INTEGRAÇÃO ECONÔMICA REGIONAL Palestra do Sr. SGAS Instituto Rio Branco 13 de maio de 2011 Antecedentes Na década de 1950, a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), cujo papel é fundamental na história da integração latino-americana, assinalava que o desenvolvimento somente ocorreria quando os países da região deixassem de produzir exclusivamente “commodities” e passassem a produzir bens de maior valor agregado. Segundo a Comissão, os mercados nacionais eram pequenos para impulsionar a produção de bens industrializados e, portanto, a integração regional, sob a forma da criação de um mercado comum latino-americano, seria condição para a substituição de importações e produção de bens de maior valor agregado. O mercado regional ampliado e protegido ofereceria a possibilidade de maior especialização e escala necessárias para a produção, pelos países da região, de bens com melhor qualidade a custos mais baixos, tornando-os assim mais competitivos. Com o apoio da CEPAL, o Brasil iniciou negociações com os países do Cone Sul, para o estabelecimento de uma ZLC no Sul do Continente. Paralelamente à negociação da ZLC do Cone Sul, nas reuniões regulares da CEPAL continuavam as discussões sobre como implementar as idéias sobre integração regional. O processo negociador brasileiro da ZLC fundiu-se com a iniciativa desencadeada pelo Grupo de Trabalho do Comitê de Comércio da CEPAL e viria a gerar, ao final, a Associação Latino-Americana de Livre Comércio – ALALC (criada em 1960, integrada por países da América do Sul e o México). Em paralelo, El Salvador, Guatemala, Honduras, e Nicarágua (e Costa Rica, em 1963), criavam, no mesmo ano, o Mercado Comum Centro Americano – MCCA, substituído, em 1991, pelo Sistema de Integração Centro Americano – SICA. Em 1969, foi fundada, pelo Acordo de Cartagena, a Comunidade Andina. A Corporação Andina de Fomento é estabelecida em 1970 com vistas a prover assistência técnica e financeira para projetos de investimento nos países do grupo andino. Outra iniciativa representativa do processo regional é criação da Comunidade do Caribe – CARICOM – em 1973. Desde 1997 defendem o tratamento diferenciado para economias pouco desenvolvidas, incluindo prazos maiores para o cumprimento de futuros acordos de comércio. No âmbito da ALALC, além da separação do Grupo Andino (Bolívia, Chile, Colômbia, Equador e Peru), verificaram-se, ao longo das décadas de 1960 e 1970, outros obstáculos substantivos ao desenvolvimento da Associação: o Rigidez no mecanismo de desgravação tarifária (em razão do princípio de extensão automática a todos os integrantes da Associação das preferências acordadas); o Não reconhecimento de assimetrias; o Falta de complementaridade das economias dos países da região (todos produziam principalmente bens primários); o Precariedade do sistema de transporte intrarregional. A ALALC foi substituída, em 1980, pela Associação Latino Americana de Integração (ALADI), que incorporou novos princípios, de modo a permitir que cada país pudesse definir seu próprio ritmo no processo de integração regional. A ALADI foi criada ao amparo da Cláusula de Habilitação do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (GATT), adotada por ocasião da Rodada Tóquio (1979), por meio da qual é permitido celebrar acordos regionais ou globais entre países em desenvolvimento com a finalidade de reduzir ou eliminar mutuamente as travas a seu comércio recíproco. O Tratado de Montevidéu de 1980 (TM80) – instrumento jurídico constitutivo da ALADI, assinado em 12 de agosto de 1980 – estabelece como objetivo de longo prazo a criação, de forma gradual e progressiva, de um mercado comum latinoamericano. O TM80 tem os seguintes princípios gerais: o Pluralismo em matéria política e econômica; o Convergência progressiva de ações parciais para a criação de um mercado comum latino-americano; o Flexibilidade; o Tratamentos diferenciais com base no nível de desenvolvimento dos países-membros; o Multiplicidade nas formas de concertação de instrumentos comerciais. O TM80 prevê e faculta a celebração de acordos entre todos os países membros (Acordos de Alcance Regional) ou entre alguns deles (Acordos de Alcance Parcial), que podem abranger diferentes matérias relacionadas à integração econômica e comercial (desgravação tarifária, matéria aduaneira, cooperação científica e tecnológica, etc.). Dessa forma, a ALADI cria facilidades para negociações intrarregionais e a integração entre os países da América Latina. O Mercado Comum do Sul A América Latina tornara-se importante mercado para a exportação de produtos manufaturados brasileiros e, nesse contexto, o esquema regional da ALADI era relevante, sobretudo levando-se em conta que contribuiu efetivamente para reduzir a dependência do mercado norte-americano. A nova realidade política e econômica que se avizinhava, com o final da Guerra Fria – concentração de poder político e econômico nos EUA, ao lado da tendência de consolidação de blocos econômicos – contribuiu para que se optasse por criar uma alternativa de integração regional que pudesse dar uma resposta aos novos desafios para a inserção do Brasil e de seus vizinhos no cenário internacional. Em torno de uma idéia-matriz de conteúdo político – a eliminação da histórica rivalidade entre Brasil e Argentina, os dois países iriam reativar de maneira mais profunda a idéia brasileira de formação de uma zona de livre comércio entre os países do Cone