A ESTAÇÃO DA AMEIXOEIRA DO METROPOLITANO DE LISBOA. ANÁLISE DO COMPORTAMENTO Joaquim Barreto1; Daniel Dias2 & Luís Ribeiro e Sousa3 Resumo – Nesta comunicação apresenta-se a extensão da Linha Amarela do Metropolitano de Lisboa, entre Campo Grande e Odivelas, onde estão em construção cinco estações. Uma delas, a estação Ameixoeira, constitui uma obra de grande interesse, dada a sua configuração geométrica e por ser integralmente subterrânea. Apresentam-se resultados mais relevantes relacionados com a caracterização geotécnica das formações, bem como resultados de observação da obra. Foram, ainda, efectuadas análises numéricas tridimensionais recorrendo ao software FLAC-3D, sendo alguns resultados comparados com os obtidos por observação. Abstract – In this communication the Lisbon Metro Yellow Line extension between Campo Grande and Odivelas is described, where five stations are now in construction. Among them special emphasis is done to the Ameixoeira station, a very important underground structure due to its geometrical configuration. Some of the most relevant studies related to the geotechnical characterization of the different formations as well as some relevant monitoring results are presented. 3D numerical analyses using the software FLAC-3D are presented, being some numerical and monitoring results compared. Palavras-Chave – Obras Subterrâneas, Observação, modelos numéricos. Introdução O prolongamento da Linha Amarela entre o Campo Grande e Odivelas tem uma extensão de cerca de 5km, incluindo cinco novas estações (Quinta das Mouras, Lumiar, Ameixoeira, Senhor Roubado e Odivelas), cerca de 2,7km de túnel construído com uma máquina TBM EBS, dois túneis construídos segundo o designado método NATM com cerca de 0,8km de comprimento, dois viadutos com a extensão aproximada de 1,1km e um túnel terminal em Odivelas. Na Figura 1 apresenta-se a rede do Metropolitano de Lisboa e a expansão da Linha Amarela na direcção da cidade de Odivelas. Na Figura 2, indica-se um trecho da extensão, onde se localiza o poço de ataque que permitiu o início de escavação do túnel em escudo [1]. Figura 1. Rede do Metropolitano de Lisboa 1 Figura 2. Estação Ameixoeira Metropolitano de Lisboa, Av. Barbosa du Bucage, [email protected] INSA-Lyon, URGC Geotechnique, 69621 Villeurbanne Cedex, França, [email protected] 3 Laboratório Nacional de Engenharia Civil, Av. do Brasil, 101, 1700-066 Lisboa, [email protected] 2 O traçado da extensão desenvolve-se em meio urbano densamente construído, como se ilustra na Figura 2. A obra iniciou-se em 1999 com a execução do poço de ataque. Para além das estruturas já referidas, assinalam-se, ainda: Dois poços de ventilação, sendo o poço de ventilação nº 1 localizado entre as Estações Quinta das Mouras e Lumiar e o poço de ventilação 2 entre as Estações do Lumiar e da Ameixoeira. O poço de extracção que possui uma secção aproximadamente rectangular, para retirada da TBM. Várias interferências que correspondem a situações de risco susceptíveis de induzir problemas nas infraestruturas existentes à superfície, que obrigaram à execução de obras preventivas de reforço de forma a evitar as referidas situações. Nesta comunicação, apresenta-se a estação Ameixoeira, que constitui uma obra relevante, dada a sua configuração geométrica e por ser integralmente subterrânea. Apresentam-se resultados mais relevantes relacionados com a caracterização geotécnica das formações, bem como resultados de observação da obra. Foram, ainda, efectuadas análises numéricas tridimensionais por utilização do software FLAC-3D, sendo alguns resultados comparados com os obtidos por observação. ESTAÇÃO AMEIXOEIRA Integrado na estação Ameixoeira, foi executado um poço circular de grande dimensões, com cerca de 40,2m de diâmetro e cerca de 22m de profundidade. O poço foi executado de forma