A DEFESA DO CONSUMIDOR EM FACE DA JURISPRUDÊNCIA DO STF Fábio Henrique Podestá* *Mestre em Direito do Consumidor (PUC-SP). Doutor em Direito Civil (USP). Professor de Direito Civil na USJT. Juiz de Direito em São Paulo Sumário: 1. Causas e razões históricas da proteção do consumidor. 2. Modelo e estrutura do Código do Consumidor. O surgimento de novos conflitos. 3. A jurisprudência do STF em direito do consumidor. Alguns aspectos. 4. Conclusão 57 // Revista da Faculdade de Direito // número 1 // primeiro semestre de 2014 Revista da Faculdade de Direito da Universidade São Judas Tadeu http://www.usjt.br/revistadireito/ // A Defesa do Consumidor em Face da Jurisprudência do STF // Fábio Henrique Podestá 1. Causas e razões históricas da proteção do consumidor Historicamente sempre houve consumo diante da necessidade do ser humano obter, notoriamente, produtos para a sua sobrevivência. A própria competição pela posse de certos elementos necessários para a vida e de determinados instrumentos para o cultivo da terra ou autodefesa são demonstrações de que a origem do homem sempre esteve associada ao consumo. A problemática sobre o consumo parece ser identificada quando tem inicio a desproporção entre produção e necessidades, o que certamente contribuiu para uma ansiedade pela posse de objetos como elementos essenciais à vida. A consagração constitucional da proteção do consumidor representou uma das novidades mais relevantes da atual Constituição Federal diante da premente necessidade de disciplina de uma relação jurídica que encontrava, via de regra, enquadramento no vetusto Código Civil de 1916, reconhecidamente já inadequado para regular os diversos campos da ordem jurídica civil. A posição que o legislador do Texto Maior conferiu à proteção do consumidor não deixa margem à dúvida de que se trata de verdadeiro direito fundamental (art.5º, inc.XXXII), não assimilável numa perspectiva jusnaturalista, mas, enquanto constitucional, reveste-se de verdadeira dimensão universalista, pois decorrente de um fenômeno mundial que encontrou fomento na massificação da sociedade, notadamente “[...] caracterizada por um número crescente de produtos e serviços, pelo domínio do crédito e do marketing, assim como pelas dificuldades de acesso à justiça. São esses aspectos que marcaram o nascimento e desenvolvimento do direito do consumidor, como disciplina autônoma”.1 Para certos autores, o imperativo da proteção do consumidor tem suas raízes desde tempos remotos, chegando-se mesmo ao próprio Código de Hamurabi até atingir a própria Idade Média.2 Mas o registro da Revolução Industrial (1750 a 1850) é a tônica de um novo marco a partir do qual o consumo começa apresentar elementos diferenciais, sobretudo diante de fatores como a concentração populacional em áreas urbanas, modos de produção dinâmicos pela utilização da máquina (desaparecimento da classe social dos artesãos com o surgimento do operário), queda na qualidade dos produtos, capitalismo irracional, entre outros. O reconhecimento efetivo da proteção do consumidor, pelo menos de forma voltada à consolidação dos direitos, ocorreu com a famosa mensagem enviada ao Congresso Americano pelo Presidente norte americano, John Fitzgerald Kennedy, em 12 de março de 1962, definindo um elenco de medidas de proteção voltadas ao direito à segurança, o // O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL // número 1 // primeiro semestre de 2014 58 Revista da Faculdade de Direito da Universidade São Judas Tadeu http://www.usjt.br/revistadireito/ // A Defesa do Consumidor em Face da Jurisprudência do STF // Fábio Henrique Podestá direito à informação, o direito de escolha e o direito de ser ouvido ou consultado.3 tempo que se caracteriza por sua irreversibilidade, mas também ao que se identificou como sociedade de consumo. Esse rol foi ampliado pela Comissão de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas em 1973, consagrando o direito à indenização, direito à educação para o consumo, direito a um meio ambiente saudável, direito à proteção de publicidade e direito a contratos com proteção a cláusulas abusivas. Após mais de duas décadas, em 1985, a Assembléia Geral da ONU editou a Resolução n.39238/85, recomendando aos governos o reforço ou manutenção de uma política voltada à proteção do consumidor, considerando os princípios adotados. A referida expressão teve sua origem desde o início das noções abstratas de economia até ocupar a linguagem diária com forte conotação pejorativa quando se identifica, em especial, que determinadas demandas materiais são mais fomentadas por conta de inequívoca posição social do que propriamente necessidades do viver diário. Percebe-se, então, a importância do tema e a própria expressão, antes mencionada, de se tratar a defesa do consumidor como um direito fundamental em favor não só do cidadão, como também da própria coletividade. Nessa linha, como bem se afirma “O que deu dimensão enormíssima ao imperativo cogente de proteção ao consumidor, ao ponto de impor-se como um tema de segurança do Estado no mundo moderno, em razão dos atritos sociais que o problema pode gerar e ao Estado incumbe delir, foi o extraordinário desenvolvimento do comércio e a conseqüente ampliação da publicidade, do que igualmente resultou, isto sim, o fenômeno desconhecido dos economistas do passado – a sociedade de consumo, ou o desfrute pelo simples desfrute, a aplicação da riqueza por mera sugestão consciente ou inconsciente”.4 Logo, o advento do Código do Consumidor não está só associado à massificação da sociedade, fenômeno de nosso Identificam-se três