UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM ARRANJOS PRODUTIVOS LOCAIS SEBASTIÃO DÉCIO COIMBRA DE SOUZA “Tese apresentada ao Centro de Ciência e Tecnologia da Universidade Estadual do Norte Fluminense como parte das exigências para obtenção do título de Doutor em concentração Ciências em de Engenharia Produção”. Orientador: Prof. José Ramón Arica Chávez, D. Sc. Campos – RJ Agosto de 2003 Engenharia, de FICHA CATALOGRÁFICA Preparada pela Biblioteca do CCT / UENF 35/2003 Souza, Sebastião Décio Coimbra de Uma abordagem evolucionária da dinâmica competitiva em arranjos produtivos locais / Sebastião Décio Coimbra de Souza. – Campos dos Goytacazes, 2003. xv, 342 f. : il. Orientador: José Ramón Arica Chávez Tese (Doutorado em Ciências de Engenharia) -- Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro. Centro de Ciência e Tecnologia. Laboratório de Engenharia de Produção. Campos dos Goytacazes, 2003. Área de concentração: Engenharia de Produção. Bibliografia: f. 234-251 1. Abordagem Evolucionária 2. Trajetória Competitiva 3. Arranjos Produtivos Locais I. Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro. Centro de Ciência e Tecnologia. Laboratório de Engenharia de Produção II. Título CDD 338.6048 UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM ARRANJOS PRODUTIVOS LOCAIS SEBASTIÃO DÉCIO COIMBRA DE SOUZA “Tese apresentada ao Centro de Ciência e Tecnologia da Universidade Estadual do Norte Fluminense como parte das exigências para obtenção do título de Doutor em Ciências concentração em Produção”. Aprovada em 29 de agosto de 2003. Comissão Examinadora: Prof. Jorge Britto, D.Sc. UFF (Economia) Prof. Luis Antônio Cardoso, D.Sc. UENF (Eng. Produção) Prof. Victor Prochnik, D.Sc. UFRJ (Eng. Produção) Prof. José Ramón Arica Chávez, D.Sc. UENF (Sistemas) Orientador ii de Engenharia, Engenharia de DEDICATÓRIA Dedico este trabalho à memória de meu pai, Sebastião Sanches de Souza, e à minha mãe, Maria Souza. iii AGRADECIMENTOS ! Ao professor José Arica, pela confiança e incentivo, que influenciou positivamente minha trajetória acadêmica e profissional. ! Ao professor Helder Gomes Costa, pelo apoio em contornar obstáculos institucionais que surgiram durante o curso. ! A todos os professores do Laboratório de Engenharia de Produção, por compartilharem seus conhecimentos durante o curso. ! Aos Professores Victor Prochnik (UFRJ) e Jorge Britto (UFF), pela atenção dispensada e pelas dicas. ! Aos Ceramistas, que abriram as portas de suas empresas e disponibilizam as informações solicitadas, em especial, ao Sr. Nildo Cardoso, pela atenção. ! Aos colegas de curso Alcimar e Roberto, pelas discussões que contribuíram para a consolidação das minhas idéias seminais sobre o tema abordado. ! Em especial, a minha namorada, companheira de todas as horas, Jacqueline Cortes, pela paciência, incentivo e colaboração ao longo desses anos de convivência. ! A todos os colegas de curso e de trabalho pelo respeito e solidariedade. ! A Luis Maurício Menezes (in memorian), ex-Diretor de Projetos da FENORTE, pela influência positiva no início do curso. ! Ao Prof. Darcy Ribeiro, idealizador do sonho “Universidade Estadual do Norte Fluminense”, em que acreditei, e a todos que ajudaram a transformálo em realidade, que me proporcionou a conclusão desse importante e difícil ciclo acadêmico-profissional. ! A toda a minha família, meus irmãos e amigos, pelo carinho e força nos momentos difíceis. ! Ao meu pai (in memorian) e a minha mãe, pela herança ética e moral, e pelos ensinamentos. ! Finalmente a Deus, pela força para superar nossas limitações e as barreiras pelo caminho, nos impulsionando para seguir em frente. iv SUMÁRIO Resumo............................................................................................................ ix Abstract............................................................................................................ x Lista de Figuras............................................................................................... xi Lista de Gráficos.............................................................................................. xii Lista de Quadros............................................................................................. xiii Lista de Fotos.................................................................................................. xiv Lista de Tabelas.............................................................................................. xv CAPÍTULO 1 – INTRODUÇÃO............................................................................... 1 CAPÍTULO 2 - COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE............. 7 Resumo........................................................................................................... 7 2.1 Introdução.................................................................................................. 8 2.2 A abordagens da competitividade............................................................. 11 2.2.1 A abordagem tradicional da competitividade e suas limitações........ 12 2.2.2 A abordagem dinâmica da competitividade...................................... 15 2.3 Determinantes da competitividade............................................................ 17 2.3.1 Análise da competitividade empresarial............................................ 23 2.3.1.1 Análise ambiental.................................................................... 23 2.3.1.2 Análise do padrão de concorrência setorial............................ 27 2.4 Competitividade empresarial x “competitividade regional”........................ 30 2.5 Competitividade e desenvolvimento econômico regional......................... 39 2.5.1 A visão tradicional e as novas abordagens...................................... 39 2.5.2 A “competitividade” de regiões e localidades................................... 42 2.6 Para um conceito integrado de competitividade....................................... 49 2.7 Para uma abordagem estratificada da competitividade em arranjos produtivos locais....................................................................................... 54 2.8. Considerações finais sobre o Capítulo................................................... 55 v CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM ARRANJOS PRODUTIVOS LOCAIS........................................ 59 Resumo..................................................................................................... 59 3.1 Introdução........................................................................................... 59 3.2 Método científico, evolução e entropia................................................ 65 3.3 Competitividade e desenvolvimento na perspectiva evolucionária..... 71 3.4 Fundamentos para uma abordagem evolucionária da dinâmica competitiva em arranjos produtivos locais................................................. 81 3.5 Considerações finais sobre o Capítulo................................................ 92 CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, TRAJETÓRIAS TECNOLÓGICAS E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA”........................... 96 Resumo...................................................................................................... 96 4.1 Introdução............................................................................................ 97 4.2 Tipos de problemas organizacionais.................................................... 98 4.3 Rotinas como unidade de análise competitiva entre firmas................. 99 4.4 Aprendizado e adaptação.................................................................... 108 4.5 Mudança de rotinas (padrões)............................................................. 109 4.6 Comportamento e competição............................................................. 111 4.7 Evolução e complexidade.................................................................... 114 4.8 Padrões e recursos da firma................................................................ 117 4.9 Regras, procedimentos e rotinas......................................................... 121 4.9.1 Regra........................................................................................... 121 4.9.2 Procedimento operacional padrão (pop)..................................... 122 4.9.3 Rotina.......................................................................................... 123 4.10 Dependência da trajetória (do contexto local)................................... 129 4.11 O vínculo entre rotinas e trajetórias tecnológicas............................. 137 4.12 O conceito de “Trajetória Competitiva”.............................................. 149 4.13 Considerações finais sobre o Capítulo.............................................. 157 vi CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO TECNOLÓGICA E “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” EM ARRANJOS PRODUTIVOS LOCAIS: UMA METODOLOGIA .......... 158 Resumo..................................................................................................... 158 5.1 Introdução........................................................................................... 159 5.2 A análise de sistemas industriais e a abordagem evolucionária......... 163 5.2.1 “Sistemas de Inovação” e o “Diamante de Porter”..................... 168 5.2.2 “Sistemas Tecnológicos”............................................................ 171 5.3 Estratificação tecnológica................................................................... 175 5.4 Uma proposta para a análise da estratificação tecnológica em arranjos produtivos locais................................................................... 183 5.5 Considerações preliminares sobre a mudança tecnológica em arranjos produtivos locais: o caso do Pólo de Cerâmica Vermelha do Norte Fluminense.......................................................................... 186 5.5.1 Análise geral e contextualização do arranjo.............................. 186 5.5.2 Um esboço de aplicação da abordagem proposta.................... 189 5.6 Uma proposta metodológica para o estudo da estratificação tecnológica e da “trajetória competitiva” em arranjos produtivos locais................................................................................. 190 5.6.1 Pesquisa empírica..................................................................... 190 5.6.1.1 Etapas da metodologia................................................. 191 5.6.1.2 Detalhamento de cada etapa........................................ 191 5.6.1.3 Agenda Futura............................................................... 195 5.7 Considerações finais sobre o Capítulo............................................... 196 5.7.1 Hipóteses da abordagem proposta........................................... 197 CAPÍTULO 6 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM UM ARRANJO PRODUTIVO LOCAL: O CASO DO PÓLO DE CERÂMICA VERMELHA DO NORTE FLUMINENSE............................................................. 201 Resumo.................................................................................................... 201 6.1 Introdução.......................................................................................... 201 6.2. Metodologia e etapas do estudo....................................................... 204 6.2.1 Método de abordagem............................................................. 204 6.2.2 Método de procedimento.......................................................... 205 vii 6.3. Apresentação dos dados e informações........................................... 206 6.3.1 Considerações preliminares...................................................... 206 6.3.2 Análise de padrões, rotinas e recursos..................................... 207 6.4 Cálculo dos índices de recursos e de desempenho........................... 212 6.4.1 Tratamento e interpretação das informações........................... 212 6.4.2 Análise dos resultados.............................................................. 218 6.5 Grupos estratificados para o arranjo.................................................. 219 6.6 Considerações finais sobre o Capítulo.............................................. 221 CAPÍTULO 7 - CONCLUSÕES............................................................................ 223 7.1 Considerações finais.......................................................................... 223 7.2 Contribuições..................................................................................... 231 7.3 Perspectivas de futuros trabalhos..................................................... 232 REFERÊNCIAS................................................................................................ 234 APÊNDICE A - PESQUISA DE CAMPO REALIZADA NO PÓLO DE CERÂMICA 252 VERMELHA DO NORTE FLUMINENSE.......................................... APÊNDICE B - MODELO E MÉTODO DE CÁLCULO DOS ÍNDICES DE RECURSOS E DE DESEMPENHO PARA O ARRANJO ESTUDADO..... APÊNDICE C - QUESTIONÁRIOS APLICADOS..................................................... viii 333 336 Resumo da Tese apresentada ao CCT/UENF, como parte dos requisitos necessários à obtenção do grau de Doutor em Ciências de Engenharia (D.Sc.) Uma Abordagem Evolucionária da Dinâmica Competitiva em Arranjos Produtivos Locais Sebastião Décio Coimbra de Souza Orientador: Prof. José Ramón Arica Chávez, D Sc. Curso: Doutorado em Ciências de Engenharia Área de Concentração: Engenharia de Produção A partir de fundamentos da teoria evolucionária de mudança técnica e de conceitos da teoria comportamental e da visão baseada em recursos e competências da firma, neste trabalho, constrói-se uma abordagem específica para o entendimento e análise da dinâmica competitiva de firmas em arranjos produtivos locais. Assume-se que nesses sistemas, ocorre um processo de estratificação entre grupos de firmas, o qual, pode ser visto como um fenômeno decorrente da dinâmica competitiva própria e da capacidade de adaptação de cada componente frente a um ambiente em constante processo de mudança técnica e organizacional. Na abordagem desenvolvida, introduz-se o conceito de “trajetória competitiva”. Adicionalmente, propõe-se uma metodologia para estudo da dinâmica competitiva em arranjos produtivos locais, baseada na abordagem proposta e em tal conceito introduzido. Uma pesquisa empírica realizada em estudo exploratório em um arranjo local típico, apresentada ao final, confirma as hipóteses assumidas e sustenta a consistência da abordagem e da metodologia propostas para o estudo da dinâmica competitiva no arranjo tratado. ix Abstract of Thesis presented to CCT/UENF as a partial fulfillment of the requirements for the degree of Doctor of Engineering Sciences (D.Sc.). An Evolutionary Approach to Competitive Dynamic in Local Productive Systems Sebastião Décio Coimbra de Souza Advisor: José Ramón Arica Chávez, D.Sc. Subject: Doctor in Engineering Science Major Subject: Production Engineering Linking foundations of the evolutionary theory of technical change with concepts of the behavioral theory of the firm and resource-based view of the firm, in this work, a specific approach is built for the understanding and analysis of the competitive dynamics of firms in local production systems. It is assumed a stratification process among groups of firms as a phenomenon due to competitive dynamics and capacity of adaptation of each component in a constant process of localized technical and organizational change. Additionally, it is introduced the "competitive trajectory” concept and a methodology based on evolutionary perspective approach for the study of a typical local production system. Results from an empiric research developed confirms the hypotheses and sustains the approach and methodology proposed for the study of the competitive dynamic on such systems. x LISTA DE FIGURAS Capítulo 2 Figura 2.1 – Relações genéricas de medida de desempenho................... 13 Figura 2.2 – Comportamento da firma com base no desempenho no mercado............................................................................ 13 Figura 2.3 – Níveis de análise da competitividade empresarial.................. 25 Figura 2.4 – Padrão de concorrência setorial............................................. 28 Figura 2.5 – Determinantes da competitividade organizacional................. 50 Figura 2.6 – Determinantes da competitividade estrutural/setorial............. 51 Figura 2.7 – Visão-resumo da dinâmica competitiva.................................. 53 Capítulo 3 Figura 3.1 – Redução de sistemas complexos a sistemas simples............ 67 Capítulo 4 Figura 4.1 – O mecanismo da atividade de resolução de problemas......... 107 Figura 4.2 – Diferentes níveis de regras de comportamento...................... 116 Capítulo 5 Figura 5.1 – Representação de um Sistema Tecnológico.......................... 171 Figura 5.2 – Exemplo simplificado de Cadeia-Padrão de Valor.................. 192 xi LISTA DE GRÁFICOS Capítulo 2 Gráfico 2.1 – Divisão do trabalho por tipos e características...................... 38 Capítulo 4 Gráfico 4.1 – Diferença entre “Regra” e “POP”............................................ 122 Gráfico 4.2 – Diferença entre “Regra” e “Rotina”......................................... 125 Gráfico 4.3 – Trade-off entre diferentes padrões de rotinas........................ 138 Gráfico 4.4 – Mudança tecnológica pela visão estruturalista...................... 142 Gráfico 4.5 – Série histórica do desenvolvimento de uma tecnologia......... 143 Gráfico 4.6 – O modelo de Curva-S............................................................. 144 Gráfico 4.7 – Trajetórias tecnológicas possíveis.......................................... 145 Gráfico 4.8 – Trajetórias e inovações.......................................................... 148 Gráfico 4.9 – Trajetória Competitiva em Arranjos Produtivos Locais/1....... 153 Gráfico 4.10 –Trajetória Competitiva em Arranjos Produtivos Locais/2...... 154 Gráfico 4.11 –Trajetória Competitiva em Arranjos Produtivos Locais/3...... 155 Capítulo 5 Gráfico 5.1 – Diferentes trajetórias de organização da atividade de inovação 178 Gráfico 5.2 – Estratificação tecnológica hipotética no arranjo.................... 194 Gráfico 5.3 – Trajetórias evolutivas hipotéticas de dois arranjos locais...... 195 Capítulo 6 Gráfico 6.1 – Padrão de recursos para as unidades da amostra............... 212 Gráfico 6.2 – Distribuição de padrões da amostra (IRTk1, PEk1 e PQ k1) 213 Gráfico 6.3 – Correlação: Recursos x Produtividade energética (Ek1)...... 213 Gráfico 6.4 – Correlação: Recursos x Produtividade na queima (PQk1) 214 Gráfico 6.5 – Distribuição de padrões da amostra (para IRTk1 e PVPk1) 215 Gráfico 6.6 – Correlação: Recursos x Produtividade na queima (PVPk1) 216 Gráfico 6.7 – Trajetória competitiva hipotética........................................... 216 Gráfico 6.8 – Distribuição de padrões da amostra (para IRTk1 e PHhk1) 217 Gráfico 6.9 – Correlação: Recursos x Produtividade Homem-hora........... 218 xii LISTA DE QUADROS Capítulo 2 Quadro 2.1 – Diferentes abordagens da competitividade das empresas.... 16 Quadro 2.2 – Forças e fatores da competitividade empresarial.................. 18 Quadro 2.3 – A visão de Porter sobre a competitividade............................ 22 Quadro 2.4 – Atividades de sustentação da competitividade empresarial 26 Quadro 2.5 – Pontos de conflitos na abordagem da competitividade......... 31 Quadro 2.6 – Variações no conceito de competitividade............................ 36 Quadro 2.7 – Integração entre políticas de longo e curto prazos............... 47 Capítulo 3 Quadro 3.1 – Alguns aspectos gerais da abordagem evolucionária........... 92 Capítulo 4 Quadro 4.1 – Comparação entre unidades de análise da firma.................. 100 Quadro 4.2 – Diferentes concepções de rotina........................................... 127 Quadro 4.3 – Características de procedimentos e de rotinas individuais... 128 Quadro 4.4 – Evolução do processo criativo técnico.................................. 135 Capítulo 5 Quadro 5.1 – Diferenças entre Sistemas de Inovação e o Modelo de Porter 170 Quadro 5.2 – Estrutura analítica de Sistemas Tecnológicos....................... 173 Quadro 5.3 – Classificação tecnológica de firmas....................................... 176 Quadro 5.4 – Classificação de atividades de inovação dentro das firmas 179 Quadro 5.5 – Tipologia de firmas segundo a segmentação do mercado 180 Quadro 5.6 – Classes de capacidade de manufatura................................. 182 Quadro 5.7 – Hipóteses da abordagem...................................................... 198 xiii LISTA DE FOTOS Capítulo 6 Foto 6.1 - Telhas revestidas (Cerâmica L).................................................. 208 Foto 6.2 – Revestimento em diversas cores (idem).................................... 208 Foto 6.3 – Cortador mecânico giratório (idem)........................................... 208 Foto 6.4 – Exemplo de cortador convencional (com arames)..................... 208 Foto 6.5 – Prensas modernas para produção de telhas (Cerâmica C)....... 209 Foto 6.6 – Bloco vazado aparente e plaquetas de revestimento (Cerâmica F) 209 Foto 6.7 – Massa muito heterogênea (Cerâmica O)................................... 210 Foto 6.8 – Blocos danificados (idem).......................................................... 210 Foto 6.9 – Transporte braçal das peças (Cerâmica I)................................. 210 Foto 6.10 – Utilização de microtrator para transporte (Cerâmica M).......... 210 Foto 6.11 – Secagem natural (ao ar livre) (Cerâmica N)............................ 211 Foto 6.12 - Ventiladores móveis para secagem (Cerâmica D)................... 211 Foto 6.13 – Forno tipo circular (secular) (Cerâmica J)................................ 211 Foto 6.14 - Forno túnel (moderno) (Cerâmica K)........................................ 211 Foto 6.15 – Processo produtivo caótico (Cerâmica J)................................. 211 Foto 6.16 – Layout limpo e organizado (Cerâmica F)................................. 211 xiv LISTA DE TABELAS Capítulo 6 Tabela 6.1 – Características dos grupos estratificados............................... 220 Tabela 6.2 – Estratificação em grupos para o arranjo estudado................. 221 xv CAPÍTULO 1 INTRODUÇÃO A intensificação da competição internacional tem forçado cada vez mais as empresas a se capacitarem para absorver novas tecnologias de modo a sustentar ou ampliar mercados e se manterem competitivas. Paralelamente, o desempenho econômico nacional ou regional, está vinculado diretamente à capacidade de aproveitamento das oportunidades de mercado, dos recursos locais e das bases existentes de tecnologia, através de treinamento profissional e científico e da exploração econômica eficiente dessas bases. No atual cenário econômico, a competitividade das firmas é cada vez mais determinada pela tecnologia dominada e pela capacidade de adaptação à mudança (DOSI, 1988; BAUM & SINGH, 1994). Nesse sentido, o desenvolvimento de processos e produtos tecnológicos mais avançados, eventualmente inovadores, é um dos principais pilares para uma empresa obter vantagens competitivas, respondendo às contínuas mudanças exigidas pelo mercado. No âmbito das empresas, a mudança tecnológica pode ser entendida como um processo de crescimento influenciado pela configuração local dos arranjos onde elas se inserem (aglomerados, distritos, redes, blocos etc), bem como, por fatores endógenos (trajetórias, rotinas organizacionais, estratégias etc). Essa dinâmica envolve exploração, adaptação e imitação de novas tecnologias (DOSI, 1982). Pressões competitivas de tecnologias novas ou correlatas e desafios ou ideais visionários dos líderes, além das características do ambiente local, contribuem para acelerar o processo de mudança e inovação. CAPÍTULO 1 – INTRODUÇÃO 2 Nesse sentido, os conceitos tradicionais de algumas variáveis envolvidas no contexto da competitividade têm sido revistos. Uma das principais, a “tecnologia”, antes entendida como simples elemento residual, tem agora seu conceito ampliado, passando as considerar múltiplas facetas. Um efeito decorrente dessa concepção do ambiente econômico é que a visão tradicional de inovação tecnológica, baseada nos conceitos de science push e technology pull, linear e unidimensional, tem sido ampliada, e, em alguns casos, substituída por uma apreciação mais complexa, incorporando diferentes aspectos além daqueles tradicionais de alta e baixa tecnologia e de tecnologia do produto e de processo (NORTH & SMALLBONE, 2000). Neste aspecto, tecnologia e inovação são vistos mais como um processo interativo entre homem, organização e contexto ambiental, e relacionados a ativos invisíveis e a conceitos evolucionários (DOSI, 1988; EDQUIST, 1997; ZIMAN, 2000; SAVIOTTI & NOOTEBOOM, 2000). Paralelamente, a infra-estrutura e o ambiente regional/local assumem papel determinante nas novas abordagens do desenvolvimento econômico. Muitos trabalhos nesse sentido têm enfatizado essa questão (ver, por exemplo, PORTER, 1989; BENKO & LIPIETZ, 1994; MALECKI & ÖINAS, 1998; PACI & USAI, 2000). Um aspecto característico desses trabalhos é a grande ênfase em países centrais e quase que exclusivamente em setores industriais altamente avançados, onde a inovação stricto sensu é uma das armas essenciais na arena competitiva. Permanece, entretanto, uma lacuna entre as teorias e conceitos evolucionários e os métodos empregados para a análise de ambientes pouco evoluídos tecnologicamente, mas fundamentais para a economia de certas microrregiões periféricas, cuja mudança se dá de maneira lenta e, muitas vezes, somente induzidas por fontes externas. Por outro lado, metodologias e abordagens adequadas para a análise de micro-sistemas produtivos, e a consideração de conceitos não-estáticos em nível microrregional e/ou mesoeconômico, necessitam ser adaptadas ao contexto. Não existem metodologias gerais que considerem aspectos dinâmicos evolutivos e, ao mesmo tempo, características locais e setoriais. Abordagens próprias têm de ser construídas. Nestes casos, há a necessidade de estudos das relações interfirmas e de segmentos de cadeias industriais que permitam a análise dos agentes e ao mesmo tempo do contexto no qual se inserem. O emprego de abordagens e metodologias baseadas em sistemas tecnológica e CAPÍTULO 1 – INTRODUÇÃO 3 economicamente avançados, ipsis litteris, ao estudo de arranjos produtivos locais1 de indústrias tradicionais, menos densos em termos de tecnologia, tem gerado vazios de interpretação, o que não tem contribuído para uma visão realista da dinâmica do desenvolvimento desses sistemas, principalmente para aqueles localizados em regiões periféricas. Nesse sentido, o preenchimento desses vazios requer a criação de abordagens que captem as diversidades locais e regionais e as diferenças entre firmas de um mesmo arranjo produtivo em termos de dinâmica competitiva e tecnológica. A dinâmica competitiva em arranjos produtivos locais é influenciada, entre outros fatores, pela freqüência e impacto de novas tecnologias e pelas características específicas do mercado, que pressionam as empresas a uma constante reavaliação de suas estratégias, métodos e rotinas organizacionais, provocando um processo de estratificação tecnológica no arranjo (SOUZA & ARICA, 2001). A estratificação tecnológica de empresas pode ser vista como um fenômeno decorrente da dinâmica competitiva do sistema e da capacidade de adaptação de cada componente frente a um ambiente em constante processo de mudança tecnológica. No nível micro-dinâmico, essa estratificação pode ser verificada através da dotação de recursos e dos índices de desempenho de cada empresa, os quais, afetam suas estratégias de mercado. Nesse contexto, entender a formação de segmentações e a dinâmica competitiva nesses sistemas, de forma geral, é uma condição fundamental para proposição de planos e programas compatíveis com a realidade local, de modo a superar deficiências técnicas, contornar de barreiras comerciais, direcionar novos investimentos e preservar condições sócio-ambientais satisfatórias. Entretanto, por razões metodológicas, tradicionalmente as políticas de incentivo e os programas de apoio ao desenvolvimento e à competitividade são distribuídos de forma genérica à regiões ou setores, e tratam aglomerados e segmentos industriais como um bloco homogêneo e integral. As diversidades internas desses arranjos e a estratificação entre empresas não são captadas, o que torna tais iniciativas pouco eficientes e, muitas 1 Esta expressão aqui adotada, e de forma recorrente nos capítulos subseqüentes, é uma denominação genérica para a concentração espacial de unidades econômicas de manufatura, desde aquelas voltadas para a utilização de recursos naturais e dispostas de forma fragmentada até aglomerados, clusters, distritos industriais e outros tipos de concentração de indústrias com características dinâmicas mais acentuadas. Nesse sentido, o termo “arranjo”, é menos restritivo que “sistema”, e não necessariamente pressupõe atividades dinâmicas de coordenação e cooperação, podendo referir-se tanto a “aglomerados informais” (ver Mytelka & Farinelli, 2000; Santos et al., 2002) e a “clusters de sobrevivência” (ver Meyer-Stamer, 2000). Ver também Cassiolato & Lastres (2001). CAPÍTULO 1 – INTRODUÇÃO 4 vezes, ineficazes. Um dos efeitos desse tratamento às atividades microeconômicas é que muitas empresas não conseguem se capacitar para serem incluídas em tais programas. Visando contribuir para o estudo e o entendimento dos micro-elementos desse contexto, neste trabalho, apresenta-se uma abordagem para a análise da dinâmica competitiva em arranjos produtivos locais a partir dos conceitos de “trajetória competitiva2” e “estratificação tecnológica”. Tal abordagem é baseada em fundamentos evolucionários como os de “dependência da trajetória”, “trajetórias, regimes tecnológicos e padrões técnicos” e “rotinas”. Ao invés de se analisar a evolução de uma determinada tecnologia em termos globais, como o conceito tradicional de “trajetória tecnológica” sugere, pela abordagem proposta, o foco da análise centra-se na dinâmica competitiva de um determinado arranjo produtivo local, para paralelamente, se avaliar como as empresas componentes se comportam e se posicionam frente aos concorrentes dentro desse sistema. Nesse sentido, o objetivo geral do trabalho é o de contribuir para o avanço da pesquisa científica através da proposição de novos métodos de solução para problemas de interesse de meio acadêmico e da sociedade, focando casos aplicados de regiões, setores e micro-sistemas produtivos locais. Especificamente no que se refere ao problema tratado, o objetivo é propor uma metodologia própria para o estudo da dinâmica competitiva em arranjos produtivos locais, através de uma abordagem que permita captar, ao mesmo tempo, o processo de mudança tecnológica e as micro-diversidades entre firmas, possibilitando a identificação e análise das fontes das vantagens competitivas individuais e em grupo, gerando informações úteis para o entendimento desses sistemas. As hipóteses assumidas são: (i) que a dinâmica competitiva e o processo de mudança tecnológica em arranjos produtivos locais provocam um processo de estratificação em grupos entre as empresas do arranjo, e; (ii) que a abordagem evolucionária constitui uma base teórica consistente para sustentar uma metodologia capaz de captar tal dinâmica. Outras hipóteses secundárias são levantadas e discutidas ao longo do texto. 2 “Trajetória” aqui refere-se a um certo caminho trilhado pelas firmas na transição entre dois “regimes tecnológicos” diferentes, o qual influencia o comportamento de outras firmas. O termo “competitivo” referese ao conceito evolucionário de disputa entre agentes (firmas) em um determinado contexto para adquirirem primeiro certos caracteres “fortes” que lhes permitam obter vantagens e se sobrepor frente aos concorrentes (Vide Capítulos 3 e 4). CAPÍTULO 1 – INTRODUÇÃO 5 O trabalho foi estruturado em sete Capítulos, incluindo a Introdução e as Conclusões, além das Referências e de três Apêndices, ao final. Os Capítulos foram encadeados de maneira a permitir um entendimento seqüencial do trabalho, de um escopo geral para um mais restrito, apesar de guardarem uma certa independência entre si. No Capítulo 2, aborda-se os fundamentos por trás do termo “competitividade”, contrapondo, sempre que possível, os diversos enfoques, de modo a prover uma visão sintética das dicotomias e divergências conceituais mais destacadas. De uma forma geral, na análise da competitividade estão envolvidos vários níveis, internos e externos, que, em suma, buscam captar o comportamento da firma. Entretanto, a divisão tradicional da análise competitiva nos níveis organizacional, estrutural, geográfico e sistêmico, negligencia certos arranjos produtivos locais, pouco competitivos fora da esfera regional. De modo a prover uma alternativa de tratamento desses sistemas, sugere-se a inclusão de um nível específico para análise da competitividade nesses arranjos. No Capítulo 3, defende-se uma abordagem da competitividade em arranjos produtivos locais através de uma perspectiva evolucionária. A partir de uma revisão dos conceitos e hipóteses fundamentais da teoria econômica evolucionária, enfatiza-se suas principais diferenças em relação à teoria neoclássica, buscando-se evidenciar sua maior relevância para o tratamento e a análise de problemas dinâmicos do ambiente socioeconômico local. Nesse aspecto, conceitos como Entropia e Evolução são importantes para o entendimento de como sistemas abertos (como o econômico) interagem com o ambiente e quais os efeitos dessa interação no comportamento de sistemas dinâmicos. Subseqüentemente, apresentam-se os reflexos mais imediatos dessa abordagem para o enfoque do ambiente competitivo e do desenvolvimento econômico regional e local. Também são traçadas algumas considerações sobre políticas e programas públicos de sustentação da competitividade local, compatíveis com a perspectiva evolucionária. Por fim, destacam-se algumas questões de pesquisa iminente a serem tratadas mais adiante. No Capítulo 4, fundamentos evolucionários são combinados com conceitos da teoria comportamental e da visão baseada nos recursos e competências da firma para o desenvolvimento de uma abordagem evolucionária específica da dinâmica competitiva em arranjos produtivos locais. Inicialmente, a noção de que o ritmo de incorporação de tecnologias mais avançadas é um dos principais fatores condicionantes da competitividade das empresas é CAPÍTULO 1 – INTRODUÇÃO 6 revista. Ressalta-se que esta incorporação não se dá de maneira homogênea nem simétrica a todas às firmas, provocando um processo que se pode denominar de “estratificação tecnológica competitiva” no arranjo. Considera-se que este seja decorrente do desempenho de cada empresa em incorporar mudanças técnicas e organizacionais e em adotar estratégias de adaptação às variações de mercado. Pela abordagem evolucionária, tais fatores poderiam ser captados pela identificação de “traços” (padrões) recorrentes em certos grupos de diferentes empresas. Nesse ponto, explora-se a relação entre os fundamentos endógenos e exógenos da firma. Pela abordagem adotada, o conjunto de regras, procedimentos, rotinas e os vários padrões de comportamento, carregam as impressões e os “caracteres” que podem revelar sua verdadeira fonte de vantagens ou desvantagens no jogo competitivo. Assim, a identificação de padrões de comportamento embutidos em tais elementos intrínsecos à firma é assumida como um meio consistente a se explorar na análise competitiva e no estudo do comportamento das organizações. A partir dos conceitos de dependência da trajetória, trajetória tecnológica e rotinas, ao final, introduz-se o conceito de “Trajetória Competitiva”. Neste sentido, no Capítulo 5, propõe-se uma abordagem e uma metodologia próprias para o estudo da estratificação tecnológica em arranjos produtivos locais, a partir do conceito de “Trajetória Competitiva”. Inicialmente, faz-se uma revisão das abordagens mais recentes para análise de sistemas produtivos locais, regionais e setoriais. São destacados alguns enfoques para o problema da estratificação de atividades tecnológicas, no âmbito da firma, de setor industrial e em termos de nação. Ao final, são traçadas as considerações prévias sobre a aplicação da metodologia ao caso específico de um arranjo produtivo local. No Capítulo 6, apresenta-se um caso aplicado da abordagem e metodologia propostas, através de uma síntese de projeto de pesquisa vinculado, realizado no Pólo de Cerâmica Vermelha do Norte Fluminense (Campos-RJ). Ao final discutem-se os resultados obtidos, a consistência da metodologia e as hipóteses assumidas. No Capítulo 7, as Conclusões encerram o trabalho. Os Apêndices complementam as informações e dados que sustentaram as conclusões, seguido das Referências, que formaram a base fundamental para construção da abordagem e metodologia propostas nesta obra. CAPÍTULO 2 COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE RESUMO Nos dias de hoje, o termo competitividade é amplamente empregado nas mais diversas situações e, na maior parte das vezes, sem rigor de definição do conceito que está por trás da palavra, o que tem gerado um verdadeiro mosaico de definições, dificultando o entendimento e, muitas vezes, induzindo conflitos de interpretação. Para sintetizar e definir um marco teórico sobre o tema, nesse Capítulo procura-se desenvolver uma avaliação sobre os principais conceitos por trás do termo “competitividade”, contrapondo, sempre que possível, os diversos enfoques, de modo a prover uma visão sintética das dicotomias e divergências conceituais mais destacadas. Através da revisão bibliográfica sobre o tema, verifica-se que na análise da competitividade estão envolvidos vários níveis, internos e externos, que, em suma, buscam captar o comportamento da firma. Entretanto, a divisão tradicional da análise competitiva nos níveis organizacional, estrutural, geográfico e sistêmico, negligencia certos arranjos produtivos locais, pouco competitivos fora da esfera regional. Nesse sentido, para quando esta análise envolver pólos de indústrias locais, propõe-se a consideração de um quinto nível, o qual foi denominado de “segmental”, por aqueles constituírem-se geralmente de pequenos segmentos de cadeias produtivas, pouco representativos comercialmente na cadeia, mas contudo, em muitos casos, exercerem papel importante na economia regional e suscetíveis a propostas de desenvolvimento local. Conclui-se que a competitividade, como o próprio processo produtivo, é antes de tudo comportamental e dinâmica. CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 8 2.1 Introdução Desde o início do século passado, com os princípios da administração dos tempos e movimentos de Taylor e Fayol, até os dias de hoje, os conceitos de crescimento e expansão, mesmo passando por um processo de constante evolução de pontos de vista, sempre estiveram presentes nos propósitos da organização industrial. Neste período, o conceito de organização produtiva expandiu-se, passando a incorporar novos requisitos, como produzir, vender e entregar melhor, mais barato e mais rápido que os concorrentes. Este processo acelerou a disputa para superação de obstáculos e adaptação aos novos requisitos exigidos pelos mercados, o que se acentuou com o processo de abertura econômica e a internacionalização dos negócios (LANGLOIS, 2001). Paralelamente, os países e regiões, por sua vez, passaram a depender cada vez mais de empresas, indústrias e setores fortes internacionalmente1 (PORTER, 1989; MALECKI, 1997; CHANDLER, 1997). Por outro lado, a expansão da riqueza nacional, o aumento da capacidade produtiva e a melhoria das condições de infra-estrutura energética, de telecomunicações e de transporte, são algumas das preocupações que sempre moveram as economias mais avançadas. Entretanto, o progresso tecnológico alcançou uma dimensão tal que “na sociedade moderna, a competitividade nacional está baseada primeiramente na tecnologia. Ciência e tecnologia passam a constituir os fatores decisivos nas novas forças produtivas. Nações em desenvolvimento precisam investir pesadamente em tecnologia para expandir a economia. Nós acreditamos que ciência e tecnologia serão o núcleo da competitividade no futuro” (PORTER et al., 2001:477). 1 Na visão tradicional, o crescimento econômico e o progresso social de uma nação estariam atrelados e dependentes da eficiência e eficácia com que as empresas e indústrias efetivamente atingiriam a seus propósitos. Estas, através do pagamento de tributos, permitiriam e sustentariam investimentos públicos em áreas estratégicas, como infra-estrutura urbana, segurança, educação, saúde e preservação do meio ambiente, e também em financiamentos aos setores produtivos. De certa forma, o desempenho de um país, a qualidade de vida e o bem estar da população, passaram a estar vinculados diretamente ao desempenho das indústrias e da boa administração do dinheiro público. Teoricamente, porém, o fluxo de capital neste ciclo não é isolado nem conservativo. Na prática, perdas devido às limitações inerentes ao próprio processo, controle e fiscalização, e a tolerância à corrupção, podem comprometer o funcionamento desse ciclo. Nesse sentido, em ambientes democráticos, sociedades mais bem informadas e de melhor nível educacional exercem maiores pressões para resolução dos problemas, a busca de soluções alternativas e a correção de falhas, contribuindo de forma fundamental para a melhoria no desempenho do país. Para diferentes pontos de vista sobre este tema, ver Piore & Sabel (1984); Buitelaar & Van Dijck (1996); Landes (1998), e os três primeiros capítulos em von Tunzelman (1995). CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 9 Apesar de afirmações contundentes como a anterior, e de servirem a propósitos semelhantes, os atributos que levam uma nação a ser considerada “evoluída” e uma empresa a ser vista como “competitiva”, carregam contradições intrínsecas. Contudo, muitas vezes são assumidos como equivalentes, sob a denominação genérica de “competitividade”. Conceitualmente, o termo competitividade pode ter suas raízes atribuídas à biologia, mais especificamente aos estudos de Lamarck e Darwin sobre a Teoria da Evolução das Espécies, pela qual, grosso modo, os seres lutam para sobreviver em um processo de competição de vida ou morte, onde os sobreviventes ganham o direito de transmitir seus genes às gerações posteriores. As primeiras tentativas de aplicação de conceitos evolucionários aos fenômenos econômicos remontam ao final do século XIX, com Veblen (ver, MAYHEW, 1998), e ao início do século XX, com Schumpeter, e sua metáfora de “destruição criativa” para os efeitos do avanço tecnológico sobre a economia2. A literatura com questões relativas à “competitividade” é extremamente dispersa e difusa. Especialmente no campo dos negócios, o seu emprego e a conotação que se atribui ao termo, é livre de qualquer rigor conceitual. Geralmente, parte-se do pressuposto que o conceito é ampla e inquestionavelmente definido, ignorando-se os conflitos teóricos que traz embutido. Ultimamente, o emprego do conceito de competitividade ganhou força epidêmica, especialmente no mundo dos negócios, com o crescimento da internacionalização e abertura de novos mercados. Mais recentemente, com a consolidação das operações globais de investimento e de produção (mais a primeira que a última), este termo tem sido trasladado para denominar países e regiões com o mesmo sentido, o que tem gerado grande polêmica e conflitos conceituais. 2 Porém, somente no início da década de 80, com a publicação do livro “An Evolutionary Theory of Economic Change” de Nelson & Winter (1982), é que foram lançadas as bases para um tratamento mais formal da aplicação dos conceitos evolucionários ao ambiente microeconômico. Este trabalho consolidou a abertura de uma avenida de pesquisa, que passou a ser denominada teoria econômica evolucionária, ou neoschumpeteriana. De forma geral, esta se caracteriza por defender que os processos econômicos de crescimento e desenvolvimento são reflexos de mudanças estruturais (basicamente, inovações), desequilíbrios e coalizões, e, fundamentalmente, que os agentes atuam em condições de “informação imperfeita” e “racionalidade limitada” e que a tecnologia não é um “pacote” livremente disponível no mercado e absorvido de forma idêntica por todas as firmas. Estas hipóteses contrapõem frontalmente os preceitos básicos da Teoria Neoclássica, de “informação perfeita”, “racionalidade” e “equilíbrio geral”. Para um survey sobre a abordagem evolucionária ver Freeman (1994). Para enfoques alternativos dessa teoria, ver, por exemplo, Metcalfe (1995a, b) e Nooteboom (1999). CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 10 Até em meios acadêmicos, nota-se pouca preocupação sobre ao que o termo “competitividade” realmente corresponde, qual o conceito por trás, e se é adequado ao contexto. Este comportamento tem contribuído para formar um mosaico de interpretações e distorções a respeito do assunto. A abordagem desse tema varia de múltiplas formas, de acordo com a corrente teórica da economia (neoclássica tradicional, do crescimento endógeno, evolucionária, estruturalista etc.); com a dimensão da análise (em nível macro ou microeconômico); com o objeto de estudo (firma, setor, país, blocos econômicos); e com o contexto (econômico, social, ambiental), entre outros. Em um nível microeconômico, “competitividade” é geralmente entendida como a habilidade de uma firma crescer, aumentando sua lucratividade e seu mercado. Pela teoria econômica tradicional, custos comparativos de produção determinariam a vantagem competitiva da firma, e uma forma de torná-la mais competitiva seria através da produção de produtos com custos menores aos dos concorrentes. Contudo, o conceito de competitividade também varia de acordo com a teoria organizacional da firma, como a comportamental e a contingencial3. Tradicionalmente, o principal enfoque da competitividade tem sido nos fatores organizacionais endógenos como desempenho, eficiência técnica e, principalmente, a otimização dos recursos das empresas. Paralelamente, é cada vez maior o enfoque no comércio internacional e nas especificidades dos fatores locais. Além da influência dos efeitos locais e regionais na competitividade de firmas e indústrias, alguns autores também procuram destacar o papel de fatores mais subjetivos, não monetários, como importantes determinantes da competitividade (ver, por exemplo, Doeringer & Terkla, 1990). Alguns estudos recentes, com diferentes enfoques sobre o tema competitividade, incluem Porter et al. (2001); Clark & Guy (1998); Maskel et. al. (1998), Krugman (1994) e Porter (1989,1988). Utilizando a metodologia proposta em Porter (1989), Coutinho & Ferraz (1995), desenvolveram um importante estudo sobre a competitividade da indústria 3 Neste trabalho adotamos uma perspectiva comportamental da firma, utilizando conceitos de trabalhos clássicos como Penrose (1959), Cyert & March (1963) e March (1988), e Burgelman et al., (1995). Desdobramentos recentes nessa linha utilizam duas denominações para a mesma visão, a “baseada em recursos” (ver, por exemplo, Lieberman & Montgomery, 1998), e a “baseada na competência” (ver, por exemplo, Reed & DeFillippi, 1990). CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 11 no Brasil. Também merecem destaque na análise da competitividade no cenário brasileiro os trabalhos de Ferraz et al. (1997) e Costa e Arruda (1999). 2.2 Abordagens da competitividade Segundo Coutinho & Ferraz (1995), um ambiente de livre mercado e competição aberta estabelece o contexto no qual a capacidade competitiva é formada. Nesse contexto, a competitividade da firma pode ser vista como “a produtividade das empresas ligada à capacidade dos governos, ao comportamento da sociedade e aos recursos naturais e construídos, e aferida por indicadores nacionais e internacionais, permitindo conquistar e assegurar fatias do mercado” (p.10). Porém, esta aferição pode ser prejudicada pela dificuldade de se obter dados e informações atualizados. “A carência de dados estatísticos e de indicadores de desempenho confiáveis, limita o acompanhamento da evolução industrial, da distribuição social dos benefícios e do estado-da-arte da tecnologia” (op.cit.: 11). No âmbito internacional, historicamente, o indicador mais difundido de competitividade é o comércio exterior, cujo principal fator de desempenho é o preço (em US$). Entretanto, esta maneira de avaliar a competitividade tem sido reconsiderada, desde que, em alguns países, constatou-se que a queda nos preços dos produtos exportados, e a elevação dos mesmos em outros, estavam, na verdade, relacionadas à variação do mercado compartilhado e não especificamente ao preço (KALDOR, 1981). Segundo Clark & Guy (1998), este fato diminuiu a credibilidade do enfoque no preço e alimentou o interesse pelo estudo dos fatores não monetários da competitividade. 2.2.1 A abordagem tradicional da competitividade e suas limitações Dependendo do conceito e da abordagem, percebem-se dois critérios distintos para se avaliar a competitividade. O primeiro vê a competitividade como uma capacidade intrínseca e restrita ao processo produtivo, com ênfase nos meios de produção. Neste caso, sua medida é feita através de um critério específico, a eficiência. O segundo, assume a competitividade como um fenômeno dinâmico e relativo aos fins da produção, e a mede pela participação no mercado. Segundo Haguenauer (1989), Kupfer (1992) e Ferraz et al., (1997), podemos caracterizar as duas abordagens da seguinte forma: CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 12 1) Uma, que define competitividade a partir da noção de eficiência do processo produtivo (ou na relação insumo-produto), e representa a competitividade potencial, a qual se expressa através da produtividade e da qualidade em relação aos concorrentes. Neste caso, os indicadores mais utilizados para a avaliação são o preço, o custo, os coeficientes técnicos e parâmetros de produtividade dos fatores da indústria internacional. Essa medida revela uma “competitividade potencial” que demonstra a capacidade da empresa em converter insumos em produtos com o máximo rendimento. Por esta visão, a competitividade é determinada pela capacidade do produtor de escolher quais técnicas utilizar, de acordo com as limitações de seus recursos, principalmente os financeiros, os tecnológicos e os gerenciais. Dessa forma, a competitividade é um fenômeno ex ante facto. 2) Outra, que defende que a competitividade está diretamente relacionada com a participação no mercado. É medida pela eficácia ou posição no mercado, principalmente pelo volume das exportações e o mercado compartilhado. Neste caso, os indicadores a serem avaliados vão desde as condições de produção até as políticas cambial e comercial, a eficácia dos canais de comercialização, os sistemas de financiamento à produção e estratégias. Por esta ótica, a competitividade é definida pelo mercado, através da demanda. A satisfação dos consumidores em adquirir os produtos e serviços influencia a competitividade das empresas. Esta seria uma medida da competitividade ex post facto. Indiretamente, a produtividade e todos os outros fatores não mensuráveis e intangíveis, estariam embutidos nessa avaliação, apesar de não se poder identificá-los. Segundo Haguenauer (1989), uma das vantagens deste conceito é sua menor complexidade de mensuração. A seguir são apresentadas duas formas de abordar o desempenho competitivo das firmas. A Figura 2.1 mostra um sistema de produção genérico, no qual os insumos (entrada) são transformados em algum tipo de produto acabado (saída). As medidas de desempenho mais comuns, e suas respectivas definições gerais, são mostradas na legenda (ver WAEYENBERGH & PINTELON, 2002). Este tipo de medida pode ser considerado uma avaliação da competitividade “internamente referenciada”. A Figura 2.2 apresenta uma visão do comportamento competitivo da firma baseado na posição do mercado. Neste caso, as vantagens comparativas seriam aquelas tradicionalmente baseadas em recursos internos. As vantagens competitivas adviriam de estratégias bem sucedidas adotadas perante o ambiente. A posição no mercado refletiria CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 13 estas vantagens ou desvantagens competitivas. A partir de resultados alcançados no mercado, realimentações no processo (feedbacks) provocariam decisões de ajuste e reposicionamento estratégico com a reformulação e a adoção de novos recursos (ver HUNT & MORGAN, 1997). Esta seria uma medida “externamente referenciada”. Insumo (entrada) Processo (caixa – preta) Produção (saída) Definições genéricas: Eficiência = Entrada teórica Saída presente Eficácia = Entrada presente Saída teórica Saída Produtividade = Efetividade = Eficácia x tempo Entrada Figura 2.1 – Relações genéricas de medida de desempenho (baseado em Waeyenbergh & Pintelon, 2002: 311, Fig.7) Recursos -Vantagens comparativas - Paridade - Desvantagens comparativas Posição no Mercado -Vantagens competitivas - Paridade - Desvantagens competitivas Desempenho financeiro - Superior - Paridade - Inferior Figura 2.2 – Comportamento da firma com base no desempenho no mercado (adaptada de Hunt & Morgan, 1997: 78, Fig.1) CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 14 Apesar de difundidas e utilizadas amplamente, as formas tradicionais de avaliação da competitividade têm sofrido severas críticas por apresentarem algumas deficiências crônicas. Segundo Ferraz et al. (1997), pelo fato de a participação no mercado e da produtividade serem referenciais medidos a posteriori, no caso, por exemplo, de haver uma política de subsídios específicos à exportação para certos setores, os resultados medidos dessa forma estariam distorcidos, pois o desempenho das empresas poderia não ser fruto da eficiência no processo produtivo. Além disso, esta seria uma abordagem estática, focada apenas nos efeitos, sem identificar as relações causais, podendo não ser sustentável no longo prazo. Coutinho & Ferraz (1995), afirmam que a visão econômica tradicional da competitividade, que a assume como uma questão de preços, custos (especialmente salários) e taxa de câmbio, está superada. Historicamente, “paises com políticas focadas na desvalorização cambial, no controle de custos e na produtividade do trabalho naufragaram sem conseguir melhorar a competitividade das empresas, enquanto que outros, foram vitoriosos e se afirmaram no mercado mundial, apesar de elevarem seus custos trabalhistas e de longos períodos de sobrevalorização cambial” (op.cit.:16). “Se observados dinamicamente, tanto o “desempenho” quanto a “eficiência” são resultados de capacitações acumuladas e estratégias competitivas adotadas pelas empresas, baseadas em percepções quanto ao processo concorrencial e ao meio ambiente econômico e social em que estão inseridas” (op.cit.: 18). Nesse sentido, Vasconcelos & Cyrino (2000:33), destacam que “com a alteração das condições ambientais, mudam também os recursos essenciais para garantir a sobrevivência e o desempenho econômico diferenciado das firmas”. Seria a antecipação dessas mudanças no ambiente, e a adoção de estratégias vencedoras, que garantiria a possibilidade de sustentação das vantagens competitivas das firmas. Nesta linha de pensamento, um conceito mais representativo do termo competitividade deveria integrar os critérios de avaliação da eficiência e do desempenho presente, com sua evolução e perspectivas de sustentação futura. Dessa forma, seria importante responder a uma pergunta fundamental: Onde estariam as fontes das vantagens competitivas? CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 15 Tais questionamentos indicaram a necessidade de se incluir na abordagem da competitividade tanto fatores endógenos como exógenos do ambiente em que as empresas atuam, em uma perspectiva dinâmica e sistêmica. 2.2.2 A abordagem dinâmica da competitividade Segundo Ferraz et al. (1997: 3), “a partir de uma perspectiva dinâmica, o desempenho no mercado e a eficiência produtiva decorrem da capacitação acumulada pelas empresas que, por sua vez, reflete as estratégias competitivas adotadas em função de suas percepções quanto ao processo concorrencial e ao meio ambiente econômico onde estão inseridas. Desse modo, ao invés de entendida como um fator intrínseco de um produto ou de uma firma, a competitividade surge como uma característica extrínseca, relacionada ao padrão de concorrência vigente em cada mercado. Este, por sua vez, corresponde ao conjunto de fatores críticos de sucesso em um mercado específico”. Pela abordagem dinâmica, o processo de tomada de decisão estratégica concentra os fatores primordiais da competitividade. Porém, devido às incertezas do ambiente, e conseqüentemente, pela impossibilidade de se conhecer antecipadamente as estratégias dos concorrentes, as empresas definem seu comportamento e suas estratégias competitivas a partir de experiências passadas e de sua perspectiva quanto ao ambiente, o que está relacionado a conceitos econômicos evolucionários (ver NELSON & WINTER, 1982; DOSI, 1988). Nesta linha, alguns fatores a serem avaliados, além da produtividade, seriam: o tamanho das firmas, a estrutura produtiva, o padrão de concorrência, as tecnologias utilizadas e alternativas presentes e futuras, as economias de escala e de escopo, as competências específicas, entre outros mais específicos à região, ao setor e às próprias firmas, como a história específica e a cadeia de agregação de valor. Dessa forma, inovar passa a ser fundamental e o sucesso competitivo torna-se dependente da criação de novas vantagens e da recombinação das anteriores. Em adição àqueles fatores tradicionais como custo, preço, qualidade e flexibilidade na produção e o tempo e confiabilidade de entrega, torna-se fundamental também considerar “certas particularidades”, menos aparentes, vinculadas à diversidade setorial e regional. CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 16 Pela abordagem dinâmica, fatores como o capital humano (habilidades, experiência e motivação do trabalhador); fatores técnicos e culturais (capacidade de adaptação a novas tecnologias); habilidade gerencial para manter e expandir relacionamentos internos e externos à firma (com firmas correlatas, com empregados, fornecedores, clientes, órgãos públicos e instituições de pesquisa), que influenciam a habilidade da firma em obter e manter uma posição lucrativa em face às mudanças tecnológicas, econômicas e sociais e a outros desafios do ambiente. Nesse sentido, a abordagem dinâmica da competitividade encontra ecos muito nítidos na teoria dos recursos da firma (resource-based view, no inglês). Tal abordagem foca nos recursos e capacitações, fatores base para o estabelecimento e sustentação das vantagens competitivas das firmas, de modo a entender o desempenho estratégico dos negócios e prover direções para a formulação das estratégias de mercado (HADJIMANOLIS, 2000). Assim, a lucratividade e o mercado compartilhado permanecem como indicadores a serem considerados, todavia, passam a ter menor significância diante da maior dimensão da análise, com uma visão de mais longo prazo. Dessa forma, o conceito de competitividade assume outra conotação e a questão de quais são os indicadores mais representativos, torna-se mais complexa. O Quadro 2.1, a seguir, mostra um resumo das diferenças entre as diferentes abordagens da competitividade apresentadas anteriormente. Quadro 2.1 – Diferentes abordagens da competitividade das empresas Abordagens Tradicionais Baseada na eficiência Baseada na eficácia/efetividade Fatores Otimização da produção: aumento da produtividade, qualidade do processo, redução de perdas etc. Fatores Desempenho, participação no mercado, satisfação dos clientes, qualidade no produto etc. Indicadores Preço, custo, coeficientes técnicos, parâmetros de produtividade dos fatores da indústria internacional. Indicadores Lucratividade, volume das vendas, exportações, mercado compartilhado, número de contratos firmados ou concorrências vencidas etc. Foco Estratégico Engenharia e Processos Produtivos Foco Estratégico Gestão e Marketing Abordagem Dinâmica Baseada no comportamento da firma Fatores Estrutura produtiva; Padrão de concorrência; Economias de escala e de escopo; Competências específicas; Experiências passadas; Perspectiva quanto ao ambiente. Indicadores Conjugados (preço, custos, produtividade, lucratividade, volume de vendas, mercado compartilhado etc.) Foco Estratégico Nas capacidades e no processo de formação e tomada de decisão CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 17 Uma abordagem dinâmica procura caracterizar e formalizar o ambiente competitivo da firma através de uma avaliação mais sistêmica e comportamental. Assim, as causas do sucesso das firmas seriam mais abrangentes, porém específicas ao meio ambiente onde a empresa surge e se desenvolve. Várias vertentes do campo da administração corporativa procuram explorar tais questões pelo ponto de vista da firma, através de conceitos como “estratégias competitivas” (PORTER, 1989; BARNETT & BURGELMAN, 1996), competências essenciais (PRAHALAD & HAMEL, 1990), capacidades dinâmicas (TEECE & PISANO, 1994), e ativos invisíveis (ITAMI, 1994). 2.3 Determinantes da competitividade Segundo Porter (1988), a competitividade das empresas é específica a cada setor industrial, e dessa forma, é determinada por seus elementos estruturais, os quais compreendem os fornecedores, os compradores, os concorrentes atuais e os concorrentes potenciais. Tais elementos influenciam diretamente o posicionamento das empresas no setor (indústria), podendo ser caracterizados através de cinco forças principais que pressionam as empresas, que foram definidas da seguinte forma: 1. O poder de negociação dos fornecedores; 2. O poder de negociação dos compradores; 3. A ameaça de produtos substitutos; 4. A ameaça dos novos entrantes; 5. A intensidade da concorrência e rivalidade no setor. Assim, tal abordagem ficou conhecida na literatura como o“modelo das 5 forças de Porter”. O Quadro 2.2 mostra alguns fatores de análise em cada uma dessas forças. CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 18 Quadro 2.2 - Forças e fatores da competitividade empresarial Força Rivalidade e concorrência O poder do comprador A ameaça de substituição Fatores de análise Custos fixos (ou de armazenamento)/valor agregado; Diferenciação de produtos; Concentração; Poder da marca; Custos de mudança; Regulação; Complexidade das informações. Alavancagem de negociação Concentração de compradores versus concentração de empresas; Volume do comprador; Custos de mudança do comprador em relação aos custos mudança na empresa Sensibilidade ao preço Preço/ compras totais Diferenças nos produtos Identidade da marca Lucros do comprador Impacto na qualidade Impacto no desempenho Custos de mudança; Desempenho relativo; Preços; Diferenciação; Flexibilidade; Condições de entrega. Qualidade; O poder do fornecedor Diferenciação; Custos de mudança; Concentração; Volume-preço; Integração para frente e para trás; Custos relativos às compras totais. As barreiras à entrada no negócio Economias de escala; Diferenciação; Identidade da marca; Custos de mudança; Capital exigido; Acesso à distribuição; Disponibilidade de insumos; Política governamental; Retaliação. Fonte: Porter (1988) Porter (op.cit.), destaca que a análise da competitividade deve ser baseada nos fatores que levam à sua sustentação. Portanto, na sua visão, a análise competitiva deve focar principalmente a cadeia de valores, onde estaria a verdadeira essência da vantagem competitiva da empresa. Ampliando o contexto empresarial/setorial da esfera nacional para a esfera internacional, Porter (1989) liderou um estudo para levantar informações e responder porque algumas nações obtêm mais sucesso no comércio internacional que outras. De acordo com este estudo, consolidado no livro “A Vantagem Competitiva das Nações”, Porter (1989), sustenta que há quatro conjuntos interdependentes de atributos de uma nação que influenciam e determinam mutuamente o ambiente que habilita as firmas a alcançarem sucesso na competição internacional. Tais conjuntos de atributos constituem o denominado modelo “Diamante de Porter”, os quais podem ser assim descritos: 1. Condições de fatores: tais como a disponibilidade de pessoal qualificado e infra-estrutura; 2. Condições de demanda para bens e serviços da indústria; 3. Indústrias auxiliares e correlatas, incluindo a presença de fornecedores competitivos; 4. Estratégia das firmas, estrutura e rivalidade. A seguir é feita uma breve síntese deste modelo: CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 19 1. Condições de Fatores (insumos): Contrariamente ao que se tradicionalmente pregava, simplesmente possuir uma força de trabalho qualificada ou bem educada, na moderna competição internacional, não representa vantagem competitiva. Vantagens são sustentadas por fatores altamente específicos às necessidades de uma indústria em particular (como, por exemplo, institutos de pesquisa, grupos de capital de risco específicos em algumas áreas). Para serem criados, tais fatores requerem investimento continuado, pois são mais escassos e mais difíceis de serem copiados pelos competidores. Por isso são estratégicos. Nesse sentido, eventuais desvantagens não necessariamente são prejudiciais, pois podem prover estímulos para o desenvolvimento da competitividade. Se matériasprimas baratas ou o trabalho são disponíveis em abundância, há uma tentação em se basear somente nestas “vantagens” iniciais e uma tendência em utilizá-las de forma ineficiente. Por outro lado, certas desvantagens (preços relativos altos, trabalho escasso, matérias-primas escassas) podem ser um desafio para a busca de soluções próprias criativas e inovadoras, as quais são difíceis de imitar. Isto, evidentemente, quando impulsos positivos são gerados por outros fatores ou sofrem estímulos do ambiente (PORTER, 1990: 78). 2. Condições de demanda: Quanto maior a demanda de clientes em uma economia, maiores serão as pressões sobre os preços e os produtos. Assim, as firmas são forçadas a constantemente buscar um melhor balanceamento entre os fatores característicos dessa demanda, melhorando sua competitividade, via produtos inovadores, alta qualidade, melhores preços, confiabilidade, flexibilidade etc. 3. A existência ou falta de indústrias auxiliares e vinculadas (Condições de suporte): A proximidade espacial à jusante e à montante da cadeia industrial facilita o intercâmbio de idéias e inovações. Por isso a importância dos clusters. Porter refere-se, entre outros, ao caso dos distritos industriais na Itália, considerando suas especificidades e vantagens proporcionadas a empresas instaladas nesses ambientes. Segundo o autor, indústrias à jusante, em nenhum caso, deveriam ser protegidas da competição internacional, pois quando certas indústrias fornecedoras de insumos não existem, ou não os produzem em condições competitivas (baixa qualidade, preços altos, capacidade etc), tais recursos poderiam ser obtidos no mercado mundial. CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 20 4. Estratégias dos negócios e estrutura e rivalidade (Condições de concorrência): Porter nota que apesar de todas as diferenças e peculiaridades nacionais, uma característica compartilhada por economias competitivas internacionalmente é a forte competição entre as firmas nacionais. De forma estática, os “campeões nacionais” podem desfrutar de vantagens de escala, mas o mundo real é dominado por condições dinâmicas, e é a competição direta que impele firmas a trabalhar para aumentar sua produtividade e melhorar seus produtos e serviços. Neste ponto, a competição anônima freqüentemente leva a rivalidades e feudos concretos, em particular quando os competidores são concentrados espacialmente. “Quanto mais localizada, mais intensa é a rivalidade. E quanto mais intensa, melhor”. (PORTER, 1990: 83). Como resultado deste processo, há uma perda de importância das vantagens locacionais estáticas, levando as firmas a desenvolverem vantagens dinâmicas. Este último ponto indica que os quatro atributos do diamante não atuam isoladamente, mas sim de forma sinérgica, podendo intensificar-se reciprocamente. Firmas que operam sob regime de forte competição, pressionam instituições de suporte (Institutos de Pesquisa e Desenvolvimento e Instituições de treinamento e aperfeiçoamento) com demandas mais específicas e objetivos mais concretos. Esta intensificação recíproca é identificada particularmente em clusters, onde competem firmas, fornecedores e instituições de suporte. O primeiro conjunto de atributos (condições de fatores) captura os conceitos neoclássicos de recursos físicos, recurso humanos e capital, além de envolver novos elementos, como os recursos de conhecimento e infra-estrutura. As condições de demanda refletem as condições do mercado doméstico para produtos e serviços, enfatizando especialmente o papel de compradores sofisticados e exigentes, que pressionam as firmas a melhorar a qualidade de seus produtos e serviços. O terceiro conjunto destaca a importância da formação de clusters, os quais, em sendo competitivos internacionalmente, transmitem e disseminam através de suas inter-relações, os padrões em nível global para as firmas correlatas e auxiliares. O quarto fator inclui aspectos legais, culturais e institucionais que determinam e condicionam as estratégias, estruturas e padrões de CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 21 concorrência, que habilitam as firmas a serem bem sucedidas em explorar oportunidades e competir no mercado global (MEYER-STAMER, 1997). Paralelamente, eventos fortuitos (acasos) e ações do governo também são considerados como variáveis adicionais. Estes eventos incluem invenções, conflitos armados e guerras, e outras causas que provocam mudanças inesperadas na demanda externa. Políticas governamentais, regulações, investimentos e o volume de compras pelo poder público, condicionam fortemente a vantagem competitiva internacional de certas indústrias e setores (como, por exemplo, pecuária, agroindústria, militar, farmacêuticos, materiais esportivos e produtos hospitalares). Segundo Porter (1990), estes conjuntos de atributos (que formam o diamante), “individualmente e como um sistema, é que criam o contexto no qual as firmas de uma nação nascem e competem”. Porém, a condição fundamental para a competitividade, entre todas, é a pressão que estes determinantes exercem sobre as firmas, levando-as a investir e inovar. O Quadro 2.3 mostra um resumo geral do pensamento porteriano sobre a competitividade. O mercado compartilhado de uma indústria no mercado mundial e no mercado doméstico são os principais indicadores com os quais Porter (1989) baseia sua análise da competitividade. Entretanto, tais medidas são colhidas ex post, sendo a existência de algum mercado compartilhado, por mínimo que seja, o único elemento qualitativo considerado para qualificar um cluster como “competitivo”. Este é um dos pontos criticados no modelo Diamante. Outra crítica feita a tal modelo é relativa a sua não aplicabilidade às características de certas regiões e países (ver, por exemplo, GRANT, 1991; RUGMAN, 1991; SPRING, 1992), Apesar das críticas, o modelo Diamante de Porter vem exercendo uma forte influência nas políticas de desenvolvimento regional e local, em várias partes do mundo (ver, por exemplo, COUTINHO & FERRAZ, 1995; HEALEY & DUNHAM, 1994) e tem sido amplamente utilizado para análise da competitividade de clusters setoriais, inclusive no Brasil (ver ZAMITH & SANTOS, 1999). CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 22 Quadro 2.3 – A visão de Porter sobre a competitividade “Nenhuma nação pode ser competitiva (e exportadora) em tudo e ao mesmo tempo” (1989: 7). “Porque as empresas de certas nações conseguem a liderança em determinados setores/indústrias?” (1989: 17). “Ao invés de simplesmente maximizar uma função sob certas restrições, a questão é como as empresas podem obter vantagens competitivas quando mudam as restrições.” (em explícita crítica à teoria neoclássica) (1989: 21). “Empresas bem sucedidas estão freqüentemente concentradas em certas regiões ou certas cidades, dentro do país” (1989: 29). “Algo nestas locações provê um ambiente fértil para empresas nestes locais, para certas indústrias ou setores” (1989: 29). “O papel do governo é impulsionar e estimular sua indústria a avançar, e não protegê-la da competição” (1989: 30). “As nações tendem a ser competitivas em atividades nas quais são admiradas ou se destacam, das quais surgem campeões” (1989: 115). “A concorrência doméstica não somente cria pressões sobre as empresas para melhorias e inovações, mas também contribui para que elas possam alcançar e até superar os concorrentes internacionais” (1989: 119). “A concentração geográfica de concorrentes em uma localidade ou região reflete e acentua os benefícios desta aglomeração. Este fenômeno é percebido no mundo inteiro” (1989:120). “Em tais ambientes, um simples restaurante se torna ponto de encontro e troca de informações e referências de várias empresas. As informações fluem com enorme velocidade” (1989: 121). “Isto não é restrito ao campo dos negócios, é um processo social que se reflete nas artes, nas ciências e nos esportes” (1989: 121). “A prosperidade nacional é criada, não herdada. Isto não surge dos recursos naturais de um país, da sua força de trabalho, de suas taxas de juros, ou do valor de sua moeda, como os economistas clássicos supunham” (1990: 73). “A competitividade de uma nação depende da capacidade de sua indústria em inovar e se modernizar. E as empresas ganham vantagem sobre seus competidores internacionais devido às pressões e aos desafios aos quais são expostas. Elas se beneficiam quando têm rivais domésticos fortes e uma base local (nacional) de fornecedores agressivos e consumidores exigentes” (em referência implícita à teoria evolucionária) (1990: 73). “Em um mundo de competição crescente, as nações tendem a se tornar mais, e não menos importantes. Como as mudanças nas bases da competição, e o foco cada vez maior na criação e assimilação de conhecimento, o papel das nações tem crescido em importância” (1990: 73). “A vantagem competitiva é criada e sustentada através de um processo altamente localizado. Diferenças nacionais em valores, culturas, estruturas econômicas, instituições e histórias contribuem para o sucesso competitivo” (crítica implícita aos preceitos neoclássicos) (1990: 73). “Há impressionantes diferenças setoriais nos padrões de competitividade em cada país e nenhuma nação será competitiva em todos eles ou na maioria deles. Ultimamente, as nações têm sucesso em certos setores pelo fato de seu ambiente doméstico ser mais audacioso, dinâmico e desafiador” (1990: 73). Fonte: Porter (1989; 1990). Porter (1989: 543-73) também propõe um modelo de desenvolvimento econômico, a partir de quatro estágios: 1) Desenvolvimento direcionado a fatores, privilegiando meios de produção tradicionais (recursos naturais, capital e trabalho), ao invés dos mais avançados; 2) Desenvolvimento direcionado ao investimento, quando os recursos financeiros melhoram as condições de fatores e a utilização de tecnologia, mas não na sua melhoria; 3) desenvolvimento direcionado à inovação, quando firmas criam novas tecnologias e competem globalmente; 4) desenvolvimento direcionado à riqueza, que em CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 23 última instância, leva ao declínio, pois a atenção é desviada da estratégia de aumentar a vantagem para, meramente, preservá-la. Essa proposta também recebeu uma série de críticas, especialmente por ser estática e genérica. Narula (1993), por exemplo, afirma que, para uma análise mais consistente, seria necessário se incorporar nessa abordagem, entre outros fatores, a capacidade de acumulação de capital no decorrer do tempo. Outros autores (entre os quais, os já citados anteriormente) simplesmente desqualificam tal proposta sob a argumentação de falta de sustentação teórica. 2.3.1 Análise da competitividade empresarial Para fins metodológicos, de um modo geral, pode-se dividir a análise da competitividade em duas etapas distintas, aqui denominadas de Análise Ambiental e Padrão de Concorrência Setorial. Estas etapas são apresentadas a seguir. 