ANAIS do XII EPEM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA NO CONTEXTO DAS PROPOSTA DO ENSINO INTEGRADO: PROJETOS E POLÍTICAS 1, 2 e 3 de maio de 2014 ISBN 978-85-98092-16-4 VOLUME 1 IFSP-SP - BIRIGUI –SP 2014 Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo Campus Birigui ANAIS do XII EPEM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA NO CONTEXTO DAS PROPOSTA DO ENSINO INTEGRADO: PROJETOS E POLÍTICAS Organizadores Profa Dra. Luciane de Castro Quintiliano Profa Dra. Zionice Garbelini Martos Rodrigues Prof. Me. Adriano de Souza Marques Realização Apoio FICHA CATALOGRÁFICA E46a Encontro Paulista de Educação Matemática (12 : 2014 : Birigui). Anais do XII Encontro Paulista de Educação Matemática, 2 e 3 de maio de 2014 / organizado por Zionice Garbelini Martos Rodrigues, et al. - Birigui : SBEM-SP : IFSP, 2014. E-Book. ISBN: 978-85-98092-16-4 1. Educação Matemática - Congresso. 2. Pesquisa em Matemática. 3. Iniciação científica. I. Sociedade Brasileira de Educação Matemática. II. Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo – Campus Birigui. III. Título CDD 510.07 COMISSÃO ORGANIZADORA (SBEM-SP) Eliane Matesco Cristovão Nelson Antonio Pirola COMISSÃO ORGANIZADORA (LOCAL) Docentes Allan Victor Ribeiro (IFSP – Birigui) Ana Paula Ximenes Flores (IFSP – Birigui) Andréia de Alcântara Cerizza (IFSP – Birigui) Jessé Valério de Paula (IFSP – Birigui) Luciane de Castro Quintiliano (IFSP – Birigui) Lidiane Ap. Longo e Garcia Gonçalves (IFSP – Birigui) Luiz Fernando da Costa Zonetti (IFSP – Birigui) Manuella Aparecida Felix de Lima (IFSP – Birigui) Régis Leandro Braguim Stábile (IFSP – Birigui) Zionice Garbelini Martos Rodrigues (IFSP – Birigui) COMISSÃO CIENTÍFICA Comissão Editorial (SBEM-SP) Dario Fiorentini (Unicamp – Campinas) Edna Maura Zuffi (USP - São Carlos) Marisa da Silva Dias (UNESP – Bauru) Miriam Cardoso Utsumi (USP – São Carlos) Saddo Ag. Almouloud (PUC –SP) Zionice Garbelini Martos Rodrigues (IFSP - Birigui) Comissão Editorial (Local) Allan Victor Ribeiro (IFSP - Birigui) Jessé Valério de Paulo (IFSP - Birigui) Luciane de Castro Quintiliano (IFSP - Birigui) Zionice Garbelini Martos Rodrigues (IFSP - Birigui) Pareceristas Conceição Aparecida Cruz Longo Cristiane Alexandra Lazaro (UNESP – Bauru) Emília de Mendonça Rosa Marques (UNESP- Bauru) Érica Valéria Alves (UNEB - Bahia) Fernanda Aparecida Ferreira (CEFET - Belo Horizonte) Ivete Baraldi (UNESP - Bauru) José Roberto Giardinetto (UNESP - Bauru) Jurandyr Carneiro de Lacerda Neto (IFSP - Araraquara) Liliane Neves Inglez Souza (UNIP – Limeira) Luis Américo Monteiro Júnior (IFSP - Caraguatatuba) Marcelo Carlos de Proença (UEM – Maringá) Márcio Pironel (IFMG - Formiga) Maria Ednéia Martins Salandim (UNESP – Bauru) Marta Santana Comério (UNICAMP– Campinas) Maria José da Silva Fernandes (UNESP - Bauru) Milene Machado (UNICAMP – Campinas) Miriam Godoy Penteado (UNESP – Rio Claro) Moacir Pereira de Souza Filho (UNESP – Presidente Prudente) Norma Sueli Gomes Allevato (UNICSUL) Odalea Ap. Vianna- (UFU – Uberlândia) Rogério Marques Ribeiro (IFSP – Guarulhos) Silvia Regina Quijadas Aro Zuliani (UNESP - Bauru) Silvia Viel (FACEF – Franca) Silvia Regina Vieira da Silva (UNESP – Ilha Solteira) Sueli Liberatti Javaroni (UNESP - Bauru) Telma Assad Mello (UNICAMP –Campinas) Índice SOBRE O EPEM .................................................................................................................. 12 COMUNICAÇÕES CIENTÍFICAS ............................................................................................ 16 EIXO TEMÁTICO: E1 - AVALIAÇÃO....................................................................................... 16 SARESP: SOBRE AS ESTRATÉGIAS UTILIZADAS POR UM GRUPO DE ALUNOS PARA RESOLVER SITUAÇÕES ENVOLVENDO FRAÇÕES ....................................................................................... 16 QUE CONCEPÇÕES DE ÁLGEBRA SURGEM NAS QUESTÕES DE MACROAVALIAÇOES: o caso do ENEM 2011. ............................................................................................................................. 30 AS AVALIAÇÕES EXTERNAS NA FORMAÇÃO DOCENTE E NO ENSINO DE MATEMÁTICA ........ 42 SISTEMA DE AVALIAÇÃO DE RENDIMENTO ESCOLAR DO ESTADO DE SÃO PAULO – SARESP – UM HISTÓRICO ........................................................................................................................ 57 A PROVA BRASIL/2011: IDENTIFICANDO DIFICULDADES RELACIONADAS ÀS CONCEPÇÕES DE ÁLGEBRA POR MEIO DOS DESCRITORES ................................................................................. 72 EIXO TEMÁTICO: E2 – CURRÍCULO ...................................................................................... 89 PROCESSO DE APROPRIAÇÃO, DE PROFESSORES, DE MATERIAIS DIDÁTICOS QUE APRESENTAM O CURRÍCULO DE MATEMÁTICA ...................................................................... 89 CURRÍCULO E A PESQUISA EM CURRÍCULO DE MATEMÁTICA NO BRASIL. .......................... 103 EIXO TEMÁTICO: E4 – FORMAÇÃO DE PROFESSORES ........................................................ 118 FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE MATEMÁTICA EM MATO GROSSO: UMA HISTÓRIA ....... 118 A TRAJETÓRIA DE VIDA ESCOLAR DO PROFESSOR E POSSÍVEIS IMPLICAÇÕES EM SUA PRÁTICA PEDAGÓGICA .......................................................................................................... 130 PRÁTICAS DE RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS NA FORMAÇÃO INICIAL: UM ESTUDO INSPIRADO NO RALI MATEMÁTICO.......................................................................................................... 144 UMA EXPERIÊNCIA DOCENTE EM SALA DE AULA DA GRADUAÇÃO COM A RESOLUÇÃO DE EQUAÇÕES DO 2º GRAU PELO MÉTODO DO COMPLETAMENTO DE QUADRADO DE ALKHWARIZMI ........................................................................................................................... 159 O PROCESSO DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES E AS CONTRIBUIÇÕES DE UM PROGRAMA INSTITUCIONAL PARA A LICENCIATURA EM MATEMÁTICA .................................................. 175 INVESTIGAÇÕES DAS CRENÇAS DOCENTES NO PROJETO PIBID. ........................................... 190 A PRÁTICA PEDAGÓGICA DE UMA PROFESSORA AO UTILIZAR O JOGO “PERDAS E GANHOS” NA AULA DE MATEMÁTICA ................................................................................................... 207 ANÁLISE DE NARRATIVAS DE PROFESSORES QUE ENSINAM MATEMÁTICA E PARTICIPAM DE UM GRUPO COLABORATIVO ................................................................................................. 222 INVESTIGANDO AS ZONAS DE UM PERFIL CONCEITUAL DE EQUAÇÃO PRESENTES NAS CONCEPÇÕES DE UM GRUPO DE PROFESSORES DE MATEMÁTICA NUM CURSO DE FORMAÇÃO CONTINUADA .................................................................................................... 232 FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE MATEMÁTICA- EVASÃO NOS CURSOS DE FORMAÇÃO CONTINUADA ........................................................................................................................ 243 ESTUDOS EM GRUPO NA FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES DE MATEMÁTICA A DISTÂNCIA ............................................................................................................................. 255 UM ESTADO DO CONHECIMENTO SOBRE A FORMAÇÃO CONTÍNUA DE PROFESSORES DOS ANOS INICIAIS NO CAMPO MULTIPLICATIVO........................................................................ 268 UM PERFIL DOS ALUNOS INGRESSANTES NA LICENCIATURA EM MATEMÁTICA DA UFMT – CAMPUS UNIVERSITÁRIO DE RONDONÓPOLIS ..................................................................... 282 A APRENDIZAGEM DA ÁLGEBRA ESCOLAR A PARTIR DOS DEPOIMENTOS DE FUTUROS PROFESSORES: PERCEPÇÕES, COMPREENSÕES, FACILIDADES E DIFICULDADES .................. 298 UMA COMPREENSÃO DE ÁLGEBRA CONSTRUÍDA PELO OLHAR DAS CONCEPÇÕES DE PROFESSORAS DE ENSINO SUPERIOR ................................................................................... 314 INVESTIGAÇÃO SOBRE OS CONHECIMENTOS PARA O ENSINO DE SITUAÇÕES PARTE-TODO EM UM PROCESSO FORMATIVO ........................................................................................... 328 FORMAÇÃO NA DESCONTINUIDADE: UM ESTUDO SOBRE A FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES ........................................................................................................................ 342 EIXO TEMÁTICO: (E5 – HISTÓRIA E FILOSOFIA) .................................................................. 353 É POSSÍVEL DEFINIR O CONCEITO DE VERDADE EM LINGUAGENS COMO DA MATEMÁTICA? ............................................................................................................................................... 353 SIMETRIA E ARQUITETURA: UM ESTUDO DE CASO DA IGREJA MATRIZ DE VOTUPORANGA-SP ............................................................................................................................................... 368 CONCEPÇÕES DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE MATEMÁTICA: UM ESTUDO A PARTIR DE NARRATIVAS .......................................................................................................................... 383 REFLEXÕES SOBRE MATEMÁTICA, INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL, CONSCIÊNCIA E CINEMA ..... 394 UMA PERSPECTIVA CULTURAL PARA O ENSINO DE MATEMÁTICA ...................................... 406 A MATEMÁTICA VIVA: EXPLORANDO A CURIOSIDADE COM CONJECTURAS SOBRE NÚMEROS PRIMOS.................................................................................................................................. 420 OS LIVROS DE MATEMÁTICA PARA OS CURSOS COMERCIAIS BÁSICOS DA REFORMA CAPANEMA............................................................................................................................ 434 EIXO TEMÁTICO: E6 - PSICOLOGIA .................................................................................... 449 FRAÇÃO: SITUAÇÃO PARTE-TODO EM QUESTÕES DE NOMEAR FRAÇÃO E DE RACIOCÍNIO.449 EIXO TEMÁTICO: E7 – RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS E INVESTIGAÇÃO MATEMÁTICA.......... 459 TEMPO E SUAS MEDIÇÕES: UM ESTUDO DOS CONHECIMENTOS MOBILIZADOS POR ALUNOS DO 6º ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL ............................................................................... 459 TEORIA DO CAOS E FRACTAIS: A UTILIZAÇÃO DE UM “PÊNDULO CAÓTICO” COMO ESTRATÉGIA DE ENSINO ........................................................................................................ 471 A UTILIZAÇÃO DE UM QUEBRA-CABEÇA NO ENSINO DE GEOMETRIA ESPACIAL: ANÁLISE, ELABORAÇÃO DE ATIVIDADES E USO EM SALA DE AULA ...................................................... 485 A COMPREENSÃO EM LEITURA E SUA INFLUÊNCIA NA RESOLUÇÃO DE EXERCÍCIOS/PROBLEMAS DE MATEMÁTICA ......................................................................... 497 EDUCAÇÃO FINANCEIRA: ANALISANDO OS CONHECIMENTOS DE ALUNOS DO PRIMEIRO ANO DO ENSINO MÉDIO ................................................................................................................ 513 EIXO TEMÁTICO: E8 - TECNOLOGIAS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO .......................... 529 O USO DA FERRAMENTA GEOGEBRA NO ENSINO E APRENDIZADO DA MATEMÁTICA PELOS ALUNOS DA FATEC OURINHOS.............................................................................................. 529 TECNOLOGIAS DIGITAIS E A PRÁTICA DO PROFESSOR DE MATEMÁTICA NO ENSINO FUNDAMENTAL II .................................................................................................................. 544 EXPOSIÇÃO DO GEOGEBRA PARA DISPOSITIVOS MÓVEIS E WEB 2.0 COMO FERRAMENTA NA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA..................................................................................................... 556 A UTILIZAÇÃO DO GEOGEBRA NA CONSTRUÇÃO DE FUNÇÕES REAIS DEFINIDAS POR MAIS DE UMA SENTENÇA .................................................................................................................... 568 A INSERÇÃO DO COMPUTADOR NAS AULAS DE MATEMÁTICA............................................ 581 O USO DE JOGOS ELETRÔNICOS COMO ELEMENTOS MOBILIZADORES NO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM DE FÍSICA. ..................................................................................... 593 EIXO TEMÁTICO: E9 - EDUCAÇÃO INCLUSIVA .................................................................... 604 ORIGENS DAS DIFICULDADES DE APRENDER MATEMÁTICA NOS PRIMEIROS ANOS DO ENSINO FUNDAMENTAL........................................................................................................ 604 O QUE OS PROFESSORES DE MATEMÁTICA DIZEM QUANDO O ASSUNTO É EDUCAÇÃO INCLUSIVA?............................................................................................................................ 616 Eixo Temático: E-10: Educação Profissional .......................................................................... 628 DERIVADAS E INTEGRAIS NOS CURSOS MÉDIOS INTEGRADOS AO TÉCNICO-O QUE DIZEM OS PROFESSORES DAS DISCIPLINAS TÉCNICAS ........................................................................... 628 RELATOS DE EXPERIÊNCIA ................................................................................................ 644 EIXO TEMÁTICO: E1 - AVALIAÇÃO..................................................................................... 644 TRIGONOMETRIA: EXPECTATIVAS INSTITUCIONAIS PARA A PRÁTICA DOCENTE ................. 644 EIXO TEMÁTICO: E3 – ETNOMATEMÁTICA E MODELAGEM................................................ 657 OBSERVATÓRIO DA EDUCAÇÃO: ATIVIDADES DESENVOLVIDAS UTILIZANDO A MODELAGEM MATEMÁTICA COMO METODOLOGIA .................................................................................. 657 UMA ATIVIDADE DE MODELAGEM MATEMÁTICA NO CURSO DE JOGOS DIGITAIS ............. 666 ETNOMATEMÁTICA NA REGIÃO DE PENAPÓLIS: UMA POSSIBILIDADE DE TRABALHO COM OS POVOS DA ALDEIA ICATU ...................................................................................................... 673 EIXO TEMÁTICO: E4 – FORMAÇÃO DE PROFESSORES ........................................................ 678 UM PROJETO INTERDISCIPLINAR SOBRE A DENGUE ENVOLVENDO O ................................. 678 IFSP E UMA ESCOLA DE INTERVENÇÃO PRIORITÁRIA ........................................................... 678 O ENSINO DE GEOMETRIA, A UTILIZAÇÃO DE TICs E A RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS: UMA MISTURA POSITIVA PARA O ENSINO DE MATEMÁTICA ........................................................ 686 O ENSINO DO GEOGEBRA COMO FERRAMENTA DE SOLUÇÕES DE PROBLEMAS MATEMÁTICOS POR MEIO DE CONSTRUÇÕES GEOMETRICAS – ENSINO FUNDAMENTAL II e ENSINO MÉDIO ...................................................................................................................... 696 DIÁLOGOS ENTRE MATEMÁTICA E CULTURA: CONTRIBUIÇÕES DA ETNOMATEMÁTICA NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES DA ESCOLA EM TEMPO INTEGRAL ....................................... 704 DAS CONCEPÇÕES DE CURRÍCULO À FORMAÇÃO DE PROFESSORES QUE ENSINAM MATEMÁTICA NOS ANOS INICIAIS: UM OLHAR SOBRE O PROJETO EMAI DA SECRETARIA DA EDUCAÇÃO DE SÃO PAULO ................................................................................................... 714 APLICANDO JOGOS E MODELOS GEOMÉTRICOS NO ENSINO DE MATEMÁTICA .................. 725 PROFESSORES E TECNOLOGIAS: A INCLUSÃO DO PROFESSOR DE MATEMÁTICA NA ERA DIGITAL .................................................................................................................................. 731 MATEMÁTICA & FUTEBOL: CONSTRUINDO CONHECIMENTOS GEOMÉTRICOS A PARTIR DA CONFECÇÃO DE UMA BOLA .................................................................................................. 734 O ESTÁGIO DOCENTE NO ENSINO SUPERIOR: EXPERIÊNCIAS VIVIDAS E COMPARTILHADAS ............................................................................................................................................... 743 O PROCESSO COLETIVO NA ELABORAÇÃO DE UMA SITUAÇÃO DESENCADEADORA DE APRENDIZAGEM DO CONCEITO DE MEDIDA DE ÁREA.......................................................... 753 ENSINO DE POTENCIAÇÃO COM MÚSICA E INSTRUMENTOS MUSICAIS .............................. 768 UMA COLABORAÇÃO ÀS POLÍTICAS PÚBLICAS VISANDO À MELHORIA DA FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE MATEMÁTICA: DUAS INCLUSÕES NA SALA DE AULA ................................... 776 CONTRIBUIÇÕES DO SUBPROJETO DE MATEMÁTICA DO PIBID/UVA/2009 NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES ........................................................................................................................ 790 RELATO DE EXPERIÊNCIA COM O PIBID. ............................................................................... 799 EIXO TEMÁTICO: E5 – HISTÓRIA E FILOSOFIA .................................................................... 803 O USO DA HISTÓRIA ORAL COMO FERRAMENTA DE PESQUISA NO ENSINO DE MATEMÁTICA NA CIDADE DE BIRIGUI/SP..................................................................................................... 803 LEITURA E ESCRITA NAS AULAS DE MATEMÁTICA: UMA PROPOSTA UTILIZANDO A HISTÓRIA DA MATEMÁTICA .................................................................................................................. 808 A UTILIZAÇÃO DA MÚSICA COMO RECURSO DIDÁTICO NO ENSINO DA MATEMÁTICA....... 817 EIXO TEMÁTICO: E7 – RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS E INVESTIGAÇÃO MATEMÁTICA .......... 826 PIBID/MATEMÁTICA/UVA E A INVESTIGAÇÃO EM SALA DE AULA: ...................................... 826 UMA POSSIBILIDADE PARA O ENSINO INTEGRADO .............................................................. 826 ATIVIDADES DE INVESTIGAÇÃO MATEMÁTICA DESENVOLVIDAS PELO OBSERVATÓRIO DA EDUCAÇÃO ............................................................................................................................ 834 GEOMETRIA PLANA VERSUS ESPACIAL: UMA EXPERIÊNCIA NA EXPLORAÇÃO DE MULTISSIGNIFICADOS. .......................................................................................................... 844 CLUBE DE MATEMÁTICA: EM BUSCA DE MULTIPLICADORES DE MATEMÁTICA .................. 852 UTILIZANDO BRINCADEIRAS PARA O ENSINO DE NOÇÕES MATEMÁTICAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL. ............................................................................................................................... 859 O LÚDICO COMO DIFERENCIAL NO ENSINO DE MATEMÁTICA............................................. 863 A IMPORTÂNCIA DOS MATERIAIS MANIPULATIVOS NO ENSINO DE GEOMETRIA ............... 873 O USO DE JOGOS NO ENSINO DE EQUAÇÃO DO 2º GRAU .................................................... 881 APRENDIZAGEM MATEMÁTICA POR MEIO DA VISUALIZAÇÃO: CONSTRUÇÃO DE FIGURAS ESPACIAIS .............................................................................................................................. 891 ENSINO DE NÚMEROS RACIONAIS E IRRACIONAIS UTILIZANDO FRAÇÕES CONTÍNUAS ...... 899 UTILIZAÇÃO DE SOFTWARE NO ENSINO DE MATEMÁTICA: RELATOS DE EXPERIÊNCIA....... 908 APRENDENDO E ENSINANDO NÚMEROS COMPLEXOS:........................................................ 914 EXPERIÊNCIA COM TECNOLOGIA EDUCACIONAL.................................................................. 914 ENTRE ISOMETRIAS E CALEIDOSCÓPIOS VIRTUAIS: UMA EXPERIÊNCIA COM O GEOGEBRA NO ENSINO SUPERIOR ................................................................................................................. 924 EIXO TEMÁTICO: E9 - EDUCAÇÃO INCLUSIVA ................................................................... 935 O ENSINO DE MATEMÁTICA PARA UM ALUNO COM A SÍNDROME DE STURGE-WEBER ..... 935 EDUCAÇÃO MATEMÁTICA NA TERCEIRA IDADE: UMA EXPERIÊNCIA COM ATIVIDADES MANIPULATIVAS ................................................................................................................... 943 UNO EM LIBRAS PARA ALUNOS COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA DO ENSINO FUNDAMENTAL, ANOS FINAIS .......................................................................................................................... 952 EIXO TEMÁTICO: E10 - EDUCAÇÃO PROFISSIONAL ............................................................ 962 A DISCIPLINA DE MATEMÁTICA NO ENSINO TÉCNICO INTEGRADO COM O MÉDIO EM QUÍMICA: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES................................................................................. 962 MINI-CURSOS .................................................................................................................. 971 EIXO TEMÁTICO: E2 - CURRÍCULO ..................................................................................... 971 RELAÇÕES ESPACIAIS E O USO DO LIVRO DIDÁTICO: REFLEXÕES SOBRE O ENSINO E A PRÁTICA DOS PROFESSORES ................................................................................................. 971 EIXO TEMÁTICO: E3 - ETNOMATEMÁTICA E MODELAGEM. ............................................... 977 CONSTRUINDO CONCEITOS GEOMÉTRICOS ATRAVÉS DA ARTE. .......................................... 977 EIXO TEMÁTICO: E4 – FORMAÇÃO DE PROFESSORES ........................................................ 982 A UTILIZAÇÃO DE JOGOS EM SALA DE AULA: O UNIVERSO DOS JOGOS E O ENSINO DE MATEMÁTICA ........................................................................................................................ 982 OS JOGOS NO ENSINO DO CAMPO MULTIPLICATIVO ........................................................... 987 O ORIGAMINA NA MATEMÁTICA ESCOLAR .......................................................................... 992 REFLEXÕES SOBRE DIFERENTES CONCEPÇÕES DE ÁLGEBRA NA MATEMÁTICA ESCOLAR ... 997 EIXO TEMÁTICO: E5 - HISTÓRIA E FILOSOFIA. .................................................................. 1002 ATIVIDADES HISTÓRICAS PARA O ENSINO DE EQUAÇÕES EXPONENCIAIS ......................... 1002 EIXO TEMÁTICO: E7 – RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS E INVESTIGAÇÃO MATEMÁTICA ........ 1007 ANÁLISE DE ERROS NA PROMOÇÃO DA .............................................................................. 1007 APRENDIZAGEM MATEMÁTICA UTILIZANDO O .................................................................. 1007 ENSINO ATRAVÉS DA RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS............................................................ 1007 OS BLOCOS DE CONTEÚDO DOS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS TRABALHADOS POR MEIO DA METODOLOGIA DE ENSINO-APRENDIZAGEM-AVALIAÇÃO DE MATEMÁTICA ATRAVÉS DA RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS ......................................................................... 1012 A TORRE DE HANÓI NAS AULAS DE MATEMÁTICA ............................................................. 1017 MATEMÁTICA NA EDUCAÇÃO BÁSICA: AS POSSIBILIDADES DA INVESTIGAÇÃO MATEMÁTICA COMO ESTRATÉGIA DE ENSINO .......................................................................................... 1023 EIXO TEMÁTICO: E8 - TECNOLOGIAS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO ........................ 1027 USANDO O ARDUINO COMO FERRAMENTA NO ENSINO DE MATEMÁTICA....................... 1027 PROFESSORES E TECNOLOGIAS: A INCLUSÃO DO PROFESSOR DE MATEMÁTICA NA ERA DIGITAL ................................................................................................................................ 1031 EIXO TEMÁTICO: E9 – EDUCAÇÃO INCLUSIVA ................................................................. 1035 PRIMEIRAS NOÇÕES NUMÉRICAS PARA CRIANÇAS COM SÍNDROME DE DOWN ATRAVÉS DE MATERIAIS MULTISSENSORIAIS .......................................................................................... 1035 INTEGRAÇÃO ENTRE NEUROCIÊNCIAS E EDUCAÇÃO NO APOIO A CRIANÇAS COM DISCALCULIA........................................................................................................................ 1041 EIXO TEMÁTICO: E10 – EDUCAÇÃO PROFISSIONAL.......................................................... 1046 O ENSINO DE MATEMÁTICA NA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL BASEADO NA ENGENHARIA DIDÁTICA E COM O AUXÍLIO DE SOFTWARES ..................................................................... 1046 SOBRE O EPEM Descrição do logotipo do XII EPEM O logotipo do XII Encontro Paulista de Educação Matemática, integra elementos geométricos que aludem à cidade Birigui, à Matemática e à Instituição onde se realiza o evento. O tema: “Birigui, cidade pérola”. Cidade Pérola, um segundo nome de Birigui, remonta de 1934 quando um jornalista vindo de São Paulo, de forma romântica, usou essa expressão para designar a cidade a qual acabou por permanecer até hoje. Concha Acústica de Birigui Praça Dr. Gama. As formas: Todas as formas presentes no logo são elementos geométricos que fazem referência à Matemática. A Forma Elíptica muito presente alude à Concha Acústica, um ponto de referência de Birigui localizado na praça central. Para exaltar os conceitos matemáticos foram representados no logo, os focos da elipse. A Esfera localizada ao centro representa a Pérola. As Setas Cruzadas na horizontal e vertical representam as coordenadas do Plano Cartesiano que, criado pelo matemático René Descartes é elemento matemático de grande importância, pois associa a geometria à álgebra. As cores: As cores, verde e vermelho em predominância fazem alusão ás cores do IFSP, Instituição onde se realiza o evento. A criação: Projeto vencedor do Concurso de Criação de Logotipo para o XII EPEM escolhido pela Comissão Organizadora do Evento foi desenvolvido por Edvan Ferreira dos Santos, graduando do curso de Licenciatura em Matemática do Instituto Federal de Ciência e Tecnologia de São Paulo Campus Birigui. 12 XII Encontro Paulista de Educação Matemática e V Fórum de Licenciaturas em Matemática O tema escolhido para o XII EPEM, realizado nos dias 02 e 03 de Maio de 2014, foi a “Educação Matemática no contexto das propostas de Ensino Integrado: projetos e políticas”. Nosso principal objetivo foi discutir os impactos das políticas públicas do governo do Estado de São Paulo tais como, matriz curricular, avaliação de desempenho de alunos, entre outros, no ensino da Matemática das escolas de Ensino Integrado. A proposta do Ensino Médio Integrado à Educação Profissional tem como objetivo proporcionar um avanço na qualidade dessa etapa final da educação básica. E o currículo, nesta modalidade, caracteriza-se pelo ensino dos conteúdos do Ensino Médio e da formação profissional de forma integrada ao longo de todo o curso, os quais devem ser trabalhados considerando a indissociabilidade entre teoria e prática. Aos estudantes é proporcionada a oportunidade de concluir o Ensino Médio e, simultaneamente, obter uma formação específica habilitando-os para mundo do trabalho. Assim, tal modalidade de ensino tem por objetivo possibilitar a melhoria das condições de cidadania, de trabalho e de inclusão social aos jovens e adultos buscando uma formação profissional de qualidade que permita alçar novos rumos para suas vidas. Neste sentido, acreditamos ser necessária e primordial a discussão sobre como o ensino de matemática vem sendo abordado nesses cursos. Vários autores1 têm enfatizado que para o processo de ensino-aprendizagem da Matemática, neste contexto, é importante não só considerar as diversas abordagens existentes tais como, a resolução de problemas, a modelagem matemática e o trabalho com projetos, mas também torna-se necessário que a comunidade de educadores matemáticos não ignore o avanço desta modalidade de ensino, bem como sob qual perspectiva a Matemática deve ser abordada nesses cursos. Na Reunião Anual da Anped2 de 2011 cuja temática foi “Educação Matemática e Ensino Médio”, dois textos foram produzidos e submetidos para a Sessão de Trabalho Encomendado3 pelo Grupo de Trabalho de Educação Matemática (GT19) os quais trazem, segundo Lopes (2011), para a discussão e reflexão uma questão primordial que é “Qual Educação Matemática se faz necessária?”, e ainda ressaltam a necessidade premente da ampliação na produção científica, para esse nível de ensino. A partir do XI EPEM, quando na ocasião houve apenas a candidatura do IFSP Campus Birigui para a realização do XII EPEM, muitas ações e decisões tiveram que ser tomadas. Desde a definição de um tema até a busca de parcerias para que o evento acontecesse da melhor forma possível. 1 MAGALHÃES, Renato.; NACARATO, Adair M.; REINATO, Rosicler A. O. Educação Matemática e o ensino técnico profissionalizante em nível médio: notas para o debate. Texto produzido atendendo à solicitação do Grupo de Trabalho de Educação Matemática da ANPED, 2011. 2 Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação. LOPES, Celi Espasandin. Os desafios e as perspectivas para a Educação Matemática no Ensino Médio. Trabalho encomendado pelo GT19- Educação Matemática, para apresentação na 34ª Reunião Anual da ANPED. Natal, 2011. 3 13 A composição da comissão organizadora local ocorreu de forma colaborativa e todos aqueles que possuíam alguma ligação com a Licenciatura em Matemática estiveram envolvidos. Colaboraram na organização também a área de Gestão, Automação e Informática. E pudemos contar ainda, com a parceria de uma fábrica de calçados da cidade de Birigui que nos cedeu a confecção das bolsas e também de uma indústria que fez doação de refrigerantes. A elaboração da plataforma “Antuérpia” para o recebimento dos trabalhos em forma digital foi realizada pela Profa. Helen de Freitas do IFSP, campus Birigui, que prontamente nos atendeu. Os trabalhos selecionados foram divididos em 10 eixos listados a seguir: E1 – Avaliação; E2 – Currículo; E3 – Etnomatemática e Modelagem; E4 – Formação de Professores; E5 – História e Filosofia; E6 – Psicologia; E7 – Resolução de Problemas e Investigação Matemática; E8 – Tecnologias de Informação e Comunicação; E9 – Educação Inclusiva; E10 – Educação Profissional. Os trabalhos puderam ser submetidos na forma de Comunicação Científica, Relato de Experiência e Minicurso. Na modalidade Comunicação Científica foram aprovados 48 trabalhos, na modalidade Relato de Experiência foram aceitos 37 e ainda, na modalidade Minicursos foram aprovados 16 trabalhos, e que todos poderão ter acesso por meio deste Ebook. O EPEM já se consolidou como um evento importante da Educação Matemática no Estado de São Paulo, constituindo-se em um momento privilegiado para debater questões sobre políticas públicas, formação de professores e o ensino da matemática nos diversos níveis. Ao longo de sua história, a SBEM tem procurado atuar como um fórum de debates com o objetivo de promover mudanças na formação matemática de todos os cidadãos e, em especial, no campo da formação de profissionais que ensinam Matemática. • I EPEM - 1989 - PUC Campinas, Campinas. • II EPEM - 1991 – USP, São Paulo. • III EPEM - 1993 – UNESP, Bauru. • IV EPEM - 1996 – PUC, São Paulo. • V EPEM - 1998 – FIRP/UNESP, São José do Rio Preto. • VI EPEM - 2001 – FAFICA, Catanduva. • VII EPEM - 2004 – USP, São Paulo. • VIII EPEM - 2006 – UNICSUL, São Paulo. • IX EPEM – 2008 – UNESP – Bauru • X EPEM – 2010 – USP/UFSCar – São Carlos • XI EPEM – 2012 – UNESP – São José do Rio Preto Assim, o V Fórum Paulista de Licenciaturas em Matemática foi realizado nas dependências do IFSP-Campus Birigui, no dia 01/05/2014 e teve como tema a “Formação do professor de matemática e a valorização da carreira docente”. 14 O evento contou com a participação de 128 inscritos, entre alunos de Licenciatura em Matemática, estudantes de pós-graduação, e professores do ensino superior e da educação básica. A mesa de abertura contou com a presença das pesquisadoras Profª Drª Marta Maria Pontin Darsie, da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT), Profª Maria Sufaneide Rodrigues, Diretora da Secretaria de Assuntos Educacionais e Culturais do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (APEOESP) e a Mediadora Profª Drª Ana Cristina Ferreira, da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP). No período da tarde, os trabalhos foram desenvolvidos em três grupos de trabalho, e em seguida houve uma Plenária de encerramento do V Fórum, na qual definiu-se uma comissão para a elaboração de documento síntese/propositivo contendo as discussões e reflexões sobre os temas abordados pelos três grupos de trabalho formados, onde discorrer-se-ia sobre as críticas e anseios dos professores sobre a eficácia ou não das políticas públicas implementadas pelo governo do Estado de São Paulo. A comissão foi composta pelas seguintes professoras: Profa. Dra. Luciane de Castro Quintiliano, Profa. Dra. Zionice Garbelini Martos Rodrigues, Profa. Ma. Kátia Lima. Os pontos discutidos nos GTs serão apresentados, posteriormente, no relatório síntese que será elaborado. Os pontos de discussão para o debate propostos pela Profa. Dra. Ana Cristina Ferreira na ocasião da abertura do V Fórum foram os seguintes: 1. Salário/piso salarial; 2. Carreira; 3. Condições de trabalho; 4. Formação inicial; 5. Formação continuada; 6. Legislação e diretrizes. 15 COMUNICAÇÕES CIENTÍFICAS EIXO TEMÁTICO: E1 - AVALIAÇÃO SARESP: SOBRE AS ESTRATÉGIAS UTILIZADAS POR UM GRUPO DE ALUNOS PARA RESOLVER SITUAÇÕES ENVOLVENDO FRAÇÕES Tiago Augusto dos Santos ALVES – UNIBAN – SP ([email protected]) Angélica Fontoura GARCIA SILVA – UNIBAN – SP ([email protected]) Cíntia Caputo PORTELA ALVES – UNIBAN – SP ([email protected]) Resumo: O presente trabalho é parte de um estudo desenvolvido no ano de 2013, o qual teve a finalidade de analisar a compreensão dos alunos da 5ª série/ 6º ano do Ensino Fundamental em relação a situações-problema apresentadas no Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo – SARESP – de anos anteriores que versavam sobre a representação fracionária dos Números Racionais. Trata-se de uma pesquisa de natureza qualitativa cujos dados foram coletados por meio de um questionário – de caráter diagnóstico – e entrevistas. O questionário era composto de 10 questões, das quais três são aqui discutidas. Esses dados foram coletados em uma escola da rede pública de ensino paulista. Na sequência, foram realizadas análises das estratégias adotadas pelos participantes à luz de resultados de pesquisa da área e também comparamos com os resultados apresentados nos relatórios do SARESP. Teoricamente, fundamenta-se esta investigação em Vergnaud e Nunes que investigam questões didáticas sobre o objeto matemático: representação fracionária do número racional. De modo geral, a análise das informações obtidas permitiu identificar que os alunos apresentaram maior dificuldade nos itens que se referem à representação da situação quociente e à equivalência de frações e, em contrapartida, demonstraram um considerável desempenho em situações parte-todo. Disso é possível inferir que o ensino destes estudantes teve foco em tal tipo de situação. Palavras-chave: Ensino e aprendizagem; Fração; SARESP; Situação quociente; Equivalência de frações; Parte-todo. 16 1. Introdução Este artigo faz parte de uma pesquisa que vem sendo desenvolvida no âmbito do projeto Observatório da Educação. Trata-se de um projeto de formação e investigação, financiado por um programa da Capes – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – com o objetivo de fomentar estudos e pesquisas em educação, de forma a proporcionar a articulação entre pós-graduação, licenciaturas e escolas de educação básica. Considerando-se o termo fração, definido por Kieran (1993), como sendo a representação fracionária de número racional, formado por , em que a e b são números inteiros e b ≠ 0, o presente trabalho pretende, a partir de revisão bibliográfica e pesquisa de campo, analisar a compreensão desse assunto por um grupo de alunos da 5ª série/ 6° ano do Ensino Fundamental da rede pública estadual paulista, frente aos resultados obtidos com os relatórios do Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo (SARESP) de anos anteriores. 