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Carta Aberta ao Sr. Henrique Eduardo Alves, Presidente da Câmara dos Deputados do
Congresso Nacional do Brasil
Henrique Eduardo Alves
Presidente da Câmara dos Deputados do Congresso Nacional do Brasil
Praça dos Três Poderes - Câmara dos Deputados
Gabinete 539 – Anexo IV
CEP 70160-900 - Brasília – DF
Brasil
[email protected]
Prezado Sr. Henrique Eduardo Alves,
Gostaríamos de expressar, por meio desta, nossa profunda preocupação com a eleição do Sr. Marco
Feliciano à presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM) dessa Câmara dos
Deputados (Câmara dos Deputados), realizada em 7 de março de 2013. A CDHM é responsável por
atividades essenciais para a proteção dos direitos humanos e para a igualdade das minorias no Brasil.
Entretanto, o Sr. Feliciano tem repetidamente dado declarações públicas de cunho discriminatório contra
homossexuais e, também, racistas, o que conflita com tais importantes atividades. Por essa razão,
pedimos respeitosamente que seja assegurado que as crenças pessoais do Sr. Feliciano não coloquem em
risco os direitos humanos e a igualdade de minorias no Brasil.
Como parte de uma das maiores autoridades legislativas do Brasil, 1 a CDHM tem o poder de proteger os
direitos humanos e assegurar a igualdade de tratamento de minorias do país. 2 Com isso, a CDHM auxilia
o Brasil no cumprimento de seus compromissos internacionais em matéria de direitos humanos, como,
por exemplo, a Declaração Conjunta para a Extinção de Atos de Violência e de Violações de Direitos
Humanos Baseados em Orientação Sexual e Identidade de Gênero 3 e a Convenção Internacional sobre a
Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial. 4
Considerando a grande importância da CDHM, lamentamos o fato de que o seu recém-eleito Presidente
aparentemente não compartilha da dedicação aos direitos humanos que o Governo brasileiro tantas vezes
demonstrou. O Brasil foi, por exemplo, um dos primeiros países a incentivar o debate na Organização
das Nações Unidas sobre questões de orientação sexual quando propôs a chamada “Resolução
Brasileira” ao Conselho Econômico e Social das Nações Unidas em 2003. 5
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Os artigos 44 e 45 da Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988, estabelecem a Câmara
dos Deputados como a casa representativa do povo brasileiro no Congresso Nacional, enquanto a outra casa, o Senado
Federal, representa os Estados brasileiros.
Artigo 32, Inciso VII, do Regimento Interno da Câmara dos Deputados, aprovado pela Resolução n º 17, de 21 de
setembro de 1989.
Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, Declaração Conjunta para a Extinção de Atos de Violência e de
Violações de Direitos Humanos Baseados em Orientação Sexual e Identidade de Gênero, de 22 de março de 2011.
Assembleia-Geral das Nações Unidas, Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de
Discriminação Racial, de 21 de dezembro de 1965.
Conselho Econômico e Social das Nações Unidas, Resolução E/CN.4/2003/L.92, Promoção e Proteção dos Direitos
Humanos, de 17 de abril de 2003.
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Adicionalmente, meios de comunicação brasileiros e internacionais têm anunciado que o Sr. Feliciano
tem regularmente dado declarações públicas homofóbicas e racistas. 6 Exemplificativamente, foi relatado
que o Sr. Feliciano declarou que “a podridão dos sentimentos dos homoafetivos leva ao ódio, ao crime e
à rejeição” e, também, que “[a]fricanos descendem de ancestral amaldiçoado", entre outras declarações
preconceituosas. 7 Não compreendemos como a CDHM protegerá adequadamente os direitos de lésbicas,
gays, bissexuais e transgêneros (LGBT) brasileiros, bem como de brasileiros descendentes de povos
africanos, se for liderada por um Presidente com um ponto de vista tão preconceituoso.
Ademais, o Sr. Feliciano decidiu realizar as reuniões da CDHM a portas fechadas (um fato sem
precedentes no atual Estado Democrático de Direito do Brasil), ameaçando, com isso, a imparcialidade e
a transparência do processo legislativo dos direitos humanos e minorias no Brasil. A Seção de São Paulo
da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP) afirmou que “[e]sse cerceamento remete a tempos
obscuros e arbitrários de nossa história política, onde os direitos humanos somente podiam ser
discutidos a portas fechadas". 8 A OAB-SP também afirmou que não estão claros “os motivos que levam
a Câmara Federal a proteger um parlamentar sem qualquer representatividade na área dos Direitos
Humanos". 9
Além disso, a eleição de um Presidente parcial para a CDHM envia uma mensagem errada para a
comunidade internacional, especialmente no momento em que o Brasil foi recentemente eleito para o
Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas. 10 Essa eleição traz grandes obrigações, entre as
quais destacamos: "[M]embros eleitos para o Conselho deverão pautar-se pelos mais altos padrões de
promoção e proteção de direitos humanos . . . e serão revisados de acordo com o mecanismo de revisão
periódica universal". 11
Consistente com essa ideia, a Alta Comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos afirmou
que a "falha de autoridades do Estado em investigar e punir . . . [a violência motivada pelo ódio contra
pessoas LGBT] . . . é uma violação da obrigação estatal de proteger os direitos à vida, à liberdade e à
segurança pessoal, como garante o artigo 3 da Declaração Universal dos Direitos Humanos e os artigos
6 e 9 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos". 12
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http://www.guardian.co.uk/world/2013/apr/05/brazil-equality-body-homophobia-racism;
http://www.huffingtonpost.com/huff-wires/20130404/lt-brazil-human-rights/?utm_hp_ref=homepage&ir=homepage;
http://g1.globo.com/politica/noticia/2013/03/pastor-contrario-lei-anti-homofobia-e-indicado-para-comissao-nacamara.html; http://veja.abril.com.br/noticia/brasil/marco-feliciano-outro-deputado-contra-gays-e-negros;
http://oglobo.globo.com/politica/deputado-federal-marco-feliciano-faz-coro-as-declaracoes-de-bolsonaro-ataca-negroshomossexuais-2802944.
7 http://www.sedentario.org/artigos/o-pastor-deputado-federal-e-agora-presidencia-da-comissao-dos-direitos-humanosmarco-feliciano-pedindo-dinheiro-a-fieis-na-assembleia-de-deus-61916;
http://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2011/03/31/deputado-federal-diz-no-twitter-que-africanosdescendem-de-ancestral-amaldicoado.htm.
8 http://www.conjur.com.br/2013-abr-05/oab-sp-repudia-fechamento-sessoes-comissao-direitos-humanos.
9 Ibid.
10 http://www.un.org/en/ga/67/meetings/elections/hrc.shtml.
11 Assembleia Geral das Nações Unidas, Resolução 60/251 – Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, de 15 de
março de 2006.
12 Escritório do Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Nascidos Livres e Iguais - Orientação
Sexual e Identidade de Gênero no Regime Internacional de Direitos Humanos, de 22 de março de 2011.
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Ainda, a Organização dos Estados Americanos “incentiva os [E]stados membros a considerarem . . .
adotar políticas públicas contra a discriminação por motivo de orientação sexual e identidade de gênero"
e, como um Estado membro, o Brasil deveria atentar-se para tal recomendação. 13
Contudo, a aparente função do Sr. Feliciano na CDHM é exatamente a de ameaçar determinadas leis de
direitos humanos e minorias, principalmente em relação aos direitos LGBT. 14 A atitude do Sr. Feliciano
é especialmente preocupante pelo fato de que, nos últimos anos, o Brasil tem realizado louváveis
progressos no sentido de proteger os direitos humanos e garantir a igualdade de minorias, incluindo seus
cidadãos LGBT. Esse importante avanço é ameaçado com a eleição de um Presidente para a CDHM
que, publicamente, faz declarações preconceituosas.
O mundo está testemunhando um momento histórico na esfera dos direitos humanos de cidadãos LGBT.
Países vizinhos ao Brasil estão avançando, cada vez mais, contra a discriminação baseada em orientação
sexual e identidade de gênero (como, por exemplo, legalizando o casamento de pessoas do mesmo sexo)
e o Brasil não deve retroagir nesse contexto. As autoridades brasileiras não deveriam tolerar nem o
menor indício de que o indivíduo a quem foi conferida a tarefa de proteger os direitos humanos e as
minorias tem, na verdade, crenças exatamente contrárias àquelas que ele deve proteger. Estamos, com
isso, preocupados que um país tão tolerante como o Brasil esteja tomando uma posição de retrocesso no
âmbito da proteção de direitos humanos e minorias.
Tendo em vista as potenciais implicações adversas da eleição do Sr. Feliciano, respeitosamente
solicitamos que V. Sa. oriente o Congresso Nacional do Brasil no sentido de iniciar uma profunda
investigação de todas as atividades realizadas por ele como Presidente da CDHM e supervisionar
quaisquer de suas atividades nesse cargo no futuro, de modo a assegurar que suas crenças pessoais não
prejudicarão a proteção dos direitos humanos ou de minorias no Brasil. Adicionalmente, solicitamos que
seja garantida a transparência na proteção dos direitos humanos e das minorias no Brasil, fazendo com
que qualquer conclusão resultante de tal investigação e/ou fiscalização seja colocada à disposição do
público em geral e, ainda, não permitindo a realização das reuniões da CDHM a portas fechadas.
Finalmente, pedimos que sejam tomadas quaisquer outras medidas legislativas adicionais necessárias
para assegurar a adequada proteção dos direitos humanos e de minorias no Brasil.
Atenciosamente,
Columbia Law School
Sexuality and Gender Law Clinic
Cornell Law School
Advocacy for LGBT Communities Clinic
University of Miami School of Law
Human Rights Clinic
13 Organização dos Estados Americanos, Resolução 2653 (XLI-O/11), Direitos Humanos, Orientação Sexual e Identidade
de Gênero, de 7 de junho de 2011.
14 http://www.senado.gov.br/noticias/opiniaopublica/inc/senamidia/notSenamidia.asp?ud=20130401&datNoticia=
20130401&codNoticia=818383&nomeOrgao=&nomeJornal=Correio+Braziliense&codOrgao=47&tipPagina=1
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