadores, conseguindo identificar e
intervir previamente.
Recomenda-se que a área de saúde do trabalhador realize ações de promoção, prevenção e recuperação da saúde do trabalhador, por meio do desenvolvimento de ações individuais e principalmente das coletivas que visem atuar no
processo saúde – trabalho – doença para controlar e atenuar os fatores de risco.
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190
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Características de Absenteísmo entre Trabalhadores da Saúde...
193
ANEXOS
ANEXO 1
Formulário de caracterização do absenteísmo
•
•
•
•
•
Superintendência:__________________ Formulário no:____________
Sexo: ( ) F ( ) M
Estado civil:_________________________
Cargo: ( ) apoio SUS ( ) assistente SUS ( ) técnico SUS ( ) PNS SUS
Faixa etária: ( ) até 25 anos ( ) 26 a 35 anos ( ) 36 a 45 anos
( ) acima de 46 anos
Tempo de SES: ( ) até 3 anos ( ) 3 a 5 anos ( ) 5 a 8 anos
( ) 8 a 12 anos ( ) 12 a 15 anos ( ) 15 a 20 anos ( ) acima de 20 anos
Mês
Observações
Quantidade de dias
Justificativa
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194
ANEXO 2
Aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa
ESTREITAMENTO DOS DIFERENCIAIS DE SALÁRIOS E AUMENTO DO
GRAU DE DISCRIMINAÇÃO: LIMITAÇÕES DA MENSURAÇÃO PADRÃO?*
Maria Cristina Cacciamali**
Fábio Tatei***
Jackson William Rosalino****
O objetivo deste artigo é estimar a incidência e a evolução recente da discriminação racial e
por gênero nos mercados de trabalho formal e informal no Brasil entre 2002 e 2006. Assim,
mensuramos os diferenciais de rendimentos por meio da decomposição de Oaxaca-Blinder,
com base nos microdados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e confirmamos a prática discriminatória. Os resultados
indicam a redução do hiato salarial dos grupos discriminados entre 2002 e 2006, exceto para
mulheres brancas; contudo, o componente da discriminação aumenta em igual período para
elas. A despeito das limitações do método de Oaxaca-Blinder, destacamos a maior resistência
ao fechamento do hiato salarial entre homens brancos e mulheres brancas e a estabilidade da
diferença entre o salário observado e o a ser pago na ausência de discriminação, exceto entre
homens brancos e mulheres negras. O componente de discriminação entre os homens brancos
e os demais grupos é maior no mercado de trabalho formal do que no informal, indicando as
dificuldades de se quebrar preconceitos e privilégios nos postos de trabalho de melhor qualidade.
Palavras-chave: Discriminação Racial e por Gênero; Discriminação entre Empregados Formais e
Informais; Decomposição de Oaxaca-Blinder; Hiato Salarial por Gênero e Raça nos Mercados de
Trabalho Formal e Informal.
WAGES GAP DECREASED AND HIGHER DISCRIMINATION DEGREE: RESTRAINT
OF THE STANDARD MEASURES?
The objective of this paper is to measure the incidence and evolution of racial and gender
discrimination among formal and informal employees in Brazil between 2002 and 2006. We
applied the decomposition of Oaxaca-Blinder on income differences among groups using microdata
from PNAD. The results indicate a reduction in the earnings gap of discriminated groups between
2002 and 2006; however, the discrimination component increases in the same period. Despite the
restrictions of the Oaxaca-Blinder method, we detach more resistance to narrowing the wage gap
between white, men and women; the stability of the difference between the observed and the
wage which would be earned in the absence of discrimination, except between white men and
* Versão anterior do presente estudo consta do livro de Maria Cristina Cacciamali e Mária de Fátima José-Silva (2008).
** Professora titular do Departamento de Economia, coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Integração da
América Latina e coordenadora científica do Núcleo de Estudos em Políticas Internacionais. Universidade de São Paulo
(USP). E-mail: [email protected]
*** Mestrando Programa de Pós-Graduação em Integração da América Latina e Pesquisador do Núcleo de Estudos em
Políticas Internacionais na USP. E-mail: [email protected]
**** Graduando em Economia na USP. E-mail: [email protected]
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196
black women. The discrimination degree between white men and other groups is higher within
the formal market rather than the informal market. This indicates why is so difficult for women and
black people overcome prejudice and privilege and insert themselves into top jobs
Key words: Racial and Gender Discrimination; Discrimination between Formal and Informal
Employees; Decomposition of Oaxaca-Blinder; Wage Gap by Gender and Race in the Formal and
Informal Labor Markets.
DISMINUCIÓN DE LOS DIFERENCIALES SALARIALES E AUMENTO DEL GRADO
DE DISCRIMINACIÓN: LIMITACIONES DEL MÉTODO?
El objetivo de este artículo es mensurar la incidencia y la evolución reciente de la discriminación
por raza y por género en el mercado de trabajo formal e informal de Brasil entre 2002 y 2006.
La descomposición de los diferenciales de salario a través de Oaxaca-Blinder, en base a los
micros datos de PNAD, confirmo prácticas discriminatorias. Los resultados indicaran la reducción
del hiato salarial de los grupos discriminados entre 2002 y 2006, excepto para las mujeres blancas,
a despecho del aumento del componente de discriminación. Además la diferencia entre el salario
observado y aquel que seria pago caso no hubiera discriminación se mantuvo relativamente
estable, presentando reducción solo para las mujeres negras.
Palabras-clave: Discriminación por Raza y Género; Mercado de Trabajo Formal e Informal;
Diferenciales de Salario; Descomposición de Oaxaca-Blinder.
REDUCTION DES DIFFERENTIELS DE SALAIRE ET AUGMENTE DE LA
DISCRIMINATION: LIMITES DE LA METHODE?
L’objectif de cet article est mesurer l’incidence et l’évolution récente de la discrimination
ethnique et par sexe dans le marché du travaille formel et informel au Brésil entre 2002 et
2006. La décomposition des différentiels de salaire, au moyen d’Oaxaca-Blinder, sur base de
micro information de PNAD, confirmais la pratique discriminatoire. Les résultats indiquent la
réduction du gap salariale des groupes discriminés entre 2002 et 2006, excepte pour des
femmes blanches, néanmoins, la composante de la discrimination augmente dans la même
période. De plus, la différence entre le salaire observé et celui à être payé en l’absence de
discrimination s’est maintenu relativement stable, en se réduisant brusquement seulement
pour les femmes noires.
Mots-clés: Discrimination Ethnique et Par Sexe; Marché de je Travaille Formel et Informel;
Differentiels de Salaire; Décomposition d’Oaxaca-Blinder.
1 INTRODUÇÃO
Os estudos sobre práticas de discriminação que ocorrem no mercado de trabalho
brasileiro tomam um caráter sistemático, a partir do fim dos anos 1990, estimulados por, pelo menos, dois motivos. O primeiro reporta-se à maior preocupação
das agências multilaterais na defesa dos direitos humanos no trabalho. Distintos
órgãos e programas da Organização das Nações Unidas (ONU) reforçam esta
vertente, por meio, por exemplo, da Declaração dos Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho de 1998, da OIT, da Declaração do Milênio das Nações
Estreitamento dos Diferenciais de Salários e Aumento do Grau de Discriminação...
197
Unidas, aceita por 186 países em 2000,1 e/ou da Declaração da Conferência Mundial contra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância das Nações
Unidas em Durbin, em 2001. O segundo motivo prende-se à maior organização
e visibilidade dos movimentos sociais de mulheres e, especialmente, negros, que
expõem as desigualdades entre os brancos e outras etnias/raças da população e
demandam ações afirmativas para superá-las como cotas no ensino superior e
mercado de trabalho. Tais tendências implantaram o tema das relações entre
exclusão social e discriminação de gênero e raça ao debate público e suscitaram
o fomento de políticas sociais voltadas ao acesso e à criação de oportunidades de
inclusão social para estes grupos. A necessidade de subsidiar as ações, por sua vez,
provocou a ampliação dos estudos e a geração de informações sobre a questão.
Desde os primeiros recenseamentos nacionais, de 1872 e 1890, o IBGE
investiga a cor da população; o Censo de 1872 enumera, inclusive, o contingente
de população escrava. Nos censos demográficos do século XX, apenas aquele de
1970 não dispõe desta variável. A PNAD, por sua vez, desde 1987, inclui nos
levantamentos anuais a coleta de dados sobre a cor/raça/etnia da população. Tal
variável é investigada, portanto, regularmente nas estatísticas nacionais, sendo
apreendida em cinco grupos (branca, preta, parda, amarela e indígena), segundo
o critério de autodeclaração de cor.
Esse estatuto de coleta de informações permite acompanhar as características
socioeconômicas dos diferentes grupos da população brasileira, segundo sua autodeclaração de cor, e, neste âmbito, podemos estimar a evolução das desigualdades sociais. Ressaltamos, entretanto, que, embora a classificação, segundo o senso comum,
possa aproximar a divisão da população brasileira por raças ou etnias, contestamos
esta visão. Em primeiro lugar porque, embora o fenótipo de uma pessoa possa remeter à determinada categoria de cor e/ou herança genética, do ponto de vista genético,
tal fato tem uma alta probabilidade de não se verificar. Em segundo lugar, no Brasil,
diferentemente de outros países, por exemplo, os Estados Unidos, em nenhum momento ou lugar confirmou-se a institucionalização de classificação e/ou a segregação por raça e/ou a proibição de casamentos inter-raciais. No Brasil, a mestiçagem
constitui-se em uma expressiva característica demográfica e estabeleceu-se como uma
ampla prática social. Assim, acreditamos que mestiços de diferentes origens, não
apenas de ascendência africana, mas também indígena, devam predominar na população brasileira. A autodeclaração, nesta situação, pode resultar na estimação da
desigualdade inter-racial/étnica/cor, basta que mestiços de elevado status social e/ou
alta renda tendam a autodeclarar-se como brancos em vez de pardos.
1. Um sumário dos avanços alcançados na promoção da igualdade de condições entre sexo e raça no Brasil é apresentado em uma coletânea de estudos organizada pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), em
2004, com a participação de cinco instituições de ensino superior, representantes das macrorregiões do país: Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas), Universidade de Brasília (UnB), Universidade Federal do Pará
(UFPA), Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
198
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
O objetivo do presente artigo, guardadas as considerações apresentadas, é
o de observar quatro grupos da população, a saber: homens brancos, homens
negros, mulheres brancas e mulheres negras – mantendo como padrão de referência o homem branco, com relação a três aspectos: a desigualdade salarial,
o grau de discriminação no mercado de trabalho e a evolução dos indicadores.
As estimativas são realizadas por meio dos microdados da PNAD para os mercados de trabalho formal e informal, ou seja, para os empregados com carteira
de trabalho assinada e sem carteira de trabalho assinada, componentes típicos
do mercado de trabalho. Tal recorte foi utilizado para isolar os efeitos derivados das práticas de discriminação dos responsáveis por domicílios que contratam os serviços de empregados domésticos e/ou decorrentes da discriminação
em domicílios e/ou empresas quando demandam a prestação de serviços de
trabalhadores por conta própria.
Ressaltamos, ainda, que o artigo centra-se na evolução recente da discriminação no mercado de trabalho brasileiro; assim, nos limitamos ao período
2002-2006.2 Destarte, por tratar-se de um período curto, não há a pretensão
de verificar possíveis mudanças estruturais do fenômeno de discriminação; contudo, desde meados da década de 1990 e, principalmente, a partir do início do
século XXI, há uma forte expansão de programas sociais por parte das diversas
esferas do governo. As políticas públicas tiveram papel importante tanto na
recente queda da desigualdade de rendimentos no Brasil nos últimos anos,3
como instrumental para a maior conscientização e inclusão social de grupos
tradicionalmente discriminados.
Desse modo, o tema exposto é desenvolvido em seis seções, incluindo esta
introdução. Na segunda seção, realizaremos uma revisão teórica sobre o tema,
na qual selecionamos um conjunto de autores que discorrem sobre a discriminação salarial por sexo e raça/cor/etnia. Na terceira seção, apresentaremos
indicadores selecionados para os grupos e mercados de trabalho considerados
e descreveremos as variáveis componentes do modelo. A quarta seção contém
a metodologia de Oaxaca-Blinder empregada neste estudo e, na quinta seção,
apresentaremos os resultados obtidos. Finalmente, passaremos às conclusões.
2. A escolha por esse período deve-se às mudanças da PNAD, em 2001, com relação à classificação dos ramos de
atividade e posições de ocupação, de modo que não é recomendável a comparação direta destas informações com os
períodos anteriores.
3. Ver, entre outros, Barros, Foguel e Ulyssea (2006).
Estreitamento dos Diferenciais de Salários e Aumento do Grau de Discriminação...
199
2 A TENDÊNCIA DE ESTREITAMENTO DOS DIFERENCIAIS SALARIAIS POR
SEXO E RAÇA
A literatura especializada indica o estreitamento dos diferenciais salariais entre
sexos e entre cor/etnia/raça em diferentes regiões do mundo, inclusive no Brasil.
Blau e Kahn (2003), por exemplo, estudaram as causas da diminuição do hiato
salarial entre homens e mulheres no período 1985-1994 para 22 países e concluíram pela primazia de duas razões: o estreitamento da estrutura salarial da força de
trabalho masculina e menor oferta líquida de mulheres no mercado de trabalho.
Os dois fatores, mas principalmente o primeiro, encontram-se circunscritos às
instituições do mercado de trabalho de cada país, especialmente com relação aos
mecanismos de negociação coletiva.
No caso dos Estados Unidos, O’Neil (1985) analisou a tendência da discriminação por sexo, entre a década de 1950 e meados da de 1980, e assinalou
a presença de dois períodos distintos. No primeiro, que perdurou até meados da
década de 1970, o hiato salarial entre mulheres e homens apresentou tendência
de crescimento e, em tal espaço de tempo, entre homens e mulheres, tanto a redução do diferencial de escolaridade como a ampliação do diferencial de experiência
no trabalho – medido como tempo no emprego – são fatores que explicavam o
aumento do hiato salarial.
A partir de meados da década de 1970, verificou-se, segundo a autora, o estreitamento do hiato salarial que correspondeu a um provável reflexo do aumento
da experiência das mulheres mais jovens e do maior crescimento do tempo médio
no emprego das mulheres, em relação ao tempo médio dos homens. Ademais,
O’Neil apresentou dois fatores adicionais que podem explicar a evolução do hiato
salarial; particularmente, a partir de 1969. O primeiro é a elevação do desemprego
que, pela maior incidência sobre as mulheres, alargou o hiato a favor dos homens.
O outro é a depressão dos salários dos trabalhadores menos experientes, um resultado do influxo na força de trabalho de mulheres mais velhas e menos experientes
e de uma coorte expressiva de trabalhadores originários do período do baby boom.
Este acréscimo de oferta de força de trabalho aumentou o ganho dos mais velhos,
homens mais experientes em relação aos mais novos e, provavelmente, também
aumentou os ganhos dos homens relativamente àqueles das mulheres.
Complementarmente, Giuberti e Menezes-Filho (2005) realizaram estudo
comparativo entre os mercados de trabalho do Brasil e dos Estados Unidos, de
1981 a 1996, e observaram que a idade dos indivíduos revela-se a principal causa
das diferenças salariais entre homens e mulheres. Ou seja, segundo os autores, a
menor experiência no mercado de trabalho é a principal causa do menor salário
da mulher e relaciona-se com as decisões sobre sua fecundidade. Todavia, o estudo mostrou que a brecha salarial entre os sexos diminuiu no período analisado.
200
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
Quanto ao hiato salarial entre brancos e negros nos Estados Unidos,
Neal e Johnson (1996) especificaram um modelo de equação salarial que,
entre outras causas, atribui a diferença salarial à diferença de qualificação
entre os dois grupos da população. Carneiro, Heckman e Masterov (2005)
investigaram, para o período 1990- 2000, nos Estados Unidos, as relações
entre qualificação e discriminação para explicar o hiato salarial entre brancos
e outros grupos étnicos. Os autores concluem que, exceto para a população
negra, o hiato salarial deve-se a fatores pré-mercado. Assim, a superação do
hiato salarial terá maior probabilidade de sucesso com a implementação de
programas educacionais e profissionais em vez de meras ações afirmativas,
exceto para os homens negros.
Quanto à literatura nacional, Soares (2000) e Biderman e Guimarães (2005)
utilizam-se de instrumental estatístico similar e estimam resultados similares e complementares. Soares aplicou uma extensão da decomposição dos rendimentos proposta por Oaxaca (1973) para analisar o diferencial de salários no Brasil, entre 1987
e 1998, dos homens brancos perante os homens negros e as mulheres brancas e
negras.4 O autor desagregou a procedência de tal diferencial em três categorias: a de
qualificação; a de inserção no mercado de trabalho – por meio de variáveis dummies;
e, por fim, a de diferença salarial pura que não é explicada por fatores produtivos,
econômicos ou regionais; isto é, segundo o autor, a parcela em razão da discriminação. Posto isto, Soares verificou que, vis-à-vis os homens brancos, a desigualdade
de rendimentos das mulheres brancas deve-se apenas à discriminação, enquanto
para os homens negros prevalece sua pior qualificação – por causa de fatores prémercado. Por sua vez, as mulheres negras enfrentam tanto a discriminação como a
menor dotação de fatores produtivos. Por fim, Soares constatou que a evolução do
diferencial de salários por cor/raça/etnia estabiliza-se entre os homens, enquanto
para as mulheres ocorre uma redução gradual.
A evolução decrescente da discriminação também é observada por Biderman
e Guimarães, que decompuseram os determinantes que afetam a desigualdade salarial de mulheres e negros, utilizando as PNADs de 1989 e 1999, em setores de
atividade selecionados.5 Assim como Soares, os autores concluíram que o principal
determinante do hiato salarial referente às mulheres é a discriminação no mercado
de trabalho; para os homens negros, o agente primordial constitui-se na defasagem
de escolaridade, ou seja, um fator pré-mercado de trabalho, ao passo que, para as
mulheres negras, o hiato decorre de ambos os fatores.
4. Com relação à literatura nacional, um conjunto de autores dedica-se a analisar a recente queda da desigualdade
de rendimentos, como Corseuil (2002), Barros, Foguel e Ulyssea (2006), Ferreira (2006), Hoffmann (2006), Soares
(2006), Barros, Franco e Mendonça (2007), Cacciamali e Camillo (2008), entre outros. Contudo, centrar-nos-emos em
trabalhos que focam a questão da discriminação no mercado de trabalho.
5. Os setores contemplados pelo estudo são alimentos, bens de capital, couro e calçados, telemática e vestuário.
Estreitamento dos Diferenciais de Salários e Aumento do Grau de Discriminação...
201
Bohnenberger (2005) ampliou o quadro de análise, em termos de espaço e tempo, e manteve as conclusões dos estudos anteriores. O autor avaliou a presença e a evolução da discriminação por sexo e cor/etnia/raça no
mercado de trabalho brasileiro, em cada uma das cinco regiões do país, entre
1992 e 2001, e concluiu que a discriminação contra as mulheres é mais
resistente do que a discriminação contra os negros. As mulheres negras, da
mesma maneira que nos demais estudos, estão na pior situação, pois sofrem
discriminação tanto de sexo quanto de cor. A região Nordeste apresentou a
maior incidência de discriminação por sexo e a região Sudeste exibiu a maior
discriminação por cor/etnia/raça. O estudo de Bohnenberger indicou que
a discriminação por sexo tende a diminuir ao longo do período estudado,
o que também está de acordo com os resultados obtidos por Crespo e Reis
(2004) e Matos e Machado (2006). Os primeiros estudaram, entre 1987 e
2000, os efeitos associados às características das coortes de nascimento, do
ciclo de vida sobre a parcela do diferencial salarial em razão do termo de
discriminação entre raças/cor/etnias; os segundos, por sua vez, examinaram
os diferenciais de rendimento, levando em conta a discriminação por sexo e
cor/etnia/raça e utilizando os microdados da PNAD de 1987 a 1999.
Especificamente, Oliveira e Rios-Neto (2006), em estudo sobre a força
de trabalho feminina para um período mais longo, estudaram a tendência da
desigualdade salarial da força deste grupo no Brasil, segundo cor/etnia/raça,
durante as décadas de 1980 e 1990. Os autores confirmaram a hipótese de que
o hiato salarial por cor/etnia/raça é determinado por diferenças individuais
e ocupacionais, mas não sancionaram as hipóteses de crescentes retornos da
renda aos anos de escolaridade e/ou a crescente demanda por mão de obra
qualificada, o que resultou na ampliação do hiato salarial entre trabalhadores
de alta e baixa qualificação.
Assim, o conjunto desses estudos constata, por um lado, a existência de
discriminação no mercado de trabalho e, por outro, o estreitamento do hiato
salarial entre grupos discriminados e um grupo padrão. Tanto os resultados
dos estudos supracitados como os apresentados no relatório de Desigualdade
de Raça e Gênero organizado pelo PNUD indicam que, em relação ao homem
branco, o diferencial de salários das mulheres brancas é fruto da discriminação
no mercado de trabalho; por sua vez, o diferencial dos homens negros ocorre,
sobretudo, por causa da discriminação pré-mercado – ou seja, menor escolaridade e/ou qualificação –, enquanto o das mulheres negras advém dos dois tipos
anteriores (pré-mercado e discriminação).6
6. Ver UFPE, PUC Minas e PNUD/IDHS (2004).
202
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
Apesar da vasta abundância de trabalhos que focalizam a análise das desigualdades do mercado de trabalho brasileiro, nota-se a escassez de estudos
sobre os efeitos da discriminação nos mercados de trabalho formal e informal;
em geral, estes estudos costumam analisar a questão por meio da inclusão de
uma variável dummy. Por exemplo, Barros, Franco e Mendonça (2007) avaliaram a influência da discriminação por sexo e cor/raça/etnia em três tipos de
segmentos (espacial, setorial e de formalização no mercado de trabalho) sobre
a redução do grau de desigualdade da remuneração do trabalho e da renda
per capita entre 1995 e 2005, mas não analisaram o grau de discriminação
e seus determinantes nos distintos mercados de trabalho. Kassouf (1998),
por meio de dados da Pesquisa Nacional sobre Saúde e Nutrição (PNSD)
do IBGE, de 1989, indicou maior incidência de discriminação por sexo no
mercado de trabalho informal do que no formal, mas sem tratar da questão de
cor/raça/etnia.7 Posto isto, o presente artigo pretende contribuir à literatura
especializada ao mensurar a incidência e evolução recente da discriminação
no mercado de trabalho brasileiro, concentrando-se nos seus efeitos sobre os
trabalhadores assalariados formais e informais.
3 INDICADORES DO MERCADO DE TRABALHO POR SEXO E RAÇA
Em 2006, a população total do Brasil era de pouco mais de 187 milhões
de pessoas, 89,6 milhões encontravam-se ocupadas, 8,2 milhões procuravam
emprego e 58,5 milhões eram economicamente inativas. Inicialmente, observa-se que, nos dois anos considerados, a taxa de atividade e a taxa de ocupação
são maiores para os homens, o que conduz a uma taxa de desocupação menor para as mulheres. Tal fato torna-se mais marcante quando se verifica que
as diferenças entre sexos são maiores do que as em razão de raça/cor/etnia.
Assim, a taxa de atividade dos homens brancos e negros é similar, de igual
modo à taxa de ocupação; a diferença mais relevante é encontrada na taxa de
desemprego. Entre as mulheres brancas e negras, constata-se comportamento
idêntico (tabela 1).
7. No artigo, Kassouf considera os trabalhadores formais os que contribuem para a previdência social e os informais
os que não contribuem, ou seja, adota uma conceituação do mercado de trabalho em sentido lato e não distingue os
efeitos de inserções distintas entre serviço doméstico, empregados e conta própria. Ademais, a autora observa que a
discriminação é responsável por dois terços do diferencial de salário das mulheres perante os homens com características semelhantes e o restante deve-se à ocupação das mulheres em postos de baixa qualificação.
Estreitamento dos Diferenciais de Salários e Aumento do Grau de Discriminação...
203
TABELA 1
Indicadores do mercado de trabalho – Brasil, 2006
Indicadores
(%)
População economicamente ativa
Empregados
Homens
Taxa de
ocupação2
Taxa de
desocupação3
25.428.848
1.538.028
73
68,8
5,7
Negros4
25.741.458
1.950.304
73,3
68,1
7
51.565.275
3.509.880
73,1
68,5
6,4
20.112.770
2.156.981
53,5
48,3
9,7
Brancas
Total
Taxa de
atividade1
Brancos
Total
Mulheres
Desocupados
Negras
17.548.125
2.503.580
51,9
45,4
12,5
Total
37.990.100
4.700.347
52,7
46,9
11
Brancos
45.541.618
3.695.009
62,6
57,9
7,5
Negros
43.289.583
4.453.884
62,5
56,7
9,3
Total
89.555.375
8.210.227
62,6
57,3
8,4
Fonte: Microdados PNAD 2006/IBGE.
Elaboração dos autores.
Obs.: População em idade ativa (PIA), isto é, pessoas de 10 anos ou mais de idade.
Notas: 1Taxa de atividade: é a percentagem da população economicamente ativa (PEA) em relação à PIA.
2
Taxa de ocupação: é a percentagem das pessoas empregadas em relação à PIA.
3
Taxa de desocupação: é a percentagem das pessoas desocupadas em relação à PEA.
4
População negra: neste estudo, representa a soma das pessoas que se autodeclaram como pretas ou pardas.
Para efeitos deste estudo, a abordagem da questão da discriminação por sexo
e cor/etnia/raça será realizada entre os trabalhadores adultos empregados do setor
privado não agrícola, ou seja, com idade igual ou superior a 25 anos. A análise será
efetuada no mercado de trabalho conceituado em sentido estrito, consideraram-se,
assim, apenas os empregados com e sem carteira de trabalho assinada – proxies dos
mercados de trabalho formal e informal, respectivamente.8 No grupo dos empregados sem carteira de trabalho assinada, também foram incluídos os empregados sem
declaração de carteira de trabalho. Foram utilizados filtros para excluir os empregados dos ramos de atividade agrícola, administração pública e serviço doméstico.
Igualmente, foram retirados da amostra os registros sem declaração de idade, declaração de renda do trabalho, cor e anos de escolaridade. O conjunto destes filtros
resultou em um total de aproximadamente 23,9 milhões de empregados.
8. O objetivo deste estudo é analisar o mercado de trabalho; assim, retirou-se da amostra categorias de posição na
ocupação que, embora sejam objeto de discriminação social e nos locais onde trabalham, apresentam características
distintas nas suas relações de trabalho vis-à-vis os empregados, trabalhadores assalariados. Os trabalhadores por
conta própria foram excluídos porque a grande maioria, de forma autônoma, presta serviços por tempo determinado a
um cliente; este tipo de trabalhador, com relação ao trabalhador assalariado, dispõe de outras relações de trabalho, tais
como: subordinação, jornada e forma de pagamento, implicando, perante o assalariado, comportamento distinto de
contratação, remuneração e práticas de discriminação. O serviço doméstico, por sua vez, presta serviços aos domicílios,
constituindo-se em mercado de trabalho distinto quanto ao tipo de empregador, jornada, alocação e regularidade das
tarefas, remuneração monetária e em espécie, entre outros fatores, além de, muitas vezes, caracterizar-se por especificidades nas relações de subalternidade, outra dimensão das práticas de discriminação.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
204
De acordo com a tabela 2, entre os homens do mercado de trabalho formal, os homens brancos representavam 61,6% do total, e os homens negros
eram 38,4%, em 2002, enquanto em 2006, sob idêntico aspecto, o mercado
de trabalho indicava diminuição do percentual de homens brancos (56,3%) e
aumento da participação de homens negros em pouco mais do que cinco pontos percentuais (p.p). Nesta direção, as mulheres negras frente às brancas não
apresentaram idêntica ocupação de espaço no mercado de trabalho aos homens.
Em 2002, as mulheres brancas ocupavam, no total das mulheres com carteira
de trabalho assinada, percentual equivalente a 66,4% e, quatro anos depois,
sua participação declinara em 3,1 p.p. Em relação aos trabalhadores informais,
entre 2002 e 2006, em todos os grupos (homens brancos, homens negros, mulheres brancas e mulheres negras) houve aumento no percentual de empregados
no mercado de trabalho formal (tabela 2).
O comportamento do mercado de trabalho, entre 2002 e 2006, segundo
sexo e cor/raça/etnia indica dois fatos. O primeiro é que a absorção de negros –
homens e mulheres – aumentou tanto no mercado de trabalho formal quanto no
informal. O segundo fato é que o status do negro no mercado de trabalho elevouse, na medida em que, entre os empregados com carteira de trabalho assinada, os
negros – mulheres e, particularmente, homens – aumentaram sua participação
frente aos brancos; e considerando-se o total de empregados, diminuiu o peso dos
negros no mercado de trabalho informal – entre os empregados sem carteira de
trabalho assinada (tabela 2).
TABELA 2
Empregados por sexo e cor/etnia/raça segundo registro em carteira de trabalho – Brasil
2002
Com carteira
Branco
(%)
Homem
Negro
(%)
Total
(%)
Branca
(%)
Mulher
Negra
(%)
Total
(%)
Sem carteira
Total de assalariados
Número
Porcentagem
Número
Porcentagem
5.486.345
77,9
1.552.973
22,1
61,6
3.420.473
38,4
8.906.818
100
3.604.511
66,4
1.824.515
33,6
5.429.026
100
–
72,7
–
75,8
–
75,7
–
66,3
–
72,3
–
54,7
1.286.880
45,3
2.839.853
100
1.156.024
55,5
925.454
44,5
2.081.478
100
–
27,3
–
24,2
–
24,3
–
33,7
–
27,7
–
Número
7.039.318
59,9
4.707.353
40,1
11.746.671
100
4.760.535
63,4
2.749.969
36,6
7.510.504
100
Porcentagem
100
–
100
–
100
–
100
–
100
–
100
–
Estreitamento dos Diferenciais de Salários e Aumento do Grau de Discriminação...
205
2006
Com carteira
Número
Branco
Homem
80,2
56,3
Negro
11.134.441
Branca
4.440.608
(%)
76,4
63,3
Negra
2.576.840
(%)
68,7
36,7
Total
7.017.448
(%)
73,3
100
–
100
–
3.753.310
–
100
39,2
26,7
100
–
60,8
31,3
2.550.047
100
5.814.185
–
46,1
–
100
23,6
1.176.470
–
100
14.299.635
–
53,9
–
45,3
22,1
1.373.577
–
100
6.482.644
–
100
Porcentagem
7.816.991
54,7
24,9
3.165.194
–
Número
–
51,1
77,9
100
19,8
1.616.959
–
Total de assalariados
Porcentagem
48,9
75,1
43,7
Total
Número
1.548.235
–
4.865.685
(%)
(%)
Mulher
Porcentagem
6.268.756
(%)
Sem carteira
–
9.567.495
–
100
100
–
Fonte: Microdados PNAD 2006/IBGE.
Elaboração dos autores.
A tabela 3 mostra que, no período considerado, dois indicadores do mercado de trabalho praticamente não se alteraram: idade média dos ocupados e horas
médias trabalhadas. O primeiro relaciona-se à oferta abundante de mão de obra
jovem e melhor qualificada que mantém o padrão etário de ingresso no mercado
de trabalho. O segundo reflete a tendência de expansão de técnicas intensivas em
capital e de empregar mão de obra mais bem qualificada, o que permite ampliar
a produtividade, mantendo-se praticamente igual o número de horas médias
trabalhadas por semana.
TABELA 3
Indicadores médios das características produtivas e dos rendimentos dos empregados – Brasil, 2002 e 2006
Idade
Anos de estudo
Salário mensal do
trabalho principal
(R$ do ano)
Horas trabalhadas
por semana
Salário-hora
2002
2006
2002
2006
2002
2006
2002
2006
2002
2006
HBCC1
37,9
37,9
8,7
9,4
1.051,40
1.364,70
45,8
45,2
5,8
7,6
HNCC
36,9
37
7,2
8
597,9
837,4
46,6
45,7
3,3
4,7
HBSC5
39,8
40,6
8
8,4
792,4
1.036,80
45,1
44,1
4,9
6,3
3
HNSC
37,6
38
5,8
6,4
425,3
581,1
46,3
44,9
2,5
3,6
MBCC2
36,6
36,8
10,1
10,7
742,3
975,3
41,3
41,7
4,5
6
MNCC
36,6
36,7
8,5
9,3
442,1
627,9
42,2
42
2,6
3,9
MBSC6
38,3
38,5
9,2
9,8
528
670,4
37,2
36,7
3,8
5
7
4
(Continua)
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
206
(Continuação)
Idade
2002
Anos de estudo
2006
2002
2006
Salário mensal do
trabalho principal
(R$ do ano)
Horas trabalhadas
por semana
2002
2002
2006
2006
Salário-hora
2002
2006
MNSC
36,8
36,8
7,5
8,4
302,4
439,9
37,2
37
2,5
3,2
Total
37,5
37,5
8,4
9,1
725,1
945,3
43,8
43,3
4,2
5,6
8
Fonte: Microdados PNAD 2006/IBGE.
Elaboração dos autores.
Notas: 1 HBCC: homem branco com carteira de trabalho assinada.
2
MBCC: mulher branca com carteira de trabalho assinada.
3
HNCC: homem negro com carteira de trabalho assinada.
4
MNCC: mulher negra com carteira de trabalho assinada.
5
HBSC: homem branco sem carteira de trabalho assinada.
6
MBSC: mulher branca sem carteira de trabalho assinada.
7
HNSC: homem negro sem carteira de trabalho assinada.
8
MNSC: mulher negra sem carteira de trabalho assinada.
Os indicadores alteraram-se no que concerne à ampliação dos anos de
escolaridade média em todos os grupos e ao decréscimo do salário médio
mensal/hora. Quanto à escolaridade, destacam-se duas situações. Os empregados negros do mercado de trabalho informal, em média, apresentaram defasagem elevada de anos de escolaridade (6,4 versus 9,1 anos com relação à
média dos empregados). As mulheres brancas e negras, conforme evidências
constatadas por inúmeras pesquisas, mantiveram escolaridade média superior à dos homens, embora não traduzissem este acréscimo em remuneração
superior à dos homens (tabela 3). O salário real diminuiu para os brancos
e aumentou para os negros; no mercado de trabalho formal, as mulheres
brancas apresentaram a maior queda entre 2002 e 2006, ao passo que no
mercado de trabalho informal, as mulheres negras exibiram a maior alta (tabela 3). Em termos reais, o salário médio por hora caiu -3,4%, por causa da
inflação de 34,9% medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor
(INPC), entre 2002 e 2006.