sequencial, sendo a espessura do suporte de variável em função da profundidade O suporte é constituído por betão projectado sobre malha electrossoldada [2]. O poço central servirá para abrigar as áreas de circulação dos utilizadores, bem como instalações várias (salas técnicas, condutas de ventilação, elevadores, escadas mecânicas e outros equipamentos electromecânicos). A localização do poço em planta está indicada na Figura 3. Figura 3. Estação da Ameixoeira. Localização do poço Por razões de planeamento, o túnel em escudo, executado por uma tuneladora Lovat, modelo ME386SE do tipo TBM EPB, ou seja uma tuneladora com confinamento por contrapressão de terras atravessou a zona da estação [3]. A execução das galerias correspondentes à nave da estação foi efectuada em redor deste túnel por um processo sequencial, com reforço do interior do túnel por perfilados metálicos e posterior demolição das aduelas de betão (Figura 4). Realçase, ainda, o facto de que existem na vizinhança alguns edifícios de grande porte, nomeadamente um edifício com 17 andares e 2 caves, conforme indicado na Figura 4. A Figura ilustra fotografias da obra ainda em fase de construção. A ocorrência de camadas arenosas, bem como um nível de água elevado, levou a que fossem efectuadas obras de drenagem do maciço, quer através do túnel em escudo onde se executaram furos subhorizontais e subverticais drenando a área envolvente das galerias. No poço foram efectuadas sistematicamente drenagens subhorizontais com drenos curtos. Previu-se, também, a utilização de ponteiras drenantes para reforço da drenagem do maciço. Figura 4. Poço de ataque, galerias e edifício de grande porte Figura 5. Fotografias da obra CARACTERIZAÇÃO GEOLÓGICA E GEOTÉCNICA No que respeita ao perfil geológico da zona da estação, foram localizados quatro estratos na sequência das sondagens efectuadas e após a escavação do poço (Figura 6). O primeiro estrato é composto por Argila do Forno de Tijolo, com uma espessura de cerca de 8m, constituídas por solos argilosos, margas e grés, argilosos e micáceos, de tons escuros, a que se segue uma camada de Calcários de Entre-Campos, com cerca de 10m de espessura, isto é, um calcário margoso, cinzento esverdeado coberto por camadas de areia seguidas por bancadas de calcário, menos compactas. Em baixo deste estrato, encontram-se Areolas da Estefânea, com 13m de espessura, constituídas por grés, calcários, areias argilosas, finas, micáceas, areias e grés argilosos. Na última formação, designada Argilas e Calcários dos Prazeres, podem encontrar-se calcários gregosos, argilas esverdeadas ou azul esverdeadas e, ainda, areias micáceas. A campanha de prospecção geotécnica envolveu a realização de sondagens geotécnicas (numeradas de S24 a S32) e de um furo S28A que permitiu a realização de ensaios com pressiómetro auto-perfurador. Os ensaios in situ efectuados compreenderam a realização de ensaios de penetração dinâmica SPT, ensaios com pressiómetro Ménard, para além dos referidos ensaios com pressiómetro auto-perfurador, da responsabilidade do LNEC [4]. Efectuaram-se, ainda, ensaios em laboratório, que envolveram nomeadamente: análise granulométrica; determinação de limites de consistência de Atterberg; determinação do teor em humidade natural; peso específico das partículas; peso volúmico; determinação em sulfatos; resistência à compressão simples; ensaio edométrico; e ensaio triaxial do tipo não drenado com consolidação. Figura 6. Perfil geotécnico de uma secção transversal INSTRUMENTAÇÃO E OBSERVAÇÃO DA ESTAÇÃO Foi implementado um plano de observação de forma a permitir a observação do comportamento do maciço envolvente da estação, bem como das infra-estruturas existentes à superfície, nas quais se integram alguns edifícios de grande porte. Na Figura 3, representam-se em planta algumas secções