Exmo. Senhor Dr. Artur Penedos M.I. Assessor de Sua Excelência o Primeiro-Ministro Rua da Imprensa à Estrela, n.º 4 1200 888 Lisboa SCTS/AR/160 S. Mamede Infesta, 21 de Setembro de 2010 Assunto: Discriminações sucessivas do Ministério da Saúde. Exmo. Sr. Dr. Artur Penedos Na sequência da reunião tida no pretérito dia 08/07/2010, prevalecemo-nos de V. Exa. para levar ao conhecimento do Senhor Primeiro-Ministro de factos que muito preocupam esta estrutura sindical e os profissionais de saúde por ela representados. Como, por certo, V.Exa se recordará, foi demonstrado na passada reunião do dia 08/07/2010, a situação de bloqueio em que se encontra o processo negocial para revisão da carreira dos técnicos de diagnóstico e terapêutica em muito devido à oposição, que só a defesa de mesquinhos interesses corporativos pode justificar, a uma fusão entre esta carreira e a de técnico superior de saúde. Confrontados com a similitude dos requisitos habilitacionais exigidos para ingresso em ambas as carreiras, a titularidade de uma licenciatura, e o mesmo grau de complexidade das funções desempenhadas pelos profissionais destas carreiras, nos casos em que não desempenham exactamente as mesmas funções, os opositores à fusão destas carreiras invocam, como derradeiro fundamento para a significativa disparidade remuneratória, a circunstância de, por um lado, o ingresso na carreira de técnica superior da saúde se fazer após a realização de um estágio de especialidade, quando na carreira de técnico de diagnóstico e terapêutica esse mesmo estágio corresponde a uma unidade curricular das licenciaturas que dão acesso ao exercício da profissão, e, por outro lado, que a licenciatura exigida é, no caso dos técnicos superiores de saúde, ministrada na Universidade ao passo que, no caso dos técnicos de diagnóstico e terapêutica, é o Politécnico que a confere. Ambos os argumentos não resistem, contudo, à prova dos factos. A letra da Lei, no caso o art. 4 do Decreto-Lei n.º 414/91 de 22 de Outubro, exige para o ingresso na carreira de técnico superior de saúde a posse do grau de especialista, conferido mediante um processo de formação pré-carreira: um estágio de especialidade com uma duração variável de dois a quatro anos que o tempo e o Processo de Bolonha tornou obsoleto. 1 Tudo leva a crer, porém, que parte significativa, senão mesmo a maioria, dos profissionais de saúde, hoje integrados na carreira de técnico superior de saúde, terá ingressado nesta carreira sem ter realizado qualquer estágio de especialidade, antes apenas beneficiando da atribuição, por via administrativa, duma equiparação da sua prática profissional à realização desse estágio de especialidade. Esta equiparação extraordinária verificou-se pela aplicação quer do Decreto-Lei n.º 38/2002, de 26 de Fevereiro quer da Portaria n.º 552/88, de 16 de Agosto, conjugada com o n.º 3 do art. 35 do Decreto-Lei n.º 441/91. Por outro lado, e tanto quanto nos podemos aperceber, há muito que não se verifica a abertura, que carece de ser publicitada, desses estágios. A suspeita de que o principal argumento, esgrimido por quem se opõe a esta fusão de carreiras, apenas existe na letra na Lei que não na realidade dos factos, levou este Sindicato a solicitar ao Senhor Presidente da ACSS, a coberto do ofício de que juntamos cópia, informação sobre qual era afinal a percentagem dos actuais técnicos superiores de saúde que efectivamente lograram obter o grau de especialista na sequência da realização do mencionado estágio de especialidade. Esta resposta, não foi, até à data, fornecida, receando, como é prática infelizmente usual da ACSS, que nunca venha a ser dada. Ora, é agora publicamente alardeado, sem que o Ministério da Saúde o desminta, que se prepara um novo processo de equiparação extraordinária da prática profissional à realização desse estágio de especialidade de modo a permitir a candidatura a concursos de ingresso na carreira de Técnico Superior de Saúde de profissionais que o não realizaram mas que, com vínculos precários, vem exercendo funções atribuídas a esta carreira. Em síntese: na prática, o que acaba por relevar, com as sucessivas equiparações administrativas do estágio de especialidade, é afinal a prática profissional. Ora, prática profissional também a dispõem, e com abundância, os nossos associados. O segundo argumento que sustenta a oposição à fusão de ambas as carreiras centra-se na diferente natureza, universitária e politécnica, dos estabelecimentos de ensino superior que conferem as licenciaturas exigidas como requisitos habilitacionais de ingresso nessas carreiras. Este argumento, que apenas algum pudor impede de ser directa e publicamente esgrimido por quem o defende, tem contra si a Lei de Bases do Sistema Educativo, mas não deixa de ser acolhido, na prática corrente, por organismos públicos na área da saúde. O que é tanto mais surpreendente quanto se multiplicam as manifestações públicas do Governo, e em especial do Senhor Primeiro-Ministro, na valorização do ensino superior politécnico, o que obriga a 2 que não se lhe atribua um estatuto de menoridade face ao ensino superior universitário. Um exemplo, retirado do caso dos profissionais de saúde com intervenção na área da nutrição e dietética, melhor demonstra o que atrás se referiu. Pela Portaria n.