PADRÕES TECNOLÓGICOS E DE COMÉRCIO EXTERIOR DAS FIRMAS BRASILEIRAS Fernanda De Negri CLASSIFICAÇÃO JEL: F12 RESUMO Este artigo analisa a relação entre os padrões tecnológicos e o desempenho externo das firmas brasileiras. Para tanto, as firmas foram classificadas em três grupos, dois dos quais são exportadores, e suas exportações foram subdivididas segundo a intensidade tecnológica. Os principais resultados mostram que: i) a tecnologia é um fator importante para o desempenho exportador das firmas brasileiras, tanto para a sua inserção no mercado internacional quanto para a ampliação dos volumes exportados; ii) firmas inovadoras apresentam um desempenho exportador superior às firmas não inovadoras, especialmente quando a inovação não se restringe à adaptação de produtos e processos; iii) As inovações de processo representam um elemento importante para as exportações de produtos de menor intensidade tecnológica; iv) Para as exportações de produtos de média intensidade tecnológica, tanto inovações de processo quanto de produto são relevantes; v) Por fim, as exportações brasileiras de produtos de alta intensidade tecnológica parecem não sofrer influência de inovações de produto. Isso sugere que o padrão de competição das firmas brasileiras que vendem esse tipo de produto está bastante afastado do padrão mundial, baseado em inovações de produto. ABSTRACT This paper analyzes the relation between technological patterns and external performance of the Brazilian firms. The main results show that: i) technology is an important element for the exporting performance of the Brazilian firms, as much for its insertion in the international market how much for the magnifying of the exported volumes; ii) innovative firms have higher export performance then non innovative firms, specially when innovation is not restrict to adequacy of products and processes; iii) Process innovation are important for the exportation of lesser technological intensity; iv) Process and product innovation are important for the exportation of medium technological intensity products; v) Finally, the Brazilian exports of high technological intensity products are not affected by product innovations. This suggests that the competition pattern of Brazilian firms is far from the world-wide pattern, that is based in product innovations. SUMÁRIO EXECUTIVO Este artigo tem o objetivo de analisar a relação entre diferentes padrões tecnológicos das firmas brasileiras e respectivos padrões de inserção externa. A partir da análise das diferentes capacitações tecnológicas e competitivas dessas firmas o trabalho procura contribuir no debate 1 sobre quais os limites e possibilidades para que o Brasil tenha uma inserção mais dinâmica no comércio internacional. As principais questões subjacentes à análise são: i) em primeiro lugar, se a inovação tecnológica é importante para determinar o volume e a intensidade tecnológica das exportações das firmas brasileiras; ii) em segundo lugar, procura-se observar quais são capacitações e/ou características competitivas das firmas que as credenciam a competir em mercados de maior conteúdo tecnológico. A TECNOLOGIA E O PADRÃO DE ESPECIALIZAÇÃO BRASILEIRO Em relação ao padrão de especialização brasileiro no comércio mundial, destaca-se alguns fatos estilizados: • A participação preponderante nas exportações brasileiras é de commodities primárias (40% do total exportado), as quais se seguem os produtos de média intensidade tecnológica (18% do total). Para efeito de comparação, a participação das commodities nas exportações mundiais é de apenas 13%. • Juntos, os produtos de alta e média intensidade tecnológicas representam pouco mais de 30% do total exportado pelo país, contra os 60% da participação desses produtos nas exportações mundiais. • Cerca de 44% das exportações brasileiras de produtos de alta intensidade tecnológica tem como destino o mercado norte-americano e canadense, enquanto que outros 31% destinamse a países da América Latina. • Essa breve análise sobre a especialização regional do comércio brasileiro indica que o Brasil parece ser capaz de exportar produtos de alta intensidade tecnológica para mercados competitivos como o mercado norte-americano, e não apenas para os países menos desenvolvidos da América Latina. Por outro lado, os países desenvolvidos exportam para o Brasil produtos, preponderantemente, de alta e média intensidade, o que faz com que os superávits brasileiros com esses países sejam sustentados por commodities e por produtos intensivos em mão-de-obra e recursos naturais. Em relação à importância da inovação tecnológica como um fator determinante das exportações brasileiras, os resultados obtidos apontam para as seguintes conclusões: • Em primeiro