23º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental III-139 - CARACTERIZAÇÃO DOS RESÍDUOS ORGÂNICOS DOMICILIARES DO MUNICÍPIO DE PORTO ALEGRE Mariza Fernanda Power Reis(1) Engenheira Química pela Universidade Pontifícia Católica (RS). Mestre em Recursos Hídricos e Saneamento pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Engenheira Química do Departamento Municipal de Limpeza Urbana de Porto Alegre. Chefe da Equipe de Reaproveitamento e responsável técnica da Unidade de Triagem e Compostagem de Resíduos Sólidos Domiciliares. Doutoranda em Recursos Hídricos e Saneamento pelo Instituto de Pesquisas Hidráulicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Diego Altieri da Silveira Engenheiro Civil pela UFRGS em 2003. Estagiário de engenharia do DMLU de Porto Alegre de 2002 a 2003. Engenheiro do DMLU de junho a setembro de 2004. Endereço(1): Av. Vicente Monteggia nº 2000, casa 8 – Vila Nova – Porto Alegre - RS - CEP: 91740290 - Brasil Tel: (051) 32667612 – Fax 32896999- e-mail: [email protected] RESUMO A composição gravimétrica dos resíduos sólidos do ponto de vista quali-quantitativo é um dos instrumentos básicos para adequação do sistema de gerenciamento, tais como a coleta, o transporte, o tratamento e a destinação final. O objetivo deste trabalho foi caracterizar os resíduos sólidos orgânicos domiciliares para subsidiar os estudos de reaproveitamento desta parcela através da digestão anaeróbia. Os resíduos orgânicos deste estudo foram provenientes da Unidade de Triagem e Compostagem do município de Porto Alegre. Foram determinadas através de amostragem e análises a composição física dos resíduos sólidos domiciliares de Porto Alegre; bem como as características físicas e químicas da matéria orgânica contida nos resíduos sólidos domiciliares. Os resultados demostraram que os resíduos sólidos domiciliares com aproximadamente 50% de matéria orgânica e esta com 50% de sólidos voláteis (média) possuem potencial de reaproveitamento da fração orgânica através da digestão anaeróbia. PALAVRAS-CHAVE: Aumento de Capacidade, Melhoria da Qualidade, Água com Alcalinidade, Coagulante Adequado, Auxiliares de Floculação. INTRODUÇÃO O conhecimento dos resíduos sólidos gerados em um município é essencial para o bom gerenciamento de cada uma das partes que compõe um sistema de limpeza público municipal, tais como: a coleta, o transporte, o tratamento e a destinação final. Considerando essa necessidade de conhecimento dos resíduos sólidos urbanos gerados no município, foi realizada em 2002 uma caracterização, objetivada a apresentar a composição gravimétrica dos resíduos sólidos domiciliares de Porto Alegre (Figura 1). Entretanto, dependendo do tipo de tecnologia utilizada para tratamento ou destinação final, é necessário realizar uma caracterização diferenciada, diretamente relacionada ao objetivo pretendido. No caso da digestão anaeróbia, por exemplo, deve-se conhecer a composição da matéria orgânica que será utilizada no reator anaeróbio para se ter uma estimativa do desempenho do processo como um todo e da produção de biogás, em particular. A digestão aneróbia desponta como uma das alternativas tecnológicas mais promissora para o tratamento de resíduos orgânicos, por ser de simples aplicação e baixo custo de instalação e manutenção, tendo como material resultante do processo composto com características essenciais de agente condicionador do solo, além de produzir uma alternativa energética pela produção de gás metano. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 1 23º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental Figura 1: Composição gravimétrica dos resíduos sólidos domiciliares de Porto Alegre - 2002 COMPOSIÇÃO GRAVIMÉTRICA DOS RESÍDUOS SÓLIDOS DOMICILIARES DE PORTO ALEGRE- RS2002 (% em peso úmido) Couros 0,55% Borracha 0,29% Plástico filme Plástico PVC 5,35% 0,13% Outros metais 0,22% Madeira 0,73% Cerâmica 0,18% Jornais Revistas 5,11% Embalagem Longa Vida 1,60% Rejeito 20,29% Matéria Orgânica facilmente biodegradável 43,83% Alumínio Trapos 0,59%Metal ferroso Vidro Isopor Plástico PET 3,53% 3,18% 2,11% 