inovação e tecnologia mineral A busca da inovação tecnológica por meio de crowdsourcing Acabou o superciclo de bonança na mineração iniciado em 2002. Para manter ou melhorar a competitividade da mineração brasileira, é preciso inovar. Também importante é a gestão eficaz para acelerar a obtenção de resultados e o retorno dos investimentos em PD&I, inclusive testando novas modalidades de gerar inovação. Este artigo resume parte de um projeto* em curso no Cetem que analisa as questões relevantes sobre o fenômeno crowdsourcing, uma forma de inovação aberta que utiliza a inteligência coletiva. Exemplos de sucesso no uso da metodologia pela indústria da mineração são citados. A inovação aberta foi inicialmente conceituada em 2003 por Henry W. Chesbrough, no livro “Open Innovation: The New Imperative for Creating and Profiting from Technology”. Diferentemente do que ocorre na inovação fechada, o conceito de open innovation prevê a geração e o uso de ideias valiosas a partir de dois planos: o externo – em que as ideias usadas vieram de fora da empresa, e o interno – quando as ideias são criadas no âmbito interno da empresa (por colaboradores) e disponibilizadas para o “mercado”. O conceito pressupõe, em sua raiz, que o conhecimento útil está amplamente distribuído, sem fronteiras. 48 Revista Mineração & Sustentabilidade | Julho . Agosto de 2015 O termo “crowdsourcing” (neologismo de “crowd” – multidão e “outsourcing” – terceirização) foi definido por Jeff Howe, em 2006, como o ato de oferecer um trabalho em uma chamada aberta à participação de um grupo de pessoas (profissionais e/ou amadores). O termo tem tido diversas interpretações de acordo com as diferentes modalidades. O próprio Howe, dois anos após a criação do termo, renomeou crowdsourcing para “crowd wisdom” (sabedoria da multidão). da multidão” na área mineral. Somente após uma ampla divulgação do sucesso da sua iniciativa é que outras mineradoras começaram a trilhar o caminho da inovação aberta como uma nova estratégia. Um velho ditado no setor se confirma: as empresas preferem ser “a primeira entre as segundas”. Crowdsourcing se refere a ligações entre uma organização e uma multidão indefinida, ligações essas embasadas no uso da Web para a participação, comunicação e colaboração da multidão, a qual é diversificada conforme as modalidades e as variantes de crowdsourcing aplicadas. No entanto, a crowdsourcing não é exclusiva para fins comerciais - tem sido utilizada por governos, associações de classe, comunidades regionais, organizações sem fins lucrativos, instituições de P&D (públicas e privadas) e pela comunidade acadêmica em nível mundial. A Goldcorp estava ficando sem reservas minerais. Sua produção de ouro estava em declínio. Até que, em 1999, a empresa decidiu expor, na internet, os dados geológicos de seus ativos e ofereceu um prêmio de US$ 575 mil a quem identificasse melhores alvos para a exploração mineral. O concurso desencadeou respostas vindas de vários países. Confirmado que a solução vencedora era de especialistas em software geoespacial, da empresa australiana Fractal Graphics, a Goldcorp declarou ter economizado três anos de exploração, mais um aumento substancial na receita. Além disso, a empresa contratou algumas das pessoas que apresentaram outras soluções inovadoras. Algumas iniciativas de sucesso ilustram a utilização de open innovation e de crowdsourcing na mineração. A empresa canadense Goldcorp foi a pioneira na aplicação da “sabedoria Desde 2008, a Rio Tinto mantém o programa “Mine of the Future” para o emprego das mais inovadoras tecnologias de automação que melhorem produtividade, eficiência e segurança de operações de mineração. O modelo da rede de inovação é baseado nas parcerias de seus seis centros de P&D com várias empresas (fornecedores selecionados) e com universidades australianas. O progresso dessa iniciativa pode ser visualizado em http://www. riotinto.com/documents/120925_ JMG_MineExpo.pdf. No site que exibe as competições intermediadas pela empresa NineSigma (https://ninesights.ninesigma.com/ rfps) há quatro desafios de crowdsourcing em tecnologia mineral: (i) da Teck Resources Ltd. (2004) sobre