O “BRAZIL-CENTRAL” E SUAS POTENCIALIDADES NA REVISTA A INFORMAÇÃO GOYANA. 1917 - 1935. Andreia Silva Lisboa (Universidade Federal de Goiás) A partir da independência a preocupação com a caracterização da nação como um corpo independente, separado da metrópole, tendo uma história própria passou a ser uma das prioridades tanto do governo quanto dos intelectuais. Estabeleceu-se um duplo confronto, primeiro, entre a nação recém – constituída, no caso do Brasil uma república que nascia, frente ao mundo civilizado e segundo, entre essa nação recém – constituída e o estabelecimento de uma identidade própria (NAXARA, 1992:181). Desta forma, na busca de um Brasil moderno, a questão da constituição de uma identidade nacional se torna importante. Herschmann e Pereira (1994) percebem nas ultimas décadas do século XIX e nas primeiras décadas do século XX, o desenvolvimento de varias estratégias na construção de um novo ordenamento político e cultural, que almejava a construção de uma nação moderna. Nesse sentido nas ultimas décadas do século XIX até 1920, toma se como referencial o mundo europeu, isto é, civilizar, tornar-se moderno, significava ficar em pé de igualdade com a Europa no que se refere a coditiano, instituições, economia, idéias etc. Já nas décadas de 1920-1930, a busca de repostas para a construção do ideário de um Brasil moderno, colocava-se em ênfase o tema da “identidade cultural /nacional”, ou seja, um momento de “descoberta do Brasil”, no qual busca uma identidade nacional, calcada na afirmação da força nativa. Diante desse cenário, o presente trabalho pretende apresentar os resultados iniciais da pesquisa que propõe analisar as estratégias de representação do Estado de Goiás na revista A Informação Goyana, editada no Rio de Janeiro de 1917 a 1935. O objetivo consiste em identificar as representações de Goiás formuladas pelos intelectuais que criaram e escreveram ao longo das páginas da revista, e as estratégias de projeção do Estado de Goiás para o país, para o mundo e para os próprios goianos. Essa reflexão nos ajuda a entender como esses articulistas buscavam integrar o Estado ao projeto de uma nação moderna. Nessa perspectiva é importante perceber as representações de Goiás formuladas pelos intelectuais que criaram e escreveu A Informação Goyana, o que constituem nas estratégias de projeção do Estado de Goiás. Contudo, não se pode ignora que tais representações são determinadas por interesses de um certo grupo que as forjam, daí se torna importante relacionar os discursos proferidos com a posição de quem os utiliza. O discurso não é neutro está sempre imbuído de estratégias e práticas, nesse caso especifico, políticas, sociais, econômicas e pedagógicas. Ainda sobre representação, Roger Chartier, associa no conceito de representação três dimensões constitutivas da realidade social: primeiro, as representações coletivas, herdadas de Durkheim e Mauss, que constituem a matriz das formas de percepção, e classificação e de julgamento; segundo, as formas simbólicas, por meio das quais os grupos e os indivíduos percebem suas próprias identidades e em terceiro a delegação atribuída a um representante (individuo, coletivo, instância abstrata), da coerência e da permanência da comunidade representada. (SILVA, 2000.p.83). Nessa acepção, entendemos que as representações vinculadas sobre Goiás se constituem em um conjunto de informações, opiniões, percepções, valores referentes às terras goianas. Além disso, essas representações dariam configurações identitárias. Isto é, essas representações também são traduzidas como formas simbólicas, por meio dos quais esse grupo de intelectuais percebiam sua identidade de goiano e a forma pela qual pretendiam veicular ou projetar essa identidade. Partimos, assim, da hipótese geral que a revista A Informação Goyana se constitui em um campo político – ideológico e, portanto tem como finalidade formar uma certa consciência sobre o Brazil –Central, mais especificamente sobre o estado de Goiás. Para tanto, seus articulistas defendem ao longo de suas páginas a importância do Estado de Goiás, para o desenvolvimento econômico, político, social e cultural do país. Com esse objetivo exalta tanto as potencialidades econômicas, naturais das terras goianas como também sua cultura e sua história. No limite a imprensa se constitui em um instrumento de manipulação de interesses e intervenção social. É importante para o historiador, estudar tal objeto como agente da história, identificando o movimento de idéias e personagens que circulam nas páginas da revista. A