principais perspectivas sobre a cultura de consumo. A primeira que confere uma visão de que esta se coloca na expansão da produção capitalista de produtos, que tem dado lugar a uma vasta acumulação de cultura material na forma de bens de consumo e de lugares de compra e de consumo. A segunda centra-se numa visão mais sociológica segundo a qual a satisfação obtida com os bens se relaciona como o acesso socialmente estruturado a eles, em um jogo de “soma zero”, em que a satisfação e o status dependem da exibição e da manutenção das diferenças em condições de inflação. Em terceira perspectiva, levam-se em consideração os prazeres emocionais do consumo, os sonhos e desejos celebrados no imaginário da cultura consumista e em determinados lugares de consumo que suscitam, de diferentes maneiras, uma excitação corporal direta e prazeres estéticos.5 Logicamente que não se pode ignorar que o fomento para o consumo irrefletido está igualmente associado a estratégias de marketing, pois “Não se procura desvendar agora um princípio de análise. Trata-se apenas da mentalidade de consumo privada e coletiva. No entanto, a este nível bastante superficial, é permitido arriscar a seguinte compara- // O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL // número 1 // primeiro semestre de 2014 59 Revista da Faculdade de Direito da Universidade São Judas Tadeu http://www.usjt.br/revistadireito/ // A Defesa do Consumidor em Face da Jurisprudência do STF // Fábio Henrique Podestá ção: é o pensamento mágico que governa o consumo, é uma mentalidade sensível ao miraculoso que rege a vida quotidiana, é a mentalidade primitiva, no sentido em que foi definida com baseada na crença na omnipotência dos pensamentos: no caso presente, trata-se da crença na omnipotência dos signos. A opulência, a ‘afluência’ não passa da acumulação de signos da felicidade”.6 organizador da economia, como também o agente regulamentador de toda vida e saúde social, política e econômica do país em parceria com sindicatos e empresas privadas, conforme a noção que se tenha de uma determinada ordem econômica institucionalizada. Inviável associar a crescente valorização da cultura de consumo somente a problemas de excesso de produção, mas ao que corretamente se designa por desclassificação cultural decorrente da perda de um racionalismo superado que teve seu apogeu com a Revolução Francesa, o que para certos pensadores justifica a vinculação da temática a uma nova fase em todos os setores da sociedade chamada de pós-modernismo.7 No aperfeiçoamento do “Estado de Direito”, “’O desenvolvimento do Estado Social’ propiciou grandes avanços em termos de proteção legislativa ao mais fraco. Muniu-se o trabalhador de novos direitos, criou-se um aparato legal de proteção ao consumidor e aos titulares de bens ambientais, amparou-se as minorias, etc. Com o ‘Welfare State’ surge uma cultura própria, fundada na ‘expectativa geral de justiça’, em contraste com o modelo prevalente no século passado, de fatalismo, resignação, apatia reivindicatória generalizada”.8 Sendo evidente que as complexidades registradas na atual sociedade ultrapassam questões meramente individuais, a maior qualidade que se pode registrar na defesa do consumidor positivada encontra-se na disciplina de relações com dimensões coletivas, vale dizer, como resultado da superação de paradigmas liberais, o próprio Estado se viu na necessidade de redimensionamento de suas funções reformulando os princípios originais. Com tal contexto, o liberalismo e todos os princípios jurídicos que o fomentavam foram questionados já que “[...] as atividades e relações se referem sempre mais freqüentemente a categorias inteiras de indivíduos, e não a qualquer indivíduo, sobretudo. Os direitos e deveres não se apresentam mais, como nos Códigos tradicionais, de inspiração individualística-liberal, como direitos e deveres essencialmente individuais, mas metaindividuais e coletivos”.9 Com isso, passou a garantir níveis mínimos de renda, promoveu acesso à saúde, escolaridade, instituiu programas sociais e, especialmente passou a intervir de forma mais acentuada na vida econômica. É o que se chamou de welfare state ou “Estado do Bem-Estar Social”, ou seja, uma espécie de organização política e econômica que faz do Estado o agente da promoção (protetor e defensor) social e Na essência, os litígios não possuem mais a estrita visão do direito romano envolvendo os conhecidos personagens “Tício versus Cáio”. Doravante a caracterização de um determinado conflito decorrente, por exemplo, de uma ofensa pode conferir, na atual sociedade cunhada de globalizada, efeitos que ultrapassam os limites de sujeitos identificados, podendo atingir um sem número de pessoas que estejam // O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL // número 1 // primeiro semestre de 2014 60 Revista da Faculdade de Direito da Universidade São Judas Tadeu http://www.usjt.br/revistadireito/ // A Defesa do Consumidor em Face da Jurisprudência do STF // Fábio Henrique Podestá na mesma situação e/ou que não sejam passíveis de identificação. São os chamados interesses difusos que possuem um grau de coletivização superior ao interesse público com o qual evidentemente não se confunde. Assim, o derramamento de óleo em um rio ou no mar, a poluição provocada por uma fábrica ou a programação televisiviva que ofenda princípios constitucionais são práticas que não provocam danos à reduzida parcela da população, mas podem (e freqüentemente assim ocorre) conferir dimensão coletiva.10 Inevitavelmente, não poderia fugir a consideração de toda essa problemática a disponibilização pelo legislador de meios para a defesa desses interesses, matéria que bem se afina com a temática do acesso à justiça. A explanação de todo esse contexto visa a demonstrar quão relevante se torna à efetivação e à proteção das normas consumeristas, o que fatalmente vai espelhar no trato com que os tribunais (em especial o Supremo Tribunal Federal) se defrontam com as chamadas novas demandas. 