Consoante à expectativa teórica, à maior escolaridade correspondeu ganhos crescentes de remuneração, embora tal tendência de aumento seja bem
menor até por volta de oito anos de estudo, o que corresponde ao ensino fundamental completo (gráficos 1 e 2). Este comportamento reflete as mudanças
na estrutura do mercado de trabalho nas duas últimas décadas, quando houve
expressivo aumento do número de trabalhadores com pelo menos o ensino
fundamental completo. O aumento da oferta de qualificados foi impulsionado pelas políticas de ampliação das matrículas em todos os níveis de ensino
e exigências de mão de obra mais bem qualificada decorrentes das mudanças
tecnológicas, o que levou à queda dos salários dos trabalhadores sem ao menos o ensino fundamental completo.
Estreitamento dos Diferenciais de Salários e Aumento do Grau de Discriminação...
207
GRÁFICO 1
Salário-hora médio por anos de estudo – empregados com carteira de trabalho
assinada – Brasil, 2006
25
20
15
10
5
0
0
1
2
3
4
5
HBCC
Fonte: Microdados PNAD 2006/IBGE.
Elaboração dos autores.
6
7
8
9
Anos de estudo
MBCC
10
HNCC
11
12
13
14
15
MNCC
GRÁFICO 2
Salário-hora médio por anos de estudo – empregados sem carteira de trabalho
assinada – Brasil, 2006
18
16
14
12
10
8
6
4
2
0
0
1
2
3
4
5
HBSC
Fonte: Microdados PNAD 2006/IBGE.
Elaboração dos autores.
6
7
8
9
10
Anos de Estudo
MBSC
HNSC
MNSC
11
12
13
14
15
208
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
A despeito da não existência de controles, outro aspecto ressaltado pelos gráficos é a elevada remuneração dos homens brancos que apresentam formação superior
completa, tanto trabalhadores formais como informais. O crescimento exponencial
do salário-hora, à medida que se aumentam os anos de escolaridade equivalentes
ao ensino superior, revela dois aspectos: i) uma supervalorização de trabalhadores
com nível superior e/ou escassez de mão de obra qualificada, que se reflete nos aumentos de remuneração em níveis mais que proporcionais ao aumento dos anos de
escolaridade; e ii) um possível problema de mensuração captada por esta variável,
dado que o último grupo de escolaridade (15 anos) abarca todos os indivíduos que
completaram o ensino superior, bem como os com pós-graduação e outros.
Apesar de a incapacidade da variável escolaridade captar todos os aspectos
referentes ao capital humano acumulado de um indivíduo, os gráficos apresentam
indícios claros de que as maiores remunerações estão associadas aos melhores postos de trabalhos, independentemente de serem formais ou informais, e, portanto,
qualquer política de elevação da renda dos trabalhadores deve avançar, primordialmente, pela maior escolarização das pessoas.
Todavia, a simples diferença salarial, como constatada por meio da tabela
3, não permite estabelecer o grau de discriminação entre grupos, uma vez que
esta diferença pode estar associada ao menor nível educacional – na comparação
entre brancos e negros – e/ou à menor experiência de trabalho entre mulheres e
homens, o que refletiria formas de discriminação pré-mercado.
Para observarmos quanto dessa diferença de rendimentos deve-se à discriminação e às capacidades pessoais dos indivíduos, vamos decompor a diferença dos
logaritmos dos salários-hora, estimados por grupos que considerem sexo, raça e
posição na ocupação, em duas parcelas.
A primeira parcela refere-se à diferença salarial derivada das distintas características produtivas. Assim, por exemplo, o fato de um grupo auferir em média
ganhos menores do que outro poderia estar inteiramente relacionado a características produtivas inferiores; por exemplo, menos anos de estudo, experiência de
trabalho etc. O diferencial de salários médios, na situação, não conteria nenhum
componente discriminatório; ao contrário, a diferença seria o resultado de valorações que ocorrem no âmbito do mercado de trabalho.
A segunda parcela corresponde ao diferencial de rendimento não explicada
pelas variáveis do modelo, ou seja, abarca características não mensuráveis como a
qualidade e o tipo de educação e treinamento, a heterogeneidade entre as distintas
ocupações e atividades econômicas e, inclusive, o fenômeno da discriminação pura.
Assim, Oaxaca e, também, Blinder (1973) sugerem que toda diferença salarial não
explicada pelo modelo pode ser representativa de um tratamento discriminatório,
pois, considerando-se que os retornos estimados para as características produtivas
são iguais para homens e mulheres, brancos ou negros, não haveria explicação econômica para determinado grupo perceber salários, em média, menores.
Estreitamento dos Diferenciais de Salários e Aumento do Grau de Discriminação...
209
Posto isto, realizamos a decomposição da equação salarial dos trabalhadores por meio do método proposto por Oaxaca-Blinder, o qual é amplamente utilizado na literatura especializada, permitindo comparações com outros
estudos, entretanto, sem desconsiderar que os resultados obtidos quanto aos
possíveis efeitos da discriminação podem estar correlacionados com outras
características não mensuráveis.9
4 O MÉTODO OAXACA-BLINDER
A construção do índice de discriminação parte do pressuposto de que é possível
estimar o salário de uma pessoa a partir de suas características pessoais (educação,
experiência de trabalho etc). A base para a estimação da equação salarial segue o
modelo da teoria do capital humano desenvolvido por Mincer (1974), no qual
temos uma equação log-linear com o logaritmo do salário-hora como variável
dependente e variáveis independentes, um conjunto de atributos produtivos que
pode mudar dependendo da disponibilidade de dados e das características do país
e/ou região a que pertence a amostra, dado por:
onde W é um vetor que representa o salário-hora do indivíduo, β é o vetor dos
coeficientes, Z é o vetor de características do indivíduo e μ é o componente aleatório. Estimando a equação, segue que:
Considere o grupo 0, isto é, o que não sofre discriminação comparado a um
grupo j. Fazendo o diferencial, obtemos:
Somando e subtraindo
:
onde
9. Por exemplo, Kassouf (1998), Soares (2000), Biderman e Guimarães (2005), Crespo e Reis (2004), entre outros.
210
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
Portanto, o primeiro termo da equação,
, corresponde a diferenças
nos salários em decorrência de atributos da produtividade, ao passo que o segundo termo,
, representa a parcela não explicada, a qual se convencionou
associar ao fenômeno da discriminação.10
5 DIFERENÇAS SALARIAIS POR SEXO E COR/ETNIA/RAÇA SEGUNDO OS MERCADOS DE TRABALHO FORMAL E INFORMAL
Estabelecemos o modelo de equação salarial log-linear composto pelas variáveis explicativas: anos de estudo, anos de estudo ao quadrado, experiência11 e experiência ao quadrado – além de dummies para as cinco macrorregiões do Brasil – para os ramos de atividade (indústria, comércio e serviços, atividades sociais e pessoais e outras atividades)12
e para as categorias de ocupação (produtores de bens e serviços e de reparação, dirigentes, ciências e artes, técnicos de nível médio e vendedores e prestadores de serviços).13
O retorno da experiência ao salário revela que este é maior para os homens do
que para as mulheres e para os brancos com relação aos negros, o que não necessariamente deve-se à discriminação, pois pode haver outros fatores influenciando este
diferencial; por exemplo, escolaridade, categoria de ocupação, ramo de atividade,
entre outros.14 O grupo de homens brancos com carteira de trabalho assinada encontra-se em melhor posição, pois obtém os maiores retornos, ao passo que o grupo
de mulheres negras sem carteira de trabalho assinada situa-se no extremo oposto.
Destaca-se a situação da mulher negra no mercado de trabalho, pois este não
valoriza o aumento da escolaridade deste grupo, implicando retornos extremamente baixos, especialmente para as empregadas sem carteira de trabalho assinada.
Com relação ao período 2002-2006, observam-se mudanças de baixa magnitude, mas distintas, dos retornos à experiência. Entre as mulheres brancas com carteira
de trabalho assinada e os negros – homens e mulheres – sem carteira de trabalho assinada, ocorreu o crescimento do retorno à experiência sobre os salários-hora; enquanto, para os demais subgrupos, este retorno diminuiu ou permaneceu constante –
com exceção da experiência mais elevada de homens brancos no mercado de trabalho
formal e mulheres brancas no mercado de trabalho informal (tabela 4).
10. Aplicamos o método de Oaxaca em duas etapas, ou seja, os efeitos referentes ao intercepto estão sendo captados
pelo segundo termo.
11. Os autores, nesse modelo, entendem que todo o desemprego é involuntário e não consideraram e/ou aplicaram o
ajustamento de Heckman na equação salarial, os coeficientes estimados, neste caso, são maiores.
12. Engloba as atividades relacionadas à intermediação financeira, a atividades imobiliárias, à informática, a pesquisa
e desenvolvimento das ciências sociais e humanas e aos serviços terceirizados.
13. As dummies Sudeste (região), Dirigentes em geral (categoria de ocupação) e atividades sociais e pessoais (ramo de
atividade) foram escolhidas como categorias de referência. Os resultados das regressões são apresentados no Anexo
deste trabalho.
14. As taxas de retorno à experiência e aos anos de escolaridade são obtidas calculando-se a derivada parcial da
equação de salários, com relação às respectivas variáveis.
Estreitamento dos Diferenciais de Salários e Aumento do Grau de Discriminação...
211
TABELA 4
Taxa de retorno à experiência
(Em %)
Experiência
HBCC
MBCC
HNCC
MNCC
HBSC
MBSC
HNSC
MNSC
5 anos
10 anos
15 anos
20 anos
2002
2,9
2,5
2,1
1,7
2006
2,8
2,4
2,1
1,8
2002
1,4
1,3
1,1
0,9
2006
1,7
1,5
1,3
1,1
2002
2,7
2,3
1,9
1,5
2006
2,3
2
1,7
1,4
2002
1
0,9
0,8
0,7
2006
0,9
0,8
0,7
0,6
2002
2,5
2,2
1,9
1,5
2006
2,4
2
1,7
1,3
2002
1,2
1,1
0,9
0,8
2006
1
1
0,9
0,9
2002
1,6
1,4
1,2
1
2006
2,3
1,9
1,6
1,2
2002
0,2
0,2
0,2
0,2
2006
0,3
0,3
0,3
0,3
Fonte: Microdados PNAD 2006/IBGE.
Elaboração dos autores.
O retorno dos anos de escolaridade ao salário é também mais elevado para
os homens do que para as mulheres, assim como para os brancos do que para os
negros, independentemente da existência de registro na carteira de trabalho.
No entanto, a tabela 5 indica queda generalizada da taxa de retorno dos
anos de escolaridade ao salário-hora entre 2002 e 2006 – com exceção dos
homens negros com ensino superior, com ou sem registro na carteira de trabalho, e das mulheres brancas com ensino fundamental incompleto sem carteira
de trabalho assinada. Tais resultados estão em conformidade com as estimações efetuadas por Barros, Franco e Mendonça, que também observaram a
redução dos retornos à escolaridade no período mais recente de sua análise
(2002-2005). A redução dos retornos da educação sobre o salário-hora pode
estar relacionada ao aumento da escolaridade em todos os níveis da população, elevando a oferta de mão de obra mais escolarizada e o perfil desejado de
qualificação da oferta de empregos.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
212
TABELA 5
Taxa de retorno à escolaridade
(Em %)
Anos de estudo
HBCC
MBCC
HNCC
MNCC
HBSC
MBSC
HNSC
MNSC
4 anos
8 anos
11 anos
15 anos
3,3
9,4
13,9
19,9
2006
2
8,2
12,9
19,1
2002
0,3
7,9
13,6
21,3
2006
-0,9
6,5
12
19,4
2002
4,2
8,3
11,4
15,4
2006
2,5
7,3
10,9
15,8
2002
2002
1
7,3
12
18,3
2006
-0,8
5,2
9,6
15,6
2002
5,1
9,5
12,8
17,3
2006
3,5
6,8
9,4
12,7
2002
2,2
7,3
11,2
16,3
2006
2,9
6,7
9,4
13,2
2002
5,5
7,2
8,6
10,3
2006
3,8
6,6
8,8
11,7
2002
4,3
7,5
10
13,2
2006
2,2
6
8,8
12,5
Fonte: Microdados PNAD 2006/IBGE.
Elaboração dos autores.
O quadro 1 apresenta a síntese dos efeitos das variáveis dummies incorporadas ao modelo de equação salarial referente ao ano de 2006, do qual os resultados
completos constam do Anexo.15 Assim, observamos que, em geral, os trabalhadores do setor formal observam os maiores retornos sobre o salário-hora nos ramos
de indústria – especialmente, os homens –, ocupados como dirigentes – exceção
dos homens brancos –, e localizados na região Sudeste, menos para as mulheres
negras. Por sua vez, no setor informal, predomina o ramo de outras atividades, na
ocupação de dirigentes ou em ciências e artes, e localizado no Centro-Oeste, para
negros, e nas regiões Sul e Sudeste, para brancos. Ou seja, os maiores retornos dos
trabalhadores formais estão relacionados com as atividades, ocupações e regiões
economicamente mais dinâmicas, enquanto, entre os informais, há uma diversificação regional, além de, como esperado, maior concentração em atividades
ligadas ao comércio e à prestação de serviços.
15. Alguns exemplos dos grupos de categorias de ocupação são: produtores de bens e serviços e de reparação (montadores de equipamentos eletrônicos, supervisores de extração mineral e marceneiros), dirigentes (legisladores e diretores de empresas), ciências e artes (engenheiros, médicos, atores e músicos) e técnicos de nível médio (técnicos em
mecatrônicas, desenhistas e atletas profissionais).
Estreitamento dos Diferenciais de Salários e Aumento do Grau de Discriminação...
213
QUADRO 1
Síntese dos resultados das regressões para as variáveis explicativas binárias – Brasil, 2006
Região geográfica
(com maior retorno)
Grupos
HBCC
Sudeste
Ramo de atividade
(com maior retorno)
Indústria
Categoria de ocupação
(com maior retorno)
Ciências e artes
MBCC
Sudeste
Outras atividades
Dirigentes em geral
HNCC
Sudeste
Indústria
Dirigentes em geral
MNCC
Centro-Oeste
Outras atividades
Dirigentes em geral
HBSC
Sul
Outras atividades
Ciências e artes
MBSC
Centro-Oeste
Outras atividades
Dirigentes em geral
HNSC
Sudeste
Outras atividades
Ciências e artes
MNSC
Centro-Oeste
Atividades sociais e pessoais
Dirigentes em geral
Fonte: Microdados PNAD 2006/IBGE.
Elaboração dos autores.
A seguir, observamos na tabela 6 que, no mercado de trabalho formal,
de 2002 a 2006, o hiato salarial entre os homens brancos e as mulheres brancas permaneceu praticamente inalterado, enquanto, em relação aos demais
grupos, houve diminuição do diferencial salarial. Por sua vez, no mercado
de trabalho informal, verificamos igual comportamento dos homens brancos
perante homens negros e mulheres negras; entretanto, com relação às diferenças entre homens brancos e mulheres brancas, o diferencial dos salários
médios aumentou. A constatação de aumento do hiato salarial das mulheres
brancas do setor informal pode ser um indicador de resistência para maior
estreitamento de salários, ou seja, sem a influência de alguma força externa,
a desigualdade de salários perante os homens brancos encontrará resistência
para atingir níveis mais baixos.
TABELA 6
Hiato entre os salários observados com relação ao homem branco
(Em %)
Grupos
2002
2006
MBCC
22,5
22,6
HNCC
53,6
44,6
MNCC
83,8
69,6
MBSC
15,3
17,6
HNSC
65,9
59
MNSC
81,5
65,1
Fonte: Microdados PNAD 2006/IBGE.
Elaboração dos autores.
214
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
A seguir, a tabela 7 mostra a aplicação da metodologia de Oaxaca-Blinder
para determinar-se a composição que é em razão da diferença de dotações e advém da parcela não explicada. Os valores foram calculados da seguinte forma:
em que X representa o percentual em razão da discriminação, A1 é o saláriohora que o grupo analisado receberia na ausência de discriminação; A2 é o
salário-hora observado deste grupo; B é o salário-hora observado do grupo
padrão ou referência (homens brancos) e Y representa o percentual em razão
da diferença de fatores.
Interpretando os resultados de uma forma corrente, conforme a literatura
especializada nos indica, podemos inferir que caso os atributos das mulheres
brancas, com e sem carteira de trabalho assinada, fossem valorizados similarmente aos do homem branco, isto é, caso não houvesse discriminação no
mercado de trabalho, elas deveriam receber salário superior ao deles (tabela 7).
Contudo, com relação aos negros, homens e mulheres, ocorreu uma evolução
distinta no período 2002-2006. Apesar de o hiato observado entre os salárioshora ter, em geral, diminuído para estes grupos, os resultados estimados indicam que a parcela referente à discriminação aumentou; ou seja, tomando-se
como padrão o homem branco, há um aumento no peso da discriminação na
composição do hiato salarial.
Entretanto, se considerarmos que a parcela referente ao que a literatura
denomina de discriminação engloba, na verdade, uma miríade de características não observáveis, tal aumento estimado para a parcela não explicada
do diferencial de salários pode ser compreendido de outra forma. Em vez
do fenômeno da discriminação propriamente dito, os resultados podem estar captando uma elevação de outras características produtivas não observáveis, mas que influenciaram positivamente a remuneração dos trabalhadores,
como a passagem por um treinamento melhor aplicado ou um aprendizado
diferenciado, entre outras.
Sob essa perspectiva é que se sobressaem as limitações da decomposição de
Oaxaca-Blinder, na medida em que não é possível desagregar os efeitos perversos
e benéficos das características não observáveis dos trabalhadores.
Estreitamento dos Diferenciais de Salários e Aumento do Grau de Discriminação...
215
TABELA 7
Decomposição de Oaxaca-Blinder – Brasil, 2002-2006
Salário-hora observado
Salário-hora observado
com peso
do homem branco
Percentual em razão de
características não observadas (discriminação) (%)
Percentual em razão de
diferença de dotações (%)
2002
2006
2002
2006
2002
2006
2002
HBCC
3,77
5,17
–
–
–
–
–
2006
–
MBCC
3,08
4,22
4,12
5,60
151
144
-51
-44
HNCC
2,45
3,58
2,78
4,01
25
27
75
73
MNCC
2,05
3,05
3
4,27
55
57
45
43
HBSC
2,74
3,88
–
–
–
–
–
MBSC
2,38
3,30
–
3
4,19
172
153
-72
-53
HNSC
1,65
2,44
1,85
2,75
19
22
81
78
MNSC
1,51
2,35
2,10
3,14
48
52
52
48
Fonte: Microdados PNAD 2006/IBGE.
Elaboração dos autores.
A despeito das limitações indicadas, observamos na tabela 8 que o hipotético hiato entre o salário pago e o salário a ser recebido na ausência de fatores não
mensuráveis, que podemos caracterizar como tratamento discriminatório, declina significativamente para mulheres negras. Os outros grupos não apresentaram
mudança significante. Verificamos que, nesta situação hipotética, tanto no setor
formal como no informal, o maior hiato diz respeito às mulheres negras seguidas
das mulheres brancas e, por último, aos homens negros, corroborando que a pior
dotação de fatores produtivos é a grande responsável pelo diferencial de salários
dos trabalhadores negros.
TABELA 8
Hiato entre o salário observado e o salário a ser recebido na ausência de discriminação – Brasil, 2002-2006
(Em %)
2002
2006
MBCC
34
33
HNCC
13
12
MNCC
46
40
MBSC
26
27
HNSC
12
13
MNSC
39
34
Fonte: Microdados PNAD 2006/ IBGE .
Elaboração dos autores.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
216
6 CONCLUSÕES
O presente estudo visa mensurar o grau de discriminação e sua tendência entre
os anos 2002 e 2006 nos mercados de trabalho formal e informal; todavia, sem
a pretensão de analisar as possíveis mudanças estruturais que tenham ocorrido
tanto no mercado de trabalho brasileiro como no fenômeno da discriminação.
Para isto, consideramos dois grupos padrão que não são objetos de discriminação:
homem branco com carteira de trabalho assinada e homem branco sem carteira
de trabalho assinada, respectivamente proxies dos mercados de trabalho formal e
informal. A partir disto, foram examinados grupos que podem ser alvo de práticas
discriminatórias: homens negros, mulheres brancas e mulheres negras.
Posto isto, os resultados que produzimos corroboram com as estimativas
apresentadas pelos especialistas na seção 2. Ou seja, verificamos dois fatos: a presença do componente não explicado do diferencial de salários – que se convenciona associar ao fenômeno da discriminação; e que o mercado de trabalho brasileiro manteve práticas de discriminação entre 2002 e 2006. Este estudo, todavia,
avança em dois aspectos. O primeiro é que os indícios de que há um aumento
do termo de discriminação em anos recentes, apesar da redução do hiato salarial,
revelam as limitações da metodologia Oaxaca-Blinder, uma vez que o referido
termo de discriminação engloba uma série de características não observáveis que
podem estar ou não relacionadas com a discriminação pura. O segundo aspecto é
que o presente estudo fornece uma nova perspectiva para os estudos de mercado
de trabalho, ao apresentar evidências claras de que o fenômeno da discriminação
afeta de forma distinta os trabalhadores formais e informais.
O componente da discriminação, segundo as nossas estimativas, é maior
para as mulheres brancas, seguidas pelas mulheres negras e pelos homens negros,
tanto entre os trabalhadores formais como entre os informais. No agregado, as
evidências são aderentes com os resultados apresentados por Soares, Bohnenberger, Biderman e Guimarães e pelos estudos da UFPE, PUC Minas e Instituto de
Desenvolvimento Humano Sustentável (IDHS)/PNUD (2004). Os resultados
apreendidos pelos trabalhos supracitados mostraram que o hiato salarial entre
os brancos, homens e mulheres, decorre, principalmente, da discriminação; enquanto o hiato salarial entre homens brancos e negros, independentemente do
registro em carteira, tem como causa principal a defasagem nas dotações de atributos produtivos, fatores prévios ao mercado de trabalho. O hiato salarial para as
mulheres negras resulta de ambos os fatores, isto é, defasagem de seus atributos
e discriminação, resultado que vem ao encontro das conclusões deste artigo. Tais
evidências estão de acordo com o que é observado na tabela 8, visto que o maior
hiato entre salário observado e salário a ser recebido na ausência de discriminação
é mais incidente para as mulheres negras, seguidas das mulheres brancas e, finalmente, dos homens negros.
Estreitamento dos Diferenciais de Salários e Aumento do Grau de Discriminação...
217
Também de acordo com os estudos especializados, as estimativas deste artigo ratificam parcialmente a tendência declinante do diferencial de salários no
mercado de trabalho e completam as informações. No período 2002-2006, houve
redução do hiato salarial entre grupos discriminados vis-à-vis o aferido por homens brancos, exceto para as mulheres brancas. Entretanto, sem controlar atributos individuais, os resultados estimados indicam que o componente referente
à discriminação aumentou nesse período. Ademais, a diferença entre o salário
observado e o a ser pago na ausência de discriminação manteve-se relativamente
estável, caindo bruscamente somente para as mulheres negras. Ou seja, o mercado tendeu a reduzir o hiato entre os salários observados e os a serem pagos na
ausência de discriminação, tendo em vista a maior homogeneidade dos atributos
produtivos da população; entretanto, o componente percentual do diferencial
de salários em razão da discriminação aumentou. No entanto, novamente, ressaltamos que o referido termo de discriminação engloba todas as características
não observáveis dos trabalhadores, de modo que outros fatores possam ter obtido
maior peso na determinação dos salários, em vez da discriminação em si.
Posto isto, o presente estudo contribui para a literatura especializada de
mercado de trabalho no Brasil ao complementar evidências acerca do tratamento
distinto entre os empregados dos mercados de trabalho formal e informal. Os resultados indicam, como esperado, que, para os trabalhadores negros, homens ou
mulheres, a discriminação é maior entre os trabalhadores do mercado de trabalho
formal do que entre seus pares do mercado de trabalho informal. Tal resultado é
um reflexo da pior remuneração e qualificação dos trabalhadores que ocupam postos que se encontram à margem da legislação trabalhista, de modo que a discriminação destes trabalhadores seja menos usual – ou menos relevante. Neste sentido,
mostra-se vital a maior fiscalização nas questões de gênero e raça, bem como o
incentivo a boas práticas de trabalho, especialmente para os assalariados formais.
Outro aspecto relevante é o avanço dos programas sociais na década de 2000
como um dos possíveis fatores para a continuidade da redução da desigualdade de renda e de melhores condições para os grupos fragilizados da sociedade.16
Todavia, os resultados observados ainda se mostram incipientes, de modo que
se fazem necessárias a manutenção e expansão nos esforços de conscientização
e valorização de grupos tipicamente discriminados, não apenas mulheres ou negros, bem como é importante avançar em melhorias na qualidade, no acesso e na
permanência da população mais carente no sistema escolar.
16. Cacciamali e José-Silva (2008) propõem uma série de ações e políticas públicas de inclusão social, que abarcam
as esferas de mercado de trabalho (incentivos a formalização e livre associação dos trabalhadores, manutenção da
política de salário mínimo e maior representatividade para entidades representativas de movimentos sociais), as pequenas e microempresas (capacitação tecnológica para aumento da produtividade do trabalhador), a capacitação, a
mídia (programas de conscientização, valorização e apoio), a extensão da jornada escolar, o sistema de cotas no ensino
superior e técnico e maior visibilidade e transparências dos programas sociais.
218
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
Por fim, ressaltamos a importância de melhoria no sistema escolar, primeiramente porque uma maior escolarização dos indivíduos elevará suas oportunidades
de inserção aos melhores postos de trabalho e, consequentemente, a maiores remunerações. Por sua vez, uma formação mais ampla e sólida do capital humano,
isto é, a ampliação de um conjunto de características produtivas não mensuráveis,
mas que agregam valor na qualificação de um indivíduo, podem estar com um
peso maior na determinação dos salários dos trabalhadores, conforme indicam os
resultados obtidos pelo presente estudo.
Estreitamento dos Diferenciais de Salários e Aumento do Grau de Discriminação...
219
REFERÊNCIAS
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Estreitamento dos Diferenciais de Salários e Aumento do Grau de Discriminação...
221
ANEXO
Resultados das regressões por sexo e cor/etnia/raça
Empregados com carteira de trabalho assinada
Brancos
Homem
Homem
Negros
Mulher
Homem
Mulher
0,87664
0,99436
0,61511
0,87167
0,58451
0,85716
0,54951
0,70832
0,01614
0,03071
0,01107
0,02794
0,01320
0,01829
0,00240
-0,00038
-0,00018
-0,00039
-0,00011
-0,00031
-0,00013
-0,00022
-0,00001
-0,02677
-0,07313
0,00187
-0,05267
0,00635
-0,02918
0,03713
0,01028
2
0,00752
0,00953
0,00507
0,00785
0,00555
0,00641
0,00220
0,00406
-0,25617
-0,15967
-0,19072
-0,14778
-0,19069
-0,27487
-0,22788
-0,14989
Nordeste
-0,39243
-0,34547
-0,30827
-0,30823
-0,46501
-0,49226
-0,42092
-0,42430
Sul
-0,12189
-0,09980
-0,04432
-0,06176
-0,04287
-0,07904
-0,07476
-0,13826
-0,11000
Centro-Oeste
-0,11181
-0,11833
-0,10215
-0,09649
-0,05405
-0,14653
-0,15067
Indústria
0,10389
0,13044
0,09217
0,01147
0,10415
-0,14597
0,001651
-0,24806
Comércio e serviços
0,00753
-0,03740
0,05912
-0,12476
0,01748
-0,13291
-0,04523
-0,26906
Outras atividades
0,07979
0,17365
0,14685
0,00971
0,06758
0,18384
0,09711
0,08656
Ciências e artes
0,00533
-0,05844
0,11138
-0,04680
-0,08651
-0,06865
0,06558
-0,09353
Técnicos
-0,33158
-0,32397
-0,33720
-0,27689
-0,16903
-0,17815
0,02083
-0,24929
Vendedores e prestadores
de serviços
-0,69284
-0,58918
-0,64010
-0,47380
-0,69003
-0,60577
-0,63738
-0,45943
Produtores de bens e
serviços e de reparação
-0,58455
-0,70991
-0,47544
-0,59004
-0,61775
-0,64322
-0,44403
-0,54941
Significância conjunta - F
4,1E+05
3,0E+05
1,3E+05
8,5E+04
7,6E+04
6,4E+04
3,8E+04
3,4E+04
R ajustado
0,53
0,55
0,37
0,41
0,42
0,45
0,31
0,35
Erro padrão da estimação
0,57
0,53
0,52
0,47
0,72
0,66
0,67
0,66
2
Brancos
Mulher
0,03230
Norte
Categoria
de ocupação
Homem
Constante
Anos de estudo
Ramo de
atividade
Mulher
Empregados sem carteira de trabalho assinada
Experiência
2
Características Experiência
pessoais
Anos de estudo
Região
Negros
5.486.345
3.604.511
3.420.473
1.824.515
1.552.973
1.156.024
1.286.880
925.454
ln(Wm) - média
Observações
1,33
1,12
0,90
0,72
1,01
0,87
0,50
0,41
Wm - média
3,77
3,08
2,45
2,05
2,74
2,38
1,65
1,51
Fonte: PNAD Microdados 2002/IBGE.
Elaboração dos autores.
Nota: 1 Não são significantes a 5%.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
222
Empregados com carteira de trabalho assinada
Constante
Experiência
Brancos
Negros
Empregados sem carteira de trabalho assinada
Brancos
Negros
Homem
Mulher
Homem
Mulher
Homem
Mulher
Homem
Mulher
1,18670
1,32552
1,17749
1,37224
1,06556
1,08314
0,81082
1,22859
0,03090
0,01979
0,02540
0,00940
0,02703
0,01103
0,02602
0,00324
-0,00035
-0,000011
-0,01487
Características Experiência
pessoais
Anos de estudo
-0,00033
-0,00023
-0,00028
-0,00009
-0,00034
-0,00006
-0,04222
-0,08234
-0,02401
-0,06710
0,00102
1
-0,00773
0,00860
Anos de estudo2
0,00779
0,00920
0,00607
0,00742
0,00421
0,00464
0,00361
0,00466
Norte
-0,17103
-0,10349
-0,13411
-0,06267
-0,19717
-0,19992
-0,13963
-0,02630
2
Região
Ramo de
atividade
Categoria
de ocupação
Nordeste
-0,30599
-0,22322
-0,23010
-0,17555
-0,39512
-0,32425
-0,37324
-0,31080
Sul
-0,06685
-0,05337
-0,04393
0,00422
0,01513
-0,03593
-0,02418
-0,08639
Centro-Oeste
-0,05082
-0,07489
-0,02054
0,00496
0,00576
0,01465
-0,01113
0,01450
Indústria
0,14840
0,10538
0,04558
0,00970
0,05301
-0,01620
-0,14120
-0,32742
Comércio e serviços
0,00703
-0,05061
-0,03091
-0,08918
0,00705
-0,10297
-0,12723
-0,29489
Outras atividades
0,08353
0,14908
0,04022
0,04845
0,05909
0,11483
0,01702
-0,01426
Ciências e artes
0,03161
-0,07517
-0,00232
-0,021751
0,04372
-0,01836
0,16966
-0,17150
Técnicos
-0,27821
-0,31633
-0,28355
-0,27414
-0,10428
-0,34059
0,02876
-0,26542
Vendedores e prestadores
de serviços
-0,65410
-0,57009
-0,65545
-0,52837
-0,70441
-0,59805
-0,44734
-0,54538
Produtores de bens e
serviços e de reparação
-0,55310
-0,67887
-0,51245
-0,57463
-0,60382
-0,78425
-0,30811
-0,62560
Significância conjunta - F
4,5E+04
4,2E+05
3,2E+05
1,9E+05
1,1E+05
6,7E+04
6,4E+04
5,3E+04
R2 ajustado
0,50
0,52
0,37
0,39
0,39
0,41
0,33
0,37
Erro padrão da estimação
0,54
0,50
0,49
0,44
0,69
0,64
0,60
0,60
6.268.756
4.440.608
4.865.685
2.576.840
1.548.235
1.373.577
1.616.959
1.176.470
ln(Wm) - média
Observações
1,64
1,44
1,28
1,12
1,35
1,19
0,89
0,85
Wm - média
5,17
4,22
3,58
3,05
3,88
3,30
2,44
2,35
Fonte: PNAD Microdados 2002/IBGE.
Elaboração dos autores.
Nota: 1 Não são significantes a 5%.
Brazilian Labor Market REGIONAL patterns:
an Approach to Gender Divergences
Anita Kon*
Brazil has many labor market gender disparities, which compromise the reduction in poverty
and future sustainable development. These gender differences are much more pronounced in a
regional approach because of the many local specific social and economic considerations requiring
different regional public policies. This paper intends to analyze the regional characteristics of labor
market gender differences for the purpose of gaining subsidies for Brazilian public policies. First,
theoretical aspects are examined explaining the causes of labor market regional divergences.
Following, regional differential indexes are analyzed, calculated by special data tabulations, for
the mid‑1990’s to 2006, and examining labor variables such as occupation and unemployment,
school level, average earnings and working hours, in order to subsidize regional public planning.
Key words: Regions; Labor; Earnings; Gender Segmentation; Brazil.
PADRÕES REGIONAIS DO MERCADO DE TRABALHO BRASILEIRO: UMA
ABORDAGEM DAS DIVERGÊNCIAS ENTRE GÊNEROS
O Brasil apresenta consideráveis disparidades nas situações entre gêneros no mercado de
trabalho, que comprometem o decréscimo da pobreza e o desenvolvimento sustentável no futuro.
Em uma abordagem regional, estas diferenças entre gêneros são ainda mais proeminentes, devido
a especificidades sociais e econômicas locais, que requerem diferentes políticas públicas. A fim de
subsidiar políticas públicas brasileiras, este artigo analisa as características regionais do mercado
de trabalho, segundo as diferenças entre gêneros. São primeiramente examinados aspectos teóricos
que explicam as causas das divergências regionais no mercado de trabalho. Em sequência, foram
analisados indicadores de diferenças regionais, calculados por meio de tabulações especiais, para
o período de meados da década de 1990 a 2007, examinando as variáveis ocupação, desemprego,
anos de estudo e rendimentos médios, a fim de subsidiar o planejamento público regional.