principais de observação, bem como alguns dos aparelhos instalados. As deformações superficiais são controladas por nivelamento geométrico de marcas superficiais. O controlo de deslocamentos horizontais e verticais no interior do maciço é feito através de inclinómetros e extensómetros localizados próximos das escavações e dos edifícios na vizinhança da obra. Para controlo de deslocamentos em edifícios, foram instalados alvos nas fachadas dos edifícios. No interior das galerias e do poço, efectuam-se medições de convergências utilizando métodos ópticos. Complementando esta instrumentação, foram também instalados piezómetros para controlo dos níveis freáticos. Foram estabelecidos critérios de alerta para os assentamentos à superfície, com base no uso de critérios empíricos e semi-empíricos e de modelos numéricos. Outros critérios seguidos para outros deslocamentos foram estabelecidos com base na análise das curvas deslocamento-tempo, na comparação sistemática entre os resultados obtidos em distintas secções de observação e na análise de modelos numéricos. Na Figura 7, apresentam-se gráficos de convergências no interior da galeria, zona da abóbada, para a secção S2a, situada do lado do Campo Grande. Iniciaram-se as leituras em 23 de Abril de 2002. As maiores convergências registamse na corda horizontal como era de prever, atingindo-se um valor máximo de cerca de 1cm. Após a escavação da abóbada do tecto, regista-se uma tendência para a estabilização mesmo com uma ligeira diminuição na corda subhorizontal. O nível de alerta da corda horizontal para a abóbada era de 17,5mm, valor que não chegou a ser atingido. Na Figura 8, representam-se deslocamentos horizontais acumulados no inclinómetro 2, situado entre as secções S2a e S3A, localizadas na galeria oposta. A direcção X é normal ao eixo da galeria, sendo a outra direcção ortogonal. As deformações não são importantes, situando-se os seus valores dentro da margem de erro do aparelho. MODELO NUMÉRICO 3D Para estudo do comportamento deformacional da estação Ameixoeira durante a sua construção, foi elaborado pelo INSA-Lyon em colaboração com o LNEC um modelo 3D com base no uso do programa FLAC3D [5]. O modelo utilizado abrange um domínio assinalado na Figura 8, sendo a discretização indicada na Figura 9 incluindo já a escavação do túnel em escudo. Contém 38850 zonas (elementos) e 2370 elementos estruturais de casca para simulação dos suportes de betão projectado nas galerias e no poço. Refere-se, ainda, o desenvolvimento de um modelo axissimétrico para a zona do poço [2]. Os parâmetros geomecânicos adoptados no cálculo estão indicados na Tabela 1. Final da escavação da abóbada 1 2 C1- C13 C2-3 2 3 C4-5 4 5 C6-7 CORDA 1-2 CORDA 1-3 CORDA 3-2 CORDA 4-5 CORDA 6-7 Figura 7. Convergências na secção S2a Acumulado (mm) -15 -7,5 0 7,5 0 Dep. Sup. e Aterro -5 Argilas e Siltes -10 -15 Acumulado (mm) 15 -15 -7,5 0 7,5 0 LEGENDA 0 Dep. Sup. e Inicial 7 mai2002 Aterro 16 mai2002 21 mai2002 -5 -5 Argilas e 7 jun2002 19 jun2002 Siltes -10 21 jun2002 -10 24 jun2002 26 jun2002 -15 -15 Argilas siltosas -20 Elev. (m) -25 15 0 -5 -10 -15 Argilas siltosas -25 -20 Elev. (m) -25 -30 -30 -30 -30 -35 -35 -35 -35 -40 -40 -40 -20 Areias Siltosas/ argilosas Argilas e Siltes margosos -45 -45 -20 Areias Siltosas/ argilosas Argilas e Siltes margosos -45 -25 -40 -45 skew = 48deg -15 -7,5 0 7,5 15 -15 -7,5 0 7,5 Desvio Acumulado Desvio Acumulado Direcção Y Direcção X Figura 8. Deslocamentos medidos no inclinómetro 2, secção S3a/S2a 15 2-Jul 27-Jun 7 22-Jun 17-Jun 12-Jun 7-Jun 2-Jun 28-Mai 23-Mai 18-Mai 13-Mai 8-Mai 28-Abr 3-Mai 6 23-Abr Deslocamentos ( mm ) CORDAS - HISTÓRICO 13,0 12,0 11,0 10,0 9,0 8,0 7,0 6,0 5,0 4,0 3,0 2,0 1,0 0,0 -1,0 -2,0 -3,0 -4,0 Figura 9. Domínio considerado na análise do modelo 3D Figura 10. Discretização do modelo 3D com escavação