2. Relevância e Fundamentação Nesta investigação procuramos analisar a resolução de alunos que frequentam uma escola da rede pública participante do Projeto Observatório à luz de outras pesquisas que tratam de questões relacionadas aos processos de ensino e aprendizagem das frações. Apoiamos-nos também em estudos como o de Nunes e colegas (1997, 2005) que fundamentados nas ideias de Vergnaud (1990) propõem que sejam considerados os invariantes ordem e equivalência e diferentes situações que pretendam dar significados à fração e as suas possíveis representações. Nunes e Bryant (1997) consideravam o ensino das frações, já no final da década de 90, alertando quanto à forte tendência por parte dos professores em trabalhar o seu conceito utilizando, sobretudo, o significado parte-todo. Salienta-se que esse fato também é evidenciado por Canova (2006), Damico (2007), Garcia Silva (2007) e Monteiro Cervantes (2011). Para este trabalho será adotada a definição da relação partetodo fornecida por Nunes e Bryant (2009) apoiada em Behr, Harel, Post e Lesh (1992; 1993) como uma quantidade dividida em um certo número de partes (y), do qual é retirado um número especificado (x). Os autores afirmam ainda que “o símbolo 17 representa esta quantidade em termos de relação parte-todo” (NUNES e BRYANT, 2009, p.10). Admitir-se-á para este trabalho a definição de Nunes et al (2009) para o significado quociente como a indicação de uma divisão e seu resultado, na qual os autores assim a consideram quando duas grandezas, x e y, são tratadas como componentes de uma divisão, ou seja, x como o dividendo e y como divisor, e, portanto, obtém-se uma única quantidade . Definição próxima a essa é adotada nos Parâmetros Curriculares Nacionais de Matemática (1998). Para seus autores a ideia de quociente é identificada na interpretação do número racional como quociente de um inteiro por outro (a:b = ; b ≠ 0). A partir de tais definições, Garcia Silva et al (2013), apoiados nos trabalhos desenvolvidos por Nunes (2003), verificaram que a utilização, principalmente, da situação quociente, estimula os alunos a refletirem sobre o uso de frações. Além disso, chamam a atenção para a utilização desse significado ao introduzir o conceito de fração, o que acarretaria uma melhor compreensão do conteúdo pelos alunos. Tal consideração também é observada nos estudos de Campos (2011), sobretudo como meio a ser utilizado para que as crianças pudessem compreender mais facilmente as invariantes ordenação e equivalência entre frações. Todavia documentos oficiais como os Parâmetros Curriculares Nacionais (1997) de Matemática para os anos iniciais, por exemplo, definem como um de seus objetivos favorecer o estudante do 2º ciclo (3ª e 4ª séries) a construir o significado do número racional, por meio de suas representações fracionárias e decimais, a partir de seus diferentes usos em seu dia-a-dia. Em complemento, os PCN (1998) para alunos da 5ª à 8ª séries do ensino fundamental apresentam a seguinte concepção: O estudo dos números racionais, nas suas representações fracionária e decimal, merecem especial atenção no terceiro ciclo (5ª e 6ª séries), partindo da exploração de seus significados, tais como: a relação parte/todo, quociente, razão e operador. (BRASIL, 1998, p.66) 18 Damico (2007), diante dos resultados de seus estudos acerca da formação de professores de Matemática para o ensino de números racionais no Ensino Fundamental, o qual mostrou limitação de conhecimento por parte dos pesquisados, aponta a necessidade de que os professores detenham elevado conhecimento acerca dos fundamentos teóricos e práticos pertinentes à Educação Básica e, referindo-se à formulação do currículo para futuros docentes para o ensino dos números racionais, defende que constantes pesquisas e discussões acerca do assunto são primordiais, além da flexibilidade para aceitar possíveis mudanças, uma vez que o ensino e aprendizagem requerem uma investigação contínua e esforço pessoal e coletivo. Apesar da indubitável importância das frações no processo de ensino e aprendizagem de Matemática, Campos (2011) em seus estudos observa que esse assunto se apresenta como um obstáculo tanto para os alunos como para os professores, desde o 4º ano ao término do ensino fundamental, sendo, pois, uma necessidade a escola buscar meios de promover seu entendimento. Em relação à rede pública de ensino paulista, podemos observar a utilização de um mecanismo para avaliar o aprendizado dos alunos. Isso ocorre por meio do Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo (SARESP), o qual consta da aplicação de testes em suas escolas. De acordo com o relatório do SARESP (2011), esta prática objetiva diagnosticar o sistema de ensino e fornecer indicadores para subsídio ao monitoramento das políticas públicas de educação. Esses diagnósticos são esboçados em relatórios, cujos resultados são vinculados a níveis de compreensão/domínio de conceitos e aplicação a situações práticas pelos alunos, a saber: abaixo do básico, básico, adequado e avançado. Na sequência, são agrupados por meio de três classificações: insuficiente, suficiente – composto pelos níveis básico e adequado – e avançado. Tal avaliação retrata de modo superficial as estratégias dos alunos da rede pública, uma vez que a análise de seus resultados é feita a partir, tão somente, de suas respostas às questões fechadas. Outro fator dificultador é a falta de análise e discussão dos resultados com os avaliados, o modo como pensaram, interpretaram e raciocinaram para resolver as situações-problemas. Dessa maneira, os relatórios apenas presumem as dificuldades e óbices de aprendizado do corpo discente da rede pública de ensino paulista. 19 Ao encontro dessa perspectiva e visando ao aprimoramento do processo de ensino aprendizagem de Matemática, Campos (2011), ao se referir às resistências de professores e responsáveis pelas políticas educacionais quanto aos trabalhos que tratam desse tema, registra em seu artigo, apoiada em estudos de Nunes e Bryant (2006), a necessidade de se realizar investigações adicionais frente ao questionamento de que tais estudos ao serem aplicados diretamente por pesquisadores em interação com os alunos poderiam gerar resultados diferentes se fossem apresentados por professores em sala de aula. Nesse sentido, como o primeiro autor, estava participando do cotidiano escolar poderia atingir resultados mais próximos aos conseguidos em sala de aula. 3. Procedimentos Metodológicos A investigação aqui apresentada é de natureza qualitativa, no sentido definido por Bogdan e Biklen (1999). Para tanto, escolhemos pesquisar as estratégias utilizadas por um grupo de alunos ao resolver itens divulgados pelo relatório pedagógico do SARESP sobre a representação fracionária dos números racionais. Depois de um primeiro levantamento bibliográfico sobre o tema e uma pesquisa nos relatórios pedagógicos do SARESP, foi realizado um trabalho de campo. Esse trabalho corresponde a um teste contendo questões relacionadas a Frações de exames anteriores do SARESP aplicado a alunos da 5ª série/ 6° ano do ensino fundamental, de uma Escola Estadual da cidade de São Paulo/SP, no dia 23 de outubro de 2013. Foram alocados em uma sala seis alunos escolhidos aleatoriamente dentre os componentes de uma classe da série supramencionada. A fim de verificar o perfil e o desempenho em sala de aula dos referidos participantes, a Professora que leciona a disciplina de Matemática foi entrevistada e apresentou algumas características comuns aos alunos, a saber: interessados, esforçados, alta taxa de frequência às aulas, além de seus pais serem participativos, acompanhando de perto seus filhos. Relatou ainda que, de modo geral, os alunos da 5ª série/ 6º ano da escola demonstram grande dificuldade em frações e tabuada. Em relação à aplicação dos testes, inicialmente, foi-lhes apresentado o conteúdo do trabalho, a saber: o caderno continha dez questões pertinentes a frações, com um tempo máximo de uma hora de duração; poderiam resolver a lápis; ao terminarem a resolução, seriam entrevistados para elucidarem o raciocínio que seguiram para solucionar os problemas apresentados; não lhes foi informado quanto à obrigatoriedade 20 ou não de escreveram a resolução, a fim de estudar a peculiaridade de raciocínio de cada um deles. O aluno que terminou por último o fez em aproximadamente cinquenta minutos e o primeiro a terminar, vinte e cinco minutos. Das dez questões propostas, neste trabalho serão apresentadas três, relacionadas a frações, e possuem a seguinte caracterização: a questão 01 tratava o significado parte-todo em sua representação fracionária; a questão 02 abordava o significado parte-todo e a invariante equivalência; e a questão 03 apresentava a situação quociente e sua representação fracionária. A seguir, apresentam-se os três problemas propostos juntamente com a análise e discussão dos dados coletados. 4. Análise e Discussão dos Dados A análise dos resultados obtidos obedecerá a dois critérios: o levantamento de índices de acertos por questão, significado, invariante e representação; e uma análise qualitativa relacionando os resultados encontrados com os obtidos pelos alunos que realizaram as provas do SARESP e com outras pesquisas da área. A primeira questão envolvia o significado parte-todo e previa verificar se o aluno identificaria a representação fracionária da situação apresentada. Esse item foi apresentado na prova do SARESP de 2009. Quadro 1: questão 1 Paulo comeu 3 partes de uma barra de chocolate que foi dividida em 8 partes iguais. A fração que representa a parte da barra de chocolate que Paulo comeu é a) b) c) d) Fonte: Relatório Pedagógico SARESP 2009 Todos os alunos acertaram a questão e a resolveram apenas mentalmente; cinco deles apresentaram o raciocínio muito parecido, pois, quando entrevistados, informaram que de um total de 8 partes, apenas 3 foram utilizadas, deste modo bastava representar a parte consumida no numerador da fração e o total de partes no denominador; já o aluno F informou que imaginou uma barra de chocolate dividida em oito partes e, como foram comidas três, bastava representar com o número 3 o numerador e 8 o denominador. De acordo com o relatório do SARESP (2009), a habilidade avaliada é identificar fração como representação que pode estar associada a diferentes significados 21 (parte/todo, quociente, razão). Dos alunos avaliados em 2009, 72% obtiveram êxito na resolução da situação. Neste relatório, esse tipo de situação-problema pertence ao nível abaixo do básico e aqueles que conseguiram resolvê-la dominam o conceito de fração parte-todo. Isso demonstra que mesmo os alunos que, no geral, não foram tão bem na prova resolveram a questão com correção. Tais resultados podem ser justificados pelas pesquisas de Nunes e Bryant (1997) que, em relação ao ensino das frações, no final da década de 90, já chamavam a atenção sobre a forte tendência por parte dos professores em trabalhar o conceito de fração utilizando principalmente o significado parte-todo. Fato também evidenciado por Canova (2006), Damico (2007), Garcia Silva (2007) e Monteiro Cervantes (2011). A segunda questão envolvia o significado parte-todo e previa verificar se o estudante compreendia o invariante equivalência da situação apresentada. Esse item foi apresentado na prova do SARESP de 2010. Quadro 2: questão 2 De um bolo de chocolate cortado em 15 pedaços iguais, Paulo comeu , Juca comeu , Zeca comeu e Beto comeu . Os dois que comeram a mesma quantidade de bolo foram: a) b) c) d) Paulo e Juca Paulo e Zeca Zeca e Beto Beto e Juca Fonte: Relatório Pedagógico SARESP 2010 Nenhum dos participantes apresentou algum registro quanto à resolução da questão. Dos seis alunos, quatro erraram a questão: os alunos A e C afirmaram que não conseguiram entender o exercício e, portanto, não escolheram nenhuma das alternativas; os alunos D e F erraram, apresentando os seguintes raciocínios, respectivamente: “como 3 x 5 = 15, então a fração o número é igual à fração ” e “como o número é o menor (Paulo) e é o maior (Juca), então quem comeu a mesma quantidade foi Zeca e Beto”. Deste modo, demonstraram não dominar o conceito de equivalência entre frações. Os alunos B e E obtiveram êxito na referida questão e, de acordo com a entrevista, apresentaram o mesmo raciocínio de resolução: utilizaram o procedimento de cálculo, ou seja, executaram o Mínimo Múltiplo Comum (MMC) dos denominadores 22 das frações e e concluíram que elas eram equivalentes. Segundo o relatório do SARESP (2010), a habilidade trabalhada nessa questão remete a identificar diferentes representações de um mesmo número racional, e o nível de aprendizado é o avançado, ou seja, os alunos que acertaram esse item foram os que se saíram bem na prova. Além disso, retrata que apenas 17,4% dos alunos avaliados no SARESP 2010 acertaram a situação-problema, indicando que não dominam com exatidão o conceito de fração, em que o todo é dividido em partes iguais, nem a equivalência entre frações. Estudos como os de Kerslake (1986), Behr, Wachsmuth, Post & Lesh (1984) e Nunes et al. (2004) apontam que os estudantes encontram dificuldades para compreender os conceitos relativos a equivalência. Nunes e colegas afirmam que a dificuldade de entendimento se deve ao fato de que para os estudantes, a compreensão da equivalência no campo dos números naturais, o número funciona como “rótulo” e isso facilita ao aluno a perceber a equivalência. Todavia o mesmo não acontece com as frações: temos uma infinidade de rótulos para identificar uma mesma quantidade: de um chocolate ou desse mesmo chocolate, temos quantidades equivalentes. A terceira questão envolvia a representação de uma situação envolvendo o significado quociente. Esse item foi apresentado na prova do SARESP de 2010. Quadro 3: questão 3 Para fazer um trabalho de Arte, a professora Jaqueline dividiu igualmente 8 cartolinas entre seus 24 alunos. Que fração de uma cartolina cada aluno recebeu? Fonte: Relatório Pedagógico SARESP 2010 Todos os alunos apresentaram registros em relação à tentativa de resolução do problema, porém nenhum deles conseguiu solucioná-lo com correção. Os participantes A, B, E e F resolveram da seguinte forma: executaram a divisão de 24 (alunos) por 8 (cartolinas) e o resultado obtido correspondia ao numerador da fração de cartolina recebida por cada aluno. O denominador seria a quantidade de cartolinas. A seguir, apresentam-se os registros executados pelo Aluno A: Figura 1 – Resolução da questão nº 3 do aluno A 23 Durante a entrevista, o referido aluno apresentou a seguinte justificativa para ter resolvido a situação-problema desse modo: “a gente dividiu igualmente oito, então 24 dividido por 8, e como o resultado é 3, então é ”. O aluno C executou a divisão de 24 por 8 e obteve 3 e registrou a resposta . Questionado durante a entrevista, informou que como eram 8 cartolinas para 24 alunos deveria executar a divisão acima mencionada e que o resultado seria o numerador da resposta para a questão, já o numerador seria 24, pois o material estava sendo dividido por total de alunos. Abaixo, são esboçados seus registros: Figura 2 – Resolução da questão nº 3 do aluno C O aluno D começou a solucionar a questão corretamente, ou seja, considerou que tal situação poderia ser representada por uma divisão a partir da fração dividiu pela fração , porém a . Questionado durante a entrevista quanto ao modo que pensou durante a resolução da questão, informou que o total de alunos era 24 e o resultado da divisão de 24 por 8 é 3; dessa forma, deveria dividir a fração por a fim de determinar quanto de cada cartolina cada aluno receberia. Abaixo são apresentados seus registros: Figura 3 – Resolução da questão nº 3 do aluno D 24 Conforme o relatório do SARESP (2010), a habilidade trabalhada nessa situação-problema é identificar a fração como representação que pode estar associada a diferentes significados (parte/todo, quociente, razão), sendo que somente 27,3% dos alunos avaliados no ano de 2010 a acertaram. Outros 24,1% resolveram de modo semelhante à maioria dos alunos participantes do trabalho de campo, pois executaram a divisão de 24 por 8, porém apresentaram como resposta o nº 3. O relatório (2010, p.88) conclui que: “É muito provável que estes alunos (24,1%) entendam ‘o todo’ como o maior dos números”. Garcia Silva et al (2013), apoiados nos trabalhos desenvolvidos por Nunes (2003), verificou que a utilização, principalmente, da situação quociente, estimula os alunos a refletirem sobre o uso de frações. Além disso, chamam a atenção para a utilização deste significado ao introduzir o conceito de fração, o que implicaria em uma melhor compreensão do conteúdo pelos alunos. Considerações finais Considerando o estudo realizado, incluindo a aplicação de questões que envolvessem o assunto Fração a um grupo de alunos da 5ª série/ 6º ano do ensino fundamental da rede pública paulista, amparada em entrevistas aos respectivos participantes e à Professora, juntamente com a análise de relatórios do SARESP, utilizando-se de embasamento teórico de estudos de diversos autores conclui-se que apesar da notória desenvoltura em relação à construção da representação significado parte-todo os alunos apresentam considerável dificuldade em compreender situaçõesproblemas que envolvam os assuntos relacionados à equivalência de frações no significado parte-todo e à situação quociente. Acredita-se que esse paradoxo seja fruto do modelo de ensino e aprendizagem adotado nas escolas, conforme apresentado nos PCN: 25 Entre os obstáculos que o Brasil tem enfrentado em relação ao ensino de Matemática, aponta-se a falta de uma formação profissional qualificada, as restrições ligadas às condições, de trabalho, a ausência de políticas educacionais efetivas e as interpretações equivocadas de concepções pedagógicas. (BRASIL, 1998, p.21) Ainda se referindo à formação dos professores do ensino da Matemática no Brasil, os autores dos PCN salientam que: (...) tanto a inicial quanto a continuada, pouco tem contribuído para qualificá-los para o exercício da docência. Não tendo oportunidade e condições para aprimorar sua formação e não dispondo de outros recursos para desenvolver as práticas da sala de aula, os professores apóiam-se quase exclusivamente nos livros didáticos, que, muitas vezes, são de qualidade insatisfatória. (BRASIL, 1998, pp.21-22) Tal ótica sobre o ensino no Brasil é confirmada por Campos (2011, p.1), “O ensino e aprendizagem de frações constituem um obstáculo considerável para professores e alunos, desde o 4º ano do ensino fundamental no Brasil, quando esse tema é abordado.” Corroborando essa perspectiva, Garcia Silva, Campos e Pietropaolo (2011) observaram em seus estudos que, dentre os professores participantes da pesquisa de campo, uma maior parcela apresentou melhor desempenho sobre o significado parte/todo (76,6% de índice de acertos) quando comparado ao significado quociente (64,7% de índice de acertos). Além disso, presenciaram em seus trabalhos a situação em que uma professora, ao executar a adição entre duas frações, realizou a soma dos numeradores e a soma dos denominadores, demonstrando a não compreensão da idéia de equivalência entre frações. Em entrevista aos professores, a maioria informou que suas dúvidas resultavam de um trabalho insatisfatório acerca de números racionais em sua formação inicial. A partir disso, os autores inferiram que os docentes optam por trabalhar o significado parte/todo em vez do significado quociente. Desta forma, tornase perceptível um considerável problema no processo de ensino e aprendizagem dos alunos. A partir de tais colocações, depreende-se que o processo de ensino 26 aprendizagem apresenta lacunas que afetam diretamente o desempenho dos alunos, sobretudo quanto a uma preparação insuficiente de professores, conforme apontadas pelo PCN e pelos autores supracitados. Ou seja, uma ênfase nas aulas de frações sob o aspecto do significado parte-todo eleva o conhecimento do aluno nessa área, o que não se observa em outras situações, como significado quociente e invariante equivalência. Cabe ressaltar que, apesar dos participantes do trabalho de campo não terem obtido resultado satisfatório na questão nº 5 (envolvendo situação quociente), nas outras duas questões aqui apresentadas, eles se destacaram frente ao resultado do SARESP de anos anteriores. Presume-se que isso seja fruto do perfil verificado durante a entrevista realizada com a Professora de Matemática, a qual informou que eles são esforçados e interessados e que, sobretudo, seus pais são participativos, acompanhando de perto o desempenho de seus filhos. Finalmente, com base nos estudos de Campos (2011) e de Garcia Silva et al (2013), apoiados nos trabalhos desenvolvidos por Nunes (2003), também acreditamos que se fosse utilizada a situação quociente nos anos iniciais em que se trabalha frações, poderia vir a surtir mais efeitos positivos no processo de ensino aprendizagem dos alunos. Referências BEHR, M., HAREL, G., POST, T., & LESH, R. Rational number, ratio, proportion. In: D. A. 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Uma investigação sobre a formação inicial de professores de Matemática para o ensino de números racionais no Ensino Fundamental. 2007. Tese (Doutorado) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo 2007. GARCIA SILVA, A. F. O Desafio do Desenvolvimento Profissional Docente: análise da formação continuada de um grupo de professores das séries iniciais do ensino fundamental, tendo como objeto de discussão o processo de ensino e aprendizagem das frações. 2007. Tese (Doutorado em Educação Matemática) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2007. GARCIA SILVA, A. F.; CAMPOS, T. M. M.; PIETROPAOLO, R. C. O desafio do conhecimento profissional docente: análise da formação continuada de um grupo de professores das séries iniciais da educação básica tendo como objeto de discussão o processo de ensino e aprendizagem das frações. UNIÓN Revista Iberoamericana de Educación Matemática, n 28, p. 21-40, dez. 2011. GARCIA SILVA, A. F.;CAMPOS, T. M. M.; PINHEIRO, M. G. C; SOUZA, M. P. Situação quociente:limites e possibilidades. In: XI ENCONTRO NACIONAL DE EDUCAÇÃO MATEMÁTICA, 2013, Curitiba. Anais XI ENCONTRO NACIONAL DE EDUCAÇÃO MATEMÁTICA, 2013. KERSLAKE, D. Fractions: Children's Strategies and Errors: A Report of the Strategies and Errors in Secondary Mathematics Project. Windsor: NFER-Nelson. 1986 KIEREN, T. Rational and Fractional Numbers: From Quotient Fields to Recursive Understanding. In: T. Carpenter, E. Fennema & T. A. Romberg (Eds.), Rational Numbers: An Integration of Research. Hillsdale, N.J.: Lawrence Erlbaum Associates, p. 49-84.1993 MONTEIRO CERVANTES, P. B. Uma formação continuada sobre as frações. 2011. Dissertação (Mestrado em Educação Matemática) – UNIBAN, São Paulo.2011. NUNES, T.; BRYANT, P. Crianças fazendo matemática. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997. _____________________, PRETZLIK, U., EVANS, D., WADE. J. & BELL, D. Vergnaud’s definition of concepts as a framework for research and teaching. Annual Meeting for the Association pour la Recherche sur le Développement des Compétences, Paper presented in Paris: 28-31, January.2004. ––––––; ––––––; CAMPOS, T.; MAGINA, S. Educação matemática: números e operações. São Paulo: Cortez, 2005. _____________________ Key understandings in mathematics learning, Paper 3: Understanding rational numbers and intensive quantities. Nuffield 28 Foundation.2009. SÃO PAULO. Secretaria da Educação do Estado: Relatório do Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo. São Paulo, 2009. SÃO PAULO. Secretaria da Educação do Estado: Relatório do Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo. São Paulo, 2010. VERGNAUD, G. La théorie des champs conceptuels.Recherches en Didactique des Mathématiques, 10 (23), p. 133-170. La Pensée Sauvage, 1990. 29 QUE CONCEPÇÕES DE ÁLGEBRA SURGEM NAS QUESTÕES DE MACROAVALIAÇOES: o caso do ENEM 2011. Regina Lucia da silva – UFABC – SP ([email protected]) Debora da Silva Souza – UFABC – SP ([email protected]) Francisco Jose Brabo Bezerra – UFABC – SP ([email protected]) Resumo: Neste artigo apresentamos nossas primeiras compreensões sobre quais concepções da álgebra surgem nas macroavaliações. Nosso foco foi verificar quais concepções aparecem nas questões da prova ENEM de 2011. Este trabalho é parte dos estudos realizados no Projeto Observatório da Educação da UFABC “Conhecimento matemático para o ensino de álgebra: uma abordagem baseada em perfis conceituais” que visa investigar os conhecimentos algébricos desenvolvidos por professores, ao ensinar álgebra na Educação Básica, utilizando-se de uma abordagem de ensino baseada em perfis conceituais. A pesquisa tem uma abordagem qualitativa, os dados foram coletados e analisados, sendo que das 44 questões, nove questões acreditamos estar no campo da àlgebra. Desta forma, selecionamos para este trabalho a discussão de três delas, cuja a escolha tem por base as competências que constam na Matriz de Referência Para as análises da pesquisa consideramos os seguintes critérios: identificar quais conteúdos algébricos está presente nas questões; verificar quais habilidades necessárias para a resolução de cada questão; reconhecer nas questões, qual concepção de Álgebra está envolvida.Como aporte teórico central das pesquisas realizadas pelos integrantes desse projeto, elegemos as Concepções de Álgebra de Usiskin (1995) apresenta quatro concepções, Lee (2001) aponta seis concepções, Fiorentini, Miorin e Miguel (1993) defendem quatro concepções, Lins e Gimenez (1997) expõem três concepções. A partir dos resultados preliminares, percebemos que as concepções mais frequentes são as de Usiskin (1995). Com relação as situações-problema, destaca-se a contextualização dos conteúdos, na qual apresentam elementos que faz parte do domínio vivencial do aluno, bem como contextos que se articulam com outras disciplinas. A ideia delineada neste trabalho foi o primeiro passo para subsidiar futuras análises que sejam mais elucidativas. Palavras-chave: Concepções, Álgebra, Ensino, Avaliação, Educação Matemática. 30 Introdução Quando se observa os resultados das macroavaliações como a Prova Brasil e o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) percebe-se um movimento crescente em relação ao desempenho dos estudantes em Matemática. Segundo Ribeiro (2012), apesar, desta evolução positiva, com relação no desempenho das notas, ainda não devemos considerar um progresso para a Educação Brasileira. Pois, existem várias lacunas relacionadas às competências matemáticas que os estudantes não desenvolveram. Portanto, há uma necessidade em colaborar na construção destes conhecimentos matemáticos, que ainda não foram adquiridos pelos estudantes. Este autor relata que, um dos campos da matemática que possui deficiência é a Álgebra. Nesse sentido o Projeto do Observatório da Educação “Conhecimento matemático para o ensino de álgebra: uma abordagem baseada em perfis conceituais” (aprovado pela CAPES em 2013), e de autoria de Ribeiro (2012), na UFABC, pretende olhar para os conhecimentos algébricos dos alunos e dos professores, da Educação Básica, quando se ensina Matemática, baseada em perfis conceituais. Nossa coleta de dados foi realizada dentro de um subgrupo de estudos que está inserido neste projeto. A construção deste artigo se apoia no projeto, e toma, como ponto de partida, elementos teóricos que envolvem o Conhecimento Matemático para o Ensino (CME) (BALL; THAMES; PHESPS, 2008) e de Perfil Conceitual (PC) (MORTIMER, 1994). Ribeiro (2013) descreve o modelo teórico Perfil Conceitual citado por Mortimer (1994) sendo: “Segundo esse modelo, conceitos polissêmicos permitem a elaboração de perfis conceituais, os quais são compostos de diferentes zonas, que correspondem a diferentes formas de ver, representar e significar o mundo”. Destacamos que, os resultados apresentados neste artigo são preliminares e que neste primeiro momento de estudos, o nosso objetivo buscou analisar questões de matemática ENEM 2011 que estão no campo da álgebra, pretendendo dessa forma, uma contribuição para melhor entendimento sobre as concepções de Álgebra. Nosso subgrupo, coordenado pelo Professor Dr. Francisco José Brabo Bezerra, da UFABC, buscou analisar e estudar as várias concepções de álgebra, que no presente trabalho destacaremos as concepções que abrangem as três questões por nós selecionadas, dentro de um grupo de nove questões. Por isso, consideramos as leituras dos textos de Usiskin (1995), que considera quatro concepções; Lee (2001) apresenta 31 seis concepções; Lins e Gimenez (1997) três concepções; Fiorentini, Miorin e Miguel (1993) defendem quatro concepções. Para guiar esse momento de trabalho surgiu a seguinte questão norteadora: Quais as questões do ENEM 2011 estão contidas no campo da Álgebra? Ao fazermos alguns levantamentos teóricos sobre as concepções de Álgebra, verificamos que aparecem várias concepções que envolvem este tema. Com isto, reflexões surgiram sobre a relevância de compreender estes significados e, assim, ampliar os estudos do projeto do observatório, bem como os modelos de perfis conceituais. Desta forma, acreditamos ter subsídios para gerar e desenvolver atividades matemáticas que considerem diversas concepções de Álgebra aplicadas nos ensinos fundamental e médio. Dentro do grupo do OBEDUC pretendemos produzir produtos e materiais de cunho pedagógico e curricular para a formação inicial e continuada de professores. Revisão de literatura Nosso ponto de partida, dentro do projeto do OBEDUC, foi perceber que, no caso especifico da Álgebra, a partir dos resultados apresentados pelo Instituto de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), observa-se que os estudantes não dominam competências como (1) identificar um sistema de equações do 1º grau que expressa um problema; (2) resolver equações do 1º grau com uma incógnita; (3) resolver problemas que envolvam equação do 2º grau; (4) identificar a relação entre as representações algébrica e geométrica de um sistema de equações do 1º grau; (5) identificar, em um gráfico de função, o comportamento de crescimento/decrescimento; (6) identificar o gráfico de uma reta dada sua equação; dentre outras. Numa perspectiva de superar tais deficiências, uma vez que a Álgebra, assim como a Matemática, pode ser mais e melhor explorada quando seus significados são articulados com outras áreas do conhecimento (KILPATRICK, HOYLES, SKOVSMOSE, 2005), este artigo foi buscar compreender quais questões do ENEM 2011 estavam relacionadas à álgebra e quais foram as habilidades cobradas no referido exame. Em nossa revisão bibliográfica observamos que o ENEM, criado em 1998, tem o objetivo de avaliar o desempenho do estudante ao fim da escolaridade básica. Podem participar do exame alunos que estão concluindo ou que já concluíram o ensino médio em anos anteriores. Além disso, o ENEM é utilizado como critério de seleção para os estudantes que pretendem concorrer a uma bolsa no Programa Universidade para Todos 32 (ProUni) e também cerca de 500 universidades já usam o resultado do exame como critério de seleção para o ingresso no ensino superior, seja complementando ou substituindo o vestibular. Sendo assim, fomos buscar quais habilidades são avaliadas no exame no que se diz respeito à álgebra e encontramos tais habilidades nas matrizes de referência do exame. São elas: H19 - Identificar representações algébricas que expressem a relação entre grandezas; H20 - Interpretar gráfico cartesiano que represente relações entre grandezas; H21 - Resolver situação-problema cuja modelagem envolva conhecimentos algébricos; H22 - Utilizar conhecimentos algébricos/geométricos como recurso para a construção de argumentação; e H23 - Avaliar propostas de intervenção na realidade utilizando conhecimentos algébricos. Tais habilidades se encontram na competência de área 5 na qual se espera que o aluno possa modelar e resolver problemas que envolvam variáveis socioeconômicas ou técnico-científicas, usando representações algébricas. No texto “Álgebra na Escola Básica e os Papéis das Variáveis” (Adaptado de Concepções sobre a álgebra da escola média e utilizações das variáveis) Usiskin (1995) traz a ideia de que o conceito de variável é multifacetado e isso não nos permite reduzir a álgebra ao estudo das variáveis apenas. Para ele, em álgebra não há uma única concepção para variável. O autor nos apresenta quatro diferentes concepções, que detalharemos a seguir. Na primeira concepção temos a álgebra como aritmética generalizada. Aqui as ações importantes para o estudante da escola básica são as de traduzir e generalizar. Já na segunda concepção concebe a álgebra como estudo de procedimentos para resolver certos tipos de problemas. Assim, para resolver uma equação, devemos raciocinar exatamente de maneira oposta à que empregaríamos para resolver o problema aritmeticamente, as instruções chaves são simplificar e resolver. O aluno precisa dominar não apenas a capacidade de equacionar os problemas, como também precisa ter habilidades em manejar matematicamente essas equações. A terceira concepção relaciona-se à álgebra como estudo das relações entre grandezas. Nessa concepção as variáveis realmente variam, o modelo é fundamentalmente algébrico e as variáveis são diferentes do argumento como, por exemplo, a equação de uma reta. E finalmente na quarta concepção temos a álgebra como estudo das estruturas, e nesse caso temos os produtos notáveis, fatoração, operações com monômios e polinômios e as instruções chaves são manipular e justificar. 