º 838/2010, de 1 de Setembro, o Ministério da Saúde reconheceu como habilitação suficiente para efeitos de ingresso no estágio da carreira de técnico superior de saúde, ramo de nutrição, a licenciatura em Dietética e Nutrição ministrada na Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa. Analisado o plano de estudos desta licenciatura e os das suas congéneres, mas ministrada na Escolas Superiores de Tecnologia de Saúde, não se vislumbra qualquer diferença significativa, seja na duração e conteúdos programáticos, que não seja o facto de, a primeira ser ministrado no ensino superior universitário, e a segunda no ensino superior politécnico. Mas, mesmo assim, o Ministério da Saúde entendeu não considerar esta última como habilitação académica suficiente para ingresso no estágio de especialidade no ramo de nutrição da carreira técnica superior de saúde. Não existe qualquer justificação, no plano académico e profissional, para esta discriminação dos licenciados em dietética e nutrição. E isto porque: (a) No plano académico, as licenciaturas em dietética e dietética e nutrição são consideradas, pelas instituições de ensino superior que as leccionam e pelas entidades públicas que as tutelam (MCTES) como cursos superiores na área científica da nutrição. Em termos de formação académica base, a duração, por um lado, da licenciatura em dietética e em dietética e nutrição e, por outro lado, da licenciatura em nutrição é exactamente igual – 4 anos com 240 ECTS (European Credit Transfer and Accumulation System), (b) No plano profissional e em relação aos conteúdos funcionais, cabe salientar que a “International Standard Classification of Ocupations (ISCO)”, da Organização Internacional do Trabalho (OIT), os conceitos de “Dieticians” e de “Nutricionists” são apresentados com o mesmo número classificativo (3223), e com o mesmo conteúdo profissional. De resto, o conteúdo profissional definido pela OIT foi transposto para o descritivo da função de Dietista constante da Classificação Nacional de Profissões, do Instituto de Emprego e Formação Profissional (EFP) como abaixo referido. Aliás, os Nutricionistas actualmente, não constam da Classificação Nacional de Profissões, pelo que, para esses efeitos, desenvolvem a sua actividade no quadro da classificação profissional de “Dietistas”. Por outro lado, e como consta do próprio site do IEFP (www.iefp.pt), a profissão de Dietista – tal como a de médico, arquitecto, entre outras – está regulamentada na Directiva Comunitária 2005/36/CE, de 7 de Setembro de 2005, “relativa ao conhecimento das qualificações profissionais” que visa permitir 3 o livre exercício de profissões e actividades pelos cidadãos comunitários num Estado-Membro diferente em que adquiram as respectivas qualificações profissionais. Mais se frisa que a Associação Portuguesa de Dietistas e a Associação Portuguesa de Nutricionistas, são ambas membros da European Federation of Associations of Dietitians (EFAD), desde 2006, segundo um estudo que instruiu o Projecto de lei n.º161/XI, nos termos e para os efeitos do art. 2.º, n.º3, da Lei n.º6/2008, de 13 de Fevereiro, pelo que os Em síntese: Nutricionistas e os Dietistas exercem a mesmíssima profissão, como é notório nos inúmeros centros hospitalares, clínicas, empresas e instituições públicas e privadas, e a única justificação para o diferente tratamento de ambas as carreiras prende-se exclusivamente com a diferente natureza, universitária e politécnica, das instituições que conferem o grau de licenciado de que são titulares os profissionais integrados em ambas as carreiras. Este Sindicato e os profissionais por ele representados estão bem cientes das dificuldades orçamentais que o país atravessa, mas, como procuramos demonstrar na passada reunião, as posições que defendemos, em sede de revisão de carreiras, visam, em última instância, conter custos salariais porquanto impedem, como aliás decorre do princípio de salário igual para trabalho igual, que se repitam, no futuro, injustificadas situações de diferente remuneração de uma mesma actividade profissional, realizada por profissionais com uma formação superior e prática profissional senão idênticas, pelo menos, significativamente similares. Esperamos que V.Exa leve esta posição e os factos atrás sumariamente descritos ao conhecimento do Senhor Primeiro-Ministro, que tem caracterizado a sua acção governativa, nomeadamente, pelo combate a injustificados privilégios de natureza corporativa, e que, assim, se consiga demover o Ministério da Saúde da sua actual posição de bloqueio das negociações para as revisões de carreira que, na prática, apenas contribuiu para que esses privilégios se mantenham, com manifesto prejuízo do erário público e dos princípios constitucionais da igualdade e da justiça. Sem outro assunto, subscrevemo-nos com elevada consideração e cordiais cumprimentos A Direcção Nacional O Presidente (Almerindo Rego) 4