3,44% 0,48% Papelão 1,94% Papel 2,75% Plástico rígido 4,24% No estudo realizado objetivou-se dois aspectos básicos: obter a composição gravimétrica da matéria orgânica triada na Unidade de Triagem e Compostagem (UTC), ou seja, os materiais orgânicos presentes, como restos de comida, resíduos de jardinagem, etc.; caracterizar físico-químicamente a matéria orgânica triada UTC, ou seja, os parâmetros físicos como umidade e os principais constituintes químicos. O desenvolvimento desse trabalho contou com o apoio e a participação do Departamento Municipal de Limpeza Urbana da Prefeitura de Porto Alegre. MATERIAIS E MÉTODOS A composição física da matéria orgânica e a amostragem do material para a caracterização físico-química foram realizados na Unidade de Triagem e Compostagem do município de Porto Alegre. Para os ensaios físico-químicos retirou-se de cada amostra três alíquotas que foram analisadas separadamente. Para a análise física dividiu-se a matéria orgânica nos seguintes grupos: 1. Resíduos alimentares; 2. Resíduos de jardim: folhas, gramas e galhos; 3. Madeira; 4. Papel e papelão; 5. Outros: plásticos, metais, vidros, cerâmica, borrachas, tecidos, cordões, pedras. Para a análise físico-química foram selecionados os seguintes parâmetros: 1. NH3 – Nitrogênio Amoniacal; 2. DQO – Demanda Química de Oxigênio; 3. COT – Carbono Orgânico Total; 4. pH; 5. Umidade; 6. NTK – Nitrogênio Total de Kjeldhal; 7. NO2 – Nitratos; 8. NO3 – Nitritos; 9. Fósforo Total. Para obtenção do parâmetro sólidos voláteis totais utilizou-se a equação; sólidos voláteis totais = 1,8 x carbono orgânico total (KIEHL, 1998). As análises físico-químicas da fração orgânica dos resíduos sólidos domiciliares foram realizadas com as amostras compostas do material proveniente da triagem. Em laboratório são retirados apenas os materiais visivelmente inertes, tais como plásticos, vidros, madeiras e outros. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 2 23º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental RESULTADOS E DISCUSSÃO Este estudo apresenta os resultados da composição gravimétrica e das análises físico-químicas da matéria orgânica triada na Unidade de Triagem e Compostagem. A figura 2 mostra a foto dos resíduos orgânicos provenientes da triagem dos resíduos na UTC. Figura 2: Foto matéria orgânica triada na UTC Lomba do Pinheiro O resultado da composição gravimétrica da matéria orgânica biodegradável é apresentado na Figura 3. Figura 3: Composição gravimétrica da matéria orgânica triada na UTC Lomba do Pinheiro Matéria orgânica mista graúda4 12,8% Resíduos alimentares 25,1% Matéria orgânica mista 3 miúda 13,8% Outros 4,0% 2 Resíduos de jardim 20,0% Papel/papelão 24,2% Madeira 0,1% 1 Média aritmética dos valores obtidos em cada turno de trabalho; Plásticos, metais, vidros, cerâmica, borrachas, tecidos, cordões, pedras; 3 Matéria orgânica mista não identificada visualmente passante em peneira 7mm; 4 Matéria orgânica mista não identificada visualmente retido em peneira 7mm. 2 A partir da composição gravimétrica da matéria orgânica pode-se conhecer a qualidade e eficiência da triagem nas esteiras da UTC, e para isso basta observar o percentual da fração “outros”, que eqüivale ao material não biodegradável. Apenas 4,0 % do material que sai das esteiras não é orgânico, ou seja, pode-se considerar a ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 3 23º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental triagem da UTC de boa eficiência e qualidade. Observou-se também que a fração “outros” é composta principalmente por pequenos pedaços de plástico, havendo também algumas pedras, cerâmicas e vidros que dão um acréscimo considerável na massa total, tampas de metal e poucos cordões e tecidos. Em relação aos papéis e papelões notou-se que apesar do maior volume, eles obtiveram massa inferior a fração “resíduos alimentares”, pois estes possuem maior umidade (Figura 4). A fração “resíduos alimentares” está composta principalmente por cascas de frutas e legumes. A fração “resíduos de jardim” obteve também um percentual considerável, pois a