33 Lee (1996) em seu texto: “An Initiation Into Algebraic Culture Through Generalization Activities” nos traz a relevância da introdução da álgebra quando queremos generalizar atividades. Ela afirma que a álgebra é uma minicultura dentro da cultura da matemática. Nesse sentido a álgebra é uma linguagem, e quando há interação entre a linguagem e o conhecimento ocorre um gradual processo de aculturação algébrica. Ao enfatizar que para introduzir álgebra como uma atividade cujo foco seja padrão de generalização, Lee (1996) afirma que isso pode auxiliar o aluno a compreender com certo grau de facilidade a tarefa. Ela afirma também que a introdução à álgebra, por meio de funções, resolução de problemas e modelagem, propiciam de modo adequado à utilização da generalização de atividades e, assim, iniciar os alunos na cultura algébrica. Em outro estudo sobre álgebra Lee (2001) diz que para fornecer um modelo sobre visões de concepções de álgebra, destaca-se a álgebra como: Linguagem para desenvolver a comunicação em uma linguagem algébrica; Caminhos de Pensamento, ou seja, pensamentos sobre relações matemáticas em lugar de objetos matemáticos; Atividade como modelo de construção de atividades; Ferramenta para resolver problemas de modo a veicular e transformar mensagens; Generalização ou estudo das estruturas da aritmética; e Cultura cuja linguagem de comunicação é a algébrica. Repensando a Educação Algébrica Elementar, autores como: Fiorentini, Miorin e Miguel, (1993) trazem algumas concepções sobre álgebra por meio do desenvolvimento histórico e uma segunda leitura do desenvolvimento da álgebra que se apoia na contribuição das diversas culturas à constituição desse campo de conhecimento. Tal compreensão da Álgebra assenta-se em outros aspectos e não mais nos aspectos exteriores da linguagem algébrica, ou seja, no significado que contém os símbolos desta linguagem. Os autores Fiorentini, Miorin e Miguel, (1993) antes de iniciar a discussão sobre as concepções de Educação Algébrica, colocam uma questão: em que medida se relacionam as concepções dominantes de Educação Algébrica que se manifestaram ao longo da história da Educação Matemática elementar com as concepções mais frequentes de Álgebra? E eles apresentam três concepções: Linguístico-pragmática, Fundamentalista-estrutural, e Fundamentalista-analógica. Na primeira concepção 34 prevalece a crença de que a aquisição, ainda que mecânica, das técnicas requeridas pelo “transformismo algébrico” seria necessária e suficiente para que o aluno adquirisse a capacidade de resolver problemas, ainda que esses problemas fossem, quase sempre, artificiais, no sentido de que não era a natureza e relevância deles que determinariam os conteúdos algébricos a serem aprendidos, mas a forma como “fabricar” um problema para cuja solução tais e tais tópicos, tidos como indispensáveis, deveriam ser utilizados. Já na Fundamentalista-estrutural ocorre à introdução de propriedades estruturais das operações, que justificassem logicamente cada passagem presente no transformismo algébrico, capacitaria o estudante a identificar e aplicar essas estruturas nos diferentes contextos em que estivessem subjacentes. Isto traria como consequência uma reorganização dos tópicos algébricos (expressões algébricas, valores numéricos, operações, fatoração). E na última, temos a síntese entre as duas anteriores, uma vez que procura, por um lado, recuperar o valor instrumental da Álgebra e, por outro, manter o caráter fundamentalista só que não mais de forma lógico-estrutural de justificação das passagens presentes no transformismo algébrico. Já os autores Linz e Gimenez (2001) trazem a ideia de que a atividade algébrica é descrita como “fazer ou usar álgebra”. Para eles, dizer que essa atividade algébrica é um cálculo com letras é uma tolice. Os autores corroboram com essa ideia sobre álgebra em um capítulo do livro “Perspectivas em Aritmética e Álgebra para o século XXI” cuja ideia central é perceber que as atividades algébricas são cálculos com letras, e afirmam que: “Não é simplesmente adotar uma caracterização da atividade algébrica com cálculo literal, mas buscar mostrar como uma suposta linha de desenvolvimento histórico da álgebra pode ser retraçada seguindo o desenvolvimento das notações algébricas.” (Lins e Gimenez, 2001, p. 90). Esses autores apresentam três concepções sobre a educação algébrica. A primeira diz respeito à concepção letrista que resume o cálculo com letras as atividades citadas como algébricas que envolvem atividades baseadas em cálculo com letras, admitindo a sequência técnica-prática, via algoritmo – exercícios. A segunda concepção é denominada letrista facilitadora, que por meio de trabalho com situações concretas é considerada a capacidade de lidar com expressões algébricas literais alcançadas por abstração. As atividades propostas são o uso de áreas para ensinar produtos notáveis, balança de dois pratos para ensinar resolução de equações. E a terceira concepção de 35 modelagem matemática nos apresenta como ponto de partida uma situação concreta, porém com sentido diferente da segunda concepção, pois o concreto aqui é visto como real e as atividades proposta são de investigação de situações reais. Será de posse desse arcabouço teórico que iremos analisar e discutir as três questões escolhidas pelo subgrupo, e podemos afirmar que as mesmas pertencem ao campo da álgebra, pois apresentaram elementos suficientes que podemos destacar segundo os autores estudados. Procedimentos metodológicos Este presente artigo se apoia na metodologia qualitativa (BODGAN; BIDKLEN, 1994), já que descreveremos todos os avanços de nossa pesquisa com riqueza de detalhes. O processo de coleta de dados deste trabalho está baseado em pesquisa de caráter documental. Para tanto utilizamos como instrumento de pesquisa a avaliação de matemática do ENEM 2011. O primeiro passo foi selecionar as questões que consideramos estar no campo da Álgebra, e nesta busca identificamos nove questões. Das nove questões identificadas, optamos por analisar três delas, que a nosso ver contemplam a grande maioria. O segundo passo teve ênfase nos estudos sobre as concepções de Álgebra, no qual formamos um conjunto de teorias com seus principais aspectos, tendo por base a bibliografia sugerida, a Matriz de Referência e a consulta dos Microdados no INEP do ENEM 2011. Para analisar as questões por nós selecionadas, nos baseamos em três critérios, a saber: identificar quais conteúdos algébricos está presente nas questões; verificar quais habilidades necessárias para a resolução de cada questão; e por último, reconhecer em cada questão, qual concepção de Álgebra estava envolvida. Análise das questões do ENEM 2011 Ao analisar as questões do ENEM 2011 tivemos por objetivo observar que conteúdos, habilidades e concepções de álgebra aparecem nesta avaliação. No primeiro momento notamos que, das 44 questões de Matemática e suas Tecnologias, nove questões fazem referência a Álgebra. Para o presente artigo vamos destacar somente três 36 questões da prova Amarela do 2o dia. Os motivos de nossa escolha foram: a primeira, questão 139 está situada na competência II – capacidade de compreender fenômenos (no caso, outra disciplina recorrendo ao instrumental matemático adequado); a segunda, questão 153 se localiza na competência III- Enfrentar situações-problema (interpretar os dados e tomar decisões): a terceira, questão 160 percebemos a competência I – Dominar Linguagens (as linguagens da Matemática (linguagem natural sendo transposta para linguagem algébrica)). Neste caso, estudos indicam que pode haver uma boa leitura, mas não garante a transposição adequada. Além de surgir dois objetos do conhecimento algébrico: Função e Equação. Apresentaremos a seguir as três questões escolhidas, e em cada uma faremos uma discussão em relação à habilidade descrita na matriz de referência do ENEM, bem como qual das concepções a questão se caracteriza melhor, e finalmente qual conteúdo algébrico se faz presente. A primeira questão a ser analisada é a de número 139, presente na prova amarela de 2011, conforme identificada na figura 1. Figura 1 - Questão 139 do ENEM-2011 e sua resolução sugerida pelo nosso Grupo Fonte: Questão 139 da prova Amarela do ENEM – 2011. Este problema, apresentado na figura 1, abrange o conteúdo algébrico de função logarítmica e as propriedades dos logaritmos que se fazem presentes no ensino de Matemática do Ensino Médio. A nosso ver a questão está diretamente relacionada com a 37 Habilidade de número 21, que diz: Resolver situação-problema cuja modelagem envolva conhecimentos algébricos. Quanto à concepção de álgebra que a caracteriza, reconhecemos que a segunda concepção de Usiskin (1995) é a que melhor se aproxima, pois ela é tida como estudo de procedimentos para resolver certos tipos de problemas, e ainda podemos relacionada à primeira concepção de Fiorentini et al. (1993), a linguístico-pragmática onde prevalece a crença de que a aquisição do conhecimento se dá modo mecânico, com uso de técnicas requeridas pelo “transformismo algébrico” seria necessária e suficiente para que o aluno consiga resolvê-la. Figura 2 – Questão 153 do ENEM 2011 e sua resolução sugerida pelo nosso Grupo Fonte: Questão 153 da prova Amarela do ENEM – 2011. A questão, apresentada na figura 2 acima, podemos destacar que o conteúdo algébrico evidenciado foi o das equações. Para a resolução da mesma acreditamos estar relacionada à habilidade de número 23, pois trata de avaliar proposta de intervenção na realidade utilizando conhecimentos algébricos. A fórmula para resolução da mesma é apresentada juntamente com a questão, e cuja variável é funcional (altura). A característica desta questão consiste em relacionar conhecimentos matemáticos à realidade cotidiana. Após a resolução o aluno poderá realizar a interpretação de seu resultado, analisando se o IMC ou o IAC encontram-se em níveis normais ou não. Em 38 relação à concepção de Álgebra identificamos que a terceira concepção de Lins e Gimenez (1997), que relata sobre a Modelagem Matemática, pode ser adequada, e mesmo a concepção da Lee (2001), que afirma ser uma atividade. Além dessas possibilidades, poderíamos também classifica-la dentro da segunda concepção de Usiskin (1995), que a concebe como estudo de procedimentos para resolver certos tipos de problemas. Figura 3 – Questão 160 do ENEM 2011 e sua resolução sugerida pelo nosso Grupo Fonte: Questão 160 da prova Amarela do ENEM – 2011. Na questão de número 160, representada na figura 3 acima, consideramos que o conteúdo algébrico abordado faz referência ao conceito de Função Afim, uso de sistemas lineares com a resolução de uma equação na variável n. A princípio a questão contempla a linguagem natural que deverá ser transposta para a linguagem algébrica. Neste caso, o aluno deverá expressar a resolução em uma equação. A questão pode ser enquadrada na habilidade 5, que aborda sobre a avaliação de propostas de intervenção na realidade utilizando os conhecimentos numéricos. A questão foi por nós classificada dentro das concepções de Fiorentini et al. (1993), como sendo fundamentalista estrutural, pois ocorreu a introdução de propriedades estruturais das operações, que justificassem logicamente cada passagem presente no transformismo algébrico. Também a classificamos dentro da quarta concepção de Usiskin (1995), que considera a álgebra como estudo das estruturas, e nesse caso temos os produtos notáveis, fatoração, 39 operações com monômios e polinômios e as instruções chaves são manipular e justificar. Considerações finais Este trabalho faz parte de um projeto mais amplo, no qual esta primeira etapa teve por objetivo analisar questões de Matemática ENEM 2011 que estão no campo da Álgebra. Uma característica que podemos citar refere-se às questões apresentarem no seu contexto temas com referências no cotidiano do educando. As abordagens das questões, com relação aos conceitos matemáticos, necessitam que o aluno tenha o domínio e a habilidade para resolver as questões em muitos contextos, que podem ser matemáticos ou outras áreas do conhecimento (Biologia, Física, Química). Quanto à questão de pesquisa, notamos que as concepções de Álgebra que mais aparecem são as concepções de Usiskin, tendo em vista que elas se encaixam em todas as questões aqui apresentadas. Apesar do universo escolhido ser pequeno, ainda assim é possível afirmar que suas concepções estabelecem maiores interligações com as questões que os demais autores. Este estudo não termina aqui, e futuras analises pretendem ser maiores e mais esclarecedoras. Na perspectiva do presente trabalho, temos a pretensão de obter subsídios para: compreender o papel de atividades matemáticas que contemplem perfis conceituais de conceitos matemáticos do campo da Álgebra, na formação inicial e/ou continuada dos professores envolvidos com/na pesquisa e identificar e mapear os diferentes conhecimentos algébricos que emergem na interação dos professores com as atividades. Referências BALL, D. L. et al. Content knowledge for teaching: What makes it special? In: Journal of Teacher Education, n.59, p. 389-407, 2008. BODGAN, R. C.; BIKLEN, S. K. Investigação Qualitativa em Educação: uma Introdução à Teoria e aos Métodos. Tradutores: Maria João Alvarez, Sara Bahia dos Santos e Telmo Mourinho Baptista. Portugal: Porto Editora Ltda, 1994. 40 BRASIL. Ministério da Educação. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP). Disponível em < http://portal.inep.gov.br/web/enem/enem >. Acesso em: 12/07/13. _______. Matriz de Referência ENEM 2011. Disponível em <http://www.ceps.ufpa.br/daves/PS%202012/PS%202012%20ENEM.pdf>. Acesso em: 06/08/13. FIORENTINI, D.; MIORIM, M. A.; MIGUEL, A. Contribuição para um repensar a educação algébrica elementar. CIDADE: Pro-Posições, v.4, n.1 (10), p. 78-91, 1993. KIERAN, C. Cognitive processes involved in learning school algebra. In: Mathematics and Cognition: a Research Synthesis by the International Group for the Psychology of Mathematics Education. Cambridge: Cambridge University Press, 1990. KILPATRICK, J. et al. Meaning in mathematics education. New York: Springer, 2005. LEE, L. Early – but which algebra? The future of the teaching and learning of algebra. CIDADE: ICMI STUDY CONFERENCE, 2001. ____. Approaches to algebra – Perspectives for Research and Teaching. London: Kluwer Academic Publishers, 1996. v.18. LINS, R. C.; GIMENEZ, J. Perspectivas em aritmética e álgebra para o século XXI. Campinas: Papirus, 1997. _______________________. Perspectivas em aritmética e álgebra para o século XXI. EDIÇÃO Campinas: Papirus, 2001. MORTIMER, E.F. Evolução do atomismo em sala de aula: mudança de perfis conceituais. São Paulo, SP, 1994. TESE (Doutorado em Educação), Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, 1994. RIBEIRO, A. J. Equação e conhecimento matemático para o ensino: relação e potencialidades para a Educação Matemática. Bolema, n. 26, p. 535-558, 2012. USISKIN, Zalman. Concepções sobre álgebra da escola média e utilização das variáveis. In: COXFORD, A.F.; SHULTE, A.P. As ideias da álgebra. São Paulo: Atual, 1995, p. 9-22. 41 AS AVALIAÇÕES EXTERNAS NA FORMAÇÃO DOCENTE E NO ENSINO DE MATEMÁTICA Simone Bueno PUC – SP ([email protected]) Edvonete Souza de Alencar PUC – SP ([email protected]) Resumo: Este trabalho é de natureza exploratória, no qual realizamos uma triangulação entre os dados das avaliações externas, teóricos de base das temáticas - avaliação e de formação de professores - e pesquisas com este enfoque. Nosso objetivo nesse estudo é identificar como as avaliações externas podem influenciar o planejamento docente ao ensinar Matemática. Como referencial teórico abordamos Luckesi (1998), Hoffman (1995) e Ball (1988). Utilizamos os dados das avaliações externas do Programme for International Student Assessment (Pisa), Prova Brasil e Sistema de Avaliação e Rendimento do Estado de São Paulo (Saresp). Ao compararmos com nossa teoria sobre avaliação verificamos a preocupação dos autores com medir e avaliar e ao mesmo tempo nos indicam a necessidade de utilização das avaliações externas para o replanejamento das ações. Tais indícios são corroborados pelas pesquisas que indicam a necessidade de utilização das avaliações externas nas ações de replanejamento. Ao observar os dados das avaliações externas e articular com estudos teóricos e científicos, percebemos a importância de investigar as dificuldades dos alunos. Esse olhar investigativo deve ser incentivado nas formações docentes. A busca pela qualidade na escola configura-se como um grande desafio e demanda estratégias que possam modificar a situação da baixa qualidade da aprendizagem e melhores condições de trabalho para o professor. Acreditamos que a qualidade de ensino não deve estar apenas atrelada ao rendimento escolar ou ao rankeamento entre as instituições de ensino. Evidenciamos ainda que utilizar desses dados não requer desenvolvermos moldes ou treinamentos a serem desenvolvidos em sala de aula, mas propiciar a reflexão dos dados e conteúdos por eles abordados. Palavras-chave: Avaliação, Formação de professores e Planejamento. 42 Introdução Atualmente vê-se a preocupação de algumas instituições com o desempenho dos alunos nas avaliações externas e como estão sendo utilizados os dados para a implementação de políticas públicas que promovam a melhoria dos resultados. As avaliações externas demonstram a dificuldade dos alunos em todos os conteúdos e segmentos do ensino, principalmente em Matemática. O Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais (INEP), vinculado ao Ministério da Educação (MEC), promove estudos, pesquisas e avaliações sobre o Sistema Educacional Brasileiro com o objetivo de subsidiar a formulação e implementação de políticas públicas para a área educacional a partir de parâmetros de qualidade e equidade, bem como produzir informações claras e confiáveis aos gestores, pesquisadores, educadores e público em geral. Esse instituto sinaliza um nível progressivo de dificuldade nos finais dos ciclos de ensino, especificamente no 5° ano do Ensino Fundamental I, 9 ° ano do Ensino Fundamental II e 3° ano do Ensino Médio. Tal fato acreditamos ser influenciado por condições ambientais, econômicas, a falta de valorização da profissão de professor, sem contar as condições de trabalho do docente . Todos estes aspectos influenciam nas ações do professor , e assim inferimos que este profissional possui formação deficitária o que dificulta suas ações de planejamento , o que por sua vez atingirá a questão de qualidade de ensino. Nesse cenário, nosso intuito com este estudo é identificar como as avaliações externas podem influenciar o planejamento. Para a realização desta pesquisa analisamos os dados das avaliações do Pisa do ano de 2012, Prova Brasil e Saresp do ano de 2011, relacionando a teoria quanto ao aspecto da avaliação e as pesquisas na área de estudo. As avaliações externas Com o intuito de obtermos uma melhor descrição de cada avaliação apresentaremos os principais aspectos que a constituem. O Programme for International Student Assessment (Pisa), em tradução nossa, Programa Internacional de Avaliação de Estudantes, trata de “uma iniciativa internacional de avaliação comparada, aplicada a estudantes na faixa dos 15 anos, idade em que se pressupõe o término da escolaridade básica obrigatória na maioria dos países.” (In: http://portal.inep.gov.br/pisa-programa-internacional-de-avaliacao-de43 alunos). A sua organização e desenvolvimento é realizada pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), no qual em cada pais há uma instituição que coordena as ações, no Brasil a instituição responsável pela coordenação é o INEP, que tem como objetivo “produzir indicadores que contribuam para a discussão da qualidade da educação nos países participantes, de modo a subsidiar políticas de melhoria do ensino básico”(In: http://portal.inep.gov.br/pisa-programainternacional-de-avaliacao-de-alunos). Com isso essa avaliação pretende verificar até que ponto as instituições estão preparando adequadamente os alunos para a sociedade atual. Estas ocorrem trienalmente e compõem–se por três áreas do conhecimento: Leitura, Matemática e Ciências. Especificamente neste artigo discutiremos os conhecimentos matemáticos. Este ainda possui questionários para os discentes e para as instituições, com o intuito de definir o perfil socioeconômico, educacional e demográfico. O INEP criou em 2005 a Prova Brasil com o intuito de identificar as dificuldades e subsidiar a qualidade da educação, assim como analisar indicadores do seu público. Segundo dados do site da Prova Brasil sua aplicação ocorreu somente em 2007. Cabe salientar que estes dados também são utilizados no cálculo do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica ( IDEB). A sua aplicação ocorre no 5º ano do Ensino Fundamental I, 9º ano do Ensino Fundamental II e no 3º ano do Ensino Médio de escolas públicas urbanas e rurais com no mínimo 20 alunos por classe. Esta avaliação é orientada pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) possuindo descritores de referência e compostas pelas disciplinas de Português e Matemática. Assim como o Pisa há nesta avaliação o questionário socioeconômico, porém as seleções são por amostragens. O Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo (Saresp ) é uma avaliação cessionária, realizada no Estado de São Paulo, sendo um dos indicadores que compõem o índice de Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo ( IDESP). O SARESP, por meio de aplicação de provas para os alunos e questionários que respondidos por professores, pais, alunos, gestores de ensino, o busca traçar metas e monitorar ações para o ensino das escolas públicas para que possam aprimorar o ensino. Atinge o segmento do 2° ano e 5° ano do Ensino Fundamental I, 7° ano e 9 ° ano do Ensino Fundamental II, e o 3º ano do Ensino Médio, sendo composta por habilidades que estão inseridas nas disciplinas de Língua Portuguesa, Matemática e 44 Ciências. Cabe salientar que estas habilidades permitem a composição de itens- questões para essa avaliação. Cenário das avaliações Em nossas análises, utilizando os dados fornecidos pelo Pisa, identificamos que o número de alunos participantes aumentou no decorrer dos anos, e em relação ao desempenho, se formos considerar a média das três áreas, podemos observar que Matemática é a que apresenta melhor desempenho. Quadro 1 – Evolução e crescimento em relação ao desempenho de Matemática ao longo dos anos Pisa 2000 Número de alunos participantes Pisa 2003 Pisa 2006 Pisa 2009 Pisa 2012 4.893 4.452 9.295 20.127 18.589 Leitura 396 403 393 412 410 Matemática 334 356 370 386 391 Ciências 375 390 390 405 405 Fonte : http://portal.inep.gov.br/internacional-novo-pisa-resultados Na disciplina de Matemática saímos em 2000 de 334 pontos para em 2012 atingir 391 pontos, no entanto, temos que observar que a média da OCDE é de 494 pontos. Com as avaliações externas da Prova Brasil 2011 e Saresp 2011, conseguimos realizar um comparativo entre as dificuldades encontradas nos conteúdos. Quadro 2 – O que é avaliado na Prova Brasil e Saresp? DADOS DO 5° ANO Prova Brasil Saresp D7- Resolver problemas significativos Nível abaixo do básico utilizando unidades de medidas padronizadas como Km- m-cm-mm. As habilidades não foram divulgadas pelo documento 23% D11- Resolver problema envolvendo o Nível adequado 45 cálculo do perímetro de figuras planas, H13- Resolver problemas envolvendo a desenhadas em malhas quadriculadas multiplicação e a divisão, especialmente 23% em situações relacionadas à comparação entre razões e a configuração retangular D13Reconhecer e utilizar 39,6% características do sistema de numeração decimal, tais agrupamentos e trocas na H27- Resolver problemas envolvendo o base 10 e princípio do valor posicional. cálculo do perímetro de figuras planas, 25% desenhadas em malhas quadriculadas 45% D25 – Resolver problema com números racionais expressos na forma decimal, H16 – Resolver problema envolvendo envolvendo diferentes significados de noções de porcentagem adição e subtração 26% (25%,50%,100%) 47,7% D19 – Resolver problema com números naturais, envolvendo diferentes significados da adição ou subtração: juntar, alteração de um estado inicial (positiva ou negativa), comparação e mais de uma transformação (positiva ou negativa) 27% H13- Resolver problemas envolvendo a multiplicação e a divisão, especialmente em situações relacionadas a comparação entre razões e a configuração retangular 47,9% H 24- Efetuar cálculos envolvendo valores de cédulas e moedas em D 27 – Ler informações e dados situações de compra e venda apresentados em tabelas 27% 48,3% D9- Estabelecer relações entre horário H 24- Efetuar cálculos envolvendo de inicio e término e ou o intervalo da valores de cédulas e moedas em duração de um evento ou acontecimento situações de compra e venda 33% 48,8% D18 – Calcular o resultado de uma H 15- Resolver problemas com números multiplicação e divisão de números racionais expressos na forma decimal naturais 36% envolvendo diferentes significados da adição ou subtração. 49,3% D1- Identificar a localização – movimentação de objeto em mapas, Nível avançado croquis e outras representações gráficas H27- Resolver problema envolvendo o 37% cálculo do perímetro de figuras planas, D26- Resolver problema envolvendo desenhadas em malhas quadriculadas. noções de porcentagem (25%, 34,5% 50%,100%) 37% H18 – Identificar formas geométricas D4- Identificar quadriláteros observando tridimensionais como esfera, cone etc. as relações entre seus lados (paralelos, ou formas bidimensionais como congruentes, perpendiculares) quadrado, triangulo etc sem o uso 46 38% obrigatório de nomenclatura 39,4% D3- Identificar propriedades comuns e H04- Identificar representações de um diferenças entre figuras bidimensionais mesmo número racional pelo número de lados e pelos tipos de 17,4% ângulos 39% Questões abertas D22- Identificar a localização de números racionais representados na H16 – Resolver problema envolvendo noções de porcentagem forma decimal na reta numérica. 40% (25%,50%,100%) 41,4% D10- Estabelecer em um problema troca de cédulas e moedas do sistema H28- Resolver problema envolvendo o monetário brasileiro, em função de seus cálculo ou estimativa de áreas de figuras planas, desenhadas em malhas valores. 42% quadriculadas. 27,7% H06Identificar fração como representação que pode estar associada a diferentes significados (parte – todo, quociente – razão) 27,3% DADOS DO 9° ANO Prova Brasil Saresp D1 – Identificar a localização, Nível abaixo do básico movimentação de objeto em mapas, croques e outras representações gráficas. Não foi divulgado pelo documento 36% Nível Básico D2 – Identificar propriedades comuns e H1 – Reconhecer as diferentes diferenças entre figuras bidimensionais representações de um número racional. e tridimensionais, relacionando as com 45,9% as suas planificações. 45% Nível Adequado D3Identificar propriedades de triângulos pela comparação de medidas H15 – Resolver problema com números racionais envolvendo as operações de lados. 40% (adição, subtração, multiplicação, D4 – Identificar a relação entre divisão, potenciação e radiciação) 40,2% quadriláteros por meio de suas H16 – Resolver problema que envolva propriedades 36% porcentagem. 34,8% D5- Reconhecer a conservação ou modificação de medidas dos lados , do H30 – Resolver problemas em diferentes 47 perímetro , da área em ampliação e ou contextos envolvendo triângulos redução de figuras poligonais usando semelhantes. 37,2% malhas quadriculadas 48% Nível Avançado D6 – Reconhecer ângulos como mudança de direção ou giros H06 Identificar um sistema de equações identificando ângulos retos ou não retos. do 1° grau que expressa um problema 34,2% 38% D7 – Reconhecer que as imagens de uma figura construída por uma transformação homotética são semelhantes, identificando propriedades e / ou medidas que se modificam ou não se alteram. 30% H09- Utilizar a notação científica como forma de representação adequada para números muito grandes ou muitos pequenos. 22% D8- Resolver problema utilizando propriedades dos polígonos ( soma de seus ângulos internos, número de diagonais, calculo de medida de cada ângulo interno nos polígonos regulares. 43% H27 – reconhecer circulo/circunferência, seus elementos e algumas de suas relações . 19,8% H11- Efetuar cálculos simples com valores aproximados de radicais. 17,6% H28 – Usar o plano cartesiano para representação de pares ordenados e coordenadas cartesianas e equações D9Interpretar informações lineares. 30% apresentadas por meio de coordenadas H29- Resolver problema utilizando cartesianas. 37% propriedade dos polígonos (somo de D10- Utilizar relações métricas do seus ângulos internos, numero de triângulo retângulo para resolver diagonais calculo da medida de cada problemas significativos. 18% ângulo interno nos polígonos regulares) D12- Resolver problema envolvendo o 26% cálculo de perímetro de figuras planas. H36 – Resolver problemas em diferentes 38% contextos, envolvendo as relações D13- Resolver problema envolvendo o métricas dos triângulos retângulos ( teorema de Pitágoras) 34,2% calculo de área de figuras planas 39% D14 – Resolver problemas envolvendo H44- Resolver problemas envolvendo processos de contagem do principio noções de volume 26% multiplicativo. 8,5% D15 – Resolver problema utilizando relações entre diferentes unidades de Questões abertas medida. 26% H15 – Resolver problema com números D18- Efetuar cálculos com números racionais envolvendo as operações ( inteiros, envolvendo as operações adição, subtração, multiplicação, divisão 48 (adição, subtração, multiplicação, , potenciação e radiciação) divisão e potenciação ) 43% H20 – Resolver problemas envolvendo D20 – Resolver problemas com relações de proporcionalidade direta números inteiros, envolvendo as entre duas grandezas por meio de operações (adição, subtração, funções de 1° grau. 5,1% multiplicação, divisão e potenciação) H30- Resolver problemas em diferentes 37% contextos envolvendo triângulos D21 – Reconhecer diferentes semelhantes. 2,8% representações de um número racional H32 – Calcular o volume de prismas em 32% diferentes contextos. 3,9% D23 – Identificar frações equivalentes H42 - Resolver problema envolvendo 26% informações apresentadas em tabelas em D24 – Reconhecer representações gráficos. 8,1% decimais dos números racionais como uma extensão de numeração decimal, identificando a existência de ordens como décimos, centésimos e milésimos. 26% D25- Efetuar cálculos que envolvam operações com números racionais ( adição, subtração, multiplicação, divisão,potenciação) 26% D26- Resolver problemas com números racionais envolvendo as operações (adição, subtração, multiplicação, divisão e potenciação) 24% D27- Efetuar cálculos simples com valores aproximados de radicais. 15% D28 – Resolver problema que envolva porcentagem 26% D29 – Resolver problemas que envolva variação proporcional direta ou inversa entre grandezas. 29% D30 – Calcular o valor numérico de uma expressão algébrica 26% D31 – Resolver problemas que envolva 49 equação do 2° grau 45% D32 – Identificar a expressão algébrica que expressa uma regularidade observada em sequência de números de figuras (padrões) 33% D33 – Identificar uma equação ou inequação do 1° grau que expressa um problema. 34% D34 – Identificar um sistema de equações do 1° grau que expressa um problema. 43% D35 – Identificar a relação entre as representações algébricas e geométricas de um sistema de equações do 1° grau. 33% D36 – Resolver problemas envolvendo informações apresentadas em tabelas ou gráficos 28% Com a observação desses dados verificamos que as habilidades no decorrer dos anos se tornam-se mais complexas e portanto inferimos que também as prováveis dificuldades dos alunos nos anos iniciais ficam mais complexas no decorrer dos anos escolares. Um convite à reflexão: referencial teórico A avaliação da aprendizagem escolar vem sendo objeto de constantes pesquisas e estudos e está presente na vida de todos nós que, de algum modo, estamos comprometidos com atos e práticas educativas. Professores, alunos, demais profissionais da equipe pedagógica, os responsáveis pelos alunos, gestores das atividades educativas públicas e privadas, administradores da educação, todos, estamos cada vez mais preocupados com essa temática que vem ocupando cada vez mais espaço em nosso sistema educacional. 50 De acordo com Azâmor e Naiff (2009) a avaliação da aprendizagem escolar vem passando por modificações, com o propósito de atender às novas demandas que surgem no ambiente escolar. Os instrumentos de avaliação cada vez mais tornam-se alvo de indagações, reflexões e críticas, por grande parte dos estudiosos da educação, como Luckesi (1998), que considera que o atual processo de aferição da aprendizagem é sob a forma de verificação e não de avaliação. No entender desse autor, o conceito de verificação: “...emerge das determinações da conduta de, intencionalmente, buscar “ver se algo é isso mesmo...”, “investigar a verdade de alguma coisa...” O processo de verificar configura-se pela observação, obtenção, análise e síntese dos dados ou informações que delimitam o objeto ou ato com o qual se está trabalhando. A verificação encerra-se no momento em que o objeto ou ato de investigação chega a ser configurado, sinteticamente, no pensamento abstrato, isto é, no momento em que se chega à conclusão que tal objeto ou ato possui determinada configuração”(LUCKESI,2008 p. 92) Desse modo, entendemos que a verificação é uma ação que “congela” o objeto, pois não permite que se retire consequências novas ou significativas. Na contramão da verificação, a avaliação transpõe a configuração do objeto, direcionando num trilha dinâmica de ação. No entender de Luckesi (1998) o conceito de avaliação é formulado a partir das determinações da conduta de “atribuir um valor ou qualidade a alguma coisa, ato ou curso de ação...” (pg.92), portanto o ato de avaliar não se encerra na atribuição de um valor ou qualidade atribuído a um objeto, a avaliação é um processo dinâmico e que implica: “...coleta, análise e síntese dos dados que configuram o objeto da avaliação, acrescido de uma atribuição de valor ou qualidade, que se processa a partir da comparação da configuração do objeto avaliado com um determinado padrão de qualidade previamente estabelecido para aquele tipo de objeto. O valor ou qualidade atribuídos ao objeto conduzem a uma tomada de posição a seu favor ou contra o objeto, ato ou curso de ação, a partir do valor ou qualidade atribuídos, conduz a uma decisão nova: manter o objeto como está ou atuar sobre ele.”