lugar, a inovação tecnológica tem impactos significativos sobre a probabilidade de uma firma brasileira exportar: firmas inovadoras tem chances maiores de se inserir no comércio internacional do que firmas não-inovadoras. • A inovação propriamente dita (para o mercado) aumenta mais as chances de uma empresa ser exportadora do que a difusão de tecnologias já existentes no mercado brasileiro (inovação para a firma). • A criação de novos produtos possui uma influência maior na probabilidade da firma exportar do que a criação de novos processos produtivos, mais eficientes ou com custos menores. • É um fato constantemente lembrado na literatura que os fatores extra-preço (qualidade do produto, por ex.) têm assumido um papel cada vez mais relevante na determinação dos 2 fluxos internacionais de comércio. A constatação que se faz aqui é que isso também parece ser verdade para o Brasil, a despeito da sua pauta de exportações ter um peso muito grande de commodities primárias, cujo padrão de competição está mais assentado em preços baixos. Portanto, embora o Brasil seja um país historicamente competitivo e com sua pauta de exportações com elevada participação de commodities primárias e produtos intensivos em mão-de-obra e recursos naturais, a inovação tecnológica, ainda assim, desempenha um papel importante na inserção externa das firmas brasileiras. • Por fim, dada a importância da inovação sobre o desempenho exportador das firmas, o que ser quer argumentar aqui é o Brasil é um país em desenvolvimento capaz de exportar produtos de maior intensidade tecnológica. Existem firmas brasileiras capazes de se inserir, competitivamente, em mercados mais intensivos em tecnologia, cujos padrões internacionais de competição são mais fortemente baseados no desenvolvimento de novos produtos. PADRÕES TECNOLÓGICOS E DE COMÉRCIO EXTERIOR DAS FIRMAS BRASILEIRAS Sobre as relações entre padrões tecnológicos das firmas brasileiras e seu desempenho externo, constatou-se que existe, na indústria de transformação brasileira, dois grupos de empresas exportadoras. Um deles, constituídos por firmas que inovam e diferenciam produtos, possui um caráter mais fortemente inovador, maiores indicadores de eficiência e é mais inserido no comércio internacional. Um segundo grupo, o de firmas especializadas em bens padronizados, possui exportações formadas, preponderantemente, por commodities. Esse grupo não é tão inovador e possui menores níveis de eficiência e uma menor inserção no comércio internacional. Este segundo grupo, entretanto, tem sido o principal responsável pelos superávits comerciais obtidos pela economia brasileira nos últimos anos. As empresas do primeiro grupo são mais competitivas em produtos de média e alta intensidade tecnológica, enquanto as do segundo grupo não se destacam das do primeiro em nenhum segmento de mercado em particular. Argumenta-se que a diferença no desempenho e no perfil do comércio exterior das duas categorias se deve, justamente, aos seus padrões de inovação tecnológica. Nesse sentido, procurou-se verificar quais os fatores de competitividade mais importantes, para as firmas brasileiras, nos diversos segmentos de mercado. Os resultados demonstraram, mais uma vez, a importância da inovação tecnológica para as exportações brasileiras, a despeito da elevada participação de commodities primárias nas exportações do país. O impacto da inovação tecnológica não se restringe aos produtos mais intensivos em tecnologia, pelo contrário, empresas inovadoras exportam mais do que suas congêneres não inovadoras em quase todas as faixas de produtos, com exceção das commodities. Isso se deve ao fato de que a competitividade brasileira em commodities tem uma relação mais estreita com a própria dotação de fatores da economia brasileira, o que é compatível com os padrões internacionais de competitividade nesses segmentos. Podemos concluir também, que os diferentes tipos de inovação – de produtos e processos – tem impactos diferenciados sobre as exportações. Em produtos de baixa intensidade tecnológica, bem como naqueles intensivos em mão-de-obra e recursos naturais, as inovações de processo são mais relevantes para o desempenho externo das firmas. Em outras palavras, o 3 padrão de competição das firmas brasileiras nesses mercados está pautado pela busca de processos produtivos mais eficientes, que garantam melhor qualidade ao produto ou que tenham custos menores. Em produtos de média intensidade tecnológica, por sua vez, as firmas brasileiras são capazes de melhorar seu desempenho externo a partir, alem da inovação em processos, da criação de novos produtos. De fato, o principal efeito da inovação tecnológica sobre o desempenho externo das firmas está, justamente, entre