2.3.1.1 Análise ambiental Segundo Marcovitch (1993), a competitividade empresarial se apresenta em três níveis diferentes e inter-relacionados: ! Um nível central, onde está a eficiência interna da empresa, na combinação de recursos para produzir bens e serviços de elevada qualidade e baixos custos, colocando-os no mercado de acordo com algum critério de segmentação; ! Um segundo nível, configurado pela estrutura setorial, que estabelece as características básicas da concorrência específicas aquele mercado, no qual são medidas forças entre fornecedores e clientes, ameaças e oportunidades setoriais determinantes da competitividade da empresa; ! Um terceiro e último nível, no qual encontram-se as condições gerais de produção e o ambiente macroeconômico. O autor acrescenta que, embora a competitividade seja determinada, primordialmente, pela eficiência da empresa, as nações têm um papel fundamental neste CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 24 processo, através de investimentos em infra-estrutura energética, de transportes e telecomunicações, na educação e suporte à pesquisa, legislação fiscal e trabalhista. Assim, os três níveis anteriormente apresentados podem ser caracterizados em termos da análise da competitividade, da seguinte forma: ! Competitividade Empresarial – refere-se à capacidade das empresas em sustentar em termos mundiais padrões elevados de eficiência na utilização de recursos e qualidade de bens e serviços oferecidos. Uma empresa competitiva deve ser capaz de projetar, produzir e comercializar produtos com preços e qualidade melhores que os concorrentes. ! Competitividade Setorial – reflete a capacidade de setores econômicos em gerar as bases de criação e desenvolvimento de vantagens que sustentem uma posição competitiva internacional. Pode ser medida, simultaneamente, pelo potencial que um setor econômico oferece oportunidade de crescimento e retornos sobre os investimentos atrativos para suas empresas. ! Competitividade Estrutural – é fruto das condições econômicas gerais de um país que determinam a capacidade das empresas em incrementar e sustentar sua participação no mercado mundial, enquanto, simultaneamente, permite um aumento do nível de vida da população e estimula o aumento da eficiência empresarial. Marcovitch, (op.cit.) afirma que a medida da competitividade internacional mais relevante é o mercado compartilhado, através de uma participação ativa e estável da empresa no comércio mundial de bens e serviços. Esta, portanto, deriva da habilidade de seus dirigentes em administrar a interação entre os três níveis descritos de competitividade e proporcionar condições, no mínimo, compatíveis às dos concorrentes externos, proporcionando bases sustentáveis de competição. De forma semelhante, Coutinho e Ferraz (1995) e Ferraz et al. (1997), diferenciam três níveis de fatores determinantes da competitividade, considerando o nível setorial dentro do estrutural. A Figura 2.3 mostra uma ilustração dos níveis e fatores de análise da competitividade. CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 25 Fatores Sistêmicos Fatores Organizacionais Macroeconômicos Estratégia e Gestão Fatores Estruturais (Setoriais) Internacionais Sociais Capacitação para inovar Mercado Indústria Concorrência Tecnológicos Infra-estruturais Capacidade Produtiva Recursos Humanos S e t o r e s Fiscais Financeiros Políticos Institucionais Figura 2.3 – Níveis de análise da competitividade empresarial (Marcovitch, 1993; Coutinho & Ferraz, 1995) Segundo Ferraz et al. (1997), a unidade básica de análise da competitividade deve ser a empresa, pois constitui o núcleo de planejamento e organização da atividade de produção. Este núcleo, por sua vez, é estruturado em distintas áreas de competência. Na obra supra citada, os autores defendem que a análise da competitividade deve compreender quatro áreas principais que sustentam a competência empresarial: produção, gestão, inovação e recursos humanos (Quadro 2.4). Estas áreas podem ser definidas da seguinte forma: ! Atividades de Produção – representam o arsenal de recursos manipulados no processo de manufatura propriamente dito, incluindo equipamentos e instalações, e os métodos de organização e controle da qualidade. ! Atividades de Gestão – compreendem as tarefas de administração típicas, o planejamento estratégico, métodos de tomada de decisão, análise financeira e de marketing e o relacionamento com clientes e fornecedores. ! Atividades de Inovação – referem-se aos esforços de pesquisa e desenvolvimento (P&D) de processos e produtos tanto internos quanto externamente à empresa e a transferência (absorção) de tecnologia (licenciamentos, intercâmbios etc.). CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 26 ! Recursos Humanos – contemplam o conjunto de condições que caracterizam as relações de trabalho, envolvendo os diversos aspectos que influenciam a produtividade, qualificação e flexibilidade da mão-de-obra. Quadro 2.4 - Atividades de sustentação da competitividade empresarial Produção Gestão RH ! ! ! ! ! ! ! ! ! ! Capacidade Atualização Eficiência Qualidade Marketing Relações interpessoais ! Finanças ! Administração ! Planejamento Fonte: Ferraz et al., 1997. Inovação Produtividade Qualificação Flexibilidade Confiabilidade ! ! ! ! Produto Processo Organização Adaptação O nível de capacitação que cada empresa é formado por um processo de acumulação, variável com o tempo. Segundo Ferraz et. al. (1997), o desempenho da empresa é, em larga escala, determinado pelas capacitações acumuladas em cada uma das áreas anteriormente descritas, no decorrer do seu ciclo de vida. Neste ponto de vista, as empresas competitivas seriam simplesmente aquelas de maior capacitação, tal como sugere a abordagem ex ante da competitividade, ou seja, a competitividade potencial. Contudo, esta é uma visão que pode induzir a equívocos, pois a formação deste “estoque de competências” não é homogênea nem simétrica em todas as áreas de atividades da organização, o que representa um caráter idiossincrático de cada empresa, influenciado por mudanças no ambiente. As novas capacitações incorporadas resultam de esforços de acordo com as prioridades e caminhos definidos pela empresa. Esta, para implementá-los, de acordo com o estoque de informações e competências acumuladas e dos recursos financeiros disponíveis, geralmente escassos, toma decisões envolvendo certa racionalidade. A natureza e intensidade dos gastos efetivamente realizados dependem das informações disponíveis no momento e de escolhas feitas pelos decisores em momentos anteriores, o que resultam nas estratégias competitivas adotadas pelas empresas (KUPFER, 1992). O conjunto de fatores determinantes da competitividade extrapola o nível da firma, da estrutura da indústria e do mercado e do sistema produtivo como um todo, englobando as externalidades que afetam as empresas. CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 27 Neste ponto, o conceito de competitividade empresarial/industrial passa a se vincular ao conceito de competitividade local e regional. 2.3.1.2 Análise do padrão de concorrência setorial A competição entre empresas se apresenta de diferentes formas, envolvendo preço, qualidade, flexibilidade, confiabilidade na entrega, diferenciação de produtos etc., porém, em cada mercado/setor há uma certa predominância de fatores críticos de sucesso específicos, que prevalecem frente aos demais. Este grupo de fatores predominantes da competição em cada mercado constitui o “padrão de concorrência setorial”, que molda e condiciona o processo decisório e as estratégias competitivas empresariais (FERRAZ et al., 1997). Os padrões de concorrência são influenciados pelas características estruturais e comportamentais do ambiente competitivo, tanto as relativas à cadeia produtiva, ao setor ou ao mercado (complementaridades tecnológicas, barreiras tarifárias e não-tarifárias, barreiras à entrada e à saída, políticas de incentivo à exportação etc.) como aquelas referentes ao próprio sistema econômico (infra-estrutura, recursos financeiros e humanos, leis e regulação, taxa de juros etc.). Ferraz et al. (1997: 44) apresentam uma tipologia da variação de alguns padrões de concorrência e seus respectivos fatores determinantes da competitividade para grandes setores industriais (commodities, bens duráveis, bens tradicionais e difusores). A Figura 2.4 ilustra as relações entre padrões de concorrência e estratégia competitiva de duas firmas de uma determinada indústria, levando-se em consideração suas variações no decorrer do tempo tn (no caso, t1 e t2). Na Figura 2.4, as Firmas 1 e 2 competem em um mesmo mercado. Em t1, as estratégias adotadas são constantemente reavaliadas de acordo com seus respectivos desempenhos (Dt1), as influências sofridas das condições presente e futura do ambiente econômico (Economia) e da estrutura do setor (Indústria), sempre tomando como parâmetro as estratégias do concorrente. As estratégias adotadas em t1, por sua vez, condicionam as capacitações de ambas no futuro (Ct2), se refletindo imediatamente em novos posicionamentos estratégicos (Et2) e novos desempenhos (Dt2). A generalização CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 28 deste ciclo, forma o que se chama de “padrão de concorrência setorial”, específico a cada Indústria4. Economia Economia D Firma 1 E C Firma 1 Indústria E C Indústria D Firma 2 D E C D Firma 2 t1 E C t2 C – Capacitação; E – Estratégia; D - Desempenho Figura 2.4 – Padrão de concorrência setorial (inspirada em Kupfer, 1992; Marcovitch, 1993; Ferraz et al., 1997). De acordo com o conceito anterior, a competitividade seria uma função de adequação das estratégias próprias de cada firma ao padrão de concorrência característico 4 Esta abordagem é uma variante do modelo tradicional estrutura-conduta-desempenho da Organização Industrial (OI). Por tal abordagem, o desempenho das firmas seria função das estratégias (conduta) que por sua vez dependeriam da estrutura da indústria. Essa visão é fortemente baseada em princípios neoclássicos pelos quais, o objetivo fundamental da firma seria a maximização dos lucros. Através da substituição dos conceitos de “estrutura” da indústria por “capacitação” e “conduta” por “estratégia”, os autores procuram ampliar tal abordagem, incorporando ao modelo original os feedbacks e aspectos dinâmicos do ambiente. Dessa forma, tais fatores passam a ser vistos assim, também como fontes de mudanças na estrutura da indústria, e não apenas como efeitos da estrutura, conforme a visão tradicional da OI (a esse respeito, ver, por exemplo, Porter, 1981; Schmalensee & Willig, 1988; Chandler, 1990; Scherer & Ross, 1990; von Tuzelmann, 1995; Vasconcellos & Cyrino, 2000). CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 29 de cada mercado, definido a partir das interações entre a estrutura econômica específica ao setor (sub-setores) e os principais atributos da concorrência naquela estrutura. Tais atributos são, em grande parte, idiossincráticos e variantes no tempo (KUPFER, 1992). Como afirmam Ferraz et al. (1997), a competitividade não é uma característica intrínseca a um produto, firma ou país, apesar de se sustentar em componentes destes. A riqueza desse conceito reside na sua percepção como um fenômeno que extrapola e permeia a âmbito da firma, da indústria e do mercado, estando condicionada pelo padrão de concorrência específico vigente no “espaço econômico”5. Portanto, a competitividade é determinada e dependente do padrão de concorrência, que por sua vez, sofre reflexos de certas características locais e regionais. Evidentemente, pode-se supor que o ambiente setorial não ocorre de forma idêntica em todas as regiões. Principalmente em países como o Brasil, de grande diversidade regional, fatores específicos a cada região, e à dinâmica local, também influenciam e condicionam o comportamento das firmas e formam “padrões” de concorrência específicos, como cultura, tradição, cooperação, políticas públicas, instituições de apoio etc. (ver, por exemplo, MASKELL et al., 1998). Porém, este aspecto não é mencionado pelos autores citados anteriormente, e supõe-se, que esta linha de pesquisa venha a merecer maior atenção de pesquisadores no futuro próximo. Uma linha importante na abordagem da competitividade tem sido a crescente ênfase no conceito de “dependência da trajetória”, o qual se refere à importância de eventos históricos e de fatores idiossincráticos que restringem ou condicionam o conjunto de opções para a tomada de decisão e para o desenvolvimento futuro tanto para firmas, regiões e países. Nesse sentido, tais fenômenos implicam na necessidade de políticas públicas além daquelas tradicionalmente implementadas e abordagens compatíveis com a dinâmica competitiva específica de cada contexto. Enquanto uma maior competitividade de firmas irá refletir uma administração bem sucedida por empreendedores e executivos, paralelamente também contribuirá para uma tendência de longo prazo de fortalecimento e aumento na eficiência da estrutura produtiva 5 Termo cunhado pelo economista francês François Perroux, famoso pelo seu trabalho sobre “pólos de desenvolvimento”, adotado para designar ambientes, não delimitados territorialmente, onde surgem e se estabelecem as relações de mercado do sistema econômico considerado. Ver, por exemplo, Perroux (1977). Na seção 2.5 discorre-se brevemente sobre essa e outras abordagens do desenvolvimento econômico regional/local. CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 30 nacional, em sua infra-estrutura técnica e outras externalidades com as quais as firmas se sustentam. Enfim, pode-se afirmar que a análise da competitividade deve incluir tanto o contexto interno à firma como os diversos níveis do contexto econômico como as estratégias da empresa para enfrentar as variações desse contexto. Nesse sentido é fundamental identificar fatores relevantes para o sucesso competitivo, os quais variam de acordo com um certo padrão da estrutura concorrencial e da dinâmica de mudança organizacional e tecnológica específicos a cada setor e região. A dinâmica do tipo de arranjo produtivo6 (aglomerado, cluster, cadeia, rede etc) e fatores regionais e locais específicos podem afetar o desempenho dos negócios e não devem ser negligenciados na análise (ver, por exemplo, CASAROTTO FILHO & PIRES, 1998; AMATO NETO, 2000). 2.4 Competitividade empresarial x “competitividade regional” A simples analogia entre firmas e nações quanto à competitividade é fortemente criticada por uma série de autores. A divergência principal é que, no caso da análise da competitividade de países, os critérios de avaliação devem ser mais abrangentes, de prazo mais longo e com maior ênfase em fatores ambientais, sociais, de infra-estrutura e de condições de vida da população. Alguns autores têm ressaltado as diferenças de objetivos e propósitos entre empresas e organizações comerciais e países e regiões (CLARK et al., 1995; MALECKI, 1997; MASKEL et al., 1998). No caso de uma nação, é de fundamental importância a inclusão de indicadores do nível de renda, do uso de fontes renováveis de energia e do padrão de vida da população, entre outros. Entretanto, a forma de mensuração e a escala de padrões para estes indicadores, permanecem como uma janela de pesquisa. 6 Neste trabalho adota-se uma distinção entre o conceito de “aglomerado” e o conceito tradicional de cluster, devido a fato deste último considerar a existência de uma certa dinâmica cooperativa e de fluxo de informação que sustentam e impulsionam sua competitividade através de externalidades e acentuadas “economias de aglomeração” (Schmitz, 1992), o que não é observado no primeiro. Diferentemente de um cluster, o termo “aglomerado” aqui deve ser entendido apenas como uma concentração espacial de atividades de manufatura, que baseadas em processos produtivos semelhantes, operam com uma certa fragmentação entre si. No entanto, admite-se que seria a base para um futuro cluster. Para uma visão detalhada da dinâmica de clusters em países em desenvolvimento, ver o importante trabalho de Bell & Albu (1999). CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 31 O Quadro 2.5 mostra uma evolução cronológica e conceitual do termo “competitividade”. Quadro 2.5 – Variações do conceito de competitividade Definição A habilidade de criar as precondições para maiores salários. Fonte Uri (1971, apud Aiginger, 1998). A capacidade de um setor de “satisfazer as demandas dos consumidores domésticos, Singh (1977:128, mas também de vender produtos externamente para pagar pelos insumos importados apud Aiginger, requeridos pela nação, mantendo níveis aceitáveis de produção, emprego e taxa de 1998). intercâmbio”. “A habilidade para vender”. Orlowski (1982:70) “A habilidade de uma nação em produzir e distribuir bens e serviços na economia internacional..., de modo que também aumente o padrão de vida da população”. “Uma empresa é competitiva quando pode produzir bens e serviços de qualidade superior, ou a custos mais baixos, que seus concorrentes domésticos e internacionais”. “O grau com o qual uma nação pode, sob condições de mercado livre e legal, produzir bens e serviços, passar pelo teste do mercado internacional, enquanto simultaneamente, no longo prazo, mantém e expande o nível de renda real de sua população”. “A habilidade de um país executar metas da política econômica, especialmente o crescimento do emprego e da renda, sem enfrentar dificuldades em sua balança de pagamentos”. “O único conceito significativo de competitividade para uma nação é sua produtividade”. “Produzir bens e serviços capazes de concorrer internacionalmente, enquanto simultaneamente mantém e expande a renda real da população doméstica”. “... é uma palavra sem sentido quando aplicada a economias nacionais”. “A capacidade da empresa em formular e implementar estratégias concorrenciais capazes de ampliar ou manter uma posição sustentável no mercado”. A habilidade de empresas, indústrias, regiões, nações e blocos econômicos, em uma economia aberta, de proporcionar altos e sustentáveis níveis de emprego e de renda a população. Scott & (1985: 15). CIC (1985). Lodge CIC (1985). Fagerberg 355). (1988: Porter (1989: 6). OCDE/TEP (1992: 237). Krugman (1994). Ferraz et al. (1997: 3). Maskel et al. (1998). Na literatura relativa à competitividade de países e regiões, de forma geral, duas correntes distintas podem ser observadas: Uma, (i) formada por autores que negam veementemente a importância do conceito de competitividade para países (com destaque para PORTER e KRUGMAN); outra, (ii) composta por aqueles que apontam a necessidade de se incorporar novos requisitos e fatores para sua utilização para regiões e países (como, por exemplo, CHESNAIS, MASKELL, MEYER-STAMER, REINERT). Suntum (1986), um dos adeptos da primeira corrente, contesta a aplicação do termo “competitividade” para nações, especificamente, devido ao fato de vivermos em um CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 32 mundo de regimes cambiais flexíveis, e, por isso, déficits na balança comercial de um país nem sempre resultam em queda geral no nível de renda da população. Aiginger (1998), defende que simplesmente seja assumido que algumas firmas e nações são competitivas e outras não. Este é um ponto de conflito conceitual, pois sendo assim, uma firma ou nação de desempenho mediano seria, por definição, não competitiva. Essa visão do conceito de competitividade refletiria a natureza de um “jogo de soma zero” do comércio internacional. Porter (1989), compartilha da opinião de que o termo competitividade de uma nação não faz sentido, enfatizando que é improvável que um país seja “competitivo em todas as indústrias”, e defende que são os clusters industriais, fortes nacionalmente, que competem externamente com arranjos similares de outras nações. Segundo Porter (op.cit.), a busca por uma explicação convincente para a prosperidade de uma nação e de uma firma deve necessariamente começar por fazer a pergunta correta, e propõe que se deve abandonar a noção de que a expressão “nação competitiva” seja equivalente à prosperidade econômica. O propósito de uma nação é proporcionar um padrão de vida alto e crescente para seus cidadãos. Isto implica que a habilidade para tornar isto realidade não depende da noção amorfa de competitividade, mas da produtividade com a qual os recursos de uma nação são empregados (PORTER, 1989). “O único conceito significante de competitividade em nível nacional é a produtividade” (op.cit.:6). Krugman (1994), também contesta (de forma mais radical) a utilização do termo competitividade de nações com o mesmo sentido da esfera empresarial. Segundo tal autor, atribuir a falta de competitividade internacional aos “males econômicos” é uma conveniente cortina-de-fumaça atrás da qual, freqüentemente, os políticos se escondem para evitar enfrentar os problemas reais, com receio da queda de seus índices de popularidade: “A idéia de que a riqueza dos países é, em grande parte, determinada pelo seu sucesso no mercado mundial é uma hipótese, não uma verdade inquestionável” (op.cit.: 7) No caso de países, um outro problema de implementação do conceito de competitividade é que certos indicadores são considerados em algumas metodologias como positivos e, em outras, como negativos (por exemplo, as exportações). Aiginger (1998) cita um caso exemplar: (i) quando um país é forçado a aumentar seu comércio exterior para CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 33 pagar juros de sua dívida externa, os investidores internacionais podem refutar em emprestar mais dinheiro devido aos riscos de crédito. Neste caso, o maior fluxo seria um sinal de fraqueza. Por outro lado, (ii) quando um país apresenta déficit público reduzido, transmite maior credibilidade, e, conseqüentemente, sofre menor resistência em obter empréstimos e financiamentos externos. Dessa forma, haveria uma propensão em adquirir maior volume de bens importados e, uma tendência a apresentar maior déficit na balança comercial (KRUGMAN, 1994; AIGINGER, 1998). Contudo, considerar o país da primeira situação como altamente competitivo não seria coerente, nem rotular o segundo como um caso de “perda de competitividade”. A noção de que uma nação é “como uma grande corporação competindo no mercado mundial” tem sido adotada com uma certa displicência atualmente. Essa visão defende que os problemas econômicos que os países enfrentam surgem, essencialmente, em um contexto de “corrida por mercados externos”. O que é uma proposição tendenciosa e questionável. A princípio, poderia parecer razoável admitir uma analogia entre uma nação (como o Brasil ou os EUA), e uma grande empresa (como a Embraer ou a GM), no mercado global. Entretanto, caracterizar e medir a “competitividade” de uma nação é muito mais complexo do que definir e identificar as vantagens competitivas de uma empresa. “[...] os países não competem como empresas, eles não vão à bancarrota e o comércio internacional não é um jogo de soma zero”. “[...] pois o mundo não é tão interdependente quanto se faz supor” (KRUGMAN, 1994:17). Uma economia com grande mercado interno (como EUA, China, Índia e o Brasil), vende grande parte de sua produção internamente. Uma grande corporação (como por exemplo, a GE, nos EUA, ou a Petrobrás no Brasil, ou similares), dificilmente terá um volume significante de mercado entre os seus próprios funcionários, mesmo que seja uma megacorporação. Nesse aspecto, a função e o propósito de uma organização comercial são bem definidos: se uma empresa não pode pagar seus funcionários, fornecedores e seus acionistas, ela inevitavelmente irá à falência e será forçada a “sair do negócio”. Então, poder-se-ia supor que uma empresa não é competitiva quando sua posição no mercado é insustentável. Se ela não melhorar seu desempenho, deixará de existir. CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 34 Por outro lado, países podem ir bem ou mal em seu desempenho econômico, mas não têm uma “linha final”. Países não têm a alternativa de “sair do negócio”. Conseqüentemente, o conceito de competitividade é vago e por isso não há simetria entre a competitividade de corporações e a de países ou regiões. Neste sentido, o termo não admitiria equivalência. “O comércio entre o Japão e o EUA não é equivalente à competição entre a Pepsi e a Coca-Cola, pois apesar de eventualmente uma ou outra companhia perder mercado, nas disputas internacionais, ambas podem sair vencedoras através das dinâmicas das vantagens comparativas” (KRUGMAN, 1994:7). Dessa forma, assim como para a competitividade empresarial, há uma necessidade de se definir também a competitividade de uma nação não apenas através de uma medida de performance, mas também em função de alguma outra variável ou fator internamente referenciado. Seguindo esta linha, uma definição interessante para competitividade, é a da Comissão Presidencial Norte Americana sobre Competitividade Industrial (CIC): “A competitividade de um país, é sua habilidade em produzir bens e serviços, sob condições de livre mercado, capazes de enfrentar concorrência internacional, enquanto, simultaneamente, proporciona a seus cidadãos um padrão de vida crescente e sustentável” (KRUGMAN, 1994: 7; COUTINHO & FERRAZ, 1995:17). Porém, para Krugman (1994), tal definição não encontra suporte no atual cenário de competição internacional. Se considerarmos uma nação com pouco comércio internacional, seu principal problema seria balancear sua taxa de intercâmbio comercial, mas devido ao pequeno comércio ser um fator menos representativo na sua economia, o nível da taxa de intercâmbio terá pouca influência no padrão de vida da população. Outra ressalva feita por esse autor à definição anterior de competitividade, é que ela não contempla, por exemplo, o caso de um país fortemente baseado no mercado doméstico, com pouco comércio externo. Neste caso, o crescimento do padrão de vida de sua população e, portanto, sua competitividade, seria determinada quase que inteiramente por fatores internos, principalmente pelo crescimento da sua taxa de produtividade, e não pelo crescimento da produtividade relativa a outros países ou regiões. Por conseqüência, Krugman (op.cit.), afirma que para economias com pouco fluxo de comércio exterior, a competitividade se resumiria simplesmente à produtividade, e sendo assim, teria pouca relação com o ambiente internacional. A partir de evidências empíricas citadas pelo autor, não há correlação entre a performance comercial de um país e CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 35 a elevação dos padrões de vida da população. “Em cada caso, a taxa de crescimento do padrão de vida equivale essencialmente à taxa de crescimento da produtividade doméstica, e não à produtividade em relação aos seus competidores”. Ou seja, a elevação dos padrões de vida da população seria dependente somente da variação da produtividade. Neste sentido, “competitividade” só representa algo mais que produtividade quando e se, e somente se, o poder de compra dos consumidores cresce de forma consideravelmente mais lenta do que a produção. Em outras palavras, quando a taxa de crescimento do padrão de vida da população, em relação à produção, é decrescente. Caso contrário segundo Krugman (1994), quando aplicada a economias nacionais, a “competitividade é uma palavra sem sentido, e a obsessão por ela, por contribuir para conflitos comerciais desnecessários, é ao mesmo tempo errada e perigosa” (op.cit.:17). De uma forma geral, alguns aspectos característicos de divergência na definição do termo competitividade podem ser destacados. O Quadro 2.6 resume tais aspectos. Quadro 2.6 – Pontos de conflitos na abordagem da competitividade Fator de Conflito Conceito Restrito x Conceito Amplo Características Conceitos restritos focam em balanços externos; enquanto que conceitos amplos enfatizam uma função de bem-estar social, incluindo fatores macroeconômicos (como renda, inflação, desemprego, câmbio), ou ainda fatores infra-estruturais e ambientais. Padrões absolutos x Padrões relativos Absolutos comparam o “nível de competitividade” com algum ativo natural, alguma tecnologia similar ou líder. Relativos privilegiam comparações com o próprio passado, a uma média nacional, histórica ou potencial. Competitividade pelo preço x Competitividade tecnológica Quando o parâmetro é o preço, sobressaem os custos de trabalho, custos sociais e ambientais baixos. A competitividade tecnológica baseia-se na alta produtividade, investimentos em P&D e no aperfeiçoamento de alto nível dos trabalhadores, sendo a ênfase geralmente em indústrias intensivas em tecnologia. Objetivo x Subjetivo Definições objetivas usam valores médios (para outros países) como benchmarking, e implicitamente introduz um conceito normativo. Definições subjetivas reconhecem que pessoas e nações têm diferentes prioridades e níveis de aspiração. O primeiro é medido através de indicadores ex post. Já o segundo é baseado em informações coletadas sobre prováveis cenários. Presente x Futuro Ponto de vista do investidor O investidor prefere baixos custos, mínimas restrições sociais e ambientais e benefícios próprios. A visão econômica enfatiza a x habilidade de vender a juros e padrões altos. Ponto de vista econômico Fonte: Aiginger (1998) CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 36 Por outro lado, outra corrente também contesta o enfoque da competitividade de uma nação exclusivamente na taxa de crescimento da produtividade, ressaltando a necessidade de inclusão de outros fatores na análise. Segundo Reinert (1995), por exemplo, essa visão não explica como algumas regiões e certos países mesmo mantendo altas taxas de crescimento da produtividade por um longo período em certas atividades e setores, e, portanto, considerados “competitivos” internacionalmente, não conseguiram elevar os níveis de renda e os padrões de vida de seus trabalhadores e da população do seu entorno. Neste sentido, Maskell et al. (1998), citam o caso emblemático das empresas americanas de bolas de beisebol instaladas no Haiti, consideradas as mais produtivas do mundo na atividade. Apesar da eficiência absoluta e do grande mercado compartilhado nesta atividade, na qual representam o estado-da-arte, o padrão de vida desses trabalhadores não cresceu” (REINERT 1995:26 apud MASKELL et al., 1998). Um aspecto setorial característico em países periféricos é seu alto grau de heterogeneidade quanto ao tamanho, tecnologia, produtividade e competitividade das firmas. Em muitos setores há firmas modernas tecnologicamente e que poderiam ser consideradas competitivas internacionalmente, mas que apresentam um alto índice de mortalidade, enquanto que outras, ainda baseiam seu processo produtivo em tecnologias obsoletas e técnicas organizacionais ultrapassadas e, mesmo assim, conseguem sobreviver no mercado (No Brasil, isto ocorre, por exemplo, nos segmentos de brinquedos, eletroeletrônicos e peças automotivas). Uma das explicações para esse fenômeno, segundo Meyer-Stamer (1997), é que, nestes países, devido à grande desigualdade de renda entre as classes sociais, aliado à poucas barreiras de entrada e à falta de mecanismos eficientes de proteção à propriedade industrial e intelectual, e ao ineficiente combate ao comércio ilegal, em certos setores, verifica-se uma extensa segmentação do mercado e a proliferação de “mercados de baixa renda”. Com isso, firmas com estratégias de baixo preço conseguem se sustentar no mercado, vendendo produtos (de baixa qualidade) direcionados especificamente aos nichos formados por consumidores de menor poder aquisitivo e pouca escolaridade. Note-se que, pelo menos no curto-médio prazo, há uma tendência de acentuação deste fenômeno, devido ao aumento da renda real dos trabalhadores de baixa renda após a estabilização da inflação no Brasil (op.cit.). CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 37 Embora a produtividade seja certamente importante para o crescimento econômico, altos níveis de produtividade, quando analisados de forma agregada, podem camuflar baixos rendimentos de alguns fatores de produção. Conseqüentemente, nesses casos, é questionável se adotar tal fator como um substituto equivalente ao que o termo competitividade pressupõe, que é um rendimento acima da média, e sustentado, de todos os fatores de produção empregados no sistema. Por outro lado, a questão de “como medir a produtividade” tampouco é fechada e inquestionável. Antigamente, a eficiência era calculada com base na fórmula matemática elaborada por Taylor, através da quantidade de produtos dividida pelo tempo humano dedicado a sua execução. Por esse critério, uma empresa se tornava mais eficiente ao fazer mais produtos no mesmo tempo ou, ao diminuir o tempo para produzir os mesmos produtos. Contudo, hoje a produtividade não pode mais ser medida apenas pelo critério tempo (ver, por exemplo, WINTER, 1994b; FRASMAN, 1998; CASTELLS, 2000; SVEIBY, 2001). Dessa forma, a medida da eficiência não deve supervalorizar o fator tempo, pois, pode-se ter muitas idéias em poucas horas ou nenhuma em uma jornada inteira de trabalho. Ou, por outro lado, ter uma só em uma vida inteira, e ela ser suficiente em termos de ganhos financeiros. Nesse sentido, empresas que vivem de produzir idéias devem se preocupar mais com o processo criativo que com o tempo, entretanto, em muitos casos, o trabalho continua sendo avaliado por critérios ultrapassados e inconsistentes com tal contexto. Evidentemente, nem todo tipo de trabalho e atividade tem a função nobre de gerar idéias. Apesar das relações, objetivos, características e atribuições do trabalho não serem homogêneas nem se distribuírem uniformemente por todos os setores, atividades profissionais e empresas, a medida tradicional da produtividade não incorpora este aspecto, especialmente aquela tomada em relação ao tempo. Por isso a analise deve levar em conta tais aspectos. A exigência criativa em um centro de pesquisas, uma universidade, uma empresa de publicidade ou de softwares é bem diferente daquela, por exemplo, em uma empresa de fabricação de componentes para motores ou de tijolos e manilhas. CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 38 Poder-se-ia dizer, por exemplo, que um trabalhador da indústria de peças automotivas, que produz cerca de 100 unidades/dia seja mais “produtivo” que um programador de software que leve um mês para produzir um software, ou que um escritor que escreve um livro a cada dois anos? Por outro lado, uma empresa financeira, que empregue apenas 10 trabalhadores para um lucro de 10 milhões de reais/ano, pode ser considerada mais “produtiva” que uma outra, com 100 empregados e lucratividade de 2 milhões/ano? Apesar da tão propalada “sociedade pós-industrial”, devido à heterogeneidade de padrões de infra-estrutura e desenvolvimento socioeconômico, em muitos lugares o trabalho continua sendo organizado de forma industrial e mecânica e dependente da produtividade do trabalho (CASTELLS, 2000). Por outro lado, também há uma grande variedade de tipos de atividade e características de trabalho específicas de cada profissão. Malecki (1997), oferece uma boa ilustração a esse respeito (ver Gráfico 2.1). Publicitários Arquitetos Médicos Pesquisadores Analistas de P&D Profissionais Técnicos Programadores Professores Administradores Tipos de trabalhadores Trabalhadores Manuais/Braçais Trabalhadores de produção rotineira (linha de montagem, de autos, eletrônicos, roupas etc.). Não-Rotineiras Intermitentes Por projeto Rotineiras Repetitivas Especificáveis Características do trabalho Gráfico 2.1 – Divisão do trabalho por tipos e características (adaptada de Malecki, 1997: 116) CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 39 De uma certa forma, quanto ao tipo de esforço característico, pode-se considerar dois extremos da divisão do trabalho: De um lado há atividades intensivas em trabalho cerebral/intelectual e de outro, aquelas intensivas em trabalho muscular/braçal. Porém, estas não são remuneradas eqüitativamente. Neste sentido, taxas de produtividade de diferentes setores e atividades são incomparáveis. Portanto, processos produtivos com diferentes intensidades de tecnologia e de trabalho criativo também são incomparáveis, especialmente, quando se toma apenas o tempo ou a lucratividade como parâmetros de referência. 2.5 Competitividade e desenvolvimento econômico regional 2.5.1 A visão tradicional e as novas abordagens Políticas de desenvolvimento, no sentido tradicional, pressupõem a possibilidade de intervenção do Governo no processo e, que esta, possa levar a uma trajetória de desenvolvimento autodefinida. Isto não tem sido verificado na prática. Muito pelo contrário, casos como os de economias do leste europeu, fechadas e fortemente planejadas pelo Estado, após uma aparente prosperidade social, em curtos períodos de tempo, não se sustentaram e entraram em colapso total. Por outro lado, políticas de abertura de mercado e incentivo à competição, apesar de contribuírem para o crescimento de certos setores, também não se mostraram capazes de alavancar, por si só, o desenvolvimento econômico, acentuando quadros de grandes desigualdades sociais, especialmente, em países da América Latina (BUITELAAR & Van DIJCK, 1996). Historicamente, políticas coordenadas de promoção do desenvolvimento de determinadas regiões proliferaram nos anos 30 nos EUA (na região do Vale do Tenessee, como parte do New Deal) e no Reino Unido (associadas ao planejamento de cidades). A idéia básica era que os mercados por si só não produzem um equilíbrio neoclássico com convergência inter-regional, assim, ações do governo eram necessárias para contornar as assimetrias geradas. Uma opção era subsidiar empresas localizadas nas áreas periféricas; outra era aumentar a atratividade básica de tais regiões através de pesados investimentos em infra-estrutura, serviços públicos e incentivos à instalação de grandes indústrias, como siderúrgicas, automotivas e refinarias de petróleo. Para sustentar tais intervenções, muitas abordagens surgiram e se tornaram bastante influentes. A Teoria dos Pólos de Crescimento, baseada nas idéias do economista francês CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 40 François Perroux (PERROUX, 1950; LAMBOOY, 1988) foi uma das mais influentes. Esta teoria enfatizava a idéia de que o desenvolvimento econômico ocorre via expansão de redes de firmas e se propaga para as proximidades por efeitos multiplicadores. As “firmas pólo” eram o ponto focal dessas redes e as forças impulsionadoras do crescimento econômico. As relações econômicas não eram muito dependentes da localização, mas decisivas na natureza das relações de mercado no denominado “espaço econômico”. Nesse ambiente, os governos poderiam incentivar a instalação de indústrias de base em áreas periféricas, que então criariam redes com firmas fornecedoras terceirizadas e subcontratadas. Neste caso, assume-se que efeitos multiplicadores deste investimento viriam através de um processo de acumulação de atividades em determinado local, que com o tempo se refletiria em desenvolvimento. Outra abordagem similar a anterior é a denominada Teoria de Myrdal (1957), que em contraste com a Teoria Neoclássica, que pregava a convergência inter-regional via mecanismos de mercado, se baseava no conceito de efeitos cumulativos, pelo qual um processo de círculo virtuoso de investimentos cria disparidades regionais. Regiões metropolitanas, ou qualquer outra com vantagens iniciais, tenderiam a se desenvolver cada vez mais; e outras, em áreas periféricas, tenderiam a possuir níveis salariais cada vez mais baixos, declinando ao invés de crescer. Esta proposta é contrária ao conceito neoclássico de “produtos finais”, onde equilíbrio e convergência dos níveis salariais e de lucro tenderiam a estabilizar o sistema (HIGGINS & SAVOIE, 1994). Por outro lado, Wallick (1969, apud SOUZA, 1999), destacou a necessidade de algumas adaptações da teoria schumpeteriana para países pobres, onde a participação do governo seria necessária para propiciar melhoria em infra-estrutura social e preencher lacunas existentes pela falta de investimentos devido à escassez de empresários inovadores, além de promover a difusão de informações e técnicas dominadas por outros países mais avançados. Com esta abordagem, a visão schumpeteriana deixaria de focar apenas na função de produção, para concentrar-se também no lado da demanda. Em relação a economias periféricas, especialmente aquelas com forte atuação pública na importação de tecnologias e capitais, uma questão que surge é em relação à concorrência que sua ação exerce sobre o setor privado. Laumas (1962, apud SOUZA, 1999), destacou os impactos da ação do Estado sobre a economia, principalmente com relação ao financiamento e à natureza ao papel das inovações. Segundo este autor, ao implantar infra-estruturas, o setor público passa a concorrer com o setor privado no CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 41 mercado de fatores de produção, provocando escassez de produtos (como, por exemplo, aço, cimento e metais não ferrosos), elevação de salários, da taxa de juros e de preços de insumos básicos. Conseqüentemente, haveria uma redução das margens de lucros, quedas nos financiamentos e as inovações tenderiam a ocorrer somente em pequena escala. Sendo assim, as mudanças não seriam significativas a ponto de alterar o equilíbrio no fluxo circular da economia, como defendido por Schumpeter (1943). Segundo Laumas, (1962:659), por exemplo, “se as mudanças não forem significativas a ponto de alterar o equilíbrio no fluxo circular, os lucros criados também serão pequenos e, conseqüentemente, a propensão a imitar a ação do empresário inovador também será mínima”. Resultados de estudos mais recentes reforçam a tese de que a ação do empresário é altamente condicionada, entre outros fatores, pelo padrão de concorrência, estratégias competitivas, competências específicas e pela cultura local (ver, por exemplo, VIETOR, 1994; TEECE & PISANO, 1994; SAXENIAN, 1994). Posteriormente, os autores neo-schumpeterianos passaram a investigar as interrelações entre estrutura e atores como mecanismo de retroalimentação (feedbacks), e não apenas como uma estrutura dada ou como o ambiente seletivo influencia os atores (isto é, a composição da sociedade dentro da estrutura de tempo e espaço), mas também como estes (especialmente os inovadores) mudam tal estrutura (DOSI, 1988). Dessa forma, a escolha por uma ou outra teoria vai influenciar a linha política a ser seguida e os programas a serem implementados. Como dizia o famoso economista John Mainard Keynes (1883-1946), “no longo prazo todos nós estaremos mortos”. Esta frase gerou uma série de interpretações equivocadas e negativas com respeito a investimento em infra-estrutura e no lado da oferta da economia. A perspectiva de intervenção via oferta, influenciou e gerou muitas políticas de desenvolvimento regional, sustentadas por esta visão distorcida das idéias de Keynes. Porém, segundo Lambooy & Boschma (2001), sua teoria era focada, primeiramente, na intervenção no ciclo de negócios através do lado da demanda. De forma resumida, o keynesianismo enfatizava a importância da demanda agregada na determinação dos níveis de produto e emprego da economia, e a conseqüente necessidade de políticas governamentais de estímulo à demanda em períodos de recessão. Keynes se concentrou particularmente na abordagem macroeconômica do pleno emprego, nos fatores de crescimento de investimento e nos impactos sobre a renda e o emprego. Sua CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 42 análise era predominantemente estática e de curto prazo (CLEMENTE & HIGACHI, 2000). Nos últimos anos houve um certo predomínio de políticas com foco na racionalização e no lado da oferta da economia, principalmente pela desregulamentação e fortalecimento de mecanismos de mercado. Para políticas regionais, isto tem resultado em abandono da ênfase em subsídios para regiões em desenvolvimento, privilegiando o fortalecimento da infra-estrutura. Atualmente, grande ênfase tem sido dada a políticas industriais voltadas para uma estratégia de “seleção dos vencedores” e a indução e/ou fortalecimento de clusters, distritos industriais, e outras formas de aglomeração e interação produtiva, freqüentemente associadas a setores baseados em conhecimento (com retornos crescentes, como por exemplo, microeletrônica e biotecnologia) ou vinculados à cultura produtiva e à aprendizagem coletiva, com fortes características locais e regionais (PORTER, 1989; COOKE & MORGAN, 1998; BRACZYK et al. 1998). 2.5.2 A “competitividade” de regiões e localidades Pesquisadores das áreas de geografia econômica, da economia regional, das ciências sociais e do planejamento regional têm questionado a consistência e utilidade de se tratar a competitividade de regiões apenas como um reflexo da produtividade, destacando a imprescindibilidade de se incorporar fatores ambientais e de bem estar social ao conceito de competitividade para países e regiões. Devido à expansão das empresas multinacionais e a ênfase na globalização da competição e a internacionalização de unidades de produção, o termo “competitividade” tem sido mais referido ao aumento do investimento direto por firmas estrangeiras, do que ao aumento dos intercâmbios comerciais entre países (CLARK & GUY, 1998). Segundo Aiginger (1998), a avaliação da competitividade de países deve ser compatível com o propósito e a função de uma nação. Esta, em última instância, seria “aumentar o bem estar da sua população”. Essa visão é compatível com teoria econômica neoclássica, cuja hipótese principal é que o propósito de uma nação ou o comportamento dos consumidores é buscar a maximização de uma função de bem-estar social, na qual, tenta-se incorporar fatores como renda, condições sociais e preservação do meio ambiente. CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 43 Nessa perspectiva, a definição de competitividade leva a três implicações imediatas: i) os baixos custos não podem ser uma meta de política econômica, e nem um indicador para competitividade de longo prazo; ii) os balanços externos contribuem diretamente ou indiretamente para o bem-estar da população, mas são pequenos quando comparados ao consumo; iii) a competitividade é uma questão dinâmica, com os níveis de aspiração dos consumidores e vendedores (a população) mudando no tempo, enquanto o investimento em capital humano, tecnologia e informação são o meio de alterar o bemestar obtido e o nível de competitividade (AIGINGER, 1998). Por outro lado, a prosperidade econômica de um país ou região está associada à sua habilidade em gerar novas atividades econômicas e atrair novos investimentos. Esta condição, por sua vez, depende do bom desempenho das empresas no mercado, para sobreviver, aumentar investimentos, pagar melhores salários e abrir novos postos de trabalho. Segundo Maskell et al. (1998), dessa forma, a competitividade é um conceito que atende ao pressuposto de que regiões e países, bem como as firmas, devem aspirar um futuro melhor. Evidentemente que, se seguirmos a visão neoclássica de que estamos em um mundo de competição perfeita e equalização do fator preço, não seria possível algo como um “rendimento dos fatores acima da média e sustentado” (MASKELL et al.,1998). Nesse sentido, se seguirmos a hipótese de que a competição imperfeita é a que prevalece, como Penrose (1959, apud FOSTER, 1997), o conceito de competitividade ganha outra conotação. Nesta abordagem, um contínuo desequilíbrio entre oferta e demanda, provocado pelo excesso de rendimentos totais sobre os custos totais, permite às firmas grande lucro no curto prazo, mas que, no longo prazo, seria transformado em custo ou eliminado. Neste caso, melhorias tecnológicas podem, por exemplo, criar novos desequilíbrios e favorecer aquelas firmas que se apropriarem delas ou as absorverem primeiro, ou, como resultado do poder obtido no mercado e não facilmente apropriável pelos concorrentes. Outros fatores que podem contribuir para a formação de desequilíbrios dinâmicos são as barreiras de entrada e saída, custos invisíveis, economias de escala, assimetrias e outras formas de informação imperfeita, retroalimentações, aprendizagem contínua e o progresso tecnológico. CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 44 Segundo Maskell et al. (1998), durante períodos de desequilíbrio surgem oportunidades para se criarem novas atividades econômicas, ou até mesmo, novos ramos industriais. Entretanto, sua distribuição espacial e geográfica não é uniforme nem totalmente indeterminada. Podem ser criadas pelo esforço intencional de firmas e governos através de atividades de P&D ou outras formas de criação de conhecimento e de desenvolvimento científico e tecnológico. As firmas engajadas nestas novas atividades não são apenas premiadas pela eficiência na utilização do capital e do trabalho, elas também dependem de habilidade de se apropriar e explorar as oportunidades geradas pelos desequilíbrios dinâmicos. Algumas regiões e nações são mais prósperas que outras, ceteris paribus, quando proporcionam e distribuem aos seus empregados e sociedade, parte dessa renda criada (OCDE, 1995). Em termos gerais, nota-se a tendência de se abordar a competitividade de forma mais abrangente, levando-se em consideração, além dos aspectos operacionais e comerciais, também aspectos sociais e ambientais regionais que afetarão as condições de vida futura. Nesse contexto, as interações entre micro e macro níveis assumem importância fundamental, pois formam a matriz onde estão ou serão inseridas as diversas atividades econômicas, a qual, pode ser decisiva para um desempenho crescente e sustentável (AIGINGER, 1998). O World Economic Forum (WEF) vem produzindo um “Placar da Competitividade Global7”, publicado pela Universidade de Oxford, avaliando 22 países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) utilizando, até pouco tempo atrás, 378 diferentes indicadores, agregados nas áreas: internacionalização, governo, tecnologia, gestão, infra-estrutura, finanças, trabalho e instituições civis. Em resposta aos críticos, como Krugman, o Fórum mudou sua definição de competitividade, em 1996, para simplesmente “a habilidade de um país em conseguir altas taxas de crescimento sustentado no PIB per capita” (The Economist, junho, 1996). Porém a metodologia compreende ainda 155 indicadores, cobrindo estudos estatísticos complexos e levantamentos baseados em julgamentos arbitrários. Fatores como “abertura do mercado”, carga tributária, nível de poupança e investimento em capital humano são incluídos. 7 Para conferir as versões mais recentes, consulte o endereço <www.weforum.org>. CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 45 Já o International Institute for Management Development (IMD), produz o chamado “Anuário da Competitividade Mundial8”, avaliando mais de 300 indicadores, analisando cinco macro fatores: desempenho econômico, eficiência na administração pública, eficiência comercial e infra-estrutura. Ambas as abordagens seguem rigor teórico e estatístico, as quais permitem a inclusão de fatores diversos, mas o tratamento dos critérios e suas ponderações é arbitrária e apresenta inconsistências. Recentemente, algumas modificações foram feitas nas metodologias. Porém, segundo Lall (2001), em ambas abordagens, há ainda sérias deficiências e equívocos. No contexto regional, segundo Chesnais (1986: 91), “a competitividade é reflexo da capacidade das firmas de investir, incorporar tecnologias externas mais eficientes e adaptar e inovar através de seu esforço próprio, adequando a tecnologia às características específicas locais... É muito mais do que um simples resultado do coletivo ou de uma “competitividade média” de suas firmas. [...] Este é um processo interativo, cujas características próprias locais irão afetar o desempenho, a capacidade e as fontes de riqueza das firmas e vice-versa”. Por outro lado, no processo de mudança tecnológica, lugares onde há uma melhor combinação de atividades econômicas, firmas grandes e pequenas, em conjunto com instituições locais, regionais e nacionais, estão mais aptos a atrair e abrigar novas indústrias e explorar novas oportunidades. Do ponto de vista humano e social, uma população mais bem educada e qualificada estará mais apta a explorar melhor as novas oportunidades e, conseqüentemente, mais propensas a obter melhores perspectivas futuras. “Localidades, regiões e nações são afetadas pelas oportunidades de mercado, mas somente conseguem sucesso em aprender, adotar e adaptar conhecimento e tecnologia através da capacidade de seu povo” (MALECKI, 1997: 322). Como exemplo de mensuração da competitividade local e regional, na Inglaterra, o Conselho de Desenvolvimento Econômico (Economic Development Group), que seria um equivalente britânico ao Ministério de Indústria e Comércio brasileiro (Department of Trade and Industry), adota um conceito de competitividade similar ao de Maskell et al. 8 Este ranking é publicado no site <www01.imd.ch/>. CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 46 (1998): “a habilidade de regiões em gerar altos níveis de renda e emprego, enquanto exposta à competição doméstica e internacional”. Tal órgão utiliza uma avaliação que envolve 14 indicadores quantitativos e qualitativos para a comparação de aspectos sociais e econômicos de 12 regiões, em comparação a média nacional e a de outros países. Como destacado, a intenção do levantamento de tais fatores não é determinar a “competitividade regional”, mas levantar dados que podem refletir a competitividade de uma região. Entre os indicadores utilizados estão: O valor agregado líquido per capita; o valor agregado líquido por hora trabalhada; a renda familiar líquida per capita; a produtividade do trabalho em manufatura e outras indústrias; o nível de investimento em manufatura e produção por empresas estrangeiras; e a exportação de bens. Além destes, são avaliados também: O mercado de trabalho; investimentos em P&D, surgimento de novos negócios e a infra-estrutura de transporte, educação e saúde (DTI, 2001). Com relação a regiões periféricas, pesquisas recentes da Comissão de Estudos para a América Latina e Caribe (CEPAL, 1992) sobre a dinâmica competitiva, destacam a necessidade de um enfoque sistêmico e integrado9 entre transformação produtiva e eqüidade, com o objetivo de se redefinir os rumos do desenvolvimento dos países latinoamericanos, devido ao contexto atual de profundas mudanças tecnológicas, organizacionais, econômicas, financeiras, sociais e ambientais. A necessidade dessa redefinição de rumos deve-se ao fato de que dados empíricos levantados recentemente revelam não haver correlação sistemática entre crescimento econômico e distribuição de renda (COSTA & ARRUDA, 1999). Dessa forma, a relação precisa entre crescimento e eqüidade dependeria da reorientação das políticas públicas. Isto implicaria em definir e priorizar políticas econômicas complementares que permitam além do crescimento, a eqüidade. Em contrapartida, seria importante inserir na política social, requisitos de aumento da produtividade e da eficiência, e não só de eqüidade. Ou seja, a idéia seria de integrar e sincronizar crescimento com desenvolvimento e eqüidade. Nesse sentido, especial atenção deve ser dada às possibilidades de conflito em certas áreas com diferentes ciclos de maturação, em que os objetivos de longo prazo são 9 A integração sistêmica, segundo a CEPAL, prioriza três eixos fundamentais: o progresso técnico, a geração de empregos produtivos e sustentáveis e investimentos em capital humano (Costa & Arruda, 1999: 64). CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 47 complementares, mas no curto prazo são conflitantes, como as de meio ambiente e de investimento em capital humano com as de educação formal e emprego (veja ilustração no Quadro 2.7). Quadro 2.7 – Integração entre políticas de longo e curto prazo para o amento da competitividade (segundo a CEPAL) LONGO PRAZO CARÁTER DAS POLÍTICAS COMPLEMENTAR CURTO PRAZO CONFLITANTE COMPLEMENTAR CONFLITANTE Difusão tecnológica, (especialmente na agricultura e nas pequenas empresas); Promoção das Exportações; Elevação da poupança; Dessegmentação do mercado de Esgotamento e depredação dos recursos naturais capitais; Salários participativos; Reforma fiscal; Capacitação, nutrição e saúde; Descentralização administrativa; Estabilização Meio ambiente; Investimentos de longo prazo; Educação formal. Criação de frentes de trabalho temporário; Transferência de renda. Fonte: CEPAL (1992) Nos países e regiões periféricos, especialmente os de regimes democráticos mais recentes, a discussão do tema “competitividade regional” somente começou a ganhar força no debate do desenvolvimento econômico e social, com o processo de reforma do estado e a predominância das políticas neoliberais de “estado mínimo” e de abertura do mercado. Com a diminuição da intervenção do Governo Central nas esferas estadual e municipal, as prefeituras, entidades de classe, organizações não-governamentais, e a sociedade civil de um modo geral, passam a ter maiores preocupações e atribuições no planejamento e na promoção do desenvolvimento econômico e social de microrregiões (subestaduais) (MEYER-STAMER, 2000). Por outro lado, os critérios de localização de empreendimentos e investimentos privados passam a estar menos vinculados aos interesses governamentais e às políticas públicas, e mais sujeitos às forças de mercado. A localização de grandes plantas industriais CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 48 torna-se alvo de disputa entre estados e municípios, através de incentivos e isenções fiscais por longos períodos, dando início à chamada “guerra fiscal10”. Este assunto tomou conta do debate político recente na questão do desenvolvimento local e regional. Dessa forma, indústrias modulares passaram a optar pela proposta de maior benefício fiscal no longo prazo, desde que satisfeitas os requisitos básicos de infra-estrutura e de logística comercial. Neste contexto, três principais conjuntos de pontos de vista se confrontam: de um lado, (i) o do investidor ou empresário responsável pelo investimento, juntamente com os potenciais beneficiários (empregados, comerciantes, prestadores de serviço etc.); de outro, (ii) o da sociedade/comunidade local/regional, não beneficiária direta do empreendimento; e um terceiro conjunto de pontos de vista, composto pelo (iii) setor público local/regional (considerando os a favor e os contra, por diversas razões). Este, teoricamente, atuando como moderador e regulador dos interesses dos outros dois pontos de vista. Porém, considerando um cenário de igualdade de condições tributária e de infraestrutura básica entre regiões, fatores mais subjetivos, como a qualidade de vida e os aspectos gerais que definem as condições de vida local, passam a compor e, em muitos casos, a prevalecer na estrutura de decisão para localização industrial. Neste sentido, há entrelaçamentos e vínculos entre as condições de competitividade empresarial e de competitividade local e regional. Se por um lado, a empresa depende das condições de infra-estrutura educacional e tecnológica local, e de funcionários bem capacitados para sustentar sua posição competitiva, por outro, a comunidade local depende dos postos de trabalho gerados e da renda proporcionada ao conjunto da população empregada, para dinamizar a economia local. Segundo Meyer-Stamer (2000), em termos de políticas de desenvolvimento e competitividade local, atualmente duas correntes se destacam: (i) uma que se concentra no estudo dos distritos industriais, principalmente os de pequenas e médias empresas, como os da chamada “terceira Itália”. Nesta linha, se destacam os pesquisadores do Intitute for Development Studies, da Universidade de Sussex, em Brighton - Inglaterra (ver 10 Esta é uma questão de tratamento polêmico. Legalmente, hoje ela está proibida no Brasil, através de Lei específica (Lei complementar 24). Na prática, sua fiscalização é problemática e não há garantias de que não seja utilizada de forma implícita, embutida em mecanismos legais. Alguns estados e municípios mais pobres a defendem por acreditaram ser a única forma de gerar empregos e dinamizar a economia local, revertendo as vantagens daqueles de maior infra-estrutura e recursos. Porém, dependendo do tipo de indústria, seus investimentos e externalidades podem não justificar a perda de arrecadação e os impactos ambiental e social que irão causar. CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 49 SCHMITZ, 1989, 1995 e SCHMITZ & NADVI, 1994). Uma outra corrente é representada pelo estudo de clusters de exportação e grandes aglomerados de empresas, com destaque para os trabalhos de Porter sobre estratégias e vantagens competitivas. Este último tem sido particularmente bem sucedido com consultorias para o Governo Americano e para o Banco Mundial sobre clusters ao redor do mundo, tendo influenciado estudos em diversos países, inclusive no Brasil (ver, por exemplo, COUTINHO & FERRAZ, 1995). Contudo, ambas as correntes apresentam como grande defasagem o fato de reduzirem o desenvolvimento econômico local e regional a simples análise de clusters e distritos industriais. Segundo Meyer-Stamer (2000), isto é um equívoco, pois os clusters e distritos, em qualquer parte, são fenômenos ubiqüitários11, mas não são os únicos modelos estruturais de desenvolvimento local. Neste sentido, muitas estratégias e políticas benéficas do ponto de vista industrial, podem ser prejudiciais para muitas localidades e regiões. 2.7 Para um conceito integrado de competitividade De um modo geral, verifica-se uma tendência em se dividir a análise dos determinantes da competitividade em três níveis. Contudo, para análises que envolvam arranjos produtivos e setores de regiões periféricas, mais voltadas para o comércio doméstico ou regional, a divisão em três níveis pode negligenciar a influência do ambiente regional/local e de fatores geográficos e espaciais na competitividade de empresas, aglomerados e arranjos produtivos, importantes para o desenvolvimento local. Além disso, quando se analisa a competitividade através da divisão em níveis diferentes, certos fatores ligados às inter-relações formais e informais, fluxos de conhecimento tácito e elementos da dinâmica local, não são captados. De modo a suprir essa deficiência, pode-se sugerir o desmembramento dos três níveis tradicionais, para incluir mais dois conjuntos de fatores a serem analisados, que são os fatores regionais ou geográficos (específicos à região ou localização); e os fatores segmentais (específicos a certos segmentos de cadeia/setores/indústrias), previstos, em parte, por Marcovitch (op.cit.), e não captados através dos fatores estruturais de Ferraz et 11 Segundo o Dicionário Aurélio Século XXI, o termo ubiqüitário denomina algum fenômeno que se localiza de forma dispersa. Literalmente, “o que pode ter diversas localizações”. Especificamente, neste caso, o autor quer enfatizar que clusters e distritos industriais, de forma geral, podem surgir e ser promovidos, em várias regiões. CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 50 al. (op.cit.). Esta abordagem se justifica pelo crescente destaque dos condicionantes locais da competitividade, como enfatizado por vários autores (ver, por exemplo, PORTER, 1989, 1990, 1998; STORPER, 1997; MALECKI, 1997), e dos fatores informais, só captados qualitativamente (ver, por exemplo, HEALEY & DUNHAM, 1994; SAXENIAN, 2000); Assim, na análise dos determinantes da competitividade, com enfoque no desenvolvimento local, pode-se sugerir que os seguintes fatores sejam considerados: 1. Fatores Organizacionais: são os que estão sob o domínio e o poder de decisão da organização. Podem ser controlados ou alterados através de intervenções diretas. Correspondem basicamente ao estoque e às estratégias de aperfeiçoamento de recursos acumulados pelas empresas, e podem ser divididos em quatro áreas (ver Quadro 2.4): i) Competência e eficácia na gestão e integração entre capacitação, estratégia e desempenho; ii) Capacitação tecnológica e atualização em processos e produtos; iii) Capacitação produtiva no planejamento, organização e controle da produção e da qualidade, e; iv) Produtividade dos recursos humanos. A Figura 2.5 mostra uma representação das interações entre capacitação, estratégia e desempenho no nível da empresa (o ambiente interno). DESEMPENHO AMBIENTE AMBIENTE Inovação Gestão RH Produção ESTRATÉGIAS ESTRATÉGIAS CAPACITAÇÃO Figura 2.5 – Determinantes da competitividade organizacional 2. Fatores Estruturais: apresentam-se vinculados às características da estrutura (aglomerado, cluster, cadeia, rede, complexo industrial) produtiva que se constitui através das relações comerciais específicas da estrutura produtiva em questão. Inclui o CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 51 padrão de concorrência, as economias de aglomeração, coletivização ou segmentação produtiva12, aspectos logísticos e de configuração dos fluxos de insumos (supply chain management, material resource planning) (ver Figura 2.6). Mercado Tamanho Sofisticação Dinamismo Barreiras Indústria Desempenho Capacitação Estrutura Articulações (cadeias) Regulação (governo) Aparato legal Políticas fiscal, financeira, comercial Atuação do Estado Figura 2.6 – Determinates da competitividade estrutural/setorial (baseada em Kupfer, 1992; Ferraz et al., 1997) Os fatores envolvidos neste nível representam os benefícios advindos de determinada configuração produtiva. São específicos e endógenos à estrutura econômica industria/setor, não incorporando fatores locacionais). 3. Fatores Sistêmicos: são aqueles que constituem externalidades stricto sensu para o sistema produtivo como um todo, sobre os quais, a princípio, a empresa não tem poder de influência (exceto em casos muito raros e privilegiados). Constituem os parâmetros do processo de decisório (as regras gerais do jogo!). Podem ser: internacionais (regras e acordos da Organização Mundial do Comércio (OMC) e de blocos econômicos, fluxos externos de capitais, regimes e trajetórias tecnológicas), macroeconômicos (taxa de câmbio e juros, carga tributária, leis trabalhistas etc.), macrosociais (benefícios sociais, o sistema de educação, o sistema de saúde etc.); ou institucionais13 (política de incentivos, programas de apoio tecnológico, alíquotas de impostos e tarifas etc.). 12 Representam as vantagens de certas estruturas, como por exemplo, um maior poder de influência sobre os fornecedores, sistemas de informação mais eficazes e um melhor fluxo na transferência e difusão tecnológicas. 13 Considera-se que, dependendo da abrangência e dos critérios adotados, estes também podem se converter em estruturais ou regionais (como por exemplo, incentivos a um setor específico, ou redução de impostos para algumas regiões ou estados). CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 52 4. Fatores Regionais ou Geográficos: são aqueles fatores que afetam exogenamente certas unidades, segmentos ou arranjos produtivos localizados em determinadas regiões (aglomerados, clusters, distritos, complexos). Sua abrangência é menor em relação aos demais fatores, contudo, este fator pode ser decisivo para atrair ou afugentar novos empreendimentos e atividades econômicas (indústrias correlatas e auxiliares, alianças, associações etc.). Tais fatores representam a diversidade regional e geográfica. Sua influência varia de acordo com a indústria/setor/tecnologia em questão e compreendem aspectos econômicos, sociais, ambientais, culturais e de infra-estrutura que diferenciam certas regiões e localidades de outras, como: os níveis de qualidade de vida, a infraestrutura local (disponibilidade de energia, modais de transporte e comunicação etc.), a cultura local e disponibilidade de recursos naturais. Estes fatores são herdados e característicos da região ou localidade (ver PORTER, 1990; MASKELL et al., 1999). 5. Fatores Segmentais (sub-setoriais): são aqueles sobre os quais a capacidade de intervenção da empresa é limitada pela mediação do processo de concorrência, ou seja, aqueles fatores nos quais o poder de influência da empresa individual é apenas parcial. Ao contrário dos fatores organizacionais, mostram diversidades setoriais associadas ao padrão concorrencial específico do segmento/setor/indústria. Entretanto, moldam o ambiente competitivo através de fatores de demanda e de oferta e englobam fatores extramercado, públicos e privados e mecanismos regulatórios do mercado. A consideração deste nível específico visa permitir a inclusão de alguns arranjos locais ignorados nos estudos de cadeias produtivas14, por deficiência de fluxos comerciais com outras indústrias. Estes fatores são endógenos ao ambiente local. A incorporação desse nível na análise é condicional. Do ponto de vista do empresário, os fatores organizacionais estão em primeiro plano, pois são constituídos e poderiam ser controlados pelas próprias empresas. Os fatores estruturais (Figura 2.6) e os fatores regionais/geográficos estão em um segundo plano, 14 Por tal método, através do levantamento e delineamento do fluxo de produção (desde a matéria-prima até o produto final, baseado no modelo input/output) entre indústrias, alguns segmentos (arranjos) de setores locais e regionais são amputados no recorte arbitrário da cadeia, cujo parâmetro referencial são os fluxos comerciais. Tal nível permite a inclusão de arranjos de empresas locais, com fluxos externos pouco substanciais (aqueles em que a cadeia de processos é praticamente toda interna, como os baseados na extração de recursos naturais, que atuam desde a extração de matéria-prima até a produção dos itens finais), mas que podem representar segmentos estratégicos para a análise do desenvolvimento e da estrutura produtiva de certas localidades e microrregiões periféricas. CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 53 pois, a princípio, fugiriam do poder de influência direta do empresário. Porém, empresas em conjunto, através de coalizões, alianças e fusões, ou via entidades de representação de classe e políticas, podem alterar os padrões de concorrência, influenciando e induzindo políticas e incentivos setoriais e regionais. Os fatores estruturais e sistêmicos representam o contexto e os cenários a serem assumidos pela empresa, e dependendo da interação entre eles, podem representar ameaças ou oportunidades de acordo com recursos, capacitação, estratégia e desempenho da empresa. Adicionalmente aos demais, os fatores segmentais representam aspectos a serem considerados quando estiverem envolvidos na análise segmentos de cadeia produtiva, aglomerados de indústrias e ou arranjos produtivos locais, que, apesar de pouco representativos em termos de fluxo comercial, ou de exportação de produtos, sua análise específica seja importante ou estratégica do ponto de vista da economia local e regional. Tal importância poderia ser medida, por exemplo, pelo número de postos de trabalho oferecidos e mão-de-obra empregada, ou pela receita gerada em impostos. A Figura 2.7, a seguir, resume o ambiente e os fatores determinantes da competitividade com enfoque na análise dinâmica. Fatores Sistêmicos Fatores Estruturais MERCADO Fatores Organizacionais ESTRUTURA DA INDÚSTRIA Padrão de Concorrência Fatores Segmentais REGULAÇÃO, POLÍTICAS (GOVERNO) Fatores Regionais Figura 2.7 – Visão-Resumo da Dinâmica Competitiva CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 54 2.7 Para uma abordagem estratificada da dinâmica competitiva de arranjos produtivos locais Para o caso específico da análise competitiva em arranjos produtivos locais, SOUZA & ARICA (2001) propuseram a adoção de uma perspectiva semelhante ao processo de “catching-up de países” (ver, por exemplo, ABRAMOVITZ, 1986), a partir de abordagem estratificada de firmas concorrentes em três grupos distintos. Segundo tal proposta, as primeiras firmas a adotar uma estratégia de mudança tecnológica e a tomar uma decisão de investimento (forging ahead), definiriam uma trajetória, assumindo maiores riscos (ver também FREEMAN & SOETE, 1997). Estas, porém, poderiam obter margens de lucro maiores e posições competitivas vantajosas (como monopólio, por exemplo, através dos direitos sobre patentes). Outras, geralmente, por não terem uma base suficiente de competências e recursos de conhecimento, por falta de capital ou por opção estratégica, aguardariam o movimento dos concorrentes para somente depois tomarem uma decisão. Estas buscariam seguir o(s) líder(es) (catching-up), contudo com uma certa defasagem tecnológica (technological gap). Apesar de tal estratégia apresentar menores riscos, grandes oportunidades de lucros e novos mercados poderiam ser perdidos. Aquelas que não conseguem acompanhar tal processo acabariam sendo excluídas daquela arena competitiva (falling back), ficando restritas ao nicho de mercado mais baseado na competição pelo preço. No longo prazo, estas dificilmente conseguiriam sobreviver. A sobrevivência neste caso ficaria condicionada pela capacidade de elaborar estratégias para explorar mercados alternativos de menor poder aquisitivo (nichos), através de produtos de menor valor agregado, concorrendo em condições de preços predatórios, com forte pressão sobre os custos de produção. Tal abordagem constitui-se em uma alternativa potencialmente promissora para o estudo da dinâmica competitiva em arranjos produtivos locais, por não se restringir a uma estrutura analítica estática, permitindo uma análise segmentada do ambiente competitivo e a identificação de padrões característicos de cada agrupamento. A incorporação de conceitos evolucionários de mudanças técnica e organizacional pode prover uma base teórica consistente para se explorar tal abordagem15, a qual 15 Vide Capítulo 4. CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 55 requererá contribuições conceituais e metodológicas específicas e a realização de pesquisa empírica minuciosa para sua validação16. 2.8. Considerações finais sobre o Capítulo Nos dias de hoje o termo competitividade é amplamente empregado nas mais diversas situações e, na maior parte das vezes, sem rigor de definição do conceito que está por trás da palavra, o que tem gerado um verdadeiro mosaico de definições para o termo, dificultando o entendimento e, muitas vezes, induzindo conflitos de interpretação. Para sintetizar e definir um marco conceitual sobre o tema, procurou-se desenvolver nesse capítulo uma avaliação sobre os principais conceitos por trás do termo “competitividade”, contrapondo, sempre que possível, os diversos enfoques, de modo a prover uma visão sintética das dicotomias e divergências conceituais mais destacadas. O conceito de competitividade está associado a uma visão teórica do processo econômico e da finalidade de sua mensuração. Nesse sentido, tradicionalmente duas correntes se destacam pelos distintos enfoques da competitividade: uma, a qual, para efeitos de contraposição de conceitos, poderíamos denominar de industrial-otimizante, centrada na eficiência e nos aspectos endógenos da empresa; e outra, com enfoque financista-comercial, que sustenta uma abordagem centrada na eficácia, cujos parâmetros de desempenho são os resultados obtidos no mercado, independente de suas fontes, sendo portanto, exógena. Em ambas o enfoque está no desempenho da empresa. Entretanto, para que se permitam e se validem estudos comparativos sobre a competitividade, tanto para firmas, países e regiões, há a necessidade de uma convergência para um conceito mais homogêneo. Um conceito mais representativo do termo competitividade deveria integrar os critérios de avaliação da eficiência e do desempenho presente, com sua evolução e perspectivas de sustentação futura. Dessa forma, seria importante responder a uma pergunta fundamental: Onde estariam as fontes das vantagens competitivas? Para responder a esta pergunta seria necessário adotar uma perspectiva dinâmica, a partir de uma visão em que o desempenho no mercado e a eficiência produtiva decorrem da capacitação acumulada pelas empresas que, por sua vez, reflete as estratégias 16 Vide Capítulo 5. CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 56 competitivas adotadas em função de suas percepções quanto ao processo concorrencial e ao meio ambiente econômico onde estão inseridas. Desse modo, ao invés de entendida como um fator intrínseco de um produto ou de uma firma, a competitividade surgiria como uma característica extrínseca, relacionada ao padrão de concorrência vigente em cada mercado. Pela abordagem dinâmica, o processo de tomada de decisão estratégica concentraria os fatores primordiais da competitividade. Porém, devido às incertezas do ambiente, e conseqüentemente, pela impossibilidade de se conhecer antecipadamente as estratégias dos concorrentes, as empresas definiriam seu comportamento e suas estratégias competitivas baseadas em experiências passadas e de sua perspectiva quanto ao ambiente, vinculando-se com conceitos econômicos evolucionários. Nesta linha, alguns fatores a serem avaliados, além da produtividade, seriam: o tamanho das firmas, a estrutura produtiva, o padrão de concorrência, as tecnologias utilizadas e alternativas presentes e futuras, as economias de escala e de escopo, as competências específicas, entre outros mais específicos à região, ao setor e às próprias firmas, como a história específica e à cadeia de valor. Na análise da competitividade estão envolvidos vários níveis, internos e externos, que, em suma, buscam captar o comportamento da firma. Entretanto, a divisão tradicional da análise competitiva nos níveis organizacional, estrutural, geográfico e sistêmico, negligenciam certos arranjos produtivos locais, pouco competitivos fora da esfera regional. Nesse sentido, para quando esta análise envolver pólos de indústrias locais, propôs-se a consideração de um quinto nível, o qual foi denominado de nível “segmental”, por estes constituírem-se geralmente de pequenos segmentos de cadeias produtivas, pouco representativos comercialmente na cadeia, mas contudo, em muitos casos, exercerem papel importante na economia regional e serem suscetíveis de análise e carentes de propostas de desenvolvimento local próprias. De um ponto de vista particular, a competitividade, como o próprio processo produtivo, é antes de tudo comportamental e dinâmica, e se configura através de uma via em mão dupla. Sendo assim, sua avaliação não pode concentrar-se apenas na eficiência ou na eficácia, ou somente no lado da oferta ou da demanda. Conseqüentemente, para que a avaliação da competitividade seja representativa e consistente, ela deve incorporar além de fatores ex ante (como a eficiência e a produtividade), e ex post facto (através do CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 57 desempenho e da eficácia do processo produtivo), uma visão sistêmica e sustentável, considerando o fator tempo, o nexo humano, e suas fontes, com critérios que reflitam até que ponto o sistema pode proporcionar sustentabilidade econômica, social e ambiental. Sendo portanto, bem mais complexa. Como destacado no texto, uma empresa ou setor geralmente é considerado competitivo quando “apresenta bom desempenho nas vendas de produtos e/ou serviços”, ou quando “consegue uma boa fatia do mercado”. Porém, uma entidade com fins lucrativos, exceto em casos e ocasiões muito raros, não têm as mesmas preocupações e prioridades de um país, região, município ou qualquer outra instituição pública, com funções sociais explícitas. Neste caso, o aspecto social e humano assume uma dimensão muito maior, apesar de financeira e administrativamente poderem (e deverem) operar de forma similar, principalmente no que diz respeito à adequação e controle de gastos à receita. Um ponto particularmente conflitante é a visão sobre o emprego. As firmas tradicionalmente o vêem como um insumo à produção, enquanto que para os governos, ele é resultado do crescimento econômico. Embora novas teorias proponham para a firma novos comportamentos e posturas, com uma crescente cobrança de responsabilidade social e ambiental, seu papel fundamental dificilmente alcançará o papel do ente público, pois, hipoteticamente, caso isto ocorra, este perderá sua função. Ademais, é uma tendência mundial o estado assumir mais um papel de moderador e regulador que de empreendedor e comerciante. Embora sua função social e importância como estimulador do desenvolvimento, esteja cada vez mais aparente e reconhecida, principalmente no que se refere a regiões menos dotadas de recursos naturais, de infra-estrutura e de conhecimento. Assim, pode-se dizer que a expressão “competitividade empresarial” (de foco mais estreito), estaria mais ligado a fatores econômicos e financeiros que levam ao crescimento da firma, buscando incorporar, “quando as restrições permitem”, fatores de natureza social e ambiental que interfiram no desempenho empresarial e industrial. Por outro lado, a adoção do conceito de “competitividade regional” (espectro mais amplo), para que não se caia em uma armadilha tautológica, só tem sentido se incorporar uma visão sistêmica e de sustentabilidade do ambiente socioeconômico, refletindo, além da eficiência e eficácia das empresas e setores econômicos locais, também a efetividade com que esses indicadores ocorrem e seus reflexos nas condições de vida e bem estar da população local. CAPÍTULO 2: COMPETITIVIDADE: CONCEITOS, ABORDAGENS E ANÁLISE 58 Conclui-se que, como o próprio processo produtivo, a competitividade, é antes de tudo comportamental e dinâmica. No próximo Capítulo, avança-se nos fundamentos teóricos da competitividade, em busca de uma abordagem que nos permita definir um meio de identificação e diferenciação de características específicas de comportamento que proporcionem às firmas a obtenção e sustentação de vantagens competitivas em determinados arranjos produtivos locais. CAPÍTULO 3 PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM ARRANJOS PRODUTIVOS LOCAIS Resumo Neste Capítulo explora-se os fundamentos evolucionários para uma abordagem da competitividade em arranjos produtivos locais. A partir de uma revisão dos conceitos e hipóteses fundamentais da teoria econômica evolucionária, enfatiza-se suas principais diferenças em relação à teoria neoclássica, buscando-se evidenciar sua maior relevância para o tratamento e a análise de problemas dinâmicos do ambiente socioeconômico local e para a análise da dinâmica competitiva em micro-sistemas produtivos locais, foco deste trabalho. A seguir, apresenta-se a importância do conceito termodinâmico de entropia para o entendimento de como sistemas abertos (como o econômico) interagem com o ambiente e quais os efeitos dessa interação no comportamento de sistemas dinâmicos. Subseqüentemente, apresentam-se os reflexos mais imediatos da abordagem evolucionária para o enfoque do ambiente competitivo e do desenvolvimento econômico regional e local. Também são traçadas algumas considerações sobre políticas e programas públicos de sustentação da competitividade local, compatíveis com a perspectiva evolucionária. Por fim, destacam-se algumas questões de pesquisa iminente que serão tratadas subseqüentemente. 