2. Modelo e estrutura do Código do Consumidor. O surgimento de novos conflitos. Visando a cumprir o mandamento constitucional (art.5º, inc. XXXII), inclusive em razão de prazo estipulado para a edição de um Código do Consumidor (art.48 da ADCT), foi promulgada a Lei n.8.078 de 11 de setembro de 1990. Marcadamente voltado para uma relação jurídica de ordem pública a interesse social (art.1º), o chamado código consumerista está inserido num contexto mais ampliado denominado “Ordem Econômica e Financeira”, representando, junto com os princípios consagrados no art.170 da CF, o modo de ser da atividade econômica fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa com vista a assegurar a todos a existência digna, conforme os ditames da justiça social.11 Mas observe-se que junto com a defesa do consumidor, outra disciplina importante, visando à adequada regulação do mercado, diz respeito à chamada defesa da concorrência, cujo objetivo se volta a conferir ao Estado o poder de intervir na atividade econômica para reprimir o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados e à eliminação da concorrência, como também ao aumento arbitrário de lucros (art.173, § 4º). A concorrência se destina a atribuir ao consumidor a liberdade de escolha, pois “De nada adiantaria proteger a concorrência se não houvesse mercado; e só há mercado com a existência de consumidor”.12 Percebe-se que as idéias têm caráter complementar todas elas voltadas a conferir de forma satisfatória um mínimo de liberdade de opções ao consumidor, muito embora seja possível reconhecer que, por força estratégica voltada ao simulacro do desejo, registre-se na sociedade atual que a liberdade seja passível de ser questionada ou até mesmo frustrada, tamanha a uniformidade dos produtos, serviços e cláusulas contratuais oferecidas no mercado, situação esta última que justifica o tratamento do controle das cláusulas // O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL // número 1 // primeiro semestre de 2014 61 Revista da Faculdade de Direito da Universidade São Judas Tadeu http://www.usjt.br/revistadireito/ // A Defesa do Consumidor em Face da Jurisprudência do STF // Fábio Henrique Podestá abusivas nos contratos de consumo.13 Pela própria expressão que assume a proteção da concorrência, portanto, não é ela um fim em si mesma e poderá ser afastada quando o escopo maior perseguido pelo sistema assim o exigir.14 Mas observe-se que se o equilíbrio do mercado (lato sensu) é a própria expressão dos princípios que regem a atividade econômica, em cujo âmago está a própria noção de liberdade (liberdade de iniciativa da empresa e liberdade de escolha do consumidor), assume-se um outro contexto externo a esse, ou seja, o problema da justiça social “non già alterando lê regole della concorrenza, o introducendo umilianti paternalismi, ma attraverso misure fiscali, offerta di servizi pubblici e politiche economiche. Il disegno, che pur si coglie ne dibattito odierno, di erogare, in luogo di beni e servici sociali (prestazioni sanitarie, scolastiche ecc.), somme di denaro o ‘buoni’ liberamente spendibili, è índice della volontà di imemettere ne mercato nuovi soggetti. La dignità dell´uomo è garantita assai più dalla dilatazione del mercato, e dunque dalla libertà di scelta e dalla responsabilità del decidire, che da misure pubbliche, la quali non tanto proteggono quanto mortificano gli esclusi”.15 Nunca se pode ignorar, portanto, que o exercício de qualquer liberdade está condicionado à consecução dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil (art.3º da CF), sob os fundamentos explícitos do art.1º da mesma Carta. De forma específica, o Código do Consumidor não é, como se costuma pensar, uma lei exclusivamente voltada a pro- teger a parte mais fraca, mas essa proteção é direcionada para também promover o equilíbrio com o fornecedor de produto ou serviço que, no mais das vezes, dita as suas regras no mercado específico que é o de consumo. Daí então a necessidade da disciplina de uma relação jurídica padronizada por dois sujeitos (o consumidor e o fornecedor), o que não se limita a sujeitos determinados, mas pode atingir outros que estejam expostos a práticas abusivas ditadas pelo fornecedor, é o que se costuma denominar equivocadamente de consumidor por equiparação (arts.17 e 29 do CDC).16 Voltada a tutelar os direitos denominados básicos do consumidor (art.6º), a lei cria uma “Política Nacional das Relações de Consumo”, cuja norma programática (art.4º e incisos) deve ser executada conforme os instrumentos especificamente considerados (art.5º).17 Pode-se dizer que o Código do Consumidor representa uma simbiose de várias disciplinas jurídicas, daí o seu caráter multidisciplinar, ou seja, não se limita a regular uma relação jurídica que tem convergência e assimetria com o Código Civil18, mas regula relações marcadamente ditadas pelo direito administrativo (art.55 usque art. 60), cria tipos penais (art.61 usque art.80), confere a proteção do consumidor em juízo (art.81 usque art.104) e confere até semelhanças com institutos típicos do direito do trabalho (art.107). Mas é no campo marcadamente da responsabilidade civil e proteção contratual do consumidor