categoria imprensa, se desmistifica, quando se faz emergir a figura de seus produtores como sujeitos dotados de consciência determinada nas práticas sociais. A analise de tal documento exige um constante dialogo com os personagens que atuaram, ou melhor, no nosso caso que escreveram ou colaboraram na constituição da revista analisada. (CAPELATO, 1988:21). Assim, em agosto de 1917, um grupo de intelectuais formado no final do século XIX e inicio do XX editou A Informação Goyana, que circulou principalmente na capital federal, Rio de Janeiro, onde foi editada, em Goiás e nos principais Estados do país e em alguns países estrangeiros, até 1935. Teve um número expressivo de colaboradores, constituído por goianos. E seus principais foram Henrique Silva (18651935) e Americano do Brasil (1892-1932). Definida em seu frontispício como “Revista mensal, illustrada e informativa das possibilidades econômicas do Brasil Central”; A Informação Goyana trabalhou de modo rico e complexo as varias expressões de vida dessa região, dedicando especial atenção a Goiás. Os dirigentes de A Informação Goyana pretenderam inserir Goiás num circuito político de discussão do qual o Estado estava praticamente ausente e que pudesse ser discutido como possibilidade econômica, política e cultural. É o que se observa no seu “artigo-programma”, escrito para o primeiro número, publicado em agosto de 1917.O texto apresenta com clareza, que o periódico não pretendia ser mais um órgão técnico no meio jornalístico em que se inseriu. Pretendia sim, ser um órgão temático especializado em Brazil Central (inter-land brasileiro), com fim político, informativo e de propaganda; enfim educativo.Assim demonstrou preocupação em relação á ignorância e o desinteresse da empresa da capital federal pelo estado de Goiás.Tomando para si não só a tarefa de preencher lacunas deixadas pela empresa carioca, como também de refutar as informações erronias vinculadas sobre o Estado.Tornar o Estado conhecido, suas possibilidades econômicas aos olhos de investidores particulares e do próprio governo federal.(NEPOMUCENO, 2003:16). Enfim, após uma breve e inicial analise de A Informação Goyana, podemos tirar algumas impressões, que serão aprofundadas durante todo o trabalho. Primeiro, a revista pretendeu mais que a divulgação de uma visão total de Goiás pretendeu sim tornar o Estado conhecido em toda a “exuberância” de suas possibilidades.Segundo, apesar de se dizer apenas informativa era, de fato uma revista de opinião que tinha como objetivo principal, formar uma imagem positiva de Goiás. Para tanto defendeu que esse Estado, estrategicamente confundido com o Brasil Central, era apenas, virtudes, possibilidades, e promessa para aqueles que dispusessem de recursos e desejassem contribuir para promover o progresso material de Goiás e, por conseguinte, do país. Conhecer a história por meio da imprensa, dessa forma, pressupõe um trabalho com método rigoroso, tratamento adequado da fonte e reflexão teórica. Sem esses ingredientes corre-se o risco de repetir para o leitor, a história que a empresa conta. (CAPELATO, 1988:23). Nesse sentido dois autores nos ajudam a traçar o caminho do pensamento e a prática exercida na abordagem da fonte. Primeiro a proposta de Brandão (1991), do método de análise de discurso. Nesse método, a fala do sujeito é situada em seu contexto para melhor ser compreendida, já que, a ciência se constrói numa relação dinâmica entre a razão daqueles que a praticam e a experiência que surge na realidade concreta. A linguagem é dessa maneira um lugar de conflito, de confronto ideológico, não podendo ser estudada fora da sociedade uma vez que os processos que a constituem são histórico -social. Segundo a proposta de Renée Barta Zicman (1985), que apresenta algumas considerações metodológicas de como se trabalhar a história por meio da imprensa. O autor parte da hipótese geral de que a Imprensa age sempre como um campo político -ideológico e, portanto toda pesquisa a partir da analise de jornais, periódico ou revistas necessariamente deve traçar as principais características do órgão de imprensa consultado.Assim analisa duas direções; primeiro, a apresentação de um esquema geral para caracterizar o órgão da imprensa analisado e segundo, apresentação de alguns elementos e aspectos do Método de Análise do Conteúdo para o estudo da Imprensa, e de pistas de aplicação deste instrumental metodológico. Para, além disso, esse método consiste segundo o autor, num conjunto de técnicas e instrumentos metodológicos capazes de efetuar a exploração objetiva de dados informacionais ou “discursos”, fazendo aparecer no conteúdo, alguns elemento particulares que possibilitam a elaboração de um certo tipo de caracterização. Assim, um instrumento metodológico, polimorfo e polifuncional, que se caracteriza como um exercício de desocultação, no sentido de que fornece uma melhor “descrição” dos textos e permite avançar para além das significações primarias dos discursos e escapar dos perigos da compreensão espontânea.