3.1 Introdução Os avanços tecnológicos têm suscitado um relativo aumento no número de abordagens para entendimento do progresso e do crescimento econômicos. As abordagens para esses avanços seguem basicamente duas correntes distintas, uma neoclássica, CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 60 chamada de “principal” (mainstream); e outra alternativa, denominada evolucionária (ou neo-schumpeteriana, segundo alguns autores), mais proeminente nos últimos anos. Neste Capítulo, procura-se tocar os principais pontos (conceitos e hipóteses) que justificam uma abordagem do desenvolvimento local/microrregional pela perspectiva evolucionária. Segundo Nelson (1995), a abordagem mainstream considera fundamentalmente o caráter estático das premissas de otimalidade e equilíbrio, intrínsecas ao pensamento neoclássico, que excluem a individualidade dos agentes. Por outro lado, a abordagem evolucionária pressupõe comportamentos e ações individuais e eventos locais de adaptação ao ambiente (político, cultural, de mercado) como fonte crítica da diversidade e mudança (NELSON & WINTER, 1982; DOSI, 1988). Processos coletivos em sistemas complexos são realizados através da realidade microscópica de diversidade e subjetividade idiossincrática, as quais provêm as bases para soluções criativas de adaptação (FOSTER 1997). Para autores como Mirowski (1983) e Hodgson (1993), uma “teoria evolucionária” é toda aquela que utiliza a metáfora da seleção natural biológica. Nesse sentido, conceitos evolucionários já eram empregados na abordagem econômica desde antes do início do século passado, ainda que de forma superficial. Veblen (1898) foi o primeiro autor a adotar o termo “economia evolucionária”, e quem pioneiramente defendeu uma abordagem evolucionária para a economia. Citando Thorsten Veblen [1857-1929], Hodgson (1993, p.15) afirma que: “[...] a teoria neoclássica era imprecisa porque indicava as condições de sobrevivência a que qualquer inovação estava sujeita, supondo-a já ter acontecido, e não as condições de variação no crescimento”. Veblen se preocupava com uma teoria que pudesse explicar como as inovações acontecem, e não em descrever as condições de equilíbrio depois das possibilidades tecnológicas estarem estabelecidas. Nesse sentido, sua preocupação centrava-se não só no processo de evolução econômica, mas também na transformação tecnológica, e na maneira como a ação é moldada pelas circunstâncias. Ele rejeitou continuamente o cálculo, o ajustamento marginal da teoria neoclássica para, ao invés disso, enfatizar a inércia e os hábitos: “A situação de hoje define as instituições de amanhã através de um processo seletivo e coercitivo, agindo sobre os hábitos, e, assim, alterando ou fortalecendo um ponto de vista ou um condicionamento trazido do passado” (VEBLEN, 1899, p.190-191). De CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 61 acordo com Veblen (1919:239), as instituições são “hábitos estabelecidos de pensamento comum à generalidade dos homens que ajudam na superação ou no fortalecimento de processos de pensamento rotinizados que são compartilhados por um número de pessoas em ambientes específicos”. Até mesmo Alfred Marshall [1842-1924], apesar de ser considerado um ícone da corrente neoclássica, já afirmava que “a Meca dos economistas fica mais na biologia econômica do que na dinâmica econômica”. Tal afirmação sintetiza a atração que a metáfora biológica exercia sobre ele, apesar de não ter voltado ao tema em seus trabalhos subseqüentes (FOSTER, 1997). Questões como diferenciação, complexidade e incertezas são preocupações da teoria econômica moderna, principalmente a baseada na Escola Austríaca. Na primeira metade do século passado, Joseph Alois Schumpeter [1883-1950], um dos célebres representantes desta corrente, enfatizava o impacto fundamental causado pelos empreendedores na estrutura econômica, considerados os reais inovadores (NELSON & WINTER, 1982). Em contraposição aos modelos neoclássicos, o enfoque schumpeteriano era no contínuo aumento de variedade na estrutura econômica, ou seja, no surgimento de novas firmas e atividades econômicas e nas novas combinações resultantes1. Como os economistas clássicos, Schumpeter (1943) enfatizava fundamentalmente o lado da oferta da economia. Em sua visão, o deslocamento da função de produção e a oferta de novos produtos sempre encontrariam demanda, enquanto que os consumidores exerceriam um papel passivo, sendo induzidos a demandar novos produtos. Dessa forma, o desenvolvimento econômico se daria através de mudanças qualitativas e quantitativas do “fluxo circular de negócios” da economia2. Segundo Freeman (1994), a evidência da fragilidade dos modelos adotados até então (década de 50) para o tratamento da dinâmica tecnológica abriu as portas para se considerar “uma nova função de produção” para o sistema econômico, gerando uma verdadeira revolução na abordagem teórica das pesquisas subseqüentes. A função de produção (neoclássica), quando conhecida, não era de grande ajuda para se decidir o quê 1 Uma compilação das diversas teorias do desenvolvimento econômico, com ênfase nos aspectos regionais, pode ser encontrada em Souza (1999) e em Clemente & Higachi (2000). 2 Mais tarde, esse ponto passou a ser fortemente contestado, como veremos na Seção 3.3. CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 62 tornava uma inovação bem sucedida. O problema essencial era que tal abordagem tratava tecnologia como uma “caixa preta”3 (ROSENBERG, 1999). Por outro lado, a abordagem evolucionária explícita somente foi desenvolvida após os anos 60, quando emergiu uma série de estudos sobre inovação e mudança técnica, motivada pela escalada armamentista do período da “Guerra-Fria”. Estes tratavam inicialmente de fatores que propiciaram, durante e após a Segunda Grande Guerra, inovações bem sucedidas a partir de investimento maciço nas atividades de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), inicialmente no campo militar. A importância, e a conseqüente necessidade de se avaliar o fenômeno da inovação sobre a economia e a dinâmica industrial, fez crescer o interesse nessa área que passou a justificar maiores investimentos. Por outro lado, essa avaliação não podia ser satisfeita com as teorias existentes. Nesse sentido, os estudos sobre inovação, se tornaram muito empíricos e focados na definição da estrutura interna da tecnologia. Grosso modo, poderiase dizer que a origem da economia evolucionária foi fortemente influenciada por estudos de casos de inovação tecnológica, até então ignorados ou negligenciados pela economia neoclássica. Entretanto, por surgir de uma metáfora com o ambiente biológico, a abordagem evolucionária inicialmente continha sérias contradições intrínsecas. Os estudos de casos, apesar de representarem uma fonte rica e interessante da história natural da inovação, não eram baseados em uma metodologia comum, e, portanto, não eram comparáveis. Se a abordagem evolucionária apontava para uma teoria que pudesse prover explicações para uma ampla gama de fenômenos econômicos, e não apenas para a inovação, estas primeiras generalizações tinham que ser integradas a outras pesquisas tradicionais. Por exemplo, inovações são criadas e adotadas, em sua maioria, nas firmas, mesmo que em diferentes períodos de tempo. Surgia então, uma necessidade de convergência para metodologias e estudos empíricos que proporcionassem uma base comum para uma explicação teórica da inovação de forma mais ampla (FREEMAN, 1994). 3 Posteriormente, a corrente neoclássica avançou na tentativa de incorporar aos modelos de crescimento econômico o papel da mudança tecnológica (como em Lucas (1964)). Porém, somente através dos trabalhos pioneiros de Romer (1986) e Lucas (1988), incorporando o avanço tecnológico como fator endógeno, criando daí uma nova série de abordagens, é que tecnologia e as desigualdades regionais passaram a ser explicitamente consideradas nos modelos neoclássicos. CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 63 Assim, um importante passo a ser dado era integração da abordagem evolucionária com as teorias das firmas e organizações, como as teorias do crescimento (principalmente, PENROSE, 1959) e comportamental (notadamente, BARNARD, 1938; SIMON, 1947; 1959; CYERT & MARCH, 1963), ou a abordagem dos custos de transação (COASE 1937; ALCHIAN, 1950), entre outras. As pesquisas que redundaram no clássico livro intitulado An Evolutionary Theory of Economic Change (NELSON & WINTER, 1982) podem ser consideradas os passos iniciais neste processo de integração. O argumento principal era que Ciência, Tecnologia e Inovação (C&T&I) não poderiam ser desenvolvidas exclusivamente via mercado, pois demandam um substancial envolvimento público, requerendo também uma abordagem institucionalista4. Apesar de Nelson & Winter (1982: 39) declararem que a denominação “neoschumpeteriana” seria equivalente à “evolucionária”, alguns autores fazem uma distinção entre ambas. Segundo Hodgson (1993), Schumpeter evitou a analogia ao processo de seleção natural para a economia e adotou um conceito inteiramente diferente de evolução. “Sua concepção era mais revolucionária do que evolucionária” (op. cit.:149). Para Schumpeter, a evolução não decorria de um processo gradual e adaptativo, mas sim através de saltos e revoluções. Esta observação e várias outras distinções parecem demonstrar que muitos dos conceitos adotados pelos “novos evolucionários” estariam mais próximos da abordagem institucionalista de Veblen do que das idéias do próprio Schumpeter. Posteriormente, os autores neo-schumpeterianos passaram a investigar as interrelações entre estrutura e atores como mecanismo de retroalimentação (feedbacks), e não 4 A escola institucionalista americana (que tem em Veblen um dos seus mais eminentes representantes, juntamente com Mitchell e Commons), referia-se às instituições, hábitos e regras, e seu processo de evolução. Nesse sentido, a abordagem institucionalista dá ênfase às análises específicas e localizadas nas concepções de que hábitos e instituições formam o vínculo entre o específico e o geral (Hodgson, 1993). O que marca o ‘velho’ institucionalismo é sua rejeição aos pressupostos ontológicos e metodológicos do liberalismo clássico e a defesa de que o indivíduo não pode ser assumido como dado”. Entretanto, para Hodgson (1993, p. 13): “(...) o ‘velho’ institucionalismo perseguiu uma direção cada vez mais descritiva, deixando muitas das questões teóricas centrais sem resposta”. Em razão disso muitos autores, como Myrdal (1953), criticam a tradicional economia institucional americana como sendo marcada pelo ‘empirismo ingênuo’. O novo institucionalismo surgiu constituindo um enfoque centrado na Economia dos Custos de Transação, a partir dos trabalhos pioneiros de Ronald Coase (Coase, 1937) (Prêmio Nobel de Economia de 1991), e mais recentemente por Oliver Williamson (ver, por exemplo, Williamson, 1990 e Williamson & Winter, 1993). Nesse sentido, o conceito de Sistemas de Inovação (Lundval, 1988; Nelson, 1993; Edquist, 1997; Braczyk et al., 1998), adota uma visão sistêmica-evolucionária para análise de processos de inovação e interações institucionais. Ver, por exemplo, Conceição (2002). CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 64 apenas como uma estrutura dada ou a forma como o ambiente seletivo influencia os atores (isto é, a composição da sociedade dentro da estrutura de tempo e espaço), mas também como estes (especialmente os inovadores) mudam tal estrutura (Dosi, 1988). Atualmente, com exceção da escola pós-keynesiana, todas as correntes da teoria econômica moderna tentam, em maior ou menor grau, utilizar alguma analogia biológica para analisar a evolução dos sistemas econômicos. Entretanto, como afirma Foster (1997), “[...] esta analogia não pode revelar os principais fatores da mudança evolucionária no processo econômico. Analogias são utilizadas em estágios preliminares de pesquisas e como argumento lingüístico ilustrativo. A deficiência chefe da analogia biológica, tanto a neodarwiniana como a lamarckiana, é que elas são atemporais, e assim, não podem incorporar a história, exceto pelo uso planejado da mecânica newtoniana comparativa, considerando a competição agindo como força equilibrante” (op.cit.:449). O surgimento de novas variedades de atividades e agentes econômicos, sua coevolução e o relacionamento recíproco entre estes e a estrutura socioeconômica é um aspecto característico da abordagem evolucionária recente, o qual, pode prover um novo entendimento para o desenvolvimento regional, microrregional e local. A partir deste enfoque, duas questões assumem maior relevância: (i) como os mecanismos de “seleção” e “dependência da trajetória” (path dependence) influenciam a formação de variedade na estrutura econômica e o desenvolvimento microrregional; e, (ii) como políticas de desenvolvimento microrregional/local podem ser mais bem adaptadas às múltiplas trajetórias de desenvolvimento, considerando um mercado potencialmente ineficiente, afetado por oportunidades e ações políticas de certos grupos de agentes. O tratamento de questões locais do desenvolvimento econômico é um tema raramente encontrado na literatura, nesse sentido, torna-se importante identificar os vínculos entre os conceitos evolucionários e a abordagem do desenvolvimento econômico e da competitividade das empresas. A seguir, o desenvolvimento das idéias e conceitos esboçados previamente estão estruturados nas seções subseqüentes. Na Seção 3.2, busca-se mostrar as diferenças da abordagem evolucionária em relação ao método científico tradicional e as peculiaridades do tratamento de sistemas abertos e fechados e a sua relação com o conceito termodinâmico de entropia. Na Seção 3.3, é feita uma discussão sobre algumas abordagens do desenvolvimento econômico pelo enfoque do relacionamento recíproco entre nova CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 65 variedade e estrutura. São feitas considerações sobre como os “mecanismos de seleção” e a “dependência da trajetória” restringem as possibilidades futuras de desenvolvimento microrregional. Adicionalmente é tocada a questão de como oportunidades e ações políticas (acasos e “intervenção humana”) afetam a formação espacial de novas atividades econômicas. Na Seção 3.4, são discutidos os contrapontos entre os conceitos evolucionários e as iniciativas e decisões políticas sobre o desenvolvimento microrregional/local. Apresentam-se alguns dos fundamentos básicos para uma “abordagem competitiva evolucionária”, a qual, é fundamentada na seção seguinte (3.5). Na seção 3.6, são apresentadas as considerações gerais sobre o Capítulo. 3.2 Método científico, evolução e entropia O método científico é útil em decorrência de sua objetividade na busca de procedimentos que possibilitam uma interpretação adequada dos fenômenos da realidade. Em virtude disso, todo avanço tecnológico suscita problemas científicos cuja solução pode consistir na proposição de novas abordagens e na elaboração de metodologias e técnicas alternativas de investigação, com a finalidade de se obter um maior conhecimento dos fenômenos particulares a certos sistemas ou para o tratamento de problemas para os quais o arcabouço teórico vigente não se tem mostrado satisfatório ou adequado (MARCONI & LAKATOS, 2000). Evolução é um conceito que tem se tornando central em várias áreas científicas, como na economia do desenvolvimento (ver, por exemplo, CLARK et al., 1995), na geografia econômica (ver, por exemplo, BOSCHMA & LAMBOOY, 1999), e, em particular, nos estudos organizacionais (ver, por exemplo, BAUM & SINGH, 1994 e NOOTEBOOM, 1999). Neste sentido, a abordagem evolucionária baseia-se na análise de processos dinâmicos e da estrutura de sistemas abertos, buscando explicar como certos organismos se comportam e evoluem em ambientes específicos. Entretanto, evolução e mudança são conceitos que tradicionalmente a ciência não têm tratado de forma satisfatória. Este fato pode ser atribuído, em parte, à tentativa de se CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 66 entender sistemas viventes5 integralmente através de ferramentas matemáticas e, por conseqüência, pela dificuldade de modelá-los na forma de equações. Através de uma equação, expressa-se o fato de o “lado direito” ser equivalente ao “lado esquerdo”, e que há duas maneiras de se dizer a mesma coisa. Um artifício utilizado nas descrições matemáticas de sistemas, e mudanças no tempo, é supor que os lados direito e esquerdo de uma equação são, respectivamente, o estado inicial e final de um sistema. Deste modo, assume-se um tipo de “conservação”, que significa que os valores inicial e final devem ser idênticos, e assim, que se a quantidade de alguma parte do sistema for aumentada, esta deve ser compensada pelo declínio proporcional da mesma em outra parte. A aplicação desta visão tradicional de ciência ao mundo real pressupõe apenas uma definição apropriada e satisfatória das “partículas elementares” conservativas no tempo, de modo a escrever as equações que seguem uma predição. Mudança, nesta visão, é apenas a transferência superficial destes componentes da uma parte a outra do sistema (LEYDESDORFF & Van den BESSELAAR, 1994; CLARK et al., 1995; KEMP, 1997). O método científico tradicional é fortemente baseado no modelo mecânico (ROSEN, 1987). Por esta visão, o comportamento de um sistema pode ser entendido, e antecipado, pela identificação e classificação de seus componentes e seus elos causais, ou mecanismos de interação6. Nos sistemas físicos, as leis fundamentais da natureza, tais como conservação de massa, momento e energia, governam estes mecanismos e determinam integralmente o que deve acontecer. Estes sistemas podem ser isolados (fechados) de forma a garantir que nenhuma nova matéria ou energia flua e gere qualquer distúrbio. Limites são colocados no comportamento possível, de forma que se possa predizer as propriedades do estado final, de forma tão geral, que se aplica genericamente a qualquer sistema físico. Nestes sistemas, o estado final é aquele do equilíbrio termodinâmico, e as propriedades da matéria que o caracterizariam, podem ser calculadas para um amplo conjunto de problemas (ALLEN, 1994; LEYDESDORFF & Van den BESSELAAR, 1994). Por esse método, o futuro de um sistema pode ser predito pelo simples expediente de considerar o comportamento das equações que governam seu movimento. A 5 Adotou-se o termo “viventes”, ao invés de “vivos”, por aquele refletir melhor a idéia de processo em contínua evolução. 6 Ver, por exemplo, o modelo proposto por Souza (1998) para o dimensionamento de um sistema energético industrial. CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 67 “explicação”, neste caso, é reduzida a um esclarecimento de como o sistema funciona. A questão do porquê dele ter se tornado o que é, (que é fundamental, por exemplo, para se entender o processo de inovação, competitividade e o desenvolvimento microrregional/local), não é respondida. Enquanto é possível escrever as equações da mecânica de partículas imaginárias, o tratamento de sistemas reais é extremamente complexo, sendo sempre necessário fazer algumas (às vezes muitas) “aproximações”, para se chegar às equações que supostamente governam seu movimento. A hipótese geralmente feita, é que os elementos que compõem as variáveis (indivíduos dentro de uma população, firmas em um setor etc.) são todos idênticos a um tipo médio. Neste caso, como afirma Clark et al. (1995), o sistema é reduzido a uma “máquina” (modelo) que representa o sistema em termos de um conjunto de equações diferenciais (às vezes não-linear) que governam suas variáveis. Esta é a visão Newtoniana, que vê o mundo como um grande (e pontual) relógio. A Figura 3.1 apresenta uma ilustração (grosseira) deste processo. SISTEMA COMPLEXO “Medianização” ou redução Modelos Orgânicos Equações diferenciais Modelos mecânicos caos equilíbrio ciclos Figura 3.1 - Redução de sistemas complexos a sistemas simples pela modelagem matemática (reproduzida de Clark et al., 1995). CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 68 Através da ilustração anterior, procura-se mostrar que com a progressiva simplificação da realidade a modelos abstratos, compatíveis com as ferramentas e modelos matemáticos previamente disponíveis (como convencionalmente se faz pelo método científico newtoniano), acaba-se por reduzir demasiadamente os problemas reais a modelos de equilíbrio geral (representado pela elipse interna). Assim, os resultados são aproximações, que, com o passar do tempo, se distanciam cada vez mais do problema real, gerando maiores distorções. Sob esta visão, predições eram feitas simplesmente “rodando” o modelo, “acelerando o mecanismo para frente no tempo”, assim, afirmações sobre o futuro, sob certas condições, podiam ser feitas estudando os tipos de soluções possíveis para o longo prazo. Este método científico era baseado na hipótese de inevitabilidade de um estado final definido. A idéia de equilíbrio vinha da hipótese de que haveria somente uma única solução para o modelo, um ponto “atrator” e, portanto, tudo que ocorresse ao sistema inevitavelmente acabaria nele7. Este ponto “atrator” (solução das equações diferenciais) expressava um máximo ou mínimo de alguma função potencial, como acontece na física com as forças dissipativas de fricção e viscosidade que agem para levar qualquer sistema mecânico para um estado de equilíbrio termodinâmico, de máxima entropia. Pela hipótese anterior, deriva-se que o sistema em questão é governado por dois aspectos característicos8: (i) mecanismos determinísticos médios, operando entre componentes típicos; e (ii) comportamento local não-médio. Entretanto, como afirma Clark et al. (1995:42): “[...] em se tratando de sistemas abertos, tal hipótese é completamente falsa”. Para sistemas isolados, há um resultado previsível, o equilíbrio termodinâmico, mas não para sistemas abertos, nos quais matéria e energia podem fluir através das fronteiras do sistema. O que muda completamente a maneira de como explicar e entender cientificamente estes sistemas. 7 Posteriormente, verificou-se que sistemas de equações diferenciais não lineares admitem vários tipos de solução, desde estacionárias e homogêneas, caóticas e heterogêneas, a estruturas de ordem espacial e temporal. Contudo, as condições de experimentação externa não são suficientes para determinar um futuro único, desde que tais sistemas podem ser estruturados de modos variados dependendo dos detalhes internos de seus componentes, os quais não podem ser controlados externamente (Allen, 1994). 8 No caso de sistemas não-lineares, tais características poderiam ser amplificadas, provocando mudanças estruturais qualitativas nos mecanismos médios (ver Allen, 1994). CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 69 Quando mecanismos não-lineares estão presentes, o sistema pode continuar a mudar indefinidamente, tanto através de trajetórias cíclicas do mesmo tipo, como por movimentos caóticos em torno de um núcleo “atrator”. Sua evolução pode envolver mudanças estruturais na organização espacial e hierárquica, quando características diferentes (qualitativamente) emergem, e novos problemas, novas restrições e satisfações são ativados espontaneamente pelo sistema (LEYDESDORFF & Van den BESSELAAR, 1994; CLARK et al.,1995). Até mesmo em sistemas tidos como “físicos puros”, quando estes se tornam abertos a fluxos de energia e matéria, não há necessariamente um estado final único, que possa representar um “estado de otimalidade”. Esta capacidade de mudança estrutural não está contida nas equações de sistemas mecânicos dinâmicos descritos convencionalmente, que são capazes de funcionar, mas não de evoluir. Mais do que isso, mudança evolutiva resulta também do que foi removido (na redução a uma descrição determinística), porém este processo não se dá pela média, como geralmente assumido. Sistemas viventes (orgânicos) como, por exemplo, os econômicos, estão sempre abertos a fluxos de matéria e energia, e somente obtêm equilíbrio termodinâmico quando “morrem”. Sistemas viventes estão em constante “diálogo” (não em equilíbrio) com seu ambiente e, até mesmo quando não evoluem visivelmente, mantêm a capacidade de evoluir e mudar devido a sua subjacente diversidade (ZIMAN, 2000). Apesar disso, sistemas econômicos, biológicos, ecológicos ou humanos e sociais são discutidos em termos de comportamentos e elementos “típicos” e de estereótipos que compõem um esquema de classificação previamente definido. Por trás desses esquemas, na realidade, há sempre bastante particularidade e diversidade (ALLEN, 1994; CLARK et al.,1995). A partir dessa visão, o triunfo da ciência clássica foi tal que se acreditou (erroneamente) que se poderia proceder da mesma forma para qualquer tipo de sistema, bastando utilizar idéias análogas para biologia, economia, e outros campos de conhecimento, não regidos pelas leis da física. O “canto da sereia” era atraente e tais idéias acabaram sendo usadas genericamente, gerando interpretações distorcidas e procedimentos inócuos. Apesar do grande avanço representado pela ciência clássica, e da validade de seus métodos para inúmeros experimentos científicos, nem todo sistema pode ser analisado em CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 70 termos de “partículas elementares rodopiando no espaço”, de acordo com as leis fundamentais da Física. Para sistemas econômicos locais, em cuja abordagem estamos interessados, esta hipótese nega a existência de criação, inovação e adaptação. No desenvolvimento econômico, mudança e transformação, surgimento e evolução, não podem ser entendidos meramente através de representações mecanicistas (ALLEN, 1987; KEMP, 1997). Mais do que isso, entender e descrever o nascimento, desenvolvimento, saturação, declínio e morte de novos “elementos”, estruturas e estados de organização são fundamentais na análise de qualquer sistema vivente, principalmente quando tratamos de conceitos dialéticos como forma e qualidade (MAYUMI, 1995). A questão de mudança e trajetória do tempo somente começou a ser tratada pela Física Clássica a partir da formulação da Segunda Lei da Termodinâmica, ou Lei da Entropia, quebrando o dogma mecanicista da Física Clássica que reinou sustentado na Primeira Lei (Lei de Conservação de Energia). A Lei da Entropia é a única “lei” da física que se aproxima claramente das mudanças qualitativas de sistemas biológicos e econômicos. Porém, ela não determina quando a entropia de um sistema isolado irá alcançar um certo nível, nem exatamente o que irá acontecer, devido à denominada “indeterminação entrópica”. Simplesmente a Lei da Entropia aceita a irreversibilidade do tempo, sem mostrar que esta provém de leis mais fundamentais, ou como se concilia com elas propriamente (MAYUMI, 1995). Na magnífica obra The Entropy Law and the Economic Process (GEORGESCUROEGEN, 1971), o economista romeno Nicholas Georgescu-Roegen [1906-1994], propôs uma nova epistemologia associando o processo econômico ao conceito termodinâmico de entropia: “[...] A Lei da Entropia é estritamente uma lei evolucionária, no sentido de um processo vinculando nascimento e morte. Entretanto, há uma insuperável dificuldade de se lidar com mudanças evolucionárias, pois o processo não pode ser visto como um sistema isolado [...] ela (a Lei) aplica-se somente a um sistema isolado como um todo” (op.cit., p.192). Ou seja, o sistema não pode ser particionado e isolado em partes. Mais tarde, tal autor reconheceu as restrições de se aplicar a Lei da Entropia ao processo econômico (MAYUMI, 1995). Porém, a característica evolucionária do processo econômico se tornou cada vez mais explícita. Nesse sentido, uma das principais críticas que se faz à visão neoclássica da economia, é que ela foi concebida como a Primeira Lei da Termodinâmica, considerando CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 71 sistemas fechados, ainda que reconheça o sistema econômico como aberto. Segundo Georgescu Roegen [1976, apud FOSTER (1997)], o sistema econômico deve ser entendido como um sistema aberto, e portanto, a abordagem mais adequada seria em termos da Segunda Lei (Entropia), considerando os fluxos com o ambiente, responsáveis por mudanças estruturais no sistema. Em um sistema evolucionário, a estabilidade de qualquer forma macroscópica é permanentemente testada por eventos de cada contexto local do sistema. O poder de autotransformação é um resultado natural do próprio processo, que envolve habilidade de evoluir e capacidade de adaptação e mutação, em resposta às incertezas do mundo real. Estas características resultam em diversidade interna e variabilidade de populações (FOSTER, 1997; ZIMAN, 2000). Nesta visão, podemos entender que as circunstâncias presentes não são inevitáveis. Fazem parte de uma história particular que foi criada e marcada por decisões, eventos de criatividade e emergência de novas formas, funcionalidades e organizações. Desta forma, a sobrevivência (ou extinção) no longo prazo de qualquer sistema ou organismo particular é, até certo ponto, mais função de sua habilidade de enfrentar incertezas e mudanças, gerando respostas apropriadas (locais), do que da otimização precisa do seu comportamento em um determinado período. 3.3 Competitividade e desenvolvimento na perspectiva evolucionária Considerando um contexto evolucionário, as alternativas para políticas regionais são muito mais satisfatórias no campo estratégico, especialmente aquelas voltadas para indústrias com “retornos crescentes” ou, também para as denominadas por Arthur (1994) de “atividades-i” que formam “setores-i”. O “i” refere-se a atividades altamente dinâmicas em setores intensivos em conhecimento e tecnologia que criam seus próprios “retornos crescentes” in situ, como resultado de seu desenvolvimento. Durante seus primeiros estágios de crescimento, sua característica de progresso cumulativo pode limitar consideravelmente as possibilidades de alocação ótima de recursos (no sentido neoclássico). Entretanto, é imprevisível saber quando tais atividades-i seguem os velhos padrões locacionais ou quando criam novas estruturas por forças próprias (ARTHUR, 1996). CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 72 As atividades e setores mencionados anteriormente não são ainda bem observados e documentados, e os mercados, assim como os governos, não estão muito conscientes de sua significância. Segundo Arthur (op.cit), para que atividades-i e setores-i se desenvolvam é fundamental que barreiras à entrada sejam baixas (especialmente os custos de produção ou aquisição de conhecimento). Além disso, é necessário criar um ambiente que retenha ou atraia empreendedores e força de trabalho pensante, fatores decisivos para o desenvolvimento de competências. Infra-estrutura física atrativa, estrutura diversificada de instituições de ensino e saúde e meios de transporte e comunicação inter-regionais, são recursos que podem ser considerados como muito importantes e que podem ser influenciados pela comunidade regional. Neste sentido, regiões altamente diversificadas, com uma infra-estrutura estabelecida, estariam mais bem preparadas para atrair empreendedores e portadores de novos conhecimentos. Como ocorreu no Vale do Silício, na Califórnia, a trajetória de desenvolvimento começou a evoluir a partir do estabelecimento da Universidade de Stanford, reforçada pela “ação humana” no desenvolvimento de redes informais de trabalhadores qualificados, com forte ênfase em projetos na área de defesa Militar. Entretanto, este não foi um processo determinístico. Pelo contrário, foi em grande parte resultado da ação inconsciente e informal de diversos agentes humanos envolvidos na área de microeletrônica (SAXENIAN, 1994). Tais políticas são geralmente focadas em indústrias ou tecnologias específicas, assumindo que efeitos cumulativos de linkages diretos ou indiretos com outras indústrias e firmas geram benefícios econômicos; ou, pela percepção de que indústrias modernas e “high tech” são necessárias para o crescimento econômico. Ambas se baseiam no planejamento de um ambiente com infra-estrutura física e socialmente agradável, para atrair empresas de alta tecnologia, prestadoras de serviços e trabalhadores altamente qualificados. Além disso, as decisões estão freqüentemente focadas em Pequenas e Médias Empresas (PME) e em empreendedores inovativos por meio de instalação e modernização de instituições locais (como centros de pesquisa) e redes de pequenas e médias empresas, de modo a estimular novas idéias e tecnologias (CARLSSON & STANKIEWICZ, 1991). Como Schumpeter já havia observado há mais de 50 anos: “desenvolvimento... é um fenômeno distinto, inteiramente diferente do que se pode verificar no processo econômico de fluxo circular ou na tendência para o equilíbrio. Constitui-se de mudanças descontínuas e espontâneas nos canais do fluxo, distúrbios do equilíbrio, que alteram e CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 73 deslocam para sempre qualquer equilíbrio previamente existente” (SCHUMPETER, 1943:64). Apesar disso, especialistas do desenvolvimento econômico continuaram, e continuam, a elaborar modelos de desenvolvimento econômico baseados em uma visão determinística e no conceito neoclássico de tendência ao equilíbrio, entre outros. Considerando as hipóteses evolucionárias, sabemos que nem todas as microrregiões e localidades possuem as mesmas oportunidades e meios para atrair novas atividades ou desenvolver fontes próprias de crescimento econômico, principalmente àquelas com dívidas históricas de investimento em infra-estrutura social e urbana. Uma questão particularmente interessante que surge é, até que ponto uma microrregião pode agir para determinar seu próprio futuro? Nesse contexto, mecanismos para desenvolver e atrair novas variedades, tornam-se fundamentais para a promoção de economias de aglomeração e a diversificação das atividades econômicas locais. Na visão evolucionária, o ambiente age como um mecanismo de filtragem dos eventos aleatórios (oportunidades), podendo favorecer ou restringir a capacidade de enfrentar mudanças. Políticas de desenvolvimento local (microrregional) compatíveis com esta visão devem levar em conta os mecanismos de seleção e de dependência da trajetória. O conceito de dependência da trajetória9 (ou do caminho, no inglês: path dependence), tem origens na Matemática, através de observações e simulações da influência das condições iniciais, em certos sistemas de equações não lineares, na trajetória futura desses sistemas. No campo econômico, de forma geral, o conceito ilustra alternativas e soluções condicionadas por eventos históricos e pela base de conhecimento comum a certas áreas (ver, por exemplo, DOSI, 1988; ARTHUR, 1989; ANTONELLI, 1997; HAKANSSON & WALUSZEWSKI, 2002). Este fenômeno tem sido também considerado e verificado em outros campos científicos, como o social e o ambiental. De forma geral, este é um conceito perverso para a manutenção de certas características da qualidade de vida e para a preservação dos recursos naturais, devido à noção de irreversibilidade que trás embutida. Neste sentido, há trabalhos que o vinculam também ao conceito termodinâmico de entropia (GEORGESCU-ROEGEN, 1971; FOSTER, 1997), 9 Para uma investigação mais teórica sobre outros conceitos de dependência, como “dependência da massa” e “dependência da densidade” (que regulam a taxa de entrada e saída de novos mercados), e a dinâmica evolucionária das organizações industriais, ver Baum & Singh (1994). Para um enfoque mais matemático, ver Vega-Redondo (1996). CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 74 descrito anteriormente. Infelizmente, “estamos amarrados ao tempo!”. Note-se, entretanto, que o conceito de “dependência da trajetória” é diferente de “dependência do passado”, pois o primeiro baseia-se na hipótese de que ações em cada ponto no tempo são capazes de alterar o curso da história (ANTONELLI, 1997), o que não é assumido no segundo. Conseqüentemente, somente através do conhecimento dos efeitos específicos e características locais é que se pode chegar às verdadeiras origens desse fenômeno, e assim, poder propor estratégias e alternativas apropriadas para superar ou reverter barreiras ao desenvolvimento desses micro-sistemas locais, como os aglomerados de pequenas indústrias (LIEBOWITZ & MARGOLIS, 1995; BALMANN, 2002). Nesse sentido, o conceito de dependência da trajetória é extremamente importante para uma abordagem da dinâmica do ambiente econômico local por uma perspectiva evolucionária. Por esse conceito, o acúmulo de competências dentro da trajetória passada (seqüência de eventos), as incertezas do ambiente e a escassez de recursos (entre os quais, os financeiros) levam as firmas à “rotinizarem” seus comportamentos, que por sua vez limitam as trajetórias possíveis a um certo conjunto viável de alternativas. O ambiente de seleção local (as estruturas institucionais, econômicas, sociais e culturais) guia, habilita e restringe os atores locais a reterem, sustentarem e expandirem sua posição competitiva. Segundo Boschma & Lambooy (1999) e Lawson (1999), entre outros, mudanças bem sucedidas em firmas e outras organizações são mais prováveis de acontecer quando sustentadas por competências locais. Por outro lado, isto leva a dois problemas. Quando a adaptação à mudança é fortemente restringida pelas fronteiras espaciais do sistema, como podem as estratégias locais voltadas para alterar o curso do desenvolvimento, serem bem sucedidas? Um outro problema é, como os agentes locais buscam e avaliam novas tecnologias como forças potenciais de reestruturação da região? Paralelamente, como podem os atores locais enfrentar o problema de avaliar e especificar o grau de adequação local a novas tecnologias? Como pode tornar-se impossível contornar todos estes problemas, o papel das políticas e ações de desenvolvimento local deve ser dirigido a identificar, orientar e melhorar os elementos da estrutura ambiente que afetam a capacidade de uma microrregião de “fertilizar” e desenvolver novas atividades econômicas (BOSCHMA & LAMBOOY, 1999). Nesta estrutura, são considerados parâmetros como o perfil da produção, dos CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 75 trabalhadores, tamanho da demanda para bens e serviços, eficiência das instituições de mercado (como órgãos de financiamento e de promoção de negócios) e um sistema de regulação fiscal eficiente. Há ainda o problema de como se evitar ou superar uma condição de travamento ou estagnação (lock-in), causado pela dependência da trajetória local. Em microrregiões altamente especializadas, economias de localização podem, certamente, estimular um comportamento inovativo ao longo das trajetórias existentes, porém, freqüentemente impedem, ou dificultam, a adaptabilidade local para gerar algo inteiramente novo (GRABHER, 1993). Isto pode ser atribuído ao comprometimento de longa data do ambiente local com “velhas” tecnologias em termos de produção, investimentos, habilidades, grupos industriais e instituições. Em microrregiões industriais “maduras”, indústrias tradicionais, sindicatos e órgãos representativos de classes, geralmente tendem a se agarrar aos seus “direitos adquiridos” e aos seus interesses corporativos. Conseqüentemente, os gestores públicos precisam antever esta dinâmica e implementar e estimular programas estruturais de capacitação e reciclagem em um ritmo compatível com o das mudanças e das transições, gerando mais trajetórias capazes de superar os mecanismos de seleção. Como conseqüência, o processo de estagnação seria resultado de um amplo conjunto de “trajetórias excluídas”. Gestores públicos comprometidos com interesses de grupos estabelecidos, contrários às mudanças estruturais, tendem a agravar esta situação (NELSON & WINTER, 1982). Devido à dependência da trajetória, políticas condizentes com a visão evolucionária devem assumir a variedade regional como ponto de partida (BRACZYK et al., 1998). Conseqüentemente, isto implica que, uma diversidade de políticas que levem a diversos possíveis caminhos de desenvolvimento é recomendável, o que fortemente contrasta com a hipótese comum às teorias keynesiana e neoclássica, de que “[...] políticas de “cima para baixo” podem ser tomadas genericamente a qualquer região [...]” (AMIN, 1998, p.2; HIGGINS & SAVOIE, 1994). Um modelo de política regional proposto por Morgan (1997), baseia-se em estratégias de “baixo para cima” afinadas com as carências e os recursos locais. Tal abordagem considera a hipótese de que as regiões diferem em potencial de desenvolvimento. CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 76 De fato, regiões, definidas como entidades socioeconômicas, não diferem somente com respeito a suas habilidades de gerar, emular ou aplicar nova tecnologia, mas também diferem em sua capacidade adaptativa. Storper (1997), por exemplo, afirma que hábitos, convenções e conhecimento tácito, em certas microrregiões, são fatores que determinam a capacidade de crescimento econômico. Isto conduz ao problema de como tratar regiões periféricas, defasadas tecnologicamente. A este respeito, Cooke & Morgan (1998), chamam a atenção para a necessidade de se estabelecer estratégias específicas para certas regiões, dentro de políticas nacionais, ou de blocos, que prevejam mecanismos de redistribuição e diminuição das desigualdades. A configuração institucional de países e regiões é freqüentemente considerada como resistente a mudanças, reflexo da cultura específica, e de lenta adaptação, devido à dependência da trajetória. Apesar desta dependência, o ambiente econômico evolucionário oferece oportunidades para que autoridades e governos locais e organizações microrregionais influenciem a direção e o desenvolvimento de suas trajetórias (PEREZ, 1983). A conectividade entre as várias partes do sistema de produção e inovação são fundamentais para o desenvolvimento local e regional (HIGGINS & SAVOIE, 1994). Na prática, políticas, programas e projetos de modernização, fortalecimento e estímulo aos elementos fracos do sistema (setores, segmentos e indústrias locais) devem ser implementados. Estas ações não devem influenciar somente a estrutura das instituições, elas também devem afetar os padrões de interação das instituições de várias formas (como por exemplo, políticas de estímulo à interação indústria-universidade). Nesse sentido, a intervenção de governos locais pode ser mais eficaz no incentivo à construção e sustentação de um sistema de interdependências como forma de aumentar a capacidade de aprendizagem local, levando em conta o passado institucional e industrial (MORGAN, 1997). Por essa visão, esbarra-se em uma questão problemática. Para aumentar a interatividade local, as microrregiões precisam construir uma “rede de capacidades e competências”, de modo a explorar as oportunidades e convertê-las em atividades bem sucedidas (STORPER, 1995). Entretanto, a inércia institucional e a falta de confiança, são exatamente as características mais comuns e acentuadas da maioria das regiões “carentes” CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 77 e de pólos de industrias tradicionais (BOSCHMA & LAMBOOY, 1999). Segundo Amin (1999:12), o principal desafio político, nesse caso, seria “[...] encontrar meios de substituir tradicionais laços de hierarquia e dependência (por exemplo, com grandes indústrias, repasses governamentais, vínculos familiares) por fluxos mútuos de informação e cooperação entre os agentes econômicos e instituições locais e regionais”. Tal substituição deve ser um objetivo de longo prazo, possível somente através de iniciativas passo a passo no curto prazo, de modo a alterar a ordem de prioridades dos investimentos, passando a incentivar novos negócios, principalmente aqueles com maior potencial para exportação e de produtos de maior valor agregado. Ações políticas compatíveis com um ambiente evolucionário devem direcionar esforços para estimular o desenvolvimento e a difusão de novas variedades ou inovações no sistema econômico. Em princípio, isto pode ser proporcionado através de mecanismos de seleção eficientes e medidas que minimizem problemas de adaptação a mudanças. Neste sentido, segundo Metcalfe (1994), diferenças com a chamada abordagem do “equilíbrio” estão na noção de “falhas de mercado” (e.g., falta de incentivos) provocadas pelo fato de não ocorrer uma alocação ótima de recursos; e que o propósito de políticas públicas não é otimizar uma função objetivo, como benefícios sociais, mas sim estimular a introdução e a difusão de melhorias tecnológicas. Isto não quer dizer que “falhas de mercado relevantes” não justifiquem uma ação na política tecnológica forte e “racional”. Pelo contrário, a operação eficiente do ambiente de seleção pode ser seriamente prejudicada por um sistema de acesso à informação mal constituído, a qual, é considerada uma das principais causas das “falhas de mercado”. Além disso, as “falhas de mercado” reaparecem quando o processo de seleção é manipulado por grupos de firmas para garantir seus lucros (e.g., através de cartéis). Contudo, o fato é que a noção de “falhas de mercado” não permite uma base segura para ações políticas devido a problemas práticos. Por exemplo, seria muito caro identificar para cada caso o grau da “falha” e implementar uma ação política corretiva. Por outro lado, também seria errado aplicar um método de otimização em um sistema evolucionário, cujas mudanças e sua dinâmica não produzam mercados com as condições de “otimalidade de Pareto” (VIETOR, 1994). Este pensamento defende que políticas públicas devem seguir dois propósitos: (i) garantir mecanismos eficientes de seleção de mercados e extramercado, através de CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 78 mercado de capitais e acesso à informação; e, (ii) assegurar a criatividade do sistema econômico e a diversidade de comportamento no sistema, através de abertura à competição e garantias de apropriabilidade de direitos (e.g., patentes) para diminuir barreiras à entrada de agentes inovativos. Porém, segundo Metcalfe (1994), a operação efetiva de um sistema de inovação evolucionário depende da eficiente interação entre as firmas e outras instituições de pesquisa, para, conjuntamente, aumentar o processo de aprendizagem e criatividade. Esta condição não é considerada pela teoria neoclássica que assume um comportamento simétrico entre os agentes, não coerente com o fato de que conhecimento disseminado (spillovers) pode gerar efeitos na aprendizagem interorganizacional. No conceito de Sistemas de Inovação10, a divisão do trabalho (em termos de função e domínio), compreende diferentes instituições, reflete diferenças culturais, tem diferentes objetivos e responde a diferentes estímulos (op.cit.). Por isso, há necessidade de ações no sentido de promover a conectividade e a interação entre as várias partes do sistema. O papel do decisor na visão evolucionária, também difere daquele na visão neoclássica, que pressupõe a idéia fictícia de um observador totalmente informado sobre o processo econômico, inclusive nas abordagens mais recentes (WEGNER, 1997). A abordagem evolucionária assume que é equivocado admitir um agente econômico como tomador de decisão totalmente informado (e dessa forma, capaz de identificar e implementar uma “decisão ótima”). De acordo com Sen (2000), isto decorre do “Teorema da Impossibilidade” de Arrow, segundo o qual, não é possível derivar uma escolha social (coletiva) a partir de preferências individuais, ou seja, que a soma das racionalidades individuais não produz uma racionalidade coletiva, e que, na economia, o todo não só é maior, como pode ser muito diferente da soma das partes. Nesse sentido, um mercado evolucionário não pode ser direcionado por ações de governo para um bem definido “estado-final”, pelo fato de que as condições de mercado resultam de decisões descentralizadas e, como produto agregado, são por natureza imprevisíveis. Segundo Wegner (1997), Hayek afirmava, entretanto, que pode haver mecanismos de coordenação da atividade econômica paralelamente ao mercado e ao governo. Metcalfe (1994) defende a idéia de que decisores evolucionários não otimizam e sim adaptam. Em um ambiente de incertezas, decisores perseguem uma política de 10 Tal conceito, baseado em fundamentos evolucionários, é comentado em detalhes no Capítulo 5. CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 79 tentativa e erro. Eles aprendem e assimilam à luz de experiências e não há nenhuma garantia de sucesso em suas ações. Conseqüentemente, há uma forte necessidade de constante avaliação do processo e, devido à dependência da trajetória, as decisões devem levar em conta o contexto particular tecnológico, econômico e institucional no qual operam (VIETOR, 1994). Em suma, noções como “dependência da trajetória” e “seleção” estão associadas ao fato de que novas variedades são largamente direcionadas e canalizadas pelo ambiente de seleção local, o que impossibilita que resultados “ótimos globais” sejam alcançados. Por outro lado, conceitos como “acasos” e “retornos crescentes” sugerem que o processo de seleção pode ser muito “frouxo”, e que firmas, em alguns casos, podem ativamente adaptar o ambiente a suas próprias necessidades e aos seus interesses. Neste sentido, o processo de seleção estaria mais de acordo com a visão evolucionária lamarckiana que a darwiniana11 (NELSON & WINTER, 1982; SAVIOTTI, 1996). O surgimento e a localização de novas atividades econômicas não são determinados somente pelo ambiente de seleção, outros mecanismos também estão envolvidos, como eventos aleatórios e estratégias locais de ajustamento. Novas formas de variedade (paradigmáticas) podem ser influenciadas por estruturas locais, mas são freqüentemente de livre localização em seu desenvolvimento posterior, pois formam seu ambiente local de acordo com suas necessidades de desenvolvimento. Nesta perspectiva, o ambiente de seleção é considerado como parcialmente “herdado”, e admite que firmas e instituições (tais como órgãos regionais) podem ‘moldar seu próprio ambiente’ (BOSCHMA, 1997). Neste caso, firmas e outras organizações não são vistas como atores meramente passivos como no conceito darwiniano, mas sim no sentido lamarckiano, que mostram intenção e comportamento aprendiz e adaptam-se ao ambiente externo, mas também o influenciam, de acordo com suas próprias necessidades e interesses (ZIMAN, 2000). De outra forma, novas variedades que não se enquadrem ao seu ambiente, não emergiriam. Nestas circunstâncias, as riquezas das regiões dependem em grande parte da habilidade de suas 11 Segundo Lamarck, as espécies sobrevivem ao processo de seleção porque são capazes de mudar algumas de suas características herdadas, ou seja, possuem uma capacidade para aprender, diferentemente de Darwin, para o qual, somente os caracteres herdados podem ser transmitidos. Assim, o conceito lamarckiano enfatiza a capacidade do aprendizado, enquanto a visão darwiniana enfatiza o conceito de sobrevivente mais ajustado. Nesse sentido, o ambiente econômico estaria muito mais próximo do conceito lamarckiano, por permitir uma abordagem da evolução considerando cada ponto da trajetópria no tempo (“pelo conjunto da obra”), e não por um ponto apenas, com o futuro predeterminado pelos caracteres genéticos adquiridos no passado (“uma obra acabada”). Logo, na abordagem evolucionária adotada não se pressupõe o denominado “determinismo darwiniano”. Para uma visão abrangente de tais conceitos ver, por exemplo, Baum & Singh (1994); Clark et al. (1995); Foster (1997); Ziman (2000). CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 80 organizações (incluindo órgãos públicos) de criar ou atrair condições necessárias ao crescimento local (STORPER, 1997). Em outras palavras, “acasos” e “intervenção humana” têm um considerável impacto no lugar onde emergem novas variedades (negócios). Esta idéia de “criatividade no espaço” está associada à dinâmica das economias de aglomeração, que descreve como a formação de aglomerados locais pode trazer “retornos crescentes” baseados em economias externas de escala e de escopo em uma área limitada, como defendido por Marshall (CHANDLER JR., 1990; ARTHUR, 1994). Assim, a eficiência dos “parâmetros estruturais”, citados anteriormente, depende não somente de um período de desenvolvimento de novas tecnologias, como depende também de um ajustamento do ambiente local de acordo com as novas demandas (por exemplo, trabalhadores mais bem capacitados). Por um lado, isto leva ao aumento da variação, resultando em “retornos crescentes” para firmas individuais ou setores e outros elementos em rede, o que pode ser atribuído a economias externas que, segundo Krugman (1995), pode ser atribuído ao tamanho do mercado. Por outro lado, resulta também em acumulação local de conhecimento (tácito) (ou spillovers tecnológicos) que, na maior parte, não apropriável, e difícil de copiar ou imitar pelos competidores de outras regiões (MASKELL & MALMBERG, 1999). Com base nos resultados das dificuldades e êxitos obtidos em diferentes países ao longo das últimas décadas, Sen (2000), defende a adoção de uma abordagem múltipla e integrada do desenvolvimento, apontando algumas questões importantes. “Essas questões relacionam-se estreitamente com a necessidade de se equilibrar o papel do governo – e de outras instituições públicas e privadas – com o funcionamento dos mercados” (op.cit.:151). “A busca de uma solução única e multiuso (como por exemplo, a abertura de mercados ou ajustar preços) influenciou acentuadamente o pensamento econômico. Ao invés disso “é preciso haver uma abordagem integrada e multifacetada, visando a um progresso simultâneo em diferentes frentes, incluindo diferentes instituições que se reforcem mutuamente” (SEN, 2000: 152). CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 81 3.4 Fundamentos para uma Abordagem Evolucionária da Competitividade em Arranjos Produtivos Locais Segundo Freeman (1994), as raízes da visão evolucionária de progresso técnico podem ser consideradas, lato sensu, próximas da teoria econômica marxista. Particularmente da visão de que a organização capitalista de produção e a distribuição de tamanhos e lucros das firmas são um sistema em constante transformação. Na abordagem evolucionária de Nelson & Winter (1982), utilizando referencial teórico de Simon12 (1959), a noção neoclássica de “comportamento racional otimizante” é substituída por um conceito mais realista de “satisfação temporária” em situações de incerteza e informação imperfeita. Posteriormente, o fato do processo de tomada decisão ocorrer dentro de fronteiras de rotinas preexistentes também foi incorporado. Para Nelson (1995:56), o termo “evolucionário” “define uma classe de teorias, modelos ou argumentos que tenham as seguintes características: 1) explicar o movimento de algo ao longo do tempo, ou explicar como algo é o que é em um momento de tempo, em termos de como chegou ali; ou seja, a análise é essencialmente dinâmica; 2) a explicação envolve tanto elementos aleatórios, que geram ou renovam o conjunto de variáveis em questão, quanto mecanismos que sistematicamente selecionam os sobreviventes, e; 3) há forças inerciais que garantem a continuidade dos sobreviventes vitoriosos”. Nesse sentido, incertezas e racionalidade limitada são importantes hipóteses da teoria evolucionária, pois implicam em mudança de enfoque na natureza do processo de tomada de decisão e para o problema de ajuste. Dessa forma, agentes econômicos defrontam-se com altas taxas de incertezas devido à complexidade e à instabilidade do ambiente no qual operam, enquanto que as informações realmente úteis ou valiosas para a tomada de decisão não se encontram disponíveis livremente, como suposto pela teoria neoclássica (NELSON & WINTER, 1982). 12 Herbert Simon [1916-2001] foi um prestigioso economista, ganhador do Prêmio Nobel de Ciência Econômica em 1978. Seus trabalhos sobre a teoria da firma (principalmente com Richard Cyert e James March), e conceitos como os de “racionalidade limitada” e “preferência do consumidor”, abriram uma nova linha de estudos, tendo contribuído em vários ramos da ciência, além da economia, como na ciência política, sociologia, teoria da organização, estatística, filosofia, ciência cognitiva, entre outras (Williamson, 2000). Suas críticas às hipóteses neoclássicas para o comportamento do agente econômico (“racionalidade ilimitada” e “informação perfeita”), praticamente ignoradas na época (décadas de 40 e 50), são hoje em dia alvo de resgate conceitual e reconhecimento histórico e fonte de inúmeros trabalhos e avanços sobre o comportamento da firma e a teoria da decisão. No Capítulo seguinte, aprofundaremos a discussão em alguns de seus conceitos. CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 82 Variedade de comportamento e na estrutura do sistema também são pressupostos essenciais na abordagem evolucionária (SAVIOTTI, 1996). Além disso, a complexidade crescente e as novas variedades (o desenvolvimento de novas espécies de tecnologias e atividades econômicas) são vistas como atributo fundamental do desenvolvimento. Deste modo, o crescimento econômico pode ser concebido como reflexo do aumento de complexidade associado com a evolução de novas variedades e com um ambiente mutável. A abordagem econômica evolucionária pode ser dividida em duas correntes principais: (i) Uma que foca nas trajetórias ou caminhos de desenvolvimento de longo prazo; e (ii) outra, que enfatiza as estratégias de luta pela sobrevivência, muitas vezes em condições competitivas adversas. Esta última destaca os meios de aumentar as propriedades da estrutura ou as condições de produção, de modo a elevar a produtividade dos atores, influenciando o ambiente de seleção através de estratégias de ajuste a mudanças. Em geral, esta abordagem não considera tomada de decisão individual. Na sua abordagem do desenvolvimento econômico, Schumpeter se concentrou nas mudanças que envolviam “eventos maiores”, disrupções e quebras de paradigmas13. “[...] entretanto, mudança tecnológica é também (e talvez cada vez mais) uma corrente contínua de inumeráveis pequenos ajustes, modificações e adaptações [...]” (ROSENBERG, 2000:166). Como afirmam Nelson & Winter (1982:130), “Inovações em rotinas organizacionais consistem, em grande parte, de novas combinações de rotinas preexistentes”. Entretanto, Schumpeter (1982) afirmava que empreendedores individuais eram aptos a desfrutar de benefícios extras usando estratégias de inovação. Ele via empreendedores como uma categoria particular de indivíduos que estavam mais propensos a correr riscos em um contexto de incertezas, porém cada um individualmente. Posteriormente, ele reconheceu também o papel das grandes corporações e dos governos no processo de inovação e desenvolvimento14 (SCHUMPETER, 1984; FREEMAN, 1994). 13 Conceito desenvolvido e explorado por Thomas Kuhn com relação ao método científico para mostrar a necessidade de rompimentos (revoluções) com a estrutura estabelecida para que a inércia estrutural seja vencida e a mudança ocorra, permitindo que novos padrões sejam estabelecidos (Kuhn, 1970). Tal concepção é bem próxima do que Marx denominou de “princípio da contradição” em relação ao progresso técnico (Vide Capítulo 4, seção 4.10). 14 Essas duas visões passaram a ser denominadas na literatura sobre inovação, respectivamente, de Marco I e Marco II de Schumpeter. CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 83 Em um ambiente evolucionário, podemos assumir duas hipóteses extremas: (i) qualquer novidade é gerada exogenamente e selecionada economicamente, assemelhandose assim a um modo de evolução darwiniano, ou (ii) ambas, geração e seleção são endógenas ao ambiente econômico, neste caso, aproximando-se de um processo evolutivo lamarckiano. De acordo com a última hipótese, o modo de geração de variedade (variação) se dá com intenção explícita de adaptar inovações ao ambiente no qual elas serão usadas. A princípio, o modo de evolução lamarckiano é mais compatível com o ambiente econômico, que o puramente darwiniano (METCALFE, 1994). Em uma recente reinterpretação deste debate, inspirado pela literatura sobre aprendizagem organizacional, Nooteboom (1999) estabelece o processo de inovação como uma conexão entre as atividades de explotação e exploração. Em sua visão, o processo de explotação (aplicação, difusão) influencia a exploração (descoberta, desenvolvimento), levando não somente a uma antecipação ex-ante do ambiente de adoção esperado, mas a uma contínua realimentação (feedback) entre exploração e explotação através de vários canais de interação. Mais uma vez, o desenvolvimento socioeconômico parece ser bastante diferente da evolução biológica. Se de fato, o processo de seleção é também um processo de geração de nova variedade, ao identificar novas combinações com algumas chances de sucesso, e, por sua vez, se este está inserido no ambiente econômico, então a fonte de variedade não é exógena nem aleatória, mas sim, surge a partir e através da aprendizagem e da experiência gerados no processo de seleção, o que alimenta ideais criativos. Nesta etapa, novas variedades ainda têm uma grande chance de sucumbir ao processo de seleção, mas este não é um processo aleatório nem independente (NELSON & WINTER, 1982). Uma inovação em uma organização pode consistir apenas do estabelecimento de novos padrões de informação e fluxos de material entre sub-rotinas anteriormente estabelecidas. Neste sentido, segundo (NELSON & WINTER, 1982): “ [...] rotinas confiáveis, com escopo bem definido, provêm os melhores componentes para que novas combinações sejam bem sucedidas” (op. cit., p.131). Nesta visão, as rotinas seriam “um tipo de genes incorporados e modificados ao longo da história organizacional” (op. cit., p.134). Por outro lado, o conjunto de idéias que são formadas e que sustentam a maioria das decisões estratégicas das empresas pode ser visto como heurísticas (princípios com os CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 84 quais busca-se uma “solução aproximada”, ou uma proposta melhorada para problemas de sobrevivência e aumento da lucratividade, que não necessariamente é a melhor resposta), as quais têm sido tratadas sob a denominação genérica de “estratégias corporativas” ou “estratégias competitivas” (ver, por exemplo, HAMEL & PRAHALAD, 1995; HENDERSON, 1998; MINTZBERG et. al., 1998). Nesse contexto, firmas não irão adotar ou implementar novas tecnologias ou se adaptar a mudanças do ambiente tão suavemente como suposto pela abordagem neoclássica convencional. Pois, devido às incertezas, elas tendem a um comportamento “rotinizado”, definindo certos padrões de comportamento mais ou menos previsíveis. Mais do que conscientemente maximizar lucros ou funções de utilidade, como previsto pelos modelos neoclássicos, a atitude típica de produtores e compradores é formar hábitos e convenções no meio em que operam. Tais hábitos e convenções são formados dentro de um contexto microrregional de redes sociais de agentes, que se encontram “embutidos” na cultura local e se desenvolvem através de inter-relações (BEST, 1990; STORPER, 1997). Os conceitos de “rotinas15”, “dependência da trajetória” e “seleção” sugerem que novas variedades são formadas e influenciadas pelo ambiente ao redor, e vários tipos de reações, freqüentemente imprevisíveis, podem ocorrer. Por outro lado, certas firmas, ou grupos específicos delas, podem agir para formar e influenciar o ambiente ao seu redor de acordo com suas necessidades e interesses (MOKYR, 2000). Buscas por novas tecnologias são mais prováveis de serem empreendidas localmente, e assim, mais propensas a se dirigirem a tecnologias e mercados com os quais estas firmas se tornaram “familiares” ou tiveram algum contato anterior (NELSON & WINTER, 1982). Do ponto de vista da firma, este processo pode ser racional, no sentido de que algumas vezes são descartadas alternativas promissoras (e, algumas vezes superiores, circunstancialmente), devido aos altos custos de ajustes, altos riscos e maiores incertezas envolvidas. Em outras palavras, as fronteiras das trajetórias exercem restrições às habilidades dos agentes econômicos reagirem a mudanças de mercado ou a mudanças tecnológicas (VIETOR, 1994). Estes elementos sustentam o conceito neo-schumpeteriano de dependência da trajetória (DOSI, 1988), que, de uma certa forma, contrapõe o conceito 15 Tal conceito é explorado em minúcias no Capítulo 4. CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 85 schumpeteriano de destruição criativa, pois enquanto o primeiro reflete uma tendência inercial de manter-se passo a passo (eventos) em uma determinada rota (irreversibilidade temporal), o outro, representa forças que levam a saltos em uma certa trajetória (melhorias substanciais) ou mudança para rotas alternativas (novas oportunidades e tecnologias). A história, em termos de herança de estruturas, instituições e culturas regionais, freqüentemente age como um filtro para acessar e lançar mão de novas oportunidades. Novos desenvolvimentos nem sempre são percebidos como um novo modo de produção ou de organização dentro da região onde ocorrem. Grupos estabelecidos (políticos, industriais, culturais etc.) tendem naturalmente a resistir às mudanças fundamentais que passam a acontecer no ambiente como forma de manter posições obtidas, já que os referenciais que mantinham as posições anteriores, com as mudanças, dificilmente permanecem intactos (BIANCHI & MILLER, 1996; MOKYR, 2000). Neste sentido, Dosi (1982), propôs a noção de “trajetórias tecnológicas16” para o estudo da natureza evolucionária do “comportamento inovativo” das organizações, enfatizando a importância de se investigar longos períodos de desenvolvimento. Tal comportamento é considerado como uma propensão, mais para “seguir próximo”, acompanhar, do que para restringir as possibilidades a rotas pré-definidas. Estas, por sua vez, formam um tipo de estrutura de pensamento que se ajusta às restrições nas oportunidades tecnológicas e provê guias para atividades exploratórias das firmas. Esta “dependência da trajetória” está vinculada ao estoque de conhecimento, informação útil e experiência, através do processo de aprendizagem coletiva. Isto é bastante relevante na avaliação das dimensões do processo de ajustamento ao aumento da complexidade, que por sua vez está associado à evolução de tecnologias. Segundo Dosi (1988), as principais características das mudanças técnicas nas firmas podem ser resumidas da seguinte forma: 16 O conceito de “trajetória tecnológica” está relacionado ao conceito de “dependência da trajetória”, e foi primeiramente proposto em Nelson & Winter (1977). Posteriormente foi ampliado em Dosi (op.cit.). Subseqüentemente, vários trabalhos passaram a adotá-lo representando “um conjunto de conhecimentos vinculados a uma inovação radical, que através da difusão em massa em certos mercados, formam uma estrutura de padrões caracterizada por efeito inercial dinâmico próprio (uma trajetória), levando a posteriores CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 86 1. Inovações e investimentos em novas tecnologias variam de acordo com o grau de apropriabilidade e incerteza sobre seus resultados técnicos e comerciais; 2. A tecnologia incorpora um certo grau de conhecimento tácito (expertise, experiência) específico a cada organização, localizado (espacialmente) e cumulativo (temporalmente). 3. Inovações resultam de processos de busca e aprendizagem de indivíduos e organizações. Atividades de resolução de problemas específicos e de aprendizagem são caracterizadas por rotinas organizacionais e comportamentais; 4. Como resultado de 1 e 2 , tecnologias se desenvolvem ao longo de certo caminhos ordenados (trajetórias) dentro dos limites das organizações ou de “paradigmas tecnológicos17”. 5. Como resultado de 1, 2, 3 e 4, a diversidade de técnicas usadas dentro e entre firmas e setores é uma característica fundamental de uma economia em face de mudança tecnológica. Nesta visão, aonde uma firma “pode ir” é função de sua posição atual, que por sua vez é função da sua trajetória passada e de sua competência para seguir as potenciais trajetórias futuras. A noção de “dependência da trajetória” reconhece que o passado histórico influencia e restringe tais trajetórias18. Dessa forma, algumas firmas consideradas altamente lucrativas e competitivas por critérios neoclássicos, podem entrar rapidamente em uma “trajetória suicida” quando não se adaptam às mudanças do ambiente, principalmente devido ao processo tecnológico de “destruição criativa”. inovações incrementais e ao desenvolvimento de uma gama de tecnologias e dispositivos técnicos e organizacionais auxiliares vinculados”. Tal conceito é central na abordagem proposta nesse trabalho. 17 Paradigmas tecnológicos, segundo Dosi (1998), refere-se a um contexto coletivo que determina as práticas de P&D e os padrões de desenvolvimento tecnológico com base em um projeto dominante de algum artefato. Neste sentido, algumas tecnologias podem se tornar “atreladas” a certos paradigmas, devido aos “efeitos de lock-in”, implicando um certo grau de irreversibilidade. 18 Esta hipótese contraria frontalmente a teoria econômica neoclássica, pela qual, é assumido que há uma infinidade de caminhos a serem seguidos, tecnologias a serem adotadas livremente, e mercados sem barreiras a serem ocupados, sem nenhuma relação com o passado (Teece & Pisano, 1994). CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 87 Pela lente evolucionária, vantagens competitivas e retornos sustentáveis são conseguidos através de competências organizacionais distintivas, tais como rotinas, habilidades e ativos complementares difíceis de serem imitados. Um conjunto particular de rotinas pode perder seu valor se não possuir alguma característica distintiva no mercado, ou se puderem ser rapidamente replicado ou emulado pelos competidores. Segundo Teece & Pisano (1994), imitação ocorre quando firmas descobrem e simplesmente copiam rotinas e procedimentos organizacionais; e emulação, se dá quando firmas, através de meios alternativos próprios, criam procedimentos ou dispositivos com a mesma funcionalidade proporcionada por uma inovação. Em um sistema evolucionário, os mecanismos de seleção guiam e restringem o comportamento criativo e adaptativo e, portanto, determinam quais mudanças prosperam e quais falham. Novas variedades (firmas, produtos, tecnologias) que não se ajustam dentro do ambiente local (mercado, regras, normas culturais), estão fadadas a desaparecer. O ambiente de seleção consiste de mercados (tais como o de capitais e de produtos), e de um conjunto de fatores extramercado, os quais incluem oportunidades, instituições, valores, normas, crenças, costumes e práticas aceitas socialmente (DOSI, 1982; MOKYR, 2000). Nesse sistema, eventos estocásticos podem influenciar o ambiente, porém os “mecanismos de seleção” limitam tal aleatoriedade a um certo conjunto de elementos “mais bem adaptados”. Em outras palavras, o ambiente local age como um tipo de mecanismo de seleção que pode, ou não, prover condições favoráveis de se atingir novos requerimentos de mudança. De acordo com Nelson & Winter (1982), esta é uma das principais características da teoria evolucionaria. De forma geral, podemos destacar quatro conceitos centrais da abordagem evolucionária: variação, seleção, retenção e luta por recursos escassos. Estes podem ser interpretados e sintetizados da seguinte forma: Variação: refere-se a mudanças em rotinas, competências e nas estruturas organizacionais. Este conceito não se restringe a uma simples analogia biológica darwiniana, na qual não haveria espaço para intencionalidade humana e atividades conscientes de busca por metas. Na abordagem econômica evolucionária não se pressupõe ausência de propósitos na ação dos agentes, e uma das formas de variação é aquela gerada por ações intencionais. Quando indivíduos agem na busca de alternativas e adaptações CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 88 (tentativa e erro) para solução de problemas concretos, o processo de aprendizagem pode envolver fatores políticos (característicos do comportamento humano), gerando uma variação intencional (ALLEN, 1987; METCALFE, 1994; SAVIOTTI, 1996). Variações não intencionais podem resultar de fatores imprevisíveis e imprevistos, como acidentes, acaso ou sorte, fruto do próprio processo criativo ou do que é, às vezes, denominado de serendipity19. Do conjunto de alternativas geradas em um ambiente competitivo (de adaptação e interação com o meio), certos tipos de variação são mais prováveis de obter sucesso do que outros (inovações), configurando um processo de seleção. Neste processo, a capacidade de recombinar recursos acumulados e de obter novos recursos é um fator fundamental para a sobrevivência. Seleção: refere-se à capacidade do ambiente de favorecer certas variações (ou tipos de variação), em detrimento de outras. Neste processo de decisão, os mecanismos de seleção priorizam e avaliam certos requisitos, características e tendências, através das quais condicionam o meio. Segundo Lambooy (1988), três tipos principais de fatores condicionam o processo de seleção: os econômicos (capital, demanda, padrão de concorrência etc); os institucionais (leis, regras, normas etc) e os geográficos (clima, recursos naturais, infra-estrutura etc). De acordo com a dinâmica do ambiente, os mecanismos de seleção atuam em diferentes níveis de exigência, condicionados pela disponibilidade de recursos (físicos, financeiros, de conhecimento) e pela adequação ao meio (requisitos legais, regulamentares, demanda) que restringem certos tipos de variação. Em cada nível, entretanto, tais mecanismos operam através de um processo de tentativa e erro com várias iterações, o que caracteriza a aprendizagem. Informações sobre quais e em que nível tais fatores serão priorizados são fundamentais na indicação das possíveis direções do processo de mudança e adaptação. Um processo evolucionário envolve um terceiro mecanismo. O de retenção seletiva de certas variações. Este mecanismo provê a certos tipos de variação incentivos à 19 Segundo o The New Lexicon Webster’s Encyclopedic Dictionary of The English Language, este termo significa, literalmente, “o dom de realizar ‘prazerosas’ descobertas por puro acaso”, originalmente cunhado pelo escritor inglês Horace Walpole em uma carta de 28 de janeiro de 1754, baseado no título de um conto de fadas persa chamado The Three Princess of Serendip. “Através de suas viagens, eles [tais príncipes] estavam sempre sujeitos a novas descobertas (por acidente e sagacidade!) de coisas que não estavam em indagação...”