Sul. O MERCOSUL assemelha-se ao processo integracionista europeu, edificado ao longo de muitos anos em múltiplos instrumentos, e difere do NAFTA, cujo objetivo é tão-somente a criação de uma zona de livre-comércio entre EUA, Canadá e México. Em vez do intercâmbio de concessões tarifárias bilaterais por setor, que caracterizou as iniciativas no âmbito da ALALC e da ALADI, o novo bloco buscou a liberalização comercial por meio de cronograma universal, automático e linear de eliminação de barreiras tarifárias intrazona. O MERCOSUL rompeu com o passado porque pretendeu ir além da simples liberalização comercial, passando a incorporar também o objetivo de um mercado comum, com economias efetivamente integradas, daí a presença na agenda de temas como coordenação macro-econômica, serviços, compras governamentais, política de concorrência, procedimentos aduaneiros, livre circulação de trabalhadores, entre outras. Também a ALADI passou a incorporar os novos temas. Em 2004, a Resolução 59 (XIII) do Conselho de Ministros da ALADI estabeleceu as bases de um Programa para a conformação progressiva de um Espaço de Livre Comércio (ELC). Vários aspectos foram considerados para o desenvolvimento do ELC, como acesso a mercados, comércio de serviços, investimentos, compras governamentais, normas e disciplinas comuns, apoio aos PMDER, bem como a inclusão da dimensão social no processo de integração da ALADI. No âmbito da ALADI, o MERCOSUL tem acordos de complementação econômica firmados com Chile (ACE-35), Bolívia (ACE-36), Peru (ACE-58), Colômbia, Equador e Venezuela (ACE-59), Cuba (ACE-62) e, restrito ao setor automotivo, com o México (ACE-55). No âmbito do ACE-35, MERCOSUL e Chile já contam com normativa para o comércio de serviços, e, no âmbito do ACE-59, MERCOSUL e Colômbia estão em processo de negociação acerca do comércio desse setor. Análise O processo de integração oferece novas oportunidades, mas pode também exigir alguns custos quando se estimula a concorrência. Nesses casos, há necessidade de esforço nacional para assegurar que eventuais esquemas de proteção sejam transitórios e venham acompanhados de contrapartidas dos empresários, que devem ser estimulados a investir na inovação e na modernização de processos produtivos, buscando aumentar sua competitividade. A integração regional, e mais especificamente a processo mercosulino, não se trata de uma volta à autarquia ou a rejeição das relações com os demais países, mas a necessidade de que o espaço integrado deixe de ser refém da conjuntura internacional sempre cambiante e volátil, ganhando uma densidade que lhe permita seguir aprofundando-se com certa autonomia. A verdadeira integração pode auxiliar, no futuro, na prevenção ou mitigação dos efeitos de crises externas, ao criar um espaço de prosperidade que se baseia, em boa medida, na ampliação do mercado consumidor intrazona e na transformação das vantagens comparativas de cada sócio em vantagens competitivas de todo o bloco. Há, no entanto, dificuldades no processo de aprofundamento das relações econômicas entre os países da América do Sul. Três perspectivas distintas acerca do regionalismo vêm-se desenvolvendo: o Chile, Colômbia, Peru e México advogam o livre comércio como melhor forma de realizar seu processo de desenvolvimento. Esses quatro países acabaram de assinar um acordo de integração profunda que poderá ter repercussões para o processo de integração regional. o Venezuela, Equador e Bolívia integram a ALBA e têm demonstrado aversão às teses de livre comércio. Advogam um processo de integração regional baseado na solidariedade e na cooperação. o O MERCOSUL, principalmente após o “Consenso de Buenos Aires” (2003), advoga a combinação entre a abertura comercial e a cooperação. Por meio do “Consenso de Buenos Aires”, Brasil e Argentina comprometem-se a aprofundar o MERCOSUL não apenas no tocante à liberalização comercial, mas também corrigindo as imperfeições da união aduaneira sem descuidar da atenuação das assimetrias no bloco, a articulação de políticas comuns para a efetiva integração de cadeias produtivas e a promoção de uma agenda social vigorosa. Constitui exemplo paradigmático dessa nova forma de encarar o bloco a criação, em 2004, do Fundo de Convergência Estrutural do MERCOSUL (FOCEM), que se encontra operacional desde 2006. O Fundo é um instrumento criado para a atenuação de assimetrias, financiando projetos que possam ter impacto significativo no desenvolvimento, no incremento da competitividade e no estímulo à coesão social dos Estados membros. A Cúpula de San Juan – 3 de agosto de 2010 – pode ser considerada uma das mais importantes do MERCOSUL desde a adoção do Protocolo de Ouro Preto de 1994, em função dos resultados alcançados nesse caminho de construção de um mercado comum. De fato, o novo impulso dado às negociações nos últimos anos levou à decisão histórica sobre a eliminação da dupla cobrança da Tarifa Externa Comum e a aprovação do Código Aduaneiro do MERCOSUL. Esses avanços são importantes para alcançar a efetiva consolidação da união aduaneira como consagrada no Protocolo de Ouro Preto. A agenda política, social e institucional também vem-se desenvolvendo. O MERCOSUL possui foros e mecanismos de participação de parlamentares, trabalhadores, empresários, lideranças locais e regionais e organizações da sociedade civil. Esses mecanismos precisam ser fortalecidos para que sejam cada vez mais ativos e dinâmicos. DEIR 12/05/11