(ZINCMAN, 1985:80). Por sua vez, na análise da revista à primeira dificuldade que nos deparamos é com a vastidão e a diversidade de material que tal documento oferece.Considerando que estamos iniciando a pesquisa e nos propondo a discutir as representações de Goiás formuladas em suas páginas, algumas discussões surgem como ponto de partida. Primeiro uma analise de A Informação Goyana, como um instrumento político e educativo.Destacando, o contexto histórico em que a revista surgiu, o perfil de seus principais colaboradores e suas relações políticas e sociais, bem como, as raízes do pensamento teórico e cientifico desse grupo de intelectuais que deram contorno e diretrizes a revista. Segundo, observando que a imagem vinculada de Goiás era de uma região dinâmica, produtiva e que tinha muito a oferecer ao projeto de um Brasil moderno, discutiremos esse contexto procurando abordar a questão do atraso, e como esse conceito é utilizado em muitos trabalhos para representar os primeiros anos da republica em Goiás e as alternativas a esse modelo de interpretação. Terceiro, percebendo que a estratégia principal dos articulistas de A Informação Goyana, para representar o Estado, era a construção de uma identidade moderna para os goianos, identificaremos nas páginas da revista os elementos constitutivos ou fundadores dessa identidade.Enfim, para integra Goiás a um projeto de nação moderna era preciso antes tudo identificar e mostrar, quem era a gente goiano o que produzia economicamente, politicamente e culturalmente, com isso ressaltar suas potencialidades e possibilidades de contribuição para o progresso brasileiro. Por fim, a analise da revista nos permite dizer que ao longo da pesquisa outras questões além destas vão surgir nessa discussão. Isso porque INFORMAÇÃO GOYANA, elegida como documento se mostra, como uma fonte muito rica, pela vastidão de temas que apresenta, o que é muito importante para a pesquisa, pelas possibilidades de reflexões. Por isso tudo ela se configura numa fonte da qual podemos reconstruir a história goiana, a partir de um novo olhar e de forma diferente. Referências Bibliográficas BRANDÃO, Helena H. N. Introdução á Análise do Discurso.Campinas, São Paulo: Ed. da UNICAMP, 1991. CAPELATO, Maria Helena Rolim.A Imprensa na história do Brasil-São Paulo: Contexto EDUSC, 1988. CHAUL, Nasr Fayad; RIBEIRO, Paulo Rodrigues (Orgs.).Goiás: identidade, paisagem e tradição - Goiânia: Ed. Da UCG, 2001. HERSCHMANN, Micael M. e PEREIRA, Carlos Alberto M. O Imaginário moderno no Brasil. In: HERSCHMANN, Micael M. e PEREIRA, Carlos Alberto M. (org). A Invenção do Brasil Moderno: medicina, educação e engenharia no Brasil nos anos 20-30. p.9-43.Rio de Janeiro: Rocco, 1994. MARTINS, Ana Luiza.República: um outro olhar. São Paulo: Contexto, 1999, p.41. NAXARA, Márcia Regina Capelari.A Construção da Identidade: um Momento Privilegiado.Revista Brasileira de História-Órgão da Associação Nacional Dos Professores Universitários de História-São Paulo. ANPUH / Marco Zero, vol. 12, n°23/24, setembro 91/ agosto92. NEPOMUCENO, Maria Araújo.O Papel Político-Educativo De A INFORMAÇÃO GOYANA Na Construção Da Nacionalidade.Goiânia: Ed.da UFG, 2003. SANDES, Noé freire. A invenção da nação: entre a monarquia e a república.Goiânia: Ed. da UFG: Agência Goiana de Cultura Pedro Ludovico Teixeira, 2000. SILVA, Helenice Rodrigues da. A História como “A Representação do Passado”: A Nova Abordagem da História Francesa.In: CARDOSO, Ciro Flamarion. MALERBA, Jurandir.Representações: Contribuição a um debate interdisciplinar.Campinas, SP: Papirus,2000.- (Coleção texto do tempo). ZICMAN, Renée Barata. História Através da Imprensa – Algumas Considerações Metodológicas.In.Revista do Programa de Estudos Pós-Graduados em História e de Departamento de História.n°4, p. 89-102. São Paulo: EDUSC, junho 1985. Fontes: A INFORMAÇÃO GOYANA. Governo do Estado de Goiás.Goiânia: AGEPEL, 2001. (Reprodução fac-similar da coleção completa da revista publicada no Rio de Janeiro por Henrique Silva e Americano do Brasil, no período de agosto de 1917 a maio de 1935).