. Seu significado ajusta-se perfeitamente bem à natureza acidental de muitas descobertas científicas, feitas por casualidade, mas somente tornadas possíveis através de uma visão aguçada, pela curiosidade e sagacidade (ver, por exemplo, http://www.cienciateca.com/stsserend.html). Para um entendimento mais específico dos fundamentos evolucionários do processo de inovação tecnológica e suas diferenças do processo evolutivo biológico, ver Mokyr (2000) e outras contribuições reunidas em Ziman (2000). CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 89 preservação, duplicação e outras formas de reprodução. Os genes (na biologia) exerceriam um papel semelhante. Dentro de organizações, este mecanismo pode ser observado pela tendência inercial na estabilidade de certas estruturas administrativas e atividades, como, por exemplo, rotinas, padronizações, especializações (NELSON & WINTER, 1982), e recursos físicos tais como prédios e máquinas. Este conceito assemelha-se à hipótese central da ecologia organizacional, pelo qual, as organizações tendem a ser inertes (HANNAN & FREEMAN, 1984), e à noção de inércia locacional na geografia econômica, que atuam como forças centrípetas que favorecem a concentração geográfica de atividades econômicas em certas regiões. As variações selecionadas (retidas) podem também se difundir por meio de imitação e adaptação (mimetismo), devido à mobilidade de pessoas, tecnologias e organizações. Apesar dos avanços das telecomunicações e meios de transporte, a proximidade espacial pode representar um fator fundamental para a transferência e difusão de inovações, imitações e adaptações em certas atividades localizadas, devido aos aspectos sociais e culturais envolvidos (BAUM & SINGH, 1994; ZIMAN, 2000). A intensidade do processo de seleção, e a conseqüente pressão pela busca por variação efetiva (novas soluções), é proporcional à escassez de recursos. A competição entre os atores econômicos por suprimentos e insumos de produção é maior e mais acirrada quando estes são limitados ou escassos (o que é compatível com a noção darwiniana de “luta pela vida”). Assim, a abordagem econômica evolucionária enfatiza principalmente o desenvolvimento estrutural e de longo prazo, mais especificamente os parâmetros estruturais do desenvolvimento, tais como composição de indústrias, tecnologias e organizações. Por outro lado, ela também trata da relação dinâmica de atores econômicos e seu ambiente pelo desenvolvimento concebido como resultante desta interação (POSSAS, 2002). Apesar da atração que exerceu, e ainda exerce em pesquisadores de várias áreas científicas, e dos avanços no campo metodológico, a analogia entre rotinas e genes, assim como entre firmas e fenótipos, revela profundas diferenças da abordagem econômica em relação à teoria evolucionária biológica (MOKYR, 2000). Por exemplo, as firmas não têm uma duração de vida natural, não necessariamente morrem, e não têm tamanho natural, CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 90 algumas podem ser grandes, outras pequenas. Evidentemente que nesse aspecto há uma ruptura de conceitos e um limite para a simples analogia. No ambiente econômico, a seleção do “melhor”, “mais forte” ou “mais apto”, é um processo que difere substancialmente do biológico, devido ao conteúdo político da “intervenção humana”. Fatores como nepotismo, oligopólio, monopólio, cartelização, lobby e tráfico de influências, entre outros, não encontram similares no processo biológico (ZIMAN, 2000). Porém, uma característica distintiva fundamental dos agentes no processo evolutivo econômico, é sua capacidade em formular estratégias, baseadas na imaginação e no raciocínio lógico aliada à capacidade intuitiva, acelerando os efeitos da competição e a velocidade das mudanças. Dessa forma, as “intervenções humanas” alteram e direcionam o curso “natural” da evolução do processo socioeconômico (HENDERSON, 1998). Por outro lado, o processo econômico pode, muitas vezes, se comportar de maneira caótica, não sendo apropriado considerá-lo como linear, pois pequenas mudanças nos parâmetros iniciais podem resultar em grandes desvios dos resultados esperados (KEMP, 1997). Além disso, o ambiente de seleção e os agentes interagem em um processo adaptativo com resultados incertos. Nesse sentido, tais intervenções não necessariamente seguem uma trajetória pré-definida. Contudo, uma vez que uma trajetória particular tenha começado a evoluir, atores, tais como empreendedores e firmas, têm influência na trajetória do seu desenvolvimento. De fato, há um crescente reconhecimento de que firmas podem co-determinar o processo de seleção (METCALFE, 1994). Isto está vinculado à noção de “retornos crescentes” devido ao processo cumulativo e de vantagens de auto-reforço de que as firmas desfrutam quando sua tecnologia obtém uma posição dominante. Arthur (1994) afirma que este processo de realimentação positiva pode surgir de diferentes fontes, tais como economias de escala (os custos de produção por unidade produzida decresce quando a escala aumenta) e pela natureza cumulativa do conhecimento tácito (baseado no learning-by-using localizado). Além disso, a importância de redes de externalidades e complementaridades - quanto mais usuários detêm uma nova tecnologia, maior a disponibilidade e a diversidade de novos produtos vinculados e maiores as tecnologias complementares e instituições auxiliares geradas (como associações, centros de pesquisa, cursos etc.). CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 91 Entretanto a criação deliberada de uma nova trajetória tecnológica é muito pouco provável (exceto no campo militar, devido aos altos investimentos estratégicos). Basicamente porque esta resulta muitas vezes de descobertas surpreendentes e inesperadas (“serendipismo”), ou de um conjunto de decisões não coordenadas; e, também, devido às muitas decisões estarem distribuídas no tempo e no espaço (DOSI, 1988). Arthur (1989), afirma que pequenos eventos arbitrários, difíceis de se conhecer com antecedência, podem provocar sérias mutações nas estruturas. Nestas circunstâncias, é muito difícil planejar um novo caminho de desenvolvimento tecnológico ou organizacional. O significado é que, “acasos”, em combinação com “retornos crescentes”, implicam que múltiplos potenciais resultados são imagináveis e possíveis. O resultado é indeterminado e imprevisível devido a outros eventos arbitrários que podem forçar a história a tomar outro curso que aquele previsto. Ademais, os vencedores não necessariamente possuem qualidades superiores, há assim uma ineficiência potencial associada aos resultados do mercado. Uma vez que uma nova tecnologia se torna dominante, os mecanismos de “retornos crescentes” geram efeitos de travamento ou estagnação (lock-in) e “dependência da trajetória”, regulando os movimentos e resultados seguintes (DOSI, 1988). Neste processo, algumas vezes o “vencedor” nem sempre é “selecionado” pelo ambiente. Por exemplo, como destacado por David (1985), não houve otimização nem seleção na escolha do padrão de teclado QWERTY20 (para PC’s). Ele foi simplesmente escolhido. Processo semelhante tem acontecido com a escolha do padrão tecnológico de televisores digitais de alta resolução. De forma a sintetizar os conceitos apresentados anteriormente, algumas características distintivas da abordagem evolucionária foram resumidas no Quadro 3.1, apresentado a seguir. 20 O padrão QWERTY foi escolhido pela indústria em detrimento do padrão DVORAK, o qual, segundo experiências com digitadores, permitiria um desempenho na digitação entre 20 a 40% maior (Andersen, 2003). CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 92 Quadro 3.1 – Alguns aspectos gerais da abordagem evolucionária Fatores Mecanismos de regulação Questão que busca responder Unidade de análise Perspectiva analítica Principais temas abordados Variáveis de análise Elementos Variação, seleção, retenção, competição. Porquê, das variações que emergem no processo econômico, somente algumas são selecionadas? A firma, principalmente, mas considerando a influência do ambiente, e seus reflexos na indústria, cluster, complexos, região etc. Principalmente sistêmica e a posteriori, mas com ênfase no processo evolutivo histórico. A variação gerada através dos processos de busca local; O processo de seleção e os efeitos de condicionamento das metaheurísticas (por exemplo, os paradigmas tecnológicos); As características, capacidades e competências das firmas para adaptação à mudança e à expansão; As estruturas institucionais específicas e seus padrões de evolução. Diferenças entre posições das firmas, setores, indústrias. Principalmente, as que alteram a estrutura competitiva. 3.5 Considerações finais sobre o Capítulo Segundo a literatura evolucionária, a abordagem neoclássica não trata de forma satisfatória a diversidade microrregional e local, nem fornece meios para se captar a dinâmica tecnológica interfirmas e as contribuições próprias de firmas que geram diversidade técnica-organizacional. Nesse sentido, seus fundamentos teóricos não seriam consistentes para se abordar questões referentes ao processo de mudança tecnológica e a dinâmica de sistemas industriais locais, importantes para o desenvolvimento de certas microrregiões e localidades. Por outro lado, pela visão evolucionária, afirmar ou identificar os locais onde novas tecnologias terão seus principais impactos locacionais é incerto. Estratégias de desenvolvimento bem sucedidas em uma determinada região não necessariamente obterão o mesmo resultado em outras regiões. Dessa forma, um dos principais problemas para políticas regionais, de forma geral, é que as novas trajetórias de desenvolvimento não seguem necessariamente aqueles caminhos planejados, nem os aparentemente “mais prováveis”. Obviamente que esta imprevisibilidade é proporcional à complexidade e à dinâmica competitiva do sistema. Ou seja, o comportamento dos atores está sujeito a uma certa racionalidade, porém ela é limitada e dependente das características locais e específicas do ambiente em questão. CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 93 Neste Capítulo, apresentou-se uma síntese das características principais da abordagem econômica evolucionária e seus elos com as questões do desenvolvimento econômico. Buscou-se destacar a relevância de se abordar o processo socioeconômico e o desenvolvimento local através de uma abordagem evolucionária. Neste caso, uma questão estratégica está em se investigar até que ponto o futuro de uma região/microrregião/localidade pode ser determinado ou previsto, e como se avaliar a dinâmica do sistema, contornar as dificuldades envolvidas e direcionar investimentos públicos. Como vimos, agentes políticos executam um papel importante na dinâmica regional e local, cujas decisões devem ser voltadas para se criar e se sustentar um ambiente favorável ao surgimento de atividades econômicas variadas. Muitas microrregiões dispõem de oportunidades para melhorar seu ambiente local e atrair empreendedores e trabalhadores qualificados capazes de desenvolver novas idéias e atividades econômicas que podem se tornar núcleos de novo ciclo de desenvolvimento. Isto é especialmente válido para microrregiões altamente dinâmicas cujas economias de aglomeração e de urbanização oferecem vantagens de flexibilidade asseguradas pela diversidade de atividades que tendem a prevenir um processo de saturação. Conseqüentemente, políticas de desenvolvimento local têm mais possibilidades de sucesso quando seus objetivos estão fortemente vinculados às características do ambiente. Neste caso, há a necessidade de políticas específicas, afinadas com os recursos e as carências de cada microrregião. Desse modo, deve-se considerar principalmente a configuração das instituições locais na construção de redes de capacitação, através da conexão de firmas e outras instituições baseadas em conhecimento (universidades, centros de tecnológicos, laboratórios etc.), fortalecendo o processo de aprendizagem interativa e os padrões competitivos setoriais e locais. Todavia, políticas de desenvolvimento baseadas em princípios evolucionários, divergem de alguns princípios neoclássicos até então pouco questionados. Pela visão evolucionária, os agentes econômicos são vistos como “adaptadores” e não como “otimizadores”. Isto é atribuído ao fato de se assumir um ambiente complexo, no qual a racionalidade é limitada e a informação para a tomada de decisões ser imperfeita, ou não simétrica a todos os atores. Neste caso, algumas trajetórias de desenvolvimento não podem ser planejadas ou previstas pelos decisores. Por outro lado, pode-se afirmar, com uma certa CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 94 dose de certeza, onde determinadas atividades não vão ser localizadas. Em tais locais, alternativas próprias devem ser criadas, e para isso, é fundamental a atuação conjunta de órgãos de governo, entidades sociais, centros de tecnologia e de pesquisa. Além disso, os mecanismos de seleção não determinam isoladamente o sucesso ou fracasso de certas regiões em gerar e desenvolver novas tecnologias ou novas combinações. A intervenção humana (política) pode exercer um papel fundamental neste processo, principalmente para reverter ou atenuar efeitos negativos em ambientes fortemente afetados pela dependência da trajetória. Na visão evolucionária, o ambiente e os agentes humanos interagem em um processo dinâmico, com resultados futuros incertos. Entretanto, em casos onde as trajetórias estão defasadas em relação a outras regiões, com acentuado gap tecnológico, em um primeiro estágio, trajetórias de desenvolvimento de outras regiões podem servir de referencial para um processo de benchmarking e absorção de tecnologias mais avançadas, com considerações às características e especificidades locais e regionais. Neste contexto, as alternativas para políticas de estímulo a criação de variedade e de determinação de desenvolvimento futuro estariam de certa forma limitadas, levando a questões para as quais dificilmente há respostas gerais: Quando as alternativas de adaptação são limitadas pelas fronteiras históricas do sistema, é possível mudar o curso do desenvolvimento microrregional para uma trajetória de sucesso? De que forma? Como, por exemplo, evitar uma situação de saturação ou estagnação, causadas pela dependência da trajetória local? Como construir uma rede de capacidades (conforme amplamente sugerido na literatura) em regiões periféricas, cuja inércia institucional e a falta de confiança são mais regra do que exceção? Como proceder para tornar mais capazes os decisores para avaliar o grau de adequação e os efeitos das interações entre os aspectos regionais/locais, mudança tecnológica e desenvolvimento? Responder a estes questionamentos constitui um dos principais desafios para o desenvolvimento econômico evolucionário no futuro próximo. Nesse sentido, um passo crucial é a criação e adoção de ferramentas de abordagem de sistemas produtivos locais que permitam visualizar seu comportamento de forma realista, captando especificidades e elementos de diversidade, não tratando como unidade o que é fragmentado, heterogêneo e difuso. CAPÍTULO 3 - PARA UMA ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA DINÂMICA COMPETITIVA EM APL’S 95 Contribuições a essas, e a outras questões vinculadas, podem servir de “luzes guia” para um tratamento mais efetivo de elementos do desenvolvimento local e da competitividade interna de arranjos produtivos locais não captados pela abordagem mainstream. A partir dessa revisão da teoria evolucionária, a proposta desse trabalho é adotar uma abordagem da competitividade não como um meio eficiente de adaptação ao meio e uma forma de predizer o futuro, mas principalmente como uma forma de se captar, explorar e caracterizar as diversidades e ineficiências inerentes ao processo competitivo, através de uma perspectiva de se entender a “engenharia da competitividade” em arranjos locais. Dessa forma, no próximo Capítulo o foco centra-se na busca e definição de uma unidade de análise do comportamento da firma que represente ao mesmo tempo: (i) um elemento de ligação entre fatores endógenos e exógenos, entre o específico e o geral e, conseqüentemente; (ii) um parâmetro de comparação que expresse o desempenho da firma, se refletindo na competitividade coletiva do respectivo arranjo produtivo local. CAPÍTULO 4 ROTINAS ORGANIZACIONAIS, TRAJETÓRIAS TECNOLÓGICAS E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” Resumo Neste Capítulo, os conceitos evolucionários apresentados no Capítulo anterior, são combinados com conceitos da teoria comportamental e da competência da firma para o desenvolvimento de uma abordagem evolucionária da dinâmica competitiva em arranjos produtivos locais. Pela abordagem desenvolvida, essa dinâmica é dependente do nível de recursos e do desempenho de cada indivíduo (firma), os quais, condicionam seus respectivos comportamentos. Estes, por sua vez, são influenciados por uma série de fatores internos e externos, entre os quais, a sua capacidade de transformar recursos, habilidades e capacidade em competências e de tomar decisões estratégicas para sua sobrevivência e desenvolvimento. Entretanto, tais decisões ocorrem em vários níveis, desde aquelas mais freqüentes do dia-a-dia, até outras, eventuais, mas que podem alterar a competitividade e a sobrevivência futura da firma. Internamente, o conjunto de regras, procedimentos, rotinas e os vários padrões de comportamento, carregam as impressões e os “caracteres” que podem revelar à verdadeira fonte de vantagens que a firma dispõe e emprega no jogo competitivo. Nesse sentido, considera-se que a identificação de padrões de comportamento, embutidos em tais elementos intrínsecos à firma, é um meio consistente de se entender e se captar os reais valores competitivos e, ao mesmo tempo, um parâmetro representativo para análise competitiva e o estudo do sistema. A partir dos conceitos de dependência da trajetória, trajetória tecnológica, rotinas e do comportamento das firmas em arranjos produtivos locais, ao final, introduz-se o conceito de “trajetória competitiva”. CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 97 4.1 Introdução O comportamento da firma tem como elemento-chave os recursos humanos que, através da realização de diferentes atividades e de diversas interações, adquirem habilidades específicas e desenvolvem competências próprias, caracterizando um comportamento adaptativo de luta pela sobrevivência em um ambiente seletivo. Ao longo do tempo, este processo cria um tipo de “herança genética organizacional”. Por outro lado, certas firmas podem também influenciar a mudança de certas características do ambiente. Assim, a amplitude de variações dessas características fica limitada a um certo conjunto de alternativas “selecionadas”. Aquelas firmas que as possuem, ou que mais rapidamente conseguem incorporá-las, adquirem vantagens competitivas frente aos concorrentes, se colocando como as “mais prováveis” de obter sucesso. Esse processo (evolucionário) não é determinístico. O que é determinado, principalmente devido aos efeitos da dependência da trajetória, é a distribuição de probabilidade de mudança para outras trajetórias, em um certo período de tempo (NELSON & WINTER, 1982). Nesse sentido, é assumida uma certa capacidade de antecipação, uma racionalidade limitada (à la Simon, ver MARCH, 1988; FRASMAN, 1998). Assim, a capacidade de antever as trajetórias mais adequadas tende a crescer proporcionalmente com o número de rotinas na execução de atividades internas dos agentes. Coase (1937), já destacava a importância da redução de incertezas como objetivo de todo empresário ao investir em mais e melhores modos de organizar as firmas. Para Penrose (1959; 1995), a firma constitui-se a partir de dois pilares básicos, que são, uma coleção de recursos produtivos (físicos e humanos) e uma organização administrativa, para implementar e aperfeiçoar produtos e serviços oferecidos aos consumidores. Nesses termos, o aumento de atividades realizadas segundo uma certa rotina, possibilita maior eficiência na utilização dos recursos e facilita a administração dos procedimentos organizacionais, contribuindo para o aumento da capacidade da firma em adotar novas rotinas. Sob a denominação genérica de “rotina” pode ser encontrada na literatura uma ampla gama de conceitos, entre os quais: “um modo de fazer as coisas”, regras de decisão, técnica, procedimentos operacionais, habilidade, prática, programa e política gerencial, sistema de informação, estratégia, roteiro, entre outros (ver, por exemplo, CYERT & MARCH, 1963; NELSON & WINTER, 1982; COHEN et al., 196; REYNAUD, 2000; CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 98 BECKER, 2001). Ao longo do texto, é desenvolvida uma concepção de rotina mais apropriada ao escopo deste trabalho. 4.2 Tipos de problemas organizacionais Um “problema organizacional” é um fator negativo que impede a firma de atingir seus objetivos ou de atender uma certa demanda sem incorrer em prejuízos ou prejudicar seu desempenho. Nesse sentido, fatores que atrapalhem a execução de rotinas são problemas. A solução de tais problemas envolve restabelecer os padrões normais, ou seja, as rotinas. De acordo com Zawislak (1994), os problemas do âmbito interno da firma podem ser de três tipos: relativos ao projeto, relativos ao produto e relativos ao processo. Os problemas de projeto, ou “agenda de pesquisa”, são todos aqueles ligados à definição do produto (protótipos) e do respectivo processo produtivo, desde os métodos até a disponibilidade de matéria-prima, passando pela adequação da mão-de-obra, a elaboração das ferramentas, a aquisição das máquinas (por compra ou fabricação) etc. Nesse processo, para se atingir um nível “aceitável” do projeto, barreiras técnicas e organizacionais deverão ser enfrentadas e superadas, o que pressupõe a definição de rotinas adequadas para se alcançar metas e objetivos dentro de um cronograma previamente definido. Os problemas de produto referem-se ao nível de solução imediata de problemas. Incluem problemas que aparecem durante a fabricação do produto ou quando o produto já foi lançado no mercado. O problema de produto que aparece durante o processo produtivo é basicamente aquele que foge da rotina, mas que está incluído no espectro de “problemas de rotina” previstos pela atividade de projetos. Trata-se de um tipo de problema que não exige retorno à etapa de projetos, pois pode ser resolvido in loco no chão-de-fábrica. É o caso da matéria-prima inadequada, das falhas humanas, dos problemas causados pelas máquinas e ferramentas, e demais exemplos que necessitam de um esforço de retrabalho. O problema de falta de controle de qualidade no produto, em muitos casos, só é percebido após as vendas, o que pode representar custos de fracasso e comprometer a imagem da empresa (ver, por exemplo, RUSSEL & TAYLOR III, 1999). Finalmente, os problemas de processo são aqueles que exigem um verdadeiro esforço de resolução de problemas, diferente da solução de rotina, pois envolvem CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 99 problemas que ainda não foram previstos. Certamente, existe também um espectro de problemas de processo que são transformados em rotina (e.g., substituição de peças gastas em máquinas, realimentação, manutenção, paradas etc), mas são aqueles que surgem de modo inesperado que acabam por exigir o esforço maior de resolução. Este tipo de problema tende a bloquear o processo sem que se tenha uma noção exata do retorno à normalidade, ou seja, à rotina. A correção se faz fora da ação e das normas de correção de problemas. Geralmente trata-se de uma atividade que envolve o elemento diretamente ligado ao problema, ou seja, quem o identifica, além de elementos auxiliares (como mecânicos, mestres, técnicos) que contribuem na interpretação e identificação da melhor solução e das correções apropriadas. Segundo Zawislak (1994), grande parte dessas soluções são encontradas sem a necessidade de se mobilizar toda a estrutura formal da firma. É neste nível que, em casos de ausência da atividade de P&D, se tem o maior fluxo de soluções de sucesso para serem adicionadas às rotinas das firmas. Empresas, setores e países com déficit na atividade de P&D sustentam o fluxo de novas soluções apoiados nessa atividade de resolução de problemas, as quais, são conduzidas pelos próprios elementos humanos diretamente ligados ao processo produtivo. Estas, mesmo não se convertendo em fluxo de novos conhecimentos e novas habilidades, garantem o funcionamento da tecnologia em uso com adaptações próprias e mudanças incrementais. Lazonick (1992) explica este processo de resolução de problemas através da atividade de levar a produtividade de um sistema, com uma certa tecnologia, ao seu limite máximo, o que pode resultar no “esgarçamento” dos recursos e em sobretensões na força de trabalho. Devido à importância da atividade de transformação de problemas em rotinas, a atividade de resolução de problemas (e de inovação lato sensu), pode ser considerada como parte do conjunto que forma o verdadeiro motor do crescimento capitalista (BOYER, 1989). 4.3 Rotinas como unidade de análise competitiva entre firmas Para o estudo da organização econômica, existem vários conceitos e teorias, cada qual como uma visão particular da firma, através da ênfase em aspectos específicos, adotando para isso uma unidade de análise característica. Simon (1957 apud WILLIAMSON, 1998), por exemplo, considerava o conceito de “premissa de decisão” CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 100 como parâmetro fundamental de análise. Para a corrente denominada “economia dos direitos autorais e de propriedade”, a unidade de análise mais representativa é a “apropriabilidade”. A organização industrial adota a “indústria” como parâmetro de análise através da abordagem estrutura-conduta-desempenho. O “indivíduo” tem sido assumido como unidade de análise na “teoria da agência”. A “teoria dos custos de transação” toma os diversos tipos de transação (formais e informais) entre as firmas como unidade básica de análise (WILLIAMSON, 1998). Para a teoria evolucionária proposta por Nelson & Winter (1982), a unidade de análise são as “rotinas organizacionais”. A unidade de análise deve ser compatível com a base teórica e a respectiva abordagem adotada, considerando-se suas dimensões críticas e fatores específicos. O Quadro 4.1 apresenta um resumo comparativo entre as unidades de análise anteriormente mencionadas. Quadro 4.1 – Comparação entre unidades de análise da firma Unidade de análise Dimensões críticas Problema focal Premissa de Decisão Papel, informação, idiossincrasias Relacionado a RH Apropriabilidade Onze características específicas Externalidades Indústria Concentração, barreiras de entrada Margens custo-preço Indivíduo Não declarada Incentivos Transação Freqüência, incerteza, ativos específicos Integração vertical Rotina Aprendizagem e mudança Comportamentos e interações Fonte: baseado em Williamson (1998, p. 37) Diferentemente da abordagem taylorista da “rotina no trabalho”, um conceito estático, Nelson & Winter (1982) adotaram um conceito dinâmico-evolutivo de rotina, segundo o qual, as rotinas constituem um tipo de memória com que as firmas armazenam conhecimento. Assim, uma rotina pode ser definida como “um padrão repetitivo de CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 101 execução de tarefas e procedimentos para a solução de um determinado tipo de problema, que no processo de aprendizagem, vai sendo incorporado e adaptado à estrutura das organizações através execução do trabalho dos indivíduos”. Em Nelson & Winter (1982), o conjunto de rotinas de uma firma é visto como uma impressão genética (técnicas e procedimentos recorrentes), a partir da qual, a firma é capaz de adaptações ao ambiente, segundo suas necessidades de sobrevivência em um determinado nível de funcionamento e qualidade. De acordo com tal conceito, as rotinas podem ser divididas em três tipos básicos, que são as rotinas de operação, de decisão e de inovação, as quais podem ser caracterizadas da seguinte forma: Rotinas de Operação – envolvem a produção, administração e processo de vendas, relativas à articulação da capacidade tecnológica da firma, que se refletem nos custos unitários de produção, na produtividade do processo e na qualidade dos produtos; Rotinas de Decisão – englobam as decisões de investimento e alocação de recursos, métodos e técnicas de tomada de decisão que refletem as estratégias de comportamento da empresa frente aos concorrentes; Rotinas de Inovação – compreendem as estratégias e a forma de agir da empresa orientadas para o melhoramento das rotinas anteriores, através da inovação e imitação. As rotinas deste tipo interagem entre si e com as demais. Como visto no Capítulo anterior, na literatura evolucionária, a analogia com o sistema biológico serve como referencial do ambiente e de comportamento da firma. Entretanto, as semelhanças encontram limite na questão do “instinto de sobrevivência”. Em termos biológicos, “tentar sobreviver” significa uma “reação natural”, e por isso, previsível. Porém, o ato de sobreviver no indivíduo racional (homem) e, por conseqüência, para as firmas, envolve escolhas (políticas, estratégicas etc.), com base em atributos característicos da natureza e da inteligência humanas (CYERT & MARCH, 1963; NELSON & WINTER, 1982). A situação característica de fazer uma escolha surge paralelamente à situação de enfrentar algum tipo de problema, como as alternativas de saída de uma certa rotina, ou uma mudança necessária em alguma técnica empregada. Uma vez que a firma tem poder CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 102 sobre suas rotinas, ela pode modificar e adaptar seus conteúdos, tornando-as compatíveis com as mudanças do ambiente externo. Neste ponto, a questão de como tratar a tecnologia envolve aspectos endógenos e exógenos à firma, e a teoria evolucionária é perfeitamente compatível com as características desse modelo, oferecendo subsídios e riqueza de conceitos para fundamentar o entendimento e a análise da dinâmica desse sistema. Em função de uma escolha (de uma solução), indivíduos e firma levam consigo os “traços” de um processo que lhes dará características específicas para o desempenho de suas atividades (uma certa “herança genética”). Logo, o contínuo processo de resolução de problemas leva a determinadas escolhas que, por conseqüência, delineiam os contornos dos comportamentos de um indivíduo e de grupo de indivíduos (firma), condicionando assim as bases específicas para a definição de rotinas (técnicas) particulares. Cada firma, face aos diferentes problemas, faz uma escolha que é fortemente baseada em suas experiências e escolhas passadas (dependência da trajetória) e em suas expectativas futuras (intuição). Estas características e expectativas são, geralmente, aquelas de um comportamento dominante dentro da firma (paradigma). Neste ponto, a teoria evolucionária encontra total acordo com a teoria do comportamento da firma (ver CYERT & MARCH, 1963). Quanto mais uma firma for pressionada a “escolher”, mais ela estará sendo forçada a resolver problemas, o que significa realizar adaptações e, em última instância, inovações. O processo de resolução de problemas e, por conseqüência, o processo de inovação, é uma característica que irá se mostrar diferente de uma firma para outra, caracterizando a lógica do mecanismo de seleção. Cada firma (como um grupo interativo de seres humanos) tem um modo diferente de resolver problemas, adotando procedimentos próprios. Estes, algumas vezes levam ao sucesso, outras não. Algumas tomam uma direção e atingem uma certa posição de destaque, enquanto outras, na mesma direção não conseguem se destacar, ou tomam uma trajetória diferente. Informações, interpretações e conhecimentos diferentes levam a comportamentos distintos. Logo, o que se tem é a existência de uma racionalidade limitada, escolhas equivocadas (imperfeitas), resultando em diversidade e histórias individuais específicas (SIMON & MARCH, 1958; NELSON & WINTER, 1982; MARCH, 1988; FRASMAN, 1998). Dosi (1991) apresenta uma sistematização do processo descrito anteriormente através de conceitos da teoria evolucionária de mudança técnica e organizacional, CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 103 fortemente influenciado pelos autores descritos no parágrafo anterior. Seus fundamentos podem ser resumidos da seguinte forma: (i) O sistema assiste à persistente emergência de inovações, isto é, à aplicação de novas soluções técnicas em produtos, processos e organizações. Desta forma a tecnologia é considerada como sendo uma variável parcialmente endógena às firmas. (ii) A busca de novas soluções é também endógena e contínua (“mutação”). Isto implica, para cada firma, um empecilho para atingir um mesmo e único estado geral de equilíbrio, pois as oportunidades de pesquisa e as soluções dificilmente serão as mesmas de uma firma para a outra, dadas as diferentes competências e história (“herança genética”) de cada uma. (iii) O sistema envolve processos descentralizados de sucessos e de fracassos (na busca e aplicações de novas soluções) entre as firmas: trata-se de um conjunto de descobertas úteis e inúteis, de tentativa e erro, de aprendizados produtivos e improdutivos e várias formas de competição que acabam por recompensar, ou punir, agentes heterogêneos (“seleção natural”). (iv) O sistema é, assim, caracterizado pela interação destes agentes heterogêneos. Disto resulta uma provável regularidade de evolução do sistema, explicada pelo conjunto dos comportamentos destes agentes. O modelo acima descrito reconhece a existência de sistemas que exibem evolução não linear e caminhos dinâmicos múltiplos (DOSI et al., 1994). A partir de um sistema econômico referencial, os setores que o compõem apresentarão comportamentos produtivos e de resolução de problemas diferenciados e localizados; mesmo que os contornos de cada setor sejam os de um mesmo paradigma tecnológico. Os fatores que, segundo a teoria evolucionária, justificariam a heterogeneidade entre as firmas são a habilidade, o aprendizado e a rotina. O mecanismo que as interliga é apresentado por Nelson & Winter (1982) de forma bastante simples. A partir de uma dada habilidade, um indivíduo qualquer (e, por substituição, uma firma) estará, ou não, apto(a) a realizar uma atividade. Se não estiver, deverá adquirir o conhecimento mínimo necessário para realizar a atividade, ou seja, deverá aprender. Possuindo as capacidades para realizar a atividade, poderá executá-la segundo um roteiro prescrito de ações e reações. Com o CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 104 tempo, este roteiro terá sido transformado em uma rotina pelo indivíduo (ou pela firma), que executará suas devidas tarefas de modo recorrente desprendendo menos energia (menor esforço mental). Porém, como foi mencionado anteriormente, existe um volume permanente de fatores aleatórios e imprevistos que vêm de encontro a tal processo. Nestes momentos, o indivíduo, ou a firma, sofre pressões para sair da rotina e, conscientemente, tentar contornar o fator aleatório. Com o tempo, um determinado conjunto desses fatores também poderá ser transformado em rotinas e incluído no roteiro de execução da atividade. Existirá sempre, porém, para cada sistema, um determinado volume de fatores que continuará sendo aleatório e imprevisto, e que posteriormente poderá ou não ser transformado em rotina. Fatores aleatórios sempre ocorrerão, porém em graus variados de imprevisibilidade. O grau de imprevisibilidade de cada problema varia em função do conjunto de conhecimentos específicos dominado através de eventos passados (memória) e da capacidade criativa intrínseca a cada agente (NELSON & WINTER, 1982; DOSI, 1988). Este mecanismo de transformar um fator aleatório em uma rotina nada mais é do que o processo de aprendizado, de acúmulo de novos conhecimentos tácitos, competências qualificações, que acontece no chão-de-fábrica (on-the-job)1 e que integra novas soluções à rotina dos indivíduos e, por conseqüência, o conjunto de rotinas (técnica) das firmas. As diferentes qualificações dos recursos humanos constituem a “memória”, a competência produtiva da firma. Neste sentido, elas são uma espécie de “depósitos de conhecimentos” (WINTER, 1994). O conjunto de conhecimentos diferentes dá corpo ao “conhecimento técnico da firma como entidade organizada e não reduzida ao que cada um dos seus indivíduos sabe (...)” (NELSON & WINTER, 1982, p.63). A essência da heterogeneidade entre as firmas está no fato de nenhum agente ser perfeitamente racional, devido à impossibilidade de se formar um padrão geral, rígido, universalmente aceito, para tratar de forma genérica processos formados localmente através de ilimitadas contribuições e experiências individuais. Logo, stricto sensu, nenhuma firma possui um capital humano idêntico ao de outra. Sendo assim, não só o volume de competências individuais que compõe a competência da firma será diferente, mas também seu processo de aprendizado. Dessa forma, mesmo para dois processos 1 Um aprendizado caracterizado pelo acúmulo de experiências adquiridas pelo trabalhador e pela organização com a sucessiva realização da atividade produtiva e da interatividade (ZAWISLAK, 1994). CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 105 inicialmente idênticos (por exemplo, supondo duas firmas que adquiriram as mesmas máquinas e organizaram a produção exatamente como prescrito no manual do fabricante), as rotinas que serão incrementadas com o desenrolar das atividades, serão diferentes e específicas a cada um deles. Em outras palavras, uma mesma técnica, adotada por duas firmas, com o desenrolar do processo de competição e sobrevivência de cada uma delas sofrerá modificações, resultando em rotinas potencialmente diferentes (DOSI et al., 1994). A atividade de solução de problemas nas modernas sociedades industriais se apresenta de diferentes formas e em diferentes graus de complexidade, notadamente, na forma de atividade formal de inovação, descrevendo assim diferentes níveis de capacitação tecnológica e trajetórias de resolução de problemas. Nesse caso, “inovação” é entendida como “solução de um problema”, o que implica em assumir “problema” como “tudo aquilo que impede um agente ou uma organização qualquer de atingir, dentro de um ritmo esperado, seus objetivos”. Nesse processo, tais problemas são tratados de acordo com sua relevância no processo produtivo e seu grau de risco para a atividade, o que envolve atividades objetivas e subjetivas. A atividade de “resolução de problemas” em uma firma é uma atividade subjetiva que visa encontrar novas e melhores formas de realizar a atividade objetiva que é constituída por rotinas. O resultado positivo desta atividade de resolução de problemas é a solução propriamente dita ou, mais especificamente, a criação de uma nova rotina, um novo método, um novo objeto técnico que traga implícita a possibilidade de resolução do problema antes observado (ZAWISLAK, 1994). Pela própria abordagem de Nelson & Winter (1982), a atividade de resolução de problemas pode ser vista como a atividade específica e deliberada para fazer evoluir o conjunto de rotinas, ou seja, a técnica. Nestes termos, o mecanismo de funcionamento de toda e qualquer atividade de resolução de problema é a essência de todo e qualquer tipo de atividade de inovação nas técnicas empregadas. Nesse sentido, nem todo processo de resolução de problemas stricto sensu é um processo de inovação lato sensu, mas todo o processo de inovação stricto sensu (e.g., P&D) pode ser considerado como um processo de resolução de problemas lato sensu. Ademais, o processo de inovação lato sensu pode ser considerado como um processo de resolução de problemas lato sensu. Novas soluções (adaptações e/ou melhoramentos), guardadas as devidas proporções, podem ser vistas como inovações. Se uma nova solução, por menor que tenha sido o problema, for de sucesso, ela terá incrementado um plus de CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 106 qualidade à técnica original (ZAWISLAK, 1994). Neste sentido, existem “inovações” mesmo em ambientes informais de resolução de problemas (por exemplo, empresas com processo rudimentar). Pode-se dizer que toda atividade produtiva, mesmo que subjetiva, subentende a aplicação consciente de conhecimentos acumulados para atingir um resultado esperado. Em um processo qualquer, para que um indivíduo (ou uma firma) seja considerado capaz de executar uma tarefa, ele deverá possuir uma certa habilidade. Para Nelson & Winter (1982), a habilidade é “a capacidade de realizar uma seqüência de comportamentos coordenados que é normalmente eficaz com relação aos seus objetivos, dentro de um contexto que normalmente se repete”. Dessa forma, a habilidade está vinculada diretamente com a idéia de “técnica”, constituída a partir da experiência de enfrentamento de algum tipo de desafio de caráter rotineiro (não aleatório). Nelson & Winter (1982) consideram três características associadas à idéia de habilidade que podem ser atribuídas à técnica e ao estabelecimento de rotinas: (a) Por se tratar de uma “seqüência de comportamentos coordenados”, toda habilidade pode ser programada (adquirida em um nível mínimo, por exemplo, através de treinamento2); (b) Além dos conhecimentos mínimos necessários para realizar uma atividade, ter habilidade subentende a existência de conhecimentos tácitos, adquiridos com a prática; (c) A construção de uma habilidade supõe a existência de escolhas feitas e por fazer. Segundo Zawislak (1994), o paralelo entre habilidade e técnica serve para melhor ressaltar o mecanismo de progresso das habilidades, das técnicas e do próprio processo de resolução de problemas e inovação. A dinâmica de acúmulo de habilidades é contínua e diretamente originada do processo de resolução de problemas específicos de toda e qualquer atividade produtiva. Na medida em que a habilidade evolui, a técnica também evolui, pois a habilidade, na forma de rotina, incorpora soluções de sucesso ao método e/ou aos objetos técnicos, o que fecha um ciclo de aprendizagem organizacional (NELSON & WINTER, 1982). 2 Aqui não é mencionado, mas subentende-se que exista um caráter idiossincrático na habilidade, o talento individual, como traço da “herança genérica organizacional”, que limita tal programação. CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 107 Em suma, toda atividade produtiva pode ser entendida como um processo de aprendizado, formal e codificado (volume mínimo de conhecimento que habilita a execução da atividade de modo eficiente) e informal e tácito (parcela de conhecimento memorizado, característica de cada indivíduo que o diferencia na execução de atividades supostamente idênticas), que será realizado através de uma rotina. A cada rotina, corresponde um determinado volume de problemas, mais ou menos estáveis e freqüentes, mas com variáveis imprevisíveis. Logo, o controle de cada problema envolve encontrar novas soluções, as quais, uma vez aplicadas com sucesso, implicarão em um processo de aprendizado e, posteriormente, em novas rotinas. Este é o mecanismo central da atividade de resolução de problemas, da evolução das habilidades, das técnicas organizacionais e, das rotinas (ZAWISLAK, 1994). A Figura 4.1 mostra uma ilustração de tal processo, quando observada da esquerda para a direita. Figura 4.1 - O mecanismo da atividade de resolução de problemas/atividade de inovação (reproduzida de Zawislak, 1994) Na referida Figura, este mecanismo pode também ser visto sob uma ótica diferente. Supondo que haja demanda para solução de algum problema futuro (i.e. a inexistência de um produto ou de um processo, previsão de alguma falha em um processo ou da falta de matéria-prima), uma primeira iniciativa seria montar um plano de tratamento do problema, definindo métodos e objetos, ou seja, uma forma de rotina. O aprendizado organizacional, por conseqüência, surge da freqüência de execução dessa rotina e de sua difusão coletiva aos agentes do processo de produção. CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 108 Com a inversão no sentido desse mecanismo de resolução de problemas, ocorre um processo ex-ante de resolução de problemas que é o chamado processo de inovação stricto sensu, ou inovação tecnológica formal (realizada em departamentos de engenharia e P&D nas empresas). Dessa forma, é que se dá a construção de uma atividade deliberada de inovação, não só para resolver, mas principalmente para prever problemas. Investir nesse mecanismo pressupõe um nível de organização e assimilação de funções e atividades da organização que envolve a existência da atividade de resolução de problemas stricto sensu (ZAWISLAK, 1994). Esta é uma visão particular da micro-dinâmica da inovação, caracterizada pela interação de mecanismos science push/technology pull (ver, por exemplo, ROSENBERG, 1982; MOWERY & ROSENBERG, 1989). 4.4 Aprendizado e adaptação O aprendizado pelas próprias firmas engloba os diversos processos pelos quais os conhecimentos científicos e empíricos mínimos e as habilidades são adquiridos e dominados pelos indivíduos (KING, 1984). Segundo Dosi et al. (1994) “o aprendizado é um processo pelo qual a rotina e a experiência permitem a realização das tarefas de um modo cada vez mais rápido e melhor, que possibilita a identificação das novas oportunidades de produção” (p.191). O aprendizado pode se dar de duas maneiras, segundo o tipo de conhecimento requerido. Segundo Nelson (1990), tal aprendizado pode ser prático, do tipo informal, como por exemplo, aqueles adquiridos on-the-job (learning by doing), ou formal, quando obtido em escolas, universidades, treinamentos, estágios, pesquisas e interações (learning by searching, by interacting, by learning). Na essência deste mecanismo está, obviamente, o processo de resolução de problemas onde, com base nos conhecimentos acumulados, os indivíduos são levados a tomar decisões, ou seja, a fazer escolhas para manter o processo em funcionamento e, com isso, a acumular novos conhecimentos através de uma relação contínua entre estoque e fluxo de conhecimentos. Como resultado da soma dos aprendizados informais e formais dos recursos humanos vinculados à firma e transformados em procedimentos técnicos e organizacionais, cada firma pode adicionar uma contribuição própria à “tecnologia” adquirida CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 109 externamente. Nesse sentido, “o aprendizado pode ser entendido como toda e qualquer contribuição de uma firma que aumente sua capacidade de utilizar e realizar mudanças em técnicas, métodos e práticas em uso” (BELL, 1984, p.189). Fica evidente pois, o caráter evolucionário e heterogêneo dos agentes (indivíduos e firmas), onde “cada processo de modificação particular é específico, principalmente quando visto como expressão de um aprendizado que possibilita aos recursos humanos mobilizados adquirirem progressivamente novas competências e qualificações” (AMENDOLA & GAFFARD, 1988, p.XI). 4.5 Mudança de rotinas No processo produtivo de uma firma existe uma grande quantidade de fatores que são plenamente conhecidos, outros que são de freqüência conhecida e aqueles que são desconhecidos e, portanto, eventos que envolvem incerteza. Logo, há a necessidade de um tratamento especial desses fatores, para eliminá-los ou reduzi-los a um nível aceitável ao funcionamento normal da firma. Devido à incerteza, não é possível que se tenha pleno e total conhecimento dos rumos a serem seguidos pela firma e, por conseqüência, quais técnicas e métodos a serem antecipados. Assim, é impossível se prever com total exatidão quais serão as trajetórias de aprendizado e de solução de problemas que uma firma adotará. Nesse sentido, as rotinas delineiam uma determinada trajetória passo a passo. Em outras palavras, as rotinas se tornam mais completas, à medida que elas sistematizam as respostas às ocorrências aleatórias, reduzindo a distribuição de freqüência das incertezas. Nesse sentido, quanto maior for o volume de rotinas em uma certa trajetória, maior a probabilidade dos problemas freqüentes serem resolvidos com sucesso. Segundo Zawislak (1994), uma vez que uma rotina tenha sido estabelecida, abre-se espaço para a solução de problemas não previstos, desconhecidos. Uma rotina é estabelecida no processo de transformação gradual de uma variável aleatória em um fator específico (com variância conhecida), permitindo sua memorização e posterior aplicação repetitiva. A redução de variabilidade de erros no processo produtivo é um exemplo prático dessa atividade, no qual, causas especiais de desperdícios, devem ser eliminadas e as causas comuns, reduzidas ao máximo (ver, por exemplo, RUSSEL & TAYLOR III, 1999). CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 110 Na análise da “natureza da firma” (COASE, 1937; FRASMAN, 1998; GRANOVETTER, 1999), a criação de rotinas, com soluções de sucesso, seriam alternativas para contornar os custos transacionais, reduzindo “atritos” e contribuindo para a organização formal da firma. Nesse sentido, rotinas são os “caminhos de interação que representam soluções de sucesso para problemas específicos” (DOSI et al., 1994, p.191). Com o desenvolvimento desse processo, surgem novos problemas que deverão ser enfrentados e resolvidos. Logo, a rotina vai evoluindo com o acréscimo de novas variáveis, cujas variâncias passam também a ser conhecidas. Enfim, com as novas rotinas, a organização e a tecnologia da firma evoluem, o que resulta na própria evolução da firma. Apesar do reconhecimento do seu importante papel dentro das organizações, pesquisas empíricas sobre rotinas são muito recentes na literatura científica. De acordo com Becker (2001), somente a partir da década de 90 (ver WEICK, 1990 apud BECKER, 2001) é que surgiram os primeiros trabalhos empíricos tocando aspectos conceituais de rotinas (ver, por exemplo, COHEN & BACDAYAN, 1992; PENTLAND, 1994; PENTLAND & RUETER, 1994). “Como as rotinas influenciam o desempenho das organizações?” e “Quais os aspectos relevantes para serem tomados como critérios de seleção para futuras pesquisas?” Em termos metodológicos, estas são, entre outras, questões a serem respondidas com base em estudos empíricos (BECKER, 2001). A importância do conceito de rotinas foi destacada em um recente trabalho empírico demonstrando as diferenças de desempenho entre firmas (KNOT & MCKELVEY, 1999). Nesse trabalho foi feita uma comparação de rotinas entre diferentes firmas franqueadas e os padrões exigidos pelo franqueador. Os resultados mostraram que naquelas firmas em que os gerentes buscaram gerar, selecionar, incorporar e exigir rotinas superiores (funções de produção), com adaptações próprias, a eficiência era maior do que naquelas naquelas firmas que buscaram seguir um único padrão de recomendações passado pelo franqueador, e que as prescrições para maximização da eficiência através do desenvolvimento de rotinas operacionais podem oferecer mais possibilidade de sucesso do que exigências e incentivos de alinhamento aos padrões do franqueador. Uma série recente de casos de estudo em diversos setores da economia concluem que as rotinas são um valioso conceito para o entendimento do processo de mudança técnica nas organizações (ver, por exemplo, COSTELLO, 2000; BECKER, 2001), e que CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 111 podem servir como uma unidade de análise útil para comparações do desempenho entre firmas. 4.6 Comportamento e competição Uma firma, como agente de negócios, assume riscos na tomada de decisão na alocação de recursos, e para sobreviver ou crescer perante as condições impostas pelas mudanças no ambiente (mercado), apóia-se em suas vantagens competitivas baseadas em recursos e estratégias. Desse modo, a firma sofre pressões para se engajar em um processo de busca por novas soluções, reavaliando e adequando sua estrutura interna para absorver novas capacidades e habilidades (técnicas, rotinas, processos etc), para competir pela conquista das oportunidades geradas pelas mudanças através de novas soluções (produtos e serviços) (NELSON & WINTER, 1982). Nesse processo competitivo e adaptativo (evolucionário), o êxito da firma é manifestado através de suas conquistas e vantagens obtidas frente aos concorrentes. Como um processo evolucionário, as propriedades estatísticas da população de agentes do sistema são afetadas pela freqüência e evolução na mudança de seus comportamentos, que alteram a estrutura do sistema (METCALFE, 1998). Dessa forma, sua evolução pode ser avaliada através do estabelecimento de determinadas “regras de comportamento” (ALCHIAN, 1950) ou “regras de decisão” (CYERT & MARCH, 1963: 121-135). O conceito de “concepção populacional” oferece uma boa distinção entre a abordagem evolucionária moderna e as teorias de seleção lamarckiana tradicionais. A base da “concepção populacional” contém implícita a idéia de que processos determinísticos surgem de mudanças estatísticas. Conseqüentemente, não é uma teoria probabilística, mas uma teoria de como pontos dispersos de uma distribuição estatística evoluem no tempo sob pressões do ambiente (MAYR, 1959 apud METCALFE et al., 2000). Tais momentos não são representativos de qualquer indivíduo, mas sim da sua porção relativa na população. Dessa forma, eles são um conjunto descritivo agregado construído a partir de dados sobre toda a população. Tal visão não é compatível com variações estocásticas nas características das diversas entidades envolvidas, muito menos com o funcionamento do processo de seleção. Nesse sentido, não se deve considerar as vantagens acumuladas no processo CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 112 seletivo com o decorrer do tempo como características distribuídas pela média da população. Essa visão leva em conta a existência de variabilidade nas características dentro da população, reforçando as noções de mudança e diversidade. Nesse caso, a diversidade é fruto do escopo de variedade, que contribui para o processo de evolução, e não como um complicador, como no conceito lamarckiano/darwiniano. De acordo com Metcalfe (1998), nessa visão, a atenção se volta para a variedade de características dentro da população e, no ritmo tipológico, pois variedade não é um nuisance (empecilho) que esconde a realidade. Assim, a distribuição de variedade na população, que é a condição para o processo de mudança, adaptação e evolucão, é o que importa. Entretanto, essa abordagem menospreza a diferença de adaptabilidade entre os agentes. Se todos os agentes forem perfeitamente adaptáveis em todos os estratos da população não haveria escopo para o processo de seleção, pois os agentes se adaptariam de forma idêntica, ajustando seus comportamentos de acordo com as imposições do ambiente. Este ponto evidencia uma clara distinção de abordagem com relação aos métodos de classificação do processo competitivo baseados em conceitos neoclássicos (METCALFE, 1998; METCALFE et al., 2000). Outro ponto importante dessa abordagem da população está no “critério de demarcação”, que pode ser entendido através das unidades de seleção e do ambiente de seleção. As unidades de seleção são entidades com características que se mantém relativamente estáveis com o tempo para preservar suas identidades. Na concepçao de Nelson & Winter (1982), tais unidades são atividade de negócios freqüentemente específicas, que produzem um conjunto particular de itens utilizando métodos característicos. Esse tratamento da população também contrasta com a visão tradicional da teoria econômica de assumir o comportamento de um agente médio representativo, estilizado de maneira uniforme. Pela “concepção populacional” o desempenho do agente é relativo à mudança nas freqüências que revelam suas características. O critério pelo qual um agente é considerado estatisticamente representativo tem a vantagem de exibir as características emergentes na população do sistema. Essas características não são propriedades específicas à indivíduos, mas sim ao sistema, fruto de diversas interações com outros agentes através de fluxos internos e externos (troca de informações, experências, conhecimento etc). Entretanto, a consideração de um comportamento como CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 113 representativo deve ser um corolário não uma hipótese, ou seja, um produto de análise, não uma consideração prévia, apesar das evidências que possam existir (METCALFE, 1998). Nesse sentido, um comportamento representativo em uma população pode evoluir mesmo quando certos comportamentos individuais permaneçam constantes (o que, em um mundo de agentes de comportamentos uniformes, seria obviamente impossível). Na presença de diversos microcomportamentos individuais, o que é representativo em qualquer dado contexto são certos padrões recorrentes que se sustentam ao longo do tempo (“caracteres fortes”), que, por sua vez, dependem da maneira como são afetados pelos mecanismos de coordenação coletiva, pelo mercado e por instituições reguladoras. Assim, uma metodologia para captar tais caracteres fortes deve ser bastante sofisticada, mas sobretudo, coerente com as hipóteses de uma abordagem evolucionária, adaptativa e não reducionista. Quais seriam os critérios necessários para incluir agentes em um mesmo padrão? É possível estabelecer uma demarcação qualitativa entre os grupos? Quais as características que os agentes compartilham? Quais as mais promissoras em termos competitivos? O melhor caminho para responder a tais questionamentos é definir os membros da população não em termos de suas características per se, mas como entidades sujeitas a um ambiente comum de pressões competitivas (BRANDON, 1990 apud METCALFE, 1998). Na abordagem evolucionária, os mecanismos de variedade não podem ser baseados em populações com entidades idênticas. Apesar dos agentes nesse sistema compartilharem certos atributos, e estarem expostos as mesmas oportunidades e incentivos, agem de forma independente, com estratégias próprias, de acordo com suas capacidades e limitações (principalmente de recursos de capital e de conhecimento). O ambiente de seleção é, na realidade, a arena competitiva na qual os agentes disputam mercados, que avaliam as várias entidades e transformam suas características seletivas em vantagens seletivas. O que é verificado na forma de “estruturas de mercado”. No processo competitivo, formam-se grupos específicos de indivíduos dentro da população que tornam suas características seletivamente relevantes. Como conseqüência, segundo Metcalfe (1998), tais grupos não podem ser identificados, a menos que se definam anteriormente quais as características relevantes. CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 114 Dessa forma, os agentes não podem ser classificados segundo seus atributos individuais, mas pelo fato de atuarem em uma arena competitiva comum, estão sujeitos às mesmas forças seletivas que revelam certas características predominantes. Nesse sentido, pode-se definir a dinâmica competitiva entre firmas em um determinado sistema, como um processo interativo de mudança e adaptação, condicionado por mecanismos de rivalidade e cooperação entre os agentes, buscando compatibilizar suas características internas, através de diferenciações em produtos e processos, às exigências externas (de mercado), que possibilitem vantagens perante seus concorrentes. 4.7 Evolução e complexidade Um grupo de agentes pode ser representado por seu conjunto de regras específicas (METCALFE et al. 2000). Tais “regras” podem ser definidas como um conjunto de padrões recorrentes de interações formados a partir de um processo de aprendizagem, no qual são tomadas microdecisões em um ambiente fortemente imprevisível resultando em ações de sucesso e fracasso (tentativa e erro). Quase como um mecanismo de defesa, no tempo, este processo de aprendizagem condiciona os agentes a adotarem certas decisões baseados na memória passada, formando regras de comportamento ou rotinas. Tais rotinas são influenciadas pelos mecanismos de seleção (leis, regulações, normas, incentivos, crises econômicas etc) e pela estrutura de mercado (pressões competitivas) através de um conjunto de variáveis do sistema. Estas, por sua vez, em um processo interativo, levam a novos comportamentos (adaptação) das firmas ao ambiente. As atividates dentro das firmas são desenvolvidos com base em práticas e métodos testados no processo de busca por soluções para os problemas internos (NELSON & WINTER, 1982). Quando o mecanismo de busca é ativado (devido a um problema qualquer), primeiramente são testadas as alternativas já existentes (rotinas existentes) e, posteriormente, se busca alguma outra solução (inovações). O resultado surge pelo melhor trade-off entre as velhas (rotinas) e as novas alternativas (novas rotinas). Neste processo está embutido uma atividade de benchmarking (interno e externo) entre as práticas adotadas pelos melhores concorrentes. Porém, o processo de tomada de decisão de sair de CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 115 uma rotina envolve incertezas, logo, é limitado por fatores internos/externos e gerais/ específicos do ambiente que caracterizam o grau de aversão da firma ao risco3. No conceito de Nelson & Winter (1982), “regras” e “rotinas” são ilustradas não somente em termos de aderência a normas e convenções, mas também como emergência de novos padrões de comportamento. O conjunto de regras e rotinas que caracteriza as firmas pode ser definido de acordo com parâmetros de continuidade e regularidade. Assim, tal conjunto pode compreender elementos de dois tipos: (i) estáticos, se associados com a capacidade reprodutiva de tarefas previamente executadas ; ou, (ii) dinâmicos, quando vinculados à busca por novas respostas para mudanças e tendências verificadas no ambiente externo, ou a iniciativas de auto-adaptação, devido à ocorrência de circunstâncias imprevistas. Emergência pode ser definida como um ajuste dinâmico no conjunto base de rotinas internas que são modificadas e refinadas no processo interativo de busca por novas alternativas com base em experiência passadas (NOOTEBOOM, 2000). A descrição anterior corresponde a definição de Sistemas Evolutivos-Adaptativos (HOLLAND, 1998; ARTHUR, 1997). Porém, o ponto de partida neste caso são os agentes que podem ser representados através de suas regras de conduta no processo de adaptação e seleção. Nesse sentido, o estudo da dinâmica competitiva interfirmas deve considerar as relações institucionais (vínculos formais e informais) e os efeitos dos mecanismos de dependência da trajetória que crescem em complexidade quando analisados sistemas de múltiplos agentes (NOOTEBOOM, 2000). Se as características de um certo grupo de indivíduos podem corresponder a um processo não-linear, então o comportamento coletivo não pode ser deduzido pela soma dos comportamentos de agentes isolados. Nesse contexto, alguns conceitos se tornam importantes para o entendimento do funcionamento do sistema, entre os quais, os de adaptação contínua, auto-organização (não manipulado) e dinâmica fora do equilíbrio. Segundo Holland (1998), a emergência de padrões de comportamento reforça a idéia de uma coleção diversificada de agentes, caracterizada pela diversidade, pelo potencial agregado, pelo encadeamento (networking) e pela não-linearidade do processo. Estas 3 Tais fatores compreendem, por exemplo, a política econômica (taxas de juros, câmbio etc), a dependência da trajetória (inércia estrutural e organizacional), o nível de recursos físicos e humanos vigentes (por exemplo, capital, qualificação e flexibilidade dos recursos humanos etc), coalizões (como: contratos com fornecedores e clientes estratégicos, regulamentação de impostos especiais, normas trabalhistas e ambientais específicas), e características específicas do mercado (Cyert & March, 1963; Teece & Pisano, 1998). CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 116 características podem ser consideradas como as bases para a evolução da estrutura do sistema. Em sistemas complexos com múltiplos agentes pode-se observar características como diversidade em habilidades, adaptação e reação frente aos padrões estabelecidos e ao ritmo de mudanças impostas pelo ambiente. As rotinas podem ser simples e às vezes limitadas inicialmente, mas quando consideradas em relação à mudanças e alterações na estrutura do sistema, surgem níveis distintos de agregação e hierarquia. Com o aumento no escopo das rotinas, surgem padrões recorrentes de interações. Quanto mais agregado, maior e mais sofisticado se torna o conjunto de rotinas, comportamentos e estratégias. Dessa forma, grupos de agentes podem ser representados pelo conjunto de rotinas, comportamentos e estratégias específicos de cada sistema. A Figura 4.2 ilustra esse processo. AGENTE INDIVIDUAL META-AGENTE ORGANIZAÇÕES Agente Conjunto de regras simples Meta-Agente Modos de comportamento (grupos) Organizações Meta–regras (estratégias) Figura 4.2 – Diferentes níveis de regras de comportamento (baseado em Metcalfe et al., 2000; Fonseca, 2001) CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 117 Segundo Metcalfe et al. (2000), um conjunto de regras tornam-se uma estratégia quando: 1. Definem uma seqüência de decisões; 2. Revelam alguma forma de antecipar acontecimentos, no sentido de “o que fazer” quando surge uma situação inesperada; 3. Desenvolvem-se dentro de organizações. Nesse sentido, quanto mais complexas as interações entre os agentes, mais eficientes devem ser as regras. Nesse nível de complexidade, os vínculos funcionais entre os agentes podem também ser definidos como uma “organização”, caracterizado por um processo contínuo de legitimação coletiva. 4.8 Padrões e recursos da firma Dentro de cada mercado, as firmas buscam se diferenciar das concorrentes através de diferentes estratégias. O ambiente competitivo leva a adoção de comportamentos diversos, influenciado pelas competências internas da firmas e por elementos aleatórios do ambiente. A adaptação a essa dinâmica constitui a base para o desenvolvimento competitivo sustentável de uma organização (SAVIOTTI & METCALFE, 1991; LEVINTHAL, 1994). Nesse sentido, a abordagem evolucionária e a teoria dos recursos da firma consideram que as firmas são heterogêneas em relação à recursos, capacidades, competências e estratégias. Segundo Hadjimanolis (2000), a teoria dos recursos da firma complementa e integra contribuições de muitas vertentes teóricas, entre as quais e especialmente, a organização industrial e a teoria dos custos de transação. “A visão baseada em recursos da firma busca interligar as teorias das capacitações internas e das estratégias competitivas da firma” (op.cit.: 264). Por essa visão, os recursos são ativos tangíveis e intangíveis utilizados pelas firma no ambiente competitivo, os quais compreenderiam os recursos físicos, humanos, tecnológicos e de reputação (imagem), incluindo o emprego de tecnologia interna para as atividades do dia-a-dia e pessoal qualificado na execução de tais atividades, o que envolve treinamento e aprendizagem. As capacitações são habilidades CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 118 gerenciais e fatores internos da firma formadores das rotinas organizacionais, que baseadas nos recursos, possibilitariam vantagens competitivas específicas, difíceis de imitar. Nesse sentido, as capacitações dinâmicas podem ser entendidas como as habilidades da firma de integrar, construir e rearranjar competências internas e externas de acordo com as mudanças e exigências do ambiente (TEECE et al., 1997). As rotinas específicas às firmas são dependentes de eventos e decisões ao longo do tempo (path dependence). As combinações específicas de recursos e capacitações (técnicas e gerenciais) contribuem para diferenciar certas firmas de seus competidores. A interação entre recursos e capacitações dinâmicas é que formariam as competências de cada firma4. (HADJIMANOLIS, 2000). As capacidades referem-se à habilidade de mobilização de recursos (humanos, capital, coalizões etc.) necessários na definição de padrões de comportamento individuais e coletivos, os quais definem suas estratégias para absorver novos conhecimentos (COHEN & LEVINTHAL, 1990; AGUILAR-ZAMBRANO, 2001). O desempenho nessa dinâmica é função da eficiência e eficácia na articulação entre recursos, capacidade e estratégias para explorar as oportunidades do ambiente e dos diversos tipos de conhecimento disponíveis. Uma série de autores têm destacado a importância das organizações desenvolverem habilidades específicas para absorver mudanças e gerar novas competências a partir da combinação de fontes exógenas e endógenas à organização (HAMEL & PRAHALAD, 1990; NONAKA, 1994 ; TEECE & PISANO, 1994; 1998). Tais habilidades referem-se ao talento que certos entes possuem que os qualificam a “fazer algo”. A competência decorre da habilidade de fazer “tal coisa”, em um certo grau de qualidade e efetivamente, i.e., um certo número de vezes, com um percentual de acerto acima da média, por exemplo (AGUILAR-ZAMBRANO, 2001). O conjunto de habilidades da firma inclui técnicas e métodos que caracterizam a capacidade das firmas em poder ou não fazer algo “com competência”. Competência aqui pode ser vista de duas maneiras: (i) técnica, associada à rotinas de manipulação de artefatos, técnicas de execução e elementos de um processo produtivo (trabalhadores, equipamentos etc) e; (ii) organizacional, referente à rotinas que envolvem habilidade de administração e gerenciamento do processo, métodos de fabricação, relacionamento como 4 Uma crítica feita a essa abordagem é que, pela subjetividade e complexidade de aplicação, “poderia levar a práticas inadequadas de gerenciamento e decisões estratégicas” (sic!) (MacGrath et al., 1992). CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 119 clientes e fornecedores. Nesse sentido, esse conjunto de habilidades reflete o que as firmas sabem e podem fazer. Entretanto, os recursos, capacidades e competências da firma apenas são explicitados através das estratégias adotadas frente às circunstâncias do ambiente. Cada circunstância exige uma conjugação diferente desses fatores. Um grau de conhecimento reduzido sobre tais fatores (que inclui saber como, quando e o quanto utilizá-los) pode levar a decisões equivocadas. Erros de avaliação podem provocar comportamentos não apropriados a certa situação. Neste caso, as reais habilidades, capacidades e competências da firma não são explicitados (METCALFE, 2001). Isso explica porque uma firma com baixo nível de recursos, mas que os utiliza eficazmente (com uma melhor estratégia), eventualmente pode levar vantagens competitivas frente a um concorrente mais bem dotado de recursos, capacidade e competências, porém, com baixo grau de conhecimento e de desempenho desses fatores. Neste caso, seus ativos estariam sendo subutilizados. Os recursos, capacidades e competências da firma constituem ativos estratégicos quando são utilizados para um determinado propósito ou objetivo. Dessa forma, uma estratégia tecnológica pode ser entendida como um processo em que a organização desenvolve capacidades tecnológicas constantemente, de modo a obter e sustentar vantagens competitivas específicas (TEECE & PISANO, 1998). Nessse processo dinâmico e evolutivo, nenhuma organização pode ser reduzida simplesmente a seus padrões de ação, pois a sabedoria interna de seus indivíduos e o que eles podem fazer, depende do contexto específico e da habilidade coletiva em operar capacidades em conjunto para atingir determinados propósitos. Entretanto, tais padrões se constituem em um importante parâmetro para análises de desempenho, pois são o repositório de competências e a fonte de estratégias sustentáveis no médio e longo prazo (METCALFE, 2001). Diferenças de comportamento aparecem como resposta das firmas de uma indústria ao aparecimento de uma tecnologia que provê um novo meio de executar determinadas funções de importância central para o desempenho competitivo. Em grande escala, tais episódios ocorrem pela substituição de equipamentos mecânicos e eletromecânicos por dispositivos eletrônicos em diversos tipos de equipamentos e em praticamente todas as indústrias. Em menor escala, cada tecnologia tem seu próprio ritmo de substituição. No caso dos microprocessadores para computador, cada vez mais velozes, e dos aparelhos de CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 120 telefonia celular, cada vez menores, até atingir limites técnicos de qualidade para o consumidor (utilidade e adequação ao uso), tecnológicos (saturação do padrão de certa tecnologia em ampliar serviços ou de compatibilidade com outras tecnologias) e de escala (saturação do mercado) (ver, por exemplo, DOSI, 1982; PEREZ, 1983; ABRAMOVITZ, 1986; DOSI, 1988; MYTELKA, 1998; GU, 2000). Um padrão comum que se verifica em tais episódios é que as firmas líderes em uma indústria freqüentemente parecem reagir mais lentamente aos desafios, o que, no futuro pode comprometer sua posição frente aos concorrentes. Com o tempo e o ritmo de inovações, a tendência é que a liderança seja assumida por algum competidor pioneiro em uma nova tecnologia. Algumas vezes, um firma anteriormente líder, passa a ter dificuldades para sobreviver ou, em última instância, entrar em processo de falência. Este “padrão” de comportamente é, obviamente, uma ilustração da metáfora schumpeteriana de “destruição criativa” da mudança tecnológica, a qual era vista por ele como um aspecto essencial da estratégia de negócios frente ao “constante vento forte das inovações” (LEONARD-BARTON, 1998). Geralmente “padrões de ação” são entendidos como rotinas. Entretanto, há outros tipos de ação no comportamento das firmas, como procedimentos de busca (métodos de tentativa e erro, heurísticas5), “regras do polegar6”, estratégias, paradigmas, estruturas cognitivas, hábitos e procedimentos operacionais recorrentes na organização, que fogem a esse escopo. Tais padrões podem ser considerados como individuais ou coletivos, porém são interdependentes entre si. Em termos evolucionários, ações recorrentes são considerados como características “quasi-genéticas”, pois, devido a um processo de feedback cumulativo, permanecem invariantes na firma por um período de tempo indeterminado (NELSON & WINTER, 1982). 5 O termo “heurística”, amplamente utilizado no campo da Pesquisa Operacional e da Engenharia da Computação (para tratamento de problemas de difícil solução ou, sem solução ótima), pode ser entendido como “um mecanismo de busca, característico do processo criativo, que através de procedimentos lógicos estruturados levam a uma solução aproximada para um determinado problema”. Segundo Altshuller (1999, p. 38), o termo foi criado pelo matemático grego Alexandria, que viveu na segunda metade do século 3, sendo, posteriormente popularizado pelos cientistas Leibnitz e Descartes. Pode ser definido, no sentido amplo, como “um método de processamento estruturado do pensamento criativo”, mais eficiente em termos de tempo e energia, em contraposição ao método convencional de tentativa e erro. Nesse sentido, pode-se falar em heurísticas de baixo nível e heurísticas de alto nível, de acordo com a complexidade dos problemas e nível de exigência do processo criativo (Altshuller, 1999). 6 Um tipo de heurística de baixo nível, utilizada para problemas gerais de pouca complexidade e que exigem solução precisa. Um exemplo de “regra do dedo polegar” consiste em fixar um certo gasto em P&D, proporcionalmente ao retorno esperado (Lazaric & Denis, 2001). CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 121 4.9 Regras, procedimentos e rotinas Recentemente tem crescido o interesse no estudo de rotinas no meio acadêmico, especialmente entre os que utilizam a abordagem evolucionária, devido ao potencial do conceito como elemento de ligação entre os níveis micro e macroeconômico (REYNAUD, 2000). Entretanto, a literatura sobre rotinas não é consistente na definição e estabelecimento de diferenças entre conceitos aparentemente semelhantes, o que podem levar a equívocos e dificuldades na sua interpretação. Nesse sentido, é importante definir mais precisamente conceitos como “regra”, “procedimento operacional padrão” e “rotina”. 4.9.1 Regra Uma regra pode ser considerada como um relacionamento no qual indivíduos “disparam” uma ação quando certas condições se apresentam (COHEN et al., 1996). A reação a estas condições pode ser automática ou deliberada e consciente. Outra definição considera regras como padrões de comportamento ou ação a serem adotados de forma consciente ou não por certos indivíduos sob certas circunstâncias, que tem como principal característica sua estrutura lógica (por exemplo, em caso de X, fazer Y). Nesse caso, rotinas podem ser um tipo de regra de ação, quando colocadas em prática. Ou seja, regras são códigos representativos que definem ações, e não as ações em si (AGUILAR-ZAMBRANO, 2001). Na prática, regras formais especificam tarefas e competências de decisão entre membros de uma organização em termos de hierarquias, funções e procedimentos operacionais (técnicos e administrativos), reduzindo o escopo de atribuição das decisões. Por outro lado, as regras não definem como os agesntes (trabalhadores) devem executar uma tarefa “bem feita”, ou como fazer melhor. Em condições de mudança do ambiente, as regras estão sempre defasadas do contexto, pois são estáticas, impondo severas restrições ao comportamento organizacional adaptativo-evolutivo (WINTER, 1994). De forma similar a Cohen et al., (1996), Reynaud (2000), define regras como relações permanentes entre uma hipótese ou antecedente e sua conseqüência, que através de uma estrutura lógica do tipo condição-ação, disparam uma ação sob certas circunstâncias. Nesse sentido há dois tipos de regras: (i) regras acabadas (“prontas para uso”) e regras semiacabadas, que requerem interpretação antes de colocadas em prática. O CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 122 primeiro tipo envolve comportamento rotinizado, já o segundo, requer um comportamento interpretativo. 