que se registram inovações que fomentaram a doutrina para o desenvolvimento, por exemplo, do princípio da boa-fé objetiva, antes relega- // O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL // número 1 // primeiro semestre de 2014 62 Revista da Faculdade de Direito da Universidade São Judas Tadeu http://www.usjt.br/revistadireito/ // A Defesa do Consumidor em Face da Jurisprudência do STF // Fábio Henrique Podestá do ao esquecimento, em que pesem manifestações de determinados autores.19 A questão essencial que envolve a disciplina dos contratos e da responsabilidade civil, no âmbito do direito do consumidor, diz respeito àquela da alocação dos riscos, inevitáveis, entre os sujeitos da relação posta em causa e, ainda, por força das práticas notadamente abusivas no mercado de consumo. Assim, em que medida os fornecedores arcarão com a responsabilidade? Como definir o alcance da segurança que será dada ao consumidor? Quais os impactos que isso trará sobre a produção e o custo dos produtos? Essas questões demonstram a complexidade que envolve a sintonia entre a produção e o consumo voltados à consecução de objetivos que, em termos abstratos, vêm bem apontados pelo Código do Consumidor (art.4º e incisos). Por essa linha, se a opção do legislador foi de afastar a ocorrência de cláusulas abusivas ou de aliviar os consumidores do risco do produto, sobretudo porque há o reconhecimento expresso da sua vulnerabilidade (art. 4º, inc. I), a necessidade da concorrência levará, portanto, à busca de melhor qualidade e produtividade, fazendo com que o custo seja reduzido. 20 Por outro lado, diante da amplitude que assume a proteção do consumidor, novas demandas surgem levantando sérios questionamentos sobre a suposta insuficiência do atual modelo, ou seja, como dimensionar a responsabilidade civil do fornecedor no âmbito do chamado comércio eletrônico? O Código de Defesa do Consumidor é passível de incidência nos meios de comunicação de massa? Como adequar de forma mínima a proteção do consumidor frente ao chamado mercado informal? Há uma nova crise do contrato? Nesse caso, se a resposta for afirmativa, os juízes estão convictos desse novo momento? Encontra-se em vias de configuração uma “consumerização” do direito empresarial? As respostas a estas questões desviam da finalidade destas linhas, mais servindo como fomento para discussão e reflexão em uma próxima oportunidade. Passemos ao objeto central destas linhas. 3. A jurisprudência do STF em direito do consumidor. Alguns aspectos. A competência da Corte Suprema é prevista pela Constituição Federal e, especialmente, a possibilidade de apreciação de causas envolvendo questões de direito do consumidor submetem-se ao permissivo do art.102, I, letra “a” (ação direta de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual e a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo), letra “p” (pedido de medida cautelar das ações diretas de inconstitucionalidade), art.102, inciso III (julgar, mediante recurso extraordinário as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida contrariar dispositivo desta Constituição). Por conta deste âmbito da competência, grande parte da matéria relativa ao direito do consumidor diz respeito à legislação infraconstitucional, o que fatalmente impede que a maior parte dos recursos extraordinários tenha acesso à // O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL // número 1 // primeiro semestre de 2014 63 Revista da Faculdade de Direito da Universidade São Judas Tadeu http://www.usjt.br/revistadireito/ // A Defesa do Consumidor em Face da Jurisprudência do STF // Fábio Henrique Podestá apreciação do Supremo Tribunal Federal, ou seja, é pacífica a jurisprudência da mais alta Corte, no sentido de não tolerar, em recurso extraordinário, alegação de ofensa que, irradiando-se de má interpretação, aplicação, ou, até, inobservância de normas infraconstitucionais, seria apenas indireta à Constituição da República. Veja-se a respeito a seguinte ementa que bem expressa a jurisprudência dominante. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONTENDA DECIDIDA COM FUNDAMENTO EM NORMAS VEICULADAS PELO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMI- poupança, não obstante as normas veiculadas pelo Código de Defesa do Consumidor alcançarem as instituições financeiras, não é possível a sua aplicação retroativa, sob pena de violação do art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal.22 Frente à questão, manifestou a Corte Suprema que mesmo sendo o Código do Consumidor uma lei de ordem pública23 e de interesse social24 (art. 1º), o efeito retroativo fica descartado, notadamente porque o texto constitucional, ao prever que a lei nova não prejudicará o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada, não faz distinção entre legislações de ordem pública e outras que não possuem essa natureza. DOR. OFENSA INDIRETA. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. 1. A controvérsia sobre a qual versam os autos gira em torno da aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor e de legislação correlata. 2. Aferir se houve ou não ofensa à Constituição do Brasil demandaria a análise de normas cujos preceitos estão inseridos em comandos Fosse a hipótese contrária, isto é, a possibilidade de retrotrair leis de ordem pública, deveria o legislador supremo, como fez com questões envolvendo a lei penal benéfica ao réu, excepcionar, expressamente, tal situação na própria Constituição Federal. infraconstitucionais. Agravo regimental não provido.21 Assim, não há como mapear de forma completa e integral todas as decisões do Supremo Tribunal Federal em matéria de direito do consumidor, justificando a seleção e comentário de alguns julgados pela maior repercussão criada em razão da natureza das questões enfrentadas, senão vejamos. Na mesma linha da matéria envolvendo aplicação de lei no tempo, entendeu o STF que critério de correção monetária instituído por lei não pode retrotrair para alcançar contratos de caderneta de poupança anteriormente celebrados. EMENTA: AGRAVOS REGIMENTAIS NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CADERNETA DE POUPANÇA. CORREÇÃO MONETÁRIA. MEDIDA PROVISÓRIA 32/89. CON- Selecionamos alguns julgados de interesse. TRATOS EM CURSO. INAPLICABILIDADE. ATO JURÍDICO Nos embargos de declaração interposto contra acórdão que julgou recurso extraordinário relatado pelo Min. Sepúlveda Pertence, reconheceu-se que no contrato firmado entre instituição financeira e seus clientes referente à caderneta de PERFEITO. INTANGIBILIDADE. 1. Os critérios de correção monetária introduzidos pela Medida Provisória 32/89, convertida na Lei n. 7.730/89, não podem ser aplicados aos contratos de caderneta de poupança firmados ou reno- // O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL // número 1 // primeiro semestre de 2014 64 Revista da Faculdade de Direito da Universidade São Judas Tadeu http://www.usjt.br/revistadireito/ // A Defesa do Consumidor em Face da Jurisprudência do STF // Fábio Henrique Podestá vados antes de sua edição, sob pena de violação do ato fundado na Convenção de Varsóvia. jurídico perfeito. 2. Agravos regimentais a que se nega provimento.25 Confira-se a ementa: Em outra oportunidade, o Supremo Tribunal Federal posicionou-se expressamente em favor da chamada “Teoria finalista” ao entender que os bens e serviços usados diretamente na produção de outros bens e serviços, estes últimos destinados ao consumidor final, como também no comércio internacional de produção não estão sob a incidência da lei consumerista.26 PRAZO PRESCRICIONAL. CONVENÇÃO DE VARSÓVIA E CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. 1. O art. 5º, § 2º, da Constituição Federal se refere a tratados internacionais relativos a direitos e garantias fundamentais, matéria não objeto da Convenção de Varsóvia, que trata da limitação da responsabilidade civil do transportador aéreo internacional (RE 214.349, rel. Min. Moreira Alves, DJ 11.6.99). 2. Embora válida a norma do Código de Defesa do Consumidor Cuida-se da conhecida discussão travada entre doutrinadores, entendendo que o Código do Consumidor tem aplicação ampla a todas as relações jurídicas privadas (inclusive interempresariais) sob a argumentação de que a superioridade econômica e fática de um determinado sujeito de direito que permitiu a utilização do método de contratação por adesão e a fixação unilateral das cláusulas contratuais por aquele que tenha posição mais forte, justifica o reconhecimento da vulnerabilidade nos moldes daquele microsistema. É a teoria maximalista. Para outros, a vulnerabilidade do mesmo sujeito centra-se na figura do consumidor padrão, ou seja, aquele que adquire um produto ou usufrui um serviço para uso próprio e de sua família, sendo possível a equiparação do conceito (arts. 17 e 29) somente com base em prova a ser produzida no caso concreto. Trata-se da teoria finalista.27 Por outro lado, em caso de responsabilidade civil por transporte aéreo e a questão sobre a aplicação de prazo prescricional envolvendo conflito de lei interna e tratado internacional, posicionou-se o STF pelo lapso de dois anos, quanto aos consumidores em geral, no caso específico de contrato de transporte internacional aéreo, com base no art. 178 da Constituição Federal de 1988, prevalece a Convenção de Varsóvia, que determina prazo prescricional de dois anos. 3. Recurso provido.28 Por fim, talvez o caso de maior repercussão envolveu a apreciação da ADIn 2.591, que foi julgada pelo Pleno em 7.6.2006, sendo relator o Min. Eros Grau. A questão, pela importância social que assume a atividade bancária, merecia mesmo uma apreciação definitiva por parte da mais alta Corte do País, como forma de afastar qualquer dúvida a respeito da aplicabilidade do Código do Consumidor à atividade bancária, nada obstante o texto legal expresso (art. 3º, § 2º, do CDC) e as decisões dos tribunais inferiores, inclusive por parte do STJ que editou a Súmula 297 (“O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”). Centrando-se na questão, observe-se que a Constituição // O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL // número 1 // primeiro semestre de 2014 65 Revista da Faculdade de Direito da Universidade São Judas Tadeu http://www.usjt.br/revistadireito/ // A Defesa do Consumidor em Face da Jurisprudência do STF // Fábio Henrique Podestá Federal faz duas distinções relevantes acerca da chamada ordem econômica, dedicando um capítulo relativamente extenso (arts. 170 a 191), e cuidando da denominada ordem financeira, prevendo somente um único artigo (192). Conforme já visto, a proteção ao consumidor está expressamente inserida na ordem econômica (art. 170, inc. V), como um dos princípios essenciais do ordenamento, sendo que a política monetária e cambial por outro lado, encontra-se na ordem financeira, em seu artigo 192, intitulado “Do sistema financeiro nacional”. A primeira disciplina as relações econômicas em geral e a segunda cuida do preço do dinheiro, das operações passivas e ativas, na intermediação da moeda. Nada obstante a clara distinção, certa jurisprudência, tão logo editado o Código do Consumidor, começou a manifestar entendimento no sentido de que caberia ao Poder Judiciário o poder de fixar o custo do dinheiro, a partir da interpretação conferida à norma do § 3º do art. 192 da CF (hoje revogada pela Emenda nº 40/03), a qual estipulava em 12% a taxa dos juros reais. A questão, portanto, estava afeta à ordem econômica (CDC) e não à ordem financeira (Banco Central). O próprio STF, em reiteradas oportunidades, sempre manifestou-se pela impossibilidade de autoaplicar-se o art.192, § 3º, da CF diante da ausência de lei infraconstitucional definindo o que sejam “juros reais”.29 A dúvida interpretativa sobre a aplicação, ou não, da lei consumerista ampliou-se assim que o Banco Central editou norma administrativa, consagrando um “Código de Defesa do Consumidor Bancário”, até que em 26 de dezembro de 2001, a CONSIF, Confederação Nacional das Instituições Financeiras, ajuizou a ADIn 2591 perante o STF, visando à declaração de inconstitucionalidade do art. 3º, § 2º, do CDC na seguinte locução: “inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária”. A rigor, um dos cernes da questão envolvia a suposta identificação de invasão de campo reservado à lei complementar (que à época da vigência do art.192, §3º, da CF deveria ser editada) pela referida expressão. Na verdade, a edição do Código do Consumidor e a previsão expressa de sua incidência nas relações entre instituições financeiras não teve o potencial de subtrair do Banco Central o dever de disciplinar a prestação de serviços bancários a clientes e ao público em geral, como, aliás, ocorreu com a edição da Resolução nº 2.878 de 26 de junho de 2001, por parte do Conselho Monetário Nacional, ao dispor sobre os procedimentos a serem observados pelas instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central, na contratação de operações e na prestação de serviços aos clientes e ao público em geral. Nada obstante as interpretações manifestadas pelos julgadores participantes, prevaleceu o entendimento do relator da referida ADIn, Ministro Eros Grau, declarando que a ordem econômica não se confunde com a financeira, estando excluído do conceito de serviço atividades concernentes à determinação do custo das operações ativas e da remuneração das operações passivas, praticadas pelas instituições financeiras na exploração da intermediação de dinheiro, inclusive por ser essa matéria pertinente à macroeconomia. // O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL // número 1 // primeiro semestre de 2014 66 Revista da Faculdade de Direito da Universidade São Judas Tadeu http://www.usjt.br/revistadireito/ // A Defesa do Consumidor em Face da Jurisprudência do STF // Fábio Henrique Podestá incumbe a fixação, desde a perspectiva macroeconômica, A decisão certamente preservou os direitos do consumidor em todas as operações consideradas de consumo, ficando, porém, afastadas as relações ativas e passivas concernentes ao custo do dinheiro, atribuição do Banco Central para que continue a conduzir a definição da melhor política monetária a ser seguida pelo sistema bancário. da taxa base de juros praticável no mercado financeiro. 5. O Banco Central do Brasil está vinculado pelo dever-poder de fiscalizar as instituições financeiras, em especial na estipulação contratual das taxas de juros por elas praticadas no desempenho da intermediação de dinheiro na economia. 6. Ação direta julgada improcedente, afastando-se a exegese que submete às normas do Código de Defesa do Consu- Pelo interesse do tema, transcreve-se a ementa: midor [Lei n. 8.078/90] a definição do custo das operações ativas e da remuneração das operações passivas pratica- CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. ART. 5o, XXXII, das por instituições financeiras no desempenho da inter- DA CB/88. ART. 170, V, DA CB/88. INSTITUIÇÕES FINAN- mediação de dinheiro na economia, sem prejuízo do con- CEIRAS. SUJEIÇÃO DELAS AO CÓDIGO DE DEFESA DO trole, pelo Banco Central do Brasil, e do controle e revisão, CONSUMIDOR, EXCLUÍDAS DE SUA ABRANGÊNCIA A pelo Poder Judiciário, nos termos do disposto no Código DEFINIÇÃO DO CUSTO DAS OPERAÇÕES ATIVAS E A RE- Civil, em cada caso, de eventual abusividade, onerosidade MUNERAÇÃO DAS OPERAÇÕES PASSIVAS PRATICADAS excessiva ou outras distorções na composição contratual NA EXPLORAÇÃO DA INTERMEDIAÇÃO DE DINHEIRO NA da taxa de juros. ART. 192, DA CB/88. NORMA-OBJETIVO. ECONOMIA [ART. 3º, § 2º, DO CDC]. MOEDA E TAXA DE EXIGÊNCIA DE LEI COMPLEMENTAR EXCLUSIVAMENTE JUROS. DEVER-PODER DO BANCO CENTRAL DO BRA- PARA A REGULAMENTAÇÃO DO SISTEMA FINANCEIRO. SIL. SUJEIÇÃO AO CÓDIGO CIVIL. 1. As instituições finan- 7. O preceito veiculado pelo art. 192 da Constituição do ceiras estão, todas elas, alcançadas pela incidência das Brasil consubstancia norma-objetivo que estabelece os normas veiculadas pelo Código de Defesa do Consumidor. fins a serem perseguidos pelo sistema financeiro nacional, 2. "Consumidor", para os efeitos do Código de Defesa do a promoção do desenvolvimento equilibrado do País e a Consumidor, é toda pessoa física ou jurídica que utiliza, realização dos interesses da coletividade. 8. A exigência de como destinatário final, atividade bancária, financeira e de lei complementar veiculada pelo art. 192 da Constituição crédito. 3. O preceito veiculado pelo art. 3º, § 2º, do Código abrange exclusivamente a regulamentação da estrutura do de Defesa do Consumidor deve ser interpretado em coerên- sistema financeiro. CONSELHO MONETÁRIO NACIONAL. cia com a Constituição, o que importa em que o custo das ART. 4º, VIII, DA LEI N. 4.595/64. CAPACIDADE NORMA- operações ativas e a remuneração das operações passivas TIVA ATINENTE À CONSTITUIÇÃO, FUNCIONAMENTO E praticadas por instituições financeiras na exploração da FISCALIZAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. ILE- intermediação de dinheiro na economia estejam excluídas GALIDADE DE RESOLUÇÕES QUE EXCEDEM ESSA MA- da sua abrangência. 4. Ao Conselho Monetário Nacional TÉRIA. 9. O Conselho Monetário Nacional é titular de ca- // O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL // número 1 // primeiro semestre de 2014 67 Revista da Faculdade de Direito da Universidade São Judas Tadeu http://www.usjt.br/revistadireito/ // A Defesa do Consumidor em Face da Jurisprudência do STF // Fábio Henrique Podestá pacidade normativa --- a chamada capacidade normativa 4. Conclusão. de conjuntura --- no exercício da qual lhe incumbe regular, além da constituição e fiscalização, o funcionamento das instituições financeiras, isto é, o desempenho de suas atividades no plano do sistema financeiro. 10. Tudo o quanto exceda esse desempenho não pode ser objeto de regulação por ato normativo produzido pelo Conselho Monetário Nacional. 11. A produção de atos normativos pelo Conselho Monetário Nacional, quando não respeitem ao funcio- Ao fim de todo o exposto, percebe-se a importância do direito do consumidor na atual sociedade, sobretudo diante da sua expressão maior como direito fundamental, cuja dimensão vai encontrar ideal suporte no necessário equilíbrio do mercado, nos valores sociais da livre iniciativa e na razão de ser do Direito voltada a preservar a dignidade da pessoa humana. namento das instituições financeiras, é abusiva, consubstanciando afronta à legalidade. D Notas 1. GRINOVER, Ada Pelegrini “et alii”, Código Brasileiro de defesa do Consumidor – Comentado pelos autores do anteprojeto, São Paulo/Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004, p.6. 2. OTHON SIDOU, J.M. Proteção ao consumidor. Rio de Janeiro: Forense, 1977, p.4. 3. COMPARATO, Fábio. A proteção ao consumidor na constituição brasileira de 1988, Revista de direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro, São Paulo: RT, vol.80, p.66. 4. Idem, p.5. 5. FEATHESTONE, Mike – Cultura de consumo e posmodernismo, Buenos Aires: Amorrortu Editores, p.38. 6. BAUDRILLARD, Jean, A sociedade de consumo, Lisboa: Edições 70, pp.21-22. 7. Este não é o campo próprio para debate a respeito da efetiva existência de uma fase pós-moderna na sociedade, sob pena de desvio do principal objetivo deste artigo. No entanto, somos críticos da linha denominada “pós-moderna”, especialmente porque, em países ditos de terceiro mundo, nem mesmo pode-se dizer que o projeto da modernidade tenha atingido níveis satisfatórios mínimos, sobretudo quando se percebe que a maioria da população está à margem dos benefícios conquistados pelo mundo moderno. Para uma abordagem precisa sobre os diversos campos do chamado pós-modernismo, consulte-se: ROUANET, Sérgio Paulo As razões do iluminismo, São Paulo: Companhia das Letras, 2005, p.229; GODOY, Arnaldo Sampaio de Moraes. O pós-modernismo jurídico. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 2005; LYOTARD, Jean-François. A condição pós-moderna. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 2006; HARVEY, David. La condición de la posmodernidad. Buenos Aires: Amorrortu editores, 2004. 8. BENJAMIN, Antônio Herman V. – A insurreição da aldeia global contra o processo civil clássico. Apontamentos sobre a opressão e a libertação judiciais // O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL // número 1 // primeiro semestre de 2014 68 Revista da Faculdade de Direito da Universidade São Judas Tadeu http://www.usjt.br/revistadireito/ // A Defesa do Consumidor em Face da Jurisprudência do STF // Fábio Henrique Podestá do meio ambiente e do consumidor” in Ação civil pública, Coord. Édis Milaré, São Paulo: RT, 1995, pp.79-80. 9. CAPPELLETTI, Mauro. Formações sociais e interesses coletivos diante da justiça civil. Revista de Processo, São Paulo: RT, vol.5, p.131. 10. Sobre o assunto: MANCUSO, Rodolfo de Carmargo. Interesses difusos. Conceito e legitimação para agir. São Paulo: RT, 1994, p.65, passim; MAZZILLI, Hugo Nigro. A defesa dos interesses difusos em juízo. São Paulo: RT, 1993, p.19, passim. PODESTÁ, Fábio Henrique. Interesses difusos, qualidade da comunicação social e controle judicial. São Paulo: RT, p.109, passim. 11. A chamada “justiça social” representa a dimensão coletiva do princípio da dignidade de pessoa humana, ou seja, Não basta alguém possuir digna existência se aquele que está ao lado não possui dignidade alguma. Por isso que a justiça social está relacionada com a correção das grandes distorções que ocorrem numa sociedade, diminuindo distâncias e diferenças entre as diversas classes que a constituem, favorecendo os mais humildes. Evitar que os ricos se tornem cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres e oferecer idênticas oportunidades a todos constituem variações semânticos do termo sob comento (PETTER, Lafayete José. Princípios constitucionais da ordem econômica. São Paulo: RT, 2005, p.181). 12. PINHEIRO, Armando Castelar e SADDI, Jairo. Direito, economia e mercados. São Paulo: Elsevier, 2-006, p.396. 13. Sobre o assunto, nossa Tese de Doutorado defendida perante a USP no presente ano intitulada: “O princípio da confiança na teoria contratual”, 2007. 14. FORGIONI, Paula A. Os fundamentos do direito antitruste. São Paulo: RT, 1998, p.170. 15. IRTI, Natalino. L´ordine giuridico del mercato. Roma-Bari: Editori Laterza, 2004, pp.108-109. 