tecnologias de tratamento da água usada em operações de mineração para reaproveitamento e uso em ecossistemas de vida aquática, atendendo aos padrões de qualidade para concentrações de selênio e nitratos; (ii) da International Copper Association (2009) para obter sugestões de usos do cobre e suas ligas em aplicações comerciais; (iii) do K+S Group (2010) para tecnologias inovadoras a serem usadas na moagem de minerais cocristalizados, otimizando sua separação após sucessivas moagens e minimizando a formação de poeira; e (iv) da Newmont Mining Corporation (2011) para métodos com maior rendimento na extração da prata de diferentes minérios. Outros exemplos de empresas que concretizaram consórcios de inovação aberta: (i) a Anglo American, por meio de um fórum aberto destinado a desenvolver tecnologias e modelos de operação para o futuro; (ii) a Gold Fields, via participação em hackathons (eventos para o desenvolvimento de programas computacionais); (iii) a AngloGold Ashanti, com um consórcio para inovação tecnológica (https://anglogoldashantitechnology.com/), criado em 2010; e (iv) o programa “Base Metals Innovation” da Vale, coordenado por sua equipe de desenvolvimento tecnológico no Canadá (http://www.vale.com/ canada/en/business/mining/mineral-research/product-innovation-technology/pages/default.aspx). Há também notícia de que a BHP Billiton já está considerando a inovação aberta Fernando A. Freitas Lins, Engenheiro Metalúrgico, D. Sc., Pesquisador Titular e Diretor do Cetem/MCTI • [email protected] Carmen Lucia Branquinho, Química Industrial e Engenheira Nuclear, PhD, Tecnologista Senior e Colaboradora do Cetem • [email protected] como um potencial impulso para atualizar sua estratégia tecnológica. por rota úmida e que ainda não tem uma destinação adequada na escala em que é produzido. Em 2012, a Votorantim Metais obteve ideias de como impulsionar novas aplicações para aço galvanizado. Motivada pelas interessantes respostas, a empresa lançou outro desafio em 2013 e obteve sugestões inovadoras de como aumentar o uso do zinco para beneficiar o agronegócio e a saúde humana. Com respeito a um fabricante de equipamentos, tem-se o exemplo da Sandvik. Com seus departamentos de P&D em vários países, a empresa vem aplicando crowdsourcing há algum tempo. Seus projetos básicos de novos caminhões são apresentados em workshops para a coleta de sugestões de usuários, e os participantes, todos os clientes convidados pela empresa, identificam os pontos fortes e fracos e sugerem as mudanças a serem efetuadas. Compiladas e organizadas, as informações são repassadas ao departamento de engenharia da empresa. O novo caminhão TH663, lançado no final de 2013, é exemplo de sucesso da metodologia empregada. No Brasil, três empresas obtiveram êxito nos seus desafios de ideação via plataforma da Batalha de Conceitos (http://www.battleofconcepts.com. br/batalhas). Em 2010, a Samarco Mineração lançou um desafio para aproveitamento de seus rejeitos de minério de ferro. A empresa obteve novas ideias para projetos de aplicação dos rejeitos (in-natura e após tratamento) em diversos setores industriais. A Promon Engenharia, com o desafio lançado em 2011, recebeu sugestões sobre produtos e tecnologias de utilização do fosfogesso, subproduto do processo de produção de fertilizantes Em março, o MCTI e a Anpei lançaram a plataforma iTec. A ferramenta reúne, em ambiente digital, instituições de pesquisa e empresas para o compartilhamento de demandas e de propostas de soluções inovadoras para os desafios enfrentados pelo setor empresarial, inclusive o setor mineral. Por fim, cabe mencionar o guia comissionado pelo governo da Finlândia e publicado em março de 2015, que é parte de uma série de diretrizes para minimizar o impacto ambiental de projetos de mineração no país. Pode ser considerado uma forma de aplicação de crowdsourcing, uma vez que orienta os cidadãos, os envolve e solicita sua opinião quanto aos procedimentos em utilização para avaliar o impacto. (*) O projeto do Cetem é financiado pelo Programa de Capacitação Institucional (PCI) do MCTI por intermédio do CNPq. 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