4.9.2 Procedimento Operacional Padrão (POP) O conceito de procedimento operacional padrão (POP) foi cunhado por Cyert & March (1963), no clássico livro A behavioral theory of the firm. Nesta obra, um POP é considerado como um padrão de comportamento, e portanto, engloba tanto regras como rotinas. Na definição de Egidi (1994) um POP é descrito como um conjunto de instruções que determinam ações a serem tomadas sob certas circunstâncias, que são formalizadas através de normas descritivas em manuais, roteiros de procedimentos e tarefas. Dessas definições conclui-se que: (i) POP’s são restritos por regras (como estrutura lógica: condição-ação) e; (ii) uma vez que uma regra tenha sido estabelecida, os POP’s possuem resultados finitos para cada ação (i.e., uma condição corresponde sempre a um conjunto definido de ações). O Gráfico 4.1, a seguir, ilustra de forma particular a diferença entre Regra e POP. Amplitude regra POP Freqüência Gráfico 4.1 – Diferença entre Regra e POP (adaptado de Aguilar-Zambrano, 2001) CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 123 Quando um, ou um conjunto de POP’s, é definido para resolução de um certo tipo recorrente de problema (através de uma regra), não é necessário que os indivíduos desenvolvem novas soluções a cada vez que aquele tipo de problema se apresenta, pois um procedimento padrão será adotado como solução. Entretanto, a literatura mostra, através de estudos empíricos realizados no chão-de-fábrica, que os comportamentos reais divergem substancialmente dos padrões descritos nas normas (manuais de procedimento, roteiros preestabelecidos etc). Logo, os POP’s são descritores mais precisos dos comportamentos reais. Em outras palavras, alguns padrões de ação podem ser considerados como regras estabelecidas por estruturas lógicas do tipo condição-ação e, em outras, podem ser rotinas em termos de ações comportamentais (COHEN et al., 1996; AGUILAR-ZAMBRANO, 2001). Porém, “o fato de uma rotina constituir-se em um padrão de ação, não significa que todo padrão de ação seja uma rotina” (REYNAUD, 2000, p. 251). 4.9.3 Rotina A noção de rotina foi pioneiramente desenvolvida no campo da Inteligência Artificial (IA), entretanto, deve-se sobretudo a Herbert Simon, e também a Friedrich Hayek, dois pesquisadores laureados com o prêmio Nobel em Economia, sua introdução nas ciências sociais e econômicas. Simon era ao mesmo tempo um téorico das organizações (ver, por exempo, MARCH & SIMON, 1958) e um especialista em psicologia cognitiva, enquanto Hayek foi um dos fundadores do campo da cibernética. Uma das maiores contribuições do amplamente citado trabalho de Nelson & Winter (1982) foi introduzir o conceito de rotinas como unidade de análise do comportamento econômico das firmas. Entretanto, muitas ambigüidades e inconsistências ainda prevalecem no tratamento empírico de rotinas. Não existe uma visão acadêmica unificada sobre a noção de rotina. Esta situação é agravada pelo fato de serem bastante raras as contribuições ao conceito de rotinas e, quando ocorrem, terem impacto limitado (REYNAUD, 1998; BECKER, 2001). Dosi et al. (1994) consideram rotinas como padrões de interação relativos ao comportamento de um grupo. Tais padrões dependem que cada membro do grupo satisfaça certas condições: (i) que não tenha dúvidas a respeito de sua função e trabalho no grupo; CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 124 ii) que interprete de forma correta as mensagens passadas pelos colegas; (iii) que, a partir do conjunto de rotinas prestabelecidas, seja capaz de fornecer a resposta certa para cada probrema sem reflexão desnecessária (de forma quase imediata). As respostas de cada um são interdependentes entre si. De acordo com essa perspectiva, rotinas só existem pela interação de indivíduos. Tal concepção é compatível com a definição de Nelson & Winter (1982), na qual, rotina corresponde a uma forma de conhecimento tácito da firma, funcionando como uma “memória organizacional”. Nesse sentido, rotinas dão uma identidade à organização, pois são idiossincráticas e, como elemento tácito, mantém-se como atributo retido pela firma. Um conjunto de características processuais de rotinas têm sido identificado: tempo de impacto, evolução, manutenção, resistência, discrepâncias, tempo de aquisição, dependência, condições para que mudanças ocorram em saltos ou de forma incremental, confiabilidade etc (ver, por exemplo, WEICK, 1990 e BECKER, 1992). Cada uma dessas dimensões pode ser útil para o avanço do entendimento do papel das rotinas nas organizações, de acordo com os objetivos almejados. Uma rotina pode ser considerada um padrão de comportamento regular e previsível das firmas, que é parte do processo recursivo que constitui uma organização. Cada rotina relaciona uma determinada atividade a um procedimento específico operacional (cognitivo ou físico), provendo ações de acordo com instruções previamente definidas por regras para certas circunstâncias. Nesse caso, uma rotina é definida como um meio pragmático para a resolução de um problema, para a qual, uma certa regra dá uma resposta teórica e geral. Assim, as regras formam os parâmetros para a definição das rotinas. Isto implica que não é possível adotar rotinas sem anteriormente estabelecer regras, pois rotinas são baseadas em regras de comportamento (COHEN et al., 1996; REYNAUD, 2000). Estabelecer diferenças entre regras e rotinas não é simples, pois envolve a redução de todas as atividades complexas da organização àquelas essenciais e representativas de uma descrição condição-ação (regras). A complexidade do conjunto de regras esbarra nos limites da racionalidade (COHEN et al, 1996). Rotinas são descritas como a memória organizacional e práticas recorrentes executadas em uma organização. Tal memória é constituída, em parte, pelos repertórios de conhecimento ativado pelos membros da organização e, em parte, pelo conhecimento mobilizado por tais membros. Dois tipos de conhecimento são conjugadas para formar uma CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 125 rotina: - um inerte e latente, e outro explícito, mobilizado e utilizado diariamente. Esta definição bidimensional de rotina se contrapõe à noção tradicional de um “menu fixo”, ou seja, um padrão recorrente, automaticamente executado pelos membros da organização sem qualquer ação consciente e deliberada (LAZARIC & DENIS, 2001). Devido à restrições cognitivas na transmissão do conhecimento no processo de aprendizagem, a memorização das regras pelos indivíduos não é total. Entretanto, eles recriam formas particulares de interpretação das regras, gerando rotinas baseadas em regras genéricas (limites). Nesse sentido, em um processo convencional, as regras estabelecem as bases para a criação de rotinas7. O Gráfico 4.2, busca mostrar a diferença entre regra e rotina. rotina Amplitude regra Freqüência Gráfico 4.2 - Diferença entre Regra e Rotina (Adaptado de Aguilar-Zambrano, 2001) Teoricamente, para que “rotinas” tornem-se “regra”, tal processo deveria ser invertido (difusão do conhecimento particular para o coletivo). Padrões particulares podem se tornar regra quando, demonstradas sua adequação e seu desempenho em um caso particular, são aceitos e interpretados corretamente de forma coletiva. Isso pode ocorrer, por exemplo quando certos trabalhadores desenvolvem métodos, técnicas e procedimentos particulares mais eficientes que rotinas e regras anteriormente estabelecidas para execução de alguma atividade. Este é um tipo ideal e altamente elaborado de inovação incremental (adaptações), pois são melhorias baseadas em contribuções próprias sobre modelos amplamente testados e estabelecidos coletivamente em outros contextos (regra). Quando mais uma firma conseguir tornar tais eventos esporádicos em processo (converter rotinas em regras), mais estará próxima de um tipo ideal de organização, que alguns autores denominam de organização do conhecimento (ver, por exemplo, Nonaka, 1994; Leonard-Barton, 1995; Lastres & Albagri, 1999; Nonaka & Takeuchi, 1999), na qual uma grande parcela do conhecimento tácito e individual seria transformado em conhecimento codificado e coletivo. Nesse caso, sua eficiência na utilização dos recursos intangíveis seria substancialmente maior. 7 CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 126 Na prática, o conceito de rotina pode ser observado em dois níveis, conforme sugerido por Cohen et al. (1996): Em um sentido restrito, que vê rotinas como um processo organizante e automatizante8; Em um sentido amplo, como uma “regra do dedo polegar”, isto é, uma resposta em primeria instância, que reduz toda a quantidade de informação disponível a um conjunto útil, resultando em uma primeira aproximação para um problema de decisão. Tal concepção amplia o enfoque do conceito de rotinas e concede flexibilidade no seu tratamento, dependendo do quê se quer capturar e o quê se pode observar. De acordo com essa concepção, o conceito de rotina pode ser definido como “a capacidade de execução repetitiva de um desempenho como uma resposta à pressões seletivas, com base no aprendizado de uma organização sob um certo contexto” (COHEN et al. 1996, p. 683). Conforme essa definição, a análise de rotinas envolve observação de padrões no nível operacional, sem ignorar o fato de que tais padrões foram aprendidos em algum contexto específico. Assim, o processo de aprendizagem e o seu resultado (a rotinização) são dois lados de um mesma moeda, que é sustentado pela coevolução e interação das dimensões cognitivas e sociais de rotinas (LAZARIC & DENIS, 2001). Reynaud (2000) propõe a classificação de rotinas segundo distinções entre o tipo de comportamento (individual ou organizacional) e a capacidade de aprendizagem (estática ou dinâmica). Segundo tal proposta, as rotinas podem assumir quatro tipos diferentes: (I) Rotinas individuais estáticas - são baseadas nas habilidades do trabalhador. Tal habilidade refere-se a capacidade de executar as mesmas tarefas repetidamente em um nível satisfatório; (II) Rotinas organizacionais estáticas - são procedimentos e regras de decisão adotados pelas firmas com base em informações simples do dia-a-dia, amplamente difundidas a todos os trabalhores; 8 Esta noção está de acordo com March & Simon (1958), que define rotinas como programas e ações, com base em regras como “resposta fixa a um estímulo definido (p. 142)”. CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 127 (III) Rotinas dinâmicas operacionais - são relativas a capacidade de busca individual por melhores práticas através de tentativa e erro, que o coloca em um nível acima do satisfatório (acima da média). (IV) Padrões dinâmicos de comportamento (meta-rotinas) – são caracterizados por autonomia e capacidade de reformular as rotinas estabelecidas, através de novos padrões de comportamento. A definição das rotinas segundo essa concepção permite uma melhor caracterização dos tipos de rotinas (Quadro 4.2). Quadro 4.2 – Diferentes concepções de rotina Tipo de Comportamento Individual Organizacional Estática (I) Habilidade ou rotina no sentido restrito (II) POP ou “regras do polegar” Dinâmica (III) Capacidade de busca; heurística (IV) Meta-rotinas Capacidade de Aprendizagem Fonte: Reynaud (2000) A distinção entre rotinas individuais e procedimentos tampouco é trivial. Segundo Reynaud (2000, p. 254), “procedimentos são explícitos e codificados, rotinas são tácitas. A execução de um procedimento não requer qualquer interpretação, pois este está no domínio da sintaxe e do cálculo. Já a aplicação de rotinas requer interpretação, mesmo que mínima, pois está no domínio pre-delimitado por uma interpretação, como a rotina de interpretar e usar os resultados de certos procedimentos”. O Quadro 4.3 fornece alguns elementos de distinção entre procedimentos e rotinas individuais. CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 128 Quadro 4.3 – Características de procedimentos e de rotinas individuais Procedimento Rotina Lista finita de instruções a serem seguidas Um mecanismo local de transformação de em uma certa ordem que leva a resultados algum recurso com um objetivo específico (um reproduzíveis; processo para solucionar algum problema); Não limitado pelo contexto (desde que as Limitada pelo contexto local; possibilidades sejam exploradas); Informação tácita, não codificada; Informação explícita, codificada ; Executada automaticamente, Não requer interpretação; Requer interpretação mínima ; Envolve racionalidade processual (Simon, Envolve racionalidade adaptativa (Cyert & 1976, apud Reynaud, 2000) March, 1963) Fonte: Reynaud (2000) Resultados de pesquisas empíricas sustentam que as rotinas emergem como efeito de “um processo distribuído gerado pela interação9 de diversos padrões e regras individuais de produção” (EGIDI & NARDUZZO, 1997). Por não possuírem todo o conhecimento necessário para executar a melhor estratégia, os agentes exploram apenas uma pequena parte das regras potenciais existentes. Por essa razão, eles aprendem e memorizam apenas um limitado conjunto pessoal de meta-regras (EGIDI & NARDUZZO, 1997; FONSECA, 2001). As vantagens competitivas embutidas em competências adquiridas ao longo do processo de melhoria gradual (adaptações e inovações incrementais) das rotinas organizacionais são menos acessíveis à agentes externos, logo, são mais difíceis de serem transferidas a outros contextos e menos suscetíveis à imitação pelos concorrentes. Nesse sentido, as estratégias competitivas baseadas em rotinas internas são mais consistentes e, as vantagens delas advindas, mais sustentáveis no longo prazo. 9 Nesse caso, questões sobre a “observabilidade” e “não-observabilidade” de rotinas obviamente não podem ser captados por pesquisas baseadas apenas em observações. CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 129 4.10 Dependência da trajetória (do contexto local) Resultados de pesquisas empíricas mostram que as rotinas estão intimamente ligadas ao contexto social, cultural e econômico local, no qual as firmas foram criadas, se desenvolveram e coexistem. Isso pode ser entendido como uma “dependência do contexto”. Contudo, ainda não é possível estabelecer em que níveis, pois não há evidências claras a esse respeito (ver, por exemplo, COSTELLO, 1996; DUBUISSON, 1998). Essa é uma questão aberta do ponto de vista acadêmico e merece maior aprofundamento teórico para estabelecer um marco conceitual mais consistente. Apesar da literatura apresentar estudo de casos de transferência de rotinas10, avanços recentes indicam que apenas alguns aspectos das rotinas são transferíveis para um contexto diferente, mesmo assim, somente em um grau bastante limitado. Casos muito específicos, de sistemas produtivos isolados, indicam a transferência de rotinas entre ambientes completamente distintos (como em montadoras de automóveis através de fábricas modulares, nas quais, praticamente todas as tarefas rotineiras são executadas por máquinas e robôs). Isso é devido ao fato do conhecimento embutido nas rotinas envolver características idiossincráticas, tácitas e processuais (“não empacotáveis”), com fortes vínculos com a memória passada específica de cada contexto (dependência da trajetória) (ver BECKER, 2001; LAZARIC & DENIS, 2001; COHENDET & LLERENA, 2001). Cohen & Bacdayan (1994) demonstraram os efeitos da dependência da trajetória e das especificidades locais nas rotinas das firmas. Apesar do estabelecimento de regras para homogeneizar procedimentos e tarefas internos às firmas, a heterogeneidadade persiste devido ao caráter peculiar do ambiente no qual as rotinas são estabelecidas dentro das firmas (unidades e setores específicos). Isto é explicado pelo fato do processo de adoção de novas rotinas envolver diversas etapas (interpretação, adaptação, aplicação, difusão) e se basear em interpretações particulares (individual ou em conjunto) de procedimentos e tarefas específicos, resultando em diversidade e heterogeneidade de práticas (BECKER, 2001). 10 Kostova (1998) e Fernandes & Prochnik (2001), por exemplo, apresentam estudos sobre casos de transferência internacional de rotinas entre fábricas (matriz/filiais), com base em alguns modelos específicos. Nesse caso, como a transferência é entre países, as diversas barreiras (culturais sociais e econômicas) já existentes nesse tipo de proposta são bastante acentuadas. Nesses casos, pela abordagem assumida aqui, o que se transfere de fato são atividades e funções com objetivos específicos (por exemplo, redução de custos), e não rotinas. No novo ambiente, de acordo com o contexto e a realidade local, são estabelecidas novas rotinas (mesmo que adaptações). CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 130 O aumento da rotinização tem o papel de estabilizar certas atividades das firmas, reduzindo a complexidade das decisões diante de problemas recorrentes. Em momentos de crises ou de situações inesperadas, as rotinas possibilitam decisões rápidas através de eventos já memorizados, diminuindo consideravelmente o tempo de resposta (mobilizando menos esforço mental e recursos cognitivos). Esse papel é particularmente importante quando os atores não podem decodificar toda a informação disponível, sendo mais eficiente uma resposta rotinizada (EGIDI & NARDUZZO, 1997). Por outro lado, o efeito inercial da dependência da trajetória implica em certa inflexibidade nas rotinas estabelecidas, o que explica a resistência à mudança. Em casos extremos, isso pode levar a uma negativa transferência do foco organizacional, do objetivo, que é o desempenho, através de melhoria nas rotinas, para os meios, que são as próprias rotinas. Padrões habituais de trabalho podem se converter em características inerciais muito fortes (por exemplo, aspectos culturais, religiosos, leis trabalhistas etc.), sobrepondo inclusive incentivos à mudança (LAZARIC & DENIS, 2001). Se por um lado, as rotinas habilitam as firmas a trabalhar, elas também limitam sua propensão a aceitar a substituição de certos padrões. Nesse sentido, as firmas enfrentam o paradoxo entre renovação e preservação. Nesse caso, a inércia da organização pode ser analisada em termos de eficiência e desempenho. Se as práticas internas das firmas são eficientes, a inércia é benéfica. Caso contrário ela se constitui em um problema. Assim, o repertório de rotinas da firma restringe seu comportamento futuro porque suas reações e decições são tomadas mais com base em interpretações do passado do que em antecipações do futuro. Desse modo, é mais provável que o comportamento futuro de uma firma seja compatível com as rotinas que tenham sido adotadas no passado (NELSON & WINTER, 1982; FRASMAN, 1998; CORIAT & DOSI, 1999) Com o processo de internacionalização da produção e comercialização de produtos, de modo a evitar a propagação de padrões idiossincráticos por cada cliente, passou a ser requerido uma padronização dos produtos, de modo a permitir uma avaliação não apenas da qualidade dos produtos mas também do processo e dos procedimentos gerais de produção. Com a criação das normas ISO (International Standartisation Organization), a partir do final da década de 70, as organizações foram forçadas a estabelecer certos padrões de conformidade e qualidade para atender a exigência dos clientes e facilitar a CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 131 produção de itens uniformes independente da procedência. Isso exerceu um importante papel para a difusão de práticas mais eficientes e para a melhoria de rotinas técnicoorganizacionais. Lazaric & Denis (2001), por exemplo, discutem os efeitos da implantação de normas de qualidade nas rotinas das organizações da indústria de alimentos, fortemente baseada em tradições artesanais de produção, na qual, as práticas de produção evoluem muito lentamente, devido ao fato de ser uma atividade intensiva em mão-de-obra e baseada em representações tradicionais. De um ponto de vista técnico, uma certificação de qualidade requer tornar uma tarefa explícita por meio de seu registro no manual de qualidade11. Desse modo, a organização descreve as características de seu processo produtivo, construindo uma representação coletiva de seus repertórios de conhecimento. Esse processo é usualmente feito por trabalhadores que conhecem o conteúdo das tarefas e procedimentos, porém não seu gerenciamento, implicando assim um relevante afastamento do modo taylorista de controle da produção12. A diferença é que os operadores coletam primeiro os procedimentos e, então, um gerente de qualidade prepara uma proposta inicial do conteúdo do trabalho a ser incluída no manual da qualidade, o qual é revisto pelos operadores, que podem questionar ou refutar qualquer ponto. Em seguida, há um processo de discussão para dirimir conflitos até se chegar a um consenso. Isso contribui para identificar pontos passíveis de melhoria posterior. Evidentemente que esse processo se dá de maneira própria em cada contexto e, por razões diversas, em muitos casos a organização não consegue implementá-lo com sucesso. Apesar de ser um assunto instigante, a discussão sobre tais razões fogem ao escopo deste trabalho. 11 As normas ISO 9001, 9002 e 9003, inicialmente usadas como referência na relação cliente/fornecedor, são hoje adotadas como referência de qualidade. O processo de certificação ISO 9000 requer o registro formal dos procedimentos em documento denominado de “manual de qualidade”. As práticas associadas a um certo processo produtivo devem ser identificadas, questionadas, documentadas e, posteriormente, revisadas e atualizadas periodicamente. Este sistema não garante qualidade de um produto, mas a do processo produtivo em produzir aquilo que é requerido. A certificação somente é obtida após uma série de procedimentos (testes, avaliações, auditorias), e quando realizados por institutos autônomos transmitem maior credibilidade. As organizações podem optar por três padrões referenciais. A norma 9001 é o modelo mais completo de garantia da qualidade, envolvendo atividades desde o projeto, produção e testes no produto final. A 9002 cobre a produção e os testes nos produtos finais e a 9003 cobre apenas os testes nos produtos finais. 12 Uma das características do taylorismo é a definição do conteúdo das tarefas pelo gerente, que através da codificação dos procedimentos dos operadores por setores específicos, tende a racionalizar o trabalho e impor severas restrições à autonomia na execução das tarefas (LAZARIC & DENIS, 2001). CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 132 Entretanto, o documento produzido (manual da qualidade) não deve ser excessivamente específico em suas prescrições para que não imponha limitações que impeçam contribuições individuais ao processo. Os procedimentos devem ser suficientemente gerais para dar autonomia aos trabalhadores e permitir um certo comportamento discricionário na solução de novos problemas (RUSSEL & TAYLOR III, 1999). Na prática, mudanças organizacionais associadas com a implementação de novos procedimentos, geralmente estão vinculadas à introdução de novos equipamentos, máquinas e dispositivos tecnológicos que permitem medidas mais precisas e um maior controle do processo. Essas mudanças podem causar um certo desconforto nos trabalhadores e conflitos na adesão a novos métodos de trabalho, o que pode representar um elemento inercial na organizacão. Tais barreiras são denominadas por Leonard-Barton (1995) de “core rigidities”, quando indivíduos ou grupos com competências estabelecidas para certos padrões maduros, demonstram resistência à novas competências, devido à dificuldades de adaptação ou por sentirem-se ameaçados pela exigência de aprendizagem vinculada à novos padrões técnicos. De fato, a perda de poder relativo de grupos devido às mudanças em padrões estabelecidos é um fator que perpassa toda a dinâmica competitiva econômica. O problema das firmas é encontrar a melhor maneira de administrar tais conflitos, tanto na absorção de novas informações, na melhoria de rotinas atuais e na adoção de novos procedimentos organizacionais, possibilitando melhores condições de trabalho e maior eficiência na execução das tarefas. Paralelamente, investimentos em treinamento e qualificação dos trabalhadores são fundamentais para a sistematização de um processo (cultural) de melhoria contínua que permita à organização atingir um estado positivo de propensão à mudança (inércia dinâmica) (ver, WINTER, 1994; BECKER, 2001; LAZARIC & DENIS, 2001). De uma forma geral, a evolução dos padrões de rotinas associa-se ao próprio processo de evolução da organização industrial e das condições de comércio vigentes em cada contexto. CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 133 Segundo Lazaric & Denis (2001), no processo de mudança organizacional, a firma adota certas soluções típicas, que podem ser classificadas de acordo com três instâncias13: (i) Uma solução passiva, na qual os trabalhadores seguem os procedimentos prescritos no manual da qualidade sem exercer qualquer iniciativa própria ou prestar atenção à eventuais problemas que possam vir a ocorrer. Neste caso, as rotinas são executadas automaticamente evitando qualquer perda de tempo extra. A motivação é mínima e o sistema de qualidade é visto simplesmente como uma regra a mais a ser seguida. Os eventuais incentivos não são atrativos para os trabalhadores. A possibilidade de advirem contribuições próprias na melhoria de rotinas obviamente são mínimas, senão nulas; (ii) Uma solução inovativa, requer uma percepção da implementação da norma de qualidade como uma oportunidade de aprendizagem. Os trabalhadores percebem a introdução do sistema de qualidade como uma oportunidade de aprendizagem e crescimento profissional e tentam exercer uma função discricionária utilizando sua experiência e conhecimento tácito na resolução dos problemas. Desse modo, obtêm maior autonomia na definição das tarefas e podem ampliar seu escopo com menores dificuldades. (iii)Uma solução de monitoramento, os gerentes não percebem qualquer possibilidade de atrair contribuições dos trabalhadores em relação ao sistema de qualidade, exercendo sua força discricionária codificando eles próprios os procedimentos, reforçando sua função supervisora e aumentando o controle sobre cada tarefa. Tal situação está longe de ser a ideal, sendo adotada quando os gerentes não crêem na capacidade dos operadores em mudar antigas rotinas, e tentam exercer sua autoridade para introduzir novas práticas utilizando algum sistema de incentivo ou de pressão sobre os empregados. Como instâncias esquemáticas, a solução do segundo tipo (inovativa), seria a mais satisfatória, por revelar um ambiente integrado de cooperação entre gerentes e operadores, sendo mais propício à implementação de mudanças e ao sucesso na introdução de melhorias. Neste caso, a participação dos operadores nas rotinas vai além de uma simples 13 Por exemplo, com relação a iniciativas exigidas na implantação de um sistema de qualidade. CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 134 execução para uma tentativa de contribuição na resolução dos problemas. O terceiro tipo solução de monitoramento – é o mais problemático e ineficiente, devido à relutância dos trabalhadores em questionar os procedimentos atuais e em aprender novas tarefas, o que pode levar a uma situação de conflito mais acentuado. De acordo com os conceitos marxistas de “máquina ideal” e “contradição técnica”, seria possível controlar substancialmente o processo de resolução de problemas, inclusive os criativos. A “máquina ideal” indicaria a direção de busca, enquanto a “contradição técnica” apontaria os obstáculos a serem removidos. Entretanto, ocasionalmente, alguma contradição poderia se encontrar camuflada pelo ambiente ou, se tornar despercebida por trás de equívocos na declaração de um problema (ou seja, é dependente da interpretação e da qualidade da descrição). Remover tal “contradição” envolveria encontrar um meio, caminho ou direção que leve a uma solução. Tal caminho, por sua vez, tanto poderia ser percorrido através de poucos passos ou exigir uma seqüência complexa de procedimentos, com mudanças pontuais de direção, retrocessos e desvios. Quanto mais complexo o caminho escolhido (trajetória), maior seria o esforço exigido para se chegar à solução, podendo requerer recursos racionais (táticos e estratégicos), de modo a reduzir o esforço, economizando energia e tempo para se atingir o objetivo, ou seja, encontrar uma solução. Proposto pelo cientista russo Genrich Altshuler (1926-1998), as idéias contidas no parágrafo anterior descreve um método para o tratamento criativo de problemas técnicos. Funciona como um tipo de “algoritmo14” do processo criativo denominado ARIZ (Algorithm for ReSolution Inventive Problems), adaptável às condições específicas do objeto em questão. Tal método foi publicado em livro originalmente no idioma russo (em 1969), sendo posteriormente traduzido para o inglês, publicado sob o título The Innovation Algorithm (ALTSHULLER, 1999). O ARIZ foi a base para a futura construção da chamada Teoria da Solução de Problemas Criativos (TRIZ – Theory of ReSolving Inventive Problems), descrita em tal publicação. Segundo Atshuller (1999), o processo técnico criativo pode ser traduzido por meio de múltiplos níveis e diferentes estágios da atividade criativa. O Quadro 4.4 apresenta um 14 Aqui o termo “algoritmo” é usado no sentido amplo, como um processo constituído por um conjunto seqüencial de ações estruturadas para se chegar a um determinado objetivo. Na Matemática, significa uma seqüência de passos, estritamente regulada, necessários para se chegar à solução de um problema, de acordo com certas condições preestabelecidas. CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 135 diagrama estruturado do processo criativo, conforme os níveis e seus estágios propostos pelo referido autor. Quadro 4.4 – Evolução do processo criativo técnico Estágio Nível A B C D E F Escolha da tarefa/ rotina Escolha de um método de busca Coleta de informações gerais Busca por uma idéia Idéia obtida Implementação em um caso prático Utilização de um modelo padrão Produção de um produto/ modelo padrão Escolha de um modelo alternativo Produção de um produto/ modelo modificado Mudança no modelo padrão Produção de novo produto/ modelo 1 Utilização de uma tarefa/ rotina dominada 2 Escolha de uma rotina alternativa Utilização de Utilização de Utilização de um método informações uma solução dominado dominadas padrão Escolha de um método de busca alternativo Coleta de informações aprofundadas Escolha de uma déia alternativa Informações Mudança no obtidas padrão 3 satisfatórias a dominado nova rotina Novo método Coleta de Nova de busca informações Busca por 4 satisfatório a relativas a Rotina nova solução nova rotina nova rotina Coleta de Busca por informações Novo Busca por novo relativas a 5 conceito/ problema novo método novo princípio problema Fonte: adaptado de Altshuller (1999) Mudança da rotina original Modificação para novo método Difusão e utilização de forma diferente do novo modelo Modificação em todos os sistemas Desenvolvimento através da de novo conceito aplicação do novo conceito Desenvolvimento de novo modelo No Quadro anterior, as letras (A, B, C ...) representam os estágios a serem percorridos no processo criativo. Os números (1, 2, 3 ...) correspondem aos níveis que, não necessariamente, são seqüênciais. Tais níveis apresentariam as seguintes características: 1. Utilização de um objeto existente, de forma independente (sem necessidade de considerar outros); 2. Escolha de um objeto alternativo; 3. Implementar pequenas mudanças no objeto selecionado (incrementais); CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 136 4. Desenvolvimento de um novo objeto, ou a completa modificação no objeto atual; 5. Desenvolvimento de um sistema completamente novo. Para cada nível, há uma escala de complexidade composta por seis estágios. Para cada estágio, existe um certo tipo de problema característico, e uma forma típica (padrão) de tratá-lo, de acordo com a dimensão do sistema que o abrange. Em termos quantitativos, a complexidade nos diferentes níveis pode ser interpretada (ou avaliada) pela quantidade mínima de iterações requerida para se chegar a uma solução de primeira ordem (através de um método de tentativa e erro, por exemplo). Para os problemas de primeira ordem (nível 1), já haveria um domínio popular de pelo menos uma forma de resolução, devendo esta ser interpretada em função de cada objeto em questão. No caso dos problemas de mais alta ordem (nível 5), não haveria nenhuma forma de resolução conhecida. Nesse caso, um novo método heurístico seria requerido. Altshuller (1999) também propôs uma escala de complexidade para interpretar e classificar problemas de acordo com sua dimensão e seu conteúdo, através da seguinte taxonomia: Nível 1 – Um problema, e seu respectivo meio de resolução, abrangem uma determinada área profissional (um setor industrial específico); Nível 2 – Um problema, e seu meio de resolução correspondente, abrangem uma certa indústria (por exemplo, problemas relativos a máquinas e equipamentos sendo resolvidos pela aplicação de métodos dominados dentro dessa indústria, e apenas transferidos de uma área a outra) Nível 3 - Um problema, e seu meio de resolução, existiriam dentro de uma área da ciência (como um problema mecânico, que é resolvido por meio da engenharia mecânica); Nível 4 – Um problema, e sua solução, que transpõem a fronteira da ciência onde se originaram (como, por exemplo, um problema mecânico solucionado através de engenharia química ou eletrônica). Seria o caso de soluções multidisciplinares (e.g.); Nível 5 (e acima) – Nesse caso, problema e solução estariam fora dos limites da ciência comtemporânea, requerendo nova descoberta ou invenção. Na realidade, tal tipo de CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 137 problema surge a partir de uma descoberta, sendo necessária uma solução criativa e um procedimento inovador. Obviamente, que esse é apenas um quadro esquemático geral de tipos de problemas e meios comuns de solução. Não quer dizer haja uma divisão de problemas e soluções e que estes sigam sempre uma mesma lógica. Hoje em dia, devido à facilidade de acesso à informação e difusão de conhecimento, as fronteiras entre as ciências não ficam claras, com uma tendência crescente em se romper os limites de cada área. Assim, o leque de soluções possíveis tende a ser crescente. Apesar de pouco conhecido, e não ter sua autoria reconhecida no meio acadêmico ocidental, vários dos conceitos desenvolvidos por Altshuller (como, por exemplo, o conceito de Engenharia Reversa) sobre o processo criativo, estão atualmente difundidos pelos diversos campos e processos da Engenharia, principalmente embutidos em Métodos Cognitivos, Inteligência Artificial e Melhoria Contínua da Qualidade. 4.11 O Vínculo entre rotinas e trajetórias tecnológicas Através da memória passada do processo decisório de implementação de cada rotina, as tarefas e procedimentos podem ser executados da próxima vez (repetidos) com menor esforço intelectual. Desse modo, recursos intelectuais podem ser concentrados na solução de novos problemas e no estabelecimento de novas rotinas para problemas ainda pouco conhecidos. Entretanto, para cada etapa de uma rotina já estabelecida, sempre há uma certa “folga” (truce, no conceito de Nelson & Winter 1982), ou seja, há espaço para melhorias até que se atinja um “ponto de saturação” (p*, no Gráfico 4.3). A partir deste ponto, o investimento em uma nova rotina passa a ser mais conveniente (por reduzir desperdícios, por exemplo), ou a ser exigido (devido à pressão competitiva de firmas concorrentes, por exemplo), implicando em um investimento total menor (I*), comparativamente àquele em investir em melhoria da rotina atual. A partir do ponto p*, os custos envolvidos em continuar melhorando uma determinada rotina (trajetória em azul) passam a não se justificar devido a uma saturação técnica do padrão atual de rotinas (r*), ou à perda de competitividade frente ao padrão atingido pelos concorrentes (linha verde). Ou seja, a partir desse ponto, se torna mais conveniente adotar um novo padrão tecnológico, passando a investir na melhoria de novas CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 138 rotinas associadas a este, através da implantação de tecnologias mais avançadas ou de I n v e s t i me n t o s contribuições técnicas próprias, que caracterizariam um novo padrão de rotinas. I* Investimento total Padrão Atual Novo Padrão Região onde o custo de melhoria na rotina atual é menor do que o investimento em nova rotina p* ∆T Região onde o custo de melhoria na rotina atual supera o investimento em nova rotina r* Melhoria na Rotina Gráfico 4.3 – Trade-off entre diferentes padrões de rotinas Além disso, o custo da transição de um certo padrão de rotinas a outro, mais avançado, é diretamente proporcional à defasasem técnica (∆T, gap tecnológico) entre o padrão atual de rotinas e o novo. Logo, no ponto p*, a firma atingiu o limiar para o próximo padrão (gap mínimo), o que implica no custo de transição mínimo. O Gráfico 4.3 resume essas idéias, supondo, para fins ilustrativos, uma simetria no trade-off entre dois padrões consecutivos de rotinas. O aperfeiçoamento das rotinas organizacionais cresce passo a passo por intermédio de habilidades e contribuições individuais na execução de pontos específicos de CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 139 determinadas tarefas e procedimentos. Este é um processo heurístico e “possibilístico15”, no qual, uma rotina estabelecida pode ser entendida como uma solução viável, mas não única (não ótima), já que, para obtenção dos mesmos objetivos, é possível que haja outras rotinas que satisfaçam aos mesmos requisitos para o problema em questão (inclusive melhores soluções implementadas por outras firmas). Nesse sentido, teoricamente, toda rotina poderia ser melhorada até um determinado ponto, a partir do qual, uma mudança substancial passaria a ser requerida, caracterizada pelo estabelecimento de um novo padrão de rotinas. Assim o ritmo de estabelecimento de novas rotinas (que implica no ciclo de vida das rotinas estabelecidas) seria função da pressão competiva do ambiente local em que a firma atua, da sua capacidade em descobrir e absorver soluções inovadoras (novas rotinas, atingindo padrões técnicos de melhor desempenho) e do seu grau de dependência das rotinas e dos padrões anteriores (aqui, considerando-se efeitos de dependência da trajetória). Na prática, esses conceitos se aplicam à problemas de trade-off entre alternativas complementares, típicos da área de Engenharia de Produção, como por exemplo, na Gestão de Estoque e da Qualidade Total. Os investimentos no controle da qualidade de um certo produto ou processo (que envolve rotinas) se justificam até o ponto em que os custos de substituição por um novo sejam menores (investimento no controle da qualidade: prevenção + avaliação) ou, que o padrão de concorrência específico do mercado admita seu repasse para os preços (custos externos: perda de competitividade em relação a firmas com melhores rotinas, por exemplo). Situação similar também ocorre quando se deseja saber o “melhor” momento de se fazer uma nova encomenda para estoque, sob condições de incerteza da demanda. O trade-off nesse caso se daria entre os custos de não atender ao pedido e os custos de estocagem, caso o pedido não aconteça (ver, por exemplo, RUSSEL & TAYLOR III, 1999). O “ponto de viabilidade da mudança” entre dois padrões de rotinas é mais facilmente identificado quanto maior for o gap (∆T) existente entre tais padrões (ver, 15 Esse termo é adotado por alguns autores para denominar certos tipos de problemas que não se enquadram na divisão tradicional de problemas determinísticos e probabilísticos (ou estocásticos), nem tampouco são considerados em ambiente de incerteza total. Apesar de não haver dados históricos e informações suficientes para inferir probabilidades e tratamento formal, considera-se que os agentes mais aptos (ou privilegiados pelas condições do sistema) podem captar sinais do ambiente que lhes permitam, através de recursos intelectuais e intuitivos, eleger e trabalhar com um leque de soluções possíveis. Está vinculado aos problemas tratados por meio de lógica nebulosa (fuzzy theory) e conjuntos aproximativos (rough sets). Ver Heene & Sanchez (1997) e Inuiguchi & Ramik (2000). CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 140 Gráfico 4.3). Quando o gap é considerável, pelo processo de “destruição criativa”, inovações tecnológicas tornam obsoletos certos padrões vinculados a uma tecnologia madura, ou provocam uma bifurcação entre duas plataformas tecnológicas diferentes. Contudo, no caso de inovações incrementais, ou processos de mudanças mais sutis, pode não haver um ponto específico, mas sim uma seqüência de pontos (um segmento). Nesse caso, a mudança de padrões é mais suave, podendo se tornar clara somente a posteriori. Essa concepção é compatível com o conceito dialético de “contradição” do progresso técnico de Marx (apud ALTSHULLER, 1999, p. 91): “O processo de melhoria em determinada caraterística de um artefato técnico sempre leva a um conflito com alguma outra característica ou fator desse artefato, baseado na estrutura anterior. Para que a melhoria ocorra e funcione, tal característica ou fator também deve acompanhar a trajetória da mudança. A remoção dessa “contradição” é condição fundamental para que o processo de mudança, invenção e inovação aconteça. A necessidade por mudança cresce na medida que os problemas apresentam demandas adicionais (contradições, barreiras). A formação e superação de uma contradição é uma das principais características do progresso técnico”. Nesse parágrafo está contida a idéia básica marxista sobre mudança técnica, a qual, fundamentou o conceito schumpeteriano de destruição criativa16. Nesse sentido, a passagem de um certo padrão estabelecido de rotinas para outro, envolveria um processo de trade-off entre os elementos constituintes do sistema, o que poderia influenciar o ritmo e a trajetória de mudança. No sentido amplo, tais elementos podem incluir diversos fatores (desde econômicos, sociais, culturais, políticos até religiosos). De certa forma, o modelo descrito anteriormente, também é compatível com a noção de “mudança estrutural” da abordagem econômica “estruturalista”17. Pela 16 Geralmente, as bases que sustentaram tal concepção da mudança técnica são atribuídas na literatura apenas ao economista russo Kondratieff, e aos longos períodos de crescimento econômico descritos por ele. Tais períodos (ciclos, ondas ou fases), definidos a partir de uma avaliação histórica do desenvolvimento econômico, levariam em torno de meio século para se completarem. O Primeiro (1780-1840), seria caracterizado pela revolução industrial e a produção têxtil; o segundo (1840-1890), pela era da máquina a vapor e estradas; o terceiro (1890-1940), seria marcada pela era da eletricidade e do aço; o quarto (19401990), pela produção em massa de automóveis e materiais sintéticos; e o quinto (1990 - ?), vinculado era da microeletrônica e das redes de computadores (ver Freeman & Soete, 1997: 18-19). 17 Na abordagem estruturalista, formulada com base em contribuições de Schumpeter e Kusnetz, mudanças estruturais seriam causas e não efeitos do processo de crescimento. Este seria pontuado por períodos de mudanças discretas na alocação de recursos (por exemplo, devido à ‘destruição criativa’), o que poderia acelerar bastante a taxa de crescimento. Estas hipóteses contrariam a visão neoclássica de que mudanças CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 141 abordagem estruturalista, a mudança tecnológica influencia as trajetórias agregadas de setores e regiões. Em termos macroeconômicos, investimentos em infraestrutura para superar certas barreiras e defasagens de infra-estrura regionais ou setoriais gerariam “dobras ou disrupções” na função de produção agregada. Tais dobras seriam “nós” e “junções” que tornariam viáveis as “mudanças estruturais”. Contudo, considerando que a estrutura econômica seja incapaz de implementá-las, para que tais mudanças ocorram, seria necessária uma “violenta realocação de recursos de modo a alterar os padrões vigentes (inovações schumpeterianas) através de planejamento e coordenação, para evitar situações de estagnação social e econômica” (JUSTMAN & TEUBAL, 1991, p. 1178). Este processo pode ser interpretado como uma mudança (de rota ou trajetória) de um padrão tecnológico tradicional para um mais avançado. O Gráfico 4.4 ilustra a visão estruturalista de “mudança tecnológica”, onde k* representa a “junção” (condição) na qual a mudança tecnológica seria ótima18. Como as tecnologias, os padrões tecnológicos a elas associados e estabelecidos cumprem um determinado ciclo de vida, o qual, após um certo período de tempo, chegam a seu limite, se esgotam. De acordo com as exigências do ambiente, aqueles já em ponto de saturação em termos de desempenho ou de compatibilidade com padrões de outras tecnologias, sofrem progressivamente um processo de substituição por tecnologias de padrões que permitem um desempenho superior. Os dispositivos ligados aos padrões obsoletos podem sofrer um prolongamento de seu ciclo, sobrevivendo no mercado vinculados a alguma atividade econômica, atendendo à aplicações específicas (como é o caso das máquinas de escrever, os meios de transporte estruturais adviriam do crescimento, como efeitos do processo (lento e suave, quase automático) de acumulação de capital e crescimento da renda per capita (Justman & Teubal, 1991). Nesse sentido, haveria fortes barreiras ao crescimento de certas regiões e setores, requerendo coordenação e intervenções pontuais na economia (por exemplo, com substanciais investimentos em infraestrutura), de modo a superar tais desequilíbrios. Esse pensamento influenciou fortemente trabalhos sobre a economia de países pobres e em desenvolvimento, principalmente na América Latina, gerando inclusive outras derivações como a corrente denominada “cepalina” (ver, por exemplo, CEPAL, 1992; Costa & Arruda, 1999). 18 No nosso caso, a idéia de “otimalidade” seria como a “condição mais satisfatória”. A noção de “otimalidade” não se aplica ao caso de mudanças entre dois padrões de rotinas devido, por exemplo, aos chamados “custos da oportunidade”. Um caso similar típico é o que ocorre na decisão de investimentos em mercados futuros, quando o trade-off entre sair de um portfólio de investimentos, e passar para outro, se dá sem confiabilidade de sucesso, pois a probabilidade é desconhecida, não havendo garantias de que a trajetória passada irá se repetir, da mesma forma. Contudo, em tais situações, considera-se que certos agentes são mais capazes que outros em obter no ambiente (mercado) informações úteis ou captar certos “sinais” (padrões) que, quando interpretados de forma correta, permitem decisões que podem fazer a diferença entre sucesso e fracasso (lucrar muito ou ter prejuízo) (ver, por exemplo, Winter, 1994). CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 142 com tração animal, o barco a vapor, o sistema operacional DOS, dos aparelhos de TV em preto e branco, entre outros19). Padrão tecnológico mais avançado y Padrão tecnológico convencional k* k Gráfico 4.4 – Mudança tecnológica pela visão estruturalista (adaptado de Justman & Teubal, 1991, p. 1178) Paralelamente à adoção de novas tecnologias e à substituição dos dispositivos técnicos obsoletos, as rotinas e os padrões técnicos e organizacionais, se tornam incompatíveis com os padrões da nova estrutura, requerendo mudança e adaptação (BURGELMAN et al., 1995; UTTERBACK, 1996). Uma vez que um certo estágio tecnológico tenha sido alcançado, forças competitivas limitam o tempo de vantagem que uma determinada tecnologia pioneira tenha obtido em determinado sistema. A partir de uma inovação, e de sua posterior difusão, diversas melhorias incrementais e adaptações adicionadas ao produto original, criam 19 A esse respeito, Utterback (1996) apresenta vários exemplos de evolução tecnológica em longo da história contemporânea, além de uma visão geral da dinâmica da inovação. CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 143 ramificações que levam a resultados imprevisíveis, podendo vir a ser bem ou mal sucedidas no mercado. A partir do momento em que estas são amplamente dominadas, os resultados econômicos e os benefícios para a sociedade começam a se esgotar e, conseqüentemente, uma nova plataforma tecnológica (um conjunto de atividades agregadas pela utilização de um mesmo padrão tecnológico) pode encampar ou suplantar aquela já madura. Se o progresso tecnológico se configurasse como uma sucessão de eventos aleatórios, não seria possível estabelecer uma relação entre a taxa de avanço tecnológico no tempo, o que tornaria qualquer previsão a respeito inconsistente20 (BURGELMAN et al., 1995:143). Veja uma representação no Gráfico 4.5. Performance tecnológica * * * * * * * * * * * tempo Gráfico 4.5 – Série histórica do desenvolvimento de uma tecnologia genérica (baseada em Burgelman et al., 1995) Entretanto, por outro lado, as empresas vivem em um tipo de sistema onde as oportunidades, em maior ou menor grau, se apresentam e se vão, em um ritmo específico de cada ambiente. Estruturas de influência política e econômica, tradições sócio-culturais e 20 Nesse caso, apesar de haver um aumento da performance no decorrer do tempo, esta não seguiria um padrão regular. Tal informação não permitiria aproximar uma curva que fornecesse uma previsão consistente do futuro. Se os parâmetros tecnológicos seguissem um caminho errático, não seria possível uma previsão. Entretanto, tal situação raramente acontece (Burgelman et al., 1995). CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 144 outros fatores ligados à evolução histórica específica e ao poder exercido por certos grupos dominantes (coalizões, no conceito de BIANCHI & MILLER, 1996) podem condicionar as alternativas tecnológicas disponíveis e limitar as possibilidades de exploração de novas oportunidades, reduzindo o espectro de trajetórias tecnológicas possíveis a um conjunto mais provável, de acordo com recursos e competências específicas. Nesse sentido, a análise de dados históricos de um certo conjunto de fenômenos mostra que o progresso não é tão aleatório e descontínuo como poderia sugerir, mas sim, que ele percorre uma certa trajetória, um padrão regular quando analisado em relação a algum critério selecionado, tal como desempenho funcional (velocidade, por exemplo, para aeronaves), um parâmetro técnico (por exemplo, a força de tensão pela taxa de densidade para um material), ou uma medida de desempenho econômico (custo por kilowatt-hora, para geração elétrica). Tais parâmetros, quando plotados em relação ao tempo, caracterizam um padrão de evolução da forma denominada de Curva-S (BURGELMAN et al. 1995). A Figura 4.6 mostra uma ilustração. Parâmetro de performance Limite devido a restrições naturais ** 2 ** * * * * 1 * * * * * * * * * * * * * * 3 * * * * * * * tempo Gráfico 4.6 – Modelo de Curva-S Como se pode perceber, a Curva-S é similar ao modelo de ciclo de vida do produto. Pela Curva-S da ilustração mostrada no Gráfico 4.6, pode-se observar que há um período CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 145 inicial, caracterizado por um crescimento lento (1), seguido por um período de crescimento acelerado (2), após o qual, ocorre uma redução na velocidade de crescimento, com uma inversão na curva (3). Nesta fase, a curva atinge um limite assintótico21 de saturação, normalmente devido a restrições de alguma propriedade física do sistema. Apesar dos efeitos inerciais, tais idéias não querem dizer que, a partir de uma trajetória estabelecida, o progresso siga uma rota contínua, sem perturbações, até um ponto específico, determinado. Considerando-se um sistema aberto (como visto no Capítulo 3), nenhum progresso tecnológico acontece sem capacitação e competência nas decisões de investimento e na alocação de recursos. Dessa forma, seria mais correto falar em uma família de Curvas-S, trajetórias possíveis geradas a partir de decisões estratégicas nos pontos de trade-off entre uma melhoria e mudança de padrões técnicos a partir de uma oportunidade tecnológica (como por exemplo, o ponto p*, no Gráfico 4.3, ou ponto k*, no Gráfico 4.4). Uma interpretação do processo de mudança na forma da Curva-S pode ser visualizada no Gráfico 4.7. C2 A2 Parâmetro de performance C1 A1 B O tempo t1 t2 Gráfico 4.7 – Trajetórias tecnológicas possíveis (adaptado de Burgelman, 1995: 144) 21 Referente à “assíntota”, definida como uma reta tangente à curva em um ponto tendendo ao infinito. CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 146 Admitindo-se que o estímulo ao investimento para se atingir um padrão de alto desempenho seja baixo, uma curva típica para tal processo descreveria uma forma similar ao segmento OB (Gráfico 4.7). Por outro lado, o segmento OC2 revelaria uma taxa de progresso muito maior, devido a condições favoráveis de mercado, o que justificaria maiores investimentos em P&D. Considerando que, uma tecnologia tendo alcançado A1, no tempo t1, seja alvo de inovações22, receptora de vultosos investimento extras (por exemplo, devido à incentivos públicos estratégicos substanciais) ou devido à mudanças estruturais favoráveis na política econômica (sobrevalorização da moeda, investimento militar etc). Neste caso, O trade-off passaria a ser favorável à mudança, e uma trajetória típica seria aquela representada pelo segmento A1C1C2, sendo limitada pelo tamanho dos recursos disponíveis ou pela taxa em que este poderia ser empregado de forma útil (lucrativa). Com base em tais informações, no ponto t1, tal processo poderia ser descrito como muito provável de assumir uma trajetória semelhante ao segmento OA1A2, a menos que ocorram interferências de fatores do ambiente que alterem os parâmetros estruturais ao sistema. Neste caso, a trajetória mais provável seria OA1C1. Na prática, tais interferências estruturais não são freqüentes e, quando ocorrem, não acontecem de forma abrupta. As correlações entre os dados fornecem tendências que revelam para onde as mudanças são mais prováveis de ocorrer (BURGELMAN et al., 1995). Pela aprendizagem e implementação de inovações incrementais, uma firma pode melhorar seu nível tecnológico através da adoção de padrões técnicos de melhor desempenho dentro de um certo limite da tecnologia adotada (regime tecnológico). Quando uma firma está mais próxima de tal limite, pela saturação nas possibilidades de melhorar seu nível tecnológico dentro daquele regime, esta é pressionada a buscar alternativas de mudança para novos padrões. Através de uma inovação radical, as firmas podem mudar de uma trajetória tecnológica para outra, que permita melhor desempenho, considerando a absorção de recursos vinculados, tais como tecnologias, equipamentos e dispositivos auxiliares, treinamento e qualificação para aprendizagem de novas rotinas e padrões de melhor desempenho. Uma contribuição que sustenta esse tipo de interpretação foi realizado por Calssom et al., (1997), que desenvolveram módulos de simulação computacional, utilizando os 22 Aqui se aplicam os cinco tipos de inovação no conceito schumpeteriano (ver Capítulo 5, seção 5.2). CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 147 conceitos de “sistemas tecnológicos23”, inovações (radical e incremental) e trajetórias tecnológicas. No caso, consideram-se os seguintes regimes tecnológicos: Mecanização convencional (C); Produção em massa (M); Produção flexível (F). Cada um destes, consiste de quatro “técnicas”. Por exemplo, as “técnicas” representam (através de uma variável booleana) elementos com um certo parâmetro de desempenho operacional vinculado ao regime correspondente. Em uma representação vetorial do tipo (X,Y,Z,W)K, onde: K – Regime tecnológico (C, M ou F); X - Tipo de ferramenta de corte (1, em caso de alta velocidade de corte; 0, caso contrário); Y - Velocidade de corte (1, se igual ou superior a 3600 rpm; 0, caso contrário); Z - Alimentação do corte (1, se 10 cm/min; 0, caso contrário); W - Tipo de resfriamento (1, se água; 0, caso contrário). No Gráfico 4.8 é apresentada uma ilustração desse trabalho24. Considera-se que o mais alto desempenho (correspondente ao mais alto nível tecnológico) é aquele obtido pelos parâmetros de desempenho das técnicas especificadas. Dessa forma, as melhores práticas (técnicas, procedimentos, rotinas) para o primeiro regime, corresponderiam a um vetor na posição (1,1,1,1)C. Por outro lado, uma firma que adote as melhores práticas no regime de produção flexível (F), potencialmente, obteria uma melhor performance do que uma outra com melhores práticas, mas adotando o regime convencional (C). Entretanto, uma firma posicionada no regime de médio desempenho (M), adotando as melhores práticas, porém, não utilizando uma ferramenta que possibilite uma velocidade de corte 23 No Capítulo seguinte, tal conceito será explicado em detalhes. 24 O processo de evolução é um tema que fascina e atrai cada vez mais adeptos no meio acadêmico de vários campos da ciência. Matematicamente, a complexidade de tratamento formal de tal abordagem sempre dificultou seu tratamento computacional. Porém, nos últimos anos, com o avanço da tecnologia dos computadores, tem crescido substancialmente o número de trabalhos que utilizam métodos que buscam associar princípios evolucionários aos modelos e métodos de resolução computacional, como por exemplo, “algoritmos genéticos” e “redes neuronais”. No trabalho citado, os autores utilizam uma heurística implementada através de algoritmos genéticos para simular a evolução das tecnologias genéricas dos meios de produção. A notação adotada é típica de tais modelos. O vetor, no caso (X,Y,Z,W)K, representa um gene, onde as variáveis podem assumir um número 0-1, são os denominados “alelos”. A posição que cada “alelo” ocupa na estrutura do gene é denominada de “lócus”. Para uma introdução aos modelos de algoritmos genéticos ver, por exemplo, Goldberg (2000). CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 148 apropriada (de acordo com as especificações para o regime), é representada pelo vetor (1,0,1,1)M. Nível tecnológico (1,1,1,1)F (1,1,1,1)M (0,0,1,0)F (1,0,1,1)M (1,1,1,1)C (1,1,0,1)C (1,1,0,0)C (0,1,0,0)C tempo Inovações radicais (duas alternativas) Inovações incrementais Gráfico 4.8 – Trajetórias e inovações (adaptado de Carlssom et al., 1997: 260) No caso, uma “inovação radical” significa uma mudança de um regime para outro (C⇒M⇒F). Quando uma firma consegue tal mudança (uma inovação radical), ela tentará descobrir e aprender os elementos apropriados (melhores práticas) que possibilitem alto nível de desempenho25. 25 Em nossa abordagem, este é dos principais elementos da diversidade tecnológica no arranjo a ser estudado, devido às diferenças de competência das firmas em absorver e adaptar tecnologias externas e adotar rotinas que possibilitem melhor desempenho técnico e organizacional. CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 149 O Gráfico 4.8 mostra uma associação entre os três regimes através das trajetórias das firmas em um processo de inovação e aprendizagem. A firma no ponto (0,1,0,0)C está posicionada no padrão mais baixo (utiliza tecnologia convencional, mas adota as melhores práticas apenas para a ferramenta de corte), os demais padrões correspondentes às melhores práticas não estão no nível mínimo especificado para tal regime. Como tal firma está distante da linha correspondente ao próximo regime (1,1,1,1)C, uma trajetória possível seria investir em melhorar seu desempenho através de inovações incrementais no regime em que está, por exemplo, até o ponto (1,1,0,1)C. Quando as possibilidades de melhorias se exaurem, ou se saturam, passa a ser conveniente uma mudança para outro regime (através de uma inovação radical). A partir desse ponto, na ilustração são mostrados duas trajetórias possíveis (1,0,1,1)M e (0,0,1,0)F. Observe que a firma não irá adotar a tecnologia de produção flexível (0,0,1,0)F, pois tal opção apresenta menor desempenho que o ponto (1,1,0,1)C (devido a, por exemplo, sua estrutura de produção não possuir as condições mínimas necessárias para um bom desempenho com tal sistema), apesar daquele apresentar um potencial muito superior. Assume-se que as firmas não conhecem o potencial de crescimento das novas tecnologias (ou seja, suas trajetórias futuras). A comparação entre diferentes tecnologias é feita apenas com base em informação disponível (limitada). 4.12 O conceito de “trajetória competitiva” A partir dos conceitos apresentados nas seções anteriores, pode-se, finalmente, introduzir o conceito de “trajetória competitiva” para o comportamento da firma em arranjos produtivos locais. Uma “trajetória competitiva” é uma interpretação particular da vinculação entre a dinâmica competitiva das firmas e o conceito de trajetórias tecnológicas em nível global. Na “trajetória competitiva”, a “inovação radical” é apenas uma mudança inserida pela primeira vez entre as firmas do arranjo. O ponto de vista passa para a análise do comportamento das firmas e inovações incrementais, através de melhoria e mudança nas rotinas dominadas, da adoção de novas tecnologias disponíveis (trajetórias) e da incorporação de novas rotinas, compatíveis com os padrões de desempenho exigidos no novo contexto. Logo, o foco de análise se transfere da tecnologia e da inovação em si, como convencionalmente adotado no conceito de trajetória tecnológica, para o ambiente específico do arranjo local, com suas trajetórias específicas, regimes tecnológicos peculiares e seus diferentes padrões de desempenho. CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 150 Por esse conceito, busca-se refletir a forma com que as firmas, representativas de um determinado arranjo produtivo local, se comportam face às trajetórias tecnológicas disponíveis. Tal comportamento é dependente de fatores tanto externos quanto internos. Entre os fatores externos incluem-se aqueles vinculados ao poder de influência que tal segmento exerce sobre instituições, autoridades e a sociedade local, como forma de obter incentivos, vantagens específicas, minimizar custos de transação através de melhores contratos, de modo a superar barreiras estruturais, os quais, possibilitam às firmas adotar tecnologias de mais alto desempenho disponíveis para seus respectivos processos produtivos. Por outro lado, assume-se que não basta um ambiente externo em condições favoráveis para que uma firma obtenha sucesso na adoção de novas tecnologias. Seu nível de desempenho interno (referente principalmente a recursos, rotinas e POP’s) é um parâmetro que restringe suas possibilidades de sucesso na adoção de nova tecnologia e no processo de mudança para outra trajetória tecnológica. O processo inicia-se através de uma busca por uma solução para um problema ou conjunto de problemas (por exemplo, pela elevação dos custos associados a algum insumo específico, mercado mais restritivo quanto à qualidade, aumento da concorrência etc) que levam uma firma a tentar uma nova solução. Considera-se que tal busca se dá através de um método de tentativa e erro, onde uma primeira firma (ou um grupo reduzido delas) assume maiores riscos na implementação da mudança para uma nova trajetória (devido ao novo contexto ser incerto, e exigir outras mudanças vinculadas, por exemplo, novos produtos, novos mercados). Porém, tal firma pioneira adquire primeiro as experiências necessárias, se colocando em um novo padrão de desempenho, à frente das demais. O comportamento e desempenho dessa firma pioneira (ou grupo), influencia às demais firmas concorrentes do arranjo a se arriscar na nova trajetória, de acordo com suas competências e estratégias, fornecendo sinais de como se comportar (melhores práticas), e as alternativas a seguir, desencadeando um processo que se poderia denominar de “corrida pela mudança26”. Entretanto, por um lado, dependendo das condições do mercado, suas segmentações e peculiaridades, e, por outro, das rotinas, recursos, capacidade e competências de cada firma, os níveis de desempenho possibilitados pela nova tecnologia variam, e dificilmente 26 Compatível ao princípio evolucionário de “luta pela vida”. Vide Capítulo 3. CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 151 tal mudança será conveniente a todas as firma em um mesmo momento (ou um pequeno período de tempo). Em conjunto, tal processo de mudança, adaptação e melhorias, adotado por um grupo de firmas, face à mudança de uma trajetória tecnológica para outra, forma uma trajetória de transposição de padrões entre os regimes adotados pelas firmas do arranjo. Dessa forma, associado à dinâmica de mudança tecnológica e da segmentação do mercado, admite-se que ocorra nessa “corrida para um novo regime tecnológico”, um processo de estratificação entre as firmas27. Esse processo de transição de uma trajetória tecnológica a outra (de melhor conjugação de fatores de competitividade, como, por exemplo, recursos, desempenho, capacidade, competências, mercado) revela as características (padrões) que as firmas devem adotar nesse percurso. Nesse processo, as firmas “alocam” tais características, formando o que aqui se denomina de “Trajetória Competitiva” das firmas do arranjo. Para interpretação do conceito de Trajetória Competitiva em arranjos produtivos locais, considera-se j trajetórias tecnológicas (TTj), composta por n regimes tecnológicos28 (RTn). Cada Regime, por sua vez, compreende m padrões técnicos (PTm), cujo grau de domínio pelas firmas caracteriza as rotinas correspondentes necessárias para operar em tal regime. Para fins ilustrativos, considera-se, a seguir, respectivamente nos Gráficos 4.9, 4.10 e 4.11, o caso de três trajetórias tecnológicas (j={1,2,3}), três regimes tecnológicos (m={1,2,3}) e três padrões técnicos (n={1,2,3}). Subentende-se que a passagem de uma trajetória a outra é dependente de um conjunto de fatores da competitividade no arranjo (como por exemplo, desempenho, aprendizagem (know-how), recursos, padrão de rotinas, condições de mercado etc) que estabelecem um nível mínimo de viabilidade para a 27 O processo de estratificação é decorrência da hipótese evolucionária de “variação” (vide Capítulo 2), que é adotada na metodologia proposta, a ser apresentada nos capítulos subseqüentes. 28 De forma resumida, este conceito é aqui considerado como uma seqüência de padrões técnicos e organizacionais vinculados a certas tecnologias que formam trajetórias diferentes de desenvolvimento técnico, através de um processo de aprendizagem e aplicação prática (Van de Poel, 2000). Assume-se que cada regime é composto por m padrões técnicos e organizacionais, os quais são estabelecidos no processo de aprendizagem e absorção tecnológica, específicos de cada unidade. Na passagem de um padrão técnico a outro, em cada regime, considera-se “períodos estacionários” que representam lapsos temporais (certos vácuos), necessários à superação de barreiras endógenas (ineficiência ou incapacidade própria), e exógenas (desequilíbrios de preços relativos, políticas industriais desfavoráveis, crises econômicas, sociais etc). Tais conceitos são baseados, principalmente, em Nelson & Winter (1982); Dosi (1988); Carlsson & Stankiewicz (1991); Carlsson et al., (1997); Bell & Albu (1999); Reynaud (2000); Van de Poel (2000); Squazzoni & Boero (2002). CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 152 transição para uma trajetória de padrão competitivo superior (no caso, três regimes distintos, cada qual em uma trajetória específica). Tais fatores são representados através da correlação entre Rotinas e Desempenho29 (Gráfico 4.9) e Rotinas e Recursos30 (Gráfico 4.10). No Gráfico 4.9, no ponto representativo do nível de Rotinas que habilita uma firma à mudança para uma trajetória de desempenho superior (R1,2), em um regime apropriado (segmento em verde), exige que esta adquira um diferencial de desempenho (∆D1,2) que a habilite a operar no nível mínimo de competitividade admitido em tal regime (D2,1), para àquele conjunto de rotinas. Observe que tal ponto corresponde àquele de melhor trade-off para a decisão de mudança para a trajetória seguinte (no caso, os pontos p*, no Gráfico 4.3, e k*, no Gráfico 4.4), a partir do qual, a defasagem de desempenho entre os padrões tende a aumentar, e a mudança, no decorrer do tempo, a exigir uma melhoria adicional. A interpretação é a mesma na mudança para as trajetórias seguintes (no caso da próxima, representada pelo segmento em vermelho). Como a passagem é dependente da trajetória, tal processo é realizado passo a passo, ou seja, não se considera a possibilidade de mudanças através de “saltos” de um regime para outro. Portanto, os períodos estacionários considerados (PE(j-1,j)), representam recursos ou desempenho adicionais que demandam tempo e esforço para serem adquiridos e implementados, como, por exemplo, tecnologias e novos métodos que demandam aprendizagem formal, informal, treinamentos etc. 29 Assume-se aqui que a dinâmica competitiva do sistema em questão possa ser sintetizada e representada pela conjugação de fatores expressos através dessas duas variáveis. O que não quer dizer que não se possa expressar a dinâmica do sistema através de outras variáveis. 30 Recurso aqui é tomado em sentido amplo, envolvendo desde físicos (tecnologias específicas, equipamentos etc), financeiros (capital e direitos) e humanos (trabalho e conhecimento), englobando também, as rotinas e os padrões técnico-organizacionais de cada firma. Rotina seria um tipo específico de recurso dinâmico. CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 153 Desempenho (Dmn) TT3 D3,1 TT2 PE2,3 ∆D2,3 D2,3 TT1 D2,1 PE1,2 ∆D1,2 D1,3 D1,2 PTn D1,1 PT2 PT1 R1,2 Legenda: TTj – Trajetórias tecnológicas (j) RTm – Regimes Tecnológicos (m) PTn – Padrões Técnicos (n) PE(j-1, j) - Períodos Estacionários R2,3 Rotinas (Rmn) ⇒ j={1,2,3}; m={1,2,3}; n={1,2,3} RT1 RT2 RT3 TT1 TT2 TT3 Trajetória competitiva do arranjo Gráfico 4.9 –Trajetória Competitiva em Arranjos Produtivos Locais/1 CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 154 No Gráfico 4.10, o raciocínio é idêntico. Nesse caso, demonstrando uma correlação entre as variáveis Rotinas e Recursos. Quando um certo padrão de Rotinas, em um certo regime, atinge o ponto limite de saturação da capacidade de melhoria, para que uma firma possa mudar para um novo regime, passa a ser requerido um determinado conjunto de Recursos (como, por exemplo, investimento em equipamentos e dispositivos técnicos auxiliares, treinamento dos trabalhadores, organização etc), para que a firma possa operar no padrão técnico mínimo desse regime. Ou seja, nesse caso, o diferencial de desempenho nas rotinas é dependente de um certo conjunto mínimo de recursos. Recursos (Remn) TT3 Re3,1 TT2 PE2,3 ∆Re2,3 Re2,3 TT1 Re2,1 PE1,2 ∆Re1,2 Re1,3 Re1,2 PTn Re1,1 PT2 PT1 R1,2 R2,3 Gráfico 4.10 –Trajetória Competitiva em Arranjos Produtivos Locais/2 Rotinas (Rmn) CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 155 O Gráfico 4.11 mostra uma ilustração na forma de vetores unitários que representam a posição em que o trade-off de mudança para a nova trajetória se tornaria mais favorável, considerando os fatores desempenho e recursos. TT3 Desempenho (Dmn) TT2 TT1 Recursos (Remn) Gráfico 4.11 –Trajetória Competitiva em Arranjos Produtivos Locais/3 O comportamento da firma, e sua capacidade de conjugação própria desses fatores, condicionariam sua aptidão ou não à mudança. No ponto em que uma firma se torna apta, sua posição em relação aos padrões do regime seguinte, definiriam o diferencial necessário (recursos, rotinas, competências etc) a ser adquirido e a direção a ser tomada para a mudança. Um certo período de tempo (PE(j-1, j)) para tal processo está subentendido. Nesse sentido, tal ponto corresponderia ao “ponto de menor dependência da trajetória”. Como se CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 156 considera que tal comportamento se dá em um sistema aberto, devido às incertezas do ambiente, fatores como, por exemplo, as condições de mercado e elementos do ambiente micro, meso e macroeconômico, e a própria estrutura de decisão de investimento, específica de cada firma, interferem e, conseqüentemente, dificultam sua modelagem e a determinação de tal ponto. Teoricamente, uma aproximação a esse ponto poderia ser dada pelo momento em que a taxa de crescimento da curva entra em saturação31. No caso da firma permanecer na trajetória anterior, por não adquirir as condições necessárias à mudança ou, por exemplo, por opção pela estratégia de redução de custos, tal trajetória poderia ser definida como potencialmente autodestrutiva, com a tendência de crescimento das barreiras a uma mudança futura devido à crescente dependência da trajetória. A partir dos conceitos anteriores, Trajetória Competitiva pode ser definida como “uma linha de evolução de padrões de produto, processo e estratégias de mercado, definida a partir dos comportamentos das firmas no processo de adoção, absorção e aprendizagem de novas rotinas vinculadas a novas tecnologias na dinâmica competitiva de certos sistemas produtivos locais”. O modelo introduzido de Trajetória Competitiva se baseia em uma interpretação particular do processo de mudança tecnológica e da dinâmica competitiva das firmas em arranjos produtivos locais, considerando fatores endógenos e exógenos, específicos e gerais do ambiente. As hipóteses consideradas, com base na abordagem evolucionária e nos conceitos dos recursos e competências da firma, são as seguintes: i) Os recursos, experiência, habilidades, competências, estratégias e o conhecimento útil, próprios de cada firma e incorporados em suas rotinas e técnicas, se refletem no desempenho competitivo das firmas; ii) As oportunidades de melhoria técnica e o acesso às trajetórias tecnológicas, através dos respectivos regimes tecnológicos e padrões técnicos e organizacionais, são disponíveis a todas às firmas, porém apenas aquelas que conseguem atingir um padrão mínimo de recursos, rotinas e desempenho, se tornam aptas a migrar para o novo regime (está vinculado ao item i); 31 Apesar de não explorada aqui, devido às contradições com a abordagem evolucionária adotada, essa é uma hipótese com potencial promissor para futura investigação. CAPÍTULO 4 - ROTINAS ORGANIZACIONAIS, ... E O CONCEITO DE “TRAJETÓRIA COMPETITIVA” 157 iii) O padrão de concorrência específico do arranjo, elementos micro-mesodinâmicos do ambiente e as condições de mercado e de infraestrutura da indústria local, condicionam os comportamentos das firmas no processo de mudança. 