Palavras-chave: Trabalho; Regiões; Rendimentos; Gênero; Segmentação Ocupacional; Brasil.
LOS PATRONES REGIONALES del MERCADO DE TRABAJO DE BRASIL: UNA
APROXIMACIÓN DE LAS DIFERENCIAS ENTRE GÉNEROS
Brasil presenta considerables disparidades en las situaciones entre hombres y mujeres el mercado
de trabajo, que compromete la disminución de la pobreza y el desarrollo sostenible en el futuro.
En un abordaje regional, estas diferencias entre géneros aún más prominentes, se deben a
especificidades sociales y económicos lugares, que exigen distintas políticas públicas. Con el fin
de subvencionar políticas públicas brasileñas, este artículo analiza las características regionales
del mercado de trabajo según diferencias entre géneros. En primer lugar se examinan algunos
aspectos teóricos que explican las causas de las divergencias regionales en el mercado de trabajo.
En secuencia, fueran analizados indicadores de diferencias regionales, calculados a través de
* Professora titular do Departamento de Economia da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo.
E-mail: [email protected]
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
224
tabulaciones especiales, para el período de medios de la década de 1990 a 2007, examinando
las variables empleo, desempleo, años de estudio, rentas medias, con el fin de subvencionar la
planificación pública regional.
Palabras-clave: Trabajo; Regiones; Rentas; Género; Segmentación Profesional; Brasil.
LES VARIATIONS RÉGIONALES DU MARCHÉ DU TRAVAIL BRÉSILIEN: UNE
APPROCHE DES DIFFÉRENCES ENTRE LES SEXES
Le Brésil présente de considérables disparités dans les situations entre des hommes-femmes dans le
marché de travail, qui compromet la diminution de la pauvreté et le développement soutenable à l’avenir.
Dans un abordage régional, ces différences entre des genres sont encore davantage proéminents,
dû à des spécificités sociales et économiques de chaque localisation, qui exigent de différentes
politiques publiques. Afin de subventionner des politiques publiques brésiliennes, cet article analyse les
caractéristiques régionales du marché de travaux selon les différences entre des genres. Premièrement
sont examinés des aspects théoriques qui expliquent les causes des divergences régionales dans le
marché de travail. Dans séquence, sont analysés des indicateurs de différences régionales, calculés
à travers des tabulations spéciales, pour la période de milieux de la décennie de 1990 à 2007, en
examinant les variables occupation, le chômage, années d’étude, revenus moyens, afin de subventionner
la planification publique régionale.
Mots-clés: Travail; Régions; Revenus; Genre; Segmentation Professionnelle; Brésil.
1 INTRODUCTION
The stabilization and reform policies undertaken in Brazil since the eighties, to
cope with high inflation and other macroeconomic unbalances, have affected
(positively or negatively) the performance of the regional economies and mainly
labor market opportunities. The impacts on segmentation in gender labor division
have been somewhat similar among the regions, but there have also been many
disparities that have led to an unfavorable situation, mainly among women.
In this sense, the specific cultural, demographic, political and economic structures
of each Brazilian region have caused worker distribution, calling for distinct regional
policies. It has been observed that Brazilian regional occupational segmentation
according to gender, regarding inequalities in labor protection conditions,
qualification and earnings reinforce the already existing exclusion and poverty.
This paper strives to analyze the regional characteristics of this country’s labor
market, regarding gender differences, which impact personal and regional income
inequality, and reflect on global and regional poverty levels. Some theoretical aspects
that could explain the causes of the regional labor market gender divergences and
the impacts on economic development of the countries will be examined first.
Next, an empirical analysis of Brazilian inequalities among positions for
women and men according to the regional labor market division is presented.
Among the selected indicators that quantify and qualify the diversities, Regional
Brazilian Labor Market Regional Patterns: an approach to gender divergences
225
Differential Quotients and other regional indexes are calculated, using special data
tabulations, for the most recent period from the mid-1990’s to 2006, in order to
examine labor market variables such as occupation and unemployment, school
level and average earnings, for the purpose of subsidizing regional public planning.
2 ECONOMIC GLOBALIZATION AND REGIONAL LABOR MARKET IMPACTS:
GENDER INEQUALITIES
Developing countries face the challenge of solving the conflicts between
macroeconomic stabilization and developing policies, aiming at competing in
world markets. The occupational structure of these economies, in each situation,
results from the possibilities of dealing with these conflicts. The characteristics of
occupational distribution in formal and informal activities of developing countries
result from the specific possibilities of the manpower offer, in those economies,
to respond to firm’s labor demands. The nature of these labor market offers can
either block or allow firms and workers facing international competition to adjust
dynamically to the new requisites brought about by the boost in world productivity.
The world globalization process has caused significant changes in advanced
as well as in less developed economies in recent years, which include: a) increasing
internationalization of economic activities; b) reorganization of dominant firms:
c) increasing integration of manufacturing and service production; d) growing use
of microelectronics technology; e) growing industrial demand for a high skilled
workforce, in contrast to many routine jobs being displaced by technical change; f )
the increasing complexity and volatility of consumption; and g) the changing role
of state intervention. (Rima, 1996; Beneria, 2003; Castells, 2005; Boserup, (2007).
Although these changes occur more rapidly in more advanced countries,
a similar dynamics of restructuring in other low and middle income countries
is also observed, although at a lower speed. Similar patterns of occupational
structure and restructuring are found for each level of economic development
during a period of time, due to industrialization and technological modernization.
Business organizations have to cope with international competition and deal
with many changes regarding technology and plant, nature of labor qualification,
new organization of labor process, new features of production (non-continuous
production and limited economies of scale), among others. On the other hand,
technical innovations affect the nature of products (intensification of non-material
services, the features of a product, etc.), consumption (through product delivery
forms, role of consumers, organization of consumption, etc.) and also markets
(organization of markets, regulation and marketing tools, etc.) (Kon, 2007).
The impacts of the recent economic globalization on the Brazilian economy have
revealed a diversified trend when observing regional production and labor market
structures. This is due to the specific features of each region, as regards their sector
226
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
structure, the availability of human resources, the agglomeration economies and
the degree of technological innovation undertaken by local companies. In contrast
with the regional inequalities observed in the socioeconomic levels of development
at the beginning of the eighties, the dynamics of Brazilian regional evolution has
shown different speeds and intensities in several spaces. This is because international
competitiveness and economic stabilization must be coped with simultaneously.
On one hand, there is the influence of structural aspects related to material
and human resources, and also to specific spatial, politic and cultural conditions.
As regards human resources, mainly in developing countries, severe gaps are
noticed caused by differences in school enrollment and adult illiteracy, access to
health, safe water and sanitation services, which reflect intensely on the cultural
environment and on the ability to seek modernization. These gaps result in
diversified possibilities of labor to adapt to the technological progress and an
organizational modernization that is brought about in enterprises, in order to
compete in the world market. In this sense, the most advanced regions reveal a
more intense and faster growth in the more industrialized and modern sectors,
strongly impacting regional worker productivity.
As a result of human and social difficulties, in many countries labor market
has been showing negative characteristics in regard to the conditions for work and
earnings, like the increase in open long-lasting unemployment and the spread
of small informal enterprises driven by outsourcing and subcontracts, and the
increase in low productivity sectors with low salaries. Moreover, self-employment
in low-income occupations is also growing fast. This diminishes productivity
gains at the average regional level. The differences in infrastructure utilities or
in physical capital stocks, resulting in agglomeration economies and positive
externalities to company location, also depict the relevant historical, cultural and
economic picture of the differences in dynamism among regions, due to cultural
and human resources causes (Kon, 1995).
On the other hand, there is the influence of conjuncture situations that
also have repercussions on various socioeconomic spaces, with different results
and intensities. The macro- and microeconomic policies aiming at economic
stabilization or at stimulating specific sectors have different effects on each
region, according to the structural and conjuncture possibilities of responding
to these stimuli. Therefore, each space reacts differently to the impacts of the
recent economic globalization, in regard to the possibilities of improving labor
productivity and other labor conditions. In several economies, the impact of
technological and organizational transformations and globalization also changed
the attraction of regional business location conditions. This led to a different
model of economic influence based on distinct central places or distinct growth
clusters in the same region, instead of the former central place.
Brazilian Labor Market Regional Patterns: an approach to gender divergences
227
In regard to labor gender conditions, a historical trend toward increased
participation by women in occupational structure is observed in developing
countries. On one hand, this increase reflects positive aspects of the evolution
of social values, as well as of the modernization of production processes, which
refined and increased the division of tasks, and, in some cases, created occupations
favoring female labor conditions, like accuracy and manual skills. However, greater
female participation in the labor market, mainly during times of economically
hardship, is also connected to the issue of family survival, or to the sustaining of
a standard of living, and to the creation of the woman’s own work opportunities.
The composition of occupational distribution according to gender reflects
the net movements of these long-term and conjuncture trends. These are
diversified regionally, according to the spatial impacts of global economic policies
and to specific cultural factors reflected in particular patterns of segmentation. The
specific features of each region are also due to their sector structure, availability of
human resources, agglomeration economies and degree of technological innovation
undertaken by local firms. But it is seen in a great part of countries that women
disadvantages in labor market conditions prevail (Lustig and Edwards, 1997).
In contrast with the regional inequalities observed in the socioeconomic
levels of development at the beginning of the eighties, the dynamics of regional
evolution has shown different speeds and intensities in several spaces, similar to
the impacts on labor market gender distribution, which, in contrast, maintained
a high level of disparities.
Some analysts, entrepreneurs and even government agents, who are in charge of
labor policies, have argued that excessive protection through labor market regulation
causes some limitations to markets responses to adjusting to the high unemployment
rates, and is leading an increasingly greater number of workers to precarious situations
in the informal market thus worsening inequalities and exclusion. They refer to some
East Asian economies, in order to base ideas of reforms in the labor markets and to
suggest policies to increase labor qualification and gender equality.
Others assert that any measure that leads to the elimination of labor
protections will worsen the social conditions of the workers and will increase
poverty and the inequity in income distribution of the country .They also argue
that regulations in Brazil have commonly been largely ignored by the employers
and that the labor markets already are considerably flexible. On the other hand,
some regulatory policies have not solved unemployment problems and gender
inequalities in the labor market. (Lustig and Edwards, 1997; Moe, 2003; Beneria,
2003; Kon, 2007, Jacobsen, 2007). In any case, economic reforms leading to
stabilization and economic modernization have not particularly solved some
problems resulting from the changes in the previous labor market conditions.
228
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
In the context of capitalist development, there is a historical trend toward
increased participation by women in the occupational structure. On one hand,
this increase reflects positive aspects of the evolution of social values, which
began to allow a higher rate of women to participate in the labor market, and
in the modernization of production processes. This has refined and increased the
division of tasks and, in some cases, has created occupations favoring female labor
conditions, like accuracy and manual skills.
Nevertheless, firms had to cope with their need to modernize their production
and organizational processes in order to increase their competitiveness at a global
level, although in some regions, labor forces were not prepared to respond to an
increasing demand for more qualified workers. The increasing number of selfemployed workers was a way in which the economy could adjust to the new
world reality of transnationalization and technological innovation, which are job
economizers. The allocation of workers in informal activities, which allow easier
articulation in order to cope with the economic adjustment of the firms, have an
unstable character and result in smaller remuneration for those excluded from
labor market.
3 PREMISES OF BRAZILIAN REGIONAL GENDER DIFFERENCES
IN LABOR CONDITIONS
Offer and demand factors of the Brazilian labor market, in more recent years, were
deeply associated with the accelerated pace of technological progress and economic
globalization, which led to technological and organizational restructuring in
companies in most countries, as already seen. These changes had considerable
repercussions on the nature of the productive processes, on the composition
of production structures and on the evolution and nature of the product. This
dynamic had also transforming impacts on the conditions and nature of work in
all economic sectors, since economic modernization, with the introduction of new
techniques, eliminates a series of job occupations and positions, while it creates
new functions and occupations.
When analyzing the subjects related to labor earnings distribution specifically,
the basic hypotheses of this evaluation are related to theoretical premises that associate
this structuring with some primordial determinants which mould the standards of this
composition. These determinants refer to the already mentioned labor “spatiality,” that is,
the specific qualities of the occupational structure in each region, originated by cultural,
social and economic characteristics peculiar to each space.
They result from diverse regional reflexes on the occupational structures,
which derive from specific resources and socioeconomic bases, and are represented:
a) by the quality of the job offer, in other words, of the “human capital”
Brazilian Labor Market Regional Patterns: an approach to gender divergences
229
incorporated in workers (Smith, 1983:248; Becker, 1993; Jacobsen, 1998:249;
Boserup, 2007); b) by the differences in labor market segmentation internally to
the companies (Gordon, Reich & Edwards, 1973; Doeringer and Worsen, 1971;
Vietorisz & Harrison, 1973; Jacobsen 2007, Kon, 2007); c) by the structural
differences in earnings (Rima, 1996:260; Jacobsen 2007, Kon, 2007); and d)
by the participation of workers according to gender (Kon, 1995 e 2007; Mutari,
Boushey and Fraher, 1997; Jacobsen, 2007).
One of the main determinants of labor spatiality is the Human Capital
endowing of the regional labor force. The concept of Human Capital (HC) is an old
discussion in economic theory (Gary Becker, 1993; Jacobsen, 2007, Rima, 1996), not
relevant to classical and neoclassical theories, which considered labor homogeneity
as a hypothesis, or, in other words, that all workers have the same qualifications and
are identical in all important aspects. Nevertheless, revisions in these concepts are
part of new theories, and are reviving the concern about the economic relevance of
differences in labor capacities, as well as differences in the interpretation of gender
HC endowments by the firms (Rima, 1996; Jacobsen 1998; Boserup, 2007).
The first discussions concerning the importance of Human Capital on
worker remuneration pointed out that manpower, in fact, is heterogeneous, and
that differences among individuals and in the labor market interfere directly in
the workers’ earnings. According to this approach, this capital is composed in part
of a worker’s physical and mental abilities that are innate and that are the result of
acquired education, on‑the‑job training and other professional and specialization
courses, as well as work experience. The common characteristic of these capacities
is that they maintain or increase the market value of manpower. In other words,
the salary structure or earnings differences among groups in an economy are
frequently associated with age, gender, race and type of occupation; however,
they also reflect the former diverse kinds of HC. The worker “rents” the use of
his HC to the employer and the resulting salary is not only the compensation for
the hours spent at work, but also for the available worker’s HC (Rima, 1996:109)
Another explanation about earnings differences among individuals comes
from the theories that internally analyze the labor market segmentation of the
firms. The distinct branches of these theories try to explain the existing differences
in the kinds of jobs inside companies, based on diverse recruitment criteria
selection and training on one hand, and on the other, on several forms of work
and career promotions linked to specific salary levels (Gordon, Reich & Edwards,
1973; Doeringer and Worsen, 1971; Vietorisz & Harrison, 1973).
In short, the ideas of these authors point out the different labor market
segments inside the firms, classified as Primary and Secondary groups. The Primary
market is composed of jobs with stability and with relatively high productivities and
230
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
salaries. The promotions and the salaries are established through rules specific to the
firm, and are frequently adopted in large oligopolistic companies, with high capital/
labor relation The Secondary segment is composed of workers with minimum
qualifications and training, who are not incorporated in promotions processes. The
salaries and productivity are relatively low, and the working habits are not stable, with
few formal contracts. These segments are more easily found in small competitive
firms with unstable demand and little access to capital and technology; however,
it is also frequent in industrial big size companies. In this segment, internal labor
market promotions do not exist, because the labor is homogeneous and there are no
turnover costs to the firms.
In what refers to earnings, differences in the structure of the remunerations
have also been analyzed, based on two basic focuses: differences among
occupations and among workers. The traditional focus on the differences
among occupations considers the economy as a network of labor markets
for each of the many occupations, which are differentiated according to
qualification requisites, job position stability, working conditions and
other factors. More recently, the focus of the HC theory does not consider
differences among jobs positions, but among people, and it relates a worker
earnings directly to his personal characteristics, what includes gender.
Today, an examination of the nature and sources of change in different
occupational remunerations shows the strong influence of a payroll polarization
process among occupational categories, related to the erosion of average
remuneration job opportunities, across the earnings scale. This is connected,
on one hand, to greater cost reductions undertaken by companies, as part of
their administrative strategies, aiming to reduce the payroll expenses. These cuts
had greater impacts on modern sectors, such as the computer science industry,
commerce and financial sectors. They have also been affecting a great number
of bureaucratic and administrative occupations, creating a labor demand
for qualified and more flexible workers, hired at lower salaries. Their former
companies sometimes rehire many previously dismissed workers, without any
legal labor protections or additional benefits and with lower remuneration. A great
number of these administrative workers turn into temporary workers, through
subcontracting processes. These recent company practices affect professionals as
well as technical and other qualified worker occupations particularly, reflecting
company efforts to reduce unit production costs (Kon, 2007).
However, literature shows many cases where it is seen that all these theoretical
determinants may have different impacts in workers conditions, according to
their gender characteristic. In the next section the paper will analyze Brazilian
regional labor force distribution according to gender, aiming to understand the
disparities comparing the country’s profile to the former theoretical premises.
Brazilian Labor Market Regional Patterns: an approach to gender divergences
231
4 BRAZILIAN REGIONAL LABOR SEGMENTATION ACCORDING TO GENDER
4.1 Initial considerations
The analysis of Brazilian regional occupational segmentation according to
gender presented in this paper is part of a larger research project studying
the country’s labor market structure, and examining the occupational profile
of the working population and the labor changes that have occurred in this
distribution since the nineties (Kon, 2007). The data sources are the National
Domicile Sampling Survey (Pesquisa Nacional por Amostra de DomiciliosPNAD) and the Monthly Employment Research (Pesquisa Mensal de Emprego)
conducted by the Brazilian Institute of Geography and Statistics (Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatistica-IBGE). Some indicators were constructed
for the purpose of determining regional diversities in labor force distribution
according to gender, by selecting some educational and earnings variables that
allow a better understanding of the implications of these differences in regions
with diverging levels of development. The determination of these differences
allows regional public policies to select proper measures specifically directed at
the most needed group of workers and regions.
First, it is pointed out that the regional labor segmentation, which can
be seen through the country’s statistical information, results from the structural
changes that occurred in different economic activities and sectors in the period
analyzed, which had a new and innovative character. These changes played
the role of unbalancing the old patters, regarding the creation of a volume of
necessary job positions to be adjusted to economic growth on one hand, and
to the qualification profile of Brazilian manpower, on the other. The pace of
economic modernization, as well as that of the introduction of new functions
and occupations in companies or in autonomous work, is often upset by the
specific conditions of the Brazilian labor force profile, which is not always
prepared to take over more flexible terms of production processes or more
sophisticated tasks. Therefore, the Brazilian labor market conditions of the
nineties on did not show as many structural changes as would be expected in
the new world situation. In this context, women are still at a disadvantage
in labor market conditions; nevertheless, they present a qualification level
equivalent to men, as it will be seen.
Brazilian labor market gender diversities are considerable for the entire
economy; however, these differences in regional terms take on much more
pronounced contours according to the space, particularly due to the cultural,
economic and social disparities that affect the regionalized occupational structure,
confirming the theoretical premises for all countries, in a more intense level than
advanced ones.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
232
With regard to the impacts on different region economies, the specific
qualities of the occupational structure in each Brazilian space, are molded as much
by inner structural components as by other forces, exogenous to regional and
national ones, which affect these qualities in a given period. The transformations
in this “spatiality” result from each space adjustment capacity to cope with new
economic requisites from world economies, as impact of economic paradigms
changes (Kon, 2007).
It is greatly known that some Brazilian states, such as São Paulo, Rio de
Janeiro, Rio Grande do Sul, Amazonas, Distrito Federal and Santa Catarina,
present a higher per capita income in relation to the national average, whereas
the other state show income rates which are lower than half the Brazilian average
index. Nevertheless, it should be noted that this situation represents an advance
in relation to the previous period, starting in the fifties, when income disparities
between the most advanced and the most backward states were even higher.
In the 1950-1985 period, some important changes occurred in the
production and occupational structures of the various spaces, in such a way that
some regions approached the country average GDP, either in the positive sense
(that is, through a higher relative growth rate) or in the negative sense (due to an
inferior relative growth). Regional dynamics is driven by a sequence of factors,
which act to accelerate, retard or diminish the specific growth rates (Kon, 2005).
In what concerns to human resources, it is noticed severe gaps among the
North-Northeast regions and the South-Southeast regions, caused by differences
in school enrolment and adult illiteracy, access to health, safe water and sanitation
services which have intense reflections in the cultural environment and in the
capacity to assimilate modernization.
In order to determinate these differences, the regional analysis undertaken
here adopts two approaches, in accordance with the availability of statistical
information on gender distribution by type: (a) according to selected metropolitan
regions and (b) according to the so-called 5 Great Regions. It is initially observed
that regional activity rates, that is, the regional levels of occupation, show
considerable differences between the genders for all the regions.
The following selected variables aim to determinate the labor market regional
profile of workers, in order to quantify and qualify the main gender differences:
activity rates, unemployment situation, education level and average earnings.
4.2 Activity rates
It is initially observed that the regional activity rates, that is, the regional levels of
occupation present considerable differences between the genders for all the regions.
The gender regional activity rates (AR) were determined by the following expression:
Brazilian Labor Market Regional Patterns: an approach to gender divergences
AR = (OPij / EAPij) x 100,
233
where
OP = Occupied Population, EAP = Economically Active Population, i = gender ,
j = region.
The Brazilian average AR shows that about 73% of men were economically
active in 1999 and only 49% of women, whereas in 2006, the average rate of
female activity rose almost 8%, to nearly 53%, and male activity declined not
very significantly, i.e., about 1% (Figure 1).
FIGURE 1
Gender regional activity rate (AR)
90
80
70
60
50
40
30
20
10
00
Men 1999
Men 2006
Women 1999
Women 2006
Brasil
74
73
49
53
North*
71
73
47
49
Northeast
74
72
49
50
Southeast
72
72
47
53
South
78
76
55
58
West-Center
77
74
51
53
Source: IBGE-PNADs 1999 and 2006.
Elaborated by the author.
* Urban North, in 1999.
All regions show similar situations; however, the South shows the highest
rates for the two genders in the period, in that men participate with about 78%
in the gender differentiation and women, 55%, in first year, and respectively
76% and 58% in the last year, closely followed by the West-Center. The lower
rates among men are found in the Southeast; however, the highest participation
growth between the two periods (6,1%) was observed among women.
Regional differences are better observed through the gender regional activity
rate differences (ARD), which is calculated as:
ARD = [(ARij / ARiB) -1],
where
ARij = (OPij / EAPij) x 100 and ARiB = (OPiB / EAPiB); OP = Occupied Population,
EAP = Economically Active Population, i = gender , j = region and B = Brazil.
Regional differences are best observed in Figure 2, where, in regard to the
total average activity rate of Brazilian workers, men show positive differentials of
21% and 17%, respectively in 1999 and 2006, and the largest positive differences
are found in the South and West-Center regions (28% and 26% in the first year),
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
234
declining at the end of the period. In turn, the differentials for the women are
negative in all regions, as to Brazilian global average, but there is a trend of greater
convergence in the period. The region that shows the largest positive divergence
among men is the same one that presents the lowest negative divergence among
women (South). In short, a very slow trend toward convergence of the activity
rates was clear in the period, that is, a reduction of the differentials.
However, the more intense increase in women’s activity rates, in a different
way than it was found in the above mentioned theoretical literature, resulted not
so much from the country’s modernization – as an effect of growing economic
globalization – but mainly from the fact that during economically Brazilian
hardship times in the period, the raise in female participation, was mainly linked
to family survival; this has happened in inequality conditions, and in order to
create their own work opportunities, in labor exclusion situations.
FIGURE 2
Gender regional activity rate differences (ARD)
0,40
0,30
0,20
0,10
0,00
-0,10
-0,20
-0,30
Brasil
North*
M
0,21
0,17
W
-0,20
-0,23
Northeast
Southeast
South
West-Center
0,21
0,18
0,28
0,26
-0,20
-0,23
-0,10
-0,17
1999
2006
M
0,17
0,17
0,16
0,16
0,21
0,19
W
-0,16
-0,22
-0,20
-0,15
-0,07
-0,16
Source: IBGE-PNADs 1999 and 2006.
Elaborated by the author. Global Brazil (M+W) = 0
*Urban North, in 1999.
In any case, the diverse conditions between the genders, in regard to family and
professional responsibilities, rigid work schedules, and stricter demands of skills for
men, among others, show that women’s work doesn’t depend only on market demand,
but also on a series of other interconnected factors. These factors frequently lead to the
allocation of workers in informal activities that allow easier articulation, but that are
unstable in character and have lower remuneration. In sum though Brazilian female
participation in labor market continued its historical tendency towards increasing
rates, these indicators reflect something more than positive aspects of the evolution of
economic performance and social values, as in more advanced countries.
Brazilian Labor Market Regional Patterns: an approach to gender divergences
235
Domestic work is frequently a solution found by Brazilian women and also by
the enterprises that outsourcing some services, looking to reduce costs. However,
unlike the domestic work resulting from outsourcing of a series of more sophisticated
modern services previously allocated in the companies, in Brazil, domestic female
work, in most cases, has the character of a craft, and has low qualification and lower
remuneration. More effective public policies aiming to the larger engagement of
the feminine population in labor force are not present, or a lot of times are badly
enunciated and cause contrary effects, discouraging the enterprises companies to
hire women, because they cart in a larger relation cost/benefit (Kon, 2007).
4.3 Unemployment behavior
The impact of the recent economic globalization on the Brazilian economy has
revealed a diversified trend, when regional unemployment rates are observed. This is
due to the specificities of each region, as regards their sector structure, the availability
of human resources, the agglomeration economies and the degree of technological
innovation undertaken by local enterprises, confirming the theoretical premises.
In contrast with the regional inequalities observed in the socioeconomic levels of
development at the beginning of the eighties, the dynamics of Brazilian regional
evolution has shown different speeds and intensities in several spaces.
This is due, on one hand, to the need to cope simultaneously with
international competitiveness and the economic stabilization process, which had
an impact on the productive firms located mainly at the economic clusters, which
attracted workers from other regions and affected the regional gender distribution
and the unemployment rates. The high unemployment rates and the growth of
the informal sector have intensified, along with the debates about the institutions
that prevail in the labor markets, which can be one of the causes of the increase
in negative trends (Kon, 2007).
The attraction forces of Brazilian metropolitan spaces are also diverse,
according to the specific production structure of each cluster, as seen in Figure 3,
which presents the gender regional distribution of workers among each selected
metropolitan region, for the most recent period from 2002 to 2007.
It can be seen that, the annual participation rate differences between genders in
each region, in the entire period, were very small, but in each year and in each specific
region, there is a specific predominance of men or higher concentration of women.
The highest worker concentration is seen in the Metropolitan Region of Sao Paulo,
where the male and female concentrations in 2002 were, respectively, nearly 42%
and 41%, remaining almost the same until 2007, when there was a rise of about 1%.
The Rio de Janeiro Metropolitan Region had a great worker concentration that, in
2002, represented about 26% of the two genders, lowering to 25% of men and less
than 24% of women, by the end of the period.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
236
FIGURE 3
Brazilian metropolitan regions (MR*) workers distribution by gender
45
40
35
30
25
20
15
10
5
0
M
W
M
2002
W
M
2003
W
M
2004
W
M
2005
W
2006
M
W
2007
Recife
6,5
6,3
6,8
6,8
6,6
6,8
6,6
6,3
6,5
6,1
6,4
6,2
Salvador
6,7
7,6
6,7
7,2
6,7
7,2
6,8
7,4
6,7
7,4
6,9
7,7
Belo Horizonte 9,9 10,7
10,1 10,7
10,4 10,7
10,3 10,6
25,9 25,5
10,9 11,1
10,8 11,4
Rio de Janeiro
26,2 25,8
26,1 25,5
25,3 24,5
25,3 24,4
25,1 23,8
São Paulo
41,9 40,5
41,6 41,1
42
41,1
42,5 42,4
42,2 42,1
42,6
42
Porto Alegre
8,7
8,7
8,6
8,5
8,6
8,6
8,4
8,3
9
9,1
8,7
8,9
Source: IBGE/PME.
Elaborated by the author.
M = men; W = Women. *Σ MRi = 100%, i = gender; r = region.
r
The third metropolitan region in terms of concentration level of workers
was Belo Horizonte, where the women’s representation was slightly higher in the
entire period, about 11% and 10% respectively in 2002, and over 11.4% and
less than 11% in this order. The concentration in Porto Alegre was alternated
between male or female predominance, showing participation from 8.3% to
8.7% of men and 8.6% to 9.1% of women. The participation of Recife and
Salvador regions are similar; however, whereas in the first space, both genders
concentrate no more than 6% to 6.8% in the period, in the second space,
women are more representative, participating with 7.2% to 7.7% and men
from 6.5% to 6.9%.
In regard to regional unemployment rates, gender distribution is lower in
1999 and 2006 among men in relation to women, for all the regions (Figures 4, 5
and 6). However, the two genders show a decreasing unemployment level between
the two periods, (except for the Northeast regions). This was due to the impacts
of world commerce globalization upon Brazilian exports increase. The greatest
levels of unemployment are observed in the country’s main economic cluster
region, represented by the Southeast and also in the industrial cluster of the North.
The smallest levels were show in the Northeast, where the informal market is more
extensive and the male and female rates are almost the same in the two periods. It has
to be stressed that in the North region, the very high difference in the unemployment
rates between the two periods results from the methodological change in the research
(2002), because it did not include the region’s rural zone in 1999.
Brazilian Labor Market Regional Patterns: an approach to gender divergences
237
FIGURE 4
Regional unemployment rate by gender
16
14
12
10
8
6
4
2
0
Men 1999
Brasil
North*
Northeast
Southeast
South
West-Center
7,9
9
6,7
9,2
6,7
7,3
Men 2006
6,4
5
6,5
7,2
4,7
6,4
Women 1999
12,1
14,8
10
14
9,8
12,9
Women 2006
11
10,2
10,8
12,6
7,5
11
Source: IBGE-PNADs 1999 and 2006.
Elaborated by the author.
* Urban North in 1999.
The regional unemployment rate differences (RUD) by gender were
estimated as
RUD = [(URij / URiB) -1],
where
UR = unemployment rate, URij = ( UIij / UIiB) x 100; UI = Unemployment Index;
i = gender, j = region and B = Brazil. ** Total Brazil average (M+W) = 0.
Figure 5 show the regional worker unemployment differentials in
relation to the Brazilian overall average rate, where gender differences are
clearer. The male workers have always shown negative differences in relation
to the country’s average in all the regions, whereas the female workers showed
positive differences, except for the South. These female differentials are the
highest in the most dynamic regions of Southeast and Urban North (in this
region only in 1999), but in the South region, the female unemployment
rates, which were negative, show no significant divergence to the national
average in the two periods.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
238
FIGURE 5
Regional unemployment rate differences (RUD) according to gender
0,6
0,4
0,2
0
-0,2
-0,4
-0,6
Brasil*
Men 1999
Men 2006
Women 1999
Women 2006
North**
Northeast
Southeast
-0,09
-0,41
0,49
0,22
-0,32
-0,23
0,01
0,28
-0,07
-0,14
0,41
0,50
-0,20
-0,24
-0,22
-0,31
South
-0,32
-0,44
-0,01
-0,10
West-Center
-0,26
-0,24
0,30
0,31
Source: IBGE-PNADs 1999 and 2006.
Elaborated by the author.
* Total Brazil average (M+W) = 0.
** Urban North in 1999.
Figure 6 presents the regional unemployed workers distribution according
to gender in each selected metropolitan region for the most recent period since
2002 to 2007. It can be observed that, among the unemployed, the hierarchic
distribution among the regions, as well as the small differences between genders,
are similar to those shown in Figure 3 for total workers, maintaining the same
regional profile as that of the country’s Great Regions.
FIGURE 6
Brazilian metropolitan (MR*) unemployment distribution by gender
60
50
40
30
20
10
0
M
W
M
2002
W
M
2003
W
M
2004
W
M
2005
W
M
2006
W
2007
Recife
7,2
6
8,8
7,4
8,9
7
11
8,7
9,9
9
10
8
Salvador
9,2
8,9
9,9
9,8
10
11
11
13
9,3
10,3
12
12,3
Belo Horizonte
10
9,6
10
9,1
10
8,9
10
8,3
8,4
9,3
8,1
8,6
Rio de Janeiro
22
22
18
18
16
21
17
21
17,9 19,4
17
19,5
47,6 45,8
46
45
7
6,7
São Paulo
46
48
47
49
48
46
43
42
Porto Alegre
5,6
5,7
6,3
6,3
6,6
5,9
7,6
6,1
Source: IBGE/PME.
Elaborated by the author.
M = men; W = Women. *Σ MRi = 100%, i = gender; r = region.
r
7
6,2
Brazilian Labor Market Regional Patterns: an approach to gender divergences
239
In São Paulo, the participation of the unemployed had been higher,
and between 2002 and 2003, women showed higher percentages, the
opposite occurring in the other years of the period. In Rio de Janeiro only,
the concentrations in 2002 reached about 22% for the unemployed of both
genders, but did not show any significant decrease in the rest of the period.
The highest differences among the participations for the employed and the
unemployed (Figure 3 and 6) was seen in Porto Alegre in both genders,
where the unemployed totaled about 5.6% in the first year, whereas men’s
participation increased from 6.3% to 7% and women’s from 5.7% to 6.7%
in the following years. In the Salvador and Belo Horizonte metropolitan
spaces, the unemployed presented the same representation as the employed,
but with concentrations about 1% higher in the entire period. On the other
hand, in Recife, the concentration of the unemployed from 2003 to 2007
rose from 2% to 3% in both genders.