(Luckesi, 1998, p. 93) 51 No entender desse autor, uma avaliação escolar conduzida de forma inadequada pode, consequentemente, ocasionar a repetência do aluno, ou mesmo causar sua evasão. Nesse contexto, entendemos que uma avaliação da aprendizagem quando bem empregada pode ser uma ferramenta para a melhoria do ensino, visto que a avaliação descreve quais conhecimentos os alunos adquiriram relativos a um assunto, podem revelar quais objetivos do ensino os educandos já atingiram em um determinado momento de sua vida escolar e em quais conteúdos apresentam mais dificuldades ou facilidades. Esse conjunto de informações são necessários para que o professor por meio de estratégias possa auxiliar os educandos a resolver as dificuldades encontradas. Nesse contexto, Hoffmann (1995, p. 21) defende que: "A avaliação deixe de ser o momento terminal do processo educativo [...] para se transformar na busca incessante de compreensão das dificuldades do educando e na dinamização de novas oportunidades de conhecimento". Portanto, entendemos que a avaliação deve ser um processo contínuo, realizada em diferentes momentos, subsidiando as decisões a respeito da aprendizagem dos educandos pelo professor. Nesse cenário a concepção de avaliação dos Parâmetros Curriculares Nacionais vai além da visão tradicional, para ser compreendida como parte integrante do processo educacional, de modo que possibilite ao professor uma reflexão contínua sobre sua prática e realizando os ajustes necessários para que ocorra a aprendizagem dos alunos. A avaliação subsidia o professor com elementos para uma reflexão contínua sobre a sua prática, sobre a criação de novos instrumentos de trabalho e a retomada de aspectos que devem ser revistos, ajustados ou reconhecidos como adequados para o processo de aprendizagem individual ou de todo grupo. Para o aluno, é o instrumento de tomada de consciência de suas conquistas, dificuldades e possibilidades para reorganização de seu investimento na tarefa de aprender. Para a escola, possibilita definir prioridades e localizar quais aspectos das ações educacionais demandam maior apoio. (BRASIL, 1997, p. 55) Desse modo, entendemos que um sistema educacional comprometido com o desenvolvimento das capacidades dos alunos, concebe a avaliação como um processo 52 relevante para a produção da qualidade desejada, redimensionando investimentos, indicando mudanças curriculares, gerando impactos dentro da sala de aula, a fim de que os educandos aprendam cada vez mais e atinjam os objetivos propostos. Os Parâmetros Curriculares Nacionais, sinalizam para que: Esse uso da avaliação, numa perspectiva democrática, só poderá acontecer se forem superados o caráter de terminalidade e de medição de conteúdos aprendidos — tão arraigados nas práticas escolares — a fim de que os resultados da avaliação possam ser concebidos como indicadores para a reorientação da prática educacional e nunca como um meio de estigmatizar os alunos. Utilizar a avaliação como instrumento para o desenvolvimento das atividades didáticas requer que ela não seja interpretada como um momento estático, mas antes como um momento de observação de um processo dinâmico e não-linear de construção de conhecimento. (BRASIL, 1997, p. 56) Nesse cenário entendemos que uma avaliação da aprendizagem bem empregada pode ser uma ferramenta para a melhoria do ensino, levando o aluno ao sucesso, muito importante, tanto para as mudanças da educação como da própria sociedade. Formação docente Não poderíamos tratar a questão da avaliação, sem mencionar um ator importante desse processo: o professor. Apesar da intenção de utilizar os resultados do SARESP para a orientação de programas de formação de professores ter sido divulgada desde sua implantação, “poucas têm sido as informações divulgadas através de documentos a sua real utilização que tem sido feita desses resultados” ( Bauer 2008, p. 56) Ball (1988) relata sobre as três mitos que referem-se à formação de professores: acredita-se que os futuros professores sabem ensinar pois dominam assuntos básicos, assuntos complexos como os que envolvem a Matemática não necessitam ser revistos e se este docente é formado por esta disciplina será dotado de grande conhecimento matemático e por tanto apto para ensiná-la mesmo sem conhecimentos pedagógicos. Em seu estudo a autora investigou as concepções que os professores trazem de sua formação e concluiu que mesmo os que possuíam vasto conhecimento da matemática tinham dificuldade em ensiná-la, principalmente quanto aos significados e conexões 53 matemáticas. Neste momento a autora afirma que os docentes necessitam ampliar seu conhecimento sobre como o aluno aprende e que matemática devo ensinar ao mesmo, Para isso ela propõe o conhecimento especializado do conteúdo que é a capacidade do professor em perceber os erros e identificá-los de modo a promover intervenções que as superem. Pesquisas que identificam a influência da avaliação externa na formação docente Entre muitos estudos que indicam a influência das avaliações externas nas ações de planejamento docente apresentamos duas, que a nosso ver, exemplificam e nos dão apoio para correlacionarmos com os dados anteriores. Vasconcelos (2008) investigou o processo de formação continuada dos professores que atuam na 3ª e 4ª séries do Ensino Fundamental I rede pública estadual, da região metropolitana de Alagoas. Seu estudo aconteceu no espaço do laboratório de Matemática, com foco de estudo nas estruturas multiplicativas. Escolheu esta temática, pois os dados do SAEB indicavam baixo resultado. Em sua análise observou-se muitos aspectos que poderiam contribuir para o desenvolvimento da aprendizagem, entre estes: [...] é que os professores só querem saber do “como fazer” e não do “por que fazer” e “para que fazer”, dificultando assim as mudanças. No eixo da formação continuada em serviço de professores deve-se organizar a formação por temas direcionados pelas dificuldades de ensino detectados em sala de aula e/ou baseados nos resultados das provas em larga escala, SAEB, PROVA-BRASIL, vigente no país, que apontam alguns entraves na aprendizagem, decorrentes do ensino. (VASCONCELOS, 2008, p.140) A dissertação de Alencar (2012) analisa uma escola bem sucedida nos resultados do Saresp e propõe como estudo investigar quais foram os conhecimentos profissionais docentes desses professores dos anos iniciais para que os alunos tivessem uma boa proficiência. Seu estudo nos dá indícios que as avaliações devem ser utilizadas para o replanejamento das ações de ensino e aprendizagem. O estudo apresenta questionários contendo perguntas do Saresp com diferentes resoluções de alunos fictícios e propõe que as formações docentes seja dirigida pelo conhecimento especializado do conteúdo de Ball (1988). 54 Análise do cenário Observamos que os dados de algumas das avaliações externas indicam a dificuldade dos alunos em Matemática , e portanto as avaliações especificam os conteúdos e indicam um crescente indício de dificuldade dos conteúdos. Ao compararmos com nossa teoria sobre avaliação verificamos a preocupação dos autores com medir e avaliar (Luckesi, 1998) e ao mesmo tempo nos indica a necessidade de utilização das avaliações externas para o replanejamento das ações (Hoffman, 1995). Tais indícios são corroborados pelas pesquisas que indicam a necessidade de utilização das avaliações externas nas ações de replanejamento (Vasconcelos, 2008), assim como a pesquisa de Alencar (2012) que complementa relatando sobre a possibilidade de utilização do conhecimento especializado do conteúdo, na formação de professores (Ball, 1988). Considerações finais A avaliação apresenta uma importância social e política fundamental no fazer educativo vinculando-a a ideia de qualidade. Ao observar os dados das avaliações externas e articular com estudos teóricos e científicos, percebemos a importância de investigar as dificuldades dos alunos. Esse olhar investigativo deve ser incentivado nas formações docentes. Evidenciamos ainda que utilizar desses dados não requer desenvolvermos moldes ou treinamentos a serem desenvolvidos em sala de aula, mas propiciar a reflexão dos dados e conteúdos por eles abordados. A busca pela qualidade na escola configura-se como um grande desafio e demanda estratégias que possam modificar a situação da baixa qualidade da aprendizagem e melhores condições de trabalho para o professor. Acreditamos que a qualidade de ensino não deve estar apenas atrelada ao rendimento escolar ou ao “rankeamento” entre as instituições de ensino. Assim, para qualificar a aprendizagem de nossos educandos, é necessário que esta esteja vinculada ao desenvolvimento processual e integral do aluno, o que envolve dimensões muito mais amplas e incapazes de serem captadas e quantificadas somente pelas avaliações externas. 55 Referências ALENCAR, E. S. D. Conhecimento Profissional Docente de Professores do 5 ° ano em uma escola com bom desempenho em Matemática: o caso das estruturas multiplicativas. Dissertação ( Mestrado em Educação Matemática): UNIBAN , São Paulo, 2012. AZÂMOR, C. R; NAIFF, L. A. M. Representações sociais da avaliação da aprendizagem em professores do ensino público fundamental de Niterói. Estudos Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, Brasília, v. 90, n. 226, p. 650-672, set./dez. 2009. Ball, D. L. Knowledge and reasoning in mathematical pedagogy: Examining what prospective teachers bring to teacher education. Unpublished doctoral dissertation, Michigan State University, East Lansing.1988 Bauer, Adriana. Uso dos resultados do SARESP: o papael da Avaliação nas políticas de formação docente. 173f. Dissertação ( Mestrado). Faculdade de Educação da universidade de São Paulo.2006 BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais: Introdução. Brasília: MEC/SEF, 1997. _______ Relatório do Saeb Prova Brasil. Brasília: MEC/SEF, 2011. HOFFMAN, Jussara. Avaliação: mito e desafio: uma perspectiva construtivista. 16.ed. Porto Alegre: Educação & Realidade, 1995. LUCKESI , C. Verificação ou Avaliação: O Que Pratica a Escola? Idéias n. 8, São Paulo: FDE, 1998. p. 133-140. INEP. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas. Acesso: 13 de fevereiro de 2014 as 10:30 AM. 2014 SÃO PAULO. Secretária do Governo Estadual. Relatório do Saresp. FDE – Fundação e Desenvolvimento da Educação. São Paulo, 2011. VASCONCELOS, C. F. B. S. D. A reconstrução do conceito de dividir na formação dos professores: o uso do jogo como recurso tecnológico. Dissertação ( Mestrado em Educação): UFAL , Macéio, 2008. 56 SISTEMA DE AVALIAÇÃO DE RENDIMENTO ESCOLAR DO ESTADO DE SÃO PAULO – SARESP – UM HISTÓRICO Alessandra Carvalho Teixeira - UNICSUL – SP ([email protected]) Cintia Ap. Bento dos Santos - UNICSUL – SP ([email protected]) Norma Suely G. Allevato – UNICSUL – SP ([email protected]) Resumo O Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo – Saresp, é uma avaliação anual, em larga escala e obrigatória na rede estadual de ensino. Seus resultados são utilizados para acompanhar e verificar a melhoria da qualidade de ensino, subsidiando a tomada de decisões pelas instâncias da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo – SEE/SP. O presente artigo é parte de uma pesquisa desenvolvida para elaboração de dissertação no âmbito de um Mestrado em Ensino de Ciências e Matemática. O objetivo é apresentar um panorama do Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo – Saresp quanto à sua implantação e histórico. Apresenta, ainda, o contexto em que se dá essa avaliação externa realizada no Estado de São Paulo. A pesquisa foi desenvolvida por método qualitativo e técnica de análise documental, uma vez que foram analisados documentos oficiais referentes ao Saresp, de modo a construir um histórico desde a sua implantação. Os estudos realizados mostraram como o Saresp foi sendo modificado em seu formato, recursos empregados e formas de análise dos resultados, sempre com vistas à construção de análise diagnóstica e subsidiando ações no tocante à formação de professores e às práticas e orientações para a sala de aula na rede estadual de ensino do Estado de São Paulo. O presente artigo possibilita, portanto, que outros pesquisadores envolvidos ou interessados nesta ou em outros sistemas de avaliação em larga escala tenham, neste trabalho, uma visão das mudanças ocorridas no Saresp, desde sua implantação até a edição de 2012. Palavras chave: Avaliação em larga escala, Saresp, Qualidade de ensino 57 1. Introdução A avaliação externa, também conhecida como avaliação em larga escala, está, dentre os instrumentos utilizados para a elaboração de políticas públicas do sistema de ensino, como um dos principais. Além da relação com as políticas públicas, esse tipo de avaliação também está relacionado ao redirecionamento das metas estabelecidas para cada unidade escolar. Esse tipo de avaliação tem como objetivo monitorar e promover melhorias no desempenho das escolas e utiliza os resultados como uma medida de proficiência, ou seja, para o retrato desse desempenho das unidades escolares. O Saresp é uma avaliação externa em larga escala, aplicada na Educação Básica do Estado de São Paulo desde 1996, o qual apresenta os mesmos objetivos citados acima. O presente artigo, cujo objetivo é apresentar um panorama do Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo – Saresp quanto à sua implantação e histórico, está organizado de forma a retratar brevemente a implantação desse sistema de avaliação no Estado de São Paulo; traça seu histórico desde a sua origem (a partir de projetos anteriores) até 2012, explicitando o caráter da avaliação, a matriz e os itens de prova, o tratamento dos resultados, as séries avaliadas, os componentes curriculares avaliados, os instrumentos utilizados, a forma de divulgação dos resultados, objetivos e algumas mudanças em cada edição do Saresp; e encerra com algumas considerações finais e as referências. 2. Histórico do Saresp – de 1996 a 2012 Antes de discorrermos sobre cada edição, vale ressaltar que em 1999 não houve Saresp, e nos documentos consultados da SEE/SP não são explicitados os motivos para tal ocorrência. Também em 2006, segundo Arcas (2009), a pedagoga Maria Lúcia Marcondes Carvalho Vasconcelos, recém empossada no cargo de Secretária da Educação, observou a necessidade de repensar o Saresp, organizando, assim, um seminário para analisar os resultados obtidos anteriormente, o que resultou na não aplicação da prova. Apresentaremos a seguir, separadas por tópicos, algumas informações relevantes para a descrição do histórico das 15 edições. 58 2.1 Implantação do Saresp Antes da implantação do Saresp pela Resolução SE nº 27, de 29 de março de 1996, havia avaliações de caráter mais pontual. Dentre as avaliações precedentes ao Saresp temos: o Projeto de Inovações no Ensino Básico, que tinha como objetivo realizar avaliações de impacto das políticas educacionais vigentes em 1992 e 1993 sobre o rendimento dos alunos. Os resultados do Projeto apontaram a necessidade de se criarem avaliações que permitissem tomadas de decisões pelas várias instâncias da SEE/SP para a melhoria da qualidade de ensino, permitindo o estabelecimento de uma política de avaliação articulada com o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB), proporcionando maior autonomia às Diretorias de Ensino e escolas e, também, que permitisse informar à sociedade o desempenho do sistema de ensino e seus objetivos. Visando essas ações e necessidades apontadas, a SEE/SP repensou as avaliações que eram realizadas anteriormente e implantou, em 1996, o Saresp. O Saresp está na sua 16ª edição, ocorrida em novembro de 2013. Os anos nos quais elas aconteceram foram 1996, 1997, 1998, 2000, 2001, 2002, 2003, 2004, 2005, 2007, 2008, 2009, 2010, 2011, 2012 e 2013. Nessas edições, participaram obrigatoriamente as escolas da rede pública estadual e, por adesão, as escolas das redes municipal e particular, sendo que as municipais não aderiram em 2002/2003, e as particulares, de 2000 a 2003. A 3ª série do Ensino Médio das Escolas Técnicas do Centro Paula Souza – ETE passou a participar a partir de 2009, também por adesão. 2.2 Caráter da avaliação Desde sua implantação em 1996 até a edição que ocorreu em 1998, o Saresp apresentava caráter censitário, onde cada aluno era avaliado em apenas um componente curricular. Por exemplo: se em uma determinada edição, a prova contemplava Língua Portuguesa e Matemática, então parte dos alunos respondia a prova de Matemática e a outra parte, a de Língua Portuguesa. A partir de 2000 até as edições atuais, continua apresentando caráter censitário, mas os alunos não são mais avaliados em apenas um componente curricular, e sim, em todos os componentes que a avaliação contempla no ano de aplicação. 59 2.3 Matriz e Itens de prova Em 1997, foi elaborada a Matriz de Referência do Saeb, que buscou a associação dos conteúdos às competências cognitivas utilizadas no processo de construção do conhecimento. O Inep (2001) apresenta como significado de competência a definição apresentada por Perrenoud (1993): “capacidade de agir eficazmente em um determinado tipo de situação, apoiando-se em conhecimentos, mas sem se limitar a eles”. As competências cognitivas devem ser caracterizadas de modo objetivo, mensurável e observável, visto que possibilitam ao aluno saber o que é necessário para resolver o que foi solicitado em cada questão, e são, assim, úteis na elaboração das questões. Com a unificação do Currículo Escolar Estadual, as competências foram apresentadas em três grupos, de acordo com seus esquemas cognitivos, apresentados na Matriz de Referência para Avaliação – documento básico – Saresp, São Paulo (2009): Grupo I – esquemas representativos (propostos por Jean Piaget) – Competências para observar; Grupo II – esquemas procedimentais – Competências para realizar; Grupo III – esquemas operatórios – Competências para compreender. Segundo a Matriz de Referência (SÃO PAULO, 2009), nem todas as habilidades e competências indicadas na Proposta Curricular do Estado de São Paulo foram incluídas na Matriz de Avaliação do Saresp por não serem passíveis de serem avaliadas de acordo com os instrumentos utilizados em avaliação de larga escala. Um exemplo de habilidade que não pode ser medida é a de realização do cálculo mental. Não é possível determinar, nesse tipo de avaliação, se o aluno utilizou alguma ferramenta para resolver o item proposto ou apenas o cálculo mental. A matriz de uma avaliação é formada por um conjunto de descritores. Os descritores mostram as habilidades, possíveis de serem conferidas em testes de desempenhos, esperadas dos alunos de acordo com sua fase de escolarização. Os itens de prova são as questões de múltipla escolha que a compõem, para aferição das habilidades citadas acima. Em 1996, a matriz e os itens de prova foram elaborados pela Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas – CENP. De 1997 a 2001, foram elaborados por professores da rede estadual de ensino e, a partir de 2002, por uma comissão técnica, 60 com base nas Propostas Curriculares (SÃO PAULO, 2008) da CENP e nos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN (BRASIL, 1997). Da edição de 2009 em diante, os itens de prova passaram a ser elaborados com base na Matriz de Referência do Saresp (SÃO PAULO, 2009). 2.4 Níveis de proficiência Os níveis de proficiência são escalas métricas que permitem comparações de diferentes resultados de avaliações de larga escala. São utilizados valores arbitrários e são construídos com os resultados da Teoria de Resposta ao Item (TRI). As informações que constam deste item foram retiradas de São Paulo (2011). Os pontos selecionados que determinam a Escala de Matemática, os mesmos para as quatro séries avaliadas (4ª, 6ª e 8ª séries do Ensino Fundamental e 3ª série do Ensino Médio) são 125, 150, 175, 200, 225, 250, 275, 300, 325, 350, 375, 400, 425, que foram determinados de acordo com a média da 8ª série/ 9º ano no Saeb 1997, que foi 250 e, a partir dela, instaurados intervalos de 25 pontos. O Quadro 1 elucida os níveis de proficiência por classificação. Quadro 1 – Classificação e descrição dos níveis de proficiência do Saresp Fonte: São Paulo (2011, p. 6). Como é de responsabilidade de cada órgão o agrupamento do desempenho indicado nos diferentes valores da escala, o Governo do Estado de São Paulo os agrupou em quatro níveis de desempenho, definidos a partir das expectativas de aprendizagem apresentadas no Currículo Estadual. Os valores apresentados na Tabela 1 são referentes à 8ª série/9º ano do Ensino Fundamental. 61 Tabela 1 – Níveis de proficiência de Matemática do Saresp Níveis de proficiência Abaixo do básico 8ª série/9º ano < 225 Básico 225 a < 300 Adequado 300 a < 350 Avançado ≥ 350 Fonte: São Paulo (2011, p. 6). Cada intervalo significa que o aluno realizou tudo o que é apresentado nos pontos anteriores mais o que está sendo indicado no próprio intervalo, ou seja, cada intervalo da escala indica que o aluno atingiu os objetivos requeridos na pontuação indicada mais os objetivos das pontuações anteriores; por exemplo, o aluno que atingiu 270 pontos desenvolveu as habilidades previstas no nível abaixo do básico, mais as habilidades previstas entre 225 e 270 do nível básico. 2.5 Séries avaliadas Nesta seção, apontaremos as séries/anos que participaram de cada edição. 1996 – 3ª e 7ª séries do Ensino Fundamental. 1997 – 4ª e 8ª séries do Ensino Fundamental e 1ª série do Ensino Médio. 1998 – 5ª série do Ensino Fundamental e 1ª série do Ensino Médio. 2000 – 5ª e 7ª séries do Ensino Fundamental e 3ª série do Ensino Médio. 2001 e 2002 – 4ª e 8ª séries do Ensino Fundamental. 2003 a 2005 – todas as séries do Ensino Fundamental e Ensino Médio. A partir de 2007 – 2ª, 4ª, 6ª e 8ª séries do Ensino Fundamental e 3ª série do Ensino Médio, atuais 3º, 5º, 7º e 9º anos do Ensino Fundamental e 3ª série do Ensino Médio. Em 2001 houve, também, a participação de alunos do supletivo (atual Educação de Jovens e Adultos – EJA) que, até então, não havia participado de nenhuma edição. 62 2.6 Componentes Curriculares avaliados Apontaremos a seguir, os componentes curriculares avaliados em cada edição: 1996 – Língua Portuguesa, Matemática, História, Geografia e Ciências. 1997, 2000 e 2007 – Língua Portuguesa e Matemática. 1998 – Língua Portuguesa, Matemática e Biologia. 2001 – Língua Portuguesa. 2002 a 2004 – Leitura e Escrita. 2005 – Matemática, Leitura e Escrita. 2008, 2010 e 2012 – Língua Portuguesa, Matemática, Ciências, Biologia, Física e Química. 2009 e 2011 – Língua Portuguesa, Matemática, História e Geografia. Cabe salientar que, como dito anteriormente, a partir de 2008, os componentes Língua Portuguesa e Matemática têm sido avaliados anualmente; e bienalmente, de forma intercalada, Ciências da Natureza e Ciências Humanas. 2.7 Instrumentos utilizados Nas edições de 1996 a 2000, os instrumentos utilizados foram prova, questionário do aluno e da escola. Segundo Siebra (2009), os questionários dos alunos e da escola foram utilizados para analisar quais as variáveis que interferiam na aprendizagem dos alunos. Entre as edições de 2001 e 2003, o instrumento utilizado foi apenas a prova, não havendo questionário para o aluno e para a escola, como nas edições anteriores. Já em 2004 e 2005, os instrumentos utilizados foram a prova e o questionário do aluno, o qual voltou a ser aplicado com o intuito de traçar o perfil dos estudantes. A edição de 2007 apresentou como instrumento a prova, com 30 itens em cada uma das disciplinas avaliadas e uma redação do tipo narrativo para o Ensino Fundamental, e dissertativo para o Ensino Médio. Além do questionário dos alunos e da escola (representada pelos diretores escolares), nessa edição foram aplicados questionários a professores das séries/disciplinas avaliadas e professores coordenadores buscando subsídios que orientassem políticas educacionais. 63 A partir de 2008, foi realizada a prova e, além dos questionários a alunos, diretores de escola, professores das disciplinas avaliadas e professores coordenadores, foram aplicados questionários aos pais e aos supervisores de ensino, que objetivavam diagnosticar fatores que pudessem interferir no desempenho dos alunos. 2.8 Tratamento dos Resultados O tratamento dos resultados apresentados nas edições de 1996 a 1998 foi feito por análise clássica e comparativa a partir da utilização da TRI e Modelos Lineares Hierárquicos (MLH), sobre os quais comentaremos a seguir, respectivamente. Segundo Andrade, Tavares e Valle (2000), os indivíduos, nesse caso os alunos, apresentam características que não proporcionam formas de observação direta, e a TRI propõe modelos para que elas sejam observadas. Cada item da TRI apresenta uma discriminação que permite diferenciar a habilidade dos alunos, o grau de dificuldade e o acerto casual, de modo que uma ou mais habilidades sejam relacionadas com a probabilidade de a pessoa acertar a resposta. Assim, uma das suas principais características é o fato de não ter como elemento central a prova como um todo, e sim, os itens que a compõem de acordo com as habilidades apresentada em cada item. A TRI permite que os desempenhos dos alunos sejam comparados e colocados numa mesma escala de conhecimento. Segundo Andrade, Tavares e Valle (2000, p. 7), “[...] quanto maior a habilidade, maior a probabilidade de acerto no item”. Essa Teoria apresenta vantagens quanto à Teoria Clássica de Medidas utilizada em algumas avaliações, pois não é dependente de um conjunto de itens permitindo que escalas de habilidades sejam construídas. No caso dos Modelos Lineares Hierárquicos (MLH), cada nível é formado por amostras aleatórias, em que há unidades experimentais agrupadas em outras unidades maiores, permitindo avaliar cada um dos itens hierárquicos separadamente e incorporar efeitos aleatórios em cada um dos níveis. Em uma avaliação do sistema educacional, por exemplo, pelo MLH pode-se considerar dois níveis de amostras: um composto por alunos de uma determinada escola e outro pelas escolas envolvidas. O tratamento dos resultados na edição de 2000 apresentou um instrumento diferente das edições anteriores. Além da Teoria Clássica de Medidas, que é baseada nos resultados por escores brutos ou padronizados, TRI e MLH, a edição contou com a 64 Detecção Automática de Interação (AID), que é uma técnica exploratória de dados, também considerada ferramenta para imputação de valores ausentes. Em 2001 e 2002, o tratamento foi apenas pela Teoria Clássica de Medidas. A partir de 2003, os resultados passaram a ser tratados apenas pela Teoria de Resposta ao Item, ação que perdurou até a 15ª edição, ocorrida em novembro de 2012. A partir de 2008 a metodologia de Blocos Incompletos Balanceados (BIB) passou a ser utilizada na montagem das provas. O BIB permite o estabelecimento de vários blocos formados por diversos itens, sendo eles iguais ou diferentes, que possibilitam avaliar uma grande parte das habilidades previstas para uma determinada disciplina e série. Cada prova é formada por certa quantidade de blocos, estabelecendo um padrão de rodízio entre eles. O rodízio é necessário, uma vez que temos maior número de blocos do que os utilizados para compor uma avaliação. De acordo com Bekman (2001), sobre o BIB, Isto é especialmente útil nos sistemas de avaliação quando desejamos obter informações amplas sobre o ensino, utilizando um grande número de itens, ao passo que precisamos limitar a quantidade de itens submetido a cada aluno num valor aceitável e adequado ao tempo de prova (Ibidem, p. 121). Podemos perceber, de acordo com a citação anterior, que a metodologia BIB permite que através da elaboração e utilização de diversos itens em uma mesma prova, várias proficiências são contempladas em um único instrumento, possibilitando melhor avaliação do desempenho dos alunos. 2.9 Divulgação dos Resultados Nas edições de 1996 a 2000, os resultados foram divulgados por meio da Revista do Saresp/FDE e relatórios produzidos pelos diferentes âmbitos de organização da educação. Eles foram utilizados para subsidiar o trabalho em sala de aula, avaliar os programas da Secretaria Estadual de Educação que estavam em vigor e formular políticas públicas. Além disso, em 1998, os resultados também auxiliaram na construção do Projeto Político Pedagógico (PPP) das escolas. 65 Em 2001, a divulgação se deu por boletins produzidos e distribuídos pela Fundação para o Desenvolvimento da Educação (FDE), e no site da SEE (www.educacao.sp.gov.br), sendo usados para decidir se os alunos da Progressão Continuada teriam continuidade de estudo ou seriam encaminhados para a recuperação de ciclo. Na edição de 2002, os resultados foram encaminhados para as escolas e diretorias como subsídio para capacitação dos professores. As escolas elaboraram boletins que circularam internamente e na comunidade escolar. Os resultados de 2003 foram utilizados para a formação continuada dos professores e gestores, e a divulgação foi individualizada, por aluno. Os de 2004 e 2005, foram divulgados em treinamentos e capacitações, por meio de manuais e informes, e vistos como importante instrumento de monitoramento do ensino. Subsidiaram a tomada de decisão e o estabelecimento de políticas públicas, além de reorientarem o trabalho pedagógico quanto à capacitação e elaboração de planos e estratégias de ação visando ao aprimoramento das práticas pedagógicas em cada Unidade Escolar. Em 2005, foram apresentados às escolas de forma nominal para cada estudante. A partir da edição de 2007, houve uma inovação quanto à divulgação dos resultados, a qual foi feita no site da Secretaria Estadual de Educação através de boletins de desempenho da escola. 2.10 Objetivos e algumas mudanças ainda não citadas em cada edição do Saresp Neste item, comentaremos sobre os objetivos de cada edição do Saresp e algumas mudanças ainda não citadas. 1996 – monitorar a qualidade do sistema de ensino, subsidiar tomadas de decisões e fornecer às equipes técnicas informações para orientação na formulação do Projeto Pedagógico. 1997 –- ampliar o conhecimento do perfil do aluno a fim de subsidiar o trabalho desenvolvido em sala e permitir que a SEE/SP auxiliasse os professores com recursos, serviços e orientações. 66 1998 – além dos anteriores, avaliar o impacto de programas criados especificamente para esse fim e para a melhoria do sistema educacional. 2000 – obter informações que auxiliassem na tomada de decisão dos diferentes níveis do sistema de ensino e, após identificar os problemas, desenvolver ações que os resolvessem, proporcionando situações de aprendizagem mais significativas. 2001 – fundamentar as decisões quanto ao encaminhamento de cada aluno para continuidade dos estudos ou para a recuperação de ciclo. 2002 – diagnosticar, em termos de habilidades, o desempenho dos alunos. Esse diagnóstico forneceria informações às diretorias e escolas para que estratégias pedagógicas fossem adotadas a fim de sanar os fatores negativos apresentados quanto à qualidade de ensino. 2003 – promover uma cultura avaliativa no sistema escolar, obter indicadores significativos para subsidiar intervenções técnico-pedagógicas que corrigissem distorções e melhorassem a qualidade do ensino, e estender o Saresp aos alunos de todas as séries do Ensino Fundamental e Ensino Médio. 2004 e 2005 – obter indicadores educacionais que pudessem subsidiar a elaboração de propostas de intervenção para a melhoria da qualidade de ensino e correção de distorções detectadas no sistema. 2007 – monitorar a qualidade do sistema de ensino e subsidiar tomadas de decisões. Muitas mudanças ocorreram na formulação do Saresp a partir de 2007, entre elas, a adequação das habilidades às do Saeb/Prova Brasil para 4ª série/5º ano, 8ª série/9º ano do Ensino Fundamental e 3ª série do Ensino Médio, utilizando a mesma escala. Além disso, nessa edição, a SEE/SP divulgou em seu site as provas por série e período seus gabaritos, assim como as habilidades avaliadas, por considerá-los importantes indicadores para os educadores da rede. 2008 – diagnosticar o sistema de ensino e monitorar as políticas públicas de educação. A partir de 2008, os resultados de Língua Portuguesa e Matemática das séries finais de ciclo têm sido utilizados para compor o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica do Estado de São Paulo – Idesp –, o qual apresenta como um de seus objetivos acompanhar o cumprimento das metas estabelecidas quanto à melhoria da 67 qualidade de ensino pelas escolas estaduais e, também, para subsidiar o sistema de bonificação dos profissionais caso as determinadas metas sejam alcançadas. 2009 – diagnosticar e monitorar sistematicamente o sistema educacional do Estado de São Paulo, verificar o rendimento escolar dos alunos e fornecer informações relevantes ao sistema de ensino e equipes que dele fazem parte, interna ou externamente. 2010, 2011 e 2012 – verificar o rendimento escolar dos alunos e fornecer informações relevantes ao sistema de ensino e equipes que dele fazem parte, interna ou externamente. Uma inovação na edição de 2010 foi que, diferentemente dos anos anteriores, a Redação apareceu por amostragem, assim como foi feito com as questões de Matemática. 3. Metodologia e materiais Para atender ao objetivo da nossa investigação, foi realizada uma pesquisa do tipo qualitativa, com técnica de análise documental. Lüdke e André (1986) consideram que a pesquisa qualitativa envolve a obtenção de dados descritivos por meio do contato direto do pesquisador com a situação estudada, enfatizando mais o processo do que o produto. Creswell (2007) a caracteriza como sendo uma pesquisa que utiliza diferentes concepções filosóficas; métodos de coleta, análise e interpretação de dados; e variadas estratégias de investigação, as quais têm influência sobre os procedimentos. De acordo com Sá-Silva, Almeida e Guindani (2009), a pesquisa documental é um procedimento metodológico que, dependendo do objeto de estudo e dos objetivos da pesquisa, pode se caracterizar como principal caminho de concretização da investigação ou se constituir como instrumento metodológico complementar. Ela se propõe a produzir novos conhecimentos, criar novas formas de compreender os fenômenos e dar a conhecer a forma como estes têm sido desenvolvidos. Considerando as afirmações dos autores, na nossa pesquisa, a análise documental, enquanto técnica, foi o principal caminho. Considerando a dificuldade de encontrarmos, na época da pesquisa para o mestrado, um documento que fornecesse a linha do tempo completa do Saresp, o levantamento foi feito através de documentos diversos, muitos deles disponíveis no site 68 da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo – SEE/SP. Como referências para a elaboração deste artigo foram utilizados os Relatórios Pedagógicos de 2008, 2009, 2010, 2011, 2012, a Matriz de Referência para a Avaliação – documento básico – Saresp, o Sumário Executivo de 2008, 2009, 2010 e o Currículo do Estado de São Paulo. Embora já tenha sido realizada, os dados referentes à edição de 2013 ainda não foram disponibilizados, o que restringe o presente trabalho até a edição de 2012. 4. Considerações finais Durante nossas categorizações para a dissertação de mestrado (TEIXEIRA, 2013), a falta de material sobre a Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo – Saresp, desde a sua origem, e a não divulgação de todos os itens que compõem a avaliação, para análise e categorização, nos impuseram limitações de modo que não temos a pretensão de considerar que este trabalho se constitua em resultado completo desse sistema de avaliação. A falta de acesso a alguns dados relevantes pode ter comprometido a elaboração de um histórico mais consistente dessas avaliações, foco de nossa pesquisa. A importância deste artigo reside na possibilidade de entendermos a evolução do Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo e como ele é elaborado. Ao longo desta comunicação pudemos perceber as modificações que ocorreram durante as edições do Saresp, embora os objetivos tenham permanecido praticamente os mesmos, quais sejam: a melhoria da qualidade de ensino, de acordo com a análise do desempenho dos alunos e a utilização dos resultados obtidos como base de informações para suporte das instâncias da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo. Destaque-se que a partir de 2007, houve uma reestruturação do currículo das séries finais do Ensino Fundamental e Ensino Médio. Um dos objetivos era a possibilidade de uma base comum, a qual também nortearia a avaliação do Saresp. Em 2008, iniciou-se uma renovação no olhar para a avaliação; ela seria realizada dentro dos moldes do Currículo Básico da rede de ensino do Estado de São Paulo, com base na Proposta Curricular do Estado de São Paulo, e visava saber o que avaliar e avaliar o que o aluno deveria aprender. 