4.13 Considerações finais sobre o Capítulo A abordagem e os conceitos evolucionários e dos recursos e competências da firma apresentados neste Capítulo constituem a base teórica para a construção e proposição de uma metodologia para o estudo da Trajetória Competitiva de arranjos produtivos locais. Esse será o viés adotado a partir do próximo Capítulo. CAPÍTULO 5 ESTRATIFICAÇÃO TECNOLÓGICA E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS PRODUTIVOS LOCAIS: UMA METODOLOGIA Resumo O ritmo de incorporação de tecnologias mais avançadas é um dos principais fatores condicionantes da competitividade das empresas no ambiente atual. Entretanto, esta incorporação não se dá de maneira homogênea nem simétrica a todas às firmas, provocando um processo que se pode denominar de “estratificação tecnológica competitiva”. Este é decorrente do desempenho de cada empresa em incorporar mudanças técnicas e organizacionais e em adotar estratégias de adaptação às variações de mercado. Pela abordagem evolucionária, tais fatores podem ser captados pela identificação de “traços” (padrões) que se repetem em certos grupos de diferentes de empresas. Como visto no capítulo anterior, tais caracteres ficam embutidos nas rotinas técnicas e organizacionais da empresa, como um tipo de impressão genética que, quando são ativados, se convertem em vantagens ou desvantagens no jogo competitivo. Neste sentido, propõe-se uma abordagem e uma metodologia próprias para o estudo da estratificação tecnológica em arranjos produtivos locais, a partir de uma perspectiva evolucionária da mudança tecnológica e do conceito de trajetória competitiva, definido no capítulo anterior. Inicialmente é apresentada uma revisão das abordagens mais recentes para análise de sistemas produtivos locais, regionais e setoriais. São destacados alguns enfoques para o problema da estratificação de atividades tecnológicas, no âmbito da firma, de setor industrial e em termos de nação. Ao final, são traçadas as considerações prévias sobre a aplicação da metodologia ao caso de um arranjo produtivo específico. CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 159 5.1 Introdução O ambiente competitivo, cada vez mais intenso, tem pressionado as empresas a uma rápida absorção de novas tecnologias para manter ou ampliar mercados e sustentarem vantagens competitivas. Dessa forma, o desempenho econômico local, regional e nacional, depende cada vez mais do grau de utilização das bases existentes de tecnologia, de treinamento profissional e científico, e da exploração econômica eficiente dessas bases. Nesse sentido, a competitividade das firmas é cada vez mais determinada pela tecnologia dominada e pela capacidade de auto-organização (DOSI, 1988; BAUM & SINGH, 1994; DOSI et al.,1995, FAGERBERG, 1995, FREEMAN & SOETE, 1997). Nesse contexto, o desenvolvimento de produtos e processos tecnológicos mais avançados, eventualmente inovadores, é um dos principais pilares para uma empresa obter vantagens competitivas, respondendo às contínuas mudanças exigidas pelo mercado. No debate teórico, novas alternativas de abordagem do sistema econômico têm sido desenvolvidas. Resultados de pesquisas recentes têm sustentado a hipótese de que o ambiente econômico não pode ser considerado como um sistema isolado do sistema social e ambiental (WHISTON, 1994; CLARK et al., 1995; STORPER, 1997; MASKELL et al,.1998; MEYER-STAMER, 1998; SACHS, 2001; WILKINSON, 2002). Por outro lado, aquelas mais tradicionais têm passado por algumas modificações para incorporar novas variáveis e restrições. Contudo, pelas próprias características do método científico tradicional, ao menos nesse campo da ciência, o avanço tem sido mais consistente na destruição de velhas convicções do que na afirmação de antigas teorias. Outro aspecto é que os modelos conceituais, muitas vezes, só sofrem mudanças a partir de constatações empíricas. Isto pode ser atribuído ao fato da dinâmica das mudanças no ambiente socioeconômico ser sempre mais veloz e mais abrangente que sua incorporação aos modelos conceituais. Esta é uma contradição que tem condicionado este campo científico (CLARK et al., 1995). Nesse sentido, os conceitos tradicionais de algumas variáveis também têm sido revistos. A “tecnologia”, antes vista como simples elemento residual, tem agora seu conceito ampliado, passando a envolver múltiplas facetas. O avanço tecnológico tem movido o conceito padrão de choques exógenos para um crescente entendimento dos elementos endógenos na criação de novas tecnologias e estímulos ao crescimento (STORPER & ALLEN, 1992; LUNDVALL, 1992; CHANDLER Jr. et al., 1999). CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 160 Pela visão econômica Neoclássica tradicional1, todas a firmas estariam em igualdade de condições para implementar e competir com uma nova tecnologia. Por este ponto de vista, a implementação desta nova tecnologia se daria de forma uniforme através do setor ou segmento, tendendo para um ponto de convergência onde todas as firmas dominariam de maneira completa a referida tecnologia. Esta visão não contempla diversidades de espaço-tempo, nem capacidades próprias e competências específicas regionais e locais. Pelo enfoque do Crescimento Econômico Endógeno (também Neoclássico), fatores internos podem levar ao sucesso ou ao fracasso na implementação de uma nova tecnologia, que ocasionaria certos desníveis ou atrasos, e justificaria períodos de estagnação. Porém, não pressupõe diversidade e vínculos não comerciais que afetem o desempenho das firmas (MULDER et al., 2001). Alternativamente, a abordagem pela Teoria Evolucionária pressupõe um ambiente seletivo e dinâmico, onde a capacidade de adaptação à mudança dos agentes, pode determinar quais serão bem sucedidos e quais estarão fadados à “exclusão”. Isto não quer dizer que esta adaptação deve ser autóctone e independente. A idéia neoclássica de otimalidade de uma função de utilidade é substituída por um comportamento de busca passo a passo de melhores condições e de uma disputa pela sobrevivência, onde a satisfação é apenas temporária. Nesta visão, o ambiente competitivo é condicionado, principalmente, pelo grau de variedade, pela eficiência e eficácia dos mecanismos de seleção, e pelos efeitos do processo de “destruição criativa” e de “dependência da trajetória2” (NELSON & WINTER, 1982; DOSI, 1988; ALLEN, 1994; MEYERSTAMER, 1998; VERSPAGEN, 2001). Um aspecto característico nessa linha de pensamento é que a visão tradicional de inovação tecnológica linear e unidimensional, baseada nos conceitos de science push and technology pull (ou marketing pull), tem sido ampliada, e, em alguns casos, substituída por uma apreciação mais complexa, incorporando diferentes aspectos além daqueles tradicionais de alta e baixa tecnologia e de tecnologia do produto e de processo (NORTH 1 Nos modelos neoclássicos tradicionais, considera-se que os atores econômicos buscam a maximização dos seus objetivos. Além disso, aquisição e absorção de novas tecnologias se dão de maneira uniforme e simétrica, indistintamente a todas as firmas (Mulder et al., 2001). Ver também, Capítulo 2 em Malecki (1997). 2 Esse conceito é abordado em detalhes no Capítulo 3. CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 161 & SMALLBONE, 2000). Neste aspecto, tecnologia e inovação são cada vez mais vistos mais como um processo interativo entre homem, organização e contexto ambiental, e relacionados a ativos invisíveis e a conceitos evolucionários (DOSI, 1988; BAUM & SINGH, 1994; EDQUIST, 1997; PAVITT, 1999; ZIMAN, 2000; SAVIOTTI & NOOTEBOOM, 2000). Assim, conceitualmente, o termo “inovação tecnológica” muda de sentido, pois a “inovação” descola-se do conceito tradicional de “tecnologia” para uma visão mais ampla e sistêmica, incorporando aspectos ambientais, políticos, sociais e culturais, além dos de mercado. Nesse contexto, a mudança tecnológica no âmbito da firma pode ser entendida como um processo de crescimento, influenciado por fatores endógenos (trajetórias, rotinas organizacionais, estratégias etc), bem como pela configuração local onde elas se situam (clusters, distritos, setores, blocos etc.). A dinâmica deste processo envolve busca e adoção de novas tecnologias, exploração, adaptação e imitação (DOSI, 1982). Pressões competitivas de novas tecnologias, ou correlatas, e desafios ou ideais visionários dos lideres, além das características do ambiente no qual se inserem, contribuem para acelerar o processo de mudança e inovação. Novos estudos, principalmente empíricos, têm procurado refletir este novo ambiente econômico (NELSON, 1993; DOSI, 1995; CHANDLER Jr. et al., 1999; PACI & USAI, 2000). Por outro lado, a infra-estrutura e o ambiente regional assumem papel determinante nas novas abordagens do desenvolvimento econômico3. Muitos estudos nesse sentido têm tido destaque na literatura (ver, por exemplo, PORTER, 1989; BENKO & LIPIETZ, 1994; NELSON, 1993; MALECKI, 1997; COOKE et al., 1997; MALECKI & ÖINAS, 1998). Entretanto, estes estudos focam quase que apenas em países centrais e exclusivamente em setores industriais altamente avançados, que poderiam ser posicionados no nível mais elevado de uma escala de evolução tecnológica hipotética, cujo fator determinante da 3 A distinção entre o conceito de “desenvolvimento” e “crescimento” econômicos nem sempre é tratada de forma explícita na literatura. As teorias tradicionais (neoclássicas) tratavam o “desenvolvimento” como sinônimo ou conseqüência natural do “crescimento econômico” (aumento total da riqueza, no sentido vertical, hoje medido pelo PIB). Uma visão geral das teorias que tratam deste tema é apresentada em Souza (1999). Essa discussão voltou a ganhar destaque a partir da I Conferência Mundial para o Desenvolvimento Sustentável (RIO-ECO92), realizada no Rio de Janeiro, há dez anos, quando foi proposta e aprovada a chamada Agenda 21 (um ambicioso conjunto de recomendações e ações para preservar as condições de vida futura no planeta, baseada num modelo de desenvolvimento apoiado em três pilares: avanço econômico, progresso social e proteção do meio ambiente). Atualmente, tem crescido a convicção de que o “desenvolvimento” não pode ser tratado apenas de forma macroeconômica, necessitando de soluções regionais e locais (Meyer-Stamer, 1998; Sachs, 2001; Wilkinson, 2002). Para um ensaio conceitual do desenvolvimento regional, sob o ponto de vista da abordagem evolucionária, ver Souza (2002). CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 162 competitividade é a inovação. O emprego dessas abordagens e metodologias, ipsis litteris, ao estudo de arranjos produtivos locais (aglomerados de forma geral) de indústrias tradicionais, menos densos em termos de tecnologia, tem gerado um vazio na interpretação e pouco contribuído para o entendimento da dinâmica do desenvolvimento de sistemas produtivos locais, principalmente de regiões periféricas. Há a necessidade de criação de abordagens que captem as diversidades locais e regionais e as diferenças entre firmas de um mesmo arranjo produtivo em termos de dinâmica competitiva e tecnológica. Permanece, entretanto, uma lacuna entre as teorias e conceitos evolucionários e os métodos empregados para a análise de ambientes pouco evoluídos tecnologicamente, mas fundamentais para a economia de certas regiões periféricas, cuja mudança se dá de maneira lenta e, muitas vezes, somente induzidas pelo poder público. Metodologias e abordagens adequadas para a análise desses micro-sistemas produtivos, e a consideração de conceitos não-estáticos em nível microrregional e/ou meso-econômico, necessitam ser adaptadas (VERSPAGEN, 2001). Uma dificuldade é que não existem metodologias gerais que considerem aspectos dinâmicos evolutivos e, ao mesmo tempo, características locais e setoriais. Abordagens específicas têm de ser construídas. Nestes casos, há a necessidade de estudos empíricos de elementos intrafirma e das relações interfirmas e de segmentos de cadeias industriais que permitam a análise dos agentes e, ao mesmo tempo, do contexto no qual se inserem. Na análise de problemas de segmentos microrregionais e de aglomerados industriais pouco competitivos fora da esfera regional, algumas questões ainda persistem. Uma das principais é como analisar estes sistemas produtivos locais empregando conceitos de sistemas dinâmicos (evolucionários), se as metodologias de análise tradicionais são estáticas (como, as matrizes de insumo-produto e outras técnicas de análise de fluxos comerciais entre setores em cadeias produtivas, ou o Diamante de Porter). Estas abordagens não permitem uma visão da tendência evolutiva do sistema, nem captam a dinâmica de micro-segmentos de cadeias, como os pequenos arranjos produtivos locais, principalmente aqueles típicos de regiões periféricas, quando tal dinâmica é pouco expressiva em termos comerciais (MYTELKA, 2000). Sob esse ponto de vista, propõe-se uma metodologia própria para o estudo da competitividade de firmas em arranjos produtivos locais, a partir de uma abordagem evolucionária da estratificação tecnológica nesses ambientes. Inicialmente é feita uma CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 163 revisão de metodologias para caracterização tecnológica de países, setores e empresas, para análise de sistemas produtivos locais, regionais ou setoriais. Logo após, são apresentadas algumas abordagens do problema da estratificação de atividades tecnológicas, respectivamente, no âmbito da firma, do setor industrial e em termos de nação. A abordagem é baseada em conceitos da teoria evolucionária de mudança técnica e econômica (ver, por exemplo, NELSON & WINTER, 1982; DOSI, 1982; ARTHUR, 1994; DOSI & NELSON, 1996; CLARK et al., 1995), na perspectiva dos recursos, competências e comportamento das firmas (principalmente, PENROSE, 1959; CYERT & SIMON, 1963; COHEN & LEVINTHAL, 1990; GRANT, 1991; TEECE & PISANO, 1994; REYNAUD, 2000) e de novos avanços no estudo da economia regional e do desenvolvimento econômico local (neste caso, STORPER, 1997; MALECKI & ÖINAS, 1998; MASKELL et al., 1998; WILKINSON, 2002). A metodologia proposta é apresentada ao final, com uma ilustração para arranjos produtivos típicos. São utilizados dois referenciais como parâmetros comparativos: (i) um intrínseco à própria firma (endógeno), a partir da mudança tecnológica e os efeitos em suas rotinas e competências internas; e outro, (ii) relativo ao arranjo (exógeno), para a análise da trajetória e regimes tecnológicos, em relação a um referencial competitivo externo (outros arranjos típicos, do mesmo segmento, com trajetória similar). 5.2 A Análise de sistemas industriais e a abordagem evolucionária Para se estudar, entender e caracterizar a dinâmica da infra-estrutura científica, tecnológica, econômica e social, envolvida no processo de avanço tecnológico, novos conceitos e abordagens metodológicas têm sido propostos, principalmente em nível nacional (PORTER, 1989; LUNDVALL, 1992; NELSON, 1993). Mais recentemente, vários autores têm tentado estender estes conceitos para análise de regiões (sub-nacionais) e setores (COOKE et al., 1997; de la MOTHE & PAQUET, 1998). Uma característica comum a todas estas abordagens, é que a “força-motriz” do desenvolvimento econômico está nas inovações, e pressupõe um sistema tecnológico, como pioneiramente defendido por Schumpeter (1934) e, posteriormente ampliado pelos neo-schumpeterianos4. 4 De fato, como o próprio Schumpeter reconheceu, a visão do crescimento econômico baseado na competição tecnológica (inovação e difusão) tem raízes na “Economia de Marx”. Neste caso, é assumido que tanto a inovação como a imitação (catching-up) conduzem ao crescimento. Porém, a estratégia de imitação não CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 164 Schumpeter (1934), em seus estudos seminais sobre o papel do avanço tecnológico sobre a economia, distinguiu cinco tipos de inovações: (i) introdução de um novo produto ou uma modificação qualitativa em um já existente; (ii) novo processo para uma indústria; (iii) abertura de um novo mercado; (iv) desenvolvimento de novas fontes de suprimento de matéria-prima ou outros insumos; e (v) mudanças em uma organização industrial. Na análise evolucionária ou neo-schumpeteriana, o processo de inovação das firmas é determinado por seu comportamento, através de sua capacidade de absorver conhecimento, aprender a partir de experiências exógenas e endógenas, individuais e coletivas, de concepção, produção e comercialização de bens e serviços e de interações com outras organizações e instituições (FREEMAN, 1994; METCALFE, 1995; DOSI & NELSON, 1996; SAVIOTTI & NOOTEBOOM, 2000; VERSPAGEN, 2001). Erik Dahmém, ao incorporar uma visão de sistema em seu estudo épico sobre as dinâmicas das concentrações urbanas industriais na Suécia, as quais denominou de “Blocos de Desenvolvimento”, provavelmente tenha realizado o primeiro trabalho com uma abordagem baseada (CARLSSOM, 1997). em conceitos Segundo da dinâmica Carlssom (1997), evolucionária Dahmén schumpeteriana definiu “bloco de desenvolvimento” como “seqüências de complementaridades que, através de uma série de tensões estruturais (desequilíbrios), podem resultar em uma situação balanceada”. Ele focou no papel do empreendedorismo e dos empreendedores, e nas condições requeridas para se poder tirar vantagem de novas oportunidades de negócios, o que provocaria tensões entre recursos disponíveis e a capacidade de explorá-los comercialmente. Depois do estudo pioneiro de Dahmém, houve um longo período até surgirem novas abordagens de sistemas na literatura econômica industrial. Porém, no final da década de 80 e ao longo da década de 90, foi publicada uma série de estudos utilizando o conceito de “Sistema Nacional de Inovação” (DOSI et al., 1988; NIOSI, 1991; LUNDVALL, 1992; NELSON, 1993). Nestes trabalhos, há uma ênfase nas interações entre instituições e atores, principalmente aqueles ligados à área de Ciência e Tecnologia (C&T). A análise foca no papel da política tecnológica em diferentes países, considerando um certo período de permitiria se sobrepor aos “líderes tecnológicos” e, de uma certa forma, sua adoção perpetuaria a condição de mero agente seguidor. Por outro lado, os riscos assumidos seriam menores, o que poderia justificar sua adoção em certas condições. A esse respeito, ver Rosenberg (1984), Fagerberg (1995) e Freeman & Soete (1997). CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 165 tempo. Estas análises envolvem instituições de P&D, Universidades, Institutos de Pesquisa, agencias e políticas de governo. A firma é apresentada como um núcleo de habilidades, competências e conhecimentos tecnológicos e organizacionais (FREEMAN, 1994; DOSI et al., 1995). A partir desta abordagem, os autores desta corrente identificaram, e passaram a considerar, formas diferentes de aprendizado (learning by doing, by using, by interacting, by searching, entre outras). Posteriormente, foi observado também que a taxa de aprendizado depende fundamentalmente de um conjunto de interações com múltiplas fontes internas e externas de informações e de conhecimento. Essas interações criariam uma interdependência sistêmica, não formal, nos sistemas produtivos dos respectivos atores, dando origem ao que passou a ser denominado de “Sistema de Inovação” (ver, por exemplo, LUNDVALL, 1988; EDQUIST, 1997). Conseqüentemente, a estrutura produtiva do ambiente considerado (país ou região), com seus aspectos históricos e culturais, condicionaria tal sistema (COOKE et al., 1997). Outra abordagem amplamente conhecida, e talvez a mais empregada para análise de aglomerados e clusters, é o chamado “Diamante de Porter5”, descrita no livro de Michael Porter “A vantagem competitiva das nações” (PORTER, 1989), a partir de estudos empíricos em diversos países. Esta foca essencialmente em aglomerados industriais (clusters), suas estratégias e competitividade. Os quatro lados do diamante são constituídos por condições de fatores (habilidades, tecnologias, capital, etc.), condições de demanda, elos para relacionar e auxiliar indústrias e estratégia das firmas, estrutura e competição. Cada atividade econômica é vista como parte de um cluster de atividades e agentes, ao invés de isoladamente. Seguindo o pensamento schumpeteriano, Carlsson & Stankiewicz (1991) propõem o conceito de “Sistema Tecnológico”, locus do progresso técnico e do impulso econômico. Uma das hipóteses básicas consideradas é que as oportunidades tecnológicas que se apresentam aos agentes econômicos são ilimitadas, sendo que o trabalho destes agentes está em identificá-las e explorá-las, de acordo com suas capacidades e competências. Nesse aspecto, algumas áreas do conjunto de oportunidades globais têm sido amplamente exploradas e mapeadas, outras não. A natureza do conhecimento em cada área determina os modos pelos quais novas descobertas são feitas a partir de novas combinações do 5 Tal abordagem é comentada em detalhes no Capítulo 2. CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 166 conhecimento previamente dominado. Identificar novas oportunidades e encontrar novos modos de explorá-las pode requerer a combinação de busca ou monitoramento global e pesquisa e desenvolvimento local. Esta dinâmica forma o que eles denominam de Sistema Tecnológico. Este sistema que é caracterizado por quatro fatores: (i) a natureza do conhecimento e mecanismos disseminadores ou difusores (spillovers), (ii) a capacidade de absorver competências de várias fontes, (iii) o grau de conectividade entre as várias partes do sistema e (iv) o vigor da criação de variedade e mecanismos de seleção. Saxenian (1994), utiliza uma abordagem em torno do conceito denominado de “Sistemas de Inovação Local”. Através de um estudo da indústria eletrônica do Vale do Silício, Califórnia, e ao longo da Route 128 em Massachussets, seu trabalho focou nas diferenças de cultura e competição, grau de hierarquia e concentração, experimentação, colaboração e no aprendizado coletivo, o que têm provocado diferenças na capacidade de ajuste a mudanças nas circunstâncias de mercado naqueles dois pólos tecnológicos americanos. Contudo, esse trabalho não propôs nem adotou uma abordagem própria para o estudo desses sistemas, limitando-se apenas ao estudo e descrição das diferenças dos processos de surgimento e de crescimento dos aglomerados estudados. Outra proposta para análise da competitividade de clusters setoriais é denominada de “Sistemas Setoriais de Inovação” (BRESCHI & MALERBA, 1997; ESSY, 2001; MALERBA, 2001). Este conceito baseia-se na idéia de que diferentes setores, ou indústrias, operam sob certos “regimes tecnológicos”6 que são caracterizados por combinações particulares de oportunidades e condições de apropriabilidade, graus de cumulatividade de conhecimento tecnológico e fatores relativos às características específicas do conhecimento requerido em certos setores econômicos. Apesar da denominação, esta proposta é mais próxima, e até similar em alguns pontos, à análise de Porter, focando nas relações competitivas entre firmas e procurando considerar explicitamente o papel da seleção pelo ambiente. Vale destacar que no Brasil, uma série de estudos tem sido desenvolvida sob a denominação de “Arranjos e Sistemas Produtivos Locais”, utilizando o conceito geral de Sistemas de Inovação, aplicado a aglomerados locais (CASSIOLATO & LASTRES, 6 Referindo-se aos padrões técnicos vinculados a certas tecnologias que caracterizam grandes setores industriais, o qual é mais amplo que o conceito de “regime tecnológico” adotado neste trabalho (vide Seção final do Capítulo 4). CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 167 2000). Estes trabalhos dão destaque para o levantamento histórico de formação desses arranjos, a análise da influência das instituições de suporte às atividades de ciência e tecnologia e a proposição de políticas públicas de apoio e sustentação desses sistemas. Neste caso, os principais fatores considerados são: (i) a dimensão local do aprendizado, da capacitação e da inovação; (ii) o processo de globalização e os sistemas nacionais, supra e subnacionais de inovação; (iii) o papel de arranjos produtivos locais e sua capacidade; e (iv) o novo papel e objetivos das políticas de desenvolvimento científico e tecnológico, tendo em vista as dimensões supranacional, nacional, regional, estadual e local (CASSIOLATO et al., 2000). Encontram-se também incluídos nessa série, outros trabalhos que utilizam a abordagem de cadeias produtivas7 e redes8 (ver, por exemplo, BERNARDES, 2000). Entretanto, nesses estudos não há uma proposta conceitual adaptada às questões locais, e a análise limita-se à esfera empírica. Em muitos casos, a configuração e a existência de um “Sistema de Inovação Local” não fica clara, e conseqüentemente, a contribuição para o entendimento da dinâmica do arranjo torna-se vaga. Apesar da ênfase nas inter-relações entre instituições e no processo histórico, o emprego da abordagem de Sistemas Inovação para o estudo de arranjos produtivos locais pouco dinâmicos, principalmente aqueles localizados em regiões periféricas, também requer adaptações. O próprio conceito de “inovação” nesses ambientes não pode ser o mesmo de clusters de alta tecnologia de países avançados9. 7 Cadeia produtiva, no conceito amplo, refere-se ao conjunto de etapas consecutivas pelas quais diversos insumos vão sendo transformados e transferidos, em um ou vários processos produtivos, até chegar aos consumidores finais. Outra definição, mais especifica, o considera como a seqüência de setores econômicos unidos entre si por atividades significativas de compra e venda. Ou seja, trata especificamente de fluxos comerciais. A origem deste conceito é atribuída a uma derivação do termo filière (literalmente, “teias”), concebido por economistas franceses, entre os quais, Toledano (1978) e Truel (1980), apud Dosi (1988); e Perroux (1977) e Bellon (1983), apud Haguenauer & Prochnik (2000). 8 O conceito de “redes de firmas” é uma ampliação do conceito de cadeias. Geralmente é considerado como “arranjos interorganizacionais baseados em vínculos sistemáticos – muitas vezes de caráter cooperativo – entre firmas formalmente independentes, que dão origem a uma forma particular de coordenação das atividades econômicas” (Britto, 1999:3). Neste trabalho, são apresentados os diversos tipos de redes, seus desdobramentos nas relações industriais e uma sistematização das abordagens teóricas sobre redes. 9 Neste caso, como afirma Cantwell (2001) a própria teoria schumpeteriana de inovação precisa ser revisitada, pois, a formulação original enfatizava a necessidade de se identificar fontes originais de inovação em oposição ao processo de difusão e de imitação subseqüente, de modo a determinar a distribuição de “lucros inovativos”, ou seja, aqueles apropriados pelo empreendedor pioneiro. Essa ênfase no papel do “primeiro inovador”, e a conseqüente tendência em se negligenciar o papel dos seguidores, considerando-os como meros “imitadores”, levam a obscurecer muitos fatores importantes da dinâmica competitiva, como os CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 168 Em um artigo publicado em meados da década de 90, Meyer-Stamer (1995) já questionava a existência de um “Sistema” de Inovação Industrial no Brasil. Sua argumentação baseia-se no fato de haver pouca interação entre as universidades e centros de pesquisa e o meio empresarial, o que, segundo o autor, justificaria o baixo desempenho do país em termos de inovações e patentes. Adotando conceito de Sistemas Regionais de Inovação, o trabalho de Maculan & Carleial (1999) levou a conclusões semelhantes, através do estudo do processo de aprendizagem em redes de sub-contratação de micro e pequenas empresas e incubadoras em regiões do sul do Brasil. Apesar de representar importantes contribuições do ponto de vista de divulgação da necessidade de estudos empíricos para se entender a dinâmica de tais configurações produtivas, as abordagens anteriormente citadas, demonstram que há necessidade de se avançar mais em termos conceituais e metodológicos para se entender a dinâmica interna das aglomerações produtivas locais, principalmente em relação à análise de fatores de diversidade, como, por exemplo, o desempenho relativo entre as empresas, os efeitos de dependência da trajetória, as estratégias competitivas e as segmentações de mercado. Nesse sentido, há a necessidade de se ir além da proposição de novas denominações e taxonomias para se estudar tais ambientes. A seguir, as três primeiras abordagens anteriormente apresentadas, por serem as que mais apresentam contribuições conceituais, a seguir, são consideradas em mais detalhes. 5.2.1 Sistemas de inovação e o diamante de Porter A abordagem de Sistemas de Inovação (SI) não assume como hipótese básica uma relação de causa e efeito, determinística, nem pretende prover respostas, por si mesma, de como o sistema evolui no tempo. Conseqüentemente, não indica ferramentas ou métodos a empreender na análise dos sistemas10. O conceito de SI é visto como “holístico”, e como efeitos de dependência do contexto local, as capacidades individuais de absorção de novas tecnologias, adaptações e contribuições próprias (DOSI et al., 1994). 10 Uma proposta recente, sob o conceito de Triple Helix, busca caracterizar a inovação em um ambiente evolucionário e socialmente construído, baseado na interação das instituições do tripé governo-universidadeempresa, a partir de fluxos de informação e comunicação. Neste caso, assume-se a reformulação dos papeis e atribuições das instituições pilares do modelo (ver, por exemplo, Leydersdorff & Etzkowitz, 1998a; Leydersdorff & Etzkowitz, 1998b). CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 169 tal, em termos metodológicos surgem dificuldades analíticas para sua aplicação. Entre as questões problemáticas11, na conceituação dessa abordagem, dois podem ser considerados os principais: (i) a definição dos limites do sistema; e (ii) o tratamento da diversidade institucional. De modo a entender melhor as similaridades e diferenças entre a abordagem de SI e as mais tradicionais, utilizaremos como referencial o modelo “diamante de Porter” (1989), amplamente conhecido e empregado na análise de competitividade. Como aspectos disciplinares distintivos entre as duas abordagens, podemos citar que, enquanto a abordagem de SI está mais vinculada ao processo de inovação tecnológica (IT) e ao campo da ciência e tecnologia (C&T), o diamante de Porter, refere-se essencialmente à arena competitiva comercial e à gestão empresarial. Como métodos analíticos, ambas abordagens compartilham similaridades, como na tendência em focar os fundamentos para entender o comportamento dos sistemas. Em sua abordagem, Porter (PORTER, 1989: xvi) busca uma nova visão da vantagem competitiva centrada na habilidade de uma nação em utilizar produtivamente seus insumos e recursos. Pelo desenvolvimento do conhecimento como uma vantagem competitiva dinâmica, que, para ele pode ser criada, a análise é efetuada em vários níveis, através de elementos da economia de uma nação, focalizando clusters industriais e as interações entre os fatores do “diamante”. Dessa forma, é presumido que para uma economia nacional, o estado do sistema, ou seja, seu desempenho comercial e sua prosperidade podem ser razoavelmente explicados pela análise dos estados dos seus elementos e suas relações complexas. Entretanto, ficam evidentes outras preocupações: “... meramente usar os recursos disponíveis, ou reunir mais recursos não é suficiente para alcançar prosperidade. Nem redistribuir as riquezas da nação entre grupos de interesse” (Porter, 1989: xii). Há uma forte atenção na busca dos micro-fundamentos dos fenômenos macroeconômicos: “... Reformas macroeconômicas são necessárias, mas não suficientes...” tão importantes são os micro-fundamentos do desenvolvimento para responder às seguintes questões: Qual o próximo passo? O que fazer após o ajuste macroeconômico e a estabilização...”(PORTER, 1989: xvi). O Quadro 5.1 sintetiza as características analíticas entre SI e o “Diamante”. 11 Para uma avaliação conceitual, e detalhes das deficiências específicas dessa abordagem, ver Radosevic (1998). CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 170 Quadro 5.1 - Aspectos característicos distintivos entre SI e o modelo de Porter Critério Sistemas de Inovação Diamante de Porter A melhoria na eficiência da aprendizagem é O crescimento da produtividade é a a fonte para a “inovatividade” de uma fonte da prosperidade de uma nação. nação Nação; Nação, região, setor; Cluster (indústria, região); Cluster (indústria, região); Firma; Instituições de conhecimento Firma. público (infra-estrutura educacional e de Unidade analítica C&T); Redes de transferência de conhecimento; Sistema tecnológico Entre tecnologia e instituição: Entre os elementos do diamante: Processo Trajetórias tecnológicas; Estratégia da firma; estrutura e dinâmico/causa concorrência; Teoria do ciclo de vida da tecnologia; Condições de fatores; Dependência da trajetória (pathIndústrias vinculadas e auxiliares. dependence); Learning by doing, by using, and by interaction; Transferência de conhecimento Disciplina vinculada Inovação tecnológica Gestão empresarial Direcionamento C&T Comércio e negócios Fonte: Porter (1989); Edquist (1997); Carlsson, (1997), Gu (2000) Hipótese central De uma forma geral, a abordagem de Sistemas de Inovação enfatiza os aspectos institucionais e histórico-culturais de certas regiões que formam um ambiente fértil em idéias e as interações entre atores público-privados, que tornam tais regiões mais propícias ao surgimento de inovações que outras (ver ACS, 2000). Nessa abordagem há um predomínio absoluto de pesquisas empíricas que buscam identificar e diagnosticar fatores e características que proporcionaram o surgimento do denominado “sistema de inovação local/regional”, em regiões como o Vale do Silício (SAXENIAN, 2000), País Basco (COOKE et al., 1997), Emília Romagna e Baden-Württemberg (COOKE & MORGAN, 1998), Catalunha, Toscana, País de Gales (BRACZYK et al., 1998), e outros casos de regiões prósperas a partir de atividades industriais baseadas em tecnologia, conhecimento e cooperação institucional. Por outro lado, há uma dificuldade de se trabalhar estas abordagens em sistemas produtivos tecnologicamente defasados, nos quais não se pode considerar um “sistema de inovação” ou os fatores do “diamante” não são plenamente estabelecidos. Nestes ambientes, fatores mais “primitivos”, mas importantes para a formação da competitividade das empresas e o fortalecimento dos aglomerados, são condições essenciais para o CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 171 crescimento econômico do sistema, e não podem ser negligenciados. Entre tais fatores, pode-se incluir, aspectos operacionais, como a redução dos desperdícios, o aumento da produtividade e da qualidade dos produtos e serviços, e outros mais estruturais, como a formação de coalizões para a eliminação de barreiras à absorção de novas tecnologias e promoção da cooperação institucional. 5.2.2 Sistemas tecnológicos Na visão de Leoncini (1998), um sistema tecnológico é constituído por quatro principais pilares: (i) fontes de conhecimento científico e tecnológico; (ii) uma constelação de sistemas técnicos; (iii) o ambiente mercadológico; e (iv) uma interface institucional. Esta estrutura está em um subsistema aberto, constantemente exportando entropia de modo a manter a estabilidade, e seu comportamento auto-organizado resulta da microdiversidade do ambiente. Fluxos de matéria e informação são, assim, os principais determinantes do comportamento do sistema (ver ilustração na Figura 5.1). Fontes de conhecimento Interface institucional Sistema técnico Interface institucional Mercado (demanda) Figura 5.1 – Representação de um Sistema Tecnológico (adaptado de Leoncini, 1998) CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 172 Uma das hipóteses básicas da abordagem de Sistemas Tecnológicos é que as oportunidades tecnológicas e o conjunto global de possibilidades disponíveis aos agentes econômicos são ilimitados. Nesse aspecto, entretanto, o primeiro problema que cada agente enfrenta é como identificar e explorar sucessivamente um pequeno subconjunto de oportunidades. Uma das principais restrições é que “ganhar competência” é um processo contínuo no qual não se pode “queimar etapas”. O estudo de sistemas tecnológicos sugere que há quatro fatores principais em tais sistemas que determinariam sua performance, isto é, o grau de exploração bem sucedida das oportunidades econômicas, de acordo com alguns elementos característicos: (1) a natureza do conhecimento e mecanismos spillovers; (2) a competência receptiva (ou capacidade de absorção, na terminologia de Cohen & Levinthal (1990)), por parte de vários atores; (3) a conectividade entre várias partes do sistema; (4) o vigor de mecanismos de seleção e de criação de variedade. O Quadro 5.2 sintetiza tais conceitos. Como destacado por Carlssom (1997), em algumas áreas, o conhecimento requerido para exploração satisfatória das oportunidades é altamente específico (permanecendo restrita a uns poucos atores), enquanto que em outras, onde é necessário apenas um conhecimento mais geral (na forma de um vasto conjunto de habilidades), fica acessível e disponibilizada a muitos atores. Entretanto, algumas vezes, novas descobertas alteram radicalmente o potencial econômico e a acessibilidade de uma tecnologia, gerando amplas mudanças em um ou vários Sistemas Tecnológicos. Estas idéias estão vinculadas ao conceito de dependência da trajetória. Em determinadas áreas, devido às suas próprias características dinâmicas e perspectivas de lucro, apoiadas em estruturas socioeconômicas, políticas e regulatórias, as oportunidades globais têm sido amplamente mapeadas e exploradas (por exemplo, as indústrias de telecomunicações, microeletrônica, automóveis, petróleo etc), seguindo uma certa trajetória de desenvolvimento definida (CARLSSOM, 1997). Em outras (aquelas que dependem ainda de maior viabilidade técnica e econômica ou avanço científico), as oportunidades ainda permanecem inexploradas. Algumas áreas são altamente acessíveis, com rotas de acesso bem construídas e regras e normas bem estabelecidas. Nessas áreas, o conhecimento é altamente codificado e potenciais usuários com os equipamentos apropriados, principalmente o financeiro, podem ter acesso à tecnologia. Isto resulta em uma curta distância entre a fronteira da ciência e as práticas industriais de ponta. Outras CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 173 áreas são pouco exploradas e conhecidas pelo homem, e não são ainda plenamente incorporadas às atividades econômicas (como fusão nuclear, engenharia genética, possibilidade de variação da velocidade da luz etc). Nesse caso, o acesso é mais difícil e o sucesso comercial fruto de grandes investimentos em pesquisa experimental e o risco muito maior, pois sofre influências de fatores imprevisíveis. Quadro 5.2 – Estrutura analítica de Sistemas Tecnológicos Fatores 1. Natureza do conhecimento e mecanismos spillovers 2. Receptividade de competência 3. Conectividade 4. Mecanismos de criação de variedade Elementos 1.1 Definição do sistema 1.2 A natureza do conhecimento: 1.2.1Tácito x codificado ou articulado 1.2.2 Componentes arquiteturas 1.2.3 Incorporado x desincorporado 1.3 Mecanismos spillovers: quem? como? 2.1 Pioneiros (prime movers): 2.1.1 Quem gera/expande a visão? 2.1.2 Quem toma as iniciativas iniciais? 2.1.3 Empreendedorismo 2.2 Como se cria a massa crítica? 2.3 Falhas de mercado/obstáculos? 2.4 Como foram superados os obstáculos? 2.5 O papel das instituições e políticas públicas: 2.5.1 Fonte e papel do capital de risco 2.5.2 Papel das finanças e do mercado financeiro 2.5.3 Papel da academia 2.5.4 Papel da política educacional: 2.5.4.1 Proativa x reativa 2.5.5 Elos internacionais 3.1 Importância da proximidade/aglomeração e em qual sentido? 3.2 Relações fornecedor-usuário 3.3 Redes de resolução de problemas 3.3.1 Características das redes 3.3.2 Quem construiu as redes? 3.3.3 Instituições-ponte 3.3.4 Papel dos grupos de negócios/empresas 3.3.5 Papel das políticas públicas 3.5 Redes formais/pessoais 4.1 Visão avançada – como se caracteriza? 4.2 Dependência da trajetória; efeitos de “travamento” (lock-in) 4.3 Entrada e saída 4.4 Impulsos internacionais 4.5 Papel das políticas públicas CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 174 Nesse sentido, a natureza do conhecimento em cada área determina os modos pelos quais novas descobertas são feitas. Além disso, novas combinações são baseadas, principalmente, no estoque de conhecimento previamente acumulado (dependência da trajetória). Isto significa que o potencial para spillovers tecnológicos, e seus pré-requisitos, variam entre diferentes áreas. Assim, identificar novas oportunidades e meios (tecnologias) para explorá-las podem requerer uma combinação de busca global e P&D local (CARLSSOM, 1997; LEONCINI, 1998). Uma consideração a respeito dessa abordagem é que seu foco principal é em uma tecnologia em particular, a partir da qual se analisam as várias dimensões que tocam o ambiente econômico e suas interações. Conseqüentemente, não são considerados aspectos de natureza regional e local, que influenciam a localização de empresas e a formação de aglomerados e clusters industriais, e suas contribuições para o desenvolvimento econômico local. Seguindo implicitamente uma abordagem baseada na concepção de Sistemas Tecnológicos (ver CARLSSOM, 1997), Squazzoni & Boero (2002)12 afirmam que este campo de estudo representa “uma nova agenda de pesquisa”, para onde convergem conceitos da abordagem evolucionária, da economia regional e da organização industrial. Nesse trabalho, os autores propõem o conceito de “engenharia institucional” para tratar problemas específicos a certas tecnologias (SQUAZZONI & BOERO, 2002: 2). Considerando seu limite de escopo, o trabalho ora apresentado busca contribuir para o estabelecimento e a consolidação desta nova agenda de pesquisa. O desbravamento desse novo campo implica no estudo da dinâmica competitiva e na caracterização da evolução de certas trajetórias tecnológicas que afetam as trajetórias competitivas de aglomerados produtivos locais. 12 Nesse trabalho é proposto um tratamento computacional (através de simulações) do comportamento de distritos industriais, através da avaliação de mudanças nos padrões técnicos na adoção de terminadas tecnologias e no processo de aprendizagem técnica e organizacional. Estes autores se baseiam nos conceitos CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 175 5.3 Estratificação tecnológica O estudo da formação da competitividade de empresas, setores, indústrias e países, devido ao caráter estratégico que representa para o crescimento industrial e para o desenvolvimento socioeconômico regional/local, tem sido alvo de crescente interesse tanto no meio acadêmico como por parte dos organismos governamentais e internacionais. Nesse contexto, entender a formação de segmentações e a dinâmica competitiva de clusters, aglomerados e arranjos produtivos industriais é fundamental para superar barreiras comerciais, direcionar novos investimentos e preservar condições sócio-ambientais satisfatórias. Por razões metodológicas, porém, tradicionalmente, as políticas de incentivo e os programas de apoio tecnológico são distribuídos de forma genérica regionalmente ou, por setor, tratando aglomerados industriais como um bloco homogêneo e integral, ignorando suas diversidades internas. As diversidades internas dos aglomerados e as estratificações entre empresas não são captadas, o que torna tais iniciativas pouco eficientes e, muitas vezes, ineficazes. Um dos efeitos desse tratamento às atividades econômicas é que muitas empresas não conseguem se capacitar para serem incluídas em tais programas. Estas acabam perdendo competitividade e, em último caso, sendo excluídos do mercado. Para outras, tais iniciativas não satisfazem suas necessidades ou não contribuem para que elas superem suas barreiras organizacionais e tecnológicas. Como destaca Harrison (1994), por trás do fenomenal crescimento recente de certos pólos industriais, tidos como receita de sucesso para o desenvolvimento econômico local e regional, foram geradas substanciais desigualdades entre as empresas envolvidas, com fortes reflexos na divisão do trabalho e na geografia local. Citando os casos do Vale do Silício e dos distritos industriais italianos, Saxenian (1994) mostra que empresas situadas no núcleo desses aglomerados, intensivas em tecnologia, contam com atribuições de mais alto nível, pagando maiores salários e amplos benefícios, como planos de saúde familiar. Já aqueles trabalhadores de empresas fornecedoras de insumos ou de serviços terceirizados, mesmo trabalhando dentro das mesmas unidades industriais dos primeiros, recebem salários muito menores e, praticamente, sem qualquer tipo de benefício. Como resultado, observa-se uma estratificação na ocupação do espaço urbano, com a proliferação de de Sistemas Tecnológicos e Trajetórias Tecnológicas (Carlssom et al., 1997), com a tecnologia sendo tratada em termos globais. A questão territorial não é tocada. CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 176 verdadeiros guetos em áreas periféricas, ocupados por trabalhadores de baixa renda (geralmente imigrantes latinos e asiáticos), e a criação de condomínios de alto padrão próximos às empresas dominantes. Em um artigo clássico, Pavitt (1984) propôs uma tipologia geral para classificação da indústria em quatro tipos distintos, de acordo com sua fonte predominante de inovação tecnológica: (i) Setores dominados por fornecedores; (ii) Fornecedores especializados; (iii) Indústrias intensivas em escala; e, (iv) Setores baseados em tecnologia. Estes tipos correspondem aos meios com os quais (e onde), o conhecimento é acumulado e utilizado na inovação. Posteriormente alguns autores propuseram alterações na classificação original de Pavitt (op.cit.), como, por exemplo, acrescentar um quinto setor baseado em informações, representado principalmente por Bancos e firmas correlatas, bastante impulsionado pelo processo de globalização financeira. O Quadro 5.3 resume esta classificação. A interação entre setores na abordagem de Pavitt sugere a presença de um difusor de inovações, que beneficiaria ambos setores usuários e fornecedores. Estes “linkages” intersetoriais dentro de indústrias são a chave da acumulação de vantagens competitivas de regiões e nações (De BRESSON, 1989; PORTER, 1989). Quadro 5.3 - Classificação tecnológica de firmas Classificação das Firmas Características Setores típicos Principais fontes de acumulação tecnológica Principais canais de transferência tecnológica Dominadas por fornecedores Agricultura, construção civil, serviços privados, manufatura tradicional. Fornecedores Compra de equipamentos e serviços correlatos Intensivo em Intensivo em Baseado em escala informações tecnologia Aço, vidro, Bancos e Eletrônica, Automóveis, Financeiras química. Bens consumo vendas a duráveis varejo. Fornecedores especializados Bens de capital, Instrumentos, software. Indústria de transformação Desenho e desenvolviment o Softwares corporativos e eng. de sistemas Compra de Compra de equipamentos e equipamentos licenças de e software know-how Fonte: Baseado em Pavitt (1984: 360-1, Tabela 29.1) P&D, corporações Engenharia Treinamento de reversa; usuários P&D; avançados cientistas e engenheiros. CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 177 Entretanto, a taxonomia proposta por Pavitt (1984), e suas derivações, passaram a ser criticadas por adotarem uma visão muito geral e estática dos padrões industriais, omitindo fluxos dinâmicos entre setores e as especificidades intra-setoriais (ver MYLTELKA, 2000). De um ponto de vista mais microeconômico, Williamson (1985) afirma que, quanto maior for o volume de custos transacionais de uma empresa, maior será sua rede de contratos (nexus of treaties), e que estes, por sua vez, levariam as empresas a investir em novas soluções (inovações) de modo a reduzir tais custos. Investir em novas soluções implica em buscar alternativas organizacionais e tecnológicas viáveis, o que por outro lado, requer redução da incerteza e, por conseqüência, diminuição também do risco do investimento (COASE, 1937). Em outras palavras, investir em mais organização e tecnologia requer processos e produtos mais homogêneos, o que passa pela redução da distribuição de freqüências de fatores aleatórios (erros), que ocasionam desperdícios de custos e tempo13. Assim, de maneira simplificada, podemos considerar que quanto maior for o volume de informações documentadas, maior será a necessidade de formalmente organizálas; não somente em nível da produção (gestão e funcionamento), como da própria inovação em si (geração e aplicação). Conseqüentemente, quanto mais organizada for a atividade de resolução de problemas, teoricamente, maior será a contribuição da própria firma à tecnologia em uso. No decorrer de um certo período, este processo proporcionaria uma passagem gradativa de um nível de adaptação tecnológica para um nível de geração de tecnologia própria (adaptada). Em outras palavras, quanto mais uma firma se organiza, mais o balanceamento entre fontes externas e internas tende para o lado interno (ZAWISLAK, 1994). Na passagem do artesão para a grande indústria, ou de uma empresa menos organizada para uma mais organizada, existe um processo de despersonalização da atividade organizacional da “inovação”, e esta despersonalização exige o estabelecimento de uma estrutura de gestão que administre tal processo. 13 Para mais detalhes a esse respeito, vide Capítulo anterior. CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 178 Tomando-se como referência sistemas produtivos que se enquadrem no paradigma taylorista de divisão do trabalho, utilizando-se como variável proxy o grau de documentação de uma firma pode-se analisar o aumento do nível de organização de uma firma. Com o crescimento da organização, o volume de rotinas documentadas também aumenta, e com o aumento do grau de documentação, as estruturas (organizadas) tendem a se tornar cada vez mais despersonalizadas, em detrimento da participação dos indivíduos em novas soluções. Por outro lado, é possível encontrar uma maior participação das fontes internas na geração da nova tecnologia específica à empresa (ZAWISLAK, 1994). A partir de estudos empíricos nas indústrias de calçados e aeronáutica no Sul do Brasil, Zawislak (op.cit.) mostra que neste processo, há uma mudança no peso relativo da participação dos indivíduos (trabalhadores) e das estruturas organizadas (diversos departamentos internos de uma firma), em relação à quantidade de novas soluções realizadas pela firma em seus processos e produtos. Pelo Gráfico 5.1, pode-se observar que, na medida em que aumenta o grau de “documentação” (informação organizada segundo certos critérios) da empresa, ocorre uma substituição da participação relativa de cada um dos elementos considerados (SOLmo e SOLorg), no total de novas “soluções” de uma firma. Legenda: SOLmo - Participação da soluções originadas da mão-de-obra no total de soluções de uma empresa SOLorg - Participação da soluções originadas da estrutura organizada no total de soluções de uma empresa 1 --- 5 - Tipos de estruturas segundo o grau de documentação Gráfico 5.1 - Diferentes trajetórias de organização da atividade de inovação (Zawislak, 1994) CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 179 Por “soluções originadas da mão-de-obra” (SOLmo) entende-se àquelas soluções essencialmente de ordem técnica e incremental, adicionadas de forma irregular e informal à tecnologia original. Nestes casos, é muito mais difícil se encontrar inovações stricto sensu. O que se vê são adaptações que, no entanto, permitem o bom funcionamento da tecnologia original (tecnologia de base) e, eventualmente, uma modificação mais sensível no corpo tecnológico original (ZAWISLAK, 1994). À medida que o grau de organização da empresa aumenta, ela estará mais capacitada a contribuir com inovações, ou seja, teoricamente isto deve ocorrer proporcionalmente ao seu grau de documentação. Uma maior organização permite um maior domínio da tecnologia de base, bem como um maior conhecimento das necessidades específicas da empresa. A conjunção de ambos é o pano de fundo para novas soluções. A constatação desse tipo de fenômeno pode ser feita pela análise da variação do peso relativo das diferentes fontes de tecnologia de uma empresa. Quanto mais organizada ela for, mais apta estará para efetuar sua própria contribuição à tecnologia em uso, isto é, mais modificações específicas esta empresa poderá inserir na tecnologia adquirida. Uma tipologia para essa proposta é mostrada no Quadro 5.4. Quadro 5.4 - Classificação de atividades de inovação dentro das firmas Tipo 1 Documentação Realização de ordens de serviços Soluções Org. Quantidades produzidas Realização de fichas Qualidade do que é técnicas produzido Balanceamento da Programação e 3 produção controle da produção (PCP) Instrução de Soluções de 4 fabricação engenharia Relatórios Soluções de P&D 5 completos de P&D Fonte: Zawislak (1994) 2 Soluções MO Perda de poder sobre as quantidades Perda de poder sobre a Qualidade Perda de poder sobre o tempo de execução Perda de poder sobre a técnica Simples atividade de execução Tipo de empresa Pequena empresa intensiva em MO PME intensiva em MO Grande empresa intensiva em MO Empresas intensivas em capital Empresas intensivas em tecnologia MO – Mão-de-Obra Essa estratificação representa uma visão bastante rígida da forma como o processo de inovação irá se organizar e de sua influência no conjunto da empresa. Mas tais relações servem justamente para reforçar a idéia de que, a cada tipo de organização da atividade de inovação (de 1 a 5), a empresa deverá gerenciar a produção da tecnologia de modo CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 180 diferente, utilizando instrumentos adaptados à passagem de um extremo ao outro, ou seja, adaptadas à despersonalização da atividade respectiva. Dessa forma, para cada tipo de organização, existirá um balanceamento próprio diferente entre fontes externas e fontes internas de tecnologia. O tipo 5, reflete uma firma que estará adicionando características tecnológicas próprias à tecnologia absorvida originalmente. Em suma, quanto mais próximo de uma estrutura de P&D (tipo 5) estiver uma empresa, maior será o seu volume de documentos e menor será a participação dos trabalhadores na realização destes documentos e das novas soluções. Nestes termos, quanto mais próximo de P&D, mais explícita é a necessidade de gestão da inovação tecnológica. No entanto, as estruturas menos organizadas não necessariamente dispensam a gestão da inovação, embora esta seja conduzida de modo diferente. “Este processo é uma constatação não-histórica, mas é igualmente pertinente a estruturas ou ao momento histórico do paradigma tecnológico e organizacional fordista. O aumento de participação de estruturas impessoais, em detrimento da dos indivíduos nas atividades de rotina, é o resultado da divisão do trabalho, tanto do ponto de vista funcional, como social e internacional, e do uso de técnicas tayloristas de organização do trabalho” (ZAWISLAK, 1994). Tal classificação, entretanto, não permite traçar nenhum paralelo entre o ambiente organizacional interno da firma e sua posição competitiva no seu setor ou mercado, nem estabelecer uma relação desta classificação com a competitividade da firma. Outra ressalva que pode ser feita à abordagem descrita anteriormente diz respeito a sua inadequação a estruturas organizacionais fortemente baseadas no conhecimento, que não se enquadram no paradigma fordista/taylorista de divisão do trabalho. Além disso, as sinergias e interações entre firmas variam de acordo com o mercado, o setor econômico em questão e o modo pelo qual a atividade de inovação acontece. O Quadro 5.5 mostra uma proposta de adaptação da classificação de Zawislak (op.cit.), associada às características de segmentação do mercado (SOUZA & ARICA, 2001). CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 181 Quadro 5.5 - Tipologia de firmas segundo a segmentação do mercado TIPO 1 2 Foco estratégico Quantidades produzidas Influência da MO nas decisões Inversamente proporcional às Quantidades produzidas Qualidade do Inversamente produto proporcional à qualidade do produto Inversamente proporcional ao tempo de execução das tarefas Engenharia Inversamente 4 proporcional ao aumento da complexidade do produto P&D Mero executor de 5 tarefas Fonte: Souza & Arica (2001) 3 PCP Característica interna Micro, reduzida MO, Ramo: comércio e serviços Pequena e Média, intensiva em MO Ramo: comércio, serviços Grande, intensiva em MO Ramo: pequena indústria Intensivas em capital Ramo: Média e grande indústria Característica do Mercado Pouca concorrência. Excesso de demanda ou nichos inexplorados, FD*: preço Poucos concorrentes, segmentado. Excesso de demanda FD: Preço, Custos Forte concorrência, FD: custos e qualidade do produto Concorrência pela capacidade de inovação FD: custos, qualidade, flexibilidade e confiabilidade do produto Intensivas em FD: idem + novidade e tecnologia inovação FD: Fator determinante da competitividade A partir de uma visão evolucionária dos processos de inovação de longo prazo, Fujimoto (2001), propôs uma tipologia original para classificação das atividades, rotinas e padrões organizacionais de empresas. Neste caso, o foco central da análise é nas trajetórias de processos de inovação de grande escala, que criam novos e competitivos sistemas de manufatura entre si (como os sistemas Ford e Toyota de produção). Esta proposta inclui uma análise baseada em conjuntos de rotinas organizacionais e padrões técnicos previamente definidos, para a qual, o autor propõe o conceito de “sistemas emergentes de multi-trajetórias”. Entre os conceitos evolucionários considerados nesta abordagem estão: (i) retenção - associado à idéia de rotinas, conhecimento tácito e informações retidas ou apropriadas por grupos ligados diretamente à execução de certas tarefas; (ii) variação - vinculado ao conceito lamarckiano de adaptação de certas rotinas através de feedbacks com o ambiente, mesmo que imperfeitamente; e (ii) seleção - firmas com baixa performance podem ser eliminadas da competição pelos mercados, considerando, entretanto que, sendo pressionadas a se aperfeiçoar e a mudar suas rotinas no longo tempo estas firmas ainda conseguem permanecer no mercado por algum tempo. CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 182 A tipologia de Fujimoto (2001) divide as classes de rotinas e capacidade organizacionais em três níveis diferentes: 1) Capacidade de manufatura rotinizada – um conjunto de rotinas organizacionais que afetam o desempenho competitivo em uma determinada posição; 2) Capacidade de aprendizagem rotinizada - um conjunto de rotinas organizacionais que afetam o ritmo das melhorias contínuas, bem como, assimilação rápida em momentos críticos e a recuperação do ritmo normal; 3) Capacidade de aprendizagem evolucionária – habilidades e capacidades não rotinizadas que afetam o desempenho das outras capacidades. Adicionalmente, como “capacidades auxiliares”, o autor indica que devem ser avaliados padrões que caracterizem as atividades organizacionais mais básicas, como a identificação de problemas, suas soluções, e a retenção (aprendizagem e aplicação) das soluções obtidas. O que implica na necessidade do estudo dos padrões técnicos e das rotinas organizacionais14. O Quadro 5.6 mostra um resumo da tipologia proposta por Fujimoto (op.cit.). Quadro 5.6 - Classes de capacidade de manufatura Classes organizacionais Característica Influência básica Estática e No nível de Capacidade de desempenho manufatura rotinizada rotineira competitivo Dinâmica e Nas mudanças Capacidade de rotineira ou recuperação aprendizagem do desempenho rotinizada competitivo Dinâmica e Mudanças nos Capacidade de não rotineira padrões de aprendizagem rotinas e evolucionária capacidades Fonte: Fujimoto (2001) 14 Interpretação Padrão do sistema de informação, específico a cada firma, em termos de eficiência e precisão na transmissão de informações repetitiva. Habilidade específica a cada firma, de manipular ciclos de solução de problemas repetitivos ou um padrão rotinizado de mudanças no sistema. Habilidade de manipular sistemas emergentes ou padrões não rotinizados de mudanças no sistema, criando capacidades de definição de novas rotinas. Para uma discussão resumida do conceito de “rotinas organizacionais”, ver Reynaud (2000). Um tratamento mais denso e elaborado sobre o conceito de “rotinas” na abordagem evolucionária encontra-se no trabalho pioneiro de Nelson & Winter (1982). Vide Capítulo anterior. CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 183 5.4 Uma proposta para a análise da estratificação tecnológica em arranjos produtivos locais Como já mencionado, a abordagem de Zawislak (op. cit.) permite uma classificação das firmas de acordo com seu estágio de organização documental e sugere que este esteja vinculado ao tamanho e às atividades essenciais desenvolvidas pela firma. Contudo, pressupõe um ambiente estático, e não leva em consideração sua contextualização no ambiente. Como estas firmas se comportam e qual seu posicionamento no ambiente competitivo e em relação ao setor e à região onde atuam? Como verificado por Abramovitz (1986), através da análise do crescimento da taxa de produtividade em diversos países, um fenômeno que ocorre em ambientes econômicos competitivos é a estratificação em grupos. Assumindo um ambiente evolutivo, onde as firmam nascem, crescem e morrem, Abramovitz (op.cit.) propôs uma classificação de países de acordo com sua capacidade de desenvolver e se apropriar de conhecimentos científicos e inovar tecnologicamente. Nesse trabalho, foi verificado que as taxas de crescimento da produtividade entre países industrializados tendiam a variar inversamente com seus respectivos níveis de produtividade. Especificamente, aqueles de menor produtividade tendiam a ter uma taxa de crescimento da produtividade maior que os que apresentavam produtividade maior. Esta classificação divide os países em três grandes grupos, de acordo com seu domínio e postura tecnológica, respectivamente, os inovadores, os imitadores (ou seguidores) e “os que ficam para trás”. Ou, como na denominação original: forging ahead, catching-up e falling behind. Esta abordagem, bem difundida na literatura sobre inovação e progresso técnico, é geralmente referida como “perspectiva catching-up” (FAGERBERG, 1995; FREEMAN & SOETE, 1997; CIMOLI, 1998; MYTELKA, 1998; SOUZA & ARICA, 2001). Utilizando essa mesma abordagem, Cimoli (1998), em um interessante trabalho, propõe uma vinculação da perspectiva catching-up de países com a estrutura e dinâmica dos Sistemas Nacionais de Inovação. Mytelka (1998), por sua vez, adota uma tipologia semelhante para estratificar as estratégias de inovação e características das firmas quanto às capacidades, tipos de conhecimento crítico, parcerias e objetivos políticos requeridos no processo de aprendizagem e inovação. CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 184 Aqui, assume-se que, no processo competitivo de mudança tecnológica em determinados arranjos, ocorre um processo de estratificação de firmas semelhante à perspectiva catching-up de países. Nesse sentido, conforme proposto por Souza e Arica (2001), pode-se considerar a estratificação tecnológica de firmas, segundo suas características de desempenho e seus respectivos “graus de evolução tecnológica interna do arranjo”, da seguinte forma: A – Forging ahead - compreende aquelas que “pulam na frente” do processo tecnológico e organizacional e se mantêm como as mais competitivas no seu respectivo mercado. Estas desenvolvem e dominam conhecimentos específicos e geram, a partir destes, adaptações e melhorias técnicas e organizacionais próprias, incluindo inovações incrementais, de acordo com as exigências do mercado, antecipando tendências de produtos através de benchmarking externo com unidades similares de outros arranjos. Competem externamente, imitando, adaptando e assimilando tecnologia externa, desenvolvendo soluções próprias. Despontam no cenário competitivo loca/regional/setorial, sustentando suas vantagens competitivas. B – Catching-up - caracterizado por aquelas que buscam acompanhar o processo evolutivo tecnológico e organizacional das empresas líderes (Grupo A), porém não dominam soluções técnicas, ou dominam, mas não têm competência de convertê-lo em tecnologia útil e desempenho competitivo. Apesar de absorvem tecnologias externas, não geram soluções próprias, porém, conseguem se destacar comercialmente em alguns segmentos/setores/regiões. Não investem em melhorias substanciais, concentrando-se em adaptar e desenvolver produtos substitutos (por exemplo, através de engenharia reversa e imitações simples), e não chegam a liderar por restrições de competência interna. C – Falling Back - Este grupo caracteriza empresas que não conseguem acompanhar o avanço tecnológico e as exigências do mercado, competem principalmente pelo preço e tendem a se tornar cada vez mais defasadas tecnologicamente e “desaparecer” da arena competitiva, perdendo a parcela mais significativa do seu mercado. Estas tenderiam a ser meros clientes de tecnologias maduras e, seguindo nesta trajetória, estariam fadados a CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 185 pagar um preço cada vez mais alto por isso, com tendência de serem excluídas do mercado. Na prática, muitas vezes acabam encontrando uma saída temporária na exploração de nichos de baixo poder aquisitivo e tecnologias com demanda decrescente ou já em fase de obsolescência, porém com mercado restrito. De maneira análoga, assumindo condições semelhantes e adotando-se métodos de análise competitiva, como, por exemplo, o Modelo de Porter, e a análise de agregação de valor (por exemplo, Cadeia de Valor), tal hipótese pode ser testada em arranjos produtivos locais15. Essa abordagem, de certa forma, conjuga a taxonomia das estratégias da firma diante de mudanças técnicas no ambiente, proposta por Freeman & Soete (1997). Tal taxonomia divide as estratégias da firma em “inovativas ofensivas”, “inovativas defensivas”, “imitativas dependentes” e “oportunistas tradicionais” (ver op.cit., Capítulo 11). Por outro lado, a abordagem proposta também resgata a idéia porteriana de “agrupamentos estratégicos16”, porém de um ponto de vista local e dinâmico. Miles et al. (1978) também já indicava uma taxonomia para diferentes estratégias adotadas pelas empresas dentro de uma indústria ou segmento industrial, no caso, defensores, prospectores, analisadores e reagentes. Leontides (1982, apud HAWES & CRITTENDEN, 1984), por exemplo, descreveu três tipos amplos de estratégias de negócios adotadas pelas firmas, que seriam as “defensivas”, as “ofensivas” e as “de vanguarda” 17. 15 Aqui, o ambiente competitivo é analisado apenas em termos locais. Obviamente que, em graus variados, as empresas disputam mercados com unidades de outros arranjos, porém, se supõem que tal concorrência também se dê de forma mais acentuada por grupos estratificados. Essa é uma questão que está incluída nas hipóteses consideradas na abordagem e será alvo de exploração futura. 16 “Uma indústria, pode assim ser vista como sendo composta de... grupos de firmas, onde cada grupo consiste de firmas seguindo estratégias similares em termos das variáveis de decisão chave... Eu defino tais grupos como grupos estratégicos. Firmas, dentro de cada grupo, se assemelham umas às outras em termos de estratégias... Entre grupos, entretanto, a situação é diferente” (Porter, 1979: 215, apud Hawes & Crittenden, 1984). 17 A qual, poderia ser considerada uma redução da taxonomia de Freemam & Soete (1997), obra publicada pela primeira vez em 1974. CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 186 Segundo Hawes & Crittenden (1984), o desenvolvimento do conceito de “grupos estratégicos” foi uma importante contribuição para o entendimento do comportamento das firmas. Este entendimento avançou bastante na direção da identificação e análise de fatores externos, de mercado, que condicionam o comportamento das firmas. Entretanto, ainda permanece aberta a questão dos fatores internos da firma que emulam sua capacidade, competências, estratégias e comportamento em vários setores industriais (ver, por exemplo, CARLSSOM et al., 1997; ALBINO et al., 1999; BRAGLIA & PETRONI, 2000; SQUAZZONI & BOERO, 2002). Na abordagem proposta utilizar-se-á como referencial endógeno, procedimentos operacionais-padrão (POP’s), padrões técnicos e organizacionais e as rotinas da empresa18. Neste caso, as classificações de Zawislak (1994), Souza & Arica (2001) e Fujimoto (2001), servirão de referência para a elaboração de uma tipologia específica para o caso estudado. A seguir, adotando-se a abordagem proposta, um arranjo típico local é utilizado para uma demonstração de sua aplicação e análise. 5.5 Considerações preliminares sobre a mudança tecnológica em arranjos produtivos locais: o caso do pólo de cerâmica vermelha do Norte Fluminense 5.5.1 Análise geral e contextualização do arranjo Os dois principais pólos da atividade de manufatura de cerâmica vermelha no Estado do Rio de Janeiro são os aglomerados de Campos e de Itaboraí-Manilha. Um terceiro aglomerado, com grande crescimento nos últimos anos, encontra-se no município de Três Rios. O pólo da baixada campista, em termos da economia local, responde por cerca de 5% dos postos de trabalho da população economicamente ativa do município, o que representa algo em torno de 5000 empregos diretos, distribuídos nas cerca de 110 cerâmicas do setor. Além da relevância em termos da economia local, associada ao 18 Por razões técnicas e metodológicas, neste caso, Rotinas e POP’s serão assumidos sob o mesmo conceito, apesar das diferenças existentes entre ambos, como destacado no Capítulo 4. CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 187 segmento, há uma forte conotação social e ambiental vinculada à atividade, devido às precárias condições de trabalho e ao impacto ambiental provocado (SILVESTRE, 2001). Quanto à educação formal, a grande maioria dos trabalhadores do setor não consegue ocupação em atividades mais dinâmicas como o comércio varejista local. Muitos deles são provenientes do setor agrícola da cana-de-açúcar, quando dos períodos de entressafra. Neste sentido, o setor funciona como uma “válvula de escape” do setor sucroalcooleiro local, contribuindo para regular o quadro de mobilidade da mão-de-obra regional. No aspecto ambiental, o desenvolvimento de programas de recuperação e de zoneamento de áreas de exploração são fundamentais para garantir a sustentabilidade futura da atividade e das comunidades locais. Por outro lado, a escolha do Pólo de Cerâmica Vermelha de Campos para este estudo justifica-se, em primeiro lugar, pelo fato deste segmento da atividade econômica local apresentar características similares às da maioria dos aglomerados não-intensivos em tecnologia de microrregiões periféricas do Brasil, entre as quais, pode-se destacar: a baixa produtividade, mão-de-obra pouco qualificada, produtos de baixo valor agregado, processos produtivos rudimentares etc (SILVESTRE, 2001). De uma forma geral, excetuando algumas características dinâmicas, poder-se-ia afirmar que este segmento encontra-se em um ciclo vicioso, determinado, basicamente, pela competição pelo preço, pela incapacidade de incorporar tecnologias mais avançadas, e pela dificuldade de explorar novos mercados. Porém, algumas “janelas de oportunidade” podem ser vislumbradas, já exploradas em aglomerados ceramistas locais de outras regiões, como em Seto (Japão) (ver IZUCHI 1997), Sassuolo (Itália), Castellón (Espanha), Criciúma e Blumenau (Santa Catarina), de cerâmica de revestimento (ver MEYER-STAMER et al., 2001); e Itu e região (São Paulo), de cerâmica estrutural. A disponibilidade do gás natural na região Norte Fluminense, e sua respectiva tecnologia de queima como combustível nos processos produtivos de diversos setores industriais, grosso modo, representam uma fonte exógena de mudança tecnológica, pois pode ser adquirida e implementada, desde que provada sua viabilidade técnica e econômica. Porém, para viabilizar sua implementação, diversos fatores endógenos estão CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 188 envolvidos, como a estrutura organizacional, a eficiência do processo, a logística e o padrão de concorrência, a estrutura de custos, competências etc. O processo tradicional, de queima à lenha, está baseado em um modelo de processo produtivo cuja estrutura de custos e cadeia de valor específica, apesar de fundamentais do ponto de vista do padrão da competição local no curto prazo, mostra-se saturado do ponto de vista tecnológico e de novos mercados. A tecnologia atual impossibilita a diversificação de produtos (como telhas e revestimentos) devido a limitações técnicas inerentes ao processo de queima a lenha (temperatura, uniformidade etc.). Devido a estas restrições técnicas, outros fatores de aumento da competitividade, como o mix de produtos, a qualidade, a diferenciação, novos mercados, entre outros, praticamente inexistem com a tecnologia de queima a lenha. Uma característica específica do segmento é que o mercado para tijolos e blocos cerâmicos é pouco exigente quanto à uniformidade, resistência, textura e outros atributos aparentes do produto. Neste mercado, o preço é quase o único diferencial. Como o processo não possui muitas etapas de transformação (compreende basicamente extração, corte, moldagem e secagem) não há margens suficientes para diluição dos custos, assim, qualquer elevação nos custos é, inexoravelmente repassada aos preços. Contudo, a mudança tecnológica envolvida na implementação da queima a gás natural não pode ser analisada somente pelo ponto de vista dos custos, pois esta possibilitará a transformação de toda, ou de grande parte, da cadeia de valor e da configuração organizacional da indústria local. Se por um lado, esta mudança eleva os custos do processo produtivo, e comparativamente seria hoje “menos lucrativa” em relação à lenha, por outro, permitiria outra carteira de produtos, com novas margens de lucros e a abertura de novos mercados, representando, assim, um processo de mudança tecnológica e inovação local. Neste sentido, a implementação do gás natural no segmento de cerâmica vermelha na região Norte Fluminense, por exemplo, não deve ser vista com base na estrutura produtiva atual (com o insumo lenha), o que certamente se revelará inviável economicamente para muitas unidades (como já verificado para alguns casos, por estudos de viabilidade do Instituto Nacional de Tecnologia - INT). Ela deve levar em consideração a trajetória competitiva do setor e a dinâmica dos mercados consumidores e dos produtos substitutos e dos novos produtos. CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 189 A princípio, através da mudança do processo produtivo e dos produtos, os fatores para viabilizar a implementação do gás estariam mais nas mãos dos próprios empresários, através de um maior controle sobre o processo, aumento da eficiência, redução do desperdício de matéria prima, novos produtos, novos mercados etc., do que externamente, através de políticas públicas de incentivos. Porém, do pondo de vista do desenvolvimento socioeconômico local, em um período de transição e adaptação, uma concentração maior de esforços pode ser fundamental para superar barreiras históricas dos efeitos de dependência da trajetória e o ciclo vicioso em que se encontra a indústria. Neste caso, incentivos específicos a certos grupos (admitindo-se uma estratificação) podem representar um fator fundamental para encorajar e impulsionar à mudança e possibilitar um salto tecnológico e de qualidade na indústria, considerando as diversidades do meio. A escolha do pólo de cerâmica vermelha de Campos-RJ é paradigmática. Devido a suas características quase artesanais, em termos tecnológicos o aglomerado pode ser visto como um “enclave de atraso tecnológico”. Este seria como um “pior caso”, para se observar e verificar aspectos da dinâmica evolucionária em aglomerados locais. Com isso, acredita-se que, inclusive, adicionalmente, possam surgir contribuições conceituais para a abordagem de micro-sistemas evolucionários “quase-estáticos”. Nesse aspecto, algumas questões sobressaem: Se há um processo de estratificação tecnológica, quais seus reflexos na estrutura do segmento? Qual a configuração desta estratificação? Qual o impacto da inserção do gás natural nessa estratificação? Quais os critérios que caracterizam o grupo dos mais aptos e mais competitivos, os intermediários e os mais defasados? Qual a influência dos efeitos, e as principais características, da “dependência da trajetória?” Quais as alternativas mais apropriadas para atenuar seus efeitos? 5.5.2 Um esboço de aplicação da abordagem proposta O impacto da mudança tecnológica provocada pela implementação do gás natural, em comparação à queima a lenha, pode ser avaliado através da identificação e análise dos padrões técnicos de ambas as tecnologias, considerando–se também um sistema híbrido, de transição de uma para outra tecnologia. CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 190 Através de uma variável referencial, a tecnologia, conceitualmente considerada como “uma forma de fazer as coisas”, pode-se estabelecer uma taxonomia do “nível tecnológico”, a partir da diferenças nos padrões técnicos identificados no sistema produtivo. Na análise, dois referenciais são estabelecidos: (i) um exógeno, representando a contribuição externa para a mudança tecnológica, como por exemplo, incentivos governamentais, recursos naturais etc; outro, (ii) endógeno, representando fatores internos, como por exemplo, a competência no processo de adaptação da tecnologia, esforços próprios à empresa, contribuições técnicas, etc, para melhor caracterizar o balanço entre fontes externas e internas na mudança tecnológica. Também se propõe o estabelecimento um “índice de desempenho”. Neste caso, devido a pouca dinâmica competitiva e à verticalidade do processo produtivo, uma alternativa é considerar algum critério de produtividade. A partir desta estrutura metodológica, pretende-se estabelecer vínculos entre os fatores de mudança tecnológica e seus efeitos na estrutura do arranjo. Dessa forma, espera-se que programas específicos de apoio e incentivos e políticas e estratégias de benchmarking e up-grading tecnológico e organizacional, possam ser mais precisos e adequados às características de cada grupo de empresas identificado na estratificação. Na Seção seguinte apresenta-se uma metodologia proposta para o estudo da estratificação tecnológica e das trajetórias competitivas em arranjos produtivos locais. 5.6 Uma proposta metodológica para o estudo da estratificação tecnológica e da trajetória competitiva em arranjos produtivos locais 5.6.1 Pesquisa empírica Nesta etapa, pretende-se caracterizar um segmento industrial específico, identificando os fatores de formação da competitividade e a estratificação de grupos com competências específicas. No caso, para o Pólo de Cerâmica Vermelha de Campos-RJ. A metodologia pressupõe uma etapa prévia de levantamento de informações e dados gerais sobre a atividade, o processo produtivo, a organização industrial do arranjo CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 191 para identificação e definição das trajetórias e regimes tecnológicos a serem considerados. A hipótese da estratificação é testada como um passo inicial, uma condição prévia para que possa existir uma certa trajetória. As etapas da metodologia proposta são apresentadas a seguir. 5.6.1.1 Etapas da metodologia 1) Definição de uma amostra representativa da diversidade tecnológica no arranjo; 2) Levantamento de uma cadeia-padrão de valor (qualitativa) do arranjo; 3) Identificação de regimes tecnológicos e padrões técnicos e organizacionais pela análise das diversidades e similaridades qualitativas nas cadeias de valor; 4) Estabelecimento e levantamento de índices de “recursos” e de “desempenho”; 5) Plotagem dos dados com a correlação entre os índices levantados no item anterior; 6) Análise da estratificação e agrupamentos; 7) Cálculo da taxa de variação do índice de desempenho em função do índice de recursos técnicos. 5.6.1.2 Detalhamento de cada etapa 1) Levantamento e coleta de amostras de unidades representativas dos diferentes regimes tecnológicos considerados no arranjo; 1.1) Reunir, proporcionalmente, as amostras representativas de cada um dos regimes tecnológicos (RTn)19, para o segmento da trajetória competitiva considerado para o sistema (arranjo). 