as exportadoras de média intensidade tecnológica. Nesse segmento de mercado em particular, atributos específicos do produto, como qualidade ou desempenho, parecem ser tão relevantes para o desempenho externo do país quanto processos produtivos mais eficientes. Por fim, em produtos altamente intensivos em tecnologia, o Brasil tem um longo caminho a percorrer a fim de se tornar mais competitivo. Além da forte dependência de importações e do baixo valor agregado pelas firmas exportadoras nesse segmento, observa-se que as possibilidades de melhora do desempenho externo brasileiro em produtos de alta tecnologia residem nas inovações de processo. Isso mostra a disparidade entre os padrões competitivos das firmas brasileiras e os padrões de competição predominantes no comércio internacional desses produtos. IMPLICAÇÕES DE POLÍTICA Apesar da histórica competitividade brasileira em produtos baseados na disponibilidade de recursos naturais e mão-de-obra, um dos argumentos aqui defendidos é que é possível e desejável a um país como o Brasil, ampliar o conteúdo tecnológico de sua pauta de exportações. A possibilidade de uma inserção externa mais dinâmica assenta-se, em grande medida, no estímulo à inovação tecnológica ao nível da firma. Nesse sentido, esse estudo constata a importância da inovação, seja de produtos ou processos, como um fator determinante das exportações brasileiras. Firmas que criam novos processos produtivos têm sido capazes de exportar mais, dos mais diversos produtos, do que firmas similares que não inovam. Nesses sentido processos produtivos mais eficientes ou com custos menores tem tido resultados efetivos no desempenho comercial das firmas exportadoras de produtos de maior ou menor intensidade tecnológica. A competição externa, via inovação e/ou diferenciação de produto tem sido uma ferramenta utilizada, especialmente, pelas firmas brasileiras exportadoras de produtos de média intensidade tecnológica. Nesse segmento de mercado, o padrão de competição das firmas brasileiras é condizente com o padrão observado internacionalmente, ou seja, com o padrão de suas concorrentes no mercado mundial. O único segmento de mercado no qual a inovação não tem um papel relevante no desempenho externo das firmas, é o de commodities. Nesse caso, a competitividade brasileira está assentada em sua dotação particular de fatores, ou seja, na disponibilidade de recursos naturais e de mão-de-obra. Assim, se modificar o padrão de especialização brasileiro no comércio internacional é considerado um objetivo para a política industrial e de comércio exterior, o estímulo a inovação tecnológica das firmas é o meio, ou pelo menos um dos meios de alcançá-lo. Argumenta-se que, o estímulo à inovação, além de aumentar as exportações brasileiras, o fará, especialmente, em 4 produtos de maior conteúdo tecnológico. Existem, entretanto, diferenças importantes nos impactos da inovação sobre as exportações de produtos de média ou de alta intensidade tecnológica, que podem sinalizar a necessidade de uma política diferenciada para grupos de firmas também diferentes entre si. As firmas exportadoras de produtos de alta intensidade tecnológica no Brasil, não têm sido capazes de uma inserção externa pautada nas armas de competição características desses mercados, as inovações de produto. Nesse sentido, e diferentemente das exportadoras de produtos de média intensidade, essas firmas necessitam se aproximar dos padrões de concorrência específicos desse mercado. Assim, caberia estimular o esforço inovador dessas empresas, e não apenas esforços de inovação destinados à adaptação de produtos ao mercado doméstico, como parece ser o padrão dessas firmas. Esse estímulo poderia possibilitar, inclusive, a internalização, no país, da produção de peças e componentes atualmente importados, suavizando a dependência brasileira da importação de produtos intensivos em tecnologia. Evidentemente, uma política de inovação para esse grupo de empresas traria resultados de longo prazo, e dependem fortemente da constituição, no país, de uma infra-estrutura tecnológica adequada à criação e aplicação de novas tecnologias. Mais factível para ampliar o conteúdo tecnológico das exportações, no curto prazo, seria apostar na ampliação as exportações de produtos de média intensidade tecnológica. Para as empresas exportadoras desses produtos, a inovação, tanto de produtos quanto de processos, é uma ferramenta capaz de ampliar suas exportações. Isso mostra que essas firmas competem, no mercado internacional, tanto por meio de atributos específicos do produto quanto por meio de processos produtivos mais eficientes. É nesse segmento que os benefícios da inovação tecnológica sobre as exportações seriam mais relevantes. 5