4.4 Qualification level: years in school
As regards the qualification conditions between genders, severe gaps are
noticed between the North-Northeast and the South-Southeast regions caused
by differences in school enrollment and adult illiteracy, but also in access to
health, safe water and sanitation services, which reflect intensely on the cultural
environment and on the ability to seek modernization. These gaps result in
diversified possibilities of labor to
FIGURE 7
Brazilian labor force regional gender distribution according to years in school
(%)
7a - 0 to 1 year
30
25
20
15
10
5
M
W
M
Brazil
30
25
20
15
10
5
0
W
North
M
W
M
Northeast
W
M
Southest
W
South
M
W
West-Center
7 b - 1 to 3 y e a rs
M
W
Brazil
M
W
North
M
W
Northeast
M
W
Southest
M
W
South
M
W
West-Center
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
240
7c - 4 t o 7 y e a r s
50
40
30
20
10
0
M
W
M
W
M
North
Brazil
W
M
Northeast
W
M
W
M
South
Southest
W
West-Center
7d - 8 to 10 years
20
15
10
5
0
M
W
M
Brazil
W
M
W
M
Northeast
North
W
M
Southest
W
M
South
W
West-Center
7e - 11 years and more
40
30
20
10
0
M
W
M
Brazil
W
M
W
M
Northeast
North
W
M
Southest
1999
W
M
South
W
West-Center
2006
Source: IBGE/PNADS, 1999 and 2006.
Elaborated by the author.
M = Men; W = Women
FIGURE 8
Brazilian regional labor force distribution by gender* according to years in school
(%)
Northeast
Southeast
M
W
M
W
M
W
M
W
M
W
M
W
1999
13.6
13.2
13.3
12.7
26.6
22.2
7.8
9.5
7.4
8.7
11.2
11.5
2006
10.2
10.1
12.6
11.3
19.6
16.6
5.7
7.4
5.4
6.6
8.6
8.9
1999
19.4
17.2
21.7
17.8
26.7
23
15.8
14.6
15.4
14.8
19.9
15.4
2006
14.5
12.6
18.0
15.0
19.5
15.5
11.6
11.0
11.8
11.5
14.1
11.2
1999
34.5
34
31.9
32.4
26.7
29.4
37.2
35.1
41.1
39
36.7
35.6
2006
31.7
30.0
31.6
30.3
30.1
30.2
31.1
28.9
35.2
32.3
33.5
30.7
1999
14.7
14.9
15.3
17.1
9.1
10.4
17.5
16.8
16.8
16.4
14.6
16.1
2006
16.6
16.4
16.4
16.7
13.3
14.3
18.0
17.1
18.6
17.2
16.9
17.4
1999
17.5
20.4
17.4
19.7
10.6
14.8
21.5
23.8
18.8
20.6
17.3
21.0
2006
26.9
30.8
20.9
26.4
17.5
23.1
33.4
35.5
28.6
32.1
26.7
31.8
Years in school Period
0 to 1 year
1to 3 years
4 to 7 years
8 to 10 years
11years
Or more
Brazil
North
South
West-Center
Source: IBGE/PNADS, 1999 and 2006.
Elaborated by the author.
* M = Men; W = Women
adapt to the technological progress and an organizational modernization that
is brought about in enterprises, in order to compete in the world market. In this
sense, the most advanced regions reveal a more intense and faster growth in the more
industrialized and modern sectors, strongly impacting regional worker productivity.
Brazilian Labor Market Regional Patterns: an approach to gender divergences
241
The impact of Brazilian human capital investment (which is represented
by the “years in school” indicator) on these differences, in regard to activity and
unemployment rates, can be evaluated through the information in Figures 7
and 8 that show the regional distribution of the economically active population
according to gender.
The greatest concentrations of workers from the two genders, in all regions,
are found at the 4 the 7 years of school level (7c), which was about 34% in 1999
and 30% in 2006, with some higher rates for men. At this level, the highest
concentrations were in the Southeast and the South regions; however, in all the
regions, participation was practically the same between the genders.
It can be seen that at the level of up to 3 years of studies (7a and 7b), the
concentration of male workers, for both periods, is slightly higher in the North
and Northeast regions, and is more intense in the second region, In the south and
Southeast regions, women are more representative among the workers who have
up to 1 year of study (7a). This class of earnings concentrates a higher domestic
female work situations, which in most of the cases, has a craftsmanship character,
low qualification and it lower remuneration. At these levels, it is observed that
the concentration diminished from 1999 to 2006, in all regions and in both
genders, in contrast to an increase in the concentration in the levels for 8 years of
study and over (7d and 7e).
This shows that, overall, the average level of years in school has been
increasing, albeit at a very slowly speed, with a higher intensity in the Southeast
and the South, where the level for women has increased at a slightly higher rate.
The smallest concentrations of workers at higher school levels and the smallest
increases in concentration rates between the two periods are seen in the Northeast.
Among the workers with the highest level (7e), the concentration of women is
higher in all regions, which shows once again that the schooling level is not the
cause for female disadvantages in the work market, at a regional level either.
So, the Brazilian human capital endowment confirm only in part the
theoretical premises which stress that higher qualifications are responsible for
better (higher) women activity rates and unemployment rates (lower). In some
regions and in some school levels, women’s qualification are higher and grow
faster, however not always it is found the similar correspondence in activity or
unemployment rates.
4.5 Average real earnings
The earnings distribution of the Brazilian working population has recently
undergone some changes that are the result, on one hand, of the new
requirements demanded for labor hiring, through the present production and
242
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
organizational processes. On the other hand, the economic conjuncture policies
aiming at stabilization limit the opportunities for new jobs in the formal
labor market. The impact of these changes was shown in the composition of
average earnings, inside and outside the firms. It is evident that these changes
were accompanied by differentiated worker remunerations standards, which
reconcile several determinants. Among these, there is the need for specific
qualifications to take on new occupations or labor functions, the restriction in
the offer of working positions by firms, and the increase in the labor force offer
at several different levels of qualification.
Nevertheless in Brazil, the distribution of worker earnings has also undergone
considerable influences in the informal or self-employed labor market sector,
which has increased steadily as of the nineties. On the other hand, it is also due
to the conjuncture public policies directed at economic stabilization, which have
limited the opportunities for opening new positions of formalized jobs.
It is clear that these changes were accompanied by different patterns of worker
remunerations, which try to reconcile several determinants, such as the need for
specific qualifications for some new occupations, the conjuncture restrictions in
offers for work positions and the increase in labor offers with different degrees
of qualification, as already mentioned. On the other hand, the pace of economic
modernization, as well as that of the introduction of new functions and occupations
in companies or in autonomous work, is often upset by the specific conditions
of labor force qualification, not always prepared to take over more flexible terms of
operationalization or more sophisticated tasks, as already pointed out.
Based on these observations, the question that arose is if the processes of
production modernization and economic stabilization that occurred in Brazil, at
a quicker pace in the nineties, had the redistribution of labor remunerations as a
liquid effect. This proved favorable to larger concentration or dispersion indexes.
Then, it questioned the shape of this redistribution, manifested inside firms and
also for all workers, in several Brazilian regions, which show considerably different
socioeconomic situations.
Figures 9 to 14 show the regional differences of real average earnings between
the genders, which show that higher female disadvantages were found in all
regions, just as in the country as a whole. These remuneration differences surpass
those found in the activity rates, level of unemployment and school level. First,
Figure 9 portrays the average incomes gained by the two genders for a period from
1996 to 2006, regionalized from a Great Regions approach. It is observed that the
regional hierarchy of earnings remained unchanged in the period for both genders.
The Southeast shows the best situation, followed by the South, the West-Center,
and the Urban North, whereas the Northeast shows the lowest level.
Brazilian Labor Market Regional Patterns: an approach to gender divergences
243
A decrease in the average regional remunerations was observed for men,
from 1998 to 2003, followed by a gradual rise up until 2006. The situation
among women remained practically unchanged from 1996 to 2002, with a slight
decrease in 2003 and a gradual rise until 2006. This behavior was seen in almost
all regions, except in the Northeast, where a gradual rise of women’s incomes was
observed since the beginning of the period.
FIGURE 9
Brazilian regional average earnings according to gender
1200
1000
800
600
400
200
0
1996 1997 1998 1999 2001 2002 2003 2004 2005 2006
1996 1997 1998 1999 2001 2002 2003 2004 2005 2006
Women
Men
Brazil
Urban North
Northeast
Southeast
South
West-Center
Source: IBGE-PNADs.
Elaborated by the author.
FIGURE 10
Brazilian regional gender earnings index (RGEI)
0,7
0,6
0,5
0,4
0,3
0,2
0,1
0
1996
1997
1998
1999
2001
2002
2003
2004
2005
Brasil
Urban North
Northeast
Southeast
South
West-Center
Source: IBGE-PNADs.
Elaborated by the author.
2006
244
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
The earnings differences between the genders are better explained by the
Regional Gender Earnings Index (RGEI) that is given by the relation between
women average earnings and men average earnings. As it is seen in Figure RGEI
were very considerable in all the regions for the whole period, but have gradually
diminished. In the beginning of the period, women earned about 40% of
the male gains, and this rate was about 53% to 56% in almost all the regions
in the last year. This reduction was particularly more intense in the Northeast,
showing a ratio of 64% of gains for women in relation to men. Nevertheless, on
the other hand, the rates for this region are less unfavorable, due to the fact that
average earnings are much lower in comparison to other regions.
It was observed that in regard to real average gains of all Brazilian workers,1
men showed a differential of 40% and 30% above this average, respectively in 1999
and 2006, whereas the differences in women’s earnings had been negative by about
37% and 28% in the two periods. However from the regional point of view, there
are significant disparities, because in the Southeast, South and West-Center regions,
men gained respectively about 73%, 61% and 53% above the Brazilian average in
1999, showing a trend in 2006 to convergence toward the average. The Southeast
region earnings converged by about 16% and the other two regions by over 10%.
On the other hand, the Northeast showed about 25% negative differentials for men
(Figures 11 and 12).
The real average earnings differences (RGD and RDQ) are calculated by :
RGD = (RDQ – 1) and RDQ = (Eij / EiB),
where RDQ = (Eij / EiB) ; E = earnings; i = gender; j = region; B = Brazil.
Among women, the differences in relation to the total Brazilian average
earnings had been always negative in all the regions and these differentials had
diminished in 2006. As for the three previously mentioned regions, where the
male disparities were higher, the female differences were smaller, about 22% to
34% in 1999 and 14% to 19% in 2006. It is also in the Northeast that women
show the highest negative divergences in earnings, about 60% and 50%
respectively in the two periods. Figure 12 and 13 present these differences for a
more complete series of years and Figure 13 shows the Regional Differentiation
Quotients (RDQ). The data for both figures was based on the Brazilian average
real labor earnings, and they show the same previously described profile for
this entire longer period.
1. The real average gains of the whole Brazilian workers in 2006 “Reais” were R$ 359 and R$ 587 respectively in 1999
and 2006, and the gender ones were R$502 and R$ 764 for men and R$ 227 and R$ 423 for women in these two periods.
Brazilian Labor Market Regional Patterns: an approach to gender divergences
245
FIGURE 11
Brazilian regional gender average earnings differences (RGD)
1
0,5
0
-0,5
1
1999 Men
2006 Men
1999 Women
2006 Women
Brazil
0,40
0,30
North*
0,07
-0,09
Northeast
-0,24
-0,26
Southeat
0,73
0,61
South
0,61
0,55
West-Center
0,53
0,47
-0,37
-0,48
-0,62
-0,22
-0,30
-0,34
-0,28
-0,50
-0,52
-0,14
-0,17
-0,19
Source: IBGE-PNADs, 1999 and 2006.
Elaborated by the author.
* Urban North in 1999.
FIGURE 12
Brazilian regional gender average earnings quotients (RDQ)
1
0,8
0,6
0,4
0,2
1996 1997 1998 1999 2001 2002 2003 2004 2005 2006
0
-0,2
-0,4
1996 1997 1998 1999 2001 2002 2003 2004 2005 2006
-0,6
-0,8
Men
North*
Northeast
Southeast
South
Women
West-Center
Source: IBGE-PNADs 1996 to 2006.
Elaborated by the author.
* Urban North, from 1996 to 2002.
FIGURE 13
Average earnings Regional Differential Quotient (RDQ), according to Brazilian average,
by gender - 1999-2006
Brazil*
Urban North**
Northeast
Southeast
South
West-Center
M
W
M
W
M
W
M
W
M
W
M
W
1996
1.43
0.60
1.11
0.53
0.76
0.34
1.81
0.74
1.61
0.65
1.50
0.61
1997
1.43
0.60
1.13
0.49
0.75
0.35
1.81
0.75
1.59
0.64
1.57
0.64
1998
1.42
0.61
1.08
0.50
0.77
0.36
1.78
0.76
1.59
0.66
1.55
0.68
1999
1.39
0.60
1.07
0.49
0.76
0.36
1.73
0.73
1.61
0.66
1.53
0.63
2001
1.32
0.63
1.04
0.47
0.72
0.37
1.63
0.79
1.52
0.71
1.48
0.67
2002
1.35
0.65
1.05
0.50
0.74
0.39
1.68
0.79
1.54
0.72
1.58
0.72
2003
1.25
0.61
0.91
0.46
0.68
0.37
1.54
0.74
1.52
0.70
1.39
0.67
2004
1.37
0.64
1.09
0.51
0.76
0.40
1.65
0.75
1.69
0.74
1.61
0.72
2005
1.40
0.69
1.10
0.54
0.77
0.43
1.70
0.82
1.68
0.79
1.60
0.78
2006
1.41
0.76
1.09
0.59
0.80
0.50
1.73
0.90
1.67
0.88
1.58
0.85
Source: IBGE-PNADs.
Elaborated by the author.
*Brazilian global earnings average (M+W) = 1.
**Urban North in 1999.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
246
FIGURE 14
Average earnings Regional Differential Quotient (RDQ) according to gender average
1999-2006
Brazil*
Urban North**
Northeast
Southeast
South
West-Center
M
W
M
W
M
W
M
W
M
W
M
W
1996
1.00
1.00
0.77
0.89
0.53
0.58
1.27
1.25
1.13
1.09
1.05
1.02
1997
1.00
1.00
0.79
0.82
0.53
0.58
1.27
1.25
1.11
1.07
1.09
1.08
1998
1.00
1.00
0.76
0.81
0.54
0.59
1.25
1.23
1.12
1.08
1.10
1.11
1999
1.00
1.00
0.76
0.81
0.55
0.60
1.24
1.23
1.15
1.10
1.10
1.04
2001
1.00
1.00
0.79
0.74
0.54
0.59
1.24
1.24
1.15
1.12
1.13
1.05
2002
1.00
1.00
0.78
0.78
0.55
0.61
1.24
1.22
1.14
1.11
1.16
1.11
2003
1.00
1.00
0.73
0.76
0.54
0.60
1.23
1.22
1.22
1.15
1.12
1.10
2004
1.00
1.00
0.79
0.79
0.56
0.63
1.20
1.18
1.23
1.17
1.17
1.12
2005
1.00
1.00
0.79
0.78
0.55
0.62
1.22
1.19
1.21
1.15
1.14
1.12
2006
1.00
1.00
0.77
0.78
0.57
0.65
1.23
1.18
1.18
1.15
1.12
1.11
Source: IBGE-PNADs.
Elaborated by the author.
* Brazilian gender average = 1.
** Urban North in 1999.
Figure 14 presents the Regional Differentiation Quotients based on the
Brazilian average earnings for each gender in each year. It can be seen that
this approach confirms the highest advantages for the Southeastern region,
where men also showed positive differences of about 20% to 27% above the
total gender average in each year. As for women, positive quotients were also
shown, but there was a gradual loss in the period, from 25% for 18% above
the gender average. As in the previous analyses, this approach showed that the
Northeast had the worst earnings and that workers had gained about 43% to
47%, women about 40% to 42% less, in relation their respective gender, less
than the country’s in relation to men.
The greatest disadvantages, in this period, for the workers of both
genders were seen in the Urban North space. They earned from 21% to 27%
less than the average for men and 11% to 26% for women. The South and
West-Center regions are ranked at an intermediate earnings level and also
show positive quotients, although lower than those for the Southeast, in
relation to each gender average.
In short, the regional analysis of labor market condition differences between
genders shows that the disadvantageous situation of women exists in all the regions
and periods. However, among the regions, the disparities are even greater, with
more sizable advantages in the Southeast, South and West-Center respectively,
and disadvantages in the Northeast.
Brazilian Labor Market Regional Patterns: an approach to gender divergences
247
Another explanation about earnings and other condition differences among
individuals derive from the theories that analyze the labor market segmentation
internally to the firms. The distinct branches of these theories try to explain the
existing differences in the kinds of jobs inside companies, starting from diverse
recruitment criteria selection and training on one side, and on the other, from several
forms of work and career promotion linked to specific salary levels (Gordon, Reich
& Edwards, 1973; Doeringer and Worsen, 1971; Vietorisz & Harrison, 1973).
A former investigation on Brazilian occupational segmentation confirm these
theoretical ideas, from the different gender earnings results among workers inside
and outside the firms, and also among production and beaurocratic occupations, at
the so called Primary and Secondary markets inside the firms (Kon, 1995).
5 PUBLIC POLICY REQUISITES FOR EQUALITY IN BRAZIL
Although Brazilian women, in recent decades, have increased their participation
in the labor market, as has already been occurring historically in more developed
countries, the country’s economic difficulties witnessed in the 1980’s and the 1990’s,
had a particular effect on the job offer and on female occupation. The increase in
the female labor market participation, in moments of economic crisis, is mostly
explained by the need to supplement family income, more than it is a historical
trend for social and economic modernization.
In what refers to gender disparities, the Brazilian historical information
shows that female unemployment rates are higher than those for male, as we
could see from the former section, and did not become so much better after
the introduction of special public policies beginning in the 1990’s. Segregation,
discrimination and informality patterns can be observed with regard to Brazilian
labor market gender relations, which can be influenced, on one hand, by a series
of cultural questions, and, on the other hand, by the lack of specific public
policies, designed to improve the conditions for absorbing women through
training programs or anti-discriminatory policies. The public policies directed at
reducing disparities and integrating women more effectively in the labor market
have been more intensively discussed in the country since the 1990’s, and gender
institutional elements are gradually occupying government debates, albeit still in
an incipient form (Kon, 2007).
This is due in part because in Brazil, the traditional surpassed vision still greatly
predominates, ascribing to men the role of exclusive family supplier and to women
the role of house care and labor force creation and maintenance, and also secondary
labor force. However, recently women participation in labor market is increasing,
as already seen, not because the traditional thought has been already overcome, but
much more intensively due to necessity to complement familiar income. In fact,
248
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
some data show that women are gradually but increasingly assuming the role of
family head, even when the family is composed by a couple and relation between
poverty and it is directly related to the dimension of the country’s poverty, and to
the difficulties in increasing economic development (Kon, 2007: 95).
It was seen that in the beginning of the 1990’s, that women represented
around 25% of the family heads, while in 2005 they reach 37%. In what refers
to the participation on labor market, around 80% of the family head men
were working, while only 50% of the women had some economic occupation
(Kon, 2007: p.96) So, as the family head condition of women had grow, their
unemployment rates had also increase, what had unfavorably blocked further
improvement in the country’s poverty decrease policies, also due to the high
earnings disparities, as we could see in the former section.
On the other hand, Brazilian protection mechanisms that had been legally
instituted (as in the case of maternity protection in the labor market and children’s
care by establishing day-care centers in companies), to a large extent, however,
are showing negative impacts on women’s absorption in the labor market, due to
the prospect of higher costs to employers. The existing institutional instruments
do not take in account the macro-, meso- and microeconomic integration among
government spheres, that is, the transversal relationship of gender dimensions
in the labor policies of several economic areas and sectors. As pointed out by
the ILO (2006), a decisive element that leads to this transversal relationship in
gender dimensions is to recognize women as basic objects of these policies.
At a macroeconomic level, these instruments refer to public policies aiming
to impact the more aggregated levels of product generation, employment increase
and prices equilibrium, in what refers to the whole country’s economic system.
The so called mesoeconomic instruments deal with institutions which articulate
the relations among social and economic sectors, families and the markets, in
order to coordinate social and economic rules and laws that supervise their
behavior and performance. Examples of this kind of institutions are the labor
legislation and the labor control organizations, as well as workers and enterprises
unions, among others. On the other hand the microeconomic level deals with
firms and workers relations, as well as with instruments of human capital creation
and firm’s capacities increase.
From this point of view, the public policies instruments which are neutral
in what refers to gender dimension, show a great trend to cause disadvantages to
women labor force, as it is seen in former investigations, due to discrimination
factors already mentioned. As stressed by ILO, a decisive element that takes to
this transversal relationship on the gender dimensions is to recognize women as
basic objects of these policies.
Brazilian Labor Market Regional Patterns: an approach to gender divergences
249
As pointed out by Bandeira (2005), poverty weakens female citizenship
and hinders the possibilities of women to assume effective labor actions and to
absorb institutional policies and legal interferences, in order to modify their
condition. In addition, it also diminishes the possibilities of breaking the intergenerational cycle of poverty. In Brazil, as in other Third World countries, the
increase in women’s productive capacity would be a relevant factor to break this
cycle, considering the fact that, according to some researches, when women
present family gains, the effect on the family’s well-being is very wide-ranging,
because a considerable ratio of the earnings is invested in food, education
and children’s health expenses. In an environment of collective bargaining
discussions, which begin to be more accepted, the specific problems of female
workers still remain out of focus. It has also been that, on the whole, women
practically do not participate in the negotiation process. In addition, the
administrative and legal mechanisms of implementation supervision, as refers
to women protection instruments in the labor market, are insufficient, and
when they do exist, they are inefficient.
As stressed by some specialists in the field, in order for policies and programs
to be able to promote equal opportunities, the awareness of the difficulties involved
must be incorporated in its formularization and execution process transversally,
across all planning phases, in such a way that the programs are not strange to
gender issues and that they consider the specific characteristics and conditions
that women live in the labor market.
The articulation among several institutions, such as ministries, public
and private departments and others, requires the creation of an organizational
infrastructure to render the public policies measures effective, through constant
monitoring, evaluating and improving action programs. Moreover, the difficulty
in finding a common understanding and language to facilitate micro-, meso- and
macroeconomic integration is one of the main hurdles that are even greater than
the insufficiency endowment of financial funds.
a) policies directed at influencing wages, the most frequently adopted
policies of which aim at raising wages in sectors where the female participation
predominates, in order to be compared with other sectors where the male
is predominant, and where work values are comparable; b) policies that
try to modify the employer’s behavior in regard to hiring and promotion
procedures; c) policies more directed at workers than at employers which aim
at educational training and other programs; d) programs providing subsidies
for childcare, affecting the familial decision of the woman to enter into the
labor force; e) policies that specifically aim at the integration between genders
as the desired result.
250
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
In this sense, some basic lines of government action are recommended to develop a
strategy in the field of gender employment, besides general economic development
policies. Some lines of action are directed to promote entrepreneurship, addressed to
specific sectors (mesoeconomics). These policies aiming equal opportunities, by tackling
gender gaps, must allow the reconciliation of work and family life for both genders.
Others policies designed to influence the pattern of employer hiring and
promotion can be laid down by legal restrictions, which determine a minimum
obligatory rate of hiring a certain gender (generally female), in the same way that
policies for discrimination of race other minorities are laid down. In some sectors,
a vacancy can occur in some ranks, when it is not possible to find a satisfactory
number of qualified people offered to fill them. The results, therefore, depend on
the relative offer of workers of each gender for these specific ranks.
The educational and training policies aim at providing the target labor
force (to a great extent female) with the means to assume the types of ranks
offered. This fact does not necessarily mean the guarantee of labor attainment,
in view of other requirements demanded by employers for hiring and
promoting. Other policy measures could include the granting of subsidies or
exemptions to employers who present proven efforts to integrate women and
seek wage equality.
Some policies that influence the decision of women regarding the intensity
of their participation in the labor force and that, therefore, affect segregation, as
already seen, are related to the availability of childcare conditions, either through
day-care centers in the workplace, or to the availability of this kind of cheap and
good quality service outside the firms. Maternity licenses and flexible working
hours are also influential policies, even though the resulting changes in the degree
of segregation have not proved significant with these measures, since the trend
is for women to target mainly the predominantly female ranks of work, thus
increasing segregation.
Another important issue, pointed out by the former data, is related to the
fact that although the educational levels between genders are equivalent and many
times are higher for women, in general, this condition did not improve the female
situation of job disadvantage, and, in informal work, and the segmentation is
more pronounced in occupations reserved for women, where the wage levels
are lower. In Brazil, there exist no public “vocational” programs aiming at
allowing women to diversify their occupational options in jobs where they have
traditionally been little represented. The differences in gender remuneration
remain high even for “jobs of equal value,” and are even greater during moments
of economic stabilization crises.
Brazilian Labor Market Regional Patterns: an approach to gender divergences
251
Therefore, if the gender inequalities in the country had acted as obstacles
for balanced development, as pointed out by Jasmine (1999), the integration of
the gender dimension into the public policies would have to occur in the sense
of formulating new articulations between the formal and informal spaces of work
and leisure, between the productive and reproductive economy, and also between
the domestic and the public spheres.
Important challenges must be established for strategic policies that lead to
economic development, through the promotion of the equality between genders.
So, the institutional, social and economic measures and also global policies must
assume specific gender complement devices for the creation of local instruments
and measures, which are differentiated and specific to the particular conditions
of the country’s each region and to the local characteristics of the population and
labor force, including the cultural, social and economic aspects.
In short, it should be observed that the effective participation of women
in equal conditions in the country’s labor market does not depend exclusively
on the recognition of the need of a positive female labor force incorporation,
which is expressed in official documents, but also depends on the change of social
standards and on the population’s mentality, in the sense of demanding the real
implementation of support instruments.
Moreover, as Beneria recommends, (1995: p. 51) the micro-, meso- and
macroeconomic policies, are not neutral in regard to gender and can have a
bias, requiring measured compensatory. Paraphrasing the World Bank, the
equal opportunities between genders in the labor market is a central subject of
development, and more than this, it is exactly the objective in itself.
6 CONCLUSIONS
The Brazilian labor market regional distribution analysis according to
gender shows considerable disparities in work opportunities, which lead to
disadvantages to women and which compromise the country’s future economic
growth, making it less sustainable. On one hand, the women’s labor force is
not used to the extent of its broad possibilities to create the necessary social
capital to apply dynamics to economic development, which affects the ability
of the countries to attain more significant results. On the other hand, a greater
number of women are increasing their role as family heads and the lack of
favorable labor opportunities hinders the reduction of poverty levels. In a
regional approach, these disadvantages are much more pronounced, due to
the many social, cultural and economic specificities of each Brazilian space
requiring different regional public policies.
252
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
It is necessary to point out that the inequalities between genders in the
Brazilian labor market renders difficult the development as a whole, therefore
despite these inequalities have more direct negative impacts on feminine
population. The implied total costs are reflected in the country’s production,
consumption and investments as a whole, what rises the costs for population
well-being, diminishing the capacity of efficient management that would conduct
to poverty reduction and consequently to sustainable growth.
In regard to gender, as already known, a constant trend to increase the rates
of women’s participation in the labor market has been observed. However, in a
way different from what occurs in more advanced countries, regarding Brazil,
this increase is due only partly to cultural, demographic and economic changes
directed at social modernization and economic development, because women’s
participation in the labor market, even in periods of socioeconomic crises, has
been increasing as a consequence of the need to supplement (or as the only source
of ) family remuneration.
In any case, the diverse conditions between the genders, in regard to family
and professional responsibilities, rigid work schedules, and stricter demands of
skills for men, among others, show that women’s work doesn’t depend only on
market demand, but also on a series of other interconnected factors. These factors
frequently lead to the allocation of workers in informal activities that allow easier
articulation, but that are unstable in character and have lower remuneration.
More effective public policies aiming to a larger engagement of the feminine
population in labor force are not present, or many times are badly enunciated
and cause contrary effects, discouraging enterprises to hire women, because they
result in a larger cost/benefit relation.
Conjuncture situations also had repercussions on different results and intensities
in several different socioeconomic realities. Macro-, meso- and microeconomic
policies aiming at economic stabilization, or encouraging the development of
specific sectors, had different effects between the genders in each region, according
to the possibility for a structural and conjuncture response to these incentives. More
effective public policies aiming at the greater engagement of the female population
in a more protected labor force were not significantly present, or many were badly
stated and caused contrary effects, discouraging the enterprises from hire women,
because they entail a larger cost/benefit ratio (Kon, 2007).
Brazilian Labor Market Regional Patterns: an approach to gender divergences
253
For Brazil as for other developing countries, some basic lines of government
action are recommended to develop a strategy in the field of gender employment,
besides general economic development policies. The first line of action is directed
at some policies to promote entrepreneurship, addressing specific sectors that
create new jobs, and promote less substitution of labor by capital, stressing the need
to increase women’s participation. Second, the improvement of “employability”
through training and improvement of human capital policies, as well as through
measures favoring the young and self-employment, should not to be indifferent
to gender inequalities. Next, the adaptation of employment opportunities
according to new forms of hiring, the reorganization of working time, layoff
measures directed at decreasing women’s disadvantages, are all important. Finally,
policies must be adopted to foster equal opportunities, by tackling gender gaps,
and promoting the reconciliation of work and family life.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
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CAPACIDADE AMBIENTAL E EMULAÇÃO DE POLÍTICAS
PÚBLICAS: O CASO DA RESPONSABILIDADE PÓS-CONSUMO
PARA RESÍDUOS DE PILHAS E BATERIAS NO BRASIL
Bruno Milanez*
Ton Bührs**
A partir do exemplo das Resoluções do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) nos 257/1999
e 401/2008 para resíduos de pilhas e baterias como uma aplicação do princípio da Responsabilidade
Pós-Consumo (RPC), neste artigo é discutida a prática brasileira de emular instrumentos e políticas
desenvolvidos por países com capacidade ambiental diferente daquela encontrada no Brasil.
A primeira parte do texto apresenta o conceito de capacidade ambiental e da RPC. A segunda parte
descreve o contexto institucional no qual as resoluções foram criadas e avalia o ciclo político destas.
Por fim, tecem-se alguns comentários sobre as normas e defende-se o argumento da necessidade de
coerência entre instrumentos de política pública e capacidade ambiental.
Palavras-chave: Responsabilidade Pós-Consumo; Resíduos Sólidos Urbanos; Emulação de Políticas
Públicas.
ENVIRONMENTAL CAPACITY AND PUBLIC POLICY EMULATION: THE CASE OF
EXTENDED PRODUCER RESPONSIBILITY FOR BATTERY WASTE IN BRAZIL
Using Conama Resolutions numbers 257/1999 and 401/2008 for battery waste as an example
of Extended Producer Responsibility (EPR), we discuss the Brazilian practice of emulating foreign
policies and instruments developed by countries which have higher environmental capacity. In this
text, we firstly present the concepts of environmental capacity and EPR. Afterwards, we describe
the institutional context in which the resolutions have been designed and evaluate their policy
cycle. Finally, we comment on these norms and argue for coherence between policy instruments
and environmental capacity.
Key words: Extended Producer Responsibility; Urban Solid Waste; Policy Emulation.
CAPACIDAD AMBIENTAL Y LA EMULACIÓN DE POLÍTICAS PÚBLICAS: EL CASO
DE LA RESPONSABILIDAD EXTENDIDA DEL PRODUCTOR PARA RESIDUOS DE
PILAS Y BATERÍAS EN EL BRASIL
A partir del caso de las Resoluciones Conama 257/1999 y 401/2008 para residuos de pilas y
baterías como una aplicación del principio de Responsabilidad Extendida del Productor (REP), este
artículo discute la práctica brasilera de emular instrumentos y políticas desarrollados por países
con capacidad ambiental distinta a la que se encuentra en el Brasil. La primera parte del texto
presenta el concepto de capacidad ambiental y el de REP. La segunda parte describe el contexto
* Técnico de Planejamento e Pesquisa do Ipea. E-mail: [email protected]
** Bacharel em Ciências Sociais e Políticas, mestre em Ciências Sociais e Políticas, doutor em Ciência Política, senior
lecturer na Lincoln University. E-mail: [email protected]
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
258
institucional en el que las resoluciones fueron creadas y evalúa el ciclo político de las mismas.
Finalmente, se realizan algunos comentarios sobre las normas y se defiende el argumento de la
necesidad de coherencia entre instrumentos de política pública y capacidad ambiental.
Palabras-clave: Responsabilidad Extendida del Productor; Residuos Sólidos Urbanos; Emulación
de Políticas Públicas.
CAPACITE ENVIRONNEMENTALE ET EMULATION DE POLITIQUES PUBLIQUES:
LE CAS DE LA RESPONSABILITE ELARGIE DES PRODUCTEURS POUR RESIDUS
DE PILES ET DE BATTERIES AU BRESIL
À partir de l’exemple des Résolutions Conama 257/1999 et 401/2008 qui traite de résidus de piles
et de batteries comme une application de la Responsabilité Elargie des Producteurs (REP), dans
cet article on discute la pratique très répondu au Brésil qui est celle de copier des instruments et
des politiques développés par d’autres pays avec une capacité environnementale différencie par
rapport a celle trouvée au Brésil. La première partie du texte présente le concept de la capacité
environnementale et celle de la REP. En suite, il est décrit le contexte institutionnel dans lequel
les résolutions ont été créées et il est évalué le cycle politique de ces Résolutions. Finalement, on
présente une analyse des commentaires sur les normes en défendant l’argument de la nécessité de
cohérence entre les instruments de politique publique et la capacité environnementale.
Mots-clés: Responsabilite Elargie des Producteurs; Residus Solides Urbains; Emulation de Politiques Publiques.
1 INTRODUÇÃO
Neste artigo, discutem-se as Resoluções do Conselho Nacional de Meio Ambiente
(Conama) para resíduos de pilhas e baterias. Este consiste em um desdobramento
de uma pesquisa iniciada em 2002, que busca, a partir de leitura crítica do conceito
de modernização ecológica, discutir até que ponto a legislação ambiental brasileira consegue induzir empresas a adotarem novas tecnologias ambientalmente mais
adequadas (MILANEZ; BÜHRS, 2007, 2008). Esta pesquisa vem trabalhando,
inicialmente, com temas referentes à legislação de resíduos sólidos, em particular
aqueles referentes à Responsabilidade Pós-Consumo (RPC) (MILANEZ; BÜHRS,
2009). Aqui, busca-se debater sobre as limitações de se emular paradigmas ou políticas de outros países sem adequar a capacidade ambiental do Brasil. Como estratégia alternativa, sugere-se o desenvolvimento de instrumentos mais coerentes com o
contexto e a realidade das agências ambientais brasileiras.