1.2) Identificação dos padrões técnicos nos regimes considerados; 1.3) Análise de agrupamentos e homogeneidade de padrões técnicos; 19 RTn – Regimes tecnológicos, representam segmentos na trajetória tecnológica considerada (Vide Capítulo 4). No caso: n = {1,2,3}; RT1 = [lenha]; RT2 = [regime misto]; RT3 = [gás]. CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 192 2) Levantamento da Cadeia-Padrão de Valor do Segmento. 2.1) Assume-se que, em havendo uma estratificação, esta se refletirá em variações na estrutura da cadeia de valor das empresas. Esta hipótese baseia-se na constatação (difundida por Porter, entre outros autores), de que as raízes da competitividade estão refletidas na cadeia de valor da empresa (ver, por exemplo, PORTER, 1989:51-65). 2.2) Para se verificar as variações nas cadeias de valor, pode-se estabelecer como referencial, uma cadeia-padrão20, a partir de uma análise qualitativa da estrutura produtiva do arranjo e do perfil do mercado em questão. Veja uma ilustração deste procedimento na Figura 5.2. Seqüência de processos de produção Matéria-Prima/Insumos insumos logística interna logística externa Transformação capital humano finanças Comercialização informação marketing. . . (vendas) Atividades de Gestão CVA CV padrão CVB CVC Figura 5.2 – Exemplo simplificado de Cadeia-Padrão de Valor 20 Esta é uma generalização do conceito tradicional de cadeia de valor que, na realidade, é individual para cada unidade empresarial. Aqui, não se intenta chegar aos custos específicos do processo de agregação de valor aos produtos de cada unidade. O que se propõe é estabelecer quanto representa “qualitativamente” cada etapa em relação ao valor final agregado aos produtos. Para se estabelecer uma estrutura padrão, será assumida uma unidade típica do segmento. CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 193 3) Análise das Diversidades e Similaridades Qualitativas nas Cadeias de Valor. 3.1 Em virtude da hipótese do item anterior, espera-se que a estratificação (se confirmada), admita uma configuração do tipo forging ahead (A), catching-up (B) e falling back (C) (SOUZA & ARICA, 2001), ou alguma variante dessa conformação. 3.2 Admite-se que para cada um desses grupos estratificados, haja certos padrões, e que estes, se refletem na cadeia representativa (Por exemplo, CA, CB, CC, na Figura 5.3). Observação 3 - Na prática, serão analisadas as diferenças nas cadeias de valor entre as empresas representativas de cada Regime Tecnológico (os RTn considerados), e as características da cadeia de valor. Espera-se identificar fatores e aspectos que apresentem padrões semelhantes dentro de cada regime tecnológico considerado. No caso, CVA, CVB e CVC, corresponde respectivamente à RT1, RT2 e RT3. 4) Estabelecimento de índices de “recursos” e de “desempenho” para a amostra em questão21; 4.1) Índice de Recursos (IRT) – Posição definida em uma escala numérica gerada a partir de uma taxonomia da evolução dos padrões técnicos, nos regimentos tecnológicos considerados. Compreende as rotinas, os procedimentos técnicos e organizacionais repetitivos e outras tarefas que caracterizam cada um dos regimes considerados. Adicionalmente, podem também ser considerados critérios subjetivos, característicos do processo produtivo (como, por exemplo, qualidade, flexibilidade, rapidez), além de outras variações nos padrões técnicos e organizacionais característicos de cada regime. Observação 1 – Pode-se, por exemplo, utilizar como referência uma taxonomia reunindo alguns dos critérios utilizados nas classificações de Zawislak (1994), Souza & Arica (2001) e Fujimoto (2001), que devem ser convertidos em uma escala numérica. 21 Para o detalhamento da modelagem dos índices para o caso pesquisado, vide Apêndice B. CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 194 4.2) Índice de Desempenho (ID) – Posição definida em uma escala numérica, que representa todo o espectro de desempenho das amostras consideradas. A identificação das empresas posicionadas nos extremos define os limites da escala. Observação 2 - No caso específico do Pólo estudado, pelo fato das características do processo produtivo serem quase artesanais e, de um modo geral, o processo ser pouco eficiente, assume-se que o fator mais representativo e consistente para este índice, seja alguma medida de desempenho do processo produtivo (produtividade [produção/mês], [produção/insumo], [produção/no. trabalhadores]. 5) Plotagem dos dados 5.1) Para cada uma dos elementos da amostra (no caso, olarias e cerâmicas), levantar os respectivos índices IRT e ID. O Gráfico 5.2 mostra uma ilustração para o caso em questão. Assume-se que haja uma estratificação na amostra, e que esta, pode ser captada através da correlação entre os índices de recursos e desempenho, definidos anteriormente. A estratificação das unidades estabelecida por tal correlação definiria a Trajetória Competitiva do arranjo, de acordo com os respectivos regimes considerados. Na ilustração, RT1 (em azul), RT2 (em verde) e RT3 (em vermelho), conforme a notação utilizada no Capítulo 4. Estratificação Tecnológica Índice recursos (irt) Pólo Cerâmica Campos-RJ 5 4 3 2 1 0 0 1 2 3 4 5 Índice desempenho (id) Gráfico 5.2 – Estratificação tecnológica hipotética no arranjo CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 195 6) Identificação e análise de fatores determinantes da estratificação e agrupamentos. 7) Cálculo da taxa de variação do índice de desempenho em função do índice de recursos técnicos (IDRTn / IRTRTn). 5.6.1.3 Agenda Futura Admitindo-se a possibilidade de aplicação dessa metodologia a outros arranjos, futuramente poder-se-á ter uma visão comparativa da evolução, tendências e defasagem tecnológica existente entre diversos arranjos de regimes tecnológicos semelhantes. No caso da cerâmica vermelha, por exemplo, como referencial comparativo, poderse-á utilizar uma amostra do aglomerado de Criciúma - Santa Catarina, o do Rio Grande Norte ou o de Itu – São Paulo. Optou-se, neste caso, por tomar como referência o pólo de Itu. No Gráfico 5.3, apresenta-se uma simulação para o caso do Pólo da indústria de cerâmica vermelha de Campos-RJ, usando como comparação o mesmo segmento de ItuSP. Trajetória evolutiva id/irt cerâmica vermelha 7 6 5 4 3 2 1 0 Campos-RJ Itu-SP 1 2 3 tempo Gráfico 5.3 – Trajetórias evolutivas hipotéticas de dois arranjos locais CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 196 Na ilustração anterior (Gráfico 5.3), apresenta-se uma idéia do comportamento esperado das trajetórias evolutivas de dois arranjos. Através da identificação de padrões e rotinas associados a cada trajetória, espera-se poder estabelecer tendências e diferenças pontuais (gaps tecnológicos22) existentes para os regimes tecnológicos considerados. Com estudos específicos das dinâmicas competitivas de cada um e das variações nas estruturas relativas de tecnologias, custos e de mercado, espera-se que possam ser identificados os gargalos, os pontos críticos e deficiências estruturais, que expliquem as causas da assimetria entre as trajetórias representadas e indiquem problemas específicos a serem tratados. 5.7 Considerações finais sobre o Capítulo Avanços no estudo do desenvolvimento econômico local e das novas organizações produtivas industriais locais têm mostrado que há a necessidade de se desbravar uma nova fronteira de pesquisa nesse campo. Neste caso, a visão tradicional de divisão dos fenômenos econômicos em microeconomia e macroeconomia precisa ser substituída pela visão de uma outra dimensão (mesoeconômica), vinculada especificamente aos aspectos de localização, aglomeração e organização industrial e da economia regional. Esta dimensão interage com as dimensões micro e macro do ambiente econômico, social e ambiental (sendo condicionada por este), mas que não é captada pelas abordagens tradicionais. Através das abordagens descritas nas seções anteriores, pode-se perceber a importância do desenvolvimento de novos enfoques para análise e caracterização das atividades tecnológicas tanto para firmas, setores, regiões e países. Inicialmente, apresentou-se uma proposta de classificação do grau de organização interna da firma, considerando a tecnologia como variável endógena, enfatizando a perda de poder relativo da mão-de-obra nas soluções de problemas internos à organização, à medida que esta documenta e organiza suas atividades. A partir dos diversos conceitos desagregados e de adaptações de novas abordagens, propôs-se analisar a competitividade em arranjos produtivos locais por uma visão evolucionária. Como proposta metodológica, apresentou-se uma estrutura analítica para o estudo de sistemas produtivos locais, com base em dois níveis de análise competitiva: 22 No caso, tais gaps representariam defasagens entre pontos específicos das trajetórias evolutivas dos respectivos arranjos, considerando regimes tecnológicos similares, em um determinado momento no tempo. CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 197 interno ou endógeno, referente à firma (organizacional) e externo ou exógeno, referente ao arranjo (setor/local). A viabilidade de aplicação desta metodologia foi verificada em um estudo campo (no caso, o Pólo de Cerâmica Vermelha de Campos), o qual é descrito no próximo capítulo. Como agenda de pesquisa futura, pretende-se estender tal abordagem a outros arranjos, para que se possa estabelecer qual a relação entre o grau de evolução de certas firmas e o estágio tecnológico em que estas e seu arranjo se encontram, através da análise das suas respectivas trajetórias competitivas. Cabe ressaltar, que a estrutura analítica proposta tanto pode ser aplicada isoladamente como de forma complementar aos métodos mais gerais existentes para a análise do desenvolvimento de regiões e localidades, como os modelos de análise competitiva das “Cinco Forças” (PORTER, 1986), o “Diamante da Competitividade” (PORTER, 1989), a abordagem de “Sistemas de Inovação” (EDQUIST, 1997), “Sistemas Tecnológicos” (CARLSSON, 1997) e o modelo “Quatro R’s da lucratividade” (WINTER, 2000). Além disso, pode ser agregada à metodologia de estudo de Cadeias Produtivas (ver HAGUENAUER & PROCHNIK, 2000), explorando a dinâmica interna das indústrias e os fatores que sustentam a competitividade nos diversos segmentos envolvidos ao longo da cadeia, o que não é coberto pela metodologia citada. Pode também ser vinculada ao Planejamento Estratégico Regional e Local (ver SOUZA & ARICA, 2002b). Por outro lado, devido à escassez de informações e dados desagregados, deve-se levar em conta a dificuldade de se trabalhar com segmentos de cadeias e arranjos de pouca densidade, principalmente com aqueles mais defasados em termos organizacionais e tecnológicos. Para um levantamento inicial, diagnósticos do perfil técnico, econômico, organizacional e mercadológico devem ser considerados, que podem ser complementados pelo levantamento de informações diretas de dados primários. 5.7.1 Hipóteses da abordagem proposta A base teórica da proposta se fundamenta em conceitos evolucionários. Nesse sentido, algumas hipóteses, de um conjunto geral, estão subentendidas. O Quadro 5.7, a seguir, resume tais hipóteses. CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 198 Quadro 5.7 - Hipóteses da abordagem Hipótese Descrição H1 A dependência da trajetória influencia a capacidade de absorção de novas tecnologias; H2 A competição é condicionada por mecanismos de seleção; H3 O domínio e utilização das tecnologias disponíveis provocam uma diversidade entre os atores; H4 A ocorrência de contribuições próprias (adaptações, alterações) que afetam o desempenho (esta é uma característica mais próxima ao conceito lamarckiano de evolução que ao darwiniano23); H5 Na dinâmica do processo de adaptação e mudança, verifica-se uma característica de autoorganização do sistema, provocada, principalmente, pela competição pela sobrevivência. Esta hipótese representa uma certa “racionalidade” dos agentes (diferentemente do ambiente biológico). Na abordagem proposta, partimos do pressuposto de que, as oportunidades e mudanças tecnológicas proporcionadas pelo ambiente, provocam um processo de estratificação competitiva entre as empresas concorrentes de um mesmo arranjo. Esta é uma derivação de uma das hipóteses anteriores (H3), portanto, esta é a hipótese básica da abordagem proposta (H3.1). As demais hipóteses estão relacionadas ao contexto, sendo consideradas de forma inter-relacionada na metodologia. O levantamento e a análise da estratificação em arranjos produtivos é relevante tanto do ponto de vista da Organização Industrial e da Inovação, como para a Economia Política e a “Engenharia Institucional” (no conceito de SQUAZZONI & BOERO, 2002), possibilitando a priorização e o direcionamento de ações, programas e políticas industriais de desenvolvimento econômico-social e ambiental. Indústrias, setores, clusters, e, inclusive, pequenos arranjos locais, compreendem empresas com graus diferenciados de evolução tecnológica e organizacional. Entretanto, por razões metodológicas, são tratados de forma idêntica por programas governamentais de apoio tecnológico e organizacional. O que se propõe é uma nova alternativa de se abordar tal problema. Se as especificidades internas das firmas em relação à sua cadeia de valor, produtividade, qualidade, e outros parâmetros de formação da competitividade, seguem certos padrões e formam agrupamentos característicos em termos de arranjo, poder-se-á propor programas específicos e soluções diferenciadas para cada grupo, de acordo com suas características e 23 Vide Capítulo 3. CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 199 necessidades, seu estágio tecnológico, e suas dificuldades, considerando suas competências próprias. Com relação ao caso específico do arranjo escolhido, o processo de mudança tecnológica foi considerado através de três regimes tecnológicos: RT1 – Unidades que utilizam somente queima a lenha; RT2 – Unidades que utilizam queima a lenha e queima a gás; RT3 – Unidades que utilizam somente queima a gás. Será assumido que cada um desses regimes representa um estágio de desenvolvimento tecnológico no tempo (entretanto, na prática eles coexistem). E que, além disso, cada regime compreende certos padrões técnicos e organizacionais característicos, os quais, devem ser assimilados na transição entre dois regimes tecnológicos diferentes. Os padrões técnicos e organizacionais, que caracterizam cada um desses regimes, foram levantados em uma investigação específica. Uma análise prévia da estrutura geral do aglomerado de cerâmica vermelha permite supor que as trajetórias futuras passam por um certo tipo de trade-off entre os efeitos de “destruição criativa” e de “dependência da trajetória”24. Os primeiros, provocados pela pressão competitiva do mercado e pela disponibilidade das condições necessárias para implementação da tecnologia do gás natural. De uma certa forma estes se opõem aos efeitos da “dependência da trajetória”, devido às características históricas de subdesenvolvimento, à lenta evolução técnica e organizacional do segmento, e à cultura empresarial específica do arranjo. Tais fatores são fortemente condicionados pela efetividade e eficácia das intervenções de ajuste na atividade, através de políticas institucionais e governamentais (programas, incentivos e isenções) e normas de regulamentação (fiscalização ambiental e social), que tradicionalmente representam apenas um caráter assistencialista aos ceramistas. A princípio, o contexto do sistema apresentado no parágrafo anterior se mostra perfeitamente compatível com os conceitos e hipóteses da abordagem proposta. 24 Vide Capítulos 3 e 4. CAPÍTULO 5 - ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM ARRANJOS ... LOCAIS: UMA METODOLOGIA 200 No Capítulo seguinte, apresenta-se a aplicação da metodologia proposta ao Pólo de Cerâmica Vermelha do Norte Fluminense (Campos-RJ), através de uma pesquisa de campo exploratória, para levantamento de dados e informações diretas. CAPÍTULO 6 ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM UM ARRANJO PRODUTIVO LOCAL: O CASO DO PÓLO DE CERÂMICA VERMELHA DO NORTE FLUMINENSE Resumo A dinâmica competitiva em arranjos produtivos locais é influenciada, entre outros fatores, pela freqüência e impacto de novas tecnologias e pelas características específicas do mercado, que pressionam as empresas a uma constante reavaliação de suas estratégias, métodos e rotinas organizacionais, provocando um processo de estratificação tecnológica no arranjo. No nível micro-dinâmico, essa estratificação pode ser verificada através da dotação de recursos e dos índices de desempenho de cada empresa, os quais, afetam suas estratégias de mercado. A abordagem proposta, sintetizada na metodologia definida no capítulo anterior, foi adotada em um projeto de pesquisa realizado junto ao Pólo de Cerâmica Vermelha do Norte Fluminense (RJ). Neste Capítulo, apresenta-se uma síntese desse trabalho, cujo objetivo é o analisar o impacto provocado pelo processo de mudança tecnológica na dinâmica competitiva do pólo, empregando-se tal metodologia. Os resultados obtidos confirmam a hipótese da estratificação e sustentam a tese da Trajetória Competitiva. 6.1 Introdução A indústria de cerâmica no Brasil, que inclui os setores de cerâmica vermelha, cerâmica branca e revestimentos, fatura em média cerca de US$ 5 bilhões por ano, o que equivale a aproximadamente 1% do Produto Interno Bruto (PIB) do país. O crescimento econômico de alguns segmentos cerâmicos na década de 90 chegou a 10% ao ano, em média, enquanto que o crescimento do PIB no Brasil, não chegou a 3% no mesmo período CAPÍTULO 6 – ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM UM ARRANJO PRODUTIVO LOCAL 202 (MOTTA et al., 2001). Segundo Bustamante & Bressiani (2000), o número de empresas do segmento da cerâmica vermelha no Brasil corresponde a aproximadamente 11.000 unidades, que empregam em média de 25 a 30 funcionários. No total, geram entre 250.000 a 300.000 postos de trabalho e consomem cerca de 60 milhões de toneladas de matéria-prima por ano. Um dos grandes desafios que o setor cerâmico enfrenta é o de produzir uma grande quantidade de peças praticamente idênticas, com as mesmas características técnicas e estéticas, a partir de matérias-primas com características amplamente variáveis (TEIXEIRA et al., 2002; NOGUEIRA, 2002). No Estado do Rio de Janeiro, destacam-se os pólos ceramistas de Campos dos Goytacazes, localizado na região do Norte Fluminense, o de Itaboraí/Rio Bonito, o da Baixada Fluminense (Nova Iguaçu) e o pólo do Médio Vale do Paraíba/Três Rios (HOLLANDA & VIEIRA, 2002). O pólo campista é que concentra o maior número de empresas e o de maior produção no estado. Segundo o Sindicato dos Ceramistas da região de Campos, o pólo local conta atualmente com aproximadamente 120 empresas, entre cerâmicas e olarias, localizadas em sua maioria na região denominada de Baixada Campista. Destas, apenas 62 estão sindicalizadas. Para a região, essa atividade econômica representa uma importante fonte geradora de receita tributária, além de contribuir para a geração de um substancial número de postos de trabalho no município, estimado pelo sindicato patronal em torno de 5.000 diretos e outros 25.000 indiretos (SILVESTRE, 2001). Além do ponto de vista estritamente econômico, este segmento representa importante papel regulador do mercado de trabalho local, especialmente no período de entressafra do setor sucroalcoolerio, empregando grande parte da mão-de-obra proveniente dessa indústria, que de outra forma, provavelmente estaria na informalidade ou engrossando os índices de desemprego. Do ponto de vista interno da indústria, algumas mudanças tecnológicas têm sido verificadas pela transformação dos fornos de queima a lenha para queima a gás (natural). Tal combustível possibilita maior uniformidade na queima e a produção de itens de maior valor agregado (como telhas, blocos estruturais, revestimentos etc), e conseqüentemente, a abertura de novos mercados. Entretanto, tal mudança tecnológica requer outros investimentos paralelos em melhorias no processo produtivo, como por exemplo, na redução de desperdícios e na qualificação do pessoal. Segundo Mafra (2002), a CAPÍTULO 6 – ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM UM ARRANJO PRODUTIVO LOCAL 203 produtividade da mão-de-obra alocada diretamente na produção seria um importante indicador de desempenho para a cerâmica vermelha, porém para melhorar tal indicador é necessário investir em treinamento. Adicionalmente, a utilização do gás natural como combustível em substituição à lenha pode representar uma potencial redução dos impactos ambientais. A prevenção e o combate à poluição, em particular de fontes industriais, são objeto de leis específicas nacionais e internacionais cada vez mais restritivas, afetando diretamente a competitividade das empresas (PALMONARI & TIMELLINE, 2002). Na região Norte Fluminense (RJ), a utilização em maior escala do gás natural é reforçada pelo fato da Bacia Petrolífera de Campos ser responsável atualmente por algo em torno de 40% da produção dessa fonte energética (SILVESTRE 2001). De acordo com o Sindicato dos Ceramistas local, 18 indústrias já contam com fornos instalados para a queima a gás, através de convênio entre a Secretaria Estadual de Energia e a companhia local de gás, porém nem todas elas o têm utilizado efetivamente em seus fornos atualmente. Um dos fatores que impedem uma maior adesão ao uso do gás é a indefinição com relação à política de preços para o combustível, que sofre efeitos da variação cambial em relação ao dólar, tornando os custos do seu consumo, dependente da cotação da moeda americana, excessivamente altos quando comparados aos da lenha. Segundo alguns empresários do ramo, um outro fator é o alto custo do investimento inicial necessário para implantação dos sistema (em torno de R$ 150.000,00). Análises preliminares sobre a dinâmica competitiva do pólo local indicam que as diferentes estratégias competitivas das empresas do arranjo são fortemente condicionadas pela tecnologia adotada no processo de queima. Observa-se um efeito de estratificação em grupos de acordo com a tecnologia, métodos e rotinas adotados, produtos fabricados e estratégias de mercado (SOUZA & ARICA, 2002). Como forma de se captar as diversidades internas e a competitividade de segmentos de cadeias e sistemas produtivos locais, tem crescido o interesse no enfoque da mesoanálise para o estudo da dinâmica competitiva desses tipos de arranjos, tanto do ponto de vista de pesquisa como para o direcionamento de políticas públicas e iniciativas de apoio tecnológico e à competitividade de setores locais (KLIEMANN & HANSEN, 2002). Nesse sentido, surgem algumas questões importantes: O processo de mudança tecnológica causa uma estratificação em grupos entre as empresas do arranjo? Quais os CAPÍTULO 6 – ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM UM ARRANJO PRODUTIVO LOCAL 204 fatores que condicionam tal estratificação? Quais as principais características de cada grupo? Que tipo de barreiras impedem o avanço de cada grupo? Quais as alternativas para superá-las? Que tipo de apoio ou incentivo seria mais indicado a cada grupo? De modo a contribuir com algumas respostas a esses questionamentos, a seguir, apresenta-se uma metodologia adotada para a análise da competitividade interna do Pólo de Cerâmica Vermelha de Campos, que poderá ser estendida a outros arranjos produtivos com características similares. 6.2. Metodologia e etapas do estudo O processo de mudança tecnológica em arranjos produtivos locais provoca ou acentua um efeito de dispersão entre as empresas envolvidas que, de acordo com seus recursos e rotinas internos, competências e desempenho, caracterizam a dinâmica competitiva desses sistemas. Tal estratificação pode ser analisada em termos de agrupamentos de empresas com diferentes estágios tecnológicos e competitivos. A taxonomia adotada classifica as empresas em três grupos distintos, a saber: (1) as líderes; (2) as intermediárias; e, (3) as retardatárias, conforme a abordagem proposta no capítulo anterior. A hipótese assumida é que, através da metodologia proposta tal estratificação pode ser captada e analisada. A tese é que tal estratificação define a “Trajetória Competitiva”1 do arranjo. A seguir, apresenta-se um resumo da pesquisa realizada junto ao Pólo Ceramista de Campos empregando-se tal metodologia. 6.2.1 Método de abordagem Para a realização de tal trabalho, num primeiro momento, buscou-se informações e dados publicados a respeito de pólos similares de outras regiões de forma a definir o tipo e especificidade das informações a serem levantadas para o caso em estudo. Em seguida este mesmo procedimento foi realizado para o Pólo local. Tais informações serviram para um mapeamento geral das empresas do Pólo e do tipo de informação não disponível sobre elas. Dessa forma, foi definido um conjunto de informações que deveriam ser levantadas através de pesquisa direta. Para tanto, foi elaborado previamente um questionário para seleção de uma amostra 1 Para a interpretação desse conceito, ver Capítulo 4. A descrição da metodologia encontra-se no Capítulo 5. CAPÍTULO 6 – ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM UM ARRANJO PRODUTIVO LOCAL 205 representativa da diversidade tecnológica do pólo. Foram consultados profissionais e pesquisadores de instituições da área na região, entre os quais: o Sindicato dos Ceramistas, os Laboratórios de Materiais Avançados e de Engenharia Civil (ambos da UENF), além de técnicos do Parque de Alta Tecnologia do Norte Fluminense (TECNORTE), do Centro Federal de Ensino Tecnológico (CEFET-Campos), do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) local e dos próprios ceramistas. Os entrevistados responderam a pergunta de quais as empresas eles enquadrariam em cada grupo, adotando como parâmetro o tripé tecnologia x produto x mercado. Sugeriuse que baseassem suas escolhas em critérios como (i) modernização do processo produtivo, (ii) produtos de melhor qualidade e (iii) agregação de valor. Após as indicações, foram identificadas as empresas mais citadas, em cada um dos grupos previamente definidos. O total de empresas selecionadas foi de quinze (15), sendo 4 em cada grupo (líderes, intermetiárias e retradatárias) e outras três (3) escolhidas de forma aleatória entre aquelas citadas. Na amostra assim levantada, pode-se considerar que as empresas selecionadas para o primeiro grupo, correspondem a praticamante 100% do seu estrato na população, e as do segundo grupo, cerca de 80%. O terceiro grupo, apesar de a amostra para esse segmento ser baixa em relação ao seu correspondente populacional (cerca de 5%), verificou-se através de um mapeamento prévio e visitas informais a uma dezena de outras unidades aleatórias, que a diversidade tecnológica captada através destas, não justificava incluir mais unidades nesse grupo. Considerando que a população total do arranjo é de aproximadamente 110 unidades, pode-se considerar a amostra das 15 unidades selecionadas como altamente representativa da diversidade do arranjo. 6.2.2 Método de procedimento Essa etapa compreendeu o levantamento de informações e dados primários através de entrevistas técnicas e observações diretas nas empresas do referido Pólo. A pesquisa de campo propriamente dita, envolveu duas fases: uma, (i) de entrevistas com o proprietário ou gerente da empresa; e outra, (ii) de acompanhamento do processo produtivo. Na primeira fase, o proprietário (ou gerente) respondeu a um questionário-padrão2, com informações gerais sobre a empresa, dados relacionados à administração, produtos, mercado, investimentos e estratégias. Na segunda fase, fez-se um acompanhamento in loco 2 Vide Apêndice C. CAPÍTULO 6 – ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM UM ARRANJO PRODUTIVO LOCAL 206 de todas as etapas do processo produtivo em cada empresa, desde a extração nas jazidas, passando pelas etapas de preparação da massa e fabricação, até o estoque do produto acabado, com ênfase nos pontos diferenciais, com o preenchimento de um segundo questionário-padrão. Além das observações das etapas do processo, cada ponto representativo de diversidade em termos de equipamento, método, técnica ou rotina, foi avaliado e fotografado. Com tais informações elaborou-se um Relatório da Pesquisa de Campo3, com uma investigação empresa por empresa, etapa por etapa, cujos resultados fundamentaram a aplicação e a análise da metodologia, os quais são apresentados a seguir. 6.3. Apresentação dos dados e informações Para se preservar o sigilo das informações coletadas, os verdadeiros nomes das empresas são omitidos, adotando-se uma notação alfabética para denominar cada empresa avaliada, da seguinte forma: Cerâmica A, Cerâmica B, e assim por diante, até a Cerâmica O. 6.3.1 Considerações preliminares A maioria das empresas visitadas possui trabalhadores provenientes da indústria da cana de açúcar, devido à redução do número de emprego nesse setor nos últimos anos. Tal mão-de-obra é pouco qualificada e carente de formação técnica, com grande incidência de analfabetos, o que compromete iniciativas de melhoria da qualidade no processo de fabricação. Além disso, a maioria das empresas possui como característica peculiar a administração familiar. Das 15 cerâmicas visitadas, apenas 8 empresas (A, B, D, G, H, K, L, M) utilizavam efetivamente o gás natural em seus fornos. Essas empresas estão entre as que têm maior capacidade de queima e produzem maior volume de peças por mês. Devido ao padrão mais homogêneo proporcionado por esse combustível, os produtos desse grupo apresentam características mais uniformes e de melhor qualidade4. A seguir, apresenta-se um resumo da pesquisa com as informações mais relevantes do ponto de vista da aplicação da metodologia proposta. 3 4 O relatório completo da pesquisa de campo encontra-se no Apêndice A. A qualidade aqui referida é a aparente e comparada. Por ainda não existir normas técnicas para todos os tipos de produtos fabricados pelas empresas do arranjo, não foram realizados testes nos produtos. CAPÍTULO 6 – ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM UM ARRANJO PRODUTIVO LOCAL 207 6.3.2 Análise de padrões, rotinas e recursos A Cerâmica A, produtora de blocos cerâmicos (tijolos), é uma das 3 empresas que implantaram no processo de fabricação etapas seqüenciais semi-automatizadas (as outras, são a C e a L). Neste caso, a interferência humana acontece somente na etapa do abastecimento do caixão dosador e na parte do transporte das peças do secador para os fornos. A Cerâmica L tem como principal produto as telhas revestidas (ver Fotos 6.1 e 6.2). Tal produto passa por um processo de tratamento de impermeabilidade que aumenta a durabilidade e a resistência do material. A empresa chega a oferecer uma garantia da qualidade de 10 anos para esses produtos. Além disso, foi introduzido no processo um equipamento para resfriamento da água antes da extrusão (maromba), o que, segundo o gerente operacional, deixa a massa mais “solta”, reduzindo a frequência de interrupções do processo produtivo para limpeza do equipamento, além de proporcionar melhor textura nas peças. Segundo o proprietário, a empresa L é uma das três no Brasil (uma tem sede em Santa Catarina e outra em São Paulo) a empregar tal tecnologia na fabricação de telhas. Essa tecnologia tem patente detida pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), que recebe royalties da empresa. Pelos dados analisados pode-se verificar que a empresa L consegue um maior valor agregado nas peças fabricadas, com uma diferença no preço do milheiro que pode triplicar em relação ao preço das produzidas tradicionalmente (telhas naturais). Vale lembrar que o uso de tecnologia patenteada é um caso atípico para as empresas estudadas. Um dos pontos mais interessantes observados no processo produtivo da cerâmica L é a utilização de um cortador mecânico (sem fios de corte), no qual um tipo de pá faz o corte na massa, sendo acionado pelo próprio movimento da massa extrudada (ver Foto 6.3). Nos cortadores convencionais (automáticos), utilizados em todas as demais unidades estudadas, o corte é realizado por fios metálicos (arames), que constantemente se partem devido ao desgaste, ocasionando paradas não programadas e perdas no processo (ver exemplo na Foto 6.4). Esta “inovação” possibilitou uma substancial redução no número de paradas no processo dessa empresa. CAPÍTULO 6 – ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM UM ARRANJO PRODUTIVO LOCAL 208 Foto 6.1 - Telhas revestidas e embaladas (Cerâmica L) Foto 6.2 – Revestimento em diversas cores (idem) Foto 6.3 – Cortador mecânico giratório (idem) Foto 6.4 – Exemplo de cortador convencional (com arames) Além da Cerâmica L, outras empresas, como as Cerâmicas B, E, K, também têm como diferencial o tratamento pós-extração da massa (argila). Essas empresas realizam um tratamento diferenciado nesta etapa do processo, devido à dupla laminação e à posterior estocagem em silos da massa trabalhada, inclusive, com a utilização de testes em laboratórios credenciados. As Cerâmicas C e F investem em equipamentos modernos e na diversificação de produtos (ver Fotos 6.5 e 6.6, respectivamente). Segundo o proprietário da Cerâmica F, a reestruturação do seu setor administrativo, fez com que sua empresa adquirisse uma CAPÍTULO 6 – ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM UM ARRANJO PRODUTIVO LOCAL 209 melhor integração entre as partes da gestão e do processo produtivo, através de melhorias nas operações, o que aperfeiçou e melhorou o fluxo de informações entre os setores de administração da produção e de chão-de-fábrica. A diversificação de produtos é também uma estratégia adotada pela Cerâmica E, a pioneira local na produção de plaquetas vazadas e de revestimentos rústicos. Foto 6.5 – Prensas modernas para produção de telhas (Cerâmica C) Foto 6.6 – Bloco vazado aparente e plaquetas de revestimento (Cerâmicas F) As Cerâmicas F, I, J, N e O, trabalham com uma composição da massa muito heterogênea (ver Foto 6.7, como exemplo) e não realizam tratamento pós-extração das argilas. Outra característica comum é a não utilização de termopares (sensores para o controle da temperatura interna dos fornos). Além disso, os equipamentos de produção são muito antigos, pouco eficientes, e o lay-out da planta e as instalações em geral (especialmente as elétricas) são improvisadas. A não realização de inspeção em nenhuma das etapas do processo contribui para que a massa com resíduos orgânicos acentue as perdas totais no processo. Tais fatores comprometem a qualidade de seus produtos (ver Foto 6.8). CAPÍTULO 6 – ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM UM ARRANJO PRODUTIVO LOCAL Foto 6.7 – Massa muito heterogênea (Cerâmica O) 210 Foto 6.8 - Blocos danificados (idem) As fotos a seguir apresentam um quadro geral da diversidade de padrões verificados nas unidades pesquisadas, como por exemplo, em relação à logística interna e à organização do trabalho (Fotos 6.9 e 6.10), no processo de secagem (Fotos 6.11 e 6.12) e na tecnologia de queima (Fotos 6.13 e 6.14) e na organização da produção (Fotos 6.15 e 6.16). Foto 6.9 – Transporte braçal das peças (Cerâmica I) Foto 6.10 – Utilização de microtrator para o transporte das peças (Cerâmica M) CAPÍTULO 6 – ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM UM ARRANJO PRODUTIVO LOCAL 211 Foto 6.11 – Secagem natural (ao ar livre) (Cerâmica N) Foto 6.12 - Ventiladores móveis para secagem (Cerâmica D) Foto 6.13 – Forno tipo circular (secular) (Cerâmica J) Foto 6.14 - Forno túnel (moderno) (Cerâmica K) Foto 6.15 – Processo produtivo caótico (Cerâmica J) Foto 6.16 – Layout limpo e organizado (Cerâmica F) CAPÍTULO 6 – ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM UM ARRANJO PRODUTIVO LOCAL 212 6.4 Cálculo e plotagem dos índices de recursos e de desempenho Nesta etapa, primeiramente é verificada a hipótese da estratificação e se esta é captada pela metodologia, e em seguida, se a tese da Trajetória Competitiva se confirma. Conforme a metodologia proposta, através dos dados e informações coletados pôde-se levantar os índices de recursos (IRTk1) e de desempenho (IDk1), para cada unidade da amostra5. A seguir são apresentadas as distribuições de padrões para a amostra e as correlações apresentadas por tais índices para os parâmetros considerados. 6.4.1 Tratamento e interpretação das informações O Gráfico 6.1 apresenta a distribuição da amostra, segundo IRTk. Neste caso, no extremo superior encontram-se as unidades L (líder) e B. As unidades F, M, E e A estão em um padrão próximo, porém, abaixo. No outro extremo, as unidades J, I, O e N estão no padrão mais baixo verificado. As demais estão em uma zona intermediária. Distribuição 1,00 L B IRTk 0,80 A C F E D M G 0,60 K H N 0,40 I 0,20 O J 0,00 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 Unidades (k) Gráfico 6.1 – Padrão de recursos para as unidades da amostra 5 O detalhamento do cálculo dos índices está no Apêndice B. Os dados utilizados nos cálculos dos índices para cada unidade estão no Apêndice A. CAPÍTULO 6 – ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM UM ARRANJO PRODUTIVO LOCAL 213 O Gráfico 6.2 mostra a distribuição da amostra para IRTk1 e dois parâmetros diferentes tomados como índice de desempenho. O parâmetro PEk1 (em azul claro) é a taxa de produtividade energética, medido pela relação entre a produção (peças/mês) pelo consumo médio de energia elétrica (kWh/mês). O parâmetro PQk1 (em verde), é a taxa de produtividade da queima de combustível, medido pela relação entre a produção (peças/mês) e o consumo médio de combustível (m3/mês). Distribuição Amplitude 1,00 0,80 IR Tk1 0,60 PQ k1 0,40 PEk1 0,20 0,00 A B C D E F G H I J K L M N O Unidades (k) Gráfico 6.2 – Distribuição de padrões da amostra (segundo IRTk1, PEk1 e PQ k1) Os Gráficos 6.3 e 6.4, a seguir, mostram a correlação entre cada um deles e IRTk1. Desempenho(PEk1 ) Correlação 1,00 G D 0,80 0,60 0,40 F I J M C O N H K EA 0,20 0,00 0,20 0,40 0,60 0,80 B L 1,00 Recursos (IRTk1) Gráfico 6.3 – Correlação: Recursos (IRTk1) x Produtividade energética (PEk1) CAPÍTULO 6 – ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM UM ARRANJO PRODUTIVO LOCAL 214 Desempenho(PQ K1 ) Correlação K 1,00 0,80 0,60 0,40 J O I N H M C F E A G D 0,20 0,00 0,20 0,40 0,60 0,80 B L 1,00 Recursos (IRTk1) Gráfico 6.4 – Correlação: Recursos (IRTk1) x Produtividade na queima (PQk1) Apesar de demonstrar agrupamentos em determinadas áreas, apresentando uma média correlação com IRTk1 (respectivamente R=0,44 e R=0,56, calculados a partir do Excel), tais parâmetros não são boas referências para uma amostra estratificada, devido ao fato das concessionárias cobrarem preços diferenciados de acordo com determinadas faixas de consumo. Entretanto, a partir de tais gráficos, algumas informações relevantes foram captadas, como veremos a seguir, No Gráfico 6.3, pode-se perceber as diferenças entre as unidades que queimam lenha e aquelas que utilizam gás. Aquelas que queimam lenha e produzem tijolos conseguem um alto desempenho, mesmo com baixo padrão de recursos (como é o caso da unidade I). Enquanto aquelas que queimam gás e fabricam telhas (por exemplo, L e B), estão entre as unidades de desempenho mais baixo, apesar de apresentarem alto padrão de recursos. Isso deve-se ao fato da queima a gás e produção de telhas, exigir maior consumo de energia na planta (inclusive com maior número de horas trabalhadas por mês, pois geralmente funcionam em turnos). Por tal parâmetro, as unidades que queimam lenha sempre teriam vantagem sobre as que queimam gás. Pelo referido gráfico, a unidade E é a que estaria melhor posicionada com relação ao padrão de recursos, merecendo um comentário à parte. Tal unidade é fabricante de produtos rústicos (tijolos e plaquetas de revestimento)6, com alto valor agregado e, justamente a queima a lenha é que prossibilita a obtenção das características diferenciais de seus produtos. 6 Vide Apêndice A. CAPÍTULO 6 – ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM UM ARRANJO PRODUTIVO LOCAL 215 A interpretação anterior é semelhante para o Gráfico 6.4. Com o desempenho medido pela produtividade na queima (PQk1), como os gastos com o consumo de gás natural são substancialmente mais elevados que com a lenha, há uma distorção em favor das unidades que fabricam tijolos, utilizando tal insumo, devido aos baixos custos verificados hoje nessa configuração. Porém, há uma tendência de crescimento dos custos associados à madeira de um modo geral, por restrições ambientais e de mercado. Entretanto, conclui-se que os parâmetros anteriores não são consistentes para refletir o desempenho competitivo das empresas do arranjo, distorcendo a interpretação por não incluir uma noção de valor agregado na produção. Tecnicamente nesse caso, o fator de produtividade mais significativo em termos de desempenho competitivo deve embutir as diferenças de preço dos produtos e do gasto na produção por unidade de combustível consumido (insumo de maior peso nos custos totais da produção). Dessa forma, pode-se tratar todas as unidades do arranjo independentemente do tipo de combustível e dos produto que fabricam. Tal fator, que reflete o valor agregado na produção, é aqui denominado pela sigla PVPK1 (relação entre o valor da produção pelos gastos com consumo de combustível). Os gráficos, a seguir, mostram as respectivas distribuições e correlações desses parâmetros com relação a IRTk1, para cada unidade da amostra. Primeiramente, o Gráfico 6.5 apresenta a distribuição de PVPk1 comparado a IRTk1. IRTK1 PVPK1 Distribuição Amplitude 1,00 0,80 0,60 0,40 0,20 0,00 A B C D E F G H I Unidades (k) J K L M N O Gráfico 6.5 – Distribuição de padrões da amostra (segundo IRTk1 e PVPk1) CAPÍTULO 6 – ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM UM ARRANJO PRODUTIVO LOCAL 216 Desempenho(PVP k) Trajetória 1,00 L 0,80 B 0,60 K 0,40 J 0,20 I N H C D G A O 0,00 0,10 0,30 0,50 E 0,70 M F 0,90 1,10 Recursos (IRTk1) Gráfico 6.6 – Correlação: Recursos (IRTk1) x Produtividade na queima (PVPk1) O Gráfico 6.6 apresenta a correlação entre IRTk1 e PVPk1. Nesse caso, a correlação é bastante acentuada (R=0,90), captando nitidamente a estratificação e a trajetória definida. A distribuição dos grupos na trajetória fica bem clara, confirmando a estratificação dos grupos de acordo com os três regimes tecnológicos propostos7, definindo a trajetória competitiva do arranjo (Gráfico 6.7). desempenho recursos Gráfico 6.7 – Trajetória competitiva hipotética No Gráfico 6.6, pode-se observar que as unidades L e B (que utilizam a tecnologia 7 RT1 = lenha (em azul), RT2 = transição lenha/gás (em verde), RT3 = gás (em vermelho). CAPÍTULO 6 – ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM UM ARRANJO PRODUTIVO LOCAL 217 do gás natural e fabricam telhas) estão no topo. As unidades I, J e O (que queimam lenha e produzem tijolos) estão na região de pior desempenho, estagnadas. As demais encontramse em uma região intermediária. As unidades N e H em pior situação, muito próximas das que estão estagnadas. Já K e E estão bem próximas das líderes. Porém, segundo o conceito de Trajetória Competitiva, a unidade K estaria em um período estacionário8. A unidade E, entretanto, não se enquadra no regime RT2, nem no RT3 (gás). A princípio, esta se enquadraria no regime RT1 (lenha), porém, devido suas características específicas de produção (fabrica itens rústicos, de alto valor agregado) está em uma condição diferenciada em termos de recursos e desempenho. Uma hipótese é que estaria abrindo uma outra trajetória, com um regime RT1’ (lenha + produtos rústicos), intermediário entre RT1 e RT2. Entretanto, como este se constitui em um caso isolado, o contexto atual do arranjo não permite saber, ainda, se tal hipótese se confirmará ou não. Caso haja um maior número de unidades nesse regime (que represente mais um tipo de diversidade), uma pesquisa futura em tais unidades pode ser acrescentada ao estudo. Um outro fator representativo da produtividade, que evita as distorções provocadas pelas diferenças de combustível e o valor da produção, é a tradicional produtividade do trabalho (valor da produção pelo número de homens-hora), aqui denominada de PHhk1. A seguir, os Gráficos 6.8 e 6.9, respectivamente, mostram a distribuição e a correlação entre IRTk1 e PHhk1. IRTk1 PHhk1 Distribuição Amplitude 1,00 0,80 0,60 0,40 0,20 0,00 A B C D E F G H I J K L M N O Unidades (k) Gráfico 6.8 – Distribuição de padrões da amostra (para IRTk1 e PHhk1) 8 PE2,3 na denominação adotada no conceito de trajetória competitiva. Vide Capítulo 4, Seção 4.12 e Gráficos 4.9 e 4.10. CAPÍTULO 6 – ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM UM ARRANJO PRODUTIVO LOCAL 218 Desempenho(PHh ) Trajétória 1,00 L B 0,80 0,60 0,40 0,20 0,00 0,10 JO I 0,30 N 0,50 H K A D F C M G E 0,70 0,90 1,10 Recursos (IRTk1) Gráfico 6.9 – Correlação: Recursos (IRTk1) x Produtividade Homem-hora (PHhk1) A correlação nesse caso é fortíssima (R=0,96). Também por esse parâmetro, a hipótese da estratificação e a tese da Trajetória Competitiva são confirmadas, o que fortalece a consistência da metodologia proposta. O item 7 da metodologia proposta (Capítulo 5), constitui uma agenda futura da pesquisa. 6.4.2 Análise dos resultados Como pode-se observar através dos Gráficos anteriores, a hipótese da estratificação foi plenamente confirmada pela metodologia proposta. Ademais, tal estratificação confirma a tese da Trajetória Competitiva. A estratificação em grupos segundo padrões recorrentes de recursos e desempenho, reflete os padrões de comportamento das empresas do arranjo frente à mudança tecnológica. Essa estratificação não se dá maneira desordenada. O trade-off de cada unidade no balanceamento entre recursos e desempenho é revelado pelas correlações apresentadas. Essa informação mostra que há um certo caminho na transição de padrões tecnico-organizacionais do arranjo, no qual, dependendo da capacidade e competência de cada uma em absorver e desenvolver os recursos adquiridos, as empresas procuram se alocar, definindo uma trajetória. Tal processo, caracteriza a dinâmica competitiva do arranjo revelada pela trajetória definida, que se constitui na trajetória competitiva do arranjo (conforme proposto no Capítulo 4). CAPÍTULO 6 – ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM UM ARRANJO PRODUTIVO LOCAL 219 6.5 Grupos estratificados para o arranjo De acordo com os padrões verificados na pesquisa, pelo critério de similaridade foram as seguintes as características identificadas por cada grupo: No primeiro grupo (Grupo 1), constituído por aquelas unidades consideradas as mais dinâmicas (L e B), encontram-se as cerâmicas que estão à frente do processo competitivo local. Dominam técnicas de produção que possibilitam uma melhor qualidade dos produtos e diversificação de peças. Tais empresas adquirem conhecimentos específicos através de congressos e revistas especializadas, utilizando-os de acordo com suas necessidades e restrições. Suas estratégias estão voltadas para a produção de itens de maior valor agregado e a ampliação do mercado em nichos específicos, atendendo a uma parcela do mercado de maior poder aquisitivo e com demanda crescente. Este grupo representa aproximadamente 2% das empresas do Pólo estudado. Nas empresas do segundo grupo (Grupo 2), as intermediárias, estão as unidades que buscam acompanhar ou se integrar ao grupo líder, mas que ainda apresentam barreiras e limitações internas, tanto no processo produtivo quanto nas atividades de gestão da cadeia de valor que impedem um melhor desempenho (no caso, A, C, D, F, G, K e M). Apresentam deficiência com relação ao controle de custos do processo e não utilizam técnicas adequadas de controle da produção. Como conseqüência, suas margens de lucro são muito menores que as do grupo 1. Apresentam estratégias de mercado desfocadas, tentando se posicionar para atender aos consumidores em geral, investindo na diversificação de produtos sem estabelecer nichos específicos. Este grupo representa em torno de 5% das empresas do arranjo. Já no último grupo (Grupo 3), encontram-se aquelas empresas caracterizadas por não conseguir acompanhar o processo competitivo e as mudanças tecnológicas nem melhorias incrementais significativas (H, I, J, N e O). Tal grupo abrange empresas que atendem a uma grande parcela do mercado, porém em condições de “concorrência predatória” sofrendo, como conseqüência, forte pressão sobre os preços. Estas, não conseguem nem mesmo se tornar “receptoras” de tecnologia externa (como no caso, a implantação de queima a gás), e, a manterem-se nesse padrão, tendem a se tornar cada vez mais excluídas pelo processo competitivo, sem perspectivas de sustentabilidade. Contudo, ainda conseguem vender seus produtos para consumidores pouco exigentes, em nichos de baixo poder aquisitivo. Este grupo compreende o restante das empresas do Pólo. CAPÍTULO 6 – ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM UM ARRANJO PRODUTIVO LOCAL 220 A Tabelas 6.1 e 6.2, a seguir, apresentam um resumo com as características verificadas em cada grupo na estratificação tecnológica para o pólo estudado. Na Tabela 6.1, são indicados (para o caso em que se aplicam) os valores menor e maior, respectivamente, encontrados para o parâmetro correspondente A Tabela 6.2, mostra uma síntese dos padrões verificados para cada grupo, segundo características de processo, produto e estratégias de mercado. Tabela 6.1 – Características dos grupos estratificados Parâmetro Grupo 1 Grupo 2 Grupo 3 Início da produção 1973 - 1997 1961-1996 1973-1993 Capacidade de produção 540.000 - 1.500.000 1.200.000 - 1.800.000 450.000 - 1.500.000 Volume produzido (peças/mês) 330.000 - 2.2000.000 900.000 - 1.500.000 300.000 - 900.000 Tipo de forno Túnel, Hoffman, Caieira, Câmara Vagão, Paulistinha, Hoffman, Circular Circular, Hoffman Combustível (queima) lenha* e gás lenha** e gás lenha Tipo de secagem natural/artificial natural/artificial natural Produtos fabricados tijolos, telhas naturais e revestidas, tijolos maciços, tijolos, plaquetas e telhas naturais tijolos Preço do produto principal R$ 115 (Ti) - R$ 900 (Tr) R$ 90 (Ti) - R$ 300 (T) Nº de funcionários 30 - 110 Principais mercados RJ, Região dos Lagos, Grande Rio 35 – 54 R$ 95 - R$ 100 17 - 18 RJ, Campos, Grande Grande Rio, RJ, Rio, Região dos Lagos, Campos, ES, Região Volta Redonda dos Lagos Ti – tijolo; Tr – telha revestida; T – telha natural. * Usada para aquecer o forno. ** Neste grupo, em alguns casos, a lenha é usada apenas para aquecimento do forno, e em outros, como único combustível nos fornos. CAPÍTULO 6 – ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM UM ARRANJO PRODUTIVO LOCAL 221 Tabela 6.2 – Estratificação em grupos para o arranjo estudado Estratificação Grupo 1 Grupo 2 Grupo 3 Unidades Principais Características Processo Produto Realização de Unidades mais compactas; ensaios de Maior produtividade; conformidade; Queima mais eficiente; B, L média Realização de testes nas argilas; variabilidade de Tratamento pós-extração; padrões; Reaproveitamento do calor dos Diversificação fornos para secagem. direcionada. Testes informais de conformidade; Ampla Investimentos na modernização variabilidade de dos fornos; Substituição (lenta) A, C, D, F, G, K, M padrões; da lenha pelo gás; Iniciativas de Diversificação redução dos custos. não direcionada a nichos específicos. Não realização Administração familiar; Fornos de testes nem ineficientes; Equipamentos inspeção; rudimentares; Baixa variabilidade de H, I, J, N, O produtividade; padrões fora de Desconhecimento das perdas no controle; processo e dos seus custos. Peças de baixa qualidade. Mercado Exploração de nichos específicos (de maior poder aquisitivo); demanda pouco variável. Estratégias indefinidas; Não vende para nichos específicos de mercado; Demanda muito variável. Vende para nichos de baixo poder aquisitivo; pouco variável. 6.6 Considerações finais sobre o Capítulo Devido ao fato de atuarem em um mercado pouco restritivo quanto à qualidade, com forte pressão por menores preços, o que se observa é que, tanto as empresas do Grupo 1 (que detém maior controle na especificação de seus produtos), quanto aquelas do secundo e terceiro grupos, conseguem vender seus produtos por uma pequena variação de preços. Tal fato pode ser explicado por não existir uma regulamentação quanto às normas de qualidade e conformidade dos produtos (normalização). Como resultado, tanto aquelas empresas que realizam testes (como, por exemplo, de absorção d’água, resistência, conformidade nas dimensões e análise granulométrica da argila), quanto aquelas que não realizam nenhum tipo de ensaio, competem com preços próximos no caso dos tijolos, porém com grande defasagem de custos operacionais e na qualidade dos produtos. O gás natural, apesar de representar o principal condicionante na estratificação do arranjo, não é o único. As estratégias de diversificação de produtos e o emprego de CAPÍTULO 6 – ESTRATIFICAÇÃO E TRAJETÓRIA COMPETITIVA EM UM ARRANJO PRODUTIVO LOCAL 222 métodos de redução de desperdícios e controle do processo, paralelamente, têm forte e decisiva influência no processo de transição para sustentação desse regime. Um caso particular é o da cerâmica E, que, apesar de utilizar lenha como combustível, devido aos investimentos no controle do processo (principalmente na seleção de argilas e na temperatura de queima) e na exploração de mercados alternativos, de maior valor agregado (produtos rústicos) é a pioneira neste segmento no arranjo. Por outro lado, a grande maioria das empresas do Pólo (Grupo 3) apresenta claras deficiências técnicas e organizacionais na utilização do mesmo processo de queima. Apesar disso, estas ainda encontram mercado em nichos de baixa renda, especialmente nas favelas da cidade do Rio de Janeiro e áreas de periferia de municípios do Grande Rio e da cidade de Campos-RJ. Através da abordagem proposta pôde-se estabelecer vínculos entre os fatores de mudança tecnológica e seus efeitos na dinâmica competitiva do arranjo e o processo de estratificação em grupos. Foram idenficadas característica particulares que afetam o desempenho das empresas de cada grupo em termos do processo produtivo e atividades de gestão, ao longo das cadeias de valor. Com os resultados desse trabalho, espera-se oferecer subsídios para que programas específicos de apoio e incentivos, e políticas e estratégias de benchmarking e up-grading tecnológico e organizacional possam ser mais precisos e adequados às características de cada grupo de empresas, ao invés de distribuídos genericamente para o setor como um todo. CAPÍTULO 7 CONCLUSÕES 7.1 Considerações Finais Atualmente, o termo competitividade é amplamente empregado nas mais diversas situações e, em muitos casos, não há rigor na definição do conceito, o que tem gerado um verdadeiro mosaico de definições, dificultando o entendimento e, muitas vezes, induzindo conflitos de interpretação. Buscando avançar no marco conceitual sobre o tema, procurouse desenvolver, no Capítulo 2, uma avaliação sobre as principais visões sobre a “competitividade”, contrapondo diversos enfoques, de modo a prover uma interpretação sintética das dicotomias e divergências mais destacadas. Vimos que o conceito de competitividade está associado a uma visão teórica do processo econômico e da finalidade de sua mensuração. Nesse sentido, duas correntes se destacam tradicionalmente pelos distintos enfoques da competitividade: uma, a qual, para efeitos de contraposição de conceitos, poder-se-ía denominar de “industrial-otimizante”, centrada na eficiência e nos aspectos endógenos da empresa; e outra, com enfoque “mercadológico”, que sustenta uma abordagem centrada na eficácia, cujos parâmetros de desempenho são os resultados obtidos no mercado, independente de suas fontes, sendo portanto, exógena. Em ambas, o enfoque está relacionado ao desempenho da empresa. Observamos também, que um conceito mais representativo do termo competitividade deveria integrar os critérios de avaliação da eficiência e do desempenho presente, com sua evolução e perspectivas de sustentação futura. Dessa forma, seria CAPÍTULO 7 – CONCLUSÕES 224 importante responder a uma pergunta fundamental: Onde estariam as fontes das vantagens competitivas? Ressaltamos que para responder a esta pergunta, seria necessário adotar uma perspectiva dinâmica, a partir de uma visão em que o desempenho no mercado e a eficiência produtiva decorrem da capacitação acumulada pelas empresas que, por sua vez, reflete as estratégias competitivas adotadas em função de suas percepções quanto ao processo concorrencial e ao meio ambiente onde estão inseridas. Desse modo, ao invés de entendida apenas como um fator intrínseco de um produto ou de uma firma, a competitividade surgiria também como uma característica extrínseca, relacionada ao padrão de concorrência vigente em cada mercado. Nessa abordagem, o processo de tomada de decisão estratégica concentraria os fatores primordiais da competitividade. Porém, devido às incertezas do ambiente, e conseqüentemente, pela impossibilidade de se conhecer antecipadamente as estratégias dos concorrentes, as empresas definiriam seu comportamento e suas estratégias competitivas baseadas em experiências passadas e de sua perspectiva quanto ao futuro. Dessa forma, tal visão vincula-se a conceitos econômicos evolucionários. Nesta linha, alguns fatores a serem avaliados, além da produtividade, seriam: o tamanho das firmas, a estrutura produtiva, o padrão de concorrência, as tecnologias utilizadas e alternativas presentes e futuras, as economias de escala e de escopo, as competências específicas, entre outros mais específicos à região, ao setor e às próprias firmas, como a história específica e à cadeia de valor. Vimos que na análise da competitividade estão envolvidos vários níveis, internos e externos, que, em suma, buscam captar o comportamento da firma no ambiente. Entretanto, a divisão tradicional da análise competitiva nos níveis organizacional, estrutural, geográfico e sistêmico, negligencia certos arranjos produtivos locais, pouco competitivos fora da esfera regional. Nesse sentido, para quando esta análise envolver pólos de indústrias locais, propôs-se a consideração de um quinto nível, o qual foi denominado de nível “segmental”. Tal denominação foi adotada devido a certos segmentos de cadeias produtivas, pouco representativos em termos de fluxos comerciais, não serem captados pelos níveis tradicionais. Entretanto, em muitos casos, arranjos produtivos locais embutidos em tais segmentos, exercem papel fundamental na economia regional/local, sendo suscetíveis a propostas de desenvolvimento específicas. CAPÍTULO 7 – CONCLUSÕES 225 Concluímos que a competitividade, como o próprio processo produtivo é, essencialmente, comportamental e dinâmica. No Capítulo 3, exploramos os fundamentos teóricos da competitividade, em busca de uma abordagem que permitisse e sustentasse a identificação e diferenciação de características específicas das firmas, considerando padrões de comportamento na obtenção de vantagens competitivas em determinados ambientes. Vimos que, a visão neoclássica não permitiria uma abordagem que captasse contribuições próprias na geração de diversidade técnica e a dinâmica tecnológica interfirmas em arranjos produtivos locais. Portanto, seus fundamentos teóricos não seriam compatíveis com os propósitos desse trabalho. Em seguida, apresentamos uma síntese das características principais da abordagem econômica evolucionária e seus elos com as questões do desenvolvimento econômico local. Buscou-se destacar sua relevância no estudo do processo socioeconômico e o desenvolvimento local e, especificamente, para os propósitos desse. Nesse sentido, uma questão estratégica seria investigar até que ponto o futuro de um determinado sistema local poderia ser determinado ou previsto, e como se avaliar a dinâmica desse sistema, de modo a contornar barreiras e induzir investimentos públicos e privados. Pelas hipóteses evolucionárias, concluiu-se que a diversidade de recursos e competências, assim como o desempenho, poderiam ser critérios de identificação de méritos e deficiências dos agentes em arranjos produtivos locais. Como vimos, diversas microrregiões dispõem de oportunidades para melhorar seu ambiente local e atrair empreendedores e trabalhadores qualificados capazes de desenvolver novas idéias e atividades econômicas que poderiam se tornar núcleos de novas ondas de desenvolvimento. Nesse grupo, se enquadrariam especialmente aquelas altamente dinâmicas, cujas economias de aglomeração e de urbanização oferecem vantagens de flexibilidade asseguradas pela diversidade de atividades, as quais, tenderiam a prevenir um processo de saturação e estagnação. Por outro lado, em microrregiões que não apresentem tais condições, a disponibilidade de oportunidades não é condição suficiente para evitar uma inércia na estrutura econômica local. Nesses casos, políticas de desenvolvimento têm mais possibilidades de sucesso quando seus objetivos estão fortemente vinculados às características do ambiente local. Conseqüentemente, haveria a necessidade de políticas específicas, afinadas com os recursos e as carências de cada contexto. CAPÍTULO 7 – CONCLUSÕES 226 Desse modo, devería-se considerar principalmente a configuração das instituições locais na construção de redes de capacitação, através da conexão de firmas e outras instituições baseadas em conhecimento (universidades, centros de tecnológicos, laboratórios etc.), de modo a fortalecer o processo de aprendizagem interativa e os padrões competitivos dos arranjos locais. Neste contexto, as alternativas para políticas de estímulo à criação de variedade e de determinação de desenvolvimento futuro estariam de certa forma limitadas, levando a questões para as quais dificilmente haveria respostas gerais: Quando as alternativas de adaptação são limitadas pelas fronteiras históricas do sistema, seria possível mudar o curso do desenvolvimento para uma trajetória de sucesso? De que forma? Como, por exemplo, evitar uma situação de saturação ou estagnação, causadas pela dependência da trajetória local? Como construir uma rede de capacidades (conforme amplamente sugerido na literatura) em regiões periféricas, cuja inércia institucional e a falta de confiança são mais regra do que exceção? Como proceder para tornar mais capazes os decisores para avaliar o grau de adequação e os efeitos das interações entre os aspectos regionais/locais, mudança tecnológica e desenvolvimento? De acordo com os autores citados, observamos que responder a tais questionamentos constituiria, no futuro próximo, um dos principais desafios da abordagem evolucionária do desenvolvimento econômico e tema de crescente interesse acadêmico. Na visão evolucionária, o ambiente e os agentes humanos interagiriam em um processo dinâmico, com resultados futuros incertos. Entretanto, em casos onde as trajetórias se mostram defasadas em relação às de setores similares de outras regiões, com acentuado gap tecnológico, em um primeiro estágio, estas últimas poderiam servir de referencial para um processo de benchmarking e absorção de tecnologias mais avançadas, considerando características e especificidades de cada contexto. Todavia, observamos também que políticas de desenvolvimento baseadas em princípios evolucionários, concebem os agentes econômicos como “adaptadores” e não como “otimizadores” (como na visão neoclássica). Assim, algumas trajetórias de desenvolvimento não estariam suscetíveis ao planejamento ou previsão pelos decisores. Por outro lado, em muitos casos, podería-se afirmar com uma certa dose de certeza onde determinadas atividades não seriam localizadas. Nesse caso, seria fundamental a integração e atuação conjunta de órgãos de governo, entidades sociais, centros de tecnologia e de CAPÍTULO 7 – CONCLUSÕES 227 pesquisa para a criação de alternativas próprias de desenvolvimento. Além disso, ressaltouse também que os “mecanismos de seleção” não determinariam isoladamente o sucesso ou o fracasso de certas agentes e arranjos em gerar e desenvolver novas tecnologias ou novas combinações para superar barreiras do ambiente. A intervenção humana (política) poderia exercer um papel fundamental em tal processo, principalmente quando dirigida a reverter ou atenuar efeitos negativos da “dependência da trajetória”. Para se contornar os efeitos de “dependência da trajetória” local é necessário direcionar investimentos que proporcionem mudanças estruturais, contudo passo-a-passo e de forma sustentável. Nesse sentido, um passo crucial seria a criação e adoção de ferramentas de abordagem da competitividade que permitissem visualizar o comportamento dos agentes em sistemas produtivos locais, de forma realista, captando especificidades e elementos de diversidade, não tratando como unidade o que é fragmentado, heterogêneo e difuso. Contribuições nesse sentido podem ser consideradas como “luzes guia” para um tratamento mais efetivo da competitividade interna de arranjos produtivos locais e do desenvolvimento de certas localidades, não captadas no tratamento mainstream. No Capítulo 4, a partir dos conceitos evolucionários introduzidos previamente, enfatizou-se a busca e definição de uma unidade de análise do comportamento da firma que representasse: (i) um elemento de ligação entre fatores endógenos e exógenos (entre o específico e o geral) e, conseqüentemente, servisse como; (ii) um parâmetro de interpretação do desempenho de cada firma, refletindo as posições relativas de cada uma de acordo com a dinâmica coletiva do arranjo. Nesse sentido, o passo seguinte foi integrar os fundamentos evolucionários com conceitos da teoria comportamental e da competência da firma, para o desenvolvimento de uma abordagem evolucionária competitividade em arranjos produtivos locais que captasse elementos externos e internos à firma, de forma combinada. Assumimos, através dos conceitos explorados, que a dinâmica competitiva e a evolução, nesse tipo de sistema, são fatores dependentes do padrão de recursos e do desempenho das firmas, os quais, condicionam seu comportamento. Tal comportamento, por sua vez, seria condicionado por sua capacidade de transformar recursos, habilidades, capacidade e rotinas, em competências, aplicando-as na tomada de decisões estratégicas de sobrevivência e desenvolvimento. Um aspecto considerado em tais decisões, é que estas ocorrem em vários níveis, desde aquelas mais freqüentes, do dia-a-dia, até outras, CAPÍTULO 7 – CONCLUSÕES 228 eventuais, mas estratégicas para a sustentabilidade da firma. Internamente à firma, o conjunto de regras, procedimentos, rotinas e os vários padrões de comportamento carregariam suas impressões e “caracteres” incorporados no processo de adaptação ao meio. Estes, quando captados e interpretados coerentemente, poderiam contribuir para revelar à verdadeira fonte das vantagens e desvantagens competitivas de cada firma. A identificação de padrões embutidos em tais elementos, intrínsecos à firma, foi o método adotado para se entender e se analisar seu comportamento e a dinâmica competitiva do arranjo. Como conseqüência da interpretação particular do processo de mudança tecnológica e da dinâmica competitiva das firmas em arranjos produtivos locais, ao longo dos Capítulos apresentados, introduziu-se o conceito de “Trajetória Competitiva”. Com base nos mecanismos evolucionários, os elementos considerados foram: i) Os recursos, experiência, habilidades, competências, estratégias e o conhecimento útil, próprios de cada firma e incorporados em suas rotinas e técnicas, se refletem na posição competitiva da firma no arranjo; ii) As oportunidades de melhoria técnica e o acesso aos “regimes tecnológicos” e seus respectivos padrões técnicos e organizacionais, estariam disponíveis a todas às firmas através de trajetórias tecnológicas definidas no ambiente externo, porém, apenas aquelas que conseguem atingir um padrão mínimo de recursos, rotinas e desempenho, se tornam aptas a migrar para um novo regime; iii) Os efeitos de “dependência da trajetória”, os “mecanismos de seleção”, o padrão de concorrência específico do arranjo e as condições de mercado e de infraestrutura local, condicionam o comportamento das firmas no processo de mudança e adaptação. No Capítulo 5, vimos que avanços no estudo do desenvolvimento econômico local e das novas organizações produtivas industriais têm revelado a necessidade de se romper a tradicional fronteira de divisão dos fenômenos econômicos em microeconomia e macroeconomia. A abordagem da competitividade em arranjos produtivos locais requer um ponto vista da dimensão mesoeconômica do ambiente, vinculada especificamente ao CAPÍTULO 7 – CONCLUSÕES 229 contexto local e setorial de cada ambiente. Entretanto, fatores internos às firmas geralmente são ignorados ou não são captados pelas abordagens tradicionais. Através das abordagens descritas, pôde-se perceber a importância do desenvolvimento de novos enfoques para análise e caracterização das atividades tecnológicas, principalmente para o tipo de sistema abordado. Na abordagem proposta, considerando um arranjo produtivo local, partimos do pressuposto de que as oportunidades e mudanças tecnológicas proporcionadas pelo ambiente provocariam um processo de estratificação competitiva entre as empresas. Esta foi uma derivação da hipótese evolucionária de diversidade no ambiente, a qual se constituiu na hipótese básica da abordagem proposta. Uma proposição foi que tal estratificação poderia revelar a “Trajetória Competitiva” do arranjo (como vimos no Capítulo 4), a qual, constituiu a base da metodologia desenvolvida. Vimos que o levantamento e a análise da estratificação em arranjos produtivos locais é relevante tanto do ponto de vista da Organização Industrial e da Inovação, como para a Economia Política e a “Engenharia Institucional” (no conceito proposto por SQUAZZONI & BOERO, 2002), o qual, poderia possibilitar a priorização e o direcionamento de ações, programas e políticas industriais de desenvolvimento desses ambientes. Indústrias, setores, clusters, e, inclusive, pequenos arranjos locais, compreendem empresas com graus diferenciados de evolução tecnológica e organizacional. Entretanto, por razões metodológicas, são tratados de forma idêntica por programas governamentais de apoio tecnológico e organizacional. Nesse sentido, propomos uma nova alternativa para se abordar tal problema. Se as especificidades internas das firmas em relação à sua cadeia de valor, produtividade, qualidade, e outros parâmetros de formação da competitividade, seguem certos padrões e formam agrupamentos característicos em termos de arranjo, poder-se-ia propor programas específicos e soluções diferenciadas para cada grupo, de acordo com suas especificidades, seu padrão tecnológico e suas dificuldades, considerando suas competências próprias. Com relação ao caso específico do arranjo escolhido para ilustrar a aplicação da metodologia (Pólo de Cerâmica Vermelha de Campos-RJ), o processo de mudança tecnológica foi considerado através de uma interpretação particular do conceito de regime tecnológico aplicado à tecnologia de queima no processo produtivo. CAPÍTULO 7 – CONCLUSÕES Cada regime compreenderia certos padrões técnicos e 230 organizacionais característicos, os quais, deveriam ser assimilados por cada firma na transição entre dois regimes tecnológicos diferentes (no caso, lenha e gás natural). Portanto, tais padrões, característicos dos respectivos regimes, deveriam ser identificados e levantados. Uma investigação empírica foi realizada com esse propósito. Para o estudo de campo, foi selecionada uma amostra estratificada representativa da diversidade tecnológica do arranjo, englobando proporcionalmente unidades em cada um dos regimes. Assumimos que cada regime era representativo de um certo estágio de desenvolvimento tecnológico no tempo, sabendo, entretanto, que na prática, estes coexistem, sendo por isso incluído um regime misto, de transição. A estrutura geral do arranjo de Cerâmica Vermelha permitiu supor que as trajetórias futuras passam por um certo tipo de trade-off entre os efeitos de “destruição criativa” e de “dependência da trajetória”. Os primeiros, provocados pela pressão competitiva do mercado e pela disponibilidade das condições necessárias para implementação da tecnologia do gás natural em substituição ao sistema de queima à lenha. De uma certa forma, estes se oporiam aos efeitos da “dependência da trajetória”, devido às características históricas de subdesenvolvimento, à lenta evolução técnica e organizacional do segmento, e à cultura empresarial específica do arranjo. Tais fatores são fortemente condicionados pela efetividade e eficácia das intervenções de ajuste na atividade, através de políticas institucionais e governamentais (programas, incentivos e isenções), que tradicionalmente exercem um caráter assistencialista aos agentes (empresários), ou favorecem apenas a certos grupos específicos, além de normas de regulamentação (fiscalização ambiental e social). Verificamos que os conceitos e hipóteses assumidos na abordagem, e incorporados na metodologia, se mostraram perfeitamente compatíveis com o contexto, dado que os primeiros foram justamente definidos a partir do segundo. A aplicação-ensaio da metodologia proposta foi apresentada no Capítulo 6, com o objetivo de se avaliar sua consistência e as hipóteses levantadas. Nesse Capítulo, apresentou-se uma síntese da pesquisa de campo realizada, cujo objetivo foi o de analisar o impacto provocado pelo processo de mudança tecnológica na dinâmica competitiva no Pólo de Cerâmica Vermelha do Norte Fluminense. Observamos que a dinâmica competitiva no arranjo estudado provoca um processo CAPÍTULO 7 – CONCLUSÕES 231 de estratificação interfirmas. Tal estratificação foi captada pela metodologia proposta, e os conceitos evolucionários adotados mostraram-se suficientemente consistentes para explicar tal dinâmica, confirmando as hipóteses assumidas. Mostramos que a estratificação acima referida pode ser classificada em, pelo menos, três grupos distintos de firmas, a saber: (i) Líderes; (ii) Intermediárias e (iii) Retardatárias. Adicionalmente verificamos que tal estratificação se dá através da uma certa trajetória representativa da dinâmica competitiva do arranjo, a qual, corresponde à Trajetória Competitiva do arranjo, cuja metodologia proposta, como vimos, foi capaz de captar. 7.2 Contribuições As contribuições deste trabalho podem ser agrupadas da seguinte forma: Como uma iniciativa multidisciplinar, através da conjugação de uma série de conceitos, como evolução, entropia, trajetórias tecnológicas, dependência da trajetória e rotinas, entre outros, envolvendo várias áreas de conhecimento, entre as quais, especialmente, a Economia Regional e Local, Teoria da Firma/Organização e a Engenharia de Produção. Pela incursão em um campo acadêmico embrionário, que é o da vinculação de elementos micro e mesoeconômicos do ambiente competitivo, através de uma abordagem evolucionária do desenvolvimento local. Pela introdução do conceito de “Trajetória Competitiva”, para a abordagem da dinâmica competitiva em arranjos produtivos locais. Pela proposição de um modelo geral para se estudar a dinâmica competitiva nos sistemas em questão, flexível suficientemente para adaptação e aplicação a outros sistemas. Pela quebra de uma visão paradigmática de se explorar diversidades onde, aparentemente, não haveria, como no caso estudado. CAPÍTULO 7 – CONCLUSÕES 232 7.3 Perspectivas para Futuros Trabalhos Considera-se, a partir das contribuições destacadas no item anterior, a possibilidade de aprofundamento na linha de pesquisa. A abordagem e metodologia desenvolvidas nesse trabalho, com as devidas adaptações, podem ser estendidos a uma série de arranjos similares ao pesquisado. Especificamente, a partir da grande quantidade de dados e informações obtidos através dessa pesquisa, e com a conclusão dos trabalhos no referido pólo local, em uma segunda etapa, pretende-se realizar um estudo similar nos demais pólos estaduais de Cerâmica Vermelha, a fim de se avançar na comparação dos respectivos padrões e Trajetórias Competitivas. Em uma etapa seguinte, pólos similares de outros estados, como o de Itu-SP (citado no esboço de aplicação da metodologia, Capítulo 5), podem servir como referências comparativas. Também há a possibilidade de realização de estudo similar em arranjos de outras atividades econômicas. O Pólo de Pedras Decorativas de Santo Antônio de Pádua-RJ, por exemplo, seria um arranjo potencialmente relacionado para futuro trabalho. A princípio, não haveria restrições de aplicabilidade da abordagem aqui proposta a arranjos produtivos locais de uma forma geral, desde que satisfeitas algumas condições. Tais condições estão relacionadas aos princípios evolucionários e a certas particularidades do ambiente, como por exemplo, a coexistência de regimes tecnológicos com diversidade técnica suficientemente suscetível de identificação através da análise de padrões técnicos e rotinas organizacionais, ao longo do processo de agregação de valor aos produtos. Uma outra, é que as empresas do arranjo concorram entre si, pelo menos em alguns tipos de produtos. Arranjos do tipo “distritos industriais”, redes flexíveis de manufatura, cooperativas e aglomerados verticais, com o domínio de uma empresa-cliente, na ausência de livre concorrência entre as empresas-fornecedoras, exceto em casos muito especiais, não se enquadrariam nas hipóteses assumidas. Ou, de forma dialética, desde que o ambiente (arranjo) possa ser modelado em uma perspectiva evolucionária e satisfaça a certas condições, seria suscetível de aplicação. Tais condições seriam: 1. A existência de variedade (diversidade tecnológica) de espécies (empresas); 2. A existência de “mecanismos de seleção” (padrões concorrenciais de mercado e marcos regulatórios), e; 3. Mecanismos de retenção (oportunidades de aprendizagem e interações externas). Através da constatação da diversidade se identificam um fator principal ou conjunto CAPÍTULO 7 – CONCLUSÕES 233 de fatores de diversidade tecnológica e seus efeitos no mecanismo de seleção local. O passo seguinte é a identificação dos padrões retidos no processo de mudança e adaptação. No modelo de Trajetória Competitiva introduzido, a dinâmica do sistema foi assumida como explicável através de uma correlação XY. Uma hipótese intrínseca é que as variáveis “Recursos” e “Desempenho” são representativas e consistentes para expressar tal dinâmica, a qual, foi confirmada pelos resultados do estudo empírico. Isso não quer dizer que a dinâmica do sistema seja exclusivamente explicada por tais variáveis. Generalizando, pode-se considerar que outras trajetórias possam ser expressas por outro conjunto de variáveis, inclusive aquelas denominadas autodestrutivas. Estas só não representariam a dinâmica competitiva do arranjo como um todo, mas sim, de certos grupos específicos. Como pontos passíveis de avanço na metodologia proposta, pode-se citar, por exemplo, a utilização de métodos de classificação e de análise multicritério na modelagem dos índices utilizados, além de outras abordagens no tratamento das informações e dados como modelagem de empresas, métodos estatísticos, mapas cognitivos entre outros. Considera-se também como potencial linha de pesquisa a exploração do conceito de Trajetória Competitiva através de modelagem matemática, para simulação de possíveis trajetórias, apesar da abordagem adotada neste trabalho não sugerir tal hipótese. Enfim, a proposta desse trabalho foi a de adotar uma abordagem da competitividade não como uma concepção de adaptação eficiente dos agentes ao ambiente, nem tampouco como uma forma de predizer o futuro, mas essencialmente como um meio de se captar, explorar as diversidades e heterogeneidades inerentes ao ambiente onde tais agentes competem. Em suma, como uma estrutura analítica para se interpretar a “engenharia competitiva” que caracteriza a dinâmica de determinados ambientes competitivos locais. REFERÊNCIAS 234 REFERÊNCIAS ABRAMOVITZ, M. (1986) Catching up, forging ahead and falling behind. Journal of Economic History, 46(2): 385-406. ACS, Z. (ed.) (2000) Regional innovation, knowledge and global change. Pinter, London. AGUILAR-ZAMBRANO, J.J. (2001) Routines and the problem to create learning capabilities. International Association for Management of Technology (IAMOT). Disponível em <http://www.iamot.org/paperarchive/GSTAA.PDF>. Acessado em 04/04/2003 AIGINGER, K. 