caracterização foi realizada no período inicial do inverno, onde a quantidade de folhas é grande. Figura 4: Fotos da parcela de papéis presentes na fração orgânica dos resíduos sólidos domiciliares da UTC Ao final da amostragem restou um material de díficil identificação visual, aqui denominados fração orgânica mista, graúda e miúda. Para visualizar este material, realizou-se o peneiramento do mesmo com peneira fina de malha 4 mm. A matéria orgânica mista graúda é composta por pequenos pedaços de folhas e alguns pedaços de material não identificado visualmente. A matéria orgânica mista miúda tem a aparência semelhante ao composto proveniente da compostagem. A análise laboratorial destes materiais identificou que há 36,8% de sólidos voláteis totais na matéria orgânica mista miúda, e 33,6 % na matéria orgânica mista graúda. É importante salientar que estes são valores médios obtidos nas 9 amostras, com cada amostra composta de três alíquotas. Os resultados da análise físico-química estão apresentados na Tabela 1. Para obtenção dos resultados fez-se uma média aritmética para as três alíquotas retiradas de cada amostra, e também para as nove amostras. Tabela 1: Parâmetros obtidos na análise físico química da matéria orgânica triada na UTC Lomba do Pinheiro Desvio Padrão Parâmetros Média 1 Umidade (%) 62,3 6,50 pH a 5% 5,8 0,81 Carbono Orgânico Total (% C) 28,25 4,38 DQO – Demanda Química de Oxigênio (% O2) 68,78 10,46 Fósforo (mg P/kg) 1.290 337,74 Nitratos (mg NO3/kg) 632,1 212,80 Nitritos (mg NO2/kg) 3,86 1,95 Nitrogênio Amoniacal (mg N/kg) 453 89,28 Nitrogênio Total de Kjeldahl (mg N/kg) 11.689 2.082,78 Sólidos Voláteis Totais (%) 2 50,85 – 1 Média aritmética dos resultados obtidos em cada uma das 9 amostras. 2 Relação de Kiehl - Sólidos Voláteis Totais = 1,8 x Carbono orgânico total. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 4 23º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental A relação C:N de aproximadamente 24:1 obtida com os resultados das análises químicas da fração orgânica dos resíduos estudados apresenta relação adequada para o processo de digestão anaeróbia. Na digestão anaeróbia, alta relação C:N resulta em consumo rápido de nitrogênio e consequentemente baixa a produção de gás e baixa relação provoca a acumulação de amônia no reator e pH elevado que é tóxico para as bactérias metanogênicas. CONCLUSÕES Com base nos resultados obtidos da composição gravimétrica da matéria orgânica triada na UTC, conclui-se que os resíduos orgânicos apresentam baixos teores de inertes devida a eficiência da triagem. Justificando, neste caso, que a digestão anaeróbia, que exige resíduos com elevadas frações orgânicas pode ser aplicável para os resíduos gerados na UTC. A fração orgânica proveniente dos resíduos sólidos domiciliares possui potencial significativo de matéria orgânica, correspondente aos sólidos totais voláteis (cerca de 50%). Com base nos resultados preliminares desta caracterização concliu-se que o processo de digestão anaeróbia é alternativa para reaproveitamento da fração orgânica presente nos resíduos sólidos domiciliares. Estudos estão demonstrando que o reaproveitamento de resíduos orgânicos através da digestão anaeróbia com aproveitamento energético do biogás é passível de obter-se créditos carbono para viabilizar o tratamento de resíduos com este tipo de tecnologia. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. REIS, M. F. P.; REICHERT, G. A.; BRITTO, M. J. S. 2000. Segregação na origem: uma solução para a qualificação do composto produzido em unidade de triagem e compostagem de resíduos sólidos. In: Congreso Interamericano de Ingenieria Sanitaria y Ambiental. Porto Alegre. V. 27. Anais. Rio de Janeiro: ABES, p.223-224. 2. KIEHL, E. J. 1998. Manual de Compostagem. Piracicaba: Editora Ceres. 3. BARROS, A. J. M.; LEITE, V. D.; LOPES, W. D.; SILVA, J. V. N.; LUNA, M. L. D. 2004. Avaliação da remoção de sólidos e DQO em um reator na bioestabilização de resíduos sólidos orgânicos. Anais do IV Simpósio Internacional de Qualidade Ambiental. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 5