A pesquisa foi construída principalmente a partir de consulta a dados armazenados nos arquivos do Conama, em Brasília, bem como a informações disponíveis no site do conselho. Entre estes documentos estão relatórios apresentados por
partes interessadas, atas e transcrições de reuniões. Essas informações foram complementadas por meio de algumas entrevistas com conselheiros e representantes
de grupos de interesse. Por motivos de confidencialidade, e conforme acordado
com os entrevistados, seus nomes não são divulgados, e as informações obtidas
Capacidade Ambiental e Emulação de Políticas Públicas...
259
são identificadas por códigos: utiliza-se GOV para representantes do governo,
IND para representantes das empresas e ONG para representantes de organizações não governamentais e movimentos sociais.
Além desta introdução, o artigo possui três seções principais. A seção 2
apresenta os elementos teóricos: inicialmente esta descreve o conceito de capacidade ambiental e, em seguida, relata a situação que deu origem ao princípio
da RPC, bem como suas principais ideias e pressupostos. A seção 3, primeiramente, comenta sobre o contexto que deu origem às resoluções do Conama para
resíduos: esta descreve o sistema de funcionamento do conselho e a iniciativa do
Conama em produzir uma Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) para
o Brasil. A segunda parte desta seção combina uma perspectiva histórica com
a teoria do ciclo de políticas públicas (cf. FREY, 2000). Dessa forma, a definição
do problema remonta à expansão do consumo de telefones celulares e laptops no
Brasil e ao respectivo aumento do descarte de baterias recarregáveis com resíduos
sólidos urbanos em meados da década de 1990; a elaboração do estatuto foca no
processo de construção da Resolução no 257/1999; a implementação e o monitoramento discutem os impactos causados por esta resolução e a revisão avalia a sua
substituição pela Resolução no 401/2008. A seção 3 confronta aspectos teóricos
com as informações empíricas coletadas e defende a hipótese de que a emulação de instrumentos e políticas públicas de outros países não parece ser capaz
de compensar a limitada capacidade ambiental do Brasil. Em contraposição,
argumenta que o setor ambiental deve primeiro desenvolver sua capacidade de
identificar e resolver problemas para então adotar iniciativas desenvolvidas em
outros países, e alternativamente sugere que agências ambientais optem por criar
e implementar políticas e instrumentos mais coerentes com o contexto nacional.
2 REFERENCIAL TEÓRICO
Desde o início da década de 1990, discute-se a PNRS para o Brasil. Uma das
principais diretrizes desta política é a RPC, que torna os fabricantes responsáveis
pelos impactos ambientais dos produtos nos diversos estágios de seu ciclo de vida.
Entretanto, a RPC foi elaborada e implementada em países que possuíam elevada capacidade ambiental, situação bastante diferente da brasileira. Para melhor
entender estes conceitos, apresenta-se nesta seção a definição de capacidade ambiental; em seguida, discutem-se as características socioeconômicas que levaram
à criação da RPC e explicitam-se os pressupostos sobre os quais este conceito está
baseado. Como a aplicação da RPC se deu no país por meio de um arranjo institucional semelhante a um acordo entre governo e empresas, a seção se encerra
com algumas considerações teóricas sobre os elementos necessários para a obtenção de acordos mais efetivos.
260
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
2.1 O conceito de capacidade ambiental
O conceito de capacidade ambiental vem sendo usado dentro do campo das políticas públicas para o meio ambiente como um referencial de análise que tenta
explicar como sociedades criam habilidades para identificar e solucionar problemas ambientais (OECD, 1994 apud WEIDNER, 2002). Conforme será descrito
ao longo desta seção, este conceito possui atualmente um corpo teórico próprio,
embora ainda dialogue com teorias do desenvolvimento de capacidades, entendidas como o processo pelo qual organizações, instituições e sociedades criam habilidades para desenvolver funções, resolver problemas, definir e alcançar objetivos
(cf. SAGAR, 2000).
Para Martin Jänicke (1997), a capacidade ambiental não é formada a partir
de um único fator, um instrumento específico, um determinado ator, ou uma
instituição em particular; ao contrário, esta é construída por uma interação complexa de várias influências. Para tentar explicar o desenvolvimento da capacidade
ambiental, este autor propõe um modelo analítico que envolve três estruturas.
A estrutura cognitivo-informativa envolve, ao mesmo tempo, o conhecimento e
consciência ambiental da população, sua cultura e sistema de valores, bem como
a presença de uma comunidade científica representativa. Ao mesmo tempo, a
estrutura político-institucional relaciona-se com a abertura do processo político
à participação popular, com o grau de descentralização e com a capacidade de
integração das contribuições feitas nas diferentes esferas políticas. Por fim, a estrutura econômico-tecnológica diz respeito à disponibilidade de uma infraestrutura de
pesquisa científica e inovação tecnológica, bem como de recursos financeiros para
o financiamento desta pesquisa e para a realização dos investimentos necessários
à mudança de tecnologia.
Seguindo uma linha de argumentação semelhante, Weidner (2002) tenta
ilustrar como seria um país com elevada capacidade ambiental. Uma sociedade
que alcançasse este contexto teria grupos ambientalistas bem organizados e interligados por relações cooperativas interorganizacionais; um sistema de monitoramento e comunicação ambiental abrangente; uma elevada consciência ambiental
entre as elites políticas, a mídia e a população em geral; instituições governamentais bem equipadas, com pessoal suficiente para atender às demandas e integradas
a outros setores do governo por políticas de cooperação; uma estrutura industrial
moderna, inovativa e comprometida com as questões ambientais. Porém, o autor
mesmo afirma que tal cenário ainda não pode ser identificado no mundo real.
A literatura sobre capacidade ambiental sugere ainda quais aspectos devem
ser trabalhados pelas instituições públicas para tentar construir essa realidade.
Em primeiro lugar, esta destaca a importância de uma capacidade consensual, traduzida pela habilidade de alcançar soluções negociadas a partir de uma estrutura
Capacidade Ambiental e Emulação de Políticas Públicas...
261
política cooperativa. Em segundo lugar, esta alerta para a necessidade de uma
capacidade estratégica, que se refere à coordenação por um longo período de atividades administrativas amplas que tenham objetivos de longo prazo, independente de arranjos institucionais conjunturais. Por fim, esta também recomenda
a construção de uma capacidade inovativa, que envolve regulamentos legais, sistemas de informação e instituições de tomada de decisão que promovam a descoberta de novas soluções para lidar com os problemas ambientais (JÄNICKE,
1992; OECD, 1996a).
Apesar dessas receitas para se construir uma situação de capacidade ambiental adequada, as sociedades reais ainda estão bastante distantes desta situação.
Por exemplo, mesmo os estados mais ambientalmente progressistas da Europa
já foram convocados pela Corte de Justiça Europeia por não cumprirem alguma
diretiva da União Europeia. Entre as limitações identificadas nestes países havia
problemas com implementação, falta de vontade política, elevados custos para
o cumprimento da legislação e, mesmo, más decisões políticas (SCHREURS,
2004). Na América Latina e no Brasil, porém, o distanciamento entre teoria e
prática é ainda mais marcante.
Em uma análise sobre a América Latina, Kaimowitz (1996) afirma que, apesar de ter havido progresso nas políticas ambientais desenvolvidas na região, ações
mais substanciais têm sido limitadas devido a: i) dificuldades por parte de setores
governamentais em relacionar questões ambientais com problemas de justiça social; ii) grande influência sobre os governos de grupos que desenvolvem atividades
econômicas que destroem o meio ambiente; e iii) políticas econômicas que reforçam a elevada dependência de atividades intensivas em poluição e exploração dos
recursos naturais. Com relação a esse último ponto, Gligo (1997) destaca a divergência entre as políticas ambientais explícitas e as políticas ambientais implícitas.
Para o autor, o primeiro grupo se refere às políticas elaboradas pelos órgãos
ambientais, tais como ministérios, secretarias e conselhos do meio ambiente.
Ele ressalta que tais políticas têm como fragilidade serem, na maioria dos casos,
reativas a necessidades urgentes de minimizar impactos da expansão urbana, industrial ou da mudança do uso do solo. Porém, mais importantes do que estas, seriam as políticas ambientais implícitas, que têm origem nos setores mais próximos
aos líderes do executivo – presidentes, governadores ou prefeitos – e que, quase
sempre, têm por objetivo o crescimento econômico de curto prazo, resultando em
impactos negativos sobre o meio ambiente e a qualidade de vida da população.
Hochstetler (2002) apresentou uma análise específica da capacidade ambiental do Brasil. Para esta autora, a aplicação da legislação é o elo mais fraco do
ciclo das políticas ambientais, sendo esta limitação o fator que melhor explica
o hiato entre as normas ambientais e o baixo desempenho ambiental do país.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
262
Ela relaciona essa característica com a insuficiência de pessoal e de recursos
financeiros. Ainda afirma que a área ambiental é uma das que vivencia as mais
relevantes disputas políticas, uma vez que os oponentes da criação de uma capacidade ambiental efetiva não apenas são os atores mais poderosos do cenário
político do país, mas também veem nas ações de proteção ambiental ameaças
comuns às suas atividades, o que os une na tentativa de limitá-las.
Aparentemente, uma das estratégias utilizadas pelo setor ambiental brasileiro para tentar ampliar sua capacidade ambiental consiste na emulação de
políticas. Stone (2001) utiliza este termo para definir situações onde governos
“importam” ou “pegam emprestado”, normas, instrumentos ou políticas de
outros países. Entretanto, conforme discutido neste texto, quando existe uma
grande distância contextual e institucional entre o país emulador e o emulado,
tal processo tende a ser pouco eficaz.
2.2 O conceito da RPC
2.2.1 Origens
O conceito da RPC foi desenvolvido por alguns governos da Europa Ocidental no início da década de 1990 como uma tentativa de aplicar o Princípio
do Poluidor Pagador (PPP) aos resíduos sólidos urbanos. Criado na década de
1970, o PPP tinha como principal objetivo induzir indústrias poluidoras a internalizarem os custos sociais de sua poluição. Este princípio propunha que, uma
vez identificado o agente poluidor, diferentes instrumentos – por exemplo, taxas,
licenças e cotas de poluição – poderiam ser usados para que este arcasse com os
custos da prevenção ou remediação dos impactos ambientais.
Instrumentos baseados no PPP mostraram-se bastante eficazes em algumas
situações, mas ao longo do tempo, principalmente no final da década de 1980,
alguns formuladores de políticas perceberam suas limitações. Apesar de funcionar
em casos de poluição industrial, o PPP era inadequado para lidar com situações
onde o maior impacto ambiental ocorria durante ou após o consumo do produto.
Em casos como o uso de eletrodomésticos ou a disposição de resíduos, os poluidores eram dispersos e, individualmente, tinham pouca capacidade de reduzir
seus impactos ambientais.
Quem é o poluidor? Ele é sempre responsável? Se um motor de automóvel é ruidoso
e barulhento, não há dúvida que o poluidor é a pessoa que o utiliza, mas não se
pode argumentar que ele deve ser considerado diretamente responsável pelo impacto ambiental. (...) Neste caso, o consumidor é passivo, sem responsabilidade pela
poluição, uma vez que ele apenas usa um produto, sem capacidade de influenciar
suas características (ao menos individualmente). (...) Em outras palavras, o poluidor
nem sempre é responsável pela poluição que ele causa (OECD, 1975).
Capacidade Ambiental e Emulação de Políticas Públicas...
263
A questão dos resíduos sólidos urbanos ganhou mais destaque na Europa a
partir do início dos anos 1990, quando alguns países depararam-se com restrições
de locais para disposição de resíduos e altos custos de coleta e reciclagem destes
materiais. Como os paradigmas existentes não pareciam solucionar o problema,
novos conceitos foram propostos, entre estes a RPC.
Também colaborou para o surgimento da RPC o contexto político-econômico
daquele momento. Na década de 1980, muitos países europeus passaram por dificuldades financeiras, sendo os governos criticados por sua ineficiência. As propostas
então apresentadas pressionavam pela privatização de empresas públicas e pela desregulamentação do mercado. O paradigma da RPC também foi influenciado por
estas ideias, uma vez que propunha a diminuição da participação pública na gestão
dos resíduos e a transferência de algumas de suas responsabilidades para o setor
privado (LAUBER, 2000; LIEFFERINK; ANDERSEN; ENEVOLDSEN, 2000).
Dessa forma, o conceito da RPC surgiu não apenas pela motivação ambiental, mas
também devido ao momento econômico pelo qual passava a Europa Ocidental.
Ao longo da década de 1990, a RPC foi implantada em diversos países
europeus, para tratar de itens como embalagens, carros no fim de sua vida útil
e lixo eletrônico (MAYERS, 2007). Este paradigma obteve melhores resultados
em locais que apresentavam algumas características particulares, tais como: elevada capacidade ambiental dos órgãos públicos, movimentos sociais e associações
empresariais organizados e sólida infraestrutura de desenvolvimento tecnológico
(MILANEZ; BÜHRS, 2004). Sendo assim, tanto o momento ideológico quanto
as características contextuais contribuíram para o desenvolvimento da RPC.
2.2.2 Definições e pressupostos
O conceito da RPC é definido como “uma estratégia de política ambiental na qual
a responsabilidade do produtor é estendida até o estágio pós-consumo do ciclo de
vida do produto” (OECD, 2001, p. 9). Nesta seção, argumenta-se que políticas
desenhadas seguindo este preceito devem obedecer a três pressupostos principais:
i) os fabricantes devem assumir responsabilidade pelo impacto ambiental de seus
produtos; ii) novas soluções devem utilizar tecnologias preventivas; e iii) as empresas devem ser motivadas via instrumentos econômicos ou acordos voluntários,
discutidos em processos participativos.
A transferência da responsabilidade pelo impacto ambiental dos produtos para os fabricantes é a essência da RPC. Esta responsabilidade, que pode
ser legal, física ou econômica, aplica-se a todos os estágios do ciclo de vida
do produto (DAVIS, 2000). O foco nos fabricantes é devido ao fato de serem
eles os que decidem sobre as características dos produtos – forma, composição, matéria-prima etc. – e os que têm maior grau de influência sobre os
264
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
demais elementos da cadeia produtiva, isto é, fornecedores de matéria-prima,
atacadistas, varejistas e consumidores (OECD, 2001).
O segundo elemento da RPC é sua preocupação em motivar produtores a
adotar tecnologias preventivas. Isto é um desafio para os elaboradores de políticas
públicas, uma vez que muitas empresas ainda tendem a preferir soluções de “fim de
tubo” (GEHIN; ZWOLINSKI; BRISSAUD, 2008). O paradigma da RPC considera o projeto do produto como a etapa mais crítica para melhorar o desempenho
ambiental e, portanto, defende que os instrumentos utilizados devam induzir fabricantes a redesenhar seus produtos de forma a minimizar ou evitar os impactos
ambientais (DAVIS, 2000; OECD, 1996b; THORPE; KRUSZEWSKA, 1999).
Devido ao seu foco na prevenção e no projeto de produto, espera que a
RPC seja desenvolvida em contextos de elevada capacidade inovativa. Legislações
baseadas na RPC devem ser apoiadas por políticas públicas que apoiem a inovação tecnológica para permitir que as empresas alcancem as metas (BERKHOUT;
SMITH, 1999). Por exemplo, um dos aspectos que tornou possível a implantação do sistema de coleta de resíduos de embalagem pelos fabricantes na Alemanha
(Duales System Deutschland) foi a inovação nos sistemas de coleta e separação de
embalagens usadas (EICHSTÄDT; CARIUS; KRAEMER, 1999). Mais recentemente, a Diretiva Europeia 2000/53/EC para veículos em fim de vida útil motivou as montadoras a investirem em novos projetos para facilitar a desmontagem e
a reciclagem das peças dos carros (GERRARD; KANDLIKAR, 2007).
Por fim, a RPC opõe-se à definição tecnocrática das políticas ambientais
e defende a negociação com as partes interessadas. Além disso, propõe que tais
políticas sejam, preferencialmente, implantadas por intermédio de instrumentos
econômicos ou acordos voluntários (OECD, 1998a, 1998b, 2001). Embora a
escolha dos instrumentos econômicos para gestão de resíduos deva, em geral,
levar em consideração critério de precificação (MOTTA; SAYAGO, 1998), os
instrumentos econômicos mais comumente usados pela RPC são: sistemas de
coleta pelo produtor; padrões para incorporação de material reciclado; taxas para
disposição em aterros sanitários; impostos sobre matéria-prima virgem; e sistemas
de depósito e retorno (THORPE; KRUSZEWSKA, 1999). A questão dos acordos voluntários é discutida em mais detalhes na próxima subseção.
2.2.3 Como fazer um bom acordo com base na RPC?
Conforme mencionado anteriormente, políticas inspiradas na RPC podem ser
implementadas por meio de acordos entre governo e empresas. Para que sejam
efetivas, estas estratégias, porém, requerem algumas condições, tais como: definir
metas mensuráveis; especificar a responsabilidade de cada parte interessada; e estar articulados com outras iniciativas públicas.
Capacidade Ambiental e Emulação de Políticas Públicas...
265
O termo genérico acordo é usado nas políticas públicas para definir um grupo de contratos que estabelecem obrigações comuns a empresas ou setores. Este
é usado como um termo guarda-chuva para se referir a diferentes soluções que
podem variar, dependendo da natureza do compromisso, do processo de definição de metas e das ameaças/incentivos utilizados para encorajar a participação
(CUNNINGHAM; CLINCH, 2004).
Avaliações de experiências com acordos são geralmente positivas, embora
algumas limitações também sejam identificadas. As análises mais otimistas afirmam que os acordos permitem criar situações em que ambos os lados são beneficiados, uma vez que os grupos de interesse obteriam soluções melhores do
que se buscassem soluções individuais (HOLZINGER, 2000). Além disso, acordos podem aumentar o envolvimento e a aceitação das empresas, especialmente
em situações que possuem baixo apoio político (HOLZINGER, 2000; OECD,
1998a). Por fim, estes podem gerar soluções mais flexíveis, particularmente para
assuntos complexos (WHISTON; GLACHANT, 1996). Por outro lado, acordos
tendem a ignorar a opinião pública nos casos em que são negociados apenas pelas
empresas e poucos burocratas, sem abertura para contribuições de outras partes
interessadas (NEALE, 1997; OECD, 1999). Além de defender uma participação
mais ampla na definição de acordos, a literatura também faz algumas sugestões
práticas sobre como se fazer acordos mais efetivos.
Primeiramente, autores sugerem que acordos devem ser aplicados a poucas
companhias que se encontram em situações econômicas similares, pois espera-se
que os custos para cumprir os acordos sejam semelhantes para todas as empresas (CUNNINGHAM; CLINCH, 2004; GLASBERGEN, 1999; LÉVÊQUE,
1996). Em segundo lugar, é importante que as metas sejam específicas e quantitativas, ao invés de qualitativas. Além de definir o quê deve ser feito, as normas
devem também estabelecer quem faz o quê, bem como estabelecer as obrigações e
responsabilidades de cada parte envolvida (BIZER; JÜLICH, 1999; CUNNINGHAM; CLINCH, 2004; GLASBERGEN, 1999; NEUMAYER, 2000). Em
terceiro lugar, o monitoramento deve ser sistemático e regular, para evitar que empresas “peguem carona” nos esforços dos demais (CUNNINGHAM; CLINCH,
2004; GLASBERGEN, 1999; LÉVÊQUE, 1996; NEUMAYER, 2000). Por fim,
os tomadores de decisão devem manter em mente que os acordos são documentos
frágeis, que precisam ser acompanhados por políticas adicionais (GLASBERGEN,
1999).Do ponto de vista teórico, muitas dessas recomendações – metas claras,
sistemas de monitoramento e de incentivos, integração com outras políticas – parecem razoáveis e óbvias. Entretanto, como discutido no caso das resoluções para
resíduos de pilhas e baterias, nem todos estes elementos estão presentes nos acordos reais, levando a legislações fracas e pouco efetivas.
266
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
3 RPC NO BRASIL: O CASO DAS PILHAS E BATERIAS
Nesta seção, relata-se e analisa-se o processo de elaboração, implantação e revisão
das resoluções do Conama para resíduos de pilhas e baterias, como uma iniciativa
de se adotar a RPC no Brasil. A primeira parte apresenta a estrutura do conselho,
comenta sobre a participação dos diferentes grupos de interesse e, em seguida,
descreve o processo de negociação da PNRS no âmbito do Conama e do Congresso Nacional. A segunda parte combina uma perspectiva histórica com a teoria
do ciclo de políticas públicas, apresentando o processo de definição do problema,
elaboração, implantação, monitoramento e revisão das resoluções. Estas informações servem como base para a discussão das dificuldades e possíveis estratégias de
superação ao uso da RPC no Brasil, que serão abordadas na seção 4.
3.1 Algumas questões contextuais
3.1.1 O Conselho Nacional do Meio Ambiente
O Conama é divido em três níveis: Plenário, Câmaras Técnicas (CTs) e Grupos
de Trabalho (GTs). O Plenário é o nível de decisão do Conama e vota resoluções,
proposições, recomendações, moções e decisões. Abaixo do Plenário, existem dez
CTs, formadas por sete conselheiros cada; as CTs tratam de temas específicos –
assuntos internacionais, educação ambiental, controle e qualidade ambiental etc. –
e preparam as matérias que são submetidas à apreciação do Plenário. Quando
assuntos são considerados muito complexos, as CTs podem criar GTs ad hoc, por
um período específico. Uma vez concluídos os trabalhos dos GTs, seus relatórios
são enviados para avaliação pela respectiva CT e, posteriormente, para o Plenário.
Todas as reuniões do Conama são públicas, todavia, enquanto no Plenário e
nas CTs somente os conselheiros podem votar, nos GTs todos os presentes podem
influenciar a decisão. Sendo assim, os GTs são os fóruns que permitem a especialistas
e diferentes grupos de interesse influenciar diretamente as normas criadas pelo conselho. De forma geral, podem ser identificados cinco grupos dentro do Conama: governo federal, governos estaduais, governos municipais, movimentos sociais e empresas.
No período 2005-2006,1 o Conama tinha 40 representantes do governo federal,
27 representantes dos governos estaduais, oito representantes dos governos municipais,
22 representantes dos movimentos sociais, oito representantes das empresas – incluindo
associações da agricultura, indústria, do comércio e transporte –, e um conselheiro honorário. Além destes, ainda participavam, sem direito a voto, representantes do Ministério
1. O número total de conselheiros no Conama flutua ao longo do tempo, não apenas devido ao fato de o governo federal
ter direito a uma vaga por ministério ou secretaria – o que pode variar de um momento político para outro –, como também por nem sempre todas as vagas dos movimentos sociais e ONGs estarem preenchidas. Por questão de consistência,
a análise aqui apresentada foi feita para o período 2005-2006, com base no documento Presença de conselheiros
nas reuniões plenárias ordinárias e extraordinárias do Conama realizadas nos exercícios 2005 e 2006 (BRASIL, 2006).
Capacidade Ambiental e Emulação de Políticas Públicas...
267
Público Federal, Ministério Público Estadual e Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados (BRASIL, 2006). Embora a distribuição
de votos não seja considerada perfeitamente equilibrada, a influência no Conama parece
estar mais relacionada ao grau de envolvimento do que ao número de conselheiros.
O governo federal tem quase 40% dos votos no Plenário, mas seu poder no
Conama parece ser variável. Quando as resoluções afetam diretamente seus interesses, a Casa Civil mobiliza todos os ministérios e os orienta como devem votar
(GOV01; GOV03; ONG01).2 Por outro lado, quando a Casa Civil não toma
nenhuma iniciativa, os conselheiros do governo federal votam de acordo com seus
interesses setoriais e muitas vezes de forma inconsistente (ACSELRAD, 1995).
Outro problema identificado refere-se ao fato de os órgãos federais, com exceção das agências ambientais, não considerarem o Conama uma prioridade. Conforme apresentado no gráfico 1, no período analisado o governo federal enviou
conselheiros titulares a menos de 25% das reuniões; na realidade os ministérios
normalmente enviam conselheiros substitutos, que possuem menos peso político
e habilidade de negociação. Além disso, o governo federal troca de representantes
muito frequentemente (IND02; ONG01), o que não permite que os conselheiros
se familiarizem com o regimento interno, diminuindo sua capacidade de influenciar as votações. Sendo assim, apesar de possuir grande maioria dos votos, a capacidade do governo federal em direcionar as decisões do Conama é variável.
GRÁFICO 1
Presença dos conselheiros nas reuniões ordinárias e extraordinárias do Conama
entre 15/2/2005 e 12/4/2006
100.
80.
60.
40.
20.
0.
Governo federal
Governo estaduais
Ausente
Governo municipais
Substituto
ONGs
Empresas
Titular
Fonte: Brasil (2006).
2. Por motivos de confidencialidade, e conforme acordado com os entrevistados, seus nomes não são divulgados
e as informações obtidas são identificadas por códigos: utiliza-se GOV para representantes do governo, IND para
representantes das empresas e ONG para representantes de organizações não governamentais e movimentos sociais.
268
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
Assim com o governo federal, o grupo dos governos estaduais também têm
um baixo envolvimento com o Conama. Este é o grupo com maior número de ausências em termos relativos, o que sugere que raramente vote uma matéria de forma
decisiva. Além disso, seus representantes normalmente tomam decisões de acordo
com interesses regionais, o que os enfraquece como setor (ACSELRAD, 1995).
O grupo dos governos municipais é o que possui menos força dentro do
Conama. Sua influência é limitada não apenas pelo pequeno número de representantes, mas também pela limitada disponibilidade de técnicos para acompanhar as
reuniões. Apesar de ser o grupo com maior participação de titulares no Plenário,
raramente os municípios enviam técnicos para reuniões de GTs e CTs, conforme
mostrado na discussão sobre as resoluções sobre resíduos de pilhas e baterias.
Essa análise sugere que os três níveis de governo têm uma participação limitada nas decisões do Conama. Isto poderia ser uma oportunidade para que os
movimentos sociais – o terceiro maior grupo dentro do Conama – tomassem a
liderança do conselho; entretanto isso não parece acontecer. Os representantes
das organizações não governamentais (ONGs), com algumas exceções, não são
suficientemente preparados para participar de forma efetiva do Conama, e apenas
poucas entidades têm suficiente apoio técnico ou legal. Além destas dificuldades,
como muitos dos representantes dos movimentos sociais possuem outras atividades profissionais, eles dedicam apenas parte de seu tempo às organizações e não
estão sempre disponíveis para participar das reuniões dos GTs e CTs (GOV06).
As empresas também não parecem concentrar muitos esforços nas reuniões
do Plenário, e sua presença assemelha-se àquela das ONGs, com os titulares participando apenas de 40% dos encontros. Por outro lado, estas tendem a compensar
seu pequeno número de votos no Plenário por meio de uma intensa participação
nos estágios iniciais de elaboração das resoluções e formam o grupo mais ativo
nas CTs e, principalmente, nos GTs, conforme será discutido na subseção 3.2.
De forma geral, o debate nos GTs são polarizados entre as empresas e as agências
ambientais federais (GOV01; GOV04), entretanto, como as primeiras possuem
representantes melhor preparados, não é raro vencerem as discussões com os técnicos do governo (GOV05).
Essa estratégia de concentrar esforços nos GTs parece ser bastante eficaz; os
GTs são abertos à participação pública, não há limites ao número de participantes
e qualquer pessoa pode apresentar propostas. Embora os GTs não sejam deliberativos, quando estes são encerrados, as propostas já estão próximas de sua versão
final, sofrendo apenas correções menores nas demais instâncias (GOV07). Sendo
assim, as propostas de resolução, preparadas sob grande influência das empresas
são, muitas vezes, aquelas aprovadas pelo Plenário do Conama.
Capacidade Ambiental e Emulação de Políticas Públicas...
269
Dessa forma, há indícios de que o grau de influência no Conama não é
determinado pelo número de conselheiros no Plenário, mas sim pela organização
e capacidade de participação dos diferentes grupos de interesse nos vários níveis
do conselho. Apesar de seu reduzido número de conselheiros, as empresas superam os demais grupos tanto em termos de equipe disponível quanto de coesão e,
como dominam a fase inicial de formulação das resoluções, definem a essência
das normas. Esta dinâmica pode ser claramente identificada na experiência das
resoluções para resíduos de pilhas e baterias. Entretanto, antes de avaliar as resoluções propriamente ditas, será analisado o contexto legal no qual estas surgiram.
3.1.2 Resoluções para resíduos sólidos: lei ou acordo?
A preocupação com uma Política Nacional de Resíduos Sólidos foi consolidada
no setor ambiental como um desdobramento indireto da Conferência das Nações
Unidas para Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro,
em 1992. A partir de um contato mais próximo com as experiências europeias,
alguns atores políticos preocupados com problemas ambientais – dentro e fora do
Conama – passaram a demandar uma legislação específica para os resíduos sólidos
(GOV05; ONG01).
Quatro anos após a Rio-92, o Conama criou um GT específico para propor
diretrizes para a gestão de resíduos sólidos no país. As entidades envolvidas esperavam enviar estas diretrizes ao Congresso Nacional para servirem de base para a
PNRS. O princípio da RPC era um dos principais – e mais controversos – aspectos desta nova política.
Meu interesse aqui é que a gente realmente avance, e aí com base nos preceitos da
Agenda 21 sobre resíduos e na experiência internacional. Eu tinha tido a oportunidade de participar de seminários na Alemanha e na França sobre essa questão, fizemos até um seminário nacional (...) e a gente viu que a questão da Responsabilidade
Pós-Consumo era uma coisa que precisava... Para resolver a questão de resíduos não
poderíamos passar ao largo dela (...)” (GOV01).
O GT reuniu-se por mais de dois anos e, apesar da resistência das empresas,
a proposta de resolução foi aprovada pelo Plenário em 1999. O projeto discutido
pelos membros do Conama criava a RPC no país e definia que tipos específicos de resíduos teriam tratamentos diferenciados, cabendo ao próprio Conama deliberar sobre estes procedimentos. Sendo assim, formaram-se GTs para
discutir resolução para embalagens, lâmpadas fluorescentes, pneus e baterias.
Embora as iniciativas para embalagens e lâmpadas estejam em tramitação no Conama há quase dez anos, as resoluções para baterias – no 257/1999, revista como
no 401/2008 – e para pneus – no 258/1999 – foram aprovadas ainda em 1999.
270
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
Os conselheiros esperavam que o respaldo do Conama fosse suficiente para
garantir a aprovação do projeto da PNRS no Congresso, e o enviaram para a Casa
Civil para que fosse apresentado como Projeto de Lei do Executivo. Entretanto,
naquele momento, a documentação não foi encaminhada ao Congresso, devido
à falta de vontade política do Executivo em enfrentar a oposição das empresas
à RPC (GOV01; GOV04; IND01). Como alternativa, o projeto foi levado à
Câmara dos Deputados, mas apensado aos projetos de lei sobre o tema que já
vinham tramitando naquela casa. Em setembro de 2007, o Executivo finalmente
enviou um projeto de lei para a Câmara, novamente propondo instrumentos com
base na RPC, e este foi também apensado aos projetos de lei sobre o assunto que
tramitam no congresso desde 1991 (BRASIL, 2009).
Sem o apoio legal da PNRS, as duas resoluções aprovadas pelo Conama
caíram em um vácuo legal, o que gerou um debate sobre sua validade jurídica. As empresas alegavam que somente leis aprovadas pelo Congresso poderiam
criar obrigações e questionavam se o Conama tinha poderes para implantar a
RPC. Por outro lado, o setor ambiental, argumentava não ser necessária uma
lei específica, uma vez que a Lei no 9.605/1998 define como crime ambiental
“(...) instalar ou fazer funcionar (...) estabelecimentos, obras ou serviços potencialmente poluidores (...) contrariando as normas legais e regulamentares pertinentes” (BRASIL, 1998). Segundo esta interpretação, as resoluções para resíduos
sólidos seriam mais uma norma ambiental e não necessitariam ser regulamentadas
por lei específica. Entretanto, em termos práticos, o resultado desta dupla interpretação foi um acordo voluntário entre empresas e setor ambiental do governo.
Tudo o que foi feito de legislação com Responsabilidade Pós-Consumo está na base de
acordo de cavalheiros. Como foi uma resolução negociada entre as partes, ninguém vai
questionar a constitucionalidade dela. Mas de fato elas são [inconstitucionais], porque
não há uma lei que obrigue ninguém a ter Responsabilidade Pós-Consumo (GOV02).
Esse entendimento foi aceito por diferentes grupos de interesse e as normas
aplicadas com base nessa percepção. Esta foi, inclusive, a interpretação da Procuradoria Geral do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis (Ibama), ao afirmar que
(...) o texto usa com freqüência a expressão ‘os fabricantes e importadores deverão’ no lugar de
ficam obrigados, deixando de impor conduta determinada para prestigiar o caminho da orientação ambiental. (...) Porém, se de um lado, normas com este conteúdo, afasta (sic.) eventual
crítica de violação do princípio da legalidade, de outro, corre-se o risco de não ser cumprida
por conduzir raciocínio e interpretação no viéz (sic.) de regra facultativa (SILVA, 2006).
Entretanto, independente dessa incerteza legal, as resoluções para resíduos
de pilhas e baterias seriam capazes de apenas criar resultados marginais. A partir da próxima seção, será estudado o ciclo de políticas públicas dessa norma.
Capacidade Ambiental e Emulação de Políticas Públicas...
271
Segundo essa análise, limitações institucionais permitiram que as resoluções fossem implantadas com brechas na redação, o que facilita o seu cumprimento sem
uma melhoria efetiva do desempenho ambiental das empresas.
3.2 O ciclo das resoluções para resíduos de pilhas e baterias
3.2.1 Definição do problema
O Brasil produz cerca de 800 milhões de pilhas comuns e 17 milhões de baterias (ABINEE, 2006 apud GOMES; MELO, 2006). Em 2008, foram importadas 7,4 mil
toneladas de pilhas alcalinas, 820 toneladas de baterias de lítio e 390 toneladas de baterias de níquel-cádmio (MDIC, 2009). Em termos gerais, pode-se dividir o setor de
baterias em quatro grandes grupos: baterias industriais, baterias automotivas, pilhas comuns – alcalinas e zinco-carbono –, e baterias domésticas recarregáveis. Avaliando o
desempenho ambiental dos diferentes tipos de baterias, pôde-se observar que, apesar de
falhas em alguns grupos, sua gestão no início da década de 1990 vinha funcionando de
uma forma relativamente satisfatória. O setor apresentava problemas, porém sua superação dependia mais do aprimoramento dos órgãos de monitoramento ambiental do
que de grandes mudanças do ponto de vista legal. A principal fragilidade referia-se ao
segmento das baterias domésticas recarregáveis; entretanto, o Conama optou por criar
uma norma ampla, que englobasse todos os segmentos.