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APÊNDICE A PESQUISA DE CAMPO REALIZADA NO PÓLO DE CERÂMICA VERMELHA DO NORTE FLUMINENSE1 Resumo Neste Apêndice, apresenta-se um resumo da pesquisa de campo realizada no Pólo de Cerâmica Vermelha de Campos (Norte do Estado do Rio de Janeiro), através de um estudo exploratório realizado no período de dezembro de 2002 a maio de 2003. Primeiramente, é apresentada a metodologia da pesquisa de campo e, em seguida, uma visão geral da atividade e do processo produtivo. A seguir, são destacados os principais detalhes verificados in loco, unidade por unidade. As informações e os dados mais relevantes para a pesquisa são concentrados em uma tabela-resumo, apresentada ao final da avaliação de cada unidade. Além da análise objetiva, através de dados e informações coletados, também foi realizada uma avaliação subjetiva, com base nos padrões, rotinas e procedimentos internos verificados, a qual é relacionada ao final. 1 Objetivo Levantar a diversidade e as principais mudanças tecnológicas e seus efeitos no Pólo de Cerâmica Vermelha do Norte Fluminense, principalmente devido à disponibilidade e implantação de queima a gás natural, identificando os principais fatores condicionantes da dinâmica competitiva interna do arranjo, especialmente aqueles que contribuem para um 1 Parte integrante do Projeto Avaliação do Impacto da Mudança Tecnológica no Aglomerado de Cerâmica Vermelha do Norte Fluminense, vinculado ao Núcleo de Estudos Estratégicos e Planejamento (NEEPLAN). Pesquisa idealizada no escopo deste trabalho, sob a coordenação do autor e do Prof. José Arica, do Laboratório de Engenharia de Produção da UENF, com financiamento de uma bolsa de extensão/UENF para o aluno de graduação em Eng. CivilDavid Eler. APÊNDICE A 253 melhor desempenho das unidades, focando questões relativas à gestão, características dos produtos, melhorias observadas ao longo do processo produtivo e seus reflexos no mercado. 2 Metodologia e Etapas 2.1 Método de Abordagem Para a realização de tal trabalho, num primeiro momento, buscou-se informações e dados publicados a respeito de arranjos similares do mesmo segmento, que passaram por tal processo, em teses, livros, sites especializados, jornais e revistas especializadas, para que se pudesse definir que tipo e quais as informações a serem levantadas para o caso em questão. A partir de questionários previamente elaborados, foram consultados profissionais de instituições e órgãos com trabalhos e pesquisas vinculados à área na região, tais como: Sindicato dos Ceramistas, LAMAV (Laboratório de Materiais Avançados), LECIV (Laboratório de Engenharia Civil) da UENF, TECNORTE e CEFET-Campos, além dos próprios ceramistas. Após as indicações, foram identificadas as unidades mais citadas, em cada um dos grupos previamente definidos. O total de unidades selecionadas foi de 12 (doze), sendo 4 (quatro em cada grupo). Outras 3 (três) unidades foram escolhidas de forma aleatória entre as indicadas, totalizando 15 (quinze). 2.2 Método de Procedimento (Pesquisa de Campo) A pesquisa de campo2 propriamente dita compreendeu duas fases: uma de acompanhamento do processo produtivo; e outra, de entrevistas com o proprietário ou gerente da unidade, cobrindo as atividades de gestão. Na primeira fase, o proprietário (ou gerente) respondeu a um questionário-padrão3, com informações gerais sobre a unidade, dados relacionados à administração, produtos, mercado, secagem, queima e estratégias. Na segunda fase, fez-se um acompanhamento de todas as etapas do processo produtivo, desde a extração nas jazidas, passando pelas etapas de preparação da massa e fabricação, até o estoque do produto acabado. Todos os pontos observados foram anotados em um segundo 2 A pesquisa durou cerca de seis meses (de dezembro de 2002 a maio de 2003). 3 Os questionários aplicados estão no Apêndice C. APÊNDICE A 254 questionário-padrão. Além das observações das etapas do processo, cada ponto foi fotografado. Todas as informações obtidas, assim como as fotos, foram arquivadas para posterior análise e para que se pudesse, em uma segunda etapa, interpretar e formalizar as informações coletadas. Nessa etapa do trabalho, através das entrevistas feitas com os proprietários (ou gerentes) das unidades, foram analisadas as atividades referentes à gestão e as rotinas do processo produtivo, com a observação in loco de cada etapa nas unidades da amostra do Pólo. Além das 15 unidades selecionadas, uma outra, também relacionada, foi uma unidade criada pelo desmembramento de uma já existente, a qual não será comentada. Foram feitas observações a respeito das seguintes etapas: extração, preparação da massa, beneficiamento, secagem, queima e estocagem do produto final. Para se preservar a integridade das fontes e o sigilo das informações obtidas, utilizar-se-á denominações fictícias para cada unidade, da seguinte forma: Unidade A, Unidade B, Unidade C e assim por diante, até a Unidade O. 2.3 Etapas do processo produtivo De forma genérica, na produção oleiro-cerâmica existem fases comuns para todos os tipos de produtos, que vão desde a retirada da argila nos barreiros, seu transporte para as olarias, moldagem e secagem dos produtos, até a queima nos fornos, sendo esta última fase a que requer melhor conhecimento e habilidade, pois pode comprometer todas as etapas anteriores. Todas estas fases duram em média, de 8 a 14 dias, pois há uma significativa variação de acordo com a época do ano, ocorrendo com que no período das chuvas a secagem seja mais demorada, até duas vezes mais que no verão. Em relação às etapas do processo produtivo, a ilustração da Figura AP1, mostra o fluxograma do processo. Porém, de acordo com as características de cada unidade, há variantes nesse modelo geral. Há unidades, por exemplo, que não fazem um estoque de matéria-prima ou a mistura da argila na área da empresa. Outras, não realizam inspeção após a queima, mesmo sendo esta uma fase onde se tem a maior porcentagem de perdas do processo. Outro detalhe importante a ser relatado é que algumas unidades realizam uma laminação dupla. Nesse caso, a argila passa por todas as etapas até uma primeira laminação, a partir da qual, é desviada do fluxo do processo, seguindo para um estoque APÊNDICE A 255 específico, no qual permanece por um certo período (“descanso”), após o qual, é reutilizada no processo, laminando então uma segunda vez, seguindo para as etapas subseqüentes. Figura AP1 – Etapas do processo produtivo da cerâmica vermelha Nessa indústria, no processo de produção se empregam técnicas bastante rudimentares, devido à própria característica da atividade de extração e manufatura. As etapas do processo produtivo são praticamente as mesmas, exceto pela diferença de produção de tijolos e telhas, para a qual, há a adição da etapa de prensagem. Aqui, destacaremos cada fase para que se possa ter um melhor esclarecimento sobre as características da atividade analisada neste trabalho. As etapas descritas, a seguir, referem- APÊNDICE A 256 se ao padrão verificado no Pólo local da baixada campista. Veja a localização do referido Pólo no Mapa AP14. Mapa AP1 – Localização geográfica do arranjo estudado 2.3.1 Extração da argila: é realizada a céu aberto (Foto 2.3.1), geralmente com a utilização de uma máquina do tipo retroescavadeira (que atinge maior profundidade de extração) ou outra máquina semelhante, como um trator-esteira (que extrai lâminas horizontais de argila). Dependendo das características do solo e do tratamento pós- 4 Apenas uma das unidades da amostra se localiza fora do aglomerado mostrado no Mapa. APÊNDICE A 257 extração, tal etapa pode ser realizada através de extração vertical ou horizontal. Normalmente, a jazida encontra-se próxima à empresa e é transportada por caminhões. Foto 2.3.1 – Jazida de exploração 2.3.2 Estoque de matéria-prima: geralmente é feito a céu aberto, ou em silos cobertos (como na Foto 3.2.2), conforme as características do material e o produto a ser produzido. Foto 2.3.2 – Estoque de argila APÊNDICE A 258 2.3.3 Caixão dosador: normalmente as unidades possuem dois caixões (ver Foto 2.3.2), um destinado ao chamado barro “forte” (com maior concentração de argila) e outro destinado ao barro “fraco” (mais concentrado em areia). Foto 2.3.3 – Argila abastecendo o caixão dosador 2.3.4 Desintegrador: localizado logo após o caixão dosador, é um equipamento que, através de movimentos circulares (Foto 2.3.4), permite a quebra de torrões e a homogeneização da massa em pedaços menores. Foto 2.3.4 – Redução dos blocos de argila APÊNDICE A 259 2.3.5 Misturador: equipamento que adiciona água às matérias-primas desintegradas para se obter as características de plasticidade e homogeneidade (Foto 2.3.5) necessárias à extrusão. Foto 2.3.5 – Argila sendo revolvida 2.3.6 Laminador: é um equipamento composto de dois cilindros (Foto 2.3.6), responsáveis pela compactação e transformação da massa em “laminas” de argila. Este processo permite uma significativa redução do consumo de energia. Além disso, a massa é adensada, eliminando ou reduzindo as bolhas de ar. Foto 2.3.6 – Homogeneização da massa de argila APÊNDICE A 260 2.3.7 Extrusão ou maromba: a argila homogeneizada entra no extrusor (maromba) que a comprime contra a boquilha, dando o formato à massa da seção desejada (Foto 2.3.7), com o ar comprimido retirado por uma câmara de vácuo, isto é, uma chapa com pequenas áreas geométricas vazadas que formam bastões na dimensão correta para o corte e ou prensagem. Na produção de vasos e elementos de decoração a argila vai para um torno, em lugar de ir ao extrusor. O torno é acionado por motor elétrico, e o trabalho é totalmente manual. Foto 2.3.7 – Extrusão da massa 2.3.8 Corte: a barra contínua de material extrusado é cortada automaticamente em dimensões padronizadas (Foto 2.3.8) para cada tipo de produto. Foto 2.3.8 – Corte da massa estrusada APÊNDICE A 261 No caso da produção de telhas, a etapa seguinte é a de prensagem. Caso contrario, a etapa seguinte é a secagem. 2.3.9 Prensagem: para a fabricação de telhas os elementos extrusados e cortados em formato favorável são prensados em prensa (Foto 2.3.9) dotada de matrizes que comprimem os elementos cortados dando forma final ao produto. Foto 2.3.9 – Prensagem de telhas 2.3.10 Secagem: a céu aberto, protegido apenas por algum tipo de protetor contra as ações intempéries ou feita em galpão coberto, contendo prateleiras fixas ou móveis. Feita naturalmente, a secagem pode durar de 1 a 4 dias. São também utilizadas, por algumas unidades, estufas para este fim, conhecida como secagem artificial (Foto 2.3.10), aproveitando o calor residual dos fornos, quando do seu resfriamento ou então o calor gerado por fornalhas, reduzindo bastante o tempo de secagem. O material permanece na estufa por um período que pode variar de 12 a 36 horas. A umidade final desejada, dependendo do produto, é da ordem de 3 a 4%, ocorrendo uma contração que pode variar de 4 a 10%, porém tais números não puderam ser comprovados nas unidades. APÊNDICE A 262 Foto 2.3.10 – Entrada de um secador artificial 2.3.11 Queima: o material proveniente da secagem é carregado até o forno. Os fornos podem utilizar como fonte de energia a lenha ou gás natural. O processo de queima pode durar até 72 horas, dependendo do combustível utilizado. A Foto 2.3.11 mostra um tipo de forno muito comum na região. Foto 2.3.11 – Forno tipo Hoffman Os tipos de fornos utilizados são: o convencional, com variações que recebem nomes como, Hoffman (Fig. 2.3.11), vagão, paulistinha, paulista de crivo, entre outros, além de fornos contínuos ou fornos túneis, considerados mais avançados em termos de tecnologia, pela alta produção e características térmicas que proporcionam aos produtos. APÊNDICE A 263 2.3.12 Inspeção: é realizada principalmente na saída do forno, rejeitando material quebrado, trincado, lascado, queimado em excesso e, no caso das telhas, as que possuem som “chocho” são descartadas. No entanto, na amostra estudada, não foi verificado nenhum caso de rotina formal para registro de tal procedimento. 2.3.13 Estoque: é feito em área coberta ou ao tempo (Foto 2.3.13), permanecendo aí até a expedição. Em grande parte da amostra visitada, o estoque das unidades não é constante, variando de acordo com a demanda do mercado. Normalmente, nos meses de verão, o estoque médio permanece no menor patamar do ano. Foto 2.3.13 – Estoque a céu aberto 2.3.14 Expedição: efetuada através de caminhões (ver Foto 2.3.14) por via rodoviária, utilizando veículos próprios ou de “fretistas”. Foto 2.3.14 – Entrega de tijolos APÊNDICE A 264 Avaliação Unidade por Unidade Por razões metodológicas, as fases do processo descritas anteriormente foram rearranjadas e agrupadas em seis etapas: 1. Extração; 2. Preparação da Massa; 3. Beneficiamento; 4. Secagem; 5. Queima; e, 6. Estocagem (produto final). A seguir, apresenta-se um resumo detalhado da avaliação dessas etapas na pesquisa realizada em cada unidade, destacando-se os pontos mais relevantes da cadeia de valor, do processo produtivo e das atividades de gestão, em termos de diversidade técnica e organizacional, rotinas e padrões de processo e do produto. Unidade A Extração ! Esta unidade extrai cerca de 140m³/dia de argila (com autorização da FEEMA). ! A escolha da jazida é feita com o auxílio de um geólogo, e tem a participação direta do proprietário da unidade. ! Não há uma seleção das argilas e estas são retiradas por uma retroescavadeira e, posteriormente, são transportadas em um caminhão do tipo “caçamba”. ! Após a extração, o procedimento de tratamento do solo é feito através do plantio de capim para a pastagem de gado. ! Segundo o proprietário, um plano em estudo é reflorestamento com eucalipto. Preparação da massa ! A argila retirada das jazidas segue para um pequeno estoque dentro da unidade e, após, para os caixões-dosadores (Foto A1). APÊNDICE A 265 Foto A1 - Alimentação do caixão dosador Beneficiamento ! Há uma separação da argila em dois tipos, a forte e a fraca e, dependendo do tipo, segue para um caixão dosador correspondente (utiliza dois). ! A dosagem é feita de acordo com a qualidade especificada para o produto a ser fabricado. Após passar pelo caixão dosador, a argila segue para o desintegrador, misturador, laminador e maromba. ! A instalação de uma esteira rolante na etapa da extrusão, quando necessário, desvia o barro da maromba (ver Foto A2), pela inversão de sentido (através de um dispositivo mecânico), retornando com o barro de volta para o início do processo. Este foi o principal diferencial observado no seu processo. Essa alternativa permite a paralisação do processo quando necessário, proporcionando uma matéria-prima de melhor qualidade. Devido ao maior tempo de espera, há uma maior homogeneização da argila. Ao sair da maromba, a massa tem a forma do produto desejado e é cortada de acordo com as dimensões das peças. APÊNDICE A 266 Foto A3 – Sistema de desvio de massa da maromba Secagem ! As peças passam por um secador artificial, composto por 400 estantes com capacidade para 92 tijolos cada, que reaproveita o calor gerado pelo forno através de uma tubulação instalada entre o forno e o secador (Foto A4), sofrendo a ação de ventilação forçada. Foto A4 – Tubulação de condução do calor para o secador artificial APÊNDICE A 267 Queima ! A queima é feita em um forno tipo túnel com capacidade para 24.000 peças e utiliza como combustível o gás natural. ! A temperatura atingida gira em torno dos 650º (Foto A5) e é mantida por 24 horas. Foto A5 – Medidor de temperatura Estoque ! A unidade não mantém um estoque regular, que varia de acordo com a demanda do mercado (Foto A6). Foto A6 – Estoque elevado APÊNDICE A 268 Obs.: Esta cerâmica, produtora de blocos cerâmicos (tijolos), é uma das 3 unidades que implantaram no processo de fabricação etapas seqüenciais semi-automatizadas (as outras, são a C e a L). Esta situação pôde ser observada na etapa do transporte das peças (Foto A7) após a saída da maromba até as estantes automáticas (Foto A8), que abastecem o secador com capacidade para 400 estantes com 92 tijolos cada. Neste caso, a interferência humana acontece somente na etapa do abastecimento do caixão dosador e na parte do transporte das peças do secador para os fornos. Foto A7 – Esteira transportadora Foto A8 – Empilhadora automática APÊNDICE A 269 A seguir é apresentado um resumo dos principais dados da unidade A: Tabela A1 – Resumo das informações e dados da unidade A Tipo de informação Início da produção Produto Capacidade de produção/dia (nºde peças) Volume produzido/dia (nºde peças) Preço (principal produto) Principais mercados Volume de vendas/mês (nº de peças) Meses de maior venda Meses de menor venda Nº de funcionários Consumo de energia (KWA) Jazida Autonomia para extração (anos) Distância média da jazida (km) Tipo de secagem Tipo de forno Reaproveitamento de calor p/ secagem Combustível Consumo de combustível/milheiro Localização dos principais concorrentes Perda total Utiliza microcomputador Unidade A 1986 tijolos 46.000 24.000 R$ 200 E.S, R. Lagos, G. Rio 720.000 Dez-Fev Jul-Set 34 85.000 - 90.000 própria 5 3 artificial túnel sim lenha e gás N/D E.S 5% sim Obs.: Esta unidade apresenta um padrão mais elevado quando comparado à unidade I, por exemplo, devido a reutilização de peças com defeito (ver Foto I1) durante o processo. Assim como as unidades B, E e L, essa cerâmica possui maior controle na parte de gerenciamento nas etapas de produção e na administração. Unidade B: Obs: O proprietário não permitiu que as instalações da unidade fossem fotografadas. APÊNDICE A 270 Extração ! Extração terceirizada; ! Execução de sondagem a trado da jazida a ser explorada ! Realiza análise granulométrica em laboratório especifico de solos na UENF (Universidade Estadual do Norte Fluminense). Preparação da massa ! Tratamento pós-extração: homogeneização. 1º - estocagem de vários caminhões de argila fraca separada por corredores que são preenchidos com argila forte; 2º - Um trator faz a mistura e homogenização da massa. Beneficiamento ! Passagem da massa passa pelo caixão dosador, desintegrador, laminador, maromba e prensa, que dá a forma a massa que saiu da maromba. ! As sobras que resultam da prensagem voltam para o caixão dosador para que possa ser reaproveitada. Secagem ! Secagem das peças feita de duas formas: a secagem artificial e a natural. Na secagem natural as peças ficam estocadas sob um galpão aberto permitindo a livre circulação de ar por um período de aproximadamente 30 h. Já na secagem artificial, as peças recebem o calor gerado por uma caldeira, que também utiliza como fonte de calor o gás natural e o período é de 12 h. Queima ! Utiliza-se gás natural como combustível em um forno Hoffman e a temperatura de queima é rigorosamente controlada por termopares, atingindo os 1020ºC APÊNDICE A 271 (temperatura ideal para telhas) por 6 horas. Essa temperatura garante às telhas baixa absorção d’água e boa resistência. Estoque ! A unidade não mantém um estoque regular, variando de acordo com o mercado. A seguir tem-se um resumo de alguns dados da unidade: Tabela B1 – Resumo das informações e dados da unidade B Tipo de informação Início da produção Produto Capacidade de produção/dia (nºde peças) Volume produzido/dia (nºde peças) Preço (principal produto) Principais mercados Volume de vendas/mês (nº de peças) Meses de maior venda Meses de menor venda Nº de funcionários Consumo de energia (KWA) Jazida Autonomia para extração (anos) Distância média da jazida (km) Tipo de secagem Tipo de forno Reaproveitamento de calor p/ secagem Combustível Consumo de combustível/milheiro Localização dos principais concorrentes Perda total Utiliza microcomputador * Consumo de gás, principal combustível. Unidade B 1991 telhas 50.000 40.000 R$ 340 R.J e R.dos Lagos 1.200.000 Dez-Fev Mai-Out 110 93.000 arrendada 15 9 artificial e natural Hoffman não lenha e gás 3* 29,2 m E.S e S.P 5% sim APÊNDICE A 272 Unidade C Extração ! O processo de seleção das argilas a serem extraídas é visual e não há um planejamento formal. Preparação da massa ! Para a fabricação de tijolos, a argila é depositada diretamente no caixão dosador. ! Para a fabricação de telhas, a argila é estocada em um silo (Foto C1) e permanece neste por um período de no mínimo 30 dias antes de ser utilizada no processo produtivo. Esse “descanso” da matéria-prima dá a mesma uma característica mais homogênea. Foto C1 – Estocagem em silo para “descanso” Beneficiamento ! Pelo fato da unidade fabricar tanto tijolos quanto telhas, os processos são semelhantes até uma certa parte. APÊNDICE A 273 ! As etapas de extração, estoque, dosagem, desintegração, mistura, laminação e extrusão, são semelhante as outras unidades que produzem tijolos. ! Quando da produção de telhas, o processo segue da mesma forma até a chegada na maromba. Neste ponto, há uma esteira rolante que joga o barro para um silo e quando necessário retornar a produção deste tipo de peça, o material (barro) passa também por um primeiro laminador e posteriormente por um segundo mais fino. E por último, a prensagem. A Foto C2 mostra o laminador. Foto C3 – Interior do laminador Secagem ! Feita tanto naturalmente quanto artificialmente em estufa (ver Foto C4), onde há um reaproveitamento do calor gerado no forno com o uso de um exaustor que reaproveita o calor gerado pelo forno, as peças permanecem por 24 h. APÊNDICE A 274 Foto C4 – Secador artificial Queima ! Feita em três tipos de fornos: tipo Hoffman para tijolos, outro paulistinha reversível (Foto C5) para telhas e um terceiro para lajes e tijolos, tipo vagão. ! Em todos os fornos a lenha é o combustível para a queima. Foto C5 – Foto da parte da frente do forno (“vagão”) Estoque ! Não é regular (Foto C6), variando de acordo com o mercado. APÊNDICE A Foto C6 – Estoque de blocos cerâmicos (reduzido) A seguir tem-se um resumo dos dados da unidade: Tabela C1 – Resumo das informações e dados da unidade C Tipo de informação Início da produção Produto Capacidade de produção/dia (nºde peças) Volume produzido/dia (nºde peças) Preço (principal produto) Principais mercados Volume de vendas/mês (nº de peças) Meses de maior venda Meses de menor venda Nº de funcionários Consumo de energia (KWA) Jazida Autonomia para extração (anos) Distância média da jazida (Km) Tipo de secagem Tipo de forno Reaproveitamento de calor p/ secagem Combustível Consumo de combustível/milheiro Localização dos principais concorrentes Perda total Utiliza microcomputador * Produção em caráter experimental. ** Preço referente às telhas Unidade 1974 tijolos e telhas* 60.000 40.000 R$ 110 e R$ 310** R.J e G. Rio / R. dos Lagos 900.000 Out-Jan Mai-Jul 54 40.000 própria 30 1,5 artificial vagão sim lenha 0,83 m3 R.J e R. dos Lagos 10,00% sim 275 APÊNDICE A 276 Unidade D Extração ! A empresa faz um planejamento para a extração: divisão por área e por material, isto é, um estudo geométrico, qualitativo e quantitativo. Porém a seleção das argilas é visual, por experiência. Preparação da massa ! Para a fabricação de tijolos a argila vai direto para o caixão dosador e segue para as demais etapas do processo produtivo. ! Para a fabricação de telhas, a argila passa por todo o processo até a laminação. A partir daí segue para um estoque separado, servindo como “descanso” (Foto D1) para a fabricação das telhas. Após permanecer nesse estoque, volta para um caixão dosador especifico e repete a laminação, fazendo assim a laminação dupla. Foto D1 – Estoque de argila destinada à produção de telhas Beneficiamento ! Segue o mesmo processo para a fabricação de tijolos e telhas em relação às demais unidades. Na figura abaixo (Foto D2), observa-se a prensa para as telhas. APÊNDICE A 277 Foto D2 – Forma da prensa usada para fabricação de telhas Secagem ! Reaproveita o calor gerado pelo forno para o secador na secagem artificial (Foto D3). Este tipo de secagem destina-se somente às telhas, uma vez que os tijolos secam naturalmente. Os ventiladores forçam a circulação do ar quente entre as peças, reduzindo substancialmente o tempo de secagem. Foto D3 – Secador com ventiladores móveis APÊNDICE A 278 Queima ! Para as telhas, a queima é em um forno tipo paulistinha (Foto D4) e utiliza a madeira como combustível. A queima de tijolos é feita no forno tipo Hoffman (Foto D5) e utiliza-se o gás natural como combustível. Foto D4 – Forno tipo paulistinha Foto D5 – Forno tipo Hoffman APÊNDICE A 279 Estoque ! Mantém um estoque mínimo de tijolos e de aproximadamente 20.000 peças para telhas. Tabela D1 – Resumo das informações e dados da unidade D Tipo de informação Unidade D Início da produção 1993 Produto tijolos e telhas Capacidade de produção/dia (nºde peças) 80.000 / 6.500* Volume produzido/dia (nºde peças) 40.000 / 3500* Preço (principal produto) R$ 120 / R$ 300* Principais mercados Niterói, G. Rio e R. dos Lagos Volume de vendas/mês (nº de peças) 800.000 Meses de maior venda Mar-Jun Meses de menor venda Dez-Jan Nº de funcionários 34 Consumo de energia (KWA) 15.000 - 20.000 Jazida própria Autonomia para extração (anos) 10 Distância média da jazida (km) 8 Tipo de secagem natural Tipo de forno Hoffman / paulistinha** Reaproveitamento de calor p/ secagem não Combustível lenha e gás 3 20 m *** Consumo de combustível/milheiro Localização dos principais concorrentes R.J, Campos / S.P* Perda total 10% Utiliza microcomputador não * Referente a telhas. ** Forno Hoffman: queima de tijolos. Forno paulistinha: queima de telhas. *** Valor referente ao consumo de gás. Unidade E Obs.: Esta unidade produz exclusivamente tijolos aparentes (produtos rústicos). Extração ! Utiliza 3 (três) tipos de argila (Foto E1): duas da região de Campos, e outras do município de Silva Jardim-RJ; APÊNDICE A 280 ! O proprietário retirada amostra para análise granulométrica, que é feita na UENF ou na FUNDENOR (Fundação de Desenvolvimento do Norte Fluminense). A análise química da área a ser explorada é feita em um Laboratório em Santa Catarina. ! O processo de seleção é visual. Foto E2 – Foto de uma das argilas utilizadas pela unidade Preparação da massa ! Na fabricação de pisos e tijolos de quatro faces (Foto E3), a argila passa pelo laminador e em seguida segue para um estoque separado das demais matériasprimas, permanecendo neste local por aproximadamente 7 meses antes de ser utilizada no processo produtivo. ! Para as demais peças, não há esse período de espera. APÊNDICE A 281 Foto E3 – Tijolos de 4 faces (plaquetas, produto diferenciado) Beneficiamento ! Mesmo fabricando um produto diferente das demais unidades da região, as etapas do processo produtivo são as mesmas para a fabricação dos tijolos maciços aparentes. Secagem ! A secagem é natural (galpão coberto), e dura aproximadamente 30 dias no verão e 60 dias no inverno (Foto E4). Foto E4 – Secagem dos tijolos aparentes vazados APÊNDICE A 282 Queima ! Possui 3 fornos tipo caieira e a temperatura é controlada através de um termopar. Após o forno atingir a temperatura ideal, monitorada através de um medidor temperatura, uma cancela localizada na chaminé (Fotos E5 e E6) é fechada e as peças permanecem por mais 24 horas para que sofram sinterização. Devido ao tipo de produto fabricado, somente a lenha é usada como combustível. Fotos E5 - Detalhe da cancela na parte superior E6 – Detalhe do medidor de temperatura (termopar) APÊNDICE A 283 Estoque ! Mantém um estoque em torno de 200.000 peças (Foto E7). Foto E7 – Estoque de tijolos maciços tipo mesclados Obs.: A cerâmica E, apesar de não utilizar o gás como combustível na queima e de não produzir telhas, se apresenta como uma unidade com grande potencial, uma vez que os produtos fabricados possuem alto valor agregado, que são os tijolos aparentes. Além da qualidade das peças, devido ao conhecimento técnico demonstrado pelo proprietário e ao padrão de controle do processo estar acima da média verificada nas unidades da amostra. Essa unidade é pioneira na região na exploração de tal nicho de mercado e a única a produzir tal tipo peça. Outras unidades já tentam fabricar esse tipo de produto, porém ainda sem sucesso. Segundo o proprietário, um procedimento adotado no processo (citado na etapa da queima) é a sinterização, processo pelo qual, se reduz a porosidade e a absorção d’água pelo material, aumentando sua resistência mecânica. Essa medida evita também que as peças sofram trincas comprometendo a qualidade do material (Foto E8). APÊNDICE A Foto E8 – Trincas visíveis surgidas na queima sem sinterização Tabela E1 – Resumo das informações e dados da unidade E Tipos de Informação Unidade E Início da produção 1997 Produto tijolos maciços aparentes Capacidade de produção/dia (nºde peças) 30.000 Volume produzido/dia (nºde peças) 11.000 Preço (principal produto) R$ 250 Principais mercados R.J, G. Rio, Juiz de Fora, Vitória Niterói Volume de vendas/mês (nº de peças) 300.000 Meses de maior venda Mai-Jun Meses de menor venda Fev-Mar Nº de funcionários 30 Consumo de energia (KWA) 4.000 Jazida arrendada Autonomia para extração (anos) 1 Distância média da jazida (km) 5 – 250* Tipo de secagem natural Tipo de forno caieira Reaproveitamento de calor p/ secagem não Combustível lenha Consumo de combustível/milheiro 10 m3 Localização dos principais concorrentes Itaboraí, Campos, Santa Catarina Perda total 10% Utiliza microcomputador não * A distância de 5 km refere-se à argila extraída da região. E a distância de 250 km quando da utilização de argila de Silva Jardim. 284 APÊNDICE A 285 Unidade F Extração ! Assim como a maioria das unidades pesquisa, esta não possui um planejamento formal para a extração e a seleção é visual. Preparação da massa ! Não há um preparo da massa. A argila seque para um estoque da unidade, depois direto para o caixão dosador (Foto F1) e daí para as demais etapas. Foto F1 – Argila já no caixão dosador Beneficiamento ! Não há diferença em relação às demais unidades (Foto F2). No entanto, nesta etapa, a unidade se diferencia das demais, pois executa uma programação na para troca dos arames da cortadeira (segundo o gerente, o fio é trocado no inicio do expediente, às 07:00h, no intervalo para o almoço, as 11:00h, e à tarde, às 16:00h). Dessa forma, evita-se paralisações da produção. APÊNDICE A Foto F2 – Visão geral do processo produtivo Secagem ! O tipo de secagem é natural, cobertas apenas por placas metálicas (Foto F3). Foto F3 – Área destinada à secagem natural Queima ! Feita em um forno tipo Hoffman (ver Foto F4) e o combustível é a lenha. 286 APÊNDICE A Foto F4 – Detalhe da lenha utilizada (acima do forno) Estoque ! Mantém um estoque de 200.000 peças, mas que em meses como os do verão reduz e nos meses de inverno são mais elevados. Tabela F1 – Resumo das informações e dados da unidade F Tipo de informação Início da produção Produto Capacidade de produção/dia (nºde peças) Volume produzido/dia (nºde peças) Preço (principal produto) Principais mercados Volume de vendas/mês (nº de peças) Meses de maior venda Meses de menor venda Nº de funcionários Consumo de energia (KWA) Jazida Autonomia para extração (anos) Distância média da jazida (km) Tipo de secagem Tipo de forno Reaproveitamento de calor p/ secagem Combustível Consumo de combustível/milheiro Localização dos principais concorrentes Perda total Utiliza microcomputador Unidade F 1992 tijolos 54.000 40.000 R$ 110 G. Rio, Volta Redonda, Itaperuna 1.200.000 Set-Dez Jan-Abr 50 30.000 arrendada 2 4 natural Hoffman não lenha N/D Campos 3% sim 287 APÊNDICE A 288 Obs.: Apesar desta unidade apresentar um layout bem organizado (Foto F2), por exemplo, que a unidade I (Foto I2), está, porém, apresenta um padrão mais baixo em relação à unidade E. Os dados fornecidos pelo proprietário não foram precisos. Unidade G Extração ! O processo de seleção das argilas é visual. ! Não regularmente, a argila é levada para a UENF para análises (granulometria, plasticidade, teor de ferro e potássio e de matéria orgânica). Preparação da massa ! Não há um preparo da massa a ser utilizada no processo produtivo, uma vez que a argila segue para um pequeno estoque e posteriormente para o caixão dosador (Foto G1). Foto G1 – Alimentação de argila no caixão dosador APÊNDICE A 289 Beneficiamento ! Não foram observadas características relevantes nesta etapa. Secagem ! A secagem é natural e leva em média 24 h (Foto G2). ! Pelo fato dessa unidade fabricar também tijolos estruturais, nessa fase, o tempo de secagem dessas peças normalmente é maior. No processo de secagem, esse tipo de tijolo pode chegar a perder até 8% do seu peso. Foto G2 – Galpão coberto destinado para secagem natural Queima ! A temperatura de queima para os tijolos estruturais é maior, chegando aos 850ºC, enquanto que os demais vão à 650ºC. O forno é o tipo Hoffman (Foto G3) e o gás é o combustível utilizado. APÊNDICE A 290 Foto G3 – Forno tipo Hoffman Estoque ! Não mantém um estoque (Foto G4) regular, variando de acordo com o mercado. Foto G4 – Estoque elevado de peças Obs.: Essa unidade utiliza para o transporte das peças do forno para o estoque, um sistema mecânico composto por “carro-vagão” que leva as peças até a área de estoque. A utilização desse sistema faz com que o número de peças perdidas seja menor em relação ao transporte manual. Ao mesmo tempo, este tipo de procedimento proporciona uma melhor disposição e organização do estoque. APÊNDICE A 291 Tabela G1 – Resumo das informações e dados da unidade G Tipo de informação Início da produção Produto Capacidade de produção/dia (nºde peças) Volume produzido/dia (nºde peças) Preço (principal produto) Principais mercados Volume de vendas/mês (nº de peças) Meses de maior venda Meses de menor venda Nº de funcionários Consumo de energia (KWA) Jazida Autonomia para extração (anos) Distância média da jazida (km) Tipo de secagem Tipo de forno Reaproveitamento de calor p/ secagem Combustível Consumo de combustível/milheiro Localização dos principais concorrentes Perda total Utiliza microcomputador Unidade G 1989 tijolo 60.000 44.000 R$ 90 Grande Rio e E.S 1.300.000 Out-Nov Dez-Fev 40 28.000 própria 7 3 natural Hoffman não lenha e gás N/D Campos, Itaboraí, E.S 5% sim Unidade H Extração ! Como à maioria, esta unidade não realiza planejamento formal para a extração das argilas e a escolha é visual. Preparo da massa ! Não há no preparo da massa um tratamento diferenciado, uma vez que a argila retirada da jazida segue direto para o caixão dosador (Foto H1), onde também são reutilizadas peças defeituosas e assim para as demais fases do processo produtivo. APÊNDICE A 292 Foto H1 - Caixão dosador Secagem ! A secagem é natural (Foto H2) e dura aproximadamente 12 h no verão e 5 dias no inverno. Foto H2 – Galpão coberto para secagem natural Queima ! Feita em um forno Hoffman, usando o gás natural, e outro chamado de “Paulista de Crivo” (Foto H3, semelhante a um “caieira” moderno) que pode atingir uma temperatura de 850ºC. APÊNDICE A Foto H3 – Forno tipo paulistinha de crivo Estoque ! O estoque médio é de cerca de 50% da produção. Tabela H1– Resumo das informações e dados da unidade H Tipo de informação Início da produção Produto Capacidade de produção/dia (nºde peças) Volume produzido/dia (nºde peças) Preço (principal produto) Principais mercados Volume de vendas/mês (nº de peças) Meses de maior venda Meses de menor venda Nº de funcionários Consumo de energia (KWA) Jazida Autonomia para extração (anos) Distância média da jazida (km) Tipo de secagem Tipo de forno Reaproveitamento de calor p/ secagem Combustível Consumo de combustível/milheiro Localização dos principais concorrentes Perda total Utiliza microcomputador * Consumo de gás. Unidade H 1984 tijolos 40.000 30.000 R$ 110,00 Volta Redonda, Barra Mansa, e G. Rio 450.000 Dez-Fev Jun-Ago 35 23.000 própria 20 10 natural Hoffman e paulista de crivo não lenha e gás 20 m3* Campos 2% sim 293 APÊNDICE A 294 Unidade I Extração ! A seleção da argila é tátil, feita, inclusive, pelo proprietário. Preparo da massa ! A argila extraída segue direto para o caixão dosador e assim para as demais fases do processo produtivo. ! Observou-se o retorno de grande número de material ao início do processo, devido à ineficiência das etapas seguintes (Foto I1). As peças com problemas de conformação retornam ao caixão dosador. Foto I1 – Reaproveitamento de peças Beneficiamento ! O layout das etapas do processo é bastante desorganizado, comprometendo a eficiência em várias fases (Foto I2). APÊNDICE A Foto I2 – Visão de parte do processo produtivo Secagem ! A secagem é natural (Foto I3) e o tempo médio é de 4 dias. Foto I3 - Área de secagem natural 295 APÊNDICE A 296 Foto I4 – Transporte de peças Obs.: O transporte das peças para a etapa da secagem é feito por um funcionário, como pode ser observado na Foto I4. Este procedimento gera uma situação de ociosidade, uma vez que o trabalhador fica a espera da fabricação das peças (ver Foto I2) para apenas então, efetuar seu transporte para a secagem. Queima ! O proprietário afirmou desconhecer a temperatura máxima do forno; ! Tal fato pode estar comprometendo a qualidade dos produtos; ! A madeira usada como combustível é muito heterogênea (ver Foto I5). Foto I5 – Qualquer tipo de madeira é utilizada para abastecer o forno APÊNDICE A 297 Estoque ! O estoque da unidade é, em média, de 20% da produção (ver figura I6). Foto I6 – Estoque elevado Obs.: Assim como o processo produtivo, que é controlado pelo proprietário, a administração da unidade é de responsabilidade da integrantes da própria família. A tabela a seguir apresenta um resumo dos principais dados da unidade: APÊNDICE A 298 Tabela I1 – Resumo das informações e dados da unidade I Tipo de informação Início da produção Produto Capacidade de produção/dia (nºde peças) Volume produzido/dia (nºde peças) Preço (principal produto) Principais mercados Volume de vendas/mês (nº de peças) Meses de maior venda Meses de menor venda Nº de funcionários Consumo de energia (KWA) Jazida Autonomia para extração (anos) Distância média da jazida (km) Tipo de secagem Tipo de forno Reaproveitamento de calor p/ secagem Combustível Consumo de combustível Localização dos principais concorrentes Perda total Utiliza microcomputador Unidade I 1993 tijolos 14.000 10.000 R$ 100 G. Rio, R. dos Lagos, Campos e Macaé 240.000 Abr-Dez Jan-Mar 18 7.000 própria 10 5 natural Hoffman não lenha 0,5m3 Campos, Itaboraí 7% não Obs.: A administração é familiar. As rotinas observadas nesta etapa enquadram-se no padrão mais baixo entre as unidades avaliadas. Uma comparação visual, por exemplo, pode ser feita com aquele observado na Unidade F. Isto pode ser verificado pela comparação entre as Fotos F2 e I2. A desorganização da planta e a falta de controle do processo impedem que o proprietário conheça os custos do processo. Apresenta-se em um padrão bem inferior às unidades anteriores. Unidade J Extração ! A unidade possui uma jazida, mas ainda não a utiliza. Sua extração é feita em uma área para exploração arrendada (uma outra jazida). A estratégia do proprietário é manter seu estoque de argila preservado, vislumbrando um esgotamento do recurso na região em um futuro próximo. APÊNDICE A 299 Preparo da massa ! A argila segue direto da jazida para um pequeno estoque (Foto J1) da unidade e depois o caixão dosador. Foto J1 – Estoque de argila da unidade (ao fundo) Beneficiamento ! Segue as mesmas etapas para as unidades do setor, porém, as instalações são antigas (Foto J2). ! Devido à utilização de uma argila heterogênea, com resíduos, o processo é interrompido constantemente para retira-los. Foto J2 – Equipamento sem conservação e cobertura inadequada APÊNDICE A 300 Secagem ! Esse processo é natural (Foto J3). Foto J3 – Área de secagem das peças Queima ! O proprietário estima, uma vez que não possui equipamento para medição, que a temperatura de queima de seu forno (Foto J4) gire em torno dos 700ºC (vale lembrar que o combustível utilizado é a lenha). ! A temperatura é controlada de acordo com a experiência dos forneiros. Apresenta um produto com características visuais bastante heterogêneas. Foto J4 – Forno tipo circular APÊNDICE A 301 Estoque ! Idem (Foto J5). Foto J5 – Estoque reduzido Obs.: Esta unidade, além das cerâmicas I e O, utiliza em seu processo produtivo, uma argila com características visuais bastante heterogêneas (Foto J6). Neste ponto, apresenta um padrão bem inferior a outras unidades que realizam tratamento pós extração, como, por exemplo a unidade K (Foto J7) Foto J6 - Argila heterogênea (Cerâmica J) APÊNDICE A 302 Foto J7 – Argila tratada (Cerâmica K) Obs.: No local destinado ao abastecimento do caminhão das peças a serem expedidas, há uma região de desnível (Foto J8), que permite que a carroceria do caminhão fique no mesmo nível do solo, evitando assim, que as peças sejam “jogadas” para cima da carroceria do caminhão, o que pode reduzir o número de peças danificadas. Essa melhoria proporciona um aumento na produtividade do trabalho nesta etapa. A unidade L também possui tal atributo. Foto J8 – Local para expedição dos produtos APÊNDICE A 303 Tabela J1 – Resumo das informações e dados da unidade J Tipo de informação Início da produção Produto Capacidade de produção/dia (nºde peças) Volume produzido/dia (nºde peças) Preço (principal produto) Principais mercados Volume de vendas/mês (nº de peças) Meses de maior venda Meses de menor venda Nº de funcionários Consumo de energia (KWA) Jazida Autonomia para extração (anos) Distância média da jazida (km) Tipo de secagem Tipo de forno Reaproveitamento de calor p/ secagem Combustível Consumo de combustível/milheiro Localização dos principais concorrentes Perda total Utiliza microcomputador * Utilizada no momento. Unidade J 1973 tijolos 50.000 20.000 R$ 100 Vitória, Cabo Frio, Campos 500.000 Abr-Dez Dez-Fev 17 18.000 própria / arrendada* 10 4 natural Hoffman/Circular não lenha N/D Vitória, Itaboraí 10% não Obs.: Esta unidade caracteriza-se pela administração familiar. Através da Foto J2, pode-se notar que as instalações da unidade são de um padrão bem inferior, por exemplo, às das cerâmicas A e L. Devido à deficiência na organização interna e das rotinas, o proprietário não possui conhecimento preciso dos principais dados da unidade. Unidade K Extração ! A escolha da argila é visual. Porém a unidade possui em estoque (Foto K1), pelo fato do proprietário acreditar que a qualidade da argila melhore uma vez deixada por um período de “descanso”. APÊNDICE A 304 Foto K1 – Estoque de argila mantido em “descanso” (ao ar livre) Preparo da massa ! Nessa fase, há uma divisão: numa primeira etapa, a argila já misturada (barro forte e barro fraco) e homogeneizada passa pelo caixão dosador, desintegrador, misturador e laminador. Na segunda etapa, segue para um estoque em um silo. (Foto K2), onde permanece por 24 h ou até que seja requisitada na produção. Foto K2 – Classificação e estocagem de argila em silos Beneficiamento ! O material retirado do estoque em questão passa novamente pelas quatro etapas iniciais do processo (caixão dosador, laminador, misturador e maromba), e daí, para o cortador (Foto K3). A argila é homogeneizada duas vezes, o que possibilita um produto de melhor qualidade. APÊNDICE A 305 Foto K3 – Etapa de corte Secagem ! A secagem é feita tanto naturalmente quanto artificialmente, sendo que para este último caso há um reaproveitamento do calor, em torno de 120ºC, gerado pelo forno túnel. Além disso, a unidade está construíndo mais um secador (Foto K4), com capacidade para 50.000 peças com um tempo provável de secagem de aproximadamente 24 h, uma vez que também reaproveitará o calor gerado pelo forno. Foto K4 – Secador em fase de construção APÊNDICE A 306 Queima ! A queima é feita em dois fornos: um tipo Hoffman, onde a temperatura atinge cerca de 600ºC, e um outro, tipo túnel (Foto K5), cuja a temperatura chega a 800ºC. As temperaturas são controladas por termopares e o combustível utilizado é o gás natural. A Foto abaixo mostra o forno túnel. Foto K5 – Forno túnel (moderno) Estoque ! Estoque a céu aberto de tijolos (Foto K6). Foto K6 – Estoque elevado APÊNDICE A 307 Tabela K1 – Resumo das informações e dados da unidade K Tipo de informação Unidade K Início da produção 1972 Produto tijolo Capacidade de produção/dia (nºde peças) 90.000 Volume produzido dia (nºde peças) 18.000 Preço (principal produto) R$ 100 Principais mercados G Rio, R. dos Lagos, Vitória Volume de vendas/mês (nº de peças) 14.000 Meses de maior venda Mai-Out Meses de menor venda Dez-Fev Nº de funcionários 35 Consumo de energia (KWA) 35.000 - 90.000 Jazida própria e arrendada Autonomia para extração (anos) 30 Distância média da jazida (km) 8 Tipo de secagem natural e artificial Tipo de forno Túnel e Hoffman Reaproveitamento de calor p/ secagem Sim. Forno túnel Combustível lenha e gás* Consumo de combustível/milheiro N/D Localização dos principais concorrentes Itaboraí e Cachoeiro de Itapemirim Perda total 13% Utiliza microcomputador sim *Possui instalações, mas não queima gás há 2 anos Unidade L Extração ! A argila também é extraída por retro-escavadeira e transportada por caminhão caçamba até a unidade, que possui um estoque considerável (Foto L1) da matéria-prima a ser utilizada. APÊNDICE A 308 Foto L1 – Argila estocada (grande volume) Preparo da massa ! A argila retirada da jazida é depositada em um depósito a céu aberto (estoque) na área da própria cerâmica, ficando neste, segundo o gerente, por, no mínimo, 6 (seis) meses (Foto anterior). Depois segue para um caixão dosador, desintegrador, misturador, laminador e depois para um silo (Foto L2). Após o período de 6 meses, e a 1ª laminação, é subdividida em 5 (cinco) tipos com depósitos separados, um para cada dia da semana. Posteriormente, são utilizadas conforme o tipo de produto requerido (tijolos tipo laje e telhas). ! A matéria-prima já homogenizada permanece neste silo por 3 ou 4 dias antes de ser utilizada. Foto L2 – Silos para estoque de argila APÊNDICE A 309 Beneficiamento ! Depois do período neste silo, a massa passa novamente pelo processo (caixão dosador, desintegrador, misturador, laminador, outro laminador), caracterizando assim a laminação dupla, e, por último, pela maromba. Um detalhe relevante verificado, é que a unidade adicionou ao processo um equipamento resfriador da água (Foto L3), a ser adicionada à massa na maromba, o que contribui para uma maior homogeneização da massa. Foto L3 – Resfriador de água (antes da extrusão) Obs.: Quando da produção de tijolos de lajes, o processo realiza a seqüência convencional das outras unidades. Porém no caso das telhas, é realizada uma etapa extra para o revestimento das telhas, que consiste na etapa final para a fabricação deste tipo de material. Esse revestimento constitui na aplicação de um tipo especial de esmalte (ver Fotos L4 e L5) a base de poliéster, após a queima. Este revestimento faz com que, segundo o proprietário, a telha fique totalmente impermeável, aumentando assim a durabilidade e a resistência do material. APÊNDICE A Fotos L4– Aplicação do esmalte às telhas Foto L5 - Ventiladores para acelerar a secagem Secagem ! Natural, para tijolos de laje, e artificial, para telhas. ! O calor é gerado por uma fornalha (Foto L6). 310 APÊNDICE A 311 Foto L6 – Fornalha para geração de calor para secagem artificial Queima ! A unidade possui dois fornos tipo câmara. Na queima das telhas a temperatura atingida é de cerca de 970ºC e na queima de tijolos de laje de 800ºC, ambos utilizando o gás como combustível. A Foto L17 mostra a temperatura interna de um dos fornos quando a temperatura ainda não era a ideal de queima. A temperatura atinge 919ºC no início da queima, utilizando o gás natural. Foto L7 – Equipamento de controle da temperatura APÊNDICE A 312 Estoque ! A unidade demonstra um cuidado com a qualidade. As peças são embaladas de acordo com a cor do revestimento (Fotos L8). Quanto ao número de peças, nos meses de junho e julho não há estoque. No restante dos meses, é mínimo, como observado (Foto L9). ! Foto L8 – Peças prontas para expedição Fotos L9 – Estoque reduzido Obs.: A Cerâmica L tem como principal produto as telhas revestidas, cuja produção consiste na passagem da telhas já prontas (queimadas), por um processo de tratamento de impermeabilidade que aumenta a durabilidade e a resistência do APÊNDICE A 313 material. A unidade chega a oferecer uma garantia da qualidade de 10 anos para esses produtos. Além disso, a unidade introduziu no processo um equipamento para resfriamento da água (Foto L3) antes da extrusão (maromba), o que, segundo o gerente operacional, deixa a massa mais “solta”, reduzindo a freqüência de interrupções do processo produtivo para limpeza do equipamento, além de proporcionar melhor textura das peças. Essa unidade é a única da região a utilizar um cortador mecânico giratório, que utiliza o próprio movimento do processo para executar o corte. Segundo o proprietário, a unidade L é uma das três no Brasil (uma tem sede em Santa Catarina e outra em São Paulo), a empregar tal tecnologia na fabricação de telhas. Essa tecnologia tem patente detida pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), que recebe royalties da unidade. Pelos dados analisados, verifica-se que a unidade consegue um maior valor agregado nas peças fabricadas, com uma diferença no preço do milheiro que pode triplicar em relação ao preço daquelas produzidas tradicionalmente (telhas naturais). Ao contrário de muitas unidades do setor e da amostra visitada, a cerâmica L, assim como as cerâmicas A, B, E, K, demonstram um maior cuidado com a argila a ser utilizada no processo produtivo, que, como pode-se ver, apresentam menor heterogeneidade (Foto L10), resultando em um produto de valor e padrão bem acima das demais unidades avaliadas. Foto L10 – Argila homogênea A Tabela L, a seguir, mostra um resumo dos principais dados da unidade: APÊNDICE A 314 Tabela L1 – Resumo das informações e dados da unidade L Tipo de informação Unidade L Início da produção 1985 Produto tijolo de laje* e telhas Capacidade de produção/dia (nºde peças) 18.000 Volume produzido/dia (nºde peças) 18.000 Preço (principal produto) R$ 360 / R$ 840-R$ 960** Principais mercados R.J, M.G e E.S Volume de vendas/mês (nº de peças) 18.000 Meses de maior venda Nov-Fev Meses de menor venda Jun-Jul Nº de funcionários 60 Consumo de energia (KWA) 50.000 - 60.000 Jazida própria / arrendada*** Autonomia para extração (anos) 30 Distância média da jazida (km) 3 Tipo de secagem natural e artificial Tipo de forno câmara Reaproveitamento de calor p/ secagem sim Combustível lenha e gás Consumo de combustível/milheiro N/D Localização dos principais concorrentes R.S e S.C Perda total 2% Utiliza microcomputador sim * Somente por encomenda. ** Preço referente à telha natural e à revestida, respectivamente. *** Utilizada no momento. Unidade M Extração ! A unidade possui um estoque de matéria-prima (argila). Preparo da massa ! Não há um preparo diferenciado em relação às demais unidades, porém a argila depositada no estoque da unidade é homogeneizada por um trator esteira antes de abastecer o caixão dosador (ver Foto M1), que retira camadas horizontais do material. O resultado é uma homogenização superior em relação àquelas que APÊNDICE A 315 movimentam seu material verticalmente, por retro-escavadeira. Tal detalhe pode ser observado na Foto mencionada. Foto M1 – Trator esteira “trabalhando” a argila Beneficiamento ! Não há diferença no que diz respeito às etapas da produção para outras unidades. A Foto M2 apresenta um detalhe do corte. Foto M2 – Tijolos tipo laje Secagem ! A secagem das peças é feita naturalmente, porém em local coberto. APÊNDICE A 316 Obs.: Um “pequeno trator” transporta as peças para o local de secagem (ver Fotos M3 e M4). Este procedimento representa uma redução no tempo de realização das tarefas e de perda nessa etapa. Este tipo de rotina é um fator relevante na caracterização dos padrões verificados nas unidades pesquisadas, pois revela um tipo de melhoria organizacional. Diferentemente das unidades I, J, O, N e O, que empregam trabalho braçal em tal tarefa (ver, por exemplo, Fotos I4 e N4). Fotos M3 – Trator para transporte das peças Foto M4 – Galpão para secagem das peças Queima ! A queima das peças é feita em um forno tipo circular (Foto M5). APÊNDICE A 317 Foto M5 – Forno utilizado para a queima das peças Estoque ! Como nas demais unidades, o estoque da unidade varia de acordo com os meses do ano. O período mais baixo se dá nos meses de outubro a fevereiro. Foi observada uma quantidade reduzida de peças em estoque (Foto M6). Foto M6 – Estoque reduzido (em local coberto) A tabela, a seguir, resume os principais dados levantados: APÊNDICE A 318 Tabela M1 – Resumo das informações e dados da unidade M Tipo de informação Início da produção Produto Capacidade de produção/dia (nºde peças) Volume produzido (nºde peças) Preço (principal produto) Principais mercados Volume de vendas/mês (nº de peças) Meses de maior venda Meses de menor venda Nº de funcionários Consumo de energia (KWA) Jazida Autonomia para extração (anos) Distância média da jazida (km) Tipo de secagem Tipo de forno Reaproveitamento de calor p/ secagem Combustível Consumo de combustível Localização dos principais concorrentes Perda total Utiliza microcomputador * Consumo de gás Unidade M 1961 tijolos 64.000 50.000 R$ 180 R.dos Lagos, Campos, outros 1.200.000 Mar-Abr Dez-Jan 40 29.000 própria 5 4 natural contínuo não lenha e gás 3 36 m * Campos 7% não Unidade N Extração ! A argila é extraída da jazida e segue direto para o caixão dosador, sem nenhum tipo de tratamento. Preparo da massa ! A massa é algumas vezes estocada na unidade ou então depositada direto no caixão dosador (Foto N1). APÊNDICE A Foto N1 – Momento em que o caminhão-caçamba abastece o caixão dosador Beneficiamento ! Seque as etapas tradicionais das unidades que fabricam tijolos (Foto N2). Foto N2 – Planta do processo produtivo da unidade Secagem ! Feita naturalmente, tanto ao ar livre (Foto N3) quanto sob um galpão. 319 APÊNDICE A 320 Foto N3 – Secagem natural Queima ! O forno é do tipo Hoffman (Foto N4). O combustível utilizado é a lenha. Não utiliza medidor da temperatura. Foto N4 – Forno Hoffman (de grande extensão) Estoque ! O estoque elevado (em torno das 250.000 peças) (ver Foto N5). APÊNDICE A Foto N5 – Estoque elevado de tijolos Abaixo, apresenta-se a tabela dos dados coletados na unidade: Tabela N1 – Resumo das informações e dados da unidade N Tipo de informação Início da produção Produto Capacidade de produção/dia (nºde peças) Volume produzido (nºde peças) Preço (principal produto) Principais mercados Volume de vendas/mês (nº de peças) Meses de maior venda Meses de menor venda Nº de funcionários Consumo de energia (KWA) Jazida Autonomia para extração (anos) Distância média da jazida (km) Tipo de secagem Tipo de forno Reaproveitamento de calor p/ secagem Combustível Consumo de combustível/milheiro Localização dos principais concorrentes Perda total Utiliza microcomputador Unidade N 1996 tijolos 44.000 34.000 R$ 110 G. Rio, R. dos Lagos e Campos 25.500 Abr-Dez Jan-Mar 40 N/D própria 3 1 natural contínuo não lenha 17 m3 Campos 5% sim 321 APÊNDICE A 322 Unidade O Extração ! A argila extraída vai para uma área de estoque (Foto O1) existente na unidade, onde permanece até ser solicitada no processo produtivo. Foto O1 – Estoque externo de argila Preparo da massa ! Não há preparo da massa e a argila é bastante heterogênea (ver Foto O2). Foto O2 – Argila depositada no caixão-dosador APÊNDICE A 323 Beneficiamento ! Similar às demais unidades. Porém, como pode ser observado (Fotos O3 e O4), os equipamentos são antigos e apresentam desgastes. Na Foto abaixo e à esquerda, o detalhe da esteira (danificada) que transporta o material no processo. Foto O3 – Esteira desgastada Foto O4 - Maromba antiga (manutenção falha) Secagem ! Feita naturalmente, sob galpões (Foto O5). APÊNDICE A 324 Foto O5 – Secagem natural (coberta) Queima ! Feita em um forno circular (Foto O6) e o combustível utilizado para a queima é a lenha. ! Não há medidores de temperatura instalados. Foto O6 – Forno circular (sem controle de temperatura) Estoque ! Estoque reduzido. (Foto O7). A unidade apresenta também um estoque de peças com defeito, como pode ser observado na Foto O8. APÊNDICE A 325 Fotos O7– Estoque reduzido de peças Foto O8 - Peças de baixa qualidade (aparente) Obs.: Devido aos equipamentos antigos e à massa heterogênea, a unidade produz peças com defeitos aparentes (Foto O8) que comprometem a qualidade do produto, principalmente quando comparado, por exemplo, com as unidades A, B e L. Apesar do conhecimento técnico do gerente de produção, a unidade apresenta baixo padrão comparado ao mesmo quesito apresentado na unidade E, por exemplo. APÊNDICE A Tabela O1 – Resumo das informações e dados da unidade O Tipo de informação Início da produção Produto Capacidade de produção/dia (nºde peças) Volume produzido (nºde peças) Preço (principal produto) Principais mercados Volume de vendas/mês (nº de peças) Meses de maior venda Meses de menor venda Nº de funcionários Consumo de energia (KWA) Jazida Autonomia para extração (anos) Distância média da jazida (km) Tipo de secagem Tipo de forno Reaproveitamento de calor p/ secagem Combustível Consumo de combustível/milheiro Localização dos principais concorrentes Perda total Utiliza microcomputador Unidade O 1976 tijolos 50.000 30.000 R$ 100 R.J. e S.P. 30.000 Mar-Dez Jan-Mar 18 10.000 arrendada 1 8 natural contínuo não lenha 1,2 m3 Rio Bonito e Itaboraí 5% não 326 APÊNDICE A 327 Avaliação Subjetiva (Análise Qualitativa) Conforme a metodologia adotada para este trabalho, foram identificados padrões, rotinas e recursos característicos de cada unidade da amostra, em termos do processo produtivo e das atividades de gestão, ao longo das respectivas cadeias de valor. Das 15 cerâmicas visitadas, oito (8) unidades (A, B, D, G, H, K, L, M) utilizam efetivamente o gás natural em seus fornos. Entre essas unidades encontram-se aquelas que têm maior capacidade de queima e que produzem maior volume de peças/mês, como mostrado pelas tabelas apresentadas anteriormente. Devido ao padrão mais homogêneo proporcionado por esse combustível, os produtos desse grupo apresentam características mais uniformes, de melhor qualidade e de maior valor agregado. Através das observações in loco na pesquisa de campo realizada em cada unidade, e após a avaliação da cadeia de valor de cada unidade, atribuiu-se notas5 a cada etapa individualmente, quanto aos fatores vinculados às atividades de gestão e às etapas do processo produtivo, segundo critérios específicos (vide Apêndice B). A seguir, para cada unidade, apresenta-se a média das notas das etapas avaliadas. Unidade A Atividades de Gestão 5 Cadeia de Processos Insumos: 3 Procedimentos e métodos: 5 Capital humano: 4 Organização e controle: 4 Logística (interna e externa): 3 Melhorias: 4 Finanças: 4 Informação: 4 Marketing e vendas: 3 As notas consideradas sofreram uma ponderação entre as notas atribuídas pelos dois observadores (o autor e o bolsista) e pelo gerente ou proprietário de cada unidade, comparativamente às demais unidades da amostra, segundo uma escala de Likert de 5 pontos (vide Apêndice B para os detalhes). APÊNDICE A Unidade B Atividades de Gestão Cadeia de Processos Insumos: 4 Procedimentos e métodos: 4 Logística (interna e externa): 5 Organização e controle: 4 Capital humano: 4 Melhorias: 4 Finanças: 4 Informação: 4 Marketing e vendas: 5 Unidade C Atividades de Gestão Cadeia de Processos Insumos: 3 Procedimentos e métodos: 4 Logística (interna e externa): 5 Organização e controle: 5 Organização e controle: 3 Melhorias: 3 Finanças: 3 Informação: 4 Marketing e vendas: 3 Unidade D Atividades de Gestão Cadeia de Processos Insumos: 4 Procedimentos e métodos: 3 Logística (interna e externa): 3 Organização e controle: 4 Capital humano: 3 Melhorias: 3 Informação: 4 Marketing e vendas: 3 Finanças: 3 328 APÊNDICE A Unidade E Atividades de Gestão Cadeia de Processos Insumos: 4 Procedimentos e métodos: 4 Logística (interna e externa): 3 Organização e controle: 3 Capital humano: 3 Melhorias: 5 Finanças: 4 Informação: 5 Marketing e vendas: 4 Unidade F Atividades de Gestão Cadeia de Processos Insumos: 3 Procedimentos e métodos: 4 Logística (interna e externa): 3 Organização e controle: 3 Capital humano: 3 Melhorias: 4 Finanças: 4 Informação: 4 Marketing e vendas: 4 Unidade G Atividades de Gestão Cadeia de Processos Insumos: 4 Procedimentos e métodos: 4 Logística (interna e externa): 3 Organização e controle: 3 Capital humano: 4 Melhorias: 3 Finanças: 3 Informação: 3 Marketing e vendas: 3 329 APÊNDICE A Unidade H Atividades de Gestão Cadeia de Processos Insumos: 2 Logística (interna e externa): 3 Capital humano: 4 Finanças: 3 Informação: 2 Marketing e vendas: 3 Procedimentos e métodos: 3 Organização e controle: 3 Melhorias: 3 Unidade I Atividades de Gestão Cadeia de Processos Insumos: 1 Procedimentos e métodos: 1 Logística (interna e externa): 2 Organização e controle: 1 Capital humano: 2 Melhorias: 1 Finanças: 2 Informação: 1 Marketing e vendas: 1 Unidade J Atividades de Gestão Cadeia de Processos Insumos: 2 Procedimentos e métodos: 1 Logística (interna e externa): 1 Organização e controle: 1 Capital humano: 1 Melhorias: 1 Finanças: 1 Informação: 1 Marketing e vendas: 1 330 APÊNDICE A Unidade K Atividades de Gestão Cadeia de Processos Insumos: 4 Procedimentos e métodos: 3 Logística (interna e externa): 5 Organização e controle: 3 Capital humano: 3 Melhorias: 3 Finanças: 3 Informação: 3 Marketing e vendas: 4 Unidade L Atividades de Gestão Cadeia de Processos Insumos: 4 Procedimentos e métodos: 5 Logística (interna e externa): 4 Organização e controle: 5 Capital humano: 4 Melhorias: 5 Finanças: 5 Informação: 5 Marketing e vendas: 5 Unidade M Atividades de Gestão Cadeia de Processos Insumos: 4 Procedimentos e métodos: 4 Logística (interna e externa): 4 Organização e controle: 4 Capital humano: 3 Melhorias: 4 Finanças: 4 Informação: 3 Marketing e vendas: 4 331 APÊNDICE A Unidade N Atividades de Gestão Cadeia de Processos Insumos: 2 Procedimentos e métodos: 3 Logística (interna e externa): 2 Organização e controle: 3 Capital humano: 3 Melhorias: 2 Finanças: 3 Informação: 1 Marketing e vendas: 1 Unidade O Atividades de Gestão Cadeia de Processos Insumos: 2 Procedimentos e métodos: 1 Logística (interna e externa): 2 Organização e controle: 1 Capital humano: 2 Melhorias: 1 Finanças: 1 Informação: 1 Marketing e vendas: 1 332 APÊNDICE B MODELO E MÉTODO DE CÁLCULO DOS ÍNDICES DE RECURSOS E DE DESEMPENHO PARA O ARRANJO ESTUDADO Resumo Neste apêndice é apresentada a modelagem para cálculo dos índices utilizados na metodologia proposta. O índice de recursos é baseado no conceito de cadeia de valor, compreendendo recursos técnicos e operacionais, ao longo das etapas da cadeia de processos, e recursos organizacionais e estratégicos, envolvendo as atividades de gestão da cadeia. Para a avaliação, foram estabelecidos critérios específicos para estas duas perspectivas. O índice de desempenho foi levantado segundo várias taxas de produtividade. Após os cálculos, ambos os índices são normalizados. B1 Índice de Recursos (IRTk) B1.1 Etapas da Cadeia de Processo (execução) B1.1.1 Extração B1.1.2 Preparação da massa B1.1.3 Moldagem (extrusão, corte e prensagem (telhas)) B1.1.4 Secagem B1.1.5 Queima B1.1.6 Estoque APÊNDICE B 334 B1.2 Critérios considerados B1.2.1 Procedimentos e métodos (execução de tarefas e operações) B1.2.2 Organização e controle (leiaute e asseio) B1.2.3 Melhorias (inovações e adaptações no processo) IRTCP = n m i=1 j=1 ∑ ∑ CPij Cpij - Nota atribuída ao critério i ={1...n}, para a etapa j={1...m} da cadeia de processos; n – número de critérios considerados, m – número de etapas da cadeia de processos; Para o caso estudado: n = 3, m = 6. B1.3 Atividades de Gestão B1.3.1 Insumos B1.3.2 Logística (interna e externa) B1.3.3 Capital humano B1.3.4 Finanças B1.3.5 Informação B1.3.6 Marketing e vendas Fatores considerados Critérios Operações e métodos Indicadores 1. Controle do processo e do produto Infra-estrutura 2. Organização e controle de custos Tecnologia 3. Modernização e desempenho Estratégias e relações 4. Foco e diferenciação IRTAG = z w p=1 v =1 ∑ ∑ AGpv AGpv - Nota atribuída ao indicador p ={1...z} da atividade v = {1...w} de gestão da cadeia; z – número de indicadores considerados, w – número de atividades de gestão da cadeia. Para o caso estudado: z = 4, w = 6. Com os dados coletados através dos questionários-padrão 1 e 2, as empresas foram avaliadas em relação a cada etapa, pelos respectivos critérios e indicadores. APÊNDICE B 335 O Índice de Recursos (IRTk) foi calculado para cada elemento da amostra, pelo somatório das notas atribuídas a cadeia de processos (CPk) e as atividades de gestão (AGk): IRTk = IRTCP + IRTAG n IRTk = ∑ i=1 m ∑ CPij j=1 + z w p=1 v=1 ∑ ∑ AGpv Cpij – Nota atribuída ao critério i ={1...n}, para a etapa j ={1...m} da cadeia de processos; n – número de critérios considerados, m – número de etapas da cadeia de processos; AGpv - Nota atribuída ao indicador p={1...z} da atividade v ={1...w} de gestão da cadeia; z – número de indicadores considerados, w – número de atividades de gestão consideradas na da cadeia. k – Elemento da amostra, k={1... a}; no caso, a = 15. IRTk1 (normalizado) = IRTk/IRTMax (0 < IRTk1 < 1) IRTMax (IRT de maior valor da amostra) Observação: Na atribuição de notas a Cpij e AGpv utilizou-se uma escala tipo Likert de 5 pontos. B2 Índice de Desempenho (IDK) O índice de desempenho (IDk) foi avaliado utilizando as seguintes taxas de produtividade: i) produtividade da mão-de-obra (PMk); ii) produtividade da queima (PQk); iii) produtividade energética (PEk); e, iv) produtividade do valor agregado à produção, em relação aos gastos com combustível (PVk), onde: k – Elemento da amostra, k={1... a}; no caso, a = 15. PMk – taxa entre a produção e o total de funcionários (Prodk/NFk); PQk – taxa entre a produção e o consumo médio de combustível (Prodk/CMCk); PEk – taxa entre a produção e o consumo médio de energia (Prodk/CMEk); PVPk – taxa entre o valor da produção e os gastos na queima ($Prodk/$CMCk); Prodk – Produção (Número de peças/mês); $Prodk – Valor da produção ($); NFk – Número de funcionários; CMCk – Consumo de combustível (m3/mês); $CMCk – Gasto com o consumo de combustível ($); CMEk – Consumo médio de energia (kWh/mês); IDk1 (normalizado) = IDk/IDMAX (0 < IDk1 < 1) IDMAX (maior valor da amostra) APÊNDICE C QUESTIONÁRIOS APLICADOS Questionário Padrão 1 – Cerâmicas Informações gerais sobre empresa visitada (Gestão e Administração da Produção) Método de coleta de dados: entrevista com o proprietário ou gerente 1. Produto 1.1 Tipos Tijolo Tipos: Telha Tipos: Lajota Tipos: Outro Tipos: 1.2 Capacidade de produção/dia Tijolo: Telha: Lajota: Outros: 1.3 Volume produzido/dia Tijolo: Telha: Lajota: Outros: Telha: Lajota: Outros: 1.5 Indicador de qualidade (preço, aparência, forma etc.) Tijolo: Telha: Lajota: Outros: 1.4 Preços Tijolo: 1.6 Principais mercados (indicador percentual) APÊNDICE C Tijolo: 1.7 Volume de vendas Tijolo: 337 Telha: Lajota: Outros: Telha: Lajota: Outros: 1.8 Em relação ao preço final de cada produto, quanto representa cada um dos seguintes fatores: 1.8.1 Impostos e encargos: 1.8.2 Matéria-prima: 1.8.3 Energia elétrica: 1.8.4 Combustível: 1.8.5 Mão-de-obra: 1.9 Preço do Frete: 2.0 O que muda no processo de produção para cada tipo de produto? 2.1 Quais os meses de pico da produção? Qual a média de produção no mês de maior produção? 2.2 Quais os meses de menor produção? Qual a média de produção no mês de menor produção? 2. Processos A. Extração 2.1 Jazida Própria Arrendada De quanto é o estoque? 3 2.2 Preço da argila (m ) 2.3 Capacidade de extração/dia? 2.4 Há planejamento formal para extração? 2.5 Qual o processo de seleção das argilas? 2.6 Volume extraído/dia 2.7 Há tratamento pós-extração? Qual? Custo? 2.8 Qual o percentual estimado de perdas entre o material extraído e o processado? 2.10 Percentual estimado do custo total de extração no produto final 2.11 Distância média da jazida para a cerâmica (planta) 2.12 Qual o meio de transporte da argila para a cerâmica? 2.13 No. trabalhadores envolvidos na extração? 2.14 Há algum tipo de habilidade específica requerida para este trabalho? 2.15 Há técnicas mais avançadas que poderiam ser empregadas? Quais? Qual o impedimento para utiliza-las? 2.16 A argila extraída serve para qualquer tipo de produto? 2.17 Como é feita a composição entre argilas diferentes? Qual o fator verificado? APÊNDICE C 338 B. Secagem 2.18 Tipo de secagem Natural Artificial 2.19 Tempo médio de secagem de cada produto: 2.20 Faz reaproveitamento do calor do forno? De que forma? C. Queima 2.21 Qual a temperatura média de queima? 2.22 Qual o percentual estimado de perdas? 2.23 Faz pré-aquecimento? De que forma? Qual o rendimento? 2.24 Tempo de queima médio p/ produto 2.25 Consumo combustível/dia 2.26 Preço combustível (m3) 2.27 Percentual estimado do custo total de queima no preço do produto final 2.28 No. trabalhadores envolvidos no processo? 2.29 Há algum tipo de habilidade específica requerida para este trabalho? 2.30 Há técnicas e métodos (não equipamentos) mais avançadas que poderiam ser empregadas? Quais? Qual o impedimento para utiliza-las? 2.31 Há tecnologias disponíveis que poderiam ser empregadas? Quais? Qual o impedimento para utiliza-las? 3. Mercado 3.1 Qual a distribuição de suas vendas por região? 3.2 Qual a localização dos principais concorrentes? 3.3 Como é sentida receptividade dos clientes pelos produtos? 3.4 Fatores de maior sensibilidade para venda do produto: Baixo preço Produtos diferenciados Entrega Qualidade Outro Qual o fator? ___________ Qual? _________________ Obs. De 1 a 5 quais os pesos para cada um deles? 4. Estratégias e outros aspectos 4.1 Há previsão de investimento em melhorias do processo? Em qual parte? De que forma? 4.2 Há previsão de investimento em novos produtos? Quais? 4.3 Quais os fatores limitantes para o aumento da produção? 4.4 Quais os fatores limitantes para a melhoria dos produtos? 4.5 Quais fatores poderiam proporcionar maior lucratividade para a empresa? 4.6 Seus empregados são eficientes? Qual o ponto fraco? Que aspecto poderia melhorar? 4.7 Que tipo de programa e política de apoio seria benéfico para sua empresa? APÊNDICE C 339 4.8 Em relação ao seu principal mercado, ele tem crescido, se mantido inalterado ou diminuído? Qual o motivo? 4.9 Em relação ao Pólo Ceramista Regional (Campos e região), em uma escala de 1 a 5, quais empresas para você seriam nota 5? Nesta escala, que nota você daria a sua empresa? 4.10 Houve a implementação de alguma técnica ou método que tenha melhorado o desempenho da empresa nos últimos anos? Qual foi? Qual o impacto em termos de custo e benefício para a empresa? 5. Administração 5.1 Escolaridade do Proprietário: 5.2 Ano de início da produção: 5.3 No. total de funcionários: 5.4 Utiliza microcomputador na administração? 5.5 Trabalha em turnos? Qual o no. de horas trabalhadas/turno? 6. Produtividade 6.6 Qual o consumo de combustível por tonelada (ou m3) produzida por produto? 6.7 Qual o consumo de energia elétrica por tonelada (ou m3) produzida por produto? APÊNDICE C 340 Questionário Padrão 2 – Cerâmicas Informações sobre o processo produtivo da empresa visitada Método de coleta das informações: observação direta (in loco) 1. Extração da Argila 1.1 Como é feita a escolha da argila? 1.2 Qual o maquinário utilizado? 1.3 Qual o no. trabalhadores envolvidos? 1.4 È feito um planejamento prévio? 1.5 Qual o meio de transporte da argila? 1.6 Qual o volume extraído? 1.7 Os procedimentos adotados estão em conformidade com a norma técnica? OBS. 1 Descrever quais as tarefas e procedimentos de extração e transporte da argila. Dar uma nota de 1 a 5 para o nível de organização na execução das tarefas e procedimentos (observar principalmente fatores como limpeza, se os equipamentos e materiais são adequados, cuidado com os materiais, desperdício de material e tempo, fluidez do processo) OBS.2 Verificar e anotar os pontos onde há inspeção, de que tipo e quais os fatores avaliados. 2. Transformação (Fabricação) Descrever de forma resumida as seguintes etapas do processo: 2.1 Preparação da massa 2.1.1 Estocagem 2.1.2 Secagem 2.1.3 Moagem 2.1.4 Dosagem 2.1.5 Desintegração 2.1.6 Misturador 2.1.7 Laminação 2.1.8 Homogeneização 2.1.9 Estocagem 2.1.10 Laminação 2.1.11 Extrusão 2.1.12 Corte 2.1.13 Prensagem (telhas) 2.1.14 Secagem 2.1.15 Estocagem 2.1.16 Os procedimentos adotados estão em conformidade com a norma técnica? 2.1.17 Há automação no processo? Em que parte? APÊNDICE C 341 OBS. 1 Descrever quais as tarefas e procedimentos de preparação da massa. Dar uma nota de 1 a 5 para o nível de organização na execução das tarefas e procedimentos (observar principalmente fatores como limpeza, cuidado com os materiais, desperdício de material e tempo, fluidez do processo) OBS.2 Verificar e anotar os pontos onde há inspeção, de que tipo e quais os fatores avaliados. 2.2 Queima Descrever de forma resumida as seguintes etapas do processo: 2.2.1 Tipo de Forno 2.2.2 Capacidade 2.2.3 Trabalhadores envolvidos 2.2.4 Combustível utilizado 2.2.5 Os procedimentos adotados estão em conformidade com a norma técnica? OBS. 1 Descrever quais as tarefas e procedimentos de preparação para a queima. Dar uma nota de 1 a 5 para o nível de organização na execução das tarefas e procedimentos (observar principalmente fatores como limpeza, cuidado com os materiais, desperdício de material e tempo, fluidez do processo) OBS. 2 Verificar e anotar os pontos onde há inspeção, de que tipo e quais os fatores avaliados. 3. Produto acabado Descrever de forma resumida as seguintes etapas do processo: 3.1 Seleção 3.2 Classificação 3.3 Estocagem 3.4 Percentual de peças rejeitadas 3.5 Volume/dia expedido 3.6 Preço 3.7 Os procedimentos adotados estão em conformidade com a norma técnica (caso haja)? OBS. 1 Descrever quais as tarefas e procedimentos na manipulação dos produtos acabados. Dar uma nota de 1 a 5 para o nível de organização na execução das tarefas e procedimentos (observar principalmente fatores como limpeza, cuidado com os materiais, desperdício de material e tempo, fluidez do processo) OBS. 2 Verificar e anotar os pontos onde há inspeção, de que tipo e quais os fatores avaliados. APÊNDICE C 342 Questionário Padrão 3 – Distribuidores 1. Localização: 2. Compra produtos das cerâmicas de Campos - RJ? Quais produtos e de quais cerâmicas? 3. (Em caso afirmativo) Qual sua opinião sobre os produtos das cerâmicas de Campos? Quais os fatores positivos e quais os negativos? 4. (Em caso negativo) Porquê não? 5. Qual a localização dos principais fornecedores? 6. Quais os produtos comercializados? 7. Qual o produto mais vendido? 8. Qual a média de vendas/mês: 9. Quais os meses de maior venda? E os de menor venda? Qual a média de vendas nesses meses? 10. Quais os preços dos produtos? 11. Seus principais clientes são firmas ou pessoas físicas? Qual a proporção? 12. Quais os fatores que mais influenciam nas vendas? 13. Em relação aos seguintes fatores, quais são os mais importantes para os clientes: Qualidade, preço, produtos diferenciados, prazo de entrega. Há algum outro fator que seria importante? Qual? Porque? 14. Como é verificada a qualidade dos produtos? 15. Quais as principais reclamações dos clientes em relação aos produtos? 16. Nos últimos anos, o mercado tem crescido, permanecido no mesmo patamar ou diminuído?