69 Considerando o exposto, com base nos estudos realizados sobre o Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo – Saresp, a avaliação deixa de ter um caráter pontual para se tornar um sistema de avaliação articulado. Finalmente, esperamos que o presente artigo possibilite que outros pesquisadores envolvidos ou interessados neste ou em outros sistemas de avaliação em larga escala tenham suas compreensões ampliadas e/aprofundadas, a partir deste retrato construído das mudanças ocorridas no Saresp, desde sua implantação até a edição de 2012. REFERÊNCIAS ARCAS, P. H. Implicações da Progressão Continuada e do SARESP na Avaliação Escolar: tensões, dilemas e tendências. Tese (Doutorado). Universidade de São Paulo. Faculdade de Educação, São Paulo, 2009. BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais: introdução aos Parâmetros Curriculares Nacionais. – Brasília: MEC/SEF, 1997. CRESWELL, J. W. Projeto de pesquisa: métodos qualitativo, quantitativo e misto. Trad. Luciana de Oliveira da Rocha. 2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2007. INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS - INEP. SAEB 2001: novas perspectivas. Brasília: O Instituto, 2001. LUCKE, M. ANDRÉ, M. Pesquisa em educação: Abordagens qualitativas. São Paulo: EPU, 1986. PERRENOUD, P. Não mexam na minha avaliação: para uma abordagem sistêmica de mudanças pedagógicas. In: ESTRELA, Albano; NÓVOA, Antonio (Org.). Avaliação em educação: novas perspectivas. Porto: Porto Editora, 1993. SÁ-SILVA, J. R. S.; ALMEIDA, C. D.; GUINDANI, J. F. Pesquisa documental: pistas teóricas e metodológicas. Revista Brasileira de História e Ciências Sociais, v. 1, p. 115, 2009. SÃO PAULO. Resolução SE nº 27, de 29 de março de 1996. Dispõe sobre o Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo. Diário Oficial do Estado de São Paulo, Secretaria de Educação do Estado de São Paulo. Disponível em: <http://siau.edunet.sp.gov.br/ItemLise/arquivos/27_1996.htm?Time= 4/14/2013%205:00:50%20PM>. Acesso em: 10/01/2012. ___________. Proposta Curricular do Estado de São Paulo: Matemática; coordenação Maria Inês Fini. – São Paulo: SEE, 2008. 70 ___________. Matrizes de referência para a avaliação Saresp: documento básico/Secretaria da Educação; coordenação geral, Maria Inês Fini. – São Paulo: SEE, 2009. SIEBRA, M. J. Dificuldades e erros de alunos de 8ª série com relação a questões que envolvem álgebra. 2009. 99 f. Dissertação (Mestrado em Ensino de Ciências e Matemática).Universidade Cruzeiro do Sul, São Paulo, 2009. TEIXEIRA, A. C. Uma análise sobre a mobilização de conhecimentos matemáticos em relação aos itens e questões do Saresp 2010 do 9º ano do ensino fundamental. 2013. 187 f. Dissertação (Mestrado em Ensino de Ciências e Matemática)–Universidade Cruzeiro do Sul, São Paulo, 2013. 71 A PROVA BRASIL/2011: IDENTIFICANDO DIFICULDADES RELACIONADAS ÀS CONCEPÇÕES DE ÁLGEBRA POR MEIO DOS DESCRITORES Karina Aguiar ALVES – UFABC – SP ([email protected]) Letícia Verdinelli Navarro FAGUNDES - SEESP - SP ([email protected]) Mônica Cristina do N. ROSSETTO - SEESP - SP ([email protected]) Thais Helena Inglêz SILVA – UFABC – SP ([email protected]) Vivili Maria Silva GOMES – UFABC – SP ([email protected]) Resumo: O presente trabalho é parte integrante do projeto de pesquisa denominado “Conhecimento Matemático para o ensino de álgebra: Uma abordagem baseada em perfis conceituais”, alocado no âmbito do Programa Observatório da Educação (OBEDUC) e financiado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). Um dos subgrupos deste projeto investiga a Prova Brasil, uma avaliação em larga escala aplicada a cada dois anos ao final de cada ciclo de escolarização, ou seja, 5º e 9º anos do Ensino Fundamental e 3º ano do Ensino Médio. O objetivo de estudo deste subgrupo é identificar os conteúdos algébricos que apresentam menor percentual de acerto nas provas do 9º ano, em particular no município de Santo André - SP. O intuito desta comunicação é fazer uma breve discussão teórica sobre diferentes concepções de educação algébrica a partir dos trabalhos de Fiorentini, Miorim e Miguel (1993), Usiskin (1995) e Lins e Gimenez (2001) e apresentar uma relação com os descritores de álgebra identificados na matriz de referência da Prova Brasil. Para fazer o levantamento destes percentuais utilizamos os microdados disponíveis no site do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), identificando os descritores relacionados à álgebra e selecionando os de menor percentual de acerto, o que nos possibilitou construir quadros comparativos entre as concepções algébricas e os conteúdos relacionados aos descritores. Desta análise depreende-se uma tendência da Prova Brasil a enfatizar a resolução procedimental das questões, sendo que esta é uma das dificuldades de ensino e aprendizagem identificadas através dos dados. Encontramos obstáculos para aprofundar as análises por não termos acesso às provas aplicadas e pela complexidade de tratamento dos dados. Entretanto, estas análises ainda são preliminares e novas investigações serão empreendidas pelo grupo para aprofundar possíveis relações. Palavras-chave: Prova Brasil, Educação Algébrica, Dificuldades de Ensino e Aprendizagem 72 Introdução Este artigo trata de estudos preliminares realizados por um subgrupo de pesquisa inserido no Projeto “Conhecimento Matemático para o ensino de álgebra: Uma abordagem baseada em perfis conceituais”, vinculado ao Programa Observatório da Educação - OBEDUC, coordenado pelo Prof. Dr. Alessandro Jacques Ribeiro e financiado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), edital 049/12. O referido projeto tem por objetivo investigar os conhecimentos algébricos mobilizados por professores ao ensinar álgebra na Educação Básica, utilizando-se uma abordagem baseada em perfis conceituais (RIBEIRO, 2013). Para o levantamento de tais conhecimentos algébricos serão utilizados os dados das avaliações em larga escala desenvolvidas pelo Ministério da Educação (MEC), a Prova Brasil/SAEB no que tange o Ensino Fundamental, mais precisamente o 9º ano, e o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) referente ao Ensino Médio. Os dados coletados estão sendo analisados e discutidos pelo grupo ao longo da execução do projeto sendo que, posteriormente, serão desenvolvidas ações didáticas de intervenção em sala de aula que visem a melhoria do ensino e da aprendizagem de álgebra na Educação Básica. Neste trabalho nos concentraremos na discussão de alguns fatores envolvidos na Prova Brasil/SAEB de 2011, tais como a constituição da prova e os descritores, que serão posteriormente apresentados. O contexto das avaliações em larga escala no Brasil, também chamadas macroavaliações, inicia-se a partir da publicação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) (RABELO e PLAZA, 2011), que em seu artigo 9º, inciso VI, atribui à União a avaliação do rendimento escolar em todos os níveis, com o objetivo de melhorar a qualidade do ensino (BRASIL, 1996). Com base no exposto, as macroavaliações teriam um caráter formativo-diagnóstico na medida em que se inserem em um projeto educativo maior e identificam as dificuldades no processo de ensino e aprendizagem. Por serem realizadas em larga escala, teriam, ainda, o intuito de contribuir com a reorganização de políticas públicas voltadas à área de educação. Em 1990, o MEC aplicou pela primeira vez o Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB) em algumas séries do Ensino Fundamental, avaliando os estudantes nas disciplinas de Português, Matemática e Ciências. A partir de 1995 a construção dos 73 testes e análise dos resultados passou a seguir a metodologia de Teoria de Resposta ao Item (TRI), também utilizada no ENEM, o que possibilitou a comparação dos resultados ao longo do tempo. Nessa mesma edição decidiu-se que seriam avaliados os estudantes dos ciclos finais de cada etapa de escolarização e foram incluídas as escolas particulares. A partir de 2001, as disciplinas avaliadas passaram a ser somente Português e Matemática e a prova manteve sua periodicidade bienal; na última edição de 2013, incluiu-se em caráter experimental a avaliação da disciplina de Ciências. (INEP, 2011a) O SAEB é um conjunto de avaliações aplicadas em escala nacional com o objetivo de avaliar a Educação Básica e por meio desse processo contribuir para a formulação e monitoramento das políticas educacionais nas esferas municipal, estadual e federal. Esse conjunto de avaliações é composto por: ANEB – Avaliação Nacional da Educação Básica. ANRESC/Prova Brasil – Avaliação Nacional do Rendimento Escolar. ANA – Avaliação Nacional da Alfabetização (incorporada ao SAEB em 2013). A Prova Brasil, objeto de estudo deste artigo, teve sua primeira edição em 2005 e tem como objetivo avaliar a qualidade do ensino, contribuir para o desenvolvimento em todos os níveis educacionais, reduzir as desigualdades, contribuir para a democratização da gestão do ensino público nos estabelecimentos oficiais e possibilitar informações sistemáticas sobre as unidades escolares. A avaliação ocorre por meio de habilidades e competências (INEP, 2011b), que compõem doze níveis, divididos em uma escala que varia de 0 a 425. Cada nível refere-se a um conjunto de competências que o aluno deveria atingir. A comunidade escolar administrativa também é avaliada através de questionários aplicados a professores e diretores, a fim de coletar dados demográficos, perfis profissionais e informações sobre condições de trabalho e infraestrutura. Após o processo de avaliação, os resultados são divulgados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), fornecendo médias de desempenho por aluno, escola participante, município e estados. Estes dados oferecem subsídios para o cálculo do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) que, por sua vez, serve como parâmetro para comparar diferentes regiões do 74 país e direcionar os investimentos em educação de acordo com o Plano de Desenvolvimento da Educação (INEP, 2011c). Os resultados preliminares apresentados na sequencia referem-se a alguns estudos teóricos e à análise da Prova Brasil/SAEB 2011, realizados no ano de 2013 com a finalidade de identificar dificuldades na aprendizagem de conceitos algébricos. O objetivo perseguido até o momento, como anteriormente dito, é fazer o levantamento dos conceitos algébricos que apresentam maior deficiência, conforme os resultados na Prova Brasil/2011 e, principalmente, relacionar tais conceitos às visões de álgebra que o grupo tem estudado. Apresentamos a seguir essas visões e, posteriormente, os resultados obtidos da análise da prova. Por último, relacionamos as duas frentes e fazemos algumas considerações finais. Estudos Teóricos Nesta etapa do trabalho serão apresentadas breves sínteses de alguns autores que embasarão uma análise preliminar dos dados. Dentre os autores estudados, elencamos três teorias que contribuíram mais significativamente para a análise dos dados, dentre eles destacamos: Fiorentini, Miorim e Miguel (1993), Usiskin (1995) e Lins e Gimenez (2001). Aspectos importantes da teoria desenvolvida por Fiorentini, Miorim e Miguel (1993) sobre “Concepções de Álgebra e Educação Algébrica” são, constantemente, pontos de discussão e aprimoramento para que o grupo amplie sua concepção do que será considerado como álgebra na análise dos dados e das questões. Para os autores há uma distinção entre as concepções de álgebra e de educação algébrica, mas em nossos estudos focamos na segunda, uma vez que nossa intenção é investigar os conhecimentos de álgebra na educação básica. Fiorentini, Miorim e Miguel classificam três concepções de educação algébrica. São elas: 1. Linguístico-pragmática: Essa concepção é baseada em atividades pedagógicas que visam a resolução de problemas, por meio de aquisição mecânica das técnicas, ou seja, transformismo algébrico. 2. Fundamentalista-estrutural: Consiste na introdução das propriedades estruturais das operações, incentiva o estudante a identificar e aplicar as 75 diferentes estruturas matemáticas, a partir de um currículo centrado na Teoria de Conjuntos. 3. Fundamentalista-analógica: Retoma o papel pedagógico para solucionar problemas, não mais com o caráter mecânico, mas a partir dos fundamentos algébricos. Para isso faz uso de materiais manipulativos e de modelos geométricos. O segundo referencial adotado foi Usiskin (1995), que em seu trabalho “Concepções sobre a álgebra da escola média e utilizações das variáveis” relaciona a compreensão do significado das letras, também chamadas de variáveis, ao estudo de álgebra. Acredita que os alunos estudam álgebra quando manipulam variáveis e também afirma que as finalidades da álgebra estão relacionadas às diferentes concepções e aos diversos usos das variáveis. Usiskin apresenta quatro concepções de álgebra conforme os diferentes empregos das variáveis: 1. A álgebra como aritmética generalizada: letras são variáveis utilizadas para generalizar modelos numéricos e o papel do estudante da escola básica passa a ser o de traduzir e generalizar. 2. A álgebra como estudo de procedimentos para resolver certos tipos de problemas: nesta concepção as variáveis são incógnitas ou constantes que servem para simplificar e resolver problemas em linguagem natural. 3. A álgebra como estudo de relações entre grandezas: As variáveis não são incógnitas, nem letras utilizadas para generalizar modelos numéricos. Nessa concepção não há busca por uma fórmula, mas análise da variação em função da variável (como, por exemplo, fórmulas utilizadas na Geometria e na Física), que pode ser um argumento, valores do domínio da função ou um parâmetro ou representar um número do qual outros números dependem. 4. A álgebra como estudo das estruturas: As variáveis não recebem atribuição de um significado numérico, uma vez que a intenção é manipular e justificar recorrendo às propriedades. Assim, tornam-se um objeto arbitrário de uma estrutura pré-estabelecida por estas propriedades. 76 Outra vertente selecionada para a análise são as concepções adotadas por Lins e Gimenez (2001), onde o objetivo é discutir uma abordagem para o ensino e aprendizagem de álgebra. Essa proposta é dividida em três tendências: 1. Letrista: Consiste em atividades mecânicas, ou seja, a utilização de técnicas que transformam a atividade algébrica em “cálculo literal”. Sendo assim, a resolução de problemas é vista somente do ponto de vista de aplicação de algoritmos. 2. Facilitadora: Esta tendência ainda está muito atrelada a concepção letrista com algumas diferenças. Neste caso, as atividades propostas partem de situações concretas para chegar a situações mais abstratas, por exemplo, o uso de balanças de dois pratos para ensinar equações. Em estudos citados pelos autores, chegouse à conclusão que falta um processo intermediário de aprendizagem entre o concreto e o formal. 3. Modelagem matemática: Esta concepção parte de uma perspectiva baseada na realidade do aluno, de um ponto de vista mais concreto. A educação algébrica se dá na medida em que a produção do conhecimento vai se tornando significativa para a aprendizagem. As três teorias apresentadas sobre Concepções de Educação Algébrica convergem em muitos pontos, tais como, a utilização de técnicas para resolução de problemas e os diferentes significados que as letras podem assumir. No entanto, diferem em alguns aspectos dependendo das perspectivas e dos campos de trabalho de cada autor. Por exemplo, no caso de Usiskin vemos uma preocupação em diferenciar o significado de variáveis, tendo seus trabalhos fortes relações com a área da computação; no caso de Lins e Gimenez, percebemos uma ligação forte com as teorias de aprendizagem, e por fim, Fiorentini explora o caráter histórico das concepções. Neste trabalho, agruparemos as diferentes categorias apresentadas em cada teoria de acordo com a sua similaridade, com o intuito de construirmos quadros reflexivos que nos permitam, posteriormente, categorizar os descritores. 77 A Prova Brasil A Prova Brasil tem periodicidade bienal e é aplicada em anos ímpares, por uma equipe capacitada e treinada para manter os critérios e a padronização dos testes em âmbito nacional. O agendamento das datas e horários para a realização das provas é feito pelos aplicadores, no segundo semestre. Durante a prova os aplicadores fazem apenas a leitura das orientações do teste, sendo responsabilidade dos alunos lerem os procedimentos para preenchimento do formulário de respostas e a interpretação das questões. O tempo total estipulado para a realização das provas é de 2 horas e 30 minutos. A prova de matemática é composta por 7 blocos de 13 questões cada um, onde esses blocos são definidos apenas no momento da prova. (INEP, 2011d) A avaliação dos alunos é realizada por meio das competências e habilidades descritas na Matriz de Referência (INEP, 2011b), que é um documento oficial que apresenta todas as informações referentes a prova. O conteúdo a ser avaliado está dividido em quatro temas - que são as competências - e trinta e sete descritores que são as habilidades. Trabalharemos nesse projeto do descritor 29 ao 35, que estão inseridos no Tema III - Números e Operações/ Álgebra e Funções. Os descritores citados acima são apresentados no Quadro 1, abaixo. Quadro 1 - Descritores de álgebra Descritor Descrição D 29 Abrange o conceito de resolver um problema que envolva grandezas diretamente ou inversamente proporcionais. D 30 Calcular o valor numérico de uma expressão algébrica. D 31 Resolução de problemas envolvendo equações do 2° grau. D 32 Verificar a expressão algébrica correspondente ao problema descrito na questão, sendo sequencias de números ou padrões. D 33 Identificar uma equação ou uma inequação de primeiro grau que expressa um problema. D 34 Identificar um sistema de equações do primeiro grau que expressa um problema. D 35 Identificar a relação entre as representações algébrica e geométrica de um sistema de equações de primeiro grau Fonte: Elaborado pelas autoras com base na Matriz de Referência (INEP, 2011b) 78 As provas, bem como as escolas, municípios e estados, são classificados em doze níveis, a partir de uma escala gradativa de desempenho que varia de 0 a 425 e, de acordo com a ONG Todos pela Educação, a pontuação desejável seria de 300 (NOVA ESCOLA, 2011). O município de Santo André, SP, local de estudo deste projeto, teve desempenho na edição de 2011 de 247,37, que corresponde ao nível 5, onde o aluno deveria ter desenvolvido as seguintes habilidades: Identificar a localização/movimentação de objeto em mapas, desenhado em malha quadriculada; Reconhecer e utilizar as regras do sistema de numeração decimal, tais como agrupamentos e trocas na base 10 e o princípio do valor posicional; Calcular o resultado de uma adição por meio de uma técnica operatória; Ler informações e dados apresentados em tabelas; Resolver problema envolvendo o cálculo do perímetro de figuras planas, desenhadas em malhas quadriculadas; Resolver problemas; Utilizar a escrita decimal de cédulas e moedas do sistema monetário brasileiro. De acordo com a proposta do projeto, analisaremos as competências e habilidades relacionadas à álgebra. Faremos a análise através de dados estatísticos disponíveis no site do INEP, que serão apresentados a seguir. Análise dos Dados Os conjuntos de dados apresentados e analisados neste trabalho são intitulados pelo INEP de microdados, e estão disponíveis na aba “Informações Estatísticas” na página virtual do referido instituto. Consistem em um arquivo compactado contendo seis pastas com informações gerais sobre a prova. Quatro delas trazem arquivos auxiliares aos dados, sendo que alguns destes podem ser acessados de outras formas pelo próprio site como, por exemplo, a Matriz de Referência. Os demais arquivos trazem os modelos dos questionários socioeconômicos - respondidos por professores, gestores e alunos - além de um manual de usuário e um dicionário para o acesso aos dados das provas. As outras duas pastas referem-se aos dados estatísticos da prova e aos 79 cálculos das médias para o país, regiões e estados. O acesso a estes dados é feito pelo uso do programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), ou pelo próprio MS-Excel, no caso das planilhas menores. Apesar da disponibilidade dos microdados no site do INEP, existem algumas dificuldades na obtenção e manipulação desses dados. A maioria das planilhas contém uma quantidade de dados superior à capacidade de processamento do MS-Excel, sendo necessário fazer o download do SPSS, que é um programa auxiliar de licença paga, capaz de abrir planilhas com grande quantidade de informações. Foi utilizada uma versão de teste, disponível gratuitamente por 30 dias. Contudo, existiram outras dificuldades, como também na manipulação dessa ferramenta por desconhecimento do programa e a falta das provas aplicadas em 2011, já que no site só são disponibilizadas provas modelo, contendo questões do mesmo tipo da matriz de referência. Após a obtenção dos dados, trabalhamos com duas planilhas, nomeadas TS_RESPOSTA_ALUNO, que traz as informações das respostas dos alunos e TS_ITEM, com informações das habilidades dos itens da prova e do gabarito. Para acessar as informações contidas na primeira planilha, foi necessário usar o programa SPSS para selecionar os dados de interesse desta pesquisa, ou seja, as respostas dos alunos do município de Santo André, SP. Estes dados foram transferidos para uma nova planilha no MS-Excel, por preferência de uso deste grupo, que já tem alguma familiaridade com o programa. A partir da planilha TS_RESPOSTA_ALUNO, pôde-se obter as respostas de cada aluno à cada questão da prova e por fim, correlacionar, a partir da planilha TS_ITEM, com o descritor da mesma. Como esta pesquisa interessa-se pelo levantamento de dados em relação à álgebra, apenas as questões referentes aos descritores anteriormente listados foram levadas em consideração nesta análise. Foram encontradas treze questões distribuídas entre seis dos sete blocos existentes relacionadas aos descritores D29 a D35. Da junção dos dados dos primeiro e segundo blocos respondidos por cada aluno, além do levantamento da quantidade de alunos que respondeu cada um dos sete blocos existentes, foi possível identificar os percentuais de acertos e erros para cada uma das questões analisadas, apresentados na Figura 1, a seguir. 80 Figura 1 - Porcentagem de acertos e erros nas questões de álgebra da Prova Brasil/2011. Os códigos abaixo de cada par de barras indicam o bloco (B), a questão (Q) e o descritor (D) para cada dado apresentado. Fonte: Elaborado pelas autoras. O intuito deste levantamento era identificar alguma relação entre os percentuais de acertos e os descritores relacionados às questões. No entanto, pôde-se observar que apenas os descritores, em alguns casos, não são suficientes para identificar dificuldades na aprendizagem dos alunos, como no caso do descritor 29, presente nos blocos 1, 2, 3 e 7, com questões com percentuais de acerto, respectivamente, iguais a 35,8%, 36,7%, 63,0% e 59,8%. A provável causa desta variação nos percentuais de acertos de questões relacionadas ao mesmo descritor é o modelo de avaliação segundo o TRI, uma vez que é característica deste sistema o uso de questões com diferentes níveis de dificuldade. Sendo assim, torna-se muito difícil identificar as dificuldades sem ter acesso às questões propriamente ditas. Outro dado importante é que cerca de 15% dos alunos de Santo André foram avaliados em álgebra por uma única questão, correspondente ao descritor 33. Isso porque, uma vez que o Bloco 5 não possui questões de álgebra, os alunos que receberam os Blocos 5 e 6 responderam à única questão presente neste segundo bloco. Evidentemente, esse aspecto não afeta os propósitos da Prova Brasil, uma vez que seu 81 intuito é mapear de forma geral a aprendizagem de matemática, mas compromete parcialmente a investigação deste trabalho. Em virtude da extensão da investigação realizada, apresentaremos uma análise parcial relacionando as concepções de educação algébrica apresentadas a dois descritores. Foram selecionados os descritores D30 e D31, por relacionarem-se às questões de menor percentual de acerto na edição de 2011. Esta análise aparece sintetizada no quadro a seguir: Quadro 2 - Os descritores D30 e D31 relacionados com as concepções de educação algébrica Concepção de Educação Algébrica D 30 - Calcular o valor numérico de uma equação algébrica Fiorentini –– Linguística Pragmática Usiskin – Como estudo de procedimentos para resolver certos tipos de problemas e D 31 – Resolver problemas que envolvam equações do 2º grau Lins e Gimenez – Modelagem Matemática ou Facilitadora Justificativa Estuda as expressões algébricas seguido do uso das equações para resolução de problemas Atividades que envolvam incógnitas, com o objetivo de simplificar e resolver. A Educação Algébrica se dá na medida em que a produção de conhecimento algébrico serve ao propósito de iluminar ou organizar uma situação. Como exemplo da concepção facilitadora temos o uso de balança de dois pratos para exemplificar uma equação. Fonte: Elaborado pelas autoras. Observamos que os descritores D30 e D31 correspondem às mesmas concepções de educação algébrica. Também observamos que ambos requerem a resolução de equações algébricas. Percebemos, contudo, que os alunos não apresentam, pelo menos nesta prova, tanta dificuldade na identificação de equações que caracterizam um problema, dados os percentuais de acerto dos descritores D32 e D33. Podemos atribuir esse baixo percentual de acerto dos descritores D30 e D31 a dificuldades de assimilação do procedimento de resolução de equações. 82 É importante destacar que outros descritores envolvem as mesmas concepções procedimentais de educação algébrica apresentadas no quadro anterior, o que pode ser conferido nos demais quadros, anexos. Entretanto, dada a amplitude dos descritores, a concepção de educação algébrica a eles relacionada pode ser justificada por diferentes razões. Por exemplo, o descritor D31, que categorizamos, conforme Lins e Gimenez, em duas concepções contrárias, tanto pode se encaixar em uma como em outra concepção dependendo da questão elaborada. Salientamos, mais uma vez, que a inacessibilidade à prova inviabiliza uma análise mais profunda das relações dos descritores com as concepções aqui apresentadas. Vale, por fim, destacar que a maior parte das concepções que a Prova Brasil contempla dão ênfase às resoluções procedimentais. Considerações Finais Como parte de resultados preliminares da investigação apresentada, apontaremos algumas considerações no que tange ao prospecto da Prova Brasil, em específico a edição de 2011. Em primeiro lugar gostaríamos de salientar que a ênfase dada aos procedimentos de resolução, prevista e criticada pelos autores estudados, não condiz com os resultados observados na análise dos dados. Pelo que extraímos dos dados analisados, observamos que o processo de ensino e aprendizagem de determinados conceitos algébricos não tem obtido êxito, visto que os alunos conseguem, por vezes, identificar equações que descrevem um problema, mas não são capazes de resolvê-las. Em contrapartida, pela experiência das professoras que compõe este grupo e pelo relato de outros trabalhos, estes resultados diferem das vivências em sala de aula, que apontam que os alunos “não dominam nem compreendem o enunciado da situação problema para transpô-lo para a linguagem matemática” (PETRONILO, 2008). Ainda não sabemos como justificar e interpretar estes dados, o que pode ser relacionado à inacessibilidade da prova e à dificuldade de acesso e tratamento dos dados disponibilizados. 83 As implicações destas limitações e, principalmente, das características identificadas na Prova Brasil, nos possibilitaram retomar os objetivos do projeto de pesquisa, que futuramente subsidiarão intervenções didáticas, a fim de confrontarmos os resultados aqui apresentados com a prática em sala de aula e, talvez, encontrar meios para justificar as discrepâncias aqui apresentadas. Referências BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996., 1996. Disponivel em: <http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/ldb.pdf>. Acesso em: 05 fevereiro 2014. FIORENTINI, D.; MIORIM, M. Â.; MIGUEL, A. Contribuição para um Repensar. a Educação Algébrica Elementar. Pro-Posições, Campinas - SP, v. 4, n. 1, p. 78-91, março 1993. INEP. Histórico do SAEB, 2011a. Disponivel <http://portal.inep.gov.br/web/saeb/historico>. Acesso em: 05 fevereiro 2014. em: INEP. Matrizes de Referência, 2011b. Disponivel em: <http://provabrasil.inep.gov.br/matrizes-de-referencia-professor>. Acesso em: 07 fevereiro 2014. INEP. As avaliações e o Ideb, 2011c. Disponivel em: <http://provabrasil.inep.gov.br/asavaliacoes-e-o-ideb>. Acesso em: 12 fevereiro 2014. INEP. Aplicação, 2011d. Disponivel <http://portal.inep.gov.br/web/saeb/aplicacao>. Acesso em: 08 fevereiro 2014. em: INEP. Escalas da Prova Brasil e SAEB, 2011e. Disponivel em: <http://portal.inep.gov.br/web/saeb/escalas-da-prova-brasil-e-saeb>. Acesso em: 14 fevereiro 2014. LINS, R. C.; GIMENEZ, J. Sobre álgebra. In: LINS, R. C.; GIMENEZ, J. Perspectivas em Aritmética e Álgebra para o século XXI. Campinas: Papirus Editora, 2001. Cap. III, p. 89-157. Como interpretar os resultados da Prova Brasil. Nova Escola, n. 222, abril 2011. PETRONILO, A. C. D. S. Dificuldades de aprendizagem na resolução de problemas envolvendo equações de 1º grau. Trabalho de Conclusão de Curso (TCC). Universidade Católica de Brasília. Brasília, p. 10. 2008. RABELO, M. H. M.; PLAZA, E. M. Avaliação na educação básica: um estudo teórico sobre a Prova Brasil. Conferência Interamericana de Educação Matemática. Recife: [s.n.]. 2011. p. 11. 84 RIBEIRO, A. J. Elaborando um Perfil Conceitual de Equação: Desdobramentos para o Ensino e a Aprendizagem de Matemática. Ciência & Educação, v. 19, 2013. 55-71. USISKIN, Zalman. Concepções sobre a álgebra da escola média e utilizações das variáveis. In: COXFORD, Arthur F.; SHULTE, Alberto P.(Org). As idéias da álgebra. São Paulo: Atual, 1995. ANEXOS Quadro 3 - Relação do descritor 29 com as concepções de educação algébrica Concepção de Educação Algébrica D 29 - Resolver problema que envolva variação proporcional, direta ou inversa, entre grandezas. Justificativa Fiorentini –– Linguística Pragmática Estuda as expressões algébricas seguido do uso das equações para resolução de problemas Usiskin – Como estudo de procedimentos para resolver certos tipos de problemas Atividades que envolvem incógnitas, com o objetivo de simplificar e resolver. Lins e Gimenez – Modelagem Matemática A Educação Algébrica se dá na medida em que a produção de conhecimento algébrico serve ao propósito de iluminar ou organizar uma situação Fonte: Elaborado pelas autoras Quadro 4 - Relação do descritor 30 com as concepções de educação algébrica Concepção de Educação Algébrica D 30 - Calcular o valor numérico de uma equação algébrica Justificativa Fiorentini –– Linguística Pragmática Estuda as expressões algébricas seguido do uso das equações para resolução de problemas Usiskin – Como estudo de procedimentos para resolver certos tipos de problemas Atividades que envolvem incógnitas, com o objetivo de simplificar e resolver. Lins e Gimenez – Modelagem Matemática ou Letrista Facilitadora A Educação Algébrica se dá na medida em que a produção de conhecimento algébrico serve ao propósito de iluminar ou organizar uma situação. No caso da Letrista Facilitadora o uso de balança de dois pratos para ensinar resolução de problemas Fonte: Elaborado pelas autoras 85 Quadro 5 - Relação do descritor 31 com as concepções de educação algébrica Concepção de Educação Algébrica D 31 - Resolver problema que envolva equação do 2 grau. Justificativa Fiorentini –– Linguística Pragmática Estuda as expressões algébricas seguido do uso das equações para resolução de problemas Usiskin – Como estudo de procedimentos para resolver certos tipos de problemas Atividades que envolvem incógnitas, com o objetivo de simplificar e resolver. Lins e Gimenez – Modelagem Matemática ou Letrista Facilitadora A Educação Algébrica se dá na medida em que a produção de conhecimento algébrico serve ao propósito de iluminar ou organizar uma situação. No caso da Letrista Facilitadora o uso de balança de dois pratos para ensinar resolução de problemas Fonte: Elaborado pelas autoras Quadro 6 - Relação do descritor 32 com as concepções de educação algébrica Concepção de Educação Algébrica D 32 - Identifica a expressão algébrica que expressa uma regularidade observada em sequencias de números ou figuras (padrão). Justificativa Fiorentini – Fundamentalista Estrutural Estudo de tópicos “fundamentadores” precedendo estudo de expressões algébricas, valores numéricos e outros. Usiskin – Como Aritmética generalizada Atividades de generalização de propriedades de operação Lins e Gimenez – Modelagem Matemática ou Letrista Facilitadora A Educação Algébrica se dá na medida em que a produção de conhecimento algébrico serve ao propósito de iluminar ou organizar uma situação. No caso da Letrista Facilitadora a abstração ocorre por adivinhação e não é passagem natural. Fonte: Elaborado pelas autoras 86 Quadro 7 - Relação do descritor 33 com as concepções de educação algébrica Concepção de Educação Algébrica D 33 - Identificar uma equação ou inequação do 1 grau que expressa um problema Justificativa Fiorentini –– Linguística Pragmática Estuda as expressões algébricas seguido do uso das equações para resolução de problemas Usiskin – Como estudo de procedimentos para resolver certos tipos de problemas Atividades que envolvem incógnitas, com o objetivo de simplificar e resolver. Lins e Gimenez – Modelagem Matemática ou Letrista Facilitadora A Educação Algébrica se dá na medida em que a produção de conhecimento algébrico serve ao propósito de iluminar ou organizar uma situação. No caso da Letrista Facilitadora o uso de balança de dois pratos para ensinar resolução de problemas Fonte: Elaborado pelas autoras Quadro 8 - Relação do descritor 34 com as concepções de educação algébrica Concepção de Educação Algébrica D 34 - Identificar um sistema de equação do 1 grau que expressa um problema Fiorentini –– Linguística Pragmática ou Fundamentalista Analógica Usiskin – Como estudo de procedimentos para resolver certos tipos de problemas Lins e Gimenez – Modelagem Matemática ou Letrista Justificativa Estuda as expressões algébricas seguido do uso das equações para resolução de problemas. Para a Fundamentalista Analógica predomina tarefas que utilizam recursos analógicos geométricos e materiais concretos, como balanças e gangorras, para justificar a transformação algébrica. Atividades que envolvem incógnitas, com o objetivo de simplificar e resolver. A Educação Algébrica se dá na medida em que a produção de conhecimento algébrico serve ao propósito de iluminar ou organizar uma situação. No caso da Letrista atividades baseadas em cálculo com letras, admitindo a sequencia técnica-prática (algoritmo-exercícios). Fonte: Elaborado pelas autoras 87 Quadro 9 - Relação do descritor 35 com as concepções de educação algébrica Concepção de Educação Algébrica D 35 - Identificar a relação entre as representações algébrica e geométrica de um sistema de equação do 1 grau Fiorentini Fundamentalista Analógica Fundamentalista Estrutural Justificativa ou Para a Fundamentalista Analógica predomina tarefas que utilizam recursos analógicos geométricos e materiais concretos, como balanças e gangorras, para justificar a transformação algébrica. Já para o Fundamentalista Estrutural é o estudo de tópicos “fundamentadores” precedendo estudo de expressões algébricas, valores numéricos e outros. Usiskin – Como estudo de procedimentos para resolver certos tipos de problemas Atividades que envolvam incógnitas, com o objetivo de simplificar e resolver. Lins e Gimenez Modelagem Matemática – A Educação Algébrica se dá na medida em que a produção de conhecimento algébrico serve ao propósito de iluminar ou organizar uma situação. Fonte: Elaborado pelas autoras 88 EIXO TEMÁTICO: E2 – CURRÍCULO PROCESSO DE APROPRIAÇÃO, DE PROFESSORES, DE MATERIAIS DIDÁTICOS QUE APRESENTAM O CURRÍCULO DE MATEMÁTICA Gilberto JANUARIO – [email protected] Katia LIMA – [email protected] Célia Maria Carolino PIRES – [email protected] Resumo: Neste artigo, expomos algumas reflexões sobre o processo de apropriação, de professores dos 6º e 7º anos do Ensino Fundamental, de materiais didáticos que apresentam o currículo de Matemática. Os resultados são frutos do desenvolvimento do projeto Avaliação de Professores do Ensino Fundamental da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, em relação a documentos e materiais de apoio à organização curricular na área de Educação Matemática. Dentre as questões de pesquisa que nortearam o projeto, selecionamos duas para explorarmos neste texto: Como se dá a apropriação e a implementação pelos professores de materiais que visam a transformar o currículo proposto em currículo praticado, no caso do ensino de Matemática? Como os professores utilizam esses materiais, que mudanças realizam, que interpretações fazem das intenções que motivaram as diferentes atividades referentes a uma dada expectativa de aprendizagem? Para discutirmos essas questões apresentamos as contribuições de Sacristán (2000) sobre o nível de currículo apresentado aos professores, e de Remillard (2009) e de Brown (2009) sobre o uso que os professores fazem de materiais curriculares de Matemática e o impacto que causam no ensino. Os professores relatam que a participação no projeto e o uso do material tiveram grande implicação nas atividades realizadas em sala de aula, que foram melhor planejadas e realizadas de forma mais adequada, ressaltando a necessidade de estudos como esse serem parte integrante das propostas de formação. Palavras-chave: Currículo de Matemática, Relação Professor-Currículo, Materiais Didáticos, Educação Matemática. 