Desde antes da Resolução no 257/1999, baterias industriais com alta concentração de metais pesados já eram consideradas resíduos perigosos, devendo a gestão
de seus resíduos ser fiscalizada pelas agências ambientais estaduais. Nesse sentido,
qualquer disposição inadequada destas baterias não era decorrente de falhas de
legislação, mas do controle inadequado por parte dos órgãos ambientais (IND02).
Com relação às baterias automotivas, também havia pequena necessidade de
mudanças na legislação. Desde antes da implantação da Resolução no 257/1999,
a indústria já havia criado um sistema efetivo de reciclagem para esse grupo de
baterias. Como o Brasil não possui reservas de chumbo, a indústria utiliza material
importado e, principalmente, reciclado como matéria-prima (IND02). Dados históricos sugerem que, independente da ação do estado, o setor de baterias automotivas já vinha alcançando índices de reciclagem próximos a 98% (OCHOA, 2001).
O segmento de pilhas alcalinas e de pilhas de zinco-carbono, por sua vez,
também vinha melhorando seu desempenho ambiental. Até os anos 1980, estas
baterias tinham altas concentrações de metais pesados; entretanto, para ter acesso
ao mercado europeu, os produtores de pilhas decidiram, na década de 1990, reduzir
a concentração destes materiais. Os limites de mercúrio adotados na Europa foram
alcançados nos dois tipos de pilhas já em 1994 (REIDLER; GÜNTHER, 2000).
Além disso, as empresas eliminaram cádmio e mercúrio das pilhas alcalinas em
1999 e das pilhas de zinco-carbono em 2002 (ABINEE, 2002).
272
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
As empresas investiram trinta milhões de dólares para poder eliminar esses metais
[cádmio e mercúrio] e isso pode ser comprovado porque o próprio Ministério do
Desenvolvimento nos concedeu sistemas de importação de máquinas com isenção
de impostos devido a que nós somos um setor altamente exportador, trazemos dólar
para o país e com isso trazíamos uma nova tecnologia, ou seja, eliminação definitiva
desses dois metais (BRASIL, 2003a, p. 11).
Por fim, as baterias recarregáveis para uso doméstico – por exemplo, níquelcádmio – eram as que apresentavam mais problemas. No início dos anos 1990,
estas baterias não apenas possuíam uma grande concentração de metais pesados –
em particular cádmio, mercúrio e chumbo – como também tiveram seu consumo
consideravelmente intensificado, devido ao aumento do uso de laptops, no-breaks
e aparelhos celulares (GOV01). As baterias recarregáveis eram, em sua maioria,
dispostas de forma inadequada em lixões ou aterros controlados, não preparados
para receber este tipo de material. Este grupo de baterias foi o principal motivador
da Resolução no 257/99, pois o risco de contaminação do solo por metais pesados
chamou a atenção de algumas agências ambientais e organizações ambientalistas.
Nos últimos anos, estas baterias foram sendo substituídas por outras que utilizam
níquel metal hidreto, porém como não existem dados públicos sobre a participação de cada tipo de bateria no mercado, este grupo de baterias continuou sendo
uma das principais fontes de preocupação do setor ambiental.
Em resumo, apesar dos principais problemas ambientais referentes a pilhas
e baterias estar relacionados às baterias domésticas recarregáveis, o Conama
optou por elaborar uma resolução abrangente. Todavia, conforme discutido a
seguir, ao longo do processo de discussão, os órgãos ambientais deixaram de se
preocupar com as baterias recarregáveis e desviaram sua atenção para as pilhas
alcalinas e de zinco-carbono.
3.2.2 Elaboração e implantação da Resolução no 257/1999
O debate sobre disposição inadequada de resíduos de baterias não se iniciou em
Brasília, mas em São Paulo, em 1994. Naquele ano, a Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental do Estado de São Paulo (CETESB) iniciou uma
série de reuniões com a Associação Brasileira das Indústrias Elétrica e Eletrônica
(Abinee), para definir uma regulamentação estadual para pilhas e baterias. Esta
regulamentação se baseava na legislação da Alemanha e da França, e definia limites para a presença de cádmio, mercúrio e chumbo (IND02). Com base no
conceito da RPC, a norma estadual exigia que fabricantes e importadores que
não respeitassem os padrões seriam obrigados a coletar, tratar e dispor os resíduos
pós-consumo de seus produtos.
Capacidade Ambiental e Emulação de Políticas Públicas...
273
Em setembro de 1998, o Conama iniciou o debate de uma proposta de
resolução para regulamentar a disposição desses produtos no âmbito federal. Baseando-se no projeto de São Paulo, o GT para pilhas e baterias conseguiu chegar
a uma proposta de resolução rapidamente. A discussão nestes GTs foi polarizada
entre representantes das empresas e do governo federal. Nas três reuniões que
ocorreram, participaram em média dez representantes do governo federal e da
empresas, dois dos governos estaduais e não mais de um dos governos municipais
ou dos movimentos sociais (BRASIL, 1999a). Em abril de 1999, a proposta foi
encaminhada para a Câmara Técnica e, em julho, aprovada pelo Plenário sem
muitas modificações.
O Artigo 1o da Resolução no 257/1999 definia que as pilhas e baterias que
contivessem cádmio, mercúrio ou chumbo deveriam ser entregues, após seu esgotamento, a estabelecimentos comerciais ou à rede de assistência técnica autorizada
para repasse a fabricantes ou importadores. O Artigo 11, por sua vez, obrigava
produtores e importadores a criar sistemas de coleta, transporte e tratamento das
baterias usadas; e o Artigo 12 obrigava-os a criar sistemas de reuso, reciclagem,
tratamento e disposição final dos resíduos de bateria. Entretanto, o Artigo 13
abria uma exceção e estabelecia que “as pilhas e baterias que atenderem aos limites
previstos (...) poderão ser dispostas, juntamente com os resíduos domiciliares, em
aterros sanitários licenciados” (BRASIL, 1999b).
Em teoria, a resolução parecia seguir corretamente o paradigma da RPC,
uma vez que buscava transferir a responsabilidade dos impactos ambientais para
as empresas e encorajar a prevenção da poluição. O Artigo 13 seria o principal
componente preventivo da resolução, pois se os fabricantes respeitassem os limites definidos, eles evitariam o custo de coletar e dispor as baterias usadas.
Quando nós fizemos a resolução, pensando nas baterias, forçou com que as indústrias
aperfeiçoassem as tecnologias deles para diminuir as concentrações dos metais. (...) Aí
eu gosto sempre de falar do objetivo da Agenda 21, da essência da Agenda 21. Tem dois
objetivos na Agenda 21: (…) nos resíduos perigosos, qual é o primeiro objetivo? É a
não geração. Qual o segundo? Diminuir concentração de resíduos perigosos (ONG01).
Uma análise preliminar sugere que a Resolução no 257/1999 tinha, teoricamente, potencial de se tornar um exemplo de legislação ambiental a ser aplicada
no Brasil. Porém, uma análise mais detalhada de seu texto ajuda a entender a
limitada eficácia da resolução.
Em primeiro lugar, os padrões definidos pela resolução eram conservadores
para a realidade das empresas. De acordo com Espinosa e Tenório (2004), os fabricantes de pilhas e baterias nacionais já se enquadravam nos limites criados pelas
resoluções, portanto o fator prevenção teria uma função mais retórica do que real.
274
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
Outra limitação da resolução dizia respeito às responsabilidades criadas para
as empresas. Da forma como foi redigida, a norma apenas obrigava as companhias a criarem sistemas de coleta, transporte e tratamento das baterias usadas,
sem definir padrões mínimos para o desempenho destes sistemas. Esta falha foi
transferida para a instrução técnica que regulamentava a resolução, uma vez que
esta obrigava as empresas a informarem o tipo e a quantidade de baterias produzidas ou importadas, mas não a quantidade de pilhas que haviam sido recolhidas
(IBAMA, 2000). Dessa forma, uma vez implementada a resolução, as empresas
precisaram, em essência, criar os sistemas de coleta e tratamento, não tendo que
colocá-los em prática. Com base neste fato, pode-se argumentar que a Resolução
no 257/1999 sofria da mesma limitação legalista que caracteriza a política ambiental brasileira, baseada no pressuposto de que bastaria existir a lei para que os
problemas fossem resolvidos (GUIMARÃES, 1991).
Por fim, outra falha da resolução era a ausência de metas e sistemas de controle. Esta questão, porém, é discutida em mais detalhes na próxima seção.
3.2.3 Monitoramento da Resolução no 257/1999
Conforme discutido na subseção 2.2.3, entre os fatores que aumentam as chances
de sucesso de um acordo – que também podem ser associados a qualquer outro
tipo de política pública – estão a definição de metas quantitativas e a existência de
uma estrutura de monitoramento sistemático e regular. Entretanto, estes elementos estavam ausentes na Resolução no 257/1999, diminuindo consideravelmente
sua efetividade.
O que nós observamos, depois de três anos e dois-três meses de implementação
da Resolução, é que ela apresenta algumas falhas que não necessariamente dizem
respeito à imputação da indústria ou a falhas da indústria, e sim falhas de redação
na Resolução. (...) Controla-se... Consegue-se controlar – pelo texto da Resolução
como ela está – muito pouco e, em termos práticos, com exceção de alguns setores já estabelecidos que recolhem, que destinam, que tratam esse tipo de resíduo.
(...) Mas ela [Resolução no 257/99] como está nos tem causado, no IBAMA, um trabalho brutal, faraônico de controle, de inúmeros papéis, exigências disso e daquilo, que,
na prática, nós vemos como um resultado muito pequeno (...) (BRASIL, 2003b, p. 14).
Como não existe um controle efetivo da quantidade de pilhas recolhidas,
não é possível utilizar dados oficiais para comprovar o grau de sucesso ou fracasso
da resolução. Entretanto, informações produzidas por pesquisas independentes
indicam o descumprimento da resolução, bem como um baixo controle das atividades de reciclagem de pilhas e baterias.
Com relação à coleta dos resíduos de baterias, em 2001 – dois anos após a
aprovação da resolução –, apenas 11% das baterias retornavam aos produtores
Capacidade Ambiental e Emulação de Políticas Públicas...
275
(OCHOA, 2001), o que representa um percentual muito baixo. Apesar da afirmação da técnica do Ibama antes citada, pesquisas sugerem que o baixo retorno
de pilhas e baterias deve ser atribuído, ao menos em parte, ao baixo comprometimento das empresas.
Reidler e Günther (2002) realizaram pesquisa com varejistas e empresas fabricantes de pilhas e baterias no município de São Paulo. As pesquisadoras verificaram que, enquanto os comerciantes varejistas desconheciam suas obrigações, os
operadores de teleatendimento dos fabricantes estavam despreparados para orientar consumidores. Ao final do seu trabalho, as autoras sugeriram que as empresas
deliberadamente criariam obstáculos à comunicação com os consumidores.
Em uma pesquisa mais recente, Gracioli e Marianof (2006) aplicaram questionários a usuários e comerciantes de telefones celulares no município de Santa
Maria, no Rio Grande do Sul. As informações obtidas junto às lojas mostraram
que 61% da amostra não tinha interesse em fornecer informação sobre os riscos
relacionados à disposição incorreta de baterias; além disso, nenhum representante
das empresas soube informar onde as baterias recolhidas eram tratadas. Entre os
consumidores entrevistados, 77% afirmaram não ter recebido das lojas informações sobre como proceder no momento do descarte das baterias. Apesar deste
baixo índice de informação, as autoras estimaram que cerca de 23% das baterias
de celulares retornavam às lojas, o que sugere que, se houvesse um esforço real das
empresas, a população aderiria aos sistemas de coleta seletiva de pilhas e baterias.
Porém, ao final de sua pesquisa, elas concluíram que não haveria preocupação das
lojas e empresas em informar a seus clientes sobre os sistemas de coleta.
Entretanto, não era apenas a Resolução no 257/1999 que vinha sendo desrespeitada. Conforme comentado na subseção 3.2.1, os órgãos de monitoramento
ambiental no Brasil possuem uma limitada capacidade de controle das atividades
poluidoras, e diferentes estudos indicam que, quando há reciclagem de baterias –
ao menos no caso das baterias de chumbo-ácido –, estas não são feitas de forma
ambientalmente adequada. Em muitos casos, empresas que realizam estas atividades
possuem instalações precárias, sem equipamentos de controle de poluição. Tais empresas consistiriam, portanto, em importantes fontes de contaminação por chumbo
e impactariam de forma significativa o ambiente e, potencialmente, a saúde dos
trabalhadores e das pessoas que vivem em seu entorno (QUITERIO et al., 2006).
Mattos et al. (2003) realizaram pesquisa sobre as condições de trabalho em reformadoras de baterias de chumbo na região metropolitana do Rio de Janeiro. Os dados obtidos mostraram que as pessoas empregadas nesta atividade possuíam níveis de
chumbo no sangue muito acima do que trabalhadores do mesmo setor em outros países.
Nesta investigação, foram visitadas duas fábricas que, apesar de fazerem a reciclagem de
baterias, eram licenciadas apenas como revendedoras de material automotivo.
276
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
Em outra pesquisa, também no Rio de janeiro, Quiterio et al. (2006) avaliaram o teor de chumbo no ar próximo a uma reformadora de baterias. Segundo
os dados coletados, a presença de chumbo no ar era elevada dentro de um raio de
25 m da empresa, principalmente na direção da saída de ar do sistema de exaustão da fábrica. Algumas das amostras de ar apresentaram concentrações de mais
de 180 μg/m3, muito acima do padrão da região, estabelecido em 0,07 μg/m3.
As médias das amostras colhidas somente apresentaram valores iguais ao padrão
em pontos de coleta localizados a mais de 500 m da reformadora.
Outra investigação, realizada por Wowk e Melo (2005) em Paula Freitas, no
estado do Paraná, buscou avaliar a contaminação por chumbo do solo no entorno
de uma recicladora de baterias. A empresa analisada encontrava-se próxima a um
afluente do Ribeirão Rondinha, que deságua no Rio Iguaçu, principal responsável
pelo abastecimento da região metropolitana de Curitiba. Algumas das amostras de
solo obtidas entre o depósito de escórias da empresa e a margem do ribeirão apresentaram concentrações de chumbo de mais de 2.000 μg/cm³, muito acima do padrão
da região de cerca de 20 μg/cm³. Os autores ainda identificaram que o chumbo no
solo encontrava-se em formas iônicas de fácil lixiviação em um local onde o lençol
freático era bastante próximo à superfície, o que elevava as chances de contaminação.
Outra questão de monitoramento que foi desconsiderada pela Resolução
n 257/1999 dizia respeito à importação ilegal de pilhas e baterias no país.
Segundo dados da indústria, as baterias contrabandeadas, que em muitos casos possuem teores de metais pesados superiores àquelas produzidas no país
ou importadas legalmente, representam mais de 30% do mercado brasileiro
(BRASIL, 2008a). Apesar da importância desta questão, a resolução, omitia-se
quanto a este tema, não propondo ações para tentar modificar a situação.
o
Dessa forma, apesar de o setor ambiental não ter criado um sistema de monitoramento do cumprimento da Resolução no 257/1999, pesquisas indicam que
a norma era duplamente desrespeitada. Primeiramente, as campanhas de educação da população sob responsabilidade das empresas parecem não ter sido implementadas de forma efetiva. Em segundo lugar, em situações onde tem havido
coleta e reciclagem, como no caso das baterias automotivas, a reciclagem ocorre
de forma precária, contaminando o ambiente e prejudicando a saúde das pessoas.
3.2.4 Revisão – a Resolução no 401/2008
Apesar desses problemas, conselheiros do Conama e organizações ambientais não
procuraram melhorar os instrumentos de implementação ou o monitoramento da
resolução. Ao invés disso, questionamentos por parte do Ministério Público (MP)
desviaram o foco da discussão sobre a resolução para as pilhas alcalinas e de zincocarbono. Em 2001, o MP do Rio Grande do Sul requisitou que o Artigo 13 fosse
Capacidade Ambiental e Emulação de Políticas Públicas...
277
modificado e que os fabricantes também criassem sistemas para coleta, tratamento
e disposição final de todas as baterias, independentemente da concentração de metais pesados. Seu principal argumento era de que como a maioria dos municípios
não possuía aterro sanitário, eles não seriam capazes de cumprir a resolução.3
Essa requisição deu início a um longo e lento processo de discussão da resolução dentro do Conama. O pedido foi feito em outubro de 2001, mas somente
levado à Câmara Técnica de Controle e Qualidade Ambiental em abril de 2002,
quando foi proposta a criação de um novo GT para debater a resolução. Esta CT
discutiu durante seis meses o assunto e, em outubro de 2002, decidiu pela não
constituição do GT (BRASIL, 2003b).
Em dezembro, o MP de Minas Gerais também solicitou a revisão do Artigo
13 e, no final de maio de 2003, o assunto foi novamente levado para a pauta do
Conama, porém dentro da Câmara Técnica de Saúde, Saneamento e Gestão de
Resíduos, em que foi discutida a necessidade de revisar a resolução. Em junho,
a CT encaminhou um pedido para a Secretaria Executiva do Conama, para que
esta se posicionasse tecnicamente. Em setembro, o MP do Rio Grande do Sul
instituiu uma Ação Civil Pública para anular o Artigo 13, o que obrigou a CT a
criar, apenas em novembro, um GT para revisar a resolução (BRASIL, 2008a).
Apesar dos graves problemas envolvendo a falta de coleta de baterias e a contaminação pela reciclagem ambientalmente inadequada, estes problemas pouco
foram abordados pelos GTs. Nessa nova rodada de discussão, os debates foram
fortemente pautados pelas questões da presença das baterias importadas ilegalmente no mercado nacional e da inexistência de aterros sanitários no país para
receber as pilhas e baterias descartadas.
Assim como a discussão sobre a necessidade de um novo GT para pilhas e
baterias foi vagarosa, as reuniões do GT também ocorreram de forma espaçada
e lenta. Os debates foram iniciados pelo GT em janeiro de 2004 e só dois anos
mais tarde, em abril de 2006, uma nova proposta de resolução foi encaminhada
e aprovada pela Câmara Técnica de Saúde, Saneamento e Gestão de Resíduos.
Iniciou-se, então, um novo período de alterações e revisões, agora entre esta CT
e a Câmara Técnica de Assuntos Jurídicos, que durou até novembro de 2007. Em
março de 2008, a nova resolução foi apresentada ao Plenário do Conama, mas,
após cinco meses de discussão, voltou à Câmara Técnica de Saúde, Saneamento e
Gestão de Resíduos. Depois de uma nova rodada de discussões entre as CTs, em
que foram feitas algumas mudanças significativas, a resolução retornou ao Plenário do Conama, sendo aprovada em setembro de 2008.
3. Neste caso, o MP parece ter agido de forma equivocada, uma vez que diminuiu a cobrança sobre as prefeituras para
a instalação de aterros sanitários. O debate sobre o resíduo de baterias intensificou a pressão sobre governos municipais por uma gestão adequada dos seus resíduos sólidos, e modificações na resolução podem reduzir esta pressão.
278
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
O padrão de presença nas reuniões do GT de revisão da resolução mostrou
a mesma polarização identificada nas reuniões de 1998-1999. Ao todo houve
cinco reuniões do GT e o Conama disponibilizou a lista de presença das quatro
primeiras. Em cada uma destas reuniões, estiveram presentes, em média, 12 representantes do governo federal e das empresas, enquanto que os demais grupos –
movimentos sociais, governos estaduais e governos municipais – apenas eram representados por uma ou duas pessoas. Um padrão semelhante ocorreu nas reuniões da Câmara Técnica de Saúde, Saneamento e Gestão de Resíduos. Entre maio
de 2003 e agosto de 2008, houve 14 reuniões da CT em que a resolução para
resíduos de pilhas e baterias foi ponto de pauta. O Conama divulgou a lista de
presença de nove destas reuniões, que contaram, em média, com 16 representantes de empresas, 12 do governo federal e apenas um ou dois dos movimentos
sociais, governos estaduais e municipais (BRASIL, 2008a).
Quase seis anos e meio depois do início do processo de revisão, pode-se afirmar que a Resolução no 401/2008 pouco avançou com relação às principais fragilidades da Resolução no 257/1999. Esta nova resolução herdou algumas falhas
da versão anterior, como a falta de metas quantitativas e a ausência de medidas
relativas ao contrabando de pilhas e baterias. Além disso, a nova norma também
se tornou omissa com relação à falta de aterros sanitários no país. Estas questões
são discutidas com mais detalhes a seguir.
Assim como a Resolução no 257/1999, a Resolução no 401/2008 inspirou-se
fortemente na legislação europeia, em particular, na Diretiva 2006/66/EC, adotando
os mesmos padrões de concentração para mercúrio e cádmio. Entretanto, ao contrário da norma europeia, que define metas quantitativas para coleta (25% em 2012 e
45% em 2016) e reciclagem (65% em massa de baterias de chumbo-ácido, 75% em
massa de baterias de níquel cádmio e 50% em massa para as demais pilhas e baterias)
(EUROPEAN PARLIAMENT, 2006), a resolução brasileira se omite quanto a essa
questão (BRASIL, 2008c). Assim como no caso da Resolução no 257/1999, o Termo de Referência criado pelo Ibama para orientar os fabricantes e importadores de
pilhas e baterias de acordo com a Resolução no 401/2008 não exige que as empresas
prestem contas da quantidade de pilhas e baterias que recolhem (IBAMA, 2009).
Uma segunda limitação da Resolução no 257/1999 que foi mantida na nova
legislação refere-se a não incorporação de medidas, que buscassem reduzir o contrabando de pilhas e baterias, para o país. A presença de pilhas e baterias com
altos teores de metais pesados importadas ilegalmente foi um dos principais argumentos usados pelas empresas para contrapor-se a uma política que as obrigasse
a coletar e tratar todas as pilhas descartadas no país. Apesar de tal problema ter
sido corretamente identificado, não foi proposta nenhuma iniciativa para tentar
impedir a entrada destes produtos no mercado nacional.
Capacidade Ambiental e Emulação de Políticas Públicas...
279
Gostaria de chamar atenção dos Conselheiros para um dado, talvez seja Conselheiros que não participaram das discussões. O Brasil consome em média um bilhão e
300 milhões de pilhas por ano, quase 33% desse percentual entra no nosso país por
uma forma, que não é responsabilidade do IBAMA, não é do órgão ambiental, não
é da sociedade (BRASIL, 2008d, p. 63)
O Ibama já tem uma importante tradição no controle de comércio internacional que pode interferir na qualidade ambiental brasileira, como nos casos do
contrabando de agrotóxicos ou do comércio ilegal de espécies silvestres. Esta atividade, na maioria das vezes, é realizada em parceria com agentes da Polícia Federal.
Tal experiência poderia ser transferida para o caso das pilhas e baterias, se estas
fossem consideradas uma prioridade. Entretanto, ao invés de propor e discutir a
inserção de tal iniciativa na resolução, o setor ambiental acabou por se omitir da
questão, restringindo-se a uma proposta de recomendação à Polícia Federal para
que intensificasse o controle da entrada ilegal de pilhas e baterias no país (BRASIL,
2008b).Por fim, um aspecto no qual a nova resolução parece ser mais frágil que a
anterior é a retirada da discussão dos aterros sanitários. Na verdade, a Ação Civil
Pública que o MP do Rio Grande do Sul instituiu contra a Resolução no 257/1999
foi o fator que desencadeou o processo de revisão. Entretanto, quando a nova
versão foi apresentada ao Plenário pela primeira vez, esta ainda exigia que algumas
pilhas e baterias fossem encaminhadas para aterros sanitários, sendo esse um dos
possíveis motivos pelos quais Resolução no 401/2008 não foi aprovada. Somente
em julho de 2008, em uma reunião da Câmara Técnica de Saúde, Saneamento e
Gestão de Resíduos, o representante do Ministério da Saúde propôs substituir a
exigência pelo termo “destinação ambientalmente adequada, de responsabilidade
exclusiva do fabricante ou importador”, que foi incorporado ao Artigo 6o da resolução. Esta mudança de nomenclatura solucionou o conflito do Conama com o
MP, porém não resolveu o problema concreto da disposição das pilhas e baterias.
Como conclusão, o processo de revisão terminou por elaborar uma resolução tão vulnerável quanto à anterior. Neste sentido, há evidências de que
o Conama aprovou uma norma que, de antemão, já sabia que não seria colocada em prática.
A ideia de nós colocarmos o limite máximo era exatamente que esse limite tivesse o teor tal, que você pudesse dispor ela junto com o lixo e não tivesse
problema, porque a contaminação ou um resíduo em contaminação, qualquer
resíduo tem. Então, essa era a preocupação, porque nós vimos que a estratégia do
recolhimento não funciona; e outra, quem tem programa de recolhimento hoje,
ele recolhe metade ou mais da metade do que vai para o lixão, o país não tem
capacidade de reciclar isso ou de dar um tratamento ambiental, isso é realidade
(BRASIL, 2008d, p. 59).
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
280
Porém, essa não é uma particularidade do Conama, e pode ser identificada
no setor ambiental brasileiro como um todo. Pelo menos essa é a conclusão que
Ames e Keck (1997, p. 29) apresentam em sua análise das políticas ambientais
no Brasil. Em seu trabalho, os autores afirmam que, em muitos casos, ao fim do
processo de elaboração da legislação, nem atores públicos, nem atores privados
têm expectativa de que as normas sejam cumpridas.
Uma vez concluído o processo de revisão, o país passou a contar com uma nova
regulamentação para pilhas e baterias. Uma vez que a Resolução no 401/2008 também
não define instrumentos de monitoramento e controle, o impacto final da norma só
poderá ser verificado nos próximos anos, a partir de novas pesquisa e investigações.
4 CONCLUSÕES
O principal objetivo deste artigo foi analisar como uma experiência baseada em
RPC, um paradigma essencialmente europeu, desenvolveu-se no contexto brasileiro, que apresenta uma capacidade institucional distinta daquele encontrada
na Europa. Para isso, discutimos o conceito de capacidade institucional; apresentamos aspectos contextuais e conceituais da RPC; e comentamos o processo de
definição do problema, da elaboração, implantação, do monitoramento e da revisão das resoluções para resíduos de pilhas e baterias. Ao longo da pesquisa, foram
percebidos problemas na resolução, decorrentes, principalmente, de limitações
institucionais do setor ambiental. Nesta seção, primeiramente confrontamos alguns aspectos da RPC com a experiência brasileira das resoluções para resíduos
e pilhas e baterias. Em seguida, fazemos uma análise das principais limitações
institucionais identificadas no setor ambiental do Brasil.
A discussão sobre o conceito da RPC permitiu identificar três pressupostos
que compõem a sua base: transferência de responsabilidade, desenvolvimento de
tecnologias preventivas e uso de políticas flexíveis e participativas. Todavia, os
dados empíricos sugerem que, embora estes pressupostos possam ser associados
às resoluções para resíduos de pilhas e baterias, nenhum destes foi plenamente
considerado e incorporado na implantação das normas.
As resoluções podem ser consideradas tentativas de transferir as responsabilidades pelos resíduos de pilhas e baterias para os fabricantes e importadores, porém, as agências ambientais não possuem recursos para garantir que as empresas
estejam cumprindo suas responsabilidades. Análises independentes sugerem que
tais responsabilidades vêm sendo negligenciadas; portanto, apesar de ter havido
transferência legal de responsabilidade, esta não existe na prática.
Por meio deste estudo, não foi possível verificar se as resoluções levaram as
empresas a adotar tecnologias preventivas. No início dos anos 2000, as empresas
adquiriram novos equipamentos que permitiram a eliminação de alguns metais
Capacidade Ambiental e Emulação de Políticas Públicas...
281
pesados das pilhas alcalinas e zinco-carbono; entretanto os dados levantados sugerem que estas foram motivadas por pressões do mercado externo, e não pela Resolução no 257/1999. O aspecto tecnológico deve ser observado com mais cuidado
pelos defensores da RPC, e é preciso que eles considerem a limitada capacidade
tecnológica do Brasil. Uma vez que pouca tecnologia ambiental é desenvolvida
nacionalmente, uma norma isolada que exija técnicas avançadas de controle ou
prevenção da poluição poderá levar à importação de equipamentos – aumentando a dependência tecnológica do país – ou ao cumprimento das regras sem as tecnologias adequadas – como no caso da reciclagem de baterias de chumbo-ácido.
Para evitar estas situações, não se deve flexibilizar a legislação ambiental, porém
parece ser desejável que as políticas ambientais sejam elaboradas em conjunto
com iniciativas de desenvolvimento e promoção de tecnologia consistente com
a realidade local e acessível para as empresas que atuam no país, motivando estas
companhias a adotar soluções mais adequadas ao contexto nacional.
Com relação a uso de instrumentos flexíveis e participativos, esse caso mostra a adoção de acordos voluntários e uma limitada participação. A resolução foi
encarada como um acordo voluntário que, por não preencher todas as condições
necessárias, apresenta algumas falhas. As dinâmicas participativas devem ainda
ser aprimoradas, uma vez que o estudo da presença nas reuniões dos GTs e CTs
mostra uma polarização do debate entre empresas e governo federal e um limitado envolvimento dos demais atores – movimentos sociais, governos estaduais e
municipais. As informações levantadas não permitem uma análise das causas desta baixa participação e esta questão deve ser pesquisada em maior profundidade.
Considerando esses aspectos, as Resoluções no 257/1999 e no 401/2008 representam um caso de RPC que obteve resultados muito limitados. Todavia, não
se deve desmerecer o Conama ou menosprezar o esforço que muitas pessoas e
instituições têm feito para aprimorar a regulamentação ambiental no país. Apesar
deste esforço, as capacidades ambientais e o contexto social e institucional do
Brasil são muito distintos do europeu, o que ajuda a explicar a baixa eficácia de
práticas baseadas na RPC no país.
Primeiramente, o Brasil parece ter uma baixa capacidade para criar novas normas e instrumentos para lidar com seus problemas ambientais. Esta característica
pode ser identificada na opção de emular modelos, políticas e instrumentos ambientais de outros países, em vez de criar soluções próprias e adequadas à sua realidade.
Em segundo lugar, a capacidade consensual das agências ambientais também
precisa ser mais desenvolvida. Por questões históricas e culturais o setor ambiental
encontra-se isolado do centro de decisão, e superar este distanciamento talvez
seja o maior desafio a ser superado pelas agências ambientais. No caso específico
das resoluções para resíduos, este isolamento se mostra na incapacidade do setor
282
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
ambiental de garantir a aprovação da Política Nacional de Resíduos Sólidos ou de
conseguir recursos suficientes para um monitoramento ambiental adequado de
atividades potencialmente poluidoras.
Por fim, a capacidade estratégia dos órgãos ambientais deve ser discutida em
maior profundidade.
Uma das falhas das resoluções para resíduos de pilhas e baterias é a falta de
políticas públicas complementares. Apesar da Resolução no 257/1999 estar, teoricamente, relacionada a outras iniciativas do ponto de vista dos resíduos sólidos –
como a Resolução no 258/1999 para resíduos de pneumáticos –, esta foi uma
ação isolada de outras iniciativas que dizem respeito ao setor de pilhas e baterias.
Durante o debate sobre a revisão da resolução, foram feitas referências a programas de incentivos fiscais criados pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria
e Comércio Exterior, mas a resolução não menciona, nem sugere tais iniciativas.
Conforme discutido anteriormente, a resolução também aparece como uma política exclusivamente federal, com baixo envolvimento dos órgãos ambientais estaduais e municipais que seriam, em teoria, os responsáveis pela fiscalização de seu
cumprimento. Além disso, pesquisas com consumidores indicam que a sociedade
não foi devidamente informada sobre a resolução, limitando o controle social e a
mobilização da opinião pública.
Nesse sentido, a falta de monitoramento aparece como uma das principais
limitações das resoluções. Em primeiro lugar, não houve uma definição clara da
responsabilidade e obrigação de cada grupo de interesse, o que inviabiliza a cobrança das atribuições. Outro fator que dificulta o monitoramento é a ausência de
metas quantitativas para a coleta de pilhas e baterias, conforme discutido na subseção 3.2.4. De acordo com a análise crítica apresentada por Barros (2003, p. 326),
(...) [o]s órgão ambientais do governo são os próprios agentes determinantes da ausência de indicadores de sua performance. Essa situação é benéfica para o governo,
uma vez que enfraquece eventuais críticas sobre a atuação.
Além da omissão sobre metas, a nova versão da resolução também deixa de
abordar temas problemáticos, como a questão da falta de aterros sanitários no país
e o comércio ilegal de pilhas e baterias.
Sendo assim, a análise do processo de elaboração, implantação e revisão das
resoluções para resíduos de pilhas e baterias ajuda a identificar algumas das causas de
sua baixa efetividade. Primeiramente, estas foram implantadas como um acordo voluntário, porém não preenchem os requisitos necessários para ser um acordo eficaz.
Além disso, como a limitada capacidade do setor ambiental permitiu a elaboração
de uma resolução falha, mesmo que a norma recebesse o respaldo jurídico da PNRS,
esta continuaria sem produzir efeitos significativos. Ações pontuais para melhoria
Capacidade Ambiental e Emulação de Políticas Públicas...
283
das resoluções ou do Conama – tais como a definição de critérios quantitativos de
monitoramento, a vinculação a outras políticas públicas, a criação de parcerias com
os demais órgãos públicos ou a facilitação da participação dos representantes dos
movimentos sociais – poderiam ser adotadas como forma de aprimorar esta ou outras normas ambientais. Todavia, o caso das Resoluções no 257/1999 e no 401/2008
sugere que regulamentações realmente eficazes somente surgirão após medidas articuladas, que busquem adequar as normas brasileiras à capacidade dos órgãos ambientais no país.