16. Afirmamos “equivocadamente” porque não é o consumidor que é equiparado, mas o conceito que dele se reconhece pela dicção legal do art.2º. 17. Sobre o assunto a recente obra de SODRÉ, Marcelo Gomes. Formação do sistema nacional de defesa do consumidor, São Paulo: RT, 2006. 18. MARQUES, Cláudia Lima. Três tipos de diálogos entre o Código de Defesa do Consumidor e o Código Civil de 2002: Superação das antinomias pelo ‘dialogo das fontes’. In Código de Defesa do Consumidor e o Código Civil de 2002. Coord. Roberto A. C. Pfeiffer e Adalberto Pasqualotto, São Paulo: RT, 2005. 19. COUTO E SILVA, Clóvis V. do. A obrigação como processo. São Paulo: Bushatsky, 1976; SILVEIRA, Alípio. A boa-fé Código Civi”, São Paulo: s.ed., 1972 e MOTA PINTO, Carlos Alberto da. Cessão da posição contratual. São Paulo: Saraiva, 1985. Anote-se que apesar da menção expressa no Código Comercial, pouca atenção conferia-se ao referido princípio. 20. Por evidente que o ponto não se limita a uma abordagem exclusivamente jurídica. Há implicações econômicas que também devem ser consideradas. Sobre o assunto, consulte-se PINHEIRO, Armando Castelar e SADDI, Jairo. Ob.cit. p.41, passim. 21. AI-AgR 554810 / RJ - RIO DE JANEIRO. AG.REG.NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. Relator: Min. EROS GRAU. Julgamento: 14/03/2006.Órgão Julgador: Primeira Turma 22. RE-ED 395384 / PR – PARANÁ; EMB.DECL.NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. Julgamento: 26/04/2007.Órgão Julgador: Primeira Turma. No mesmo sentido: RE 205.999, 16.11.99, Moreira, RTJ 173/263. 23. De acordo com a doutrina: “Costuma-se dizer que as leis de ordem pública são retroativas. Há uma distorção de princípio nesta afirmativa. Quando // O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL // número 1 // primeiro semestre de 2014 69 Revista da Faculdade de Direito da Universidade São Judas Tadeu http://www.usjt.br/revistadireito/ // A Defesa do Consumidor em Face da Jurisprudência do STF // Fábio Henrique Podestá a regra da não-retroatividade é de mera política legislativa, sem fundamento constitucional, o legislador, que tem o poder de votar leis retroativas, não encontra limites ultralegais à sua ação, e, portanto, tem a liberdade de estatuir o efeito retrooperante para a norma de ordem pública, sob o fundamento de que esta se sobrepõe ao interesse individual. Mas, quando o princípio da não-retroatividade é dirigido ao próprio legislador, marcando os confins da atividade legislativa, é atentatória da constituição a lei que venha ferir direitos adquiridos, ainda que sob inspiração da ordem pública. A tese contrária encontra-se defendida por escritores franceses ou italianos, precisamente porque, naqueles sistemas jurídicos, o princípio da irretroatividade é dirigido ao juiz e não ao legislador” (PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil, Rio de Janeiro: Forense, 20ª ed., 2004, p.162). 24. “(...) de interesse social significa, em termos práticos, que o MP terá participação obrigatória em todas as ações coletivas sobre lides de consumo, encontrando-se legitimado para defender, em juízo, os direitos individuais homogêneos (CDC 81, Par. Un. III) do consumidor, pois como são de interesse social ex lege (CDC 1º), essa defesa atende a finalidade institucional do MP (CF 127 caput), como autorizado pela CF 129 IX. V. Nery, DC 3/52. As ações coletivas ((CDC 81, Par. Un.; 91 e ss; LACP) foram criadas pela lei em razão do interesse público e social. A falta de previsão constitucional expressa para a defesa coletiva, pelo MP, dos direitos individuais homogêneos (CF 129 III), ocorreu também porque a categoria foi criada por lei posterior (CDC 81 Par. Un. III), mas a legitimação do MP está assegurada pela autorização da CF 129 IX, que permite à lei federal, a atribuição ao MP de outras funções que sejam compatíveis com sua finalidade institucional. Como a defesa coletiva de interesses sociais, como o são os do consumidor (CDC 1º), é função institucional do MP (CF 127 caput), a legitimação dada ao parquet pelo CDC 82, para a tutela em juízo dos direitos individuais homogêneos, está em perfeita consonância com o sistema constitucional brasileiro.” (NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Novo código civil e legislação extravagante anotados. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 719.) 25. RE-AgR 423838 / SP - SÃO PAULO.AG.REG.NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. Relator(a): Min. EROS GRAU.Julgamento: 24/04/2007.Órgão Julgador: Segunda Turma 26. Cuida-se da Sentença Estrangeira Contestada nº 5.847-1, j. 01.12.1999, Relator: Min. Maurício Corrêa, publicada integralmente na “Revista de Direito do Consumidor”, vol. 34, pp.253-263. 27. Ver por todos, MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: RT, 5ª ed., 2006, p.372, passim. 28. RE 297901 / RN - RIO GRANDE DO NORTE.RECURSO EXTRAORDINÁRIO. Relator(a): Min. ELLEN GRACIE. Julgamento: 07/03/2006.Órgão Julgador: Segunda Turma 29. EMENTA: Recurso Extraordinário. Agravo Regimental. 2. Juros. Art.192, § 3º, da Constituição Federal. Não-auto-aplicabilidade. Precedentes desta Corte. 3. Questão referente à multa contratual dirimida pelo STJ, em sede de recurso especial. Matéria de natureza infraconstitucional. 4. Agravo Regimental a que se nega provimento.RE-AgR.351401/RS-RIO GRANDE DO SUL AG.REG.NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO.Relator(a):Min.GILMAR MENDES Julgamento: 18/02/2003. Órgão Julgador: Segunda Turma. A questão já tinha sido apreciada anteriormente pelo Min. Sidney Sanches na ADIn 4-DF. 70 // O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL // número 1 // primeiro semestre de 2014