89 Introdução Ao discutirmos o processo de elaboração e desenvolvimento curricular, consideramos ser o professor o ator fundamental para que diferentes proposições possam se materializar em situações de aprendizagem. Apesar de diferentes agentes e especialistas da educação estarem envolvidos com o currículo, seja na instância das decisões governamentais ou no interior das instituições escolares, é o professor quem coloca em prática as determinações, orientações, sugestões e decisões curriculares. Concebemos, então, o professor como o elo fundamental entre as prescrições e as atividades que favorecem e promovem a construção da aprendizagem. Nesse sentido, embora seja necessária e importante a discussão sobre organização e desenvolvimento curricular, é preciso conhecer como o professor se relaciona com o currículo e com os materiais didáticos. Nesse aspecto, consideramos a relação que os professores estabelecem com os materiais que apresentam o currículo de Matemática como o campo de investigação em Educação Matemática que oportuniza conhecer crenças, concepções e valores atribuídos por esses profissionais aos diferentes níveis do desenvolvimento curricular, além de conhecimentos da própria área de ensino. Nosso objetivo é o de apresentar alguns resultados de um projeto de pesquisa que envolveu professores dos 6º e 7º anos do Ensino Fundamental e o processo de apropriação, por eles, de materiais didáticos que apresentam o currículo de Matemática. O texto é organizado em quatro partes. Na primeira, discutimos sobre o nível de currículo apresentado aos professores, na segunda apresentamos as contribuições de estudos sobre a relação de professores com materiais didáticos, seguida da apresentação do cenário em que ocorreu a pesquisa e, por fim, destacamos alguns resultados. O currículo apresentado ao professor O educador espanhol José Gimeno Sacristán, ao refletir sobre o currículo a partir da prática que se faz dele, expõe que, de modo geral, ao longo da história dos movimentos educacionais, a cultura pedagógica tratou de problemas relacionados aos programas e ao trabalho escolar sem “a amplitude nem ordenação de significados que quer sistematizar o tratamento sobre currículos” (SACRISTÁN, 2000, p. 13). Embora seja tema de diferentes discussões no interior da escola, o significado de currículo restringe-se a programa de ensino, constituído por tópicos de conteúdos, metodologia e objetivos, a ser desenvolvido em um determinado período letivo. 90 Diferente desse significado, assumimos em nossos trabalhos e em nossos estudos, o currículo, em Educação Matemática, inserido na concepção segundo a qual é uma práxis antes que um objeto estático emanado de um modelo coerente de pensar a educação ou as aprendizagens necessárias das crianças e dos jovens, que tampouco se esgota na parte explícita do projeto de socialização cultural nas escolas. É uma prática, expressão da função socializadora e cultural que determinada instituição tem, que reagrupa em torno dele uma série de subsistemas ou práticas diversas, entre as quais se encontra a prática pedagógica desenvolvida em instituições escolares que comumente chamamos ensino. (SACRISTÁN, 2000, p. 15-16) Como um conjunto de diferentes elementos, como discussão, reflexão, proposições, normatizações, sugestões, decisões, conteúdos, objetivos, metodologias, competências, habilidades e expectativas de aprendizagem – dentre outros – o currículo se materializa na sala de aula por meio da prática pedagógica do professor. Porém, da sua elaboração por especialistas da educação à realidade escolar, há diferentes níveis da objetivação curricular. Em uma primeira fase o currículo é idealizado e organizado por uma instância de realidade distante da comunidade onde a instituição escolar está inserida. O nível que, de certo modo, traduz as prescrições oficiais aos docentes e gestores, é o currículo apresentado aos professores. De modo geral, os autores de materiais didáticos ao selecionar, organizar e tratar os conteúdos para elaborar livros, apostilas, ou recursos similares, traduzem para o professor os significados e os conteúdos do currículo prescrito, a partir de seus modos de interpretar as prescrições oficiais. Além de autores de materiais didáticos, guias para a elaboração desses livros também fazem uma transposição do conjunto das orientações oficiais como, por exemplo, o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD). Sacristán (2000) explicita que por serem muito genéricas, as prescrições não são suficientes para orientar o professor quanto ao conjunto de atividades a serem desenvolvidas em situações de aprendizagem. A formação do professor e suas condições de trabalho, muitas vezes precárias, são exemplos de agentes que tornam difícil a prática da decodificação das prescrições. Desse modo, o currículo apresentado por meio de materiais didáticos é a fase que melhor traduz, para o docente, o que evidencia o currículo prescrito. Porém, ao fazer uso de sequências de atividades dos materiais didáticos, aspectos didáticos, metodológicos, teóricos e conceituais que embasam as orientações curriculares podem não ficar claros para o professor. Para desenvolver situações de aprendizagem não é suficiente ao docente reproduzir os materiais à luz de suas convicções e suas experiências. É preciso ele mesmo traduzir as orientações curriculares para propor, problematizar e tematizar os conteúdos matemáticos no desenvolvimento de competências e habilidades. 91 Nesse sentido, a pesquisa sobre a relação que professores estabelecem com materiais didáticos – aqui considerados como o nível de currículo apresentado – dá elementos para identificar e compreender que concepção e conhecimentos têm esses profissionais acerca da Matemática, do currículo, de aspectos didáticos, metodológicos e conceituais e, desse modo, permite elaborar e propor ações formativas para repertoriar a prática docente. A relação professor-materiais didáticos Em nossos estudos sobre currículos prescritos de Matemática temos observado que embora eles possam expressar propostas interessantes e inovadoras, parecem ter dificuldades de se incorporarem à prática dos professores em sala de aula. As adaptações feitas pelos professores no âmbito dos currículos moldados (SACRISTÁN, 2000; PACHECO, 2005) e efetivamente praticados em sala de aula são uma realidade pouco conhecida. No Brasil, os livros didáticos são os materiais curriculares mais difundidos e utilizados. Em Educação Matemática, esses materiais têm sido objeto de diferentes pesquisas, porém sem o foco em como os professores os utilizam e se, e como, estes de fato influenciam as práticas nas aulas de Matemática. Por outro lado, Secretarias de Educação têm elaborado e oferecido materiais curriculares a seus professores, como documentos de orientações e materiais apostilados que procuram traduzir essas orientações em situações de aprendizagem. No entanto, a implementação desses materiais não tem sido acompanhada de estudos mais sistemáticos sobre seu uso. Ao buscar na literatura aportes para nossas reflexões, encontramos a publicação Mathematics Teachers at Work: Connecting Curriculum Materials and Classroom Instruction, coordenada por Janine Remillard, Beth Herbel-eisenmann e Gwendolyn Lloyd, os quais destacam que em resposta a um campo de pesquisa de rápido crescimento, o livro coloca uma ênfase particular – mas não se limita a – nos materiais curriculares desenvolvidos em resposta às Normas do National Council of Teachers of Mathematics (NCTM). Ao questionar-se a respeito do "que entendemos sobre a relação entre os materiais curriculares no ensino”, Remillard (2009) destaca a urgente necessidade de percebermos que o campo de pesquisa sobre o uso de materiais curriculares de Matemática pelos professores carece de uma base teórica e conceitual. Como um campo, não temos – ou que não tenham sido explícito sobre – teorias que fundamentam e explicam as relações que são objetos centrais de estudo. Como resultado, o campo não produziu um corpo de conhecimento sobre a relação do professor com os materiais curriculares, que possam ser generalizáveis a outros 92 professores, materiais, ou contextos, ou que possam informar o trabalho dos decisores políticos, currículos prescritos e designers de materiais de maneiras substantivas. (REMILLARD, 2009, p. 85) A leitura do livro mostra que nos Estados Unidos há um número crescente de pesquisas na área de Educação Matemática que procuram entender o que acontece com professores e alunos quando do uso de materiais que apresentam os currículos prescritos. Considera essencial compreender o que os professores fazem com os materiais curriculares de Matemática, porque e como fazem suas escolhas e como os materiais influenciam a atividade de sala de aula. Um dos artigos do livro intitula-se The teacher–tool relationship: theorizing the design and use of curriculum materials, escrito por Matthew William Brown, que destaca serem essas pesquisas importantes fontes de informação para as investigações sobre a organização e o desenvolvimento curricular, como também as pesquisas e ações no mundo das práticas, focalizando especialmente os resultados sobre o que os estudantes aprendem. Segundo esse autor, embora o campo de pesquisa sobre o uso de recursos curriculares por professores esteja crescendo, é ainda insuficientemente desenvolvido. Nos Estados Unidos, estudos sobre professores usando livros didáticos de Matemática, ou sobre a influência dos livros didáticos no currículo começaram a surgir por volta dos anos 1970. Ao longo dos anos, o interesse por essas pesquisas tem oscilado, ora aumentando, ora diminuindo. Também ao longo do tempo, pesquisadores têm trazido contribuições sobre a relação professor-currículo. No entanto, antes dos anos 1990, este campo nunca reuniu impulsos ou coesão em torno de um conjunto particular de questões. Na primeira década dos anos 2000, contudo, o campo cresceu consideravelmente, sinalizando um aumento no interesse pelas questões sobre como os professores usam os materiais curriculares e se estes materiais de fato podem influenciar as práticas em sala de aula e o ensino de forma mais ampla. Brown (2009) afirma que entender por que os professores interagem com os materiais curriculares de diferentes formas requer o exame de como as características dos materiais interagem com as capacidades que os professores trazem para essa interação. Em suas pesquisas, Brown analisou os recursos que os professores e os materiais curriculares trouxeram para o intercâmbio do professor com esses materiais. Ele explicita seu procedimento metodológico, por meio de uma figura intitulada The Design Capacity for Enactment Framework (DCE), figura 1. Brown argumenta que o quadro DCE capta os diferentes elementos da dinâmica professor-ferramenta e representa os diferentes tipos de interações que ocorrem entre os 93 recursos dos professores e recursos curriculares, ou seja, como professores adaptam, adotam ou improvisam com recursos curriculares. À direita do quadro, ele situa os conhecimentos, habilidades, objetivos e crenças dos professores e como eles influenciam as maneiras pelas quais professores percebem e se apropriam dos diferentes aspectos dos designs curriculares. Os professores trazem pelo menos três tipos diferentes de recursos para seu uso dos materiais curriculares: (a) o conhecimento do conteúdo, (b) conhecimento pedagógico do conteúdo (Shulman, 1986), e (c) os objetivos e crenças. Conhecimento do conteúdo denota conhecimento de fatos e conceitos do domínio (Ball, 1991; Stodolsky e Grossman, 1995). Conhecimento pedagógico do conteúdo combina o conhecimento pedagógico geral, com conhecimento específico para descrever o conhecimento de como ensinar um domínio específico. Ele inclui os objetivos e fins de ensino do conteúdo, conhecimento de como os alunos se relacionam com o conteúdo, o conhecimento dos recursos disponíveis e representações para o ensino do conteúdo, e conhecimento das estratégias instrucionais e métodos para o ensino do conteúdo específico (Shulman, 1986). Objetivos e crenças – que Ball e Cohen (1999) expressam "compromissos" – referem-se às orientações dos professores para com o material que ensinam. Isso vai além de sua capacidade de ensinar alguém se concentrar em suas motivações para ensinála. Pesquisadores têm documentado o que acontece quando as reformas curriculares não conseguem atender ou, em alguns casos desafiam objetivos e crenças dos professores. Por exemplo, Spillane (1999) e Wilson (1990) documentam como as crenças dos professores sobre a natureza das capacidades de aprendizagem dos alunos podem impedir a adoção de novas abordagens de ensino. Da mesma forma, Cohen (1988a, 1988b) observa como objetivos conflitantes – individual e social – podem resultar entraves significativos à implementação das reformas educacionais. Assim, a natureza dos objetivos e crenças dos professores é altamente relevante para a compreensão de como os professores percebem e se apropriam dos materiais currículares. (BROWN, 2009, p. 27) À esquerda do quadro, o autor engloba os recursos do design e conhecimento incorporado que compõem os materiais curriculares – incluindo três aspectos básicos dos materiais curriculares: (a) os objetos físicos e representações de objetos físicos, (b) representações de tarefas (procedimentos), e (c) representações de conceitos (representações de domínio). Objetos físicos denotam a natureza material dos materiais curriculares em si mesmos, incluindo suprimentos de acompanhamento. Representações de objetos físicos representam materiais que são recomendados, mas não foram incluídos dentro, os materiais curriculares. Eles também incluem projetos para montagem ou arranjando de outros objetos. Representações de tarefas incluem instruções, procedimentos e scripts que são destinados à promulgação por professores e alunos. Estes 94 podem incluir recomendações sobre como estruturar uma lição (para professores) ou problemas para resolver (para estudantes). Materiais curriculares podem também representar tarefas de outras formas mais indiretas. Por exemplo, o sequenciamento deliberado de atividades podem implicitamente representar práticas de alto nível de domínio que os designers pretendem transmitir. Finalmente, as representações de conceitos referem-se à representação e organização de conceitos de domínio e seus relacionamentos por meio de meios tais como diagramas, modelos, explicações, descrições e analogias. Estruturas maiores, tais como tópicos sequenciais, também podem representar conceitos de domínio. Este é frequentemente o caso em livros didáticos, que muitas vezes são sequenciados de acordo com as formas que os especialistas pensam sobre o domínio. Juntas, essas três facetas abrangem o mais fundamental aspectos do conteúdo e estrutura de um currículo: as suas ideias principais, as atividades realizadas na sua exploração, e os objetos que apóiam tal atividade. (BROWN, 2009, p. 27) Figura 1: The Design Capacity for Enactment Framework (BROWN, 2009, p. 26) Para o autor, o Design Capacity for Enactment Framework fornece um ponto de partida para identificar e situar os fatores que podem influenciar o modo como um professor adapta, desenvolve ou improvisa a partir dos recursos curriculares. Ele chama atenção para o fato de que os recursos dos professores e os recursos curriculares que selecionou não são de maneira alguma exaustivos, e refletem os objetivos particulares e as limitações do seu próprio contexto de investigação – o que pôde observar nas interações em sala de aula. 95 Contextualizando a Pesquisa A Secretaria Municipal de Educação de São Paulo desde 2006 tem investido na elaboração de materiais curriculares para nortear a prática dos professores que ensinam Matemática nos diferentes níveis e modalidades de ensino. Dentre esses materiais, destacamos as Orientações curriculares e proposição de expectativas de aprendizagem de Matemática para o Ensino Fundamental – 1º ao 5º anos e 6º ao 9º anos –, e Cadernos de Apoio e Aprendizagem de Matemática – 1º ao 9º anos para alunos e professores. Em 2011 e 2012 foi desenvolvido o projeto Avaliação de Professores do Ensino Fundamental da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, em relação a documentos e materiais de apoio à organização curricular na área de Educação Matemática, inserido no Programa de Melhoria do Ensino Público da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP)4. Além de duas pesquisadoras responsáveis, o estudo contou com oito pesquisadores-colaboradores que coordenavam as reuniões de 31 professores da rede municipal, por agrupamentos correspondentes aos anos de escolaridade, utilizando a metodologia de grupos focais. As reuniões eram realizadas aos sábados, com periodicidade quinzenal. No total do Projeto, os professores participaram de 112 horas de trabalho. Em relação aos 6º e 7º anos, esses dois grupos foram compostos por três professores e cinco professoras, com idade predominante de 40 a 50 anos. Quanto à formação, um professor possuía licenciatura em Ciências e os demais, em Matemática. Três docentes tinham mais de 20 anos de tempo de Magistério na rede municipal de São Paulo, uma professora possuía 14 anos e os demais, menos de 10 anos de carreira docente na rede municipal. Nesse projeto de pesquisa procurou-se compreender quais eram as contribuições que os Cadernos de Apoio e Aprendizagem de Matemática poderiam trazer para as experiências pedagógicas inovadoras das escolas dessa rede. 4 O Projeto foi proposto e desenvolvido a partir da parceria das pesquisadoras Celia Maria Carolino Pires (PUC/SP) e Edda Curi (UNICSUL), com a anuência da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo. 96 Foram questões norteadoras da pesquisa: (1) Como se dá a apropriação e a implementação pelos professores de materiais que visam a transformar o currículo proposto em currículo praticado, no caso do ensino de Matemática? (2) Como os professores utilizam esses materiais, que mudanças realizam, que interpretações fazem das intenções que motivaram as diferentes atividades referentes a uma dada expectativa de aprendizagem? (3) Que aspectos de sua formação precisam ser aperfeiçoados com vistas a uma atuação mais criativa num processo de ensino compatível com perspectivas de aprendizagem? (4) Quais reformulações precisam ser incorporadas nos materiais para otimizar seu uso? Neste texto iremos explorar apenas as duas primeiras questões. Como parte das atividades, os professores avaliavam conjuntamente as unidades de ensino e planejavam seu desenvolvimento. Durante a realização da unidade, cada professor produzia dois relatórios. Posteriormente, o pesquisador-colaborador de cada grupo produzia um relatório síntese, no qual as informações eram agrupadas nas seguintes categorias: adequação das expectativas de aprendizagem e das atividades propostas em relação a elas; adequação das atividades para explorar conhecimentos prévios dos alunos; avanços observados nas aprendizagens dos alunos; pontos merecedores de complementação ou de correção nos materiais; e outras observações (se houvesse). Nesse texto iremos explorar essas categorias apresentando algumas análises resultantes das discussões nos encontros e dos relatórios produzidos pelo grupo de professores do 6º e do 7º anos5. Alguns resultados da pesquisa Os Cadernos de Apoio e Aprendizagem de Matemática (CAA) são compostos por oito unidades, nas quais são desenvolvidas sequências didáticas a partir das expectativas de aprendizagem propostas nas Orientações Curriculares (SÃO PAULO, 2010). Quanto à adequação das expectativas de aprendizagem e das atividades propostas em relação a elas todos os professores participantes dos grupos do 6º e do 7º anos afirmaram, durante os encontros realizados, que as sequências didáticas estavam 5 Os relatórios em relação aos 6º e 7º anos foram consolidados pelos pesquisadorescolaboradores Gilberto Januario e Kátia Lima. 97 adequadas às expectativas de aprendizagem propostas para as oito unidades do Caderno de Apoio e Aprendizagem de Matemática. Essa adequação refere-se apenas às expectativas de aprendizagem. Não foram consideradas, nessa categoria, as necessidades de intervenções e de outras atividades que complementassem essas sequências. Referente à adequação das atividades para explorar conhecimentos prévios dos alunos, os professores afirmaram que os CAA de Matemática para os 6º e 7º anos apresentam boas situações de aprendizagem, as quais possibilitam os alunos a mobilização de seus conhecimentos prévios, o levantamento de hipóteses e as trocas de estratégias para a resolução das situações. Nesse sentido, ressaltam a resolução de problemas e a exploração como metodologias que propiciam a interação dos alunos entre si, com o professor e com as situações propostas. Apesar disso, os professores relataram que algumas das atividades propostas nas oito unidades potencializaram a mobilização dos conhecimentos prévios por parte dos alunos, mas outras não. Como ações para identificar os diferentes saberes e hipóteses dos alunos, destacam-se os questionamentos no início de cada sequência de atividade e os diálogos e perguntas estabelecidas entre os professores e os alunos. Em relação aos avanços observados nas aprendizagens dos alunos, os professores relataram, em cada unidade, os avanços referentes a cada expectativa de aprendizagem trabalhada. Quanto às aprendizagens mais gerais e não específicas de um conteúdo ou expectativa de aprendizagem, destacaram que a partir das sequências de atividades aliadas com a metodologia da resolução de problemas, foi possível ao aluno desenvolver importantes avanços: compreensão mais consistente da utilização dos números em diferentes contextos sociais; procedimentos para a resolução de problemas – importância de uma boa leitura e análise cuidadosa do enunciado; levantamento de hipóteses de resolução; elaboração e apresentação, por meio de painel, de diferentes estratégias de resolução e validação dos resultados obtidos; desenvolvimento da competência leitora dos alunos com diversos portadores de textos – gráficos, tabelas, textos informativos, texto jornalístico, mapas e obras de arte – mostrando-lhes que essas ferramentas também possibilitam o acesso ao conhecimento matemático; utilização da calculadora e de ferramentas tais como régua, compasso e transferidor para resolução de problemas; ampliação do conhecimento dos alunos sobre a Cidade de São Paulo a partir 98 de textos informativos, mapas, obras de arte e vídeos; desenvolvimento do cálculo mental, entre outros. Relativamente aos pontos merecedores de complementação ou de correção nos materiais, as contribuições dos professores foram de diferentes naturezas: necessidade de troca de um conceito por outro, quando estes possuem diferentes aceitações na comunidade acadêmica; utilização de material manipulativo antes do desenvolvimento da sequência, principalmente em algumas sequências referentes à geometria; apresentação de uma sequência mais simples antes da sequência que foi apresentada, por considerarem o conteúdo complexo e por ter sido a primeira abordagem sobre o conteúdo – essa consideração foi relatada pelos professores do 7º ano em duas sequências didáticas –; reformulação da sequência didática para atingir o objetivo proposto; necessidade de sistematização dos conceitos abordados após o desenvolvimento das sequências; proposição de atividades de livros didáticos que visem à fixação ou que possam ser extensão das atividades propostas nos Cadernos de Apoio e Aprendizagem, principalmente quando os alunos apresentaram maiores dificuldades com o desenvolvimento da sequência didática; utilização de calculadoras, mesmo quando seu uso não foi indicado no CAA do professor; proposição de oficinas de Matemática para o aprimoramento de um determinado conteúdo ou conceito; proposição de atividades ou exposição oral antes do desenvolvimento da sequência. Quanto à sugestão para alteração/inclusão, as contribuições dos professores foram diversas. Tanto os professores do 6º quanto os do 7º ano indicaram alguns erros presentes nos Cadernos. Esses erros referiram-se principalmente à escrita de um enunciado, à gramática, à escala de um gráfico, a uma imagem ou figura e a respostas contidas no Caderno do professor. Porém, não encontraram erros conceituais. Os professores também indicaram a necessidade de correção e melhoramento nos contornos de algumas tabelas, nos enunciados de algumas questões, sugeriram a ampliação de alguns mapas que poderiam vir como encarte no CAA do professor, além de sugestões para serem acrescentadas às indicações para o professor como forma de melhor desenvolverem as sequências em sala de aula. Os professores perceberam a necessidade de ampliação de algumas sequências, e um professor indicou atividades que poderiam ser contempladas para essa ampliação. 99 Outra sugestão indicada pelos professores, refere-se à antecipação de algumas atividades presentes nos Cadernos de Apoio e Aprendizagem de Matemática. Essa sugestão merece destaque, pois inicialmente, os professores, indicavam a antecipação de sequência didática inteira, mas, com as reflexões feitas nos encontros, começaram a perceber a importância e as justificativas para a ordem das sequências apresentadas nos Cadernos. Uma sugestão específica e pontual do 6º ano refere-se à exploração dos diferentes conceitos de ângulo para a melhor compreensão dessa ideia ou desse conceito. No referido Caderno é apresentado apenas a dimensão estática desse conceito, e os professores sugerem que também seja abordada a dimensão dinâmica, apesar de reconhecerem que essa questão é contemplada no Caderno de Apoio e Aprendizagem de Matemática do 7º ano. Quanto aos tipos de uso apresentados por Brown (2009), segundo o relato dos professores participantes, o fato de haver, no grupo, docentes muito experientes evidenciou que nesses casos predomina o uso com adaptações e criações. As adaptações consistiam por vezes em fazer alterações nas sequências propostas, em ampliar o número de exemplos, de problematizações e também de inserir revisões que achavam necessárias. Os mais inexperientes mostraram uma dependência maior do material e as modificações que propunham muitas vezes se relacionavam às suas próprias dificuldades tanto com conteúdos matemáticos como em relação a conhecimentos didáticos. Os participantes avaliaram como positivo o fato do material explicitar com razoável transparência as concepções teóricas subjacentes. As discussões das atividades com os pares, realizadas nas reuniões no grupo, foram indicadas como positivas pelos professores que avaliaram como fatores importantes para seu desenvolvimento profissional. Considerações finais Nos relatos escritos e orais ficou bastante evidente que a participação no projeto e o uso do material tiveram grande impacto nas atividades realizadas em sala de aula, que foram melhor planejadas e realizadas de forma mais adequada. E isso ficou bem evidente para os professores. 100 Alguns deles demonstraram que tinham algumas dificuldades quanto à abordagem metodológica proposta pelos Cadernos de Apoio e Aprendizagem, porém relataram que as discussões com seus pares e com o pesquisador-colaborador durante os encontros favoreceram a compreensão de alguns processos, principalmente porque a dinâmica de discussão proposta pelo grupo possibilitou que os colegas expusessem como procederiam e fariam as intervenções para determinadas situações propostas nas sequências didáticas das unidades do CAA. Uma das categorias analisadas refere-se aos pontos merecedores de complementação. Nela, uma das complementações destacadas pelos professores é a inserção de atividades. Com as discussões nos grupos, percebemos diferentes justificativas, por parte dos professores, para essa inserção. Eles têm consciência de que nenhum material por si só será suficiente para a construção do conhecimento dos alunos, necessitando, portanto, de outras fontes. Em alguns casos, acrescentaram outras atividades por perceberem que na sequência didática, de uma atividade para outra, havia uma ruptura que deixava algumas lacunas. Houve ainda situações, em que os professores precisaram retomar alguns conceitos antes de desenvolverem a sequência, mas estavam conscientes de que nos Cadernos de Apoio e Aprendizagem dos anos anteriores havia essa retomada. E isso, por sua vez, gerava o relato de que se todos os professores utilizassem o material, seria mais fácil o desenvolvimento das sequências, pois os alunos já estariam acostumados com a abordagem metodológica. Um fato identificado por nós foi o da necessidade de alguns professores fazerem, com seus alunos, uma aula expositiva de alguns conteúdos de uma ou outra unidade antes de trabalhar a sequência didática, o que contraria a proposta metodológica do material. Dessa forma, percebemos que a reprodução, a complementação, o tipo de adaptação que o professor faz ao propor uma atividade, ou, ainda, o que o faz adaptar esta ou aquela atividade, bem como os resultados produzidos por essas adaptações ou até mesmo o nível de reprodução que o professor faz em relação aos materiais curriculares, precisam de reflexões mais aprofundadas. Apesar de não ter sido objetivo inicial do projeto, essa proposta se revela como uma importante estratégia para a formação docente, pois os professores avaliaram que participar do Grupo Focal, no papel de professor-pesquisador, foi uma dimensão 101 importante para o seu desenvolvimento profissional, e, portanto, concluem, que estudos como os realizados nesta pesquisa seriam fundamentais para serem vistos como parte integrante dos projetos de formação docente na escola, junto com seus pares. Referências BROWN, M. W. The Teacher-Tool Relationship: Theorizing the Design and Use of Curriculum Materials. In: REMILLARD, J. T; HERBEL-EISENMANN, B. A.; LLOYD, G. M. (Ed.), Mathematics Teachers at Work: Connecting curriculum materials and classroom instruction. New York: Taylor & Francis, 2009, p. 17-36. PACHECO, J. A. Escritos Curriculares. São Paulo: Cortez, 2005. REMILLARD, J. T. Considering What We Know About the Relationship Between Teachers and Curriculum Materials (Part II Commentary). In: REMILLARD, J. T; HERBEL-EISENMANN, B. A.; LLOYD, G. M. (Ed.), Mathematics Teachers at Work: Connecting curriculum materials and classroom instruction. New York: Taylor & Francis, 2009, p. 85-92. REMILLARD, J. T; HERBEL-EISENMANN, B. A.; LLOYD, G. M. Teachers’ Use of Curriculum Materials: An Emerging Field. In: REMILLARD, J. T; HERBELEISENMANN, B. A.; LLOYD, G. M. (Ed.), Mathematics Teachers at Work: Connecting curriculum materials and classroom instruction. New York: Taylor & Francis, 2009, p. 3-14. SACRISTÁN, J. G. O currículo: uma reflexão sobre a prática. 3. ed. Tradução: Ernani F. da Fonseca Rosa. Porto Alegre: Artmed, 2000. SÃO PAULO (Município). Secretaria Municipal de Educação. Diretoria de Orientação Técnica. Orientações curriculares e proposição de expextativas de aprendizagem para o Ensino Fundamental II: Matemática. 2. ed. São Paulo: SME/DOT, 2010. 102 CURRÍCULO E A PESQUISA EM CURRÍCULO DE MATEMÁTICA NO BRASIL. João Acácio Busquini – SEESP – Brasil [email protected] Vinício de Macedo Santos – FEUSP – Brasil [email protected] Resumo: Entender a produção recente de propostas curriculares no Brasil decorrente das teorias curriculares, apenas é possível se tomarmos como base o próprio conceito de ‘currículo’, desvelando a invisibilidade de sua história nessa produção, assim, neste artigo buscamos classificar um tipo de produção curricular restrita ao campo da Matemática. Fazemos uma primeira incursão à produção das teorias curriculares para, em seguida, examinarmos a produção acadêmica sobre o Currículo de Matemática. Para tanto, produzimos algumas categorias para tecermos nossas considerações. Palavras-chave: Currículo 103 104 Introdução No artigo que ora apresentamos consideramos o currículo sob um processo de indução. Partimos de sua elaboração no campo da Educação, da concepção dos pesquisadores que o fundamentam, sua inserção no meio educacional brasileiro e as teorias curriculares que influenciam as elaborações para, em seguida, explorarmos o seu termo adjetivado, ou seja, o Currículo de Matemática. Nesse processo de indução fizemos uma revisão da produção curricular em Matemática, por meio de teses e dissertações a partir das pesquisas elaboradas na universidade na qual destacamos cinco grupos de produção. O primeiro, denominado conteúdos curriculares discutem objetos da Matemática e sua inserção nos currículos ou de suas orientações. O segundo grupo, trata do currículo destinado aos cursos superiores tanto dos cursos de Matemática como da disciplina Matemática em outros cursos. O terceiro grupo é destinado aos impactos das políticas curriculares que influenciam a Matemática. Esse grupo se destaca pela produção intensa comparada aos demais grupos constituídos em nossa pesquisa o qual creditamos pela forte produção crítica na área da Educação Matemática. O quarto grupo refere-se ao currículo na formação de professores e que têm sido objeto de debates constantes em seminários e congressos organizados pela Sociedade Brasileira de Educação Matemática (SBEM). Se os estudos sobre os impactos das políticas são candentes, o quinto grupo, das sugestões curriculares ainda, carece de uma maior produção. Acreditamos que isso seja necessário, primeiro pela própria organização e classificação dessas produções em diversos centros de pesquisas no Brasil; segundo, para identificarmos as concentrações e escassez dessas pesquisas, a fim de subsidiar futuras pesquisas e terceiro, para lançar luz ao alinhamento ou desalinhamento das orientações nacionais frente ao campo de pesquisa. 