Dessa forma, como argumento final, defende-se que as agências de meio
ambiente devam adotar instrumentos e políticas que sejam coerentes com sua
capacidade institucional. Conforme afirmou Weidner (2002), mesmo que países
periféricos adotem propostas e componentes de políticas ambientais semelhantes
àqueles utilizados em países industrializados, as diferenças em termos de interações e relações contextuais são suficientes para gerar resultados muito distintos.
Da mesma forma, Jänicke (1992, p. 47) alerta que a capacidade material, institucional e sociocultural de um país são mais relevantes na determinação dos
resultados de políticas ambientais do que os instrumentos escolhidos. Portanto, a
opção de se buscar “solucionar” problemas ambientais pela emulação de normas
internacionais complexas e desconectadas do contexto institucional e social do
país parece não só equivocada, mas mesmo um desperdício de esforços e recursos.
Se o Brasil, ou outros países como baixa capacidade ambiental, deseja se “inspirar” nos países líderes na questão ambiental, deve primeiro garantir as condições
de operação de políticas e instrumentos pelo desenvolvimento de suas capacidades institucionais. Alternativamente, estes podem, a partir do conhecimento de
sua realidade local, criar instrumentos próprios e adequados ao seu contexto, que
sejam, talvez, mais simples, mas nem por isso menos eficazes.
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DESIGUALDADES REGIONAIS E BEM-ESTAR NO BRASIL:
QUÃO EFICIENTE TEM SIDO A ATIVIDADE TRIBUTÁRIA
DOS ESTADOS PARA A SOCIEDADE?
Vladimir Fernandes Maciel*
Caio Cícero de Toledo Piza**
Roberto Nicolai Penoff***
O objetivo deste artigo é analisar eficiência dos estados brasileiros na geração de bem-estar no
período 1991-2000. O método Data Envelopment Analysis (DEA) é utilizado para a mensuração
da eficiência relativa dos estados brasileiros na geração de desenvolvimento humano e na redução
de suas desigualdades internas. A partir deste prisma, discutimos as desigualdades regionais,
buscando analisar a possibilidade de convergência nos níveis de Índice de Desenvolvimento
Humano (IDH) entre os estados brasileiros por meio do cálculo do Índice de Malmquist e de
suas decomposições. Os resultados obtidos mostram uma clara divisão regional entre as regiões
Centro – Sul e Nordeste, além de constatar uma convergência nos níveis de IDH entre os estados
brasileiros, divididos em três subgrupos – clubes de convergência.
Palavras-chave: DEA; Desigualdades Regionais; Tributação; Convergência.
Regional Inequalities and Welfare in Brazil: How Efficient Has
Been the States Taxation Activity for Society?
Our purpose is to analyze the efficiency of Brazilian states concerning the generation of welfare during
1991-2000. We adopt the methodology of Data Envelopment Analysis (DEA) in order to measure the
relative efficiency. The focus is the states’ ability to increase human development and to reduce income
inequalities. In such perspective we discuss regional inequality and the possibility of convergence on
the HDI rank among Brazilian states via computing Malmquist Index and its decompositions. The results
show a clear regional gap between Central-South and Northeast states. The possibility of convergence
on the HDI rank seems to be into three sub-groups (convergence clubs).
Key words: DEA; Regional Inequalities; Taxation; Convergence.
¿Las desigualdades regionales y el bienestar en Brasil: cómo
eficaz ha sido la actividad fiscal de los estados para la sociedad?
El objetivo de este artículo es analizar la eficacia de los Estados de Brasil en la generación de
bienestar después del período 1991-2000. El metodo Data Envelopment Analysis (DEA) se utiliza
para mensurar la participación de los Estados de Brasil en la generación de desarrollo humano
y redución de la desigualdad interna. A partir de este punto vamos examinar las disparidades
* Professor e pesquisador da Universidade Presbiteriana Mackenzie, doutorando em Administração Pública e Governo pela
Escola de Administração de Empresas de São Paulo (EAESP)/Fundação Getulio Vargas (FGV). E-mail: [email protected]
** Doutorando em Economia pela Escola de Economia de São Paulo (EESP) da FGV, mestrando em Desenvolvimento
Econômico na Universidade de Sussex/UK e pesquisador do Centro de Estudos em Microfinanças da FGV de São Paulo (SP).
E-mail: [email protected]
*** Economista formado pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. E-mail: [email protected]
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
292
regionales, con la possibilidad de convergencia en los niveles de IDH (Índice de Desarrollo Humano)
dentre los Estados de Brasil, a partir del calculo del Índice de Malmquist y su descomposición. Los
resultados obtenidos muestran que hay una división bien definida en las regiones Centro-Sur
y Noreste, así como tomando nota de la convergencia en el rango de IDH entre los estados
brasileños, divididos en tres sub-grupos (clubes de convergencia).
Palabras-clave: DEA; Desigualdades Regionales; Fiscalidad; Convergencia.
Inégalités régionales et le bien-être au Brésil: comment efficace
a été l’activité fiscale des états pour la société?
L’objectif de ce papier est d’analyser l’efficacité des États du Brésil dans la production de bien-être
dans les périodes de 1991-2000. La méthode d’enveloppement des données (DEA) est utilisé pour
mesurer l’efficacité relative des États brésiliens dans la génération du développement humain
et la réduction de leurs inégalités internes. Dans cette perspective, nous discutons de l’inégalité
régionale qui vise à analyser la possibilité de la convergence sur l’IDH entre les états brésiliens du
calcul de l’indice Malmquist et ses décompositions. Les résultats montrent une claire répartition
régionales entre le Centre-Sud et Nord-Est, ainsi que de noter une convergence sur le classement
selon l’IDH entre les états brésiliens, divisé en trois sous-groupes (clubs de convergence).
Mots-clés: DEA; Inequalities Régionales; Fiscalité; Convergence.
1 INTRODUÇÃO
O objetivo deste artigo é analisar a eficiência dos estados brasileiros na geração
de bem-estar, com um enfoque nas desigualdades regionais, a partir da análise
conjunta da eficiência na geração de desenvolvimento e na redução das suas desigualdades internas. Além disso, este trabalho analisa uma possível convergência
dos níveis de desenvolvimento humano entre os estados brasileiros.
A análise de eficiência deste trabalho baseia-se no método Data Envelopment
Analysis (DEA), ou Análise Envoltória de Dados, que concerne a um modelo não
paramétrico – não segue nenhuma distribuição de probabilidade – e utiliza-se de Programação Linear para realizar os cálculos de eficiência relativa por meio de funções de
fronteira deterministas, ou seja, não se permite observações acima da fronteira e os desvios advêm do uso ineficiente da combinação do insumo e do produto. Os produtos
são o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), elaborado pela Organização das
Nações Unidas (ONU), e o inverso do Índice L de Theil, sendo o primeiro o produto
de qualidade de vida e o segundo o produto de desigualdade. Para ambos os casos, os
insumos são as receitas e transferências tributárias de cada um dos 26 estados brasileiros
e o Distrito Federal, sendo que o período para todos os dados são 1991 e 2000. Este artigo possui mais cinco seções além da introdução e da conclusão.
Na segunda seção discutimos os fundamentos teóricos que norteiam a análise
empírica. Na terceira seção explicamos a metodologia do DEA e a base de dados utilizada. Na quarta são apresentados os modelos de eficiência na geração de
desenvolvimento humano. Na quinta são mostrados os resultados de eficiência
Desigualdades Regionais e Bem-Estar no Brasil...
293
na redução de desigualdade. A sexta seção analisa os resultados obtidos nas duas
seções anteriores, incluindo uma discussão acerca das desigualdades regionais observadas, aventando-se a ocorrência – ou não – de convergências nos níveis do
IDH entre os estados brasileiros a partir dos resultados obtidos com o cálculo do
Índice de Malmquist e suas decomposições.
2 DA TRIBUTAÇÃO À DESIGUALDADE REGIONAL: UMA DISCUSSÃO EM
DIREÇÃO AO BEM-ESTAR
Esta seção tem por objetivo apresentar os fundamentos teóricos que guiam a discussão e a análise empírica deste artigo. São três os temas abordados: desigualdade
regional, tributação/federalismo fiscal e bem-estar.
2.1 Desigualdade regional no Brasil
Uma das características marcantes do Brasil é a desigualdade econômica entre indivíduos e regiões. Do ponto de vista regional, o que se observa é uma concentração relativa de produção e renda nas regiões Sul e Sudeste e maior nível de pobreza nas regiões Norte e Nordeste. Em Furtado (2000), apresentam-se os elementos
históricos da reversão econômica, que se dá com a decadência da cana-de-açúcar
no Nordeste e a ascensão da mineração no Sudeste, posteriormente suplantada
pelo ciclo cafeeiro. As bases de infraestrutura econômica criadas pela economia
cafeeira garantiram a expansão industrial de São Paulo (CANO, 1998a).
Nos períodos posteriores, duas fases antepuseram-se. A primeira, que vai da
década de 1930 até o começo dos anos 1970, foi marcada pela intensa industrialização e pelo aumento da desigualdade regional, já que o Sudeste do país foi o
grande beneficiário. A segunda fase, que vai de meados dos anos 1970 até o fim
dos anos 1980, é caracterizada pela redução das desigualdades regionais. Esta
menor disparidade entre as regiões foi fruto dos projetos do II Plano Nacional de
Desenvolvimento, cujas localizações eram mais distribuídas pelo território, e pela
crise da década de 1980, que afeta sobremaneira os grandes centros – como São
Paulo e Rio de Janeiro, por exemplo – em relação às demais regiões. Um terceiro
período, a partir da década de 1990, não aponta para uma direção específica, qual
seja da redução ou da acentuação das desigualdades regionais (CANO, 1998b).
Do ponto de vista da teoria da Economia Espacial, Fujita, Krugman e Venables (2000) mostram que o desenvolvimento do setor industrial, com economias
de escala, em uma economia fechada ao comércio exterior e com custos de transportes não muito elevados, tende a criar aglomerações populacionais e econômicas. Isto caracteriza uma estrutura espacial com centro(s) e periferia(s) no país, o
que significa desigualdade regional.
Essa questão da desigualdade acaba se refletindo nas medidas compensatórias de
políticas públicas, como a criação de Fundos de Participação de Estados e Municípios,
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
294
que teriam por finalidade redistribuir recursos dos entes federativos mais ricos aos
mais pobres. A questão que surge, portanto, é se tais recursos estão sendo empregados
por parte do setor público de modo a diminuir as disparidades socioeconômicas.
2.2 Federalismo fiscal, transferências e tributação
A análise da eficiência na geração de bem-estar parte do pressuposto de que os estados brasileiros buscariam gerar maior bem-estar social aos indivíduos a partir do
uso de suas receitas e transferências tributárias, ou seja, os estados buscam prover
bens públicos para gerar maior bem-estar social. Assim, a descentralização fiscal e
administrativa que os estados brasileiros possuem gera possibilidades de estes estados serem mais eficientes na alocação dos recursos, devido ao fato de gozarem de
autonomia federativa para alocar os recursos de uma forma que reflita melhor as necessidades específicas de sua região e também realizar experimentos e inovações na
provisão de bens e serviços públicos (SHIKIDA; MILTON; ARAÚJO JR., 2007).
Nesse contexto, Tiebout (1956) afirma que os setores governamentais locais podem agir como empresas em mercados competitivos; assim, com o crescimento da
competição entre as jurisdições locais para prover melhores bens e serviços públicos,
haveria uma tendência de estas jurisdições realizarem uma provisão Pareto-eficiente
de bens e serviços públicos. Porém, esta maior autonomia gerada pela descentralização
fiscal e administrativa pode também causar maiores facilidades para criar ineficiências
na geração de bem-estar social por parte dos entes federativos, já que há a possibilidade de grupos de interesses locais capturarem parte deste bem-estar social gerado
pela provisão de bens e serviços públicos, uma vez que estes grupos podem realizar
pressões para que os recursos sejam direcionados para a provisão de bens e serviços que
atendam a seus interesses privados, diminuindo o bem-estar social da coletividade.
2.3 Bem-estar social
Embora poucas pessoas discordem de que o bem-estar é um fenômeno multidimensional, a maior parte das análises sobre pobreza, desigualdade e bem-estar
permanece atribuindo um peso elevado, senão exclusivo, às variáveis monetárias.1
Medidas tradicionais de desigualdade, como os índices de Gini, Theil e o próprio
índice de Atkinson, são frequentemente associados à desigualdade de renda de
uma distribuição; porém, deixam para segundo plano o aspecto multidimensional
da desigualdade (ATKINSON; BOURGUIGON, 1982; DARDANONI, 1995).
Contudo, quando o foco é o bem-estar, é imprescindível considerar outras variáveis, ao menos tão importantes para a caracterização da qualidade de vida de uma pessoa
quanto à renda (SEN, 1992, 1997). Este exercício passa por duas etapas. A primeira
1. Deve-se notar que há um número crescente de trabalhos utilizando indicadores multidimensionais de pobreza e
bem-estar. Para uma aplicação para o município de Porto Alegre, ver Picolotto et al. (2007).
Desigualdades Regionais e Bem-Estar no Brasil...
295
concerne à escolha das variáveis relevantes, isto é, refere-se à construção do espaço informacional no qual serão avaliadas as diferentes dimensões que compõem o bem-estar.
A segunda envolve a construção de funções de agregação – índices ou escolha de uma
função de bem-estar social. O exercício, portanto, envolve fundamentalmente um problema de ordem normativa (SEN, 1992). Apesar das dificuldades associadas às formulações de funções de bem-estar social, a literatura avançou consideravelmente nos últimos
30 anos (SEN, 1997). Indicadores como o IDH e o Índice de Pobreza Humana (IPH),
por exemplo, são tentativas empregadas para lidar com a multidimensionalidade.
Em trabalhos aplicados, no entanto, é usual utilizar alguma medida de bemestar abreviada. De acordo com Fields (2001) e Lambert (2001), um modo alternativo de realizar avaliações de bem-estar é por meio das chamadas funções
de bem-estar social abreviadas (abbreviated social welfare functions). Uma função
de bem-estar social é denominada abreviada se a medida de bem-estar é obtida
a partir de estatísticas calculadas de um vetor de distribuição de rendas, do tipo:
W = w(PIBpc,desigualdade, pobreza)
em que: W representa bem-estar social, PIBpc é o PIB per capita e as medidas de
desigualdade e pobreza são mensuradas com o emprego de índices.2 Assume-se que
a função de bem-estar é crescente no PIB per capita e decrescente na desigualdade
e pobreza. Isto é:
w1  0, w 2  0 e
.
A dificuldade de realizar julgamentos – ou ordenamentos – surge quando, por
exemplo, um aumento do PIB per capita é acompanhado de um aumento na
desigualdade. Neste caso, faz-se necessário aplicar algum critério para comparar
dois – ou mais – estados sociais.
As análises de dominância de primeira e segunda ordem são os métodos comumente empregados na avaliação e comparação de bem-estar social entre dois –
ou mais – estados sociais distintos. Basicamente, a análise de dominância de primeira ordem compara o nível de bem-estar de duas distribuições de renda por
meio das curvas de Lorenz (L).3 Neste caso, dadas duas distribuições de renda F e
G, diz-se que uma distribuição de renda F domina em primeira ordem G se e somente se a área entre a curva de Lorenz de F e a linha de igualdade perfeita (linha
de 45º) for menor do que a área formada pela curva de Lorenz de G. O gráfico 1
a seguir ilustra este resultado.
2. Para uma introdução aos índices de pobreza e desigualdade, ver, por exemplo, Ray (1998) e Fields (2001).
3. Este resultado foi obtido por Atkinson (1970 apud LAMBERT, 2001) e em função disto passou a ser conhecido como
Teorema de Atkinson.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
296
GRÁFICO 1
Curvas de Lorenz para diversas situações de (des)igualdade de renda
1
0.9
0.8
0.7
L(p)
0.6
0.5
0.4
0.3
0.2
0.1
0
0
0.1
0.2
0.3
0.4
0.5
0.6
0.7
0.8
0.9
1
Percentiles (p)
G
F
Fonte: Software DAD.
Elaboração dos autores.
Esse método, no entanto, não está desprovido de problemas. Por exemplo,
quando duas curvas que representam a desigualdade4 de duas distribuições se cruzam ou coincidem, não é possível ordenar os dois estados sociais usando-se apenas
a desigualdade como critério de avaliação do nível de bem-estar.
Nessas circunstâncias, utiliza-se a análise de dominância de segunda ordem, que permite comparar estados sociais que se distinguem pelo valor da média da distribuição, e não apenas pela medida de desigualdade da distribuição
empregada – coeficiente de Gini, especificamente.5
A curva de Lorenz generalizada (GL) permite ordenar dois estados sociais que apresentam a mesma distribuição de renda – ou de outra variável –,
mas rendas médias diferentes, ou seja, a GL é sensível à média da distribuição uma vez que GL  µL .6
4. As curvas a que o argumento se refere são as curvas de Lorenz. Para uma introdução às medidas gráficas de desigualdade, ver Fields (2001) e Ray (1998).
5. Para uma introdução aos teoremas de dominância de primeira e segunda ordem, ver Fields (2001). Lambert (2001)
provê uma análise pormenorizada dos teoremas e de suas aplicabilidades.
6. Embora as análises de dominância selecionem o espaço das rendas, é possível empregar a mesma metodologia para
quaisquer indicadores que constituam uma função de bem-estar que seja anônima, quase-côncava e crescente nos
argumentos (SEN, 1997). Este resultado também é conhecido como Teorema de Shorrocks.
Desigualdades Regionais e Bem-Estar no Brasil...
297
Nesse sentido, a avaliação de bem-estar exige a escolha da distribuição de
uma ou mais variáveis e, consequentemente, da média e de uma medida de desigualdade provenientes da mesma distribuição. Em outras palavras, medir bemestar requer a escolha de alguma medida de desigualdade.
Para os propósitos deste trabalho, selecionou-se o IDH como proxy para o
bem-estar médio das pessoas que residem nos diferentes estados brasileiros. Ainda que o IDH não considere a desigualdade de renda – ou de qualquer outra variável – no seu cômputo, a opção pelo IDH decorreu basicamente do fato de ser
um índice composto por três dimensões – renda per capita, expectativa de vida
ao nascer e escolaridade. Talvez, o ideal fosse substituir “bem-estar” por outra
terminologia, por exemplo, pela expressão “qualidade de vida”.7 Neste artigo, a
análise da desigualdade foi feita separadamente da análise do bem-estar – ou melhor dizendo, da “qualidade de vida”. O índice de desigualdade selecionado para
a comparação dos estados foi o Índice de Theil. Esta opção se deveu à possibilidade de decompô-lo por meio do Índice de Malmquist, como será visto adiante.
3 A DIFERENÇA NAS EFICIÊNCIAS DOS ESTADOS BRASILEIROS
E O BEM-ESTAR: METODOLOGIA
Neste artigo, adotamos como método de análise empírico a Análise Envoltória
de Dados, cuja sigla em inglês é DEA. Este método é um dos métodos possíveis
para se construir em fronteiras de eficiência. As metodologias de fronteira de eficiência trabalham com a ideia de função de produção, ou seja, de combinações entre
insumos e produtos, tal qual uma “receita de bolo” – quantidade de ingredientes
que são combinados e produto final gerado. Dessa forma, é possível a comparação
de combinações entre recursos – insumos – e resultados obtidos – produtos – em
relação às políticas públicas.
O DEA, que é um dos métodos mais utilizados, de acordo com Faria
(2006), foi desenvolvido em 1978 por Edward Rhodes em sua tese de doutorado,
cujo objetivo era avaliar a eficiência das escolas públicas. O DEA é um método
não paramétrico, ou seja, não assume uma forma funcional específica e constrói
uma fronteira de eficiência a partir dos dados. Dessa forma, a comparação entre
recursos despendidos e resultados é entre as unidades de decisão que estão sendo
avaliadas. Ou seja, a comparação é relativa.
7. Para as diferenças entre os termos “qualidade de vida” e “bem-estar”, ver Sen (1992, 1999).
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
298
FIGURA 1
Representação gráfica do esquema geral da análise envoltória de dados
Resultados
Envoltória
Rmax
Esforço
necessário
Boas
Práticas
Média
I1
Recursos
Fonte: Faria (2006, p. 3).
A fronteira de eficiência relaciona as combinações ótimas de recursos de resultados, ou seja, os casos de boas práticas de gestão dos recursos públicos. Os casos internos à fronteira são considerados como ineficientes, isto é, com os recursos
investidos seria possível obter um resultado melhor (ver figura 1).
O emprego dessa metodologia representa, em certo sentido, um avanço a
trabalhos que empregam um procedimento não paramétrico para a comparação
de desempenho a partir de indicadores de eficiência. Por exemplo, o trabalho de
Teixeira e Barroso (2003) discute a qualidade do gasto em saúde, correlacionando
despesas na área de saúde e pontuação pelo Índice de Desenvolvimento Humano
(IDH-M) para os municípios brasileiros. A não adoção de um método mais robusto dificulta a comparação e, portanto, a recomendação de políticas públicas.
Nesse sentido, o estudo de Faria (2006), que também adota o DEA, é mais
preciso, uma vez que a análise permite a identificação dos municípios fluminenses
que são eficientes no uso de recursos públicos para provimento de bens públicos
e quase-públicos.
Ainda na mesma direção, Boueri e Gaparini (2007) buscam avaliar a eficiência dos gastos públicos na área do social para a totalidade dos municípios brasileiros
em 2000. Foram escolhidas como variáveis de produto o número de crianças matriculadas em escolas públicas municipais, o número de internações realizadas na
rede hospitalar municipal e o número de domicílios servidos com coleta de lixo.
A variável de insumo escolhida foi a despesa orçamentária dos municípios. Os autores concluem que os municípios menores são relativamente ineficientes, pois detectam que há perdas de escala na provisão municipal de serviços básicos.
Desigualdades Regionais e Bem-Estar no Brasil...
299
Diferentemente dos trabalhos que analisam a eficiência do gasto, optamos
por analisar a eficiência do uso de receitas e transferências tributárias, tal qual
Shikida, Milton e Araújo Jr. (2007) fizeram para os municípios mineiros. A justificativa para tal escolha de insumo é a de ressaltar que a arrecadação por parte
do Estado é feita de modo compulsório e, particularmente no Brasil, a carga tributária é elevada, o que nos faz pensar na eficiência da aplicação destes recursos.
Vale dizer que Lima e Boueri (2008) também buscam analisar a evolução
do IDH entre os estados da federação e adotam medidas de distância calculadas
a partir do DEA. Porém, diferentemente do que fazemos, estes exploram cada
componente do IDH, usando informações da Pesquisa Nacional por Amostra
de Domicílios (PNAD) e do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica
(SAEB). O interessante, todavia, é que os resultados gerais são comparáveis aos
nossos para o IDH e paralelos podem ser estabelecidos.
3.1 Economias de escala e progresso técnico
Uma das limitações do método original de envoltória de dados era que a função
de produção assumida possuía retornos constantes de escala. Charnes, Cooper
e Rodes (1978), por exemplo, assumiram retornos constantes de escala e que
todas as Decision Making Units (DMUs) – ou Unidades de Decisão – estariam
em uma escala ótima de operação. Este pressuposto, no entanto, é incompatível com uma série de atividades econômicas. Podemos inclusive considerar
que mesmo para o Estado, que oferta bens públicos, este pressuposto é pouco
aderente. Por isso, Banker, Charnes e Cooper (1984) suprimiram o pressuposto
de retorno constante de escala e passaram a supor retornos variáveis de escala.
Assim, as DMUs não precisam operar em escala ótima, sendo este caso mais
comum devido a algum tipo de restrição, seja no insumo, seja no produto.
Como os estados brasileiros sofrem restrições financeiras, a formulação do
modelo DEA que utilizamos neste artigo é a de Banker, Charnes e Cooper (1984),
com a orientação produto – foco na (in)eficiência do produto gerado, dado um nível de insumos utilizados –, pois o objetivo é analisar a eficiência na geração de desenvolvimento humano e na redução de desigualdade – eficiência no bem-estar –,
portanto, a partir do uso das receitas e transferências tributárias pelos estados
brasileiros. Por isso, a orientação produto é a mais indicada.
Já que estamos trabalhando com um painel de dados, isto é, unidades da
federação em 1991 e 2000, é preciso analisar a eficiência ao longo do tempo.
Malmquist (1953) foi o pioneiro na análise da variação de índices de produtividade ao longo do tempo. Para o autor, dois são os efeitos que podem fazer que a produtividade mude intertemporalmente. O primeiro destes é chamado de catch-up,
ou efeito de recuperação. Neste caso, dada uma tecnologia disponível, a DMU
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
300
conseguiu melhor utilizar os seus insumos na geração de produto, aproximandose da fronteira de eficiência mudança pura de eficiência. O segundo efeito é o de
deslocamento da fronteira de eficiência no tempo. Isto implica uma mudança na
tecnologia disponível que favoreceu a variação na produtividade da DMU mudança na escala de eficiência. Dessa forma, conforme explica Tone (2004), estes
dois efeitos podem ser calculados pelo Índice de Malmquist, computado como:
IM = (Efeito ‘Catch-up’) x (Efeito Deslocamento)
Neste artigo, além de verificarmos as fronteiras de eficiência em 1991 e
2000, por meio da decomposição do Índice de Malmquist, avaliamos os fatores
que alteraram as (in)eficiências dos estados brasileiros.
3.2 Dados amostrais
Os dados que são utilizados na análise empírica deste trabalho são as receitas e
transferências tributárias, o Índice de Desenvolvimento Humano e o Índice L de
Theil, de cada um dos 26 estados brasileiros mais o Distrito Federal. A análise
refere-se somente ao período de 1991 e 2000 devido à disponibilidade de dados
referente ao IDH, pois não há dados mais recentes disponíveis sobre o IDH dos estados brasileiros. Para realizar as medidas de eficiência por meio do método DEA,
são utilizadas as seguintes variáveis (ver representação esquemática na figura 2):
•
Insumos: as receitas e transferências tributárias de cada um dos 26 estados brasileiros mais o Distrito Federal, referentes aos 1991 e 2000.
Estes dados foram elaborados pela Coordenação-Geral das Relações e
Análise Financeira de Estados e Municípios (Corem) e disponibilizados
pela Secretaria do Tesouro Nacional (STN).
•
Produtos: para a mensuração da eficiência na geração de bem-estar, utiliza-se como produto o IDH de cada um dos 26 estados brasileiros mais
o Distrito Federal, referente a 1991 e 2000. Já para a mensuração da
eficiência na redução da desigualdade, utiliza-se o inverso8 do Índice L
de Theil de cada um dos 26 estados brasileiros mais o Distrito Federal,
referente a 1991 e 2000. A fonte destes dados é o Atlas do Desenvolvimento Humano, elaborado e disponibilizado pelo Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE).
8. Já que quanto maior o Índice L de Theil maior a desigualdade de renda, adotamos o seu inverso como medida, pois
avaliamos a eficiência das unidades da federação na redução das desigualdades, isto é, quanto menor o Índice L de
Theil obtido mais eficiente é o estado.
Desigualdades Regionais e Bem-Estar no Brasil...
301
FIGURA 2
Representação das relações insumo – processamento – produto assumidas para
aplicação da metodologia DEA
Receitas tributárias
Desenvolvimento
humano
Gestão
pública
estadual
Desigualdade de
renda
Receitas de
transferências
Elaboração dos autores.
Para a mensuração do Índice de Malmquist e suas decomposições, são utilizados os mesmos dados para o cálculo das medidas de eficiência pelo método
DEA. Para cada série, os scores são rodados separadamente para 1991 e 2000.
Uma vez calculados, os resultados são empilhados por tipo de produto a que se
referem (IDH ou o inverso do L-Theil) e relacionados às suas respectivas unidades de federação. Dessa forma, procedemos o cálculo do Índice de Malmquist
e suas decomposições.
É importante mencionar que as medidas são imperfeitas e não são temporalmente causais entre si, mas correlacionadas. O IDH refere-se a resultados cumulativos e de longo prazo. Se quiséssemos estabelecer uma relação mais fiel à ideia de
insumo e produto, teríamos que retroceder a receita estadual a períodos bastante posteriores e acumulá-los. Neste artigo, fazemos um exercício de natureza exploratória.
4 EFICIÊNCIA DA TRIBUTAÇÃO EM RELAÇÃO AO DESENVOLVIMENTO HUMANO
Esta seção apresentará uma discussão sobre a classificação dos estados brasileiros
com base no IDH e suas decomposições a partir do Índice de Malmquist. A tabela 1 traz as estatísticas descritivas do IDH para 1991 e 2000.
TABELA 1
Estatísticas descritivas
IDH 1991
IDH 1991
Média
0,661
0,738
Mediana
0,664
0,735
Moda
0,753
0,773
(Continua)
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
302
(Continuação)
IDH 1991
IDH 1991
Desvio-padrão
0,073
0,058
Mínimo
0,543
0,636
Máximo
0,799
0,844
Estatística t = -4,29
Elaboração dos autores.
Como mostra a tabela 1, em 1991, o menor Índice de Desenvolvimento
Humano foi de 0,543. Este valor foi registrado pelo estado do Maranhão. O maior
valor foi registrado no Distrito Federal (ver tabela 2 a seguir). Chama atenção,
por outro lado, a evolução do IDH neste período. Em um intervalo de dez anos,
notou-se um aumento não desprezível de todas as medidas de posição – média,
moda, mediana, máximo e mínimo. O teste t para a diferença entre as médias é
estatisticamente significante ao nível de 5%.
O gráfico 2 exibe as curvas de Lorenz e as curvas de Lorenz generalizadas para
os IDHs de 1991 e 2000.
GRÁFICO 2
1
0.9
0.9
0.8
0.8
0.7
0.7
0.6
0.6
L(p)
L(p)
Análise de dominância de primeira e segunda ordem para o IDH dos estados
1
0.5
0.5
0.4
0.4
0.3
0.3
0.2
0.2
0.1
0.1
0
0
0.1
0.2
0.3
0.4
0.5
0.6
Percentiles (p)
IDH 1991
0.7
IDH 2000
0.8
0.9
1
0
0
0.1
0.2
0.3
0.4
0.5
0.6
Percentiles (p)
IDH 1991
0.7
0.8
0.9
1
IDH 2000
Fonte: Dados divulgados no Ipeadata.
Elaboração dos autores.
O primeiro gráfico traz as curvas de Lorenz para o IDH dos estados em
1991 e 2000. As linhas não se cruzam, mas são quase colineares. De qualquer
maneira, a linha cheia preta, que representa a desigualdade da distribuição do
IDH de 2000, está mais próxima da linha preta de 45º, que representa a linha de
igualdade perfeita. O segundo gráfico realça a diferença. De acordo com as curvas
de Lorenz generalizadas, nota-se que a distribuição do IDH de 2000 domina em
segunda ordem a distribuição de 1991. Isto significa, portanto, que é possível afirmar que em 2000 houve uma melhoria no desenvolvimento humano dos estados.
Desigualdades Regionais e Bem-Estar no Brasil...
303
As primeiras colunas da tabela 2 apresentam o resultado da eficiência na
geração de bem-estar obtido pelos estados brasileiros para 1991. Os resultados
do modelo apontam como eficientes na geração de bem-estar em1991 Distrito
Federal, Mato Grosso do Sul, Roraima, Santa Catarina, Goiás e Amapá, a partir
da combinação de insumos e produtos e em seu nível de escala de operação, ou
seja, os estados que estão no nível máximo de eficiência relativa aos outros estados com mesma escala de operação – estados eficientes possuem score igual a 1 e
estados ineficientes têm score menor do que 1.
A tabela 2 também contém os níveis de IDH de cada estado brasileiro
em 1991 e 2000. Observa-se que os estados considerados eficientes com base
nos scores possuem níveis de IDH diferentes em 1991, ou seja, verifica-se que
Amapá e Roraima operam eficientemente em um nível de escala menor; Goiás
e Mato Grosso do Sul operam eficientemente em um nível intermediário de
escala, enquanto Distrito Federal e Santa Catarina operam de forma eficiente
em um nível mais elevado.
Ainda de acordo com a tabela 2, os dez estados menos eficientes na geração
de bem-estar em 1991 são os estados do Tocantins em conjunto com todos os
estados da região Nordeste, pois, de acordo o método DEA orientação produto,
mantidos os insumos constantes, o produto – neste caso, o IDH – poderia ser
mais elevado, dado o nível de operação de escala destes estados; por isso, estes
estados foram considerados os menos eficientes em relação aos outros.
TABELA 2
Scores de eficiência dos estados na geração de bem-estar – 1991 e 2000
Rank
Unidade
IDH 1991
Score
Rank
Unidade
IDH 2000
1
DF
0,799
1
1
DF
0,844
Score
1
2
MS
0,716
1
2
MS
0,778
1
3
RR
0,692
1
3
SC
0,822
1
4
SC
0,748
1
4
RR
0,746
1
5
GO
0,70
1
5
AM
0,713
1
6
AP
0,691
1
6
RS
0,814
0,98
0,98
7
SP
0,778
0,99
7
MT
0,773
8
RS
0,753
0,99
8
GO
0,776
0,98
9
RJ
0,753
0,98
9
RJ
0,807
0,97
10
MT
0,685
0,96
10
ES
0,765
0,97
11
ES
0,69
0,95
11
SP
0,82
0,97
12
PR
0,711
0,94
12
RO
0,735
0,97
13
RO
0,66
0,93
13
AP
0,753
0,96
14
AM
0,664
0,91
14
PR
0,787
0,95
15
AC
0,624
0,90
15
TO
0,71
0,94
16
MG
0,697
0,89
16
AC
0,697
0,93
(Continua)
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
304
(Continuação)
Rank
Unidade
IDH 1991
Score
Rank
Unidade
IDH 2000
Score
17
PA
0,65
0,88
17
MG
0,773
0,92
18
TO
0,611
0,87
18
RN
0,705
0,91
19
RN
0,604
0,85
19
PA
0,723
0,91
20
SE
0,597
0,85
20
SE
0,682
0,89
21
PE
0,62
0,81
21
CE
0,7
0,86
22
PI
0,566
0,80
22
PE
0,705
0,86
23
CE
0,593
0,79
23
PI
0,656
0,86
24
PB
0,561
0,78
24
PB
0,661
0,85
25
AL
0,548
0,77
25
AL
0,649
0,85
26
BA
0,59
0,76
26
BA
0,688
0,83
27
MA
0,543
0,75
27
MA
0,636
0,82
Fonte: Dados divulgados no Ipeadata.
Elaboração dos autores.
Observando-se as últimas colunas da tabela 2, verifica-se que os estados mais eficientes na geração de desenvolvimento humano em 2000 são os
estados do Distrito Federal, Mato Grosso do Sul, Santa Catarina, Roraima e
Amazonas. Por outro lado, o estado de Goiás deixa de ser o mais eficiente na
geração de bem-estar em 2000, como indicaram os resultados da tabela 2 para
1991. Com uma nova combinação de insumos e produtos e dado seu nível
operacional de escala, seu produto poderia ser maior. Ademais, verifica-se que
os estados do Rio Grande do Sul, Mato Grosso e Tocantins obtiveram um
aumento na eficiência em gerar bem-estar, diminuindo suas ineficiências em
relação aos estados mais eficientes.
Além disso, pela última coluna também pode ser constatado que o estado
do Tocantins não figura entre os dez mais ineficientes, sendo esta posição assumida pelo estado do Pará e, assim como em 1991, os estados da região Nordeste completam esta lista dos dez menos eficientes na geração de bem-estar.
Já a tabela 3 mostra os resultados obtidos com o cálculo do Índice de
Malmquist e suas decomposições. Os estados mais produtivos na geração de
desenvolvimento humano no período 1991-2000, dadas as mudanças no Índice de Mudança na Eficiência Técnica Pura (IMETP) e mudanças no Índice
de Mudança na Escala de Eficiência (IMEE), foram: São Paulo, com IMEE
alto; Rio de Janeiro, com ambos os índices elevados; Rio Grande do Sul, também com ambos os índices elevados; Goiás, com o maior IMEE; e, Roraima,
também com um elevado IMEE influenciando o seu Índice de Malmquist.
Os estados com os maiores IMEEs são, respectivamente: Goiás, Amapá, São
Paulo, Paraná e Mato Grosso do Sul.
Desigualdades Regionais e Bem-Estar no Brasil...
305
TABELA 3
Índice de Malmquist para os estados – decomposição do IDH
Unidade
IMETP
IMEE
SP
0,919
4,635
Índice de Malmquist
4,261
RJ
1,829
2,289
4,187
RS
1,45
2,644
3,834
GO
0,693
5,434
3,763
3,687
SC
1,092
3,376
AP
0,67
5,306
3,556
MS
0,869
3,907
3,396
ES
1,219
2,747
3,348
MG
1,33
2,485
3,305
PR
0,787
4,098
3,224
AC
0,992
3,1
3,076
MT
0,813
3,71
3,016
RR
1
2,797
2,797
BA
1,322
2,081
2,751
PE
1,148
2,34
2,686
AM
2,113
1,269
2,681
CE
1,151
2,175
2,503
PA
0,747
3,175
2,373
AL
1,072
2,115
2,268
RO
1,321
1,71
2,259
RN
0,83
2,705
2,244
PB
0,773
2,879
2,224
SE
0,867
2,555
2,214
2,163
DF
0,916
2,362
PI
0,917
2,362
2,162
MA
0,88
2,422
2,132
TO
0,869
2,405
2,09
Elaboração dos autores.
Com o IMETP, que pode ser interpretado como uma aproximação em relação à fronteira de eficiência na geração de desenvolvimento humano, podemos
analisar se há convergência nos níveis de IDH entre os estados brasileiros. Assim,
os estados com os maiores IMETPs são: Amazonas, Rio de Janeiro, Rio Grande
do Sul, Minas Gerais e Rondônia. Os estados com os menores IMETPs são: Amapá, Goiás, Pará, Paraíba e Paraná.
Dessa forma, observando-se a tabela 3, podemos concluir que todos os estados tornaram-se mais produtivos na geração de bem-estar no período 1991-2000,
pois não há nenhum estado com um Índice de Malmquist menor do que a unidade. Esta maior produtividade também pode ser verificada por meio das tabelas 2
e 3, em que se constata que o estado menos eficiente na geração de bem-estar em
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
306
1991 é o mesmo que em 2000, no caso o estado do Maranhão; porém, seu score
em 1991 foi de 0,74542, enquanto em 2000 seu score foi de 0,82050. Com isso,
apesar de ainda ser considerado o menos eficiente na geração de bem-estar em
relação aos outros estados, o estado do Maranhão conseguiu ser mais produtivo e
diminuir a distância em relação ao estado mais eficiente em 2000.
5 EFICIÊNCIA DA TRIBUTAÇÃO NA REDUÇÃO DA DESIGUALDADE DE RENDA
Na tabela 4, encontram-se as estatísticas descritivas dos indicadores de desigualdade de renda. De acordo com esta tabela, o maior índice de desigualdade registrado em 1991 foi de 0,809 ao passo que o menor foi de 0,54. Em 2000, houve
um aumento na desigualdade de acordo com todas as medidas de posição. Embora a média da desigualdade entre 1991 e 2000 tenha aumentado, a mudança não
foi estatisticamente significante ao nível de 5%, como mostra o valor da estatística
t (-1,37). Ou seja, a desigualdade não se alterou substancialmente.
TABELA 4
Estatísticas descritivas dos indicadores de desigualdade
Theil 1991
Theil 2000
Média
0,685
0,7103
Mediana
0,695
0,7180
Modo
0,737
0,8160
Desvio-padrão
0,068
0,0706
Mínimo
0,540
0,5510
Máximo
0,809
0,8160
Estatística t = -1,37
Fonte: Dados divulgados no Ipeadata.
Elaboração dos autores.
Aqui vale um breve comentário. Pela discussão da seção 2.3 e de acordo com as estatísticas descritivas do IDH, o que se observa é justamente
um aumento na qualidade de vida acompanhado por uma elevação na desigualdade. Este é exatamente o problema de se tratar bem-estar sem levar
em conta, concomitantemente, uma medida de desigualdade na função de
bem-estar social.
A quarta coluna da tabela 5 exibe os scores de eficiência dos estados na redução da desigualdade de renda. Os resultados obtidos mostram a (in)eficiência dos
estados brasileiros na redução das desigualdades em 1991, sendo os insumos as
receitas e transferências tributárias, e o produto o Índice L de Theil de cada um
dos 26 estados brasileiros mais o Distrito Federal.
Desigualdades Regionais e Bem-Estar no Brasil...
307
TABELA 5
Scores de eficiência dos estados na redução de desigualdade
Inverso do
Unidades
1
RR
0,737
1
1
AL
0,816
1
2
CE
0,800
1
2
AM
0,786
1
3
BA
0,809
1
3
RR
0,643
1
4
MS
0,652
1
4
CE
0,816
1
Índice de Theil
Score 1991
Rank
Inverso do
Rank
Unidades
Índice de Theil
Score 2000
5
GO
0,607
1
5
PI
0,796
0,983
6
AP
0,602
1
6
PE
0,795
0,974
0,957
7
PE
0,791
0,997
7
DF
0,781
8
PI
0,747
0,996
8
BA
0,775
0,950
9
PB
0,737
0,972
9
SE
0,763
0,938
10
RN
0,725
0,961
10
MA
0,758
0,929
11
AC
0,707
0,959
11
TO
0,738
0,923
12
TO
0,712
0,959
12
AC
0,718
0,912
13
SE
0,704
0,941
13
PA
0,744
0,912
14
AL
0,697
0,930
14
MS
0,692
0,904
15
MT
0,638
0,925
15
PB
0,734
0,900
16
AM
0,698
0,924
16
RN
0,731
0,896
17
RO
0,692
0,923
17
AP
0,708
0,871
18
DF
0,713
0,906
18
RO
0,639
0,846
19
ES
0,655
0,896
19
MT
0,685
0,844
20
PA
0,688
0,885
20
MG
0,671
0,822
21
PR
0,652
0,859
21
ES
0,651
0,815
22
MG
0,695
0,859
22
RJ
0,664
0,814
23
RJ
0,673
0,838
23
PR
0,652
0,799
24
MA
0,636
0,838
24
GO
0,648
0,798
25
RS
0,635
0,798
25
RS
0,617
0,756
26
SC
0,542
0,734
26
SP
0,607
0,744
27
SP
0,540
0,667
27
SC
0,551
0,675
Fonte: Dados divulgados no Ipeadata.
Elaboração dos autores.
Segundo os resultados da tabela 5, em 1991 os estados mais eficientes na
redução de desigualdade em 1991 foram: Roraima, Ceará, Bahia, Mato Grosso
do Sul, Goiás e Amapá. Os inversos dos Índices L de Theil para 1991 e 2000
sugerem que os estados do Amapá, Goiás, Mato Grosso do Sul operam eficientemente em um nível de escala menor; o estado de Roraima opera de forma
eficiente em um nível intermediário; e os estados da Bahia e do Ceará operam
em um nível elevado de eficiência. Além disso, constata-se que os estados menos
eficientes na redução de desigualdade foram, respectivamente: São Paulo, Santa
Catarina, Rio Grande do Sul, Maranhão, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Paraná,
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
308
Pará, Espírito Santo e Distrito Federal. Ou seja, exceto os estados do Pará e do
Maranhão, os estados da região Centro – Sul figuram entre os que menos reduziram a desigualdade em 1991.
Observando a última coluna da tabela 5, os estados considerados como
os mais eficientes na redução de desigualdade em 2000 foram respectivamente:
Alagoas, Amazonas, Roraima e Ceará. Observando-se o inverso do Índice L de
Theil, verificamos que Roraima opera eficientemente em um nível baixo de escala; Amazonas opera de forma eficiente em um nível intermediário de escala; e
os estados de Alagoas e do Ceará operam eficientemente em um nível elevado de
escala. Em 2000, com exceção de Rondônia, predominam os estados da região
Centro – Sul como os mais ineficientes na redução de desigualdade. São estes,
respectivamente: Santa Catarina, São Paulo, Rio Grande do Sul, Goiás, Paraná,
Rio de Janeiro, Espírito Santo, Minas Gerais, Mato Grosso e Rondônia.
A tabela 6 apresenta os resultados obtidos com o cálculo do Índice de Malmquist
e suas decomposições para o período 1991-2000.
TABELA 6
Índice de Malmquist para os estados – decomposição do Índice L de Theil
Unidade
IMETP
IMEE
Índice de Malmquist
AC
0,888
3,530
3,134
AL
0,766
2,933
2,246
AP
0,603
6,491
3,193
AM
1,833
1,484
2,719
BA
1,188
2,325
2,764
CE
0,953
2,622
2,497
DF
0,779
2,739
2,133
ES
1,124
3,028
3,405
GO
0,661
6,100
4,030
MA
0,621
3,379
2,099
MT
0,681
4,478
3,047
MS
0,774
4,456
3,451
MG
1,265
2,655
3,358
PA
0,620
3,804
2,358
PB
0,651
3,377
2,199
PR
0,727
4,494
3,268
PE
1,009
2,669
2,694
PI
0,732
2,918
2,135
RJ
1,808
2,412
4,362
RN
0,696
3,188
2,220
RS
1,420
2,765
3,927
RO
1,267
1,765
2,236
RR
1,040
2,692
2,799
(Continua)
Desigualdades Regionais e Bem-Estar no Brasil...
309
(Continuação)
Unidade
IMETP
IMEE
Índice de Malmquist
SC
1,005
3,750
3,767
SP
0,876
5,383
4,713
SE
0,693
3,160
2,188
TO
0,709
2,898
2,054
Elaboração dos autores.
De acordo com o Índice de Malmquist, os estados que tiveram os
maiores ganhos de eficiência na redução de desigualdade no período 19912000 foram, respectivamente: Rio de Janeiro, São Paulo, Rio Grande do
Sul, Goiás e Santa Catarina. Os estados com os maiores IMEEs, respectivamente, são: Goiás, Paraná, Amapá, São Paulo e Mato Grosso do Sul. Os estados com os maiores IMETPs, ou seja, os estados que obtiveram os maiores
efeitos de catching-up foram: Amazonas, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul,
Rondônia e Minas Gerais.
Analisando os resultados observados para o Índice de Malmquist, conclui-se
que todos os estados obtiveram ganhos de produtividade na redução de suas desigualdades de renda, já que não houve nenhum estado com Índice de Malmquist
menor que a unidade.
6 IMPLICAÇÕES PARA DISCUSSÃO DAS DESIGUALDADES REGIONAIS
Nesta seção buscamos analisar os resultados obtidos na seção 4 com o objetivo
de verificar possíveis convergências nos níveis de IDH entre os estados brasileiros
e constatar diferenças regionais observadas com os resultados dos modelos de
eficiência da seção anterior.
Verificando-se as tabelas 2 e 5 em suas quartas colunas, constatamos
que os estados da região Centro – Sul predominam entre os dez mais eficientes na geração de desenvolvimento humano a partir das receitas e transferências tributárias e entre os dez menos eficientes na redução de suas desigualdades internas de renda. Porém, se observarmos as segundas colunas das
referidas tabelas, verificamos que em 1991 os estados da região Centro – Sul
predominam entre os estados com maiores níveis de IDH e os menores níveis de desigualdade. Uma observação interessante é o estado do Maranhão,
que em 1991 possuía o sexto melhor nível de desigualdade, porém, com
pior nível de bem-estar – ou seja, era um estado igual na pobreza e no baixo
desenvolvimento humano.
Em 2000 também predominam os estados da região Centro – Sul entre
os dez maiores níveis de IDH e os dez melhores níveis de desigualdade, conforme mostram as sétimas colunas das tabelas 2 e 5. Nesse ano, observando-se
310
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
as últimas colunas destas tabelas, constatamos que os estados da região Centro – Sul novamente estão entre os dez mais eficientes na geração de bem-estar
e os dez menos eficientes na redução de desigualdade. Com a região Nordeste
ocorre o inverso: os estados desta região estão entre os menos eficientes na
geração de desenvolvimento humano e os mais eficientes na redução de desigualdades. Já a região Norte não possui um padrão definido, pois seus estados
estão dispersos entre os mais eficientes e os menos eficientes tanto na geração
de desenvolvimento quanto na redução de desigualdade.
Entre o período 1991-2000, os estados da região Nordeste obtiveram as
maiores variações percentuais no nível de desenvolvimento humano, porém,
este aumento no nível do IDH não foi eficiente, pois com o mesmo nível de
insumos – receitas e transferências tributárias – os estados da região Nordeste
poderiam obter um nível de bem-estar mais elevado. Observando-se as tabelas
3 e 6, notamos que todos os estados brasileiros tiveram ganhos de produtividade na geração de desenvolvimento humano e na redução de desigualdade,
a partir de suas receitas e transferências tributárias – de acordo com o cálculo
do Índice de Malmquist.
6.1 Convergência do desenvolvimento humano
Nesta seção, o interesse passa a ser a possibilidade de convergência nos níveis de
IDH entre os estados brasileiros. Para esta finalidade, são utilizados os resultados
o Índice de Malmquist e suas decomposições que constam na tabela 3.
Conforme analisado por Marinho e Barreto (2001), a convergência é
avaliada a partir da decomposição do Índice de Malmquist em IMETP e
IMEE, que significam, respectivamente, o efeito catching-up e o efeito de
expansão da fronteira – dado um aumento e novas combinações de insumos
e produto. A análise de convergência é realizada a partir do conceito de
Clubes de Convergência, em que há uma convergência entre subconjuntos
de países, estados ou regiões, de acordo com Baumol, Nelson e Wolf (1994
apud MARINHO; BARRETO, 2001).
A análise empírica de Baumol, Nelson e Wolf (1994), no entanto, foi
criticada pelo viés da amostra escolhida. Porém, Quah (1993, 1996) trabalhou com metodologia não paramétrica – Cadeias de Markov – e constatou, do ponto de vista mundial, a convergência em clubes. Nesse caso, dois
grandes clubes parecem se formar ao longo do tempo: pobres e ricos – twin
peaks dynamics (ver figura 3).
Desigualdades Regionais e Bem-Estar no Brasil...
311
FIGURA 3
Dinâmica de convergência em dois clubes – “ricos” e “pobres”
Increasing incomes
Income distributions
t
t+s
Time
Fonte: Quah (1996, p. 1.049).
Do ponto de vista regional, esta é uma questão pertinente. A União
Europeia, por exemplo, por meio dos fundos de equalização entre os países,
vêm buscando diminuir as diferenças regionais internas ao continente, mas
o padrão de clubes parece prevalecer (MORA; VAYÁ; SURIÑACH, 2005).
A China, por sua vez, na espantosa trajetória de crescimento e urbanização dos
últimos 30 anos, vem acentuando as desigualdades regionais internas e obtendo trajetórias regionais divergentes (YAO; ZHANG, 2001).
Além disso, utilizamos o conceito de Convergência Condicional, que é entendido como um maior crescimento entre países ou regiões mais distantes entre
o nível inicial e o de longo prazo, conforme Barro (1991) e Barro e Sala-i-Martin
(1991). Segundo Barro e Sala-i-Martin, este tipo de convergência tem ocorrido
entre os diferentes estados dos EUA e entre regiões da Europa, diminuindo a
dispersão de renda entre estas regiões ao longo do tempo.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
312
Analisando-se as tabelas 2 e 3, verifica-se que os níveis de convergência podem ser divididos em três, criando-se assim três Clubes de Convergência entre os
estados brasileiros, quais sejam:
•
Nível de IDH elevado: compreende os estados do Distrito Federal, Santa Catarina, São Paulo, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e Paraná.
•
Nível de IDH intermediário: compreende os estados de Mato Grosso
do Sul, Goiás, Mato Grosso, Minas Gerais, Espírito Santo, Amapá,
Roraima, Rondônia, Pará, Amazonas e Tocantins.
•
Nível de IDH baixo: compreende os estados de Pernambuco, Rio Grande
do Norte, Ceará, Acre, Bahia, Sergipe, Paraíba, Piauí, Alagoas e Maranhão.
Regiões situadas mais distantes entre seu nível inicial e seu nível de longo
prazo crescem a taxas maiores, convergindo para um equilíbrio de longo prazo;
neste caso, há três níveis diferentes de convergência condicional.
Os estados situados no nível de IDH elevado estão divididos em dois subgrupos, referentes aos efeitos que proporcionam a estes estados a convergência nos níveis
de IDH. Os estados de Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro possuem
os dois efeitos contribuindo para a convergência nos níveis de IDH, ou seja, além de
obter mudanças em suas escalas de eficiência, estes estados também possuem o efeito
catching-up, que proporciona a aproximação da fronteira de eficiência.
Os estados compreendidos no nível de IDH intermediário também possuem
esta subdivisão em dois grupos. Os estados de Minas Gerais, Espírito Santo, Roraima,
Rondônia e Amazonas também possuem os dois efeitos contribuindo para a convergência nos níveis de IDH de seu Clube de Convergência. Já os estados de Mato
Grosso do Sul, Goiás, Mato Grosso, Amapá, Pará e Tocantins possuem somente o
efeito de mudanças em suas escalas de eficiência contribuindo para a convergência.
Por último, situam-se os estados do nível de IDH baixo, que também se
dividem em dois subgrupos. Os estados de Pernambuco, Ceará, Bahia, Alagoas
e Maranhão possuem os efeitos de catching-up e de mudanças em suas escalas de
eficiência contribuindo para a convergência nos níveis de IDH. Já os estados do
Rio Grande do Norte, Acre, Sergipe, Paraíba e Piauí possuem somente o efeito de
mudanças em suas escalas de eficiência contribuindo para a convergência.
Essa subdivisão mostra que os estados das regiões Sul e Sudeste – exceto
os estados de Minas Gerais e do Espírito Santo – e o Distrito Federal convergem para um nível elevado de IDH. Os estados das regiões Norte – exceto o
estado do Acre – e Centro-Oeste, com os estados de Minas Gerais e do Espírito
Santo, convergem para um nível de IDH intermediário-elevado. E os estados da
região Nordeste e o estado do Acre convergem para um nível de IDH claramente
inferior aos outros estados brasileiros, configurando a clara divisão regional existente
Desigualdades Regionais e Bem-Estar no Brasil...
313
no Brasil, em que os estados da região Centro – Sul possuem um nível de bemestar social e desigualdade muito superior aos estados da região Nordeste.
Esses dados obtidos com os modelos de eficiência na geração de desenvolvimento
humano e com o Índice de Malmquist e suas decomposições mostram que a região Nordeste ainda será a região brasileira com pior nível de bem-estar e desigualdade nos próximos anos, uma vez que constatamos, por meio da análise de convergência, que os estados
da região Nordeste somente conseguirão alcançar os estados situados no nível de IDH
elevado caso ocorra uma forte elevação no efeito catching-up e também uma forte elevação
em suas mudanças de escalas de eficiência. Além disso, os outros estados terão de sofrer
pequenas alterações nestes dois efeitos para que os estados da região Nordeste consigam
alcançar este nível mais elevado de bem-estar social, o que provavelmente não ocorrerá.
Os estados situados no nível de IDH intermediário possuem uma perspectiva mais favorável, em relação aos estados da região Nordeste, já que alguns destes
estados, principalmente, os estados de Mato Grosso do Sul, Goiás, Mato Grosso
e Minas Gerais, possuem maiores possibilidades de integrar o seleto grupo dos
estados com maior nível de IDH.
Partindo de outra seleção de insumos na aplicação da metodologia do DEA
para análise do IDH entre os estados, Lima e Boueri (2008) constatam a concentração dos estados de maior obtenção de bem-estar entre as regiões Sul, Sudeste e
Centro-Oeste e de maiores índices de evolução para os estados das regiões Norte
e Nordeste. Com relação a este último aspecto, há divergências em relação à análise que fizemos do IDH. Não seriam estes os estados que mais avançaram segundo
a análise do Índice de Malmquist. Porém, no que se refere à redução das desigualdades de renda internas, os estados da região têm avançado mais intensamente.
Porém, cabe relembrar que os insumos que utilizamos no DEA são diferentes dos
de Lima e Boueri (2008) e qualquer comparação mais aprofundada é difícil sem
que se tenham denominadores comuns do ponto de vista dos insumos.
Com relação ao federalismo fiscal, os resultados têm implicações relevantes,
embora contraditórias. A convergência em clubes pode significar uma manutenção sem prorrogação das políticas de transferências, pois haverá sempre grupos
diferentes – isto é, os mais e os menos desenvolvidos. Ou seja, a equalização não
será atingida e as transferências se perpetuarão.
Em oposição, podem-se ler os resultados de outra forma. Como as transferências estão incluídas na categoria de insumos – somadas à arrecadação tributária –, a ineficiência apresentada pelos indicadores e a questão da convergência em clubes questionam a validade da política de equalização como vem
sendo feita. Neste caso, o suplemento de recursos financeiros sem qualquer
vinculação com resultados não é a forma adequada de garantir a redução das
disparidades regionais dos indicadores de desenvolvimento humano.
planejamento e políticas públicas | ppp | n. 33 | jul./dez. 2009
314
7 CONCLUSÕES
A análise dos modelos de eficiência dos estados brasileiros na geração de desenvolvimento humano e na redução de desigualdade, com os respectivos Índices de Malmquist,
mostra que há uma clara separação entre os estados da região Centro – Sul como os mais
eficientes na geração de bem-estar e os menos eficientes na geração de desigualdade, enquanto os estados da região Nordeste são os menos eficientes na geração de bem-estar e
os mais eficientes na geração de desigualdade. Já os estados da região Norte não possuem
um padrão definido; por isso, não se podem realizar afirmações categóricas, já que os
estados desta região se situam entre os dois extremos, ou seja, os estados da região Norte
estão dispersos entre aos estados mais eficientes e os estados menos eficientes, tanto na
geração de bem-estar quanto na geração de desigualdade.
Com isso, podemos observar que essa divisão se reflete nos níveis de IDH e
do Índice L de Theil, já que os maiores índice de IDH são dos estados das regiões
Sul e Sudeste, exceto o Distrito Federal, enquanto os maiores níveis do Índice L de
Theil são dos estados da região Nordeste, exceto, novamente, o Distrito Federal.
Essa divisão sugere que não há possibilidades de acontecer uma convergência
absoluta nos níveis de IDH entre os estados brasileiros, porém há uma evidência de
que pode ocorrer convergência relativa em Clubes de Convergência, que neste caso
podem ser divididos em três grupos. O primeiro clube é formado pelos estados situados no nível de IDH elevado, ou seja, Distrito Federal, Santa Catarina, São Paulo,
Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e Paraná. No segundo, situam-se os estados em
um nível de IDH intermediário, compreendendo os estados do Mato Grosso do Sul,
Goiás, Mato Grosso, Minas Gerais, Espírito Santo, Amapá, Roraima, Rondônia,
Pará, Amazonas e Tocantins. E, por último, o terceiro clube representa os estados com
um nível de IDH baixo, ou seja, os estados de Pernambuco, Rio Grande do Norte,
Ceará, Acre, Bahia, Sergipe, Paraíba, Piauí, Alagoas e Maranhão. Esta subdivisão
em nível de IDH elevado, intermediário e baixo refere-se aos níveis observados entre
todos os estados brasileiros, segundo as possibilidades de convergência.
Os dados observados na quinta seção e discutidos na sexta permitem concluir
que dificilmente haverá uma convergência nos níveis de IDH dos estados da região
Nordeste em relação aos estados com nível mais elevado de IDH, pois, conforme o resultado do Índice de Malmquist para o IDH, todos os estados brasileiros
avançaram sua fronteira de possibilidades de produção (FPP) de desenvolvimento
humano, significando que a região Nordeste avançou; porém, os estados das outras
regiões do Brasil também avançaram. Por isso, conclui-se que a convergência será
relativa aos três Clubes de Convergência, conforme as definições mencionadas.
Em relação às diferenças nos scores dos estados brasileiros na eficiência na
geração de desenvolvimento humano, conforme exposto na tabela 2, uma interpretação livre seria que estas diferenças se devem a uma possível presença de um
Desigualdades Regionais e Bem-Estar no Brasil...
315
comportamento rent-seeking por agentes privados, que buscam direcionar recursos para atender a seus interesses em detrimento de um maior nível de bem-estar
coletivo. Porém, o método escolhido (DEA) e os dados utilizados não permitem
extrapolar para esta conclusão sem que se aprofunde nas relações causais e nos
aspectos institucionais e políticos de cada estado.
Outra interpretação possível do Índice de Malmquist e suas decomposições para o
IDH no período 1991-2000 é que este pode captar mudanças institucionais ocorridas
neste período, captar efeitos de mudanças na gestão dos recursos públicos, alterações e
criações de políticas públicas – incluindo programas sociais recentes, entre outros tipos
de ações públicas que buscam melhorar o bem-estar dos indivíduos. Ou seja, todos estes
aspectos institucionais, administrativos e também tecnológicos – neste caso, pode-se
considerar a informatização de ferramentas administrativas do setor público, entre outros – contribuíram para o aumento na produtividade na geração de bem-estar, conforme os resultados obtidos com o Índice de Malmquist e suas decomposições para o IDH.
Além disso, o Índice de Malmquist e suas decomposições para o IDH mostram que há possibilidades de os estados brasileiros gerarem maior bem-estar aos
indivíduos por meio do uso mais eficiente desta expansão da fronteira de possibilidades de produção de desenvolvimento humano, pois a decomposição pelo
IMETP indica que o efeito catching-up poderia ser maior para vários estados
brasileiros, conforme resultados na tabela 3. Desse modo, as mudanças institucionais, as mudanças nas políticas públicas e também as melhorias na gestão dos
recursos podem ser utilizadas de forma mais eficiente para que os estados brasileiros consigam gerar uma convergência maior entre os níveis de desenvolvimento
humano, diminuindo as disparidades regionais ainda hoje existentes no Brasil.
Sob o ponto de vista do federalismo fiscal, a política de transferência de
recursos para os estados pode ser lida de duas formas. A primeira, mais simplista,
é que a transferência de recursos dos estados mais ricos para os mais pobres deverá
ser mantida, uma vez que a equalização não ocorrerá. Entretanto, há outra interpretação possível – que acreditamos ser mais adequada: a manutenção da política
de transferência de recursos do modo que é feita é ineficiente para romper as desigualdades de desenvolvimento. Haveria de se elaborar, portanto, um sistema que
condicionasse recebimento de recursos e resultados – como não há atualmente.
Trabalhos futuros deverão se aprofundar nas relações de longo prazo entre IDH e
receitas estaduais – ou mesmo despesas –, acumulando-as ao longo de diversos anos antecedentes, de modo a capturar melhor a relação insumo – produto. Além disso, um passo
adicional seria explorar a causalidade, regredindo-se os scores contra variáveis explicativas.
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Colaboradores
Para os dois números da PPP, em 2009, a editoria da revista contou com a colaboração de um conjunto importante de pareceristas de diferentes instituições e regiões brasileiras. Agradecemos a cada um da listagem abaixo, pois desta colaboração
generosa dependem a melhoria contínua da qualidade e a pontualidade da PPP.
Alexandre Manoel Angelo da Silva (Ipea)
Alexandre Ywata de Carvalho (Ipea)
Ana Amélia Camarano (Ipea)
Ana Maria Nogales (UnB)
André B. Goligher (UFMG)
Andre Gambier Campos (Ipea)
Anita Kon (PUC/SP)
Aristides Monteiro Neto (Ipea)
Benny Schasberg (UnB)
Brancolina Ferreira (Ipea)
Bruno de Oliveira Cruz (Ipea)
Carlos Alberto Ramos (UnB)
Carlos Henrique Corseuil (Ipea)
Carlos Wagner de Albuquerque Oliveira (Ipea)
Claudio Nazareno (Câmara dos Deputados)
Claudio Savadori Dedecca (UNICAMP)
Clélio Diniz Campolina (UFMG)
Clovis Ultramari (PUC/PR)
Daniel Ferreira Pereira Gonçalves da Matta (Ipea)
Daniel Ricardo de Castro Cerqueira (Ipea)
Danielle Alencar P. Torres (Embrapa)
Diana Meirelles da Motta (Ipea)
Eduardo Pontual Ribeiro (Cade)
Élson Luciano Silva Pires (UNESP)
Enny Schasberg(UNB)
Eustáquio José Reis (Ipea)
Fabio Domingues Waltenberg (UFF)
Fernanda Estevan (Universidade de Ottawa)
Fernando Antonio Rezende Silva (FGV)
Fernando José Pires de Sousa (UFC)
Francisco de Assis Costa (UFPR)
George Alex da Guia (Iphan)
Geraldo Magela Garcia Primo (Ipea)
Geraldo Sandoval Góes (Ipea)
Guilherme Costa Delgado (UFU)
Helio Zylberstajn (USP)
Herton Ellery Araújo (Ipea)
João Alberto de Negri (Ipea)
João Carlos Ramos Magalhães (Ipea)
João Ricardo Faria (University of Texas at El Paso)
Joaquim Bento de Souza Ferreira Filho (USP)
Jorge Saba Arbache (Banco Mundial)
José Antonio Peres Gediel (UFPR)
José Aparecido Carlos Ribeiro (Ipea)
José Aroudo Mota (Ipea)
Jose Eustáquio Ribeiro Vieira Filho (Ipea)
José Mauro de Morais (Ipea)
Juliana Dalboni Rocha (Ipea)
Katy Maia (UEL)
Lauro Roberto Albrecht Ramos (Ipea)
Leandro Piquet Carneiro (USP)
Leo Heller (UFMG)
Leonardo Monteiro Monastério (Ipea)
Leôncio José Bastos Macambira Júnior (IDT)
Liana Maria da Frota Carleial (UFPR e Ipea)
Linda Maria de Pontes Gondim (UFC)
Luciana de Barros Jaccoud (Ipea)
Luciana Mendes Santos Servo (Ipea)
Luis Augusto de Queiróz Ablas (USP)
Luis Fernando Tironi (Ipea)
Luiz Dias Bahia (Ipea)
Luiz Edmundo Horta Barbosa Costa Leite (UFRJ)
Luiz Eduardo R. Parreira (Ipea)
Luseni Maria Cordeiro de Aquino (Ipea)
Mansueto Facundo Almeida Junior (Ipea)
Marcelo Abi-Ramia Caetano (Ipea)
Marcelo Almeida de Britto (Ipea)
Marcelo Piancastelli de Siqueira (Ipea)
Marcelo Weishampt Proni (UNICAMP)
Margarida Hatem P. Coelho (Ipea)
Maria Bernadete Sarmiento Gutierrez (Ipea)
Maria Cristina Cacciamali (USP)
Maria da Conceição Sampaio (UnB)
Maria da Piedade Morais (Ipea)
Maria Lúcia Mezza (UTFPR)
Maria Luisa Marques Dias (IPARDES)
Maria Martha de Meneses Cassiolato (Ipea)
Maria Thereza Noronha Vaz (Universidade do Algarve)
Marisa Valle Magalhães (Ipardes)
Maurício de Aguiar Serra (UFPR)
Milene Takasago (UnB)
Milko Matijasic (Ipea)
Natalia Fontoura (Ipea)
Orlando Silva (UFV)
Paulo Roberto Corbucci (Ipea)
Paulo Roberto Delgado (Ipardes)
Paulo Roberto Furtado da Costa (Ipea)
Roberto de Aricó Zamboni (Ipea)
Roberto Henrique Sieczkowski Gonzalez (Ipea)
Rodrigo Mendes Pereira(IPEA)
Rogério Boueri Miranda (Ipea)
Rosana Aparecida Baeninger (UNICAMP)
Roseli Rocha dos Santos (Faculdades Integradas do Brasil)
Sergei Suarez Dillon Soares (Ipea)
Silvio Rocha Sant’ana (Esquel)
Sueli Corrêa de Faria (Associação Internacional de Planejamento e Gestão Ambiental)
Susana Peralta (Universidade Nova de Lisboa)
Tereza Cristina Cardoso de Souza Higa (UFMT)
Valdemar Ferreira de Araújo Filho (UFBA)
Valéria Villa Verde Reveles Pereira (Ipardes)
Vander Mendes Lucas (UnB)
Vanessa Fleischfresser (Ipardes)
Vanessa Petrelli Corrêa (UFU)
Wilson da Silva Gomes (UFBA)
Ipea – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
Njobs Comunicação
Coordenação
Cida Taboza
Jane Fagundes
Fábio Oki
Revisão
Cindy Nagel Moura de Souza
Clícia Silveira Rodrigues
Lizandra Deusdará Felipe
Luanna Ferreira da Silva
Regina Marta de Aguiar
Olavo Mesquita de Carvalho
Editoração
Andrey Tomimatsu
Danilo Tavares
Capa
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