do túnel em escudo Material Argilas Forno do Tijolo Calcários de Entre-Campos Areolas da Estefânea Argilas e Calcários dos Prazeres Betão projectado Tabela 1. Parâmetros adoptados no cálculo E (MPa) ν γ (kN/m3) 85 0,35 20,5 500 0,35 20,5 110 0,35 20,0 250 0,35 20,0 15 000 0,25 24,0 k0 0,8 0,8 0,8 0,8 - C’ (kPa) 70 100 20 250 - φ’ (º) 35 39 35 30 - O faseamento de cálculo foi o seguinte: 1. Escavação do túnel em escudo em 90m, numa só sequência e considerando um desconfinamento de 20%, valor médio obtido em análises efectuadas considerando valores observados à superfície e a metodologia apresenta no trabalho de Vieira et al. [3]. 2. Colocação do suporte de betão do túnel em escudo e libertação dos restantes 80% das forças resultantes da libertação de tensões. 3. Escavação do poço até à cota a 15m do eixo do túnel, com colocação do respectivo suporte. 4. Escavação do poço até à cota a 6,5m do eixo do túnel, com colocação do respectivo suporte. 5. Escavação das naves da estação com sequências de escavação de 3 em 3m até ao final das galerias e conforme a sequência construtiva indicada na Figura 11. Apresentam-se, na Figura 12, deslocamentos totais calculados no final da simulação do processo construtivo. Os deslocamentos obtidos à superfície revelaram alguns empolamentos, devidos provavelmente à discretização utilizada e à simulação do processo construtivo de escavação do poço. Os valores finais calculados de convergências para a Secção 2a e para as cordas horizontais, indicadas na Figura 6, foram os seguintes: i) corda superior C23 – 11,5mm; ii) corda intermédia C45 – 21,6mm; e iii) corda inferior C67 – 17,0mm. Como se pode constatar para a corda C23, o valor máximo observado foi de cerca de 10mm, portanto dentro da ordem de grandeza do valor calculado. Figura 11. Sequência de construção das galerias adoptada no modelo Contour of Z-Displacement -8.0606e-003 to 0.0000e+000 0.0000e+000 to 5.0000e-003 5.0000e-003 to 1.0000e-002 1.0000e-002 to 1.5000e-002 1.5000e-002 to 2.0000e-002 2.0000e-002 to 2.5000e-002 2.5000e-002 to 3.0000e-002 3.0000e-002 to 3.3292e-002 Interval = 5.0e-003 Figura 12. Deslocamentos no final da escavação da estação CONCLUSÃO Nesta comunicação, apresentou-se a Estação Ameixoeira, uma obra ainda em construção para a extensão da Linha Amarela do Metropolitano de Lisboa. Apresentaram-se resultados mais relevantes relacionados com a caracterização geotécnica das formações, bem como resultados de observação da obra. Os resultados obtidos com um modelo sofisticado 3D têm permitido uma aferição mais realista dos valores observados. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem ao Metropolitano de Lisboa a autorização para publicar dados referentes à expansão da Linha Amarela – Campo Grande/Odivelas. O trabalho foi realizado ao abrigo do programa POCTI, projecto Concepção, Projecto e Reabilitação de Túneis em Obras Viárias. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS [1] [2] [3] [4] [5] Melâneo, F. (2001). Prolongamento da Linha Amarela do Metropolitano de Lisboa. O projecto, as obras e a minoração das interferências à superfície. Curso da SPG sobre Túneis em Meios Urbanos, Coimbra. Sousa, R.L.; Melâneo, F. (2002). Metropolitano de Lisboa. Experiência na construção de poços circulares de grande diâmetro. 1º Congresso Luso-Brasileiro de Geotecnia, São Paulo. Vieira, A.; Marcelino, J.; Barreto, J.; Sousa, L.R. (2002). Análise numérica do comportamento de estruturas na estação Lumiar do Metropolitano de Lisboa. 8º Congresso Nacional de Geotecnia, Lisboa, pp. 2665-2679. Geocontrole (1999). Estação Ameixoeira. Reconhecimento geológico-geotécnico. Gabinete de Geotecnia e Topografia, Lda., Lisboa. FLAD3D (1999). Fast Lagrangean Analysis of Continua in 3 Dimensions. Version 2.0. User’s Manual , Itasca Consulting Group, Minneapolis, Minnesota.