1. Currículo Na busca por uma definição singular para ‘currículo’, encontramos pluralidades. O termo em destaque, segundo Goodson (2010) teve início na Escola de Montaing, no século XV, na França, com sua divisão em classes, tendo a ideia de ordem, no sentido de sequência, como base para as práticas educativas francesas do século XVI. Esse termo admite novo significado durante o período mercantilista. As transformações sociais e econômicas foram condições para a reorganização do processo educativo. Passa a existir, nesse momento, o conceito de currículo como etapas de ensino com a intenção clara da padronização (SILVA, 2006). No inicio do século XX, nos Estados Unidos, as mudanças de uma América rural para um processo de industrialização possibilitam a Francis Bobbit e Edward Thorndike entre outros, a elaboração de um currículo cuja finalidade seria de controle social, já que uma nova classe necessitava de uma preparação para enfrentar as mudanças. Na declaração de Apple (2006, p. 102) sobre as intenções desses idealizadores do currículo 105 “o interesse dos primeiros teóricos a estruturarem o currículo estava na preservação do consenso cultural e, ao mesmo tempo, em destinar os indivíduos ao seu ‘lugar’ adequado numa sociedade industrial interdependente”. Silva (2006) discute que é nesse contexto da transição das habilidades manuais para a flexibilidade e rapidez que Ralph Tyler propõe um currículo que realce os ‘objetivos comportamentais’, atentando para sua prescrição, daquilo que deve ocorrer ou ser feito para atender às demandas de mercado. Creditamos a Tyler, ainda, quatro outras questões relevantes como: quais objetivos educacionais a escola deve procurar atingir; que experiências educacionais podem ser oferecidas e que tenham probabilidade de alcançar seus propósitos; como organizar eficientemente essas experiências educacionais; e como podemos ter certeza de que esses objetivos estão sendo alcançados. Enquanto Ralph Tyler buscava os objetivos comportamentais, John Dewey sugeria um currículo voltado às experiências das crianças e dos jovens, de reconstrução contínua, flexível, privilegiando a prática de princípios democráticos, considerando a escola um local para vivências estimulantes. Na década de 1960, o advento da denominada Guerra Fria, expressão usada por não ter ocorrido embate bélico e sim, econômico, ideológico, social, político, colocou duas das superpotências da época em conflito; de um lado, os Estados Unidos e, de outro, a União Soviética provocaram novas mudanças no estabelecimento curricular. O sentimento de derrota dos americanos frente aos soviéticos, na corrida espacial, produziu na comunidade cientifica americana a necessidade de uma ampla reforma nos programas educacionais, não apenas na América do Norte, mas que fez ecos em diversos países, entre eles o Brasil. O próprio campo que dá origem aos estudos curriculares em Educação não advém das disciplinas que compõem esta área. Como aponta Cherryholmes (1993, p. 143) [...] a Psicologia educacional tem raízes na Psicologia, a Filosofia da educação na Filosofia [...]. O currículo lida com problemas que são singularmente educacionais da mesma forma que o ensino tem suas próprias tarefas especiais [...]. No dicionário, os significados utilizados explicitam que o currículo é tido como programas escolares e, discordando dessa definição, Sacristán (2000, p. 13) revela que na prática o currículo é estabelecido por meio de “comportamentos didáticos, políticos, administrativos e econômicos”. Para ele, esses preceitos escondem, “pressupostos, teorias parciais, esquemas de racionalidade, crenças e valores que condicionam o currículo”. Currículo não é um conceito e sim uma construção cultural, aponta Grundy (1987 apud SACRISTÁN, 2000). É pela prática que Stenhouse (1991, p. 29) define o currículo. Para ele, “um currículo é uma tentativa de comunicar os princípios e características essenciais de um 106 propósito educativo, de tal forma que permaneça aberta a discussão crítica, podendo ser remetida efetivamente à prática”. Outro pesquisador, Bernstein (1996) define o currículo como o conhecimento válido e em sua teoria apresenta o currículo como um princípio regulador que está na base dos sistemas do discurso. Também delineia dois tipos de currículo: o primeiro, denominado de coleção, referindo-se a um currículo cuja classificação é fortemente marcada e suas áreas e seus campos do conhecimento são organizados de maneira isolados. No segundo, o currículo integrado, há uma diminuição das distinções entre as áreas do conhecimento, a classificação já não é uma marca. Bernstein, analisando o projeto durkheimiano da divisão de trabalho, situa a mudança do currículo como coleção para o integrado, segundo a evolução da solidariedade mecânica atribuída aos membros de uma sociedade com mesmas características sociais e até mesmo psíquicas para a solidariedade orgânica, complexa, em suas relações de trabalho e de acordo com as diferenças dos indivíduos. Cabe aqui uma distinção ou similaridade dos termos currículo, currículo oficial, propostas curriculares, orientações curriculares, currículo oculto, currículo nacional, currículo regional, enunciados anteriormente e com os quais, com frequência, nos depararemos. Utilizamos o termo currículo para indicar o modelo geral, enquanto as demais denominações se farão adjetivadas. Embora muitas fossem as designações do termo currículo, Ponte et al (1999) observam que podemos classificá-lo em dois níveis, sendo que o primeiro nível distingue o currículo oficial, o currículo implementado e o currículo adquirido, e o segundo nível distingue entre o global associado a um país, o local pertinente a uma região ou escola e o individual ligado às pessoas. Analisando o primeiro nível, Ponte et al (1999) apontam como currículo oficial aquele que se constitui pelos programas, suas associações sociais e científicas, suas teorias de aprendizagens e suas filiações políticas. Desse ponto, estão anexas as propostas curriculares e orientações curriculares que, mesmo em suas fases iniciais, são estabelecidas pelas secretarias estaduais ou municipais de Educação ou, no nível nacional, pelo Ministério da Educação. Para Sacristán (2000), o currículo oficial é um processo de regulação de todo sistema educativo e, para tal, existe uma prescrição ou orientação do conteúdo em relação ao seu grau de ensino. É a partir desse ponto que são produzidos os materiais e o controle de todo o sistema. É histórico e local, pois se trata da política vigente e de suas intervenções. O currículo prescrito como política curricular se incumbe de: regular o conhecimento, delimitando os espaços de decisões entre a administração central, escolas e professores; controlar os conteúdos mínimos exigidos; exercer o controle sobre as escolas por intermédio da supervisão das práticas escolares executadas pelos professores e das avaliações externas, bem como organizar políticas de inovações curriculares por meio da sua criação e consumo. Já os currículos implementados são aqueles que denotamos pelos gestos dos professores, os que realmente são empregados nas salas de aula e que dão substância à sua prática. Ponte et al (1999) destacam quatro hipóteses no acesso ao currículo oficial, relacionando-o com o currículo implementado: (i) as dificuldades dos professores em 107 adquirir uma nova organização em detrimento da antiga; (ii) nos projetos de inovações curriculares, o currículo oficial, de forma geral, é mais avançado que o currículo implementado; (iii) no início de uma nova reforma, os gestos profissionais que os professores devem mobilizar em sua prática ainda não estão estabilizados; (iv) a dificuldade de um currículo adaptado a certas necessidades. Se o currículo implementado aqui é revelado na prática institucionalizada, é no currículo oculto que as discussões se intensificam. Sacristán (2000) trata o currículo implementado ou apresentado – definição dada por ele – como aquele que costuma ser traduzido para os professores com base no currículo prescrito. São conceituações genéricas e geralmente não são suficientes para orientar os professores na prática da sala de aula. O papel do professor nessa implementação é decisivo, já que reproduz sua cultura profissional. Seu planejamento é configurado segundo a tradução que se faz do currículo prescrito e do implementado. O fato é que o currículo deve responder não apenas à escola, mas também, à sociedade, sob a sua ordem social e cultural. Isso torna a prática pedagógica complexa. A competência profissional é relevante para implementar o currículo, assim como, a formação docente. Por fim, nesse aspecto de implementação e apresentação, consideram-se as condições sob as quais se realiza o trabalho do professor como: a estrutura física da escola e o número de alunos na sala de aula. Para Sacristán (2000), é em virtude da formação docente precária e dos conhecimentos adquiridos pela experiência dos professores que se estabelece o que se chama de currículo oculto. O currículo escolar, frente a toda essa concorrência exterior, talvez esteja perdendo o monopólio da transmissão de certos valores culturais explícitos, mas reforça, por isso mesmo, outras funções do currículo oculto da instituição escolar: socialização, inculcação de pautas de comportamento, valores sociais, validação para subir pela pirâmide social, etc. (SACRISTÁN, 2000, p. 74) Para Torres Santomé (1995) a discussão a respeito do currículo oculto nos faz perceber o significado das práticas docentes que, no passado, eram despercebidas. São princípios e valores ensinados de maneira implícita no processo educativo. Implica-se dessa forma um determinado resistir aos programas oficiais. Acreditamos que a resistência referida por Torres Santomé esteja relacionada a diversos fatores, entre eles, a incompreensão dos documentos curriculares, a falta de formação dos professores, a não participação na elaboração dos currículos etc. Torres Santomé ainda descreve que esse tipo de currículo reproduz características da esfera econômica social. 108 Giroux (2004, p.70), em uma tentativa de ampliar o debate acerca dessa reprodução, propõe três insigths essenciais: (a) As escolas não podem ser analisadas como instituições removidas do contexto socioeconômico em que estão situadas; (b) As escolas são espaços políticos envolvidos na construção e controle do discurso, dos significados e das subjetividades; (c) Os valores e crenças do senso comum que guiam e estruturam a prática escolar não são universais a priori, mas construções sociais baseadas em pressuposições normativas políticas. Outro autor, Apple (2006), apoiado nos estudos de Jackson (1968), analisou como os significados são transmitidos nas escolas e a maneira pela qual alguns valores e atitudes ocorrem em determinados contextos políticos e econômicos, tornando-se os valores do capitalismo. É nesse sentido de reprodução dado por esses autores que as escolas estão inseridas nos contextos da sociedade e da economia, sendo espaços políticos e de disseminação de crenças e valores. A terceira dimensão denotada por Ponte et al (1999) – o currículo adquirido – é analisado do ponto de vista dos alunos, suas aprendizagens mediante as avaliações. Do ponto de vista da crítica, as avaliações homogeneízam uma determinada cultura; trata-se de uma redistribuição das forças de mercado. Apple (1994, p. 74), respondendo sobre a questão do currículo e da avaliação, nos diz que, “em parte, tanto um currículo nacional quanto um sistema de avaliação nacional podem ser vistos como concessões necessárias para a persecução desse objetivo de longo prazo”. Enfim, são mediantes as diversas classificações e níveis sobre o currículo em geral, aos quais, os currículos específicos são produzidos. Compreendermos suas dimensões e alcance possibilita elaborarmos um quadro da produção curricular de matemática. 2. Uma revisão da produção curricular das pesquisas em Matemática. Apresentada a seara dos currículos gerais, cujas pesquisas são intensas, acreditamos que o mesmo dinamismo não pode ser dito na produção curricular em Matemática elaborada nos centros de pesquisas em currículo, sobremaneira, aqui no Brasil. Pesquisamos as produções de dissertações e teses que trazem a discussão recente sobre currículo de matemática, no Brasil. Acreditamos que isso seja necessário, primeiro pela própria organização e classificação dessas produções em diversos centros de pesquisas no Brasil; segundo, para identificarmos a densidade dessa produção e como ela está distribuída no país para lançar luz sobre a nossa pesquisa, encontrando o alinhamento ou desalinhamento das orientações nacionais frente ao campo de pesquisa. 109 Pesquisamos, para o presente trabalho, teses e dissertações relacionadas com o tema currículo e Matemática na base de dados elaborada no período de 1993 a 2011 da Revista Zetetiké, editorada pela Universidade Estadual de Campinas. Foi a partir das análises nessa base de dados, que fizemos uma busca pelo título do trabalho, sobre currículo ou seus derivativos curricular (es) e a Matemática, tentando localizar as dissertações e teses produzidas no meio acadêmico a respeito do tema. Encontramos ao todo 49 (quarenta e nove) trabalhos os quais classificamos em cinco temas centrais: (a) os conteúdos curriculares; (b) currículos nos cursos superiores; (c) as políticas curriculares; (d) a formação de professores, e; (e) as sugestões curriculares. Em torno das quantidades, 12 (doze) tratam sobre os conteúdos curriculares, 07 (sete) abordam o tema do currículo nos cursos superiores, 24 (vinte e quatro) trabalhos sobre o tema impacto das políticas curriculares no ensino da Matemática na Educação Básica, 04 (quatro) pesquisam a formação de professores e apenas 02 (dois) trabalhos versando sobre sugestões curriculares. Das pesquisas que debatem os conteúdos curriculares da Matemática, destacamos aquelas que analisam (ver Quadro 1): espaço e forma e tratamento de dados, os conteúdos na Educação infantil e as demonstrações no currículo. Quadro 1 - Conteúdos curriculares. LOPES, Celi A. Espasandin. A probabilidade e a estatística no ensino fundamental: uma análise curricular. Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1998. NACARATO, Adair M. Educação Continuada sob a perspectiva da Pesquisa-ação: currículo em ação de um grupo de professoras ao aprender ensinando Geometria. Tese de Doutorado – Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP, 2000. PIETROPAOLO, Ruy Cesar. (Re)significar a demonstração nos currículos da educação básica e da formação de professores de Matemática. Tese de Doutorado em Educação Matemática. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. 2005. SANTOS, Clemente Ramos. O tratamento da informação: Currículos prescritos, formação de professores e implementação em sala de aula. Dissertação de Mestrado Profissional. São Paulo, 2005. PUC-SP. CERQUEIRA, Ana Ferreira de. Isometrias: Análise de documentos curriculares e uma proposta de situações de aprendizagem para o ensino médio. Mestrado profissional, São Paulo: PUC-SP, 2005. BAIER, Tânia. 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Acreditamos que este fato alimentaria as pesquisas com esse tema em detrimento de conteúdos como a geometria que naquele período fora dada pouca ênfase. Por sua vez é possível que a ênfase no currículo sob a álgebra seja predominante no ensino, porém é necessária uma pesquisa com esta temática. Outra organização de trabalhos pode ser encontrada no Quadro 2. Nesta organização, classificamos as pesquisas sobre currículo e Matemática. Localizamos dois estudos. O primeiro trata do currículo em cursos de licenciatura Matemática, enquanto o segundo trata da aplicação dessa área em cursos aplicados. Quadro 2 - Currículo nos Cursos Superiores. BIEMBENGUT, Maria Salett. Qualidade no Ensino de Matemática na Engenharia: uma proposta metodológica e curricular. Tese (Doutorado em Engenharia de Produção) — UFSC, Florianópolis (SC), 1997. CASTELLUBER, Arildo. Os currículos de matemática em universidades públicas da região sudeste e os professores egressos do IMPA. Dissertação (Mestrado em Educação). 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LEIVAS, José Carlos Pinto. Imaginação, intuição e visualização: a riqueza de possibilidades da abordagem geométrica no currículo de cursos de licenciatura de matemática. Tese (Doutorado em Educação) — Setor de Educação, UFPR, Curitiba (PR), 2009. Fonte: Autor Acreditamos que seja possível a ampliação de pesquisas que desenvolvam e amplifiquem o debate sobre o currículo de Matemática em cursos de licenciatura, fomentando a formação dos futuros professores. Quando analisamos o impacto das políticas curriculares, estas constituem a maior preocupação em parte da produção pesquisada como apontamos anteriormente, ou seja, determinada primazia da crítica em detrimento da análise dos conteúdos. Destacamos que o nosso estudo diz respeito ao olhar dos professores em torno de suas concepções, sentidos, percepções, formação ou visão. De outro ponto de vista, também observamos o percurso da implementação dos currículos ou propostas curriculares. Quadro 3 - As políticas curriculares. SOUSA, Maria do Carmo. A percepção de professores atuantes no ensino de Matemática nas escolas Estaduais da Delegacia de Ensino de Itu, do Movimento da Matemática Moderna e de sua influência. Dissertação de Mestrado. Universidade de Campinas, 1999. MIGNONI, Ednéia Poli. A trama ideológica do currículo: a visão do professor de matemática. Dissertação (Mestrado em Educação Matemática) - Faculdade de Educação, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, SP, 1994. CARDOSO, Edson Alves. Uma análise da perspectiva do professor sobre o currículo de Matemática na EJA. Dissertação de Mestrado. Pontifícia Universidade Católica – PUC-SP, 2001. GODOY, Elenilton Vieira. Matemática no Ensino Médio: Prescrições das Propostas Curriculares e Concepções dos Professores. Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2002. 112 PASQUINI, Iria Augusto Soares. O Ensino da Matemática no Contexto dos Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio. 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Alguns pesquisadores envolvidos na busca de uma identidade ou delimitação ao campo da Educação Matemática tratam-na pela relação entre ensino, aprendizagem e conhecimento matemático. Ponte (1999) discute ainda que a Educação Matemática é um campo de investigação onde seu papel é formular e analisar os problemas do ensino e da aprendizagem em Matemática propondo conceitos, estratégias e instrumentos relevantes para aqueles que atuam nesse campo profissional. Ampliando esses conceitos, entendemos que um dos propósitos é dado pela crítica ao currículo de Matemática com ênfase nas demonstrações, no conhecimento a partir das estruturas matemáticas, na organização linear e centrada no professor. Trata-se, como apresenta Pires (2008, p. 37), de realizar uma retrospectiva da influência da Educação Matemática sobre os documentos curriculares, em diferentes momentos. A consolidação parte de [...] aplicações cotidianas, formação de capacidades específicas e base de uma formação tecnológica (...) na construção do conhecimento pelos alunos (...) na relação da constituição de competências e habilidades do estudante, na contextualização e interdisciplinaridade, nos projetos e sequências didáticas e centrada na relação professor-aluno. (PIRES 2008, p. 37) Outro quadro (Ver Quadro 4) que formulamos destaca as pesquisas sobre a formação dos professores. Essas pesquisas destacam os significados e saberes do 114 professor fazendo a interlocução com o currículo. Uma análise do período revela que a temática do currículo de matemática do ponto de vista do professor são recentes. Quadro 4. Formação de Professores. VALLE, Silvana Maria Giacomini. Rupturas e (Re)significação do Currículo de Matemática: um olhar nos ciclos de formação. Dissertação (Mestrado em Educação nas Ciências) — Departamento de Pedagogia, Unijuí, Universidade do Noroeste do Rio Grande do Sul, Ijuí (RS), 2006. DANTAS, Wildes Gonçalves. Os saberes e concepções acerca das práticas dos professores de matemática dos anos finais do ensino fundamental em escolas públicas do estado de São Paulo em um processo de implementação do currículo. Dissertação (Mestrado em Educação Matemática) — Universidade Bandeirante de São Paulo, UNIBAN, São Paulo (SP), 2010. NEVES, Eder Wilson. Análise da percepção de professores acerca do novo currículo de matemática do 6º ano do ensino fundamental do Estado de São Paulo. Dissertação (Mestrado em Educação Matemática) — Universidade Bandeirante de São Paulo, UNIBAN, São Paulo (SP), 2010. RODRIGUES, Rosineide Monteiro. Os desafios da formação continuada de professores que ensinam matemática no ensino médio em um cenário de reorganização curricular. Dissertação (Mestrado em Educação Matemática) — Universidade Bandeirante de São Paulo, UNIBAN, São Paulo (SP), 2010. Fonte: Autor Por fim, nossa busca revelou um campo ainda pouco pesquisado na área do currículo e da Matemática que é o relativo às sugestões curriculares. Nesse sentido, a tese “Currículos de Matemática: da Organização linear à ideia de rede”, defendida por Célia Maria Carolino Pires é emblemática, pois articula uma nova concepção não linear do currículo, subvertendo o significado atual (linear) e aproximando-o dos hipertextos (não linear). Quadro 5 - Sugestões Curriculares. PIRES, Célia Maria Carolino. Currículos de Matemática: da Organização linear à ideia de rede. Tese de Doutorado. Faculdade de Educação – Universidade de São Paulo, 1995. AMADEU, João Ricardo. A educação financeira e sua influência nas decisões de consumo e investimento: proposta de inserção da disciplina na matriz curricular. Dissertação de Mestrado. Universidade do Oeste Paulista- UNOESTE: Presidente Prudente – SP, 2009. Fonte: Autor Da produção que analisamos é representativa a crítica às políticas curriculares, porém não é equivalente às sugestões feitas para esse mesmo tema. A ênfase aos 115 conteúdos curriculares em matemática representa avanço em relação às demais pesquisas constituindo tema relevante. Outro aspecto, da formação de professores na perspectiva do currículo de Matemática concentra-se em praticamente uma única instituição o que caracteriza o desinteresse de outros grupos de pesquisa com esse tema. Acreditamos, contudo que esta classificação ainda necessita maior profundidade para entender o estado da arte nesta temática tendo em vista que não é esse o propósito deste estudo. Considerações finais O campo dos estudos curriculares revela extensa produção acadêmica e certamente influencia a produção específica. Acreditamos que a Educação Matemática, seja o campo fértil desta produção tendo a vista sua interseção entre a Educação e a Matemática. A classificação que obtemos na análise das dissertações e teses são demasiadamente descritoras e uma análise dos conteúdos possa revelar um outro estado da arte desta temática, bem como, apontar novas categorias. Bibliografia APPLE, M. W.. Ideologia e Currículo. Porto Alegre: Artmed, 2006. APPLE, M. W.. A Política do conhecimento oficial: faz sentido a ideia de um currículo nacional? In. MOREIRA, A. F. B.; SILVA, T. T. Currículo, cultura e sociedade. São Paulo: Cortez, 1994. p. 59-91. CANDAU, V. L. F.. Reformas educacionais hoje na América Latina. In. MOREIRA, A. F. B. (Org.) Currículo: políticas e práticas. Campinas: Papirus, 2000. pp. 29-42. CHERRYHOLMES, C.. Um projecto social para o currículo: perspectivas pósestruturais. In T. T. da Silva (org.), Teoria Educacional Crítica e Tempos PósModernos. Porto Alegre: Artes Médicas, 1993, pp. 143-172. 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BARALDI - Unesp – Bauru ([email protected]) Resumo: O presente artigo é fruto de duas pesquisas de mestrado em andamento, na Unesp de Rio Claro, Programa de Pós Graduação em Educação Matemática, que visam mostrar uma versão histórica da formação de professores de Matemática em Cuiabá, nas cercanias da criação do primeiro curso superior do estado, abordando entre as décadas de 1960 a 1980, e no Médio Araguaia, desde a implantação do Projeto Inajá, na década de 1980, até as Licenciaturas Plenas Parceladas em Matemática, que se fazem presente na região ainda nos dias atuais. Valendo-se para isso da metodologia da História Oral, comumente utilizada no Grupo de Pesquisa História Oral e Educação Matemática, GHOEM, do qual participam. Os estudos abordados fazem parte de um projeto maior do GHOEM, o de mapeamento da formação de professores de Matemática no Brasil. Além dos depoimentos coletados, estão sendo utilizadas fontes escritas disponíveis, no esforço de escrever uma versão histórica para o tema em questão. Nesta constituição mesclam-se a história da UFMT, bem como do Projeto Inajá e das Licenciaturas Plenas Parceladas, sendo que a primeira e a última se mantém até os presentes dias formando professores nesta área. Como considerações para este, trazemos uma parte das análises preliminares já elaboradas, que mostram cursos ofertados para a formação de professores antes da implantação do primeiro curso superior na capital, bem como, contribuições trazidas ao Médio Araguaia por meio dos Projetos Inajá e Parceladas. Essas análises mostram que, muitas vezes, os professores (de matemática) possuem uma formação marcada pela urgência e pela carência, como em outras partes do Brasil, também mostrado por outros estudos. Palavras-chave: Universidade Federal de Mato Grosso. Projeto Inajá. Projeto Parceladas. História Oral. 118 Introdução Nos dias atuais a formação de professores vem recebendo destaque nas pesquisas acadêmicas, inclusive na Educação Matemática. Estes estudos permitem reflexões a respeito da prática pedagógica e processo de ensino e aprendizagem, entre outros assuntos. Com relação a isso Gama (2009) nos alerta que para avançarmos na qualidade no ensino e aprendizagem, faz-se necessário conhecer e repensar a formação dos professores. Apoiando-se em tal ideia surgiram nossas pesquisas de mestrado, atualmente em desenvolvimento, que visam formular uma versão histórica sobre a formação de professores de Matemática em Cuiabá, capital do estado de Mato Grosso, e no Médio Araguaia, região do mesmo estado. O interesse em trabalhar com este tema decorre de nossa graduação, pois, durante este período, começamos a ministrar aulas e, dessa forma, pudemos perceber grande diferença nos processos de formação dos professores de Matemática, principalmente quando se observam as metodologias empregadas em sala de aula por educadores formados há mais tempo e os recém-formados. Sendo assim, nossas experiências foram despertando curiosidades em relação como se dava e como ocorre atualmente a formação dos docentes em Matemática, nos conduzindo a esta temática e envolvendo-nos em um universo de possibilidades. Paralelamente às nossas experiências pessoais, tivemos acesso a vários estudos e pesquisas que enfocam o processo de formação de professores que ensinam Matemática, apontando desafios e possibilidades, metodologias de ensino, práticas pedagógicas e saberes docentes muito diferenciados, em diferentes partes do Brasil. Grande parte dessas pesquisas faz parte do projeto de mapeamento sobre a formação de professores de Matemática brasileiros, desenvolvido pelo Grupo de Pesquisa História Oral e Educação Matemática, do qual somos membros. Surge daí nosso interesse em estudar a formação de professores de Matemática nas regiões destacadas, sendo que, ainda, existem pontos a serem conhecidos nesse processo, permitindo uma nova visão sobre esta. Não se esgotam, no entanto, nestas 119 pesquisas, todas as possibilidades de compreensão dessa história, que sempre poderá ser retomada, complementada, revista e reeditada por quem quer que se dedique a tomar como tema a formação de professores no estado do Mato Grosso. Metodologia Para a concretização de nossas pesquisas nos valemos da metodologia da História Oral, a qual não abarca apenas procedimentos, como também uma fundamentação teórica que constantemente é revista e questionada. Com o uso da História Oral nos apoiamos em depoimentos, produzidos por meio de entrevistas, com os quais buscamos elaborar uma versão histórica para a formação de professores de Matemática, nos locais já descritos, versão esta escrita na memória de nossos colaboradores. A utilização desta metodologia não impede, no entanto, o uso de outras fontes, pelo contrário, trabalhamos com o cotejamento entre fontes orais e escritas. No decorrer de nossas pesquisas entrevistamos profissionais que estiveram envolvidos, direta ou indiretamente, com o tema, locais e períodos abordados. Transcrevemos as gravações, ou seja, redigimos no papel exatamente o que foi dito no decorrer da entrevista, e as textualizamos, momento no qual tornamos a transcrição um texto mais homogêneo, livre de vícios de linguagem e repetições. Além das entrevistas coletamos registros escritos, que também tem nos ajudado na compreensão de nosso foco de estudo. Conhecida a metodologia por nós adotada, cabe adentrar, mesmo que ligeiramente, num histórico do ensino no estado estudado. Um histórico do ensino em Mato Grosso Visando situar nossas pesquisas, destacamos algumas características do estado abordado: Mato Grosso possui grande dimensão territorial, 903.329,700 km2, dividido em 141 municípios, com população aproximada de 3.035.122 habitantes e densidade demográfica de 3,36 hab/km2. Sua capital, Cuiabá, possui 551.098 habitantes, com uma extensão territorial de 3.362,755 km2 e densidade demográfica de 163,88 hab/km2 (Censo 2010). 120 Na Figura 1 abaixo, é possível uma visualização da localização do estado em relação ao nosso país, bem como a da capital Cuiabá, local, também, de interesse de nosso estudo, quanto sua disposição no estado. Figura 1: Mapa do Brasil e do Mato Grosso Fonte:<www.ibge.gov.br/cidadesat/link.php?uf=mt> Acesso em 25 set.13 A precariedade da educação e da formação de professores em Mato Grosso se manteve por longo período, sendo decorrente de circunstâncias que marcaram a trajetória do estado desde a criação da Capitania de Mato Grosso, em 1748, até a década de 1980 (SILVA, 1997). Sendo que ainda no século XIX e início do século XX, a educação era vista como desnecessária, pois a economia era fruto de trabalho extremamente rudimentar. Citando palavras de Leite (1970 apud Silva, 1997, p. 114) a “instrução na província, no período colonial e imperial, não foi além digamos da fase inicial de preparação”. Datam da década de 1870 as primeiras ideias de habilitação de professores, no entanto, neste período ela tinha como finalidade levá-los a compreender o método que deviam colocar em prática, pois sem instrução, apenas repetiam o que haviam aprendido. Em 1874, por meio da Lei Provincial número 13, de 9 de julho, determina-se a criação do Curso Normal na Província de Mato Grosso visando formação aos professores do Primário. Em 1879, por meio da lei número 536 implantou-se o Liceu Cuiabano, que passou a ofertar dois cursos, um Normal, que habilitava professores do Primário, e um segundo Curso de Línguas e Ciências Preparatórias, que auxiliava aos que buscavam seguir estudos a nível superior e conferia título de Bacharel em Ciências 121 e Letras, o que os permitia atuar como docentes em instituições de nível secundário (GONZALES, 2011). Mas, apesar disso, até a década de 1950, as diversas reformas ocorridas no campo educacional aparecem como meros paliativos, sendo que, em 1961, ainda não existiam, no estado, escolas superiores para a formação de professores. Em 1963 é criado o Centro de Aperfeiçoamento e Treinamento do Magistério e o primeiro curso de Supervisores, visando habilitar os leigos que, dedicados ao magistério, atuavam como professores, sendo que estes totalizavam mais de 60% dos docentes estaduais. Em Cuiabá, os cursos superiores de formação de professores iniciam-se com a criação do Instituto de Ciências e Letras de Cuiabá (ICLC), em 1966, ofertando os cursos de Matemática, História Natural, Geografia e Letras, posteriormente oferecendo também Química, Física e Pedagogia. Os docentes formados neste Instituto eram considerados aptos a lecionarem no Segundo Grau, atual Ensino Médio. Com a reforma universitária de 1968 formulou-se a lei n° 5540/68, que instituiu os princípios para a organização e funcionamento do ensino superior, bem como sua articulação com a escola média. Após a reforma universitária cria-se, em 10 de dezembro de 1970, a Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), que incorpora a Faculdade de Direito de Cuiabá (considerado o primeiro estabelecimento de ensino superior do estado) e o Instituto de Ciências e Letras de Cuiabá, levando consigo seus professores. A Universidade Federal, segundo Silva (1997), surge como resposta às reivindicações populares por melhores oportunidades educacionais. Portanto é criada em caráter de urgência, carente de um prévio e consistente planejamento, o que é reforçado por Gianezini (2012, p. 5): “não havia tempo suficiente para discutir e planejar o que era necessário fazer, motivo pelo qual esta fase ficou conhecida como fase de fazejamento”. A Universidade inicia seus primeiros cursos em 1971 e 1972: Direito, Economia, Engenharia, Pedagogia, Letras, Geografia, História Natural, Matemática, Serviço Social, Física, Química e Ciências Contábeis. Sendo até 1988 a única provedora de Educação Superior no estado, desde então surgiram outras, especialmente no setor 122 privado. Em 2005, o setor público era representado por cinco instituições superiores, e o privado por cinquenta e uma. No estado apenas as universidades públicas estão credenciadas a ofertarem cursos de pós-graduação strictu sensu, a UFMT oferece dezessete (dezesseis de mestrado e um de doutorado) e a Universidade do Estado de Mato Grosso, UNEMAT, oferta dois cursos de mestrado. Desde sua criação até os presentes dias, muitas mudanças ocorreram: implantaram-se novos cursos, tanto de graduação quanto de pós-graduação; abriram-se três novos campi: Rondonópolis (sul do estado), Médio Araguaia (leste), Sinop (norte). A expansão qualitativa e quantitativa da UFMT faz dela a mais abrangente instituição de ensino superior no Estado, atendendo a todas as regiões do mesmo, especialmente por meio de polos de formação à distância. Tanto a criação dos campi, quanto o ensino por meio da Educação Aberta e à Distância, EAD, são buscas de interiorização, de levar formação superior aos diversos pontos do estado. A modalidade EAD ela teve seu início no ano de 1992, visando formar professores em serviço que não dispunham de formação em nível superior. O Núcleo de Educação Aberta e à Distância, NEAD, iniciou sua atuação ofertando cursos de Pedagogia. Após a verificação dos resultados positivos obtidos neste curso, passou a oferecer, também, nas áreas de Administração e Ciências Naturais e Matemática. Atualmente a UFMT, no sistema de modalidade à distância, oferece cursos de graduação, pós-graduação lato sensu, de aperfeiçoamento e extensão (informações retiradas do site: <www.ufmt.br>). Baseado no acima descrito é possível perceber que a formação de professores de Matemática sofreu transformações com o passar do tempo. Atualmente, tem-se a visão de que a “construção” do professor é contínua, ocorrendo desde o início de sua graduação, ou até mesmo antes disto e não terminando na colação de grau, mas, perpetuando por toda sua vida docente. Como afirmado por Perez (2005, p. 261), “a formação inicial não deve gerar produtos acabados, mas, sim, deve ser encarada como a primeira fase de um longo processo de desenvolvimento profissional”. Assim, entendemos a formação docente como algo contínuo, que não ocorre apenas por meio das aulas da graduação (quando isso é possível), iniciando muito antes de seu ingresso na universidade e não terminando em sua colação de grau, sendo fruto especialmente do desejo de se formar educador e de seu desenvolvimento profissional. 123 No Médio Araguaia, uma região no interior de Mato Grosso, a formação, em nível superior, não diferente da capital, fez-se necessária pelo intenso aumento da população em curto período de tempo, devido à migração de pessoas de outros estados em busca de terras baratas e com promessa, por vezes, de gratuidade das mesmas. Decorrente disso, o número de escolas dos municípios desta região também sofreu aumento considerável, faltando, assim, profissionais qualificados para atuarem nessas escolas. Percebendo a necessidade de fornecer formação aos professores, diversas pessoas, entre elas autoridades influentes das cidades, resolveram se mobilizar e trouxeram qualificação para os professores que atuavam até mesmo sem a formação em nível médio. Segundo Camargo (1997) A grande maioria dos professores era leiga, uma vez que possuía, apenas, formação de 1º grau incompleta. Na zona rural, a incidência era muito maior. Em geral, a maioria dos professores leigos se concentrava nas escolas municipais em decorrência do alto índice destas instituições nas áreas rurais. (p. 19) Como fruto dessa mobilização, foi planejado para a região o Projeto Inajá, ofertado em duas etapas: Inajá I e Inajá II, com duração de três anos cada. Tal Projeto foi desenvolvido em alguns municípios da região como Canarana, Porto Alegre do Norte, Ribeirão Cascalheira, São Felix do Araguaia, Luciara e Santa Terezinha. Este curso de caráter emergencial ocorreu durante os anos de 1987 a 1992. Esse Projeto possuía perfil diferenciado, buscava trabalhar com os cursistas temas dentro de suas próprias realidades, foi moldado de modo a atender pessoas da zona rural, urbana e indígena da região, contou com mais de 100 alunos. Acontecia durante as férias dos professores para que não prejudicasse o ano letivo. Trabalhava com as diversas disciplinas do currículo educacional do segundo grau (atual ensino médio), entre elas, portanto, a Matemática, que era enfocada de modo bastante lúdico e palpável. O Inajá recebeu contribuição da Universidade Estadual de Campinas, Unicamp, a qual cedia professores para ir à região trabalhar com os alunos, sendo que cada etapa era em um município. Tinha o apoio das prefeituras, da Secretaria de Educação (SEDUC) e da Igreja Católica, que sempre disponibilizava espaço físico e até auxiliava financeiramente quando os cursistas não tinham como se locomover até o polo em que 124 aconteceria a etapa. Em cada município ficava um monitor que, geralmente, era o Secretário de Educação ou professor com Ensino Médio completo. Ao término destes cursos, os professores possuíam formação em nível médio para atuação em sala de aula. Dessa maneira, posteriormente, os profissionais sentiram necessidade de obter uma formação superior, surgindo as Licenciaturas Parceladas, ofertadas pela UNEMAT, que perduram até os dias de hoje. A principal intenção das Licenciaturas Plenas Parceladas é atender aos professores em serviço, portanto, trata-se de um projeto de formação em serviço e continuada. O currículo dessas Licenciaturas abrange dois momentos: inicia com Formação Fundamental, duração de um ano e meio e, em seguida, a Formação Específica, a qual perdura em torno de dois anos e meio, voltada para as diversas áreas (História, Geografia, Matemática, Português, ...). São cursos exclusivos para professores que estão em sala de aula que não possuem a formação específica, em curso superior, e que atuam há vários anos. Eles acontecem durante as férias escolares, nos meses de janeiro, fevereiro e julho, por um período de quatro anos. Assim como o Inajá, as Parceladas também surgiram como emergencial, visando sanar o problema de falta de capacitação adequada em alguns municípios matogrossenses, no entanto, a carência se mantém e as Parceladas ainda estão na ativa, mesmo após vinte anos de seu início. Quando as Licenciaturas Plenas Parceladas iniciaram, a UNEMAT era uma universidade nova e carente de recursos, mas contava com vários colaboradores de outras universidades, tais como Unicamp já citada, Universidade Estadual Paulista (Unesp), Universidade de São Paulo (USP), Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), UFMT, Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Cabe ressaltar que a UNEMAT não foi fundada com esse nome. Primeiro existia o Instituto de Ensino Superior de Cáceres (IESC) que foi criado em 20 de julho de 1978, vinculado a Secretaria Municipal de Educação, com base na Lei nº 703, Decreto Municipal 190. Tendo sofrido várias alterações por meio de Leis e Decretos, até que 15 125 anos depois, com a Lei Complementar 30, de 15 de dezembro de1993, passou a denominar-se Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT). Já o Campus Universitário do Médio Araguaia, que será o foco principal da pesquisa, Polo Luciara, foi criado como Núcleo Pedagógico pelo Decreto Governamental nº 643 de 23/09/91 e transformou-se em Campus pela Lei nº 30 de 15/12/93. Atualmente a UNEMAT, faz-se presente em mais de 100 municípios do estado, atendendo acerca de 15 mil acadêmicos em 82 cursos regulares e modalidades diferenciadas, portanto, na tentativa de atender a todo o Mato Grosso, apresenta-se com estrutura multicampi, tendo sua Sede Administrativa no município de Cáceres. Na Figura 2, destacamos as cidades atendidas pela UNEMAT. Figura 2: Mapa de polos atendidos pela UNEMAT Fonte: <www.unemat.br/prpti/anuario> Acesso em 05 out.13. 126 Considerações acerca da formação de professores de Matemática em Cuiabá e no Médio Araguaia Como dito anteriormente, o tema exposto trata de duas pesquisas de mestrado e, diante dos resultados preliminares, já são possíveis algumas considerações sobre a formação de professores nessas duas regiões abordadas. Com relação a Cuiabá, percebemos que antes da implantação do primeiro curso superior nesta cidade, datado de 1966, os professores de Matemática eram formados nas Escolas Normais ou por meio da Campanha de Difusão e Aperfeiçoamento do Ensino Secundário, CADES (Baraldi; Gaertner, 2013). Os docentes que possuíam nível superior antes de 1969, quando se concluiu a primeira turma, haviam se formado fora do estado de Mato Grosso. Assim, os professores de matemática atuantes nas escolas básicas eram, em grande maioria, leigos ou profissionais formados em outras áreas que não o magistério. O curso superior em Matemática no ICLC era na modalidade Licenciatura Plena que, mesmo após sua incorporação à UFMT, perdurou até o ano de 1974, sendo que em 1975 iniciaram-se as primeiras turmas de Licenciatura de Curta Duração em Ciências, podendo o aluno se habilitar posteriormente em Matemática. Esta modalidade de licenciatura se manteve na Universidade Federal até o ano de 1985. Em 1987 iniciaramse as turmas em Licenciatura Plena em Matemática. Feitas as considerações com relação a Cuiabá, destacamos agora alguns pontos de interesse na formação de professores de Matemática no Médio Araguaia. Antes da implantação do Projeto Inajá, os professores atuantes, em sua maioria, não possuíam sequer o Ensino Fundamental completo; com a vinda deste curso puderam receber uma qualificação, mesmo que ainda em nível de Ensino Médio, como um Magistério, mais adequada aos anos em que atuavam. Após o contato com os professores do Inajá, especialmente os vindos da Unicamp, e com os novos conhecimentos adquiridos, os alunos formados neste projeto sentiram a necessidade de prosseguir em seus estudos, ao que clamaram e receberam o Projeto das Parceladas, com o qual puderam ter acesso a um curso superior em Matemática na região, que iniciou em 1992. Nas Parceladas buscou-se manter a mesma metodologia já adotada no Projeto Inajá. 127 Concluindo A partir dos dados expostos acima, é possível perceber que a formação docente em Mato Grosso foi um processo tardio, recebendo atenção e sendo, de fato, constituído apenas quando a situação começava a mostrar-se insustentável. A Universidade Federal de Mato Grosso foi criada após muitas reivindicações populares, tendo o início de suas atividades ainda em meio a canteiros de obras, sem tempo para um planejamento prévio. No Médio Araguaia a situação não foi diferente, a carência por profissionais formados na educação fez com que o Projeto Inajá chegasse àquela região e, posteriormente, a falta de formação em nível superior, sentida por parte destes profissionais, instigou o Projeto de Licenciaturas Plenas Parceladas, da UNEMAT. Atualmente o ensino superior no estado está mais difundido, permitindo que se atendam diferentes lugares, no entanto, ainda faltam, em muitos locais, profissionais da educação formados para as áreas específicas nas quais atuam. Referências BARALDI, I. M.; GAERTNER, R. Textos e Contextos: um esboço da CADES na História da Educação (Matemática). Blumenau, SC: Edifurb, 2013. CAMARGO, D. M. P. Mundos Entrecruzados: Formação de Professores Leigos. Campinas,SP: Alínea, 1997. CENSO 2010. Disponível em <www.ibge.gov.br> Acesso em 25 set.13. GAMA, R. P. Professores iniciantes e o desenvolvimento profissional: um olhar sobre pesquisas acadêmicas brasileiras. In: FIORENTINI, D.; GRANDO, R. C.; MISKULIN, R. G. S. (Orgs.). Práticas de Formação e de Pesquisa de Professores que Ensinam Matemática. Campinas: Mercado de Letras, 2009, p. 101-123. GIANEZINI, Q. Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT): alianças e tensões em prol de uma instituição na Amazônia Legal Brasileira. Anais do IX Reunião da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação – Região Sul (ANPED Sul). 2012. GOMES, M.L.M. Formação e atuação de professores de Matemática, testemunhos e mapas. In: GARNICA, A.V.M. (org.). Cartografias contemporâneas: mapeando a formação de professores de matemática no Brasil. Curitiba: Appris, 2013, p.11 – 37. 128 GONZALES, K. G. Elementos históricos da educação matemática no contexto do Mato Grosso: Uma análise de práticas do professor Firmo José Rodrigues (1920-1930). 2011. Dissertação (Mestrado em Educação Matemática) – Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Campo Grande, 2011. PEREZ, G. Prática reflexiva do professor de matemática. In: BICUDO, M. A. V.; BORBA, M. C. (Orgs.). Educação Matemática: pesquisa em movimento. 2ed. São Paulo: Cortez, p. 250-263, 2005. SILVA, C. A. C. A Formação do Professor Matogrossense – considerações históricas preliminares. Coletâneas do Nosso Tempo (Rondonópolis), n° 01, p. 114-125, 1997. UFMT. Disponível em <www.ufmt.br> Acesso em 25 set. 13. UNEMAT. Disponível em <www.novoportal.unemat.br> Acesso em 05 out.13. 129 A TRAJETÓRIA DE VIDA ESCOLAR DO PROFESSOR E POSSÍVEIS IMPLICAÇÕES EM SUA PRÁTICA PEDAGÓGICA Valdir AMÂNCIO SILVA - UNIBAN – SP ([email protected]) Angélica GARCIA E SILVA – UNIBAN – SP ([email protected]) Resumo: O presente trabalho é parte de um estudo realizado num processo formativo com professores da rede pública estadual de São Paulo finalizado no ano de 2012. A investigação procurou responder se professores inseridos em um processo formativo (re) construiriam concepções acerca de pressupostos da Teoria dos Campos Conceituais de Vergnaud, especificamente sobre o Campo Aditivo. Foram considerados também estudos como os de Tardif e a trajetória escolar do professor. A parte apresentada nesse artigo trata especificamente da relação do professor com a matemática acerca de situações-problema do Campo Aditivo. A pesquisa mostrou que além de mudar suas concepções acerca do Campo Aditivo o professor modificou sua forma de se relacionar com a matemática. Palavras-chave: Processo formativo, Campo Aditivo, Trajetória de vida escolar. 130 Introdução Como se sabe o professor que atua nos anos iniciais da Educação Básica é um polivalente, isto é, ministra aulas de várias áreas do conhecimento. Portanto, pode-se dizer que esse profissional não é um especialista na área da matemática. Os conhecimentos acerca dos conceitos matemáticos que ele faz uso para ministrar as aulas podem ser aqueles adquiridos ao longo de sua trajetória escolar (TARDIF – 2000). A didática para articular a abordagem de conceitos matemáticos junto a seus alunos é apresentada, nos dias de hoje, nos cursos de graduação em pedagogia. A grade curricular desses cursos não oferece muitos subsídios ao futuro professor. Pesquisas como as de Gatti e Nunes (2009), por exemplo, que investigou as propostas disciplinares e os respectivos conteúdos oferecidos pelas instituições de ensino superior dos cursos presenciais das licenciaturas em Pedagogia brasileiros observaram que “dentre as universidades públicas analisadas, nenhuma destinava disciplina para os conteúdos substantivos de cada área, nem mesmo para Língua Portuguesa e Matemática” (GATTI e NUNES, 2009, p.33). Conhecer com certa profundidade o objeto de estudo a ser ensinado, estar preparado para articular situações que favoreceram a aprendizagem e atuar em consonância com as propostas curriculares (SHULMAN -1987), são ações que podem contribuir com o ensino e a aprendizagem de conceitos matemáticos. No estado de São Paulo existem mais de duzentos mil professores sendo que uma parte atua do sexto ao nono ano do Ensino Fundamental e no Ensino Médio, e outra parte, atua nos anos iniciais, ou seja, do primeiro ao quinto ano do Ensino Fundamental. Nos últimos anos materiais tais como Ler e Escrever (Orientações Curriculares), que propunha atividades de alfabetização e matemática no mesmo volume, Jornada da Matemática, cujo objetivo era promover uma competição de matemática entre as escolas estaduais e o EMAI (Educação Matemática nos Anos Iniciais), cuja proposta é rever, com a participação do professor, as questões curriculares do ensino e aprendizagem da matemática nesse seguimento foram planejados e aplicados na rede. O EMAI tornou-se 131 um programa de formação continuada que é oferecido ao professor da rede estadual de São Paulo, com encontros semanais. No âmbito federal existe também o Projeto Observatório da Educação– que desenvolve pesquisa e formação, financiado pela CAPES. Tal Projeto é desenvolvido em uma diretoria de ensino da rede estadual paulista. Nele são promovidos encontros quinzenais com professores e pesquisadores que atuam nos primeiros anos da Educação Básica para discutir, debater os processos de ensino e aprendizagem de conceitos matemáticos. No entanto, apesar desses esforços, os órgãos competentes pela criação e aplicação de políticas públicas acerca da formação continuada de matemática nos anos iniciais compreende que o melhor caminho para tentar atingir toda a rede é a do modelo formativo formador/professor/multiplicador, isto é, um grupo recebe uma formação na fonte e leva essa formação para um grupo maior e sucessivamente. Estudos como o de Aguerrondo (2000) apontam para uma possível ineficácia nesse procedimento. Esse artigo procura mostrar a importância da prática de formações continuadas, sobretudo aquelas na qual o professor torna-se, realmente, agente da construção de novos olhares para o ensino e a aprendizagem da matemática. Essa participação do professor é mostrada numa investigação realizada com três professoras da rede estadual de ensino que atuavam nos iniciais da educação básica desenvolvida por Amâncio (2012). Para essa comunicação apresentamos parte desse estudo. Os professores elaboraram problemas envolvendo situações do Campo Aditivo à luz da Teoria dos Campos Conceituais de Vergnaud (1990), no inicio do processo formativo. Nove meses após o encerramento das sessões entrevistamos os sujeitos de pesquisa. Com a entrevista procuramos perceber se o processo formativo promoveu mudanças nas concepções do objeto de estudo em questão e de atitudes pedagógicas adquiridas durante sua trajetória escolar. 132 Fundamentação Teórica A análise apresentada neste estudo tem como fundamento a Teoria dos Campos Conceituais. Sobre essa temática, Vergnaud (1990) considera que os estudantes desenvolvem suas competências ao longo do tempo por meio de experiências cotidianas. Afirma também que o Campo Conceitual se forma pela terna (S, I, R): S- O conjunto de situações que tornam o conceito significativo; I- O conjunto de invariantes que podem ser reconhecidos e utilizados pelos estudantes para dominar as situações; R- O conjunto das representações simbólicas que podem ser utilizadas para representar os invariantes e as situações. Dentre os Campos Conceituais Vergnaud (1990 - 2010) define o Campo Conceitual Aditivo como composto pelas seis relações descritas a seguir. O autor afirma ainda que elas permitem relacionar as diferentes situações da adição e subtração. Chama a atenção ainda para o fato de que tais relações “podem ser combinadas para dar origem a um número quase infinito de casos diferentes” (2010, notas do autor) Em nosso estudo nos atemos somente às relações 1,2 e 3, ou seja, Composição, Transformação e Composição. 133 Sobre os conhecimentos formalizados do professor O conhecimento formalizado é oferecido para os professores nas universidades. Tais conhecimentos são transmitidos de forma disciplinar não promovendo um intercâmbio entre as disciplinas e a prática. Para Tardif o professor é, talvez, o único profissional que vive no ambiente de trabalho que vai promover sua própria formação, ou seja, desde criança esteve dentro da escola e mais tarde retorna para lecionar. O autor afirma que esse movimento propicia a criação dos saberes temporais: Em primeiro lugar, uma boa parte do que os professores sabem sobre o ensino, sobre os papéis do professor e sobre como ensinar provém de sua própria história de vida, [...] Os professores são trabalhadores que foram mergulhados em seu espaço de trabalho Durante aproximadamente 16 anos (em torno de 15 mil horas), [...] Essa imersão se manifesta através de toda uma bagagem de conhecimentos anteriores, de crenças, de representações e de certezas sobre a prática docente. ( Tardif, 2000, p.13). Tardif diz ainda que além desses saberes (temporais) os professores adquirem os saberes institucionais, isto é, aqueles ministrados durante sua formação inicial. Desta forma, Tardif caracteriza os saberes dos professores como sendo plurais e heterogêneos (Tardif, 2000, p. 14). Para nosso estudo precisamos considerar, portanto, os saberes temporais dos professores durante a realização das discussões nas sessões da formação, pois de acordo com suas falas, parece, ainda, muito presente em suas práticas pedagógicas. Metodologia Em nossa pesquisa procuramos entender como os professores dos anos iniciais do Ensino Fundamental, que participaram de um programa de formação continuada, (re) construíam suas práticas pedagógicas, no âmbito do Campo Conceitual Aditivo. Para esse artigo focamos os dados que estariam mostrando a relação do professor com o objeto matemático, desde sua trajetória escolar até o momento atual de atuação. 134 Fundamentamos nossa investigação, metodologicamente, nos estudos de Bodgan e Biklen (1994) que descrevem cinco características de uma pesquisa qualitativa: 1. “Na investigação qualitativa a fonte directa de dados é o ambiente natural, constituindo o investigador o instrumento principal”; 2. “A investigação qualitativa é descritiva. [...] A palavra escrita assume particular importância na abordagem qualitativa, tanto para o registro dos dados como para a disseminação dos resultados”; 3. “Os investigadores qualitativos interessam-se mais pelo processo do que simplesmente pelos resultados ou produtos. [...] Este tipo de estudo foca-se no modo como as definições (as definições que os professores têm dos alunos, as definições que os alunos têm de si próprios e dos outros) se formam”; 4. “Os investigadores qualitativos tendem a analisar os seus dados de forma indutiva”; 5. “O significado é de importância vital na abordagem qualitativa. [...] Os investigadores qualitativos estabelecem estratégias e procedimentos que lhes permitam tomar em consideração as experiências do ponto de vista do informador” (BODGAN E BIKLEN, 1994, p. 47-50). A quinta característica foi à escolhida para a fundamentação de nossa análise nesse artigo devido ao fato de buscar nas experiências do sujeito de pesquisa informações que pudessem ajudar a responder a questão da importância de, num processo formativo, o professor atuar como um construtor de saberes a partir de suas vivências. A tabela abaixo mostra como foi realizada a coleta de dados de nossa investigação. 135 Momentos da formação 1.º momento Conhecimentos do professor sobre o Campo Aditivo e sua atuação pedagógica relacionada a esse conceito antes dos encontros de formação. 3º momento 2.º momento Durante o processo formativo Conhecimento do professor sobre o Campo Aditivo e sua atuação pedagógica relacionada a esse conceito depois dos encontros de formação. Finalidade Perceber a relação do professor com a matemática, seus conhecimentos acerca do Campo Aditivo e como atuava quando ensinava os conceitos matemáticos sobre adição e subtração. Verificar o conhecimento dos professores sobre o Campo Aditivo, objeto de estudo no início da participação do processo de formação continuada. Verificar o conhecimento dos professores sobre o Campo Aditivo, objeto de estudo durante o programa de formação continuada. Perceber se, e como, o professor reflete sobre as estratégias utilizadas pelos alunos para resolver situações-problema. Verificar se, e como, após o período de formação o professor (re) construiu seus conhecimentos acerca do campo aditivo. Fonte: AMÂNCIO SILVA, 2012. p. 34 Consideramos, para esse artigo, os dados coletados no primeiro item do1º momento e o 3º momento. Apresentação e análise dos dados Três sujeitos de pesquisa participaram da investigação que ocorreu durante aquele processo formativo (Observatório da Educação), denominados Professor A, Professor B e Professor C. 136 Com esses dados procuramos perceber a relação do professor com a matemática, seus conhecimentos acerca do Campo Aditivo e como atuava quando ensinava os conceitos matemáticos sobre adição e subtração. Entendemos que a análise desses dados poderiam nos ajudar a descrever a relação do professor com o objeto matemático na sua trajetória escolar por meio de seu depoimento. No questionário de entrada da investigação na dissertação os professores falaram um pouco de suas experiências com a matemática. Para os Professores A e B a formação inicial não contribuiu com a questão profissional. De acordo com o Professor A, tal aprendizado era “sujeitado as expectativas do professor, que não permitia momentos de assimilação dos conceitos matemáticos estudados”. O Professor C afirmou que não tinha problemas com o aprendizado da matemática, no entanto, alegou que as aulas eram muito tradicionais. Analisando os depoimentos das três professoras observamos que há indícios de que esses profissionais vivenciaram experiências metodológicas bastante próximas daquela que Fiorentini (1995)6 denomina de tecnicista. No geral, observamos que as vivências relatadas parecem não ser tão significativas no sentido de contribuir para que essas profissionais produzissem conhecimentos sobre sua prática. Estudos como os de Garcia Silva (2007, p.238), por exemplo, mostraram que muitos professores, desse segmento de ensino, alegaram não ter tido experiências positivas relacionadas à matemática na formação inicial. Analisando tais resultados e considerando os estudos de Tardif (2000) acreditamos que tal fato pode não atender as expectativas esperadas de um curso de formação profissional, já que, segundo o autor, é esse o momento que permite ao educador construir representações e certezas sobre a prática docente. E num processo formativo pode favorecer a construção de novos saberes por parte do docente. Portanto, consideramos a possibilidade de que a relação com a matemática, de nossos sujeitos de pesquisa, fora muito influenciada pelas atuações de seus professores dessa disciplina durante seu período de formação inicial, todavia, outras experiências positivas (ou negativas) podem também ter influenciado a prática destes profissionais. 6 Fiorentini (1995) descreve alguns modos de ver e conceber o ensino de matemática no Brasil produzido historicamente. 137 Durante as sessões de formação no Observatório da Educação os Professores A, Be C, tiveram contato com situações-problema do Campo Aditivo. Ora elaborando problemas, ora discutindo a classificação (composição, comparação ou transformação), ora analisando estratégias utilizadas pelos alunos. Depois de nove meses do encerramento das sessões de formação procuramos investigar se as concepções dos Professores A, B e C modificaram e se foram inseridas em suas práticas pedagógicas, descrevendo, desta forma, uma nova relação com a matemática em sua trajetória profissional (que teve seu início ainda quando era estudante. Tardif -2000). A investigação desse momento foi realizada por meio de uma entrevista semiestruturada, na qual apresentamos três situações-problema do Campo Aditivo para que os professores analisassem e refletissem. Na pesquisa da dissertação solicitamos que interpretassem as estratégias dos alunos, no entanto, para esse artigo vamos focar somente os depoimentos dos sujeitos acerca de suas mudanças conceptuais. As situações-problema tomadas como base para as reflexões dos Professores A, B e C foram as seguintes: Fonte: AMÂNCIO SILVA, 2012. p. 133 138 Fonte: AMÂNCIO SILVA, 2012. p. 133 Fonte: AMÂNCIO SILVA, 2012. p. 134 Com essas situações problemas esperávamos que os sujeitos percebessem a presença de pressupostos da Teoria dos Campos Conceituais, tais como, o uso do cálculo mental como estratégia de resolução, a influência da palavra ganhou e a utilização de representações iconográficas. Vale lembrar que segundo Vergnaud (2009) uma situação-problema pode ser resolvida considerando-se diferentes conceitos e significados. Os depoimentos dos sujeitos acerca de suas vivências no processo formativo foram os seguintes: Depois do curso ampliou minha visão pedagógica, antes eu olhava com olhar de professor, mas não tão detalhada, faltava conhecimento matemático mesmo, [...] hoje eu tenho uma bagagem maior de conhecimento do que no ano passado. [...] (PROFESSORA A) 139 [...] era aquela professora que subjugava os alunos, não tinha essa visão ampla de que uma criança consegue fazer uma soma com números maiores, não sabendo quantidades, principalmente quando eles trabalhavam com dinheiro, então, eu observei minha fala...eu parei e mudei minha didática, mudei meu método, a minha fala ficou diferente, as crianças ficaram mais críticas, elas começaram a observar mais.[...] (PROFESSORA B) Era aquela tradicional... a mãe foi na feira comprou tanto, quanto ela gastou? É... o amigo foi numa festa tinham tantos doces ....partiu. Então muito tradicional. Muito fora da realidade deles. [...] Não queria saber o que o aluno já sabe, não...era o problema pronto e acabou.[...] (PROFESSORA C) Com relação às reflexões acerca das estratégias dos alunos os sujeitos disseram o seguinte: Para a situação-problema do aluno A: Na verdade ele fez uma soma, mas primeiro ele contou quanto tinha do 17 ao 25 aí ele usou o cálculo da adição e ai fez a adição pra mostrar que chegava ao 25, né! [...] Ele fez o cálculo mental, né! [...] É! De qualquer maneira ele usou o cálculo mental e a sentença pra justificar, no entanto pode não ter encontrado a resposta no meio da sentença. (PROFESSORA A) [...] Ele usou como eu fiz com a primeira série...ele usou o valor do quadradinho...ó! 17 mais o valor do quadradinho é igual a 25 [...] Ele fez 17, somou 8, pra chegar no 25. Ele fez 17 e depois fez contagem até chegar no 25. (PROFESSORA B) É. na realidade a sentença...ah!...eu entendo que ele consegue...visualizar isso aqui e depois passa para conta armada depois volta pra isso aqui. (PROFESSORA C) Para a situação-problema do aluno B: Eu acho que ele entendeu que esse 25 aqui ia ter que somar com o que ele já tinha. Ele fez 140 uma interpretação pessoal que não entendeu, né! [...] Ficou né? Ficou com 25. Ganhou 17 ficou ...ele pode ter entendido sim, ficou com mais 25.(PROFESSORA A). Aqui não ( olhando para a estratégia do aluno B), aqui ele já não soube interpretar. Ele somou...pegou 17 e somou com o 25. [...] Nesse caso aqui é uma criança viciada naquele problema que a professora dá dois números e soma esses dois números. Ele não chega a nem ler o problema! [...] Sabe aquela coisa fechada? Aquele onde aparece a palavra ganhou, perdeu, então, eu evitava usar essas palavras. Então ele usou só a palavra chave aqui ó! Então ele ganhou 17 ficou com 25, aí ele somou. Aqui é uma aula tradicional, criança viciada já! (PROFESSORA B) Então, o que ele fez...ele vai só no cálculo, ou ele visualizou os dados, e pensou. Na verdade ele não entendeu o que perguntou. [...] Ganhou...esse ganhou aqui ó! Porquê é o que eles fazem “ganhou” aí...soma. (PROFESSORA C) Para a situação-problema do aluno C: Ele foi agrupando e esse aqui (os riscos cortados) ele tirou? [...] Ele somou né? Ou ele usou os agrupamentos e fez o cálculo mental também, né? [...] E aí ele foi agrupando e fez um subtração do que...ele achou que formou os oito, né? (PROFESSORA A) Esse aqui já passou por todas as etapas..aqui o que o aluno fez é maravilhoso, aí pe cálculo mental! No caso o professor teria que estar perguntando como ele chegou nesse resultado? [...] O que tá na cabeça da criança? Aí eles são teimosos, mas provavelmente ele fez contagem também. Foi na contagem, foi cálculo mental. Aí ele contaria pra professora nos dedos, dependendo da série poderia até montar uma conta, mas geralmente, o aluno quando chega nessa etapa aqui dificilmente gosta de fazer desenhos..ele já que logo o resultado, ele não quer fazer mais. Então daqui ó...do aluno A quando você trabalha os ivariantes, os números que estão faltando , o antigo valor do quadradinho, você consegue chegar aqui ó (mostrando a estratégia do aluno A até a do aluno C). (PROFESSORA B) Então, aqui ele ainda ta no concreto...ele ainda precisa...ele não entendeu que posso fazer agrupamento de 10 em 10, de 5 em 5, de 3. [...] Ele ta no concreto, pra ele passar pra 141 realmente a conta. Mentalmente ele entendeu! Ele tem interpretação! Falta sistematizar agora! [...] colocou a quantidade...tirou...e sobrou alguma coisa. (PROFESSORA C) Percebemos de acordo com o exposto pelos professores A, B e C que com relação aos conceitos sobre o Campo Aditivo suas concepções se modificaram. E no que diz respeito à relação com a matemática, conforme seus depoimentos, também sofreu alteração, é possível perceber em suas declarações que o contato com essa disciplina pode ser diferente pra quem aprende. No sentido de professor que vai ensinar, nota-se em suas declarações que ocorreu uma mudança na forma de trabalhar conceitos matemáticos com seus alunos. Considerações Finais É bem verdade que para investigar a importância de uma formação continuada propiciar aos professores a oportunidade de uma aproximação com o conhecimento matemático de forma mais construtiva, e verificar a influência dessa construção pessoal no ensino e na aprendizagem dessa disciplina seria necessário um estudo muito mais amplo. Contudo, o caminho existe. Considerar a trajetória escolar do professor, lembrar que ele é um profissional inserido num campo de trabalho do qual viveu (e vive) por muito tempo pode leva-lo a abordar conceitos matemáticos de forma a refletir sobre os mesmos por conta própria. Referências AMANCIO SILVA, Valdir. Conhecimento profissional docente sobre o campo conceitual aditivo: uma investigação em um processo formativo. 2012. Dissertação (Mestrado em Educação Matemática) - Universidade Bandeirante de São Paulo, São Paulo. AGUERRONDO I. Los desafios de la política educativa relativos a las reformas de la formación docente. In: Programa de formación de la reforma educativa en América 142 Latina y Caribe. Maestro en América Latina: nuevas perspectivas sobre su formación y desmpeño. Santiago de Chile: Preal; Ed. San Marino, 2004. BODGAN, R. C; BIKLEN, S. K. Investigação qualitativa em educação matemática. Lisboa: Porto Editora, LTDA, 1994. FIORENTINI, D. Alguns modos de ver e conceber o ensino da matemática no Brasil. Zetetike, Campinas, n. 4, 3. 1995, p. 1-37. GATTI, Bernardete A.; NUNES, Marina MR. Formação de professores para o ensino fundamental: estudo de currículos das licenciaturas em pedagogia, língua portuguesa, matemática e ciência s biológicas. São Paulo: FCC/DPE, v. 29, 2009. SHULMAN, L. Those Who Understand: Knowledge Growth in Teaching. 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Por meio de parceria Universidade-Escola, buscou-se oportunizar ações de formação docente para estudantes de Licenciatura em Matemática, aproximando-os da realidade escolar da Educação Básica. Numa perspectiva metodológica de desenvolvimento colaborativo entre pesquisadores e licenciandos, procurou-se conduzir um processo de comunicação no qual o significado construído leva a uma ação, ou ainda, a reflexão sobre a ação conduz à construção de novos significados. Neste texto são descritos resultados de um subprojeto do referido projeto, com o objetivo de estabelecer um ambiente propício à prática de resolução de problemas na escola, visando a produção de conhecimento pelos licenciandos, com ênfase na investigação e autonomia. O foco do estudo foi na implementação, por três licenciandas de uma universidade estadual paulista, de atividades de resolução de problemas com duas turmas de primeiro ano do Ensino Médio. Tais atividades, bem como as ações de intervenção, foram inspiradas nos princípios da competição internacional denominada Rali Matemático de forma a propiciar um contexto no qual as licenciandas teriam oportunidade de observar a evolução das competências dos alunos, tanto do ponto de vista dos conceitos matemáticos, procedimentos e atitudes como dos aspectos transversais subjacentes, em particular as capacidades de leitura, escrita, argumentação e comunicação. Os resultados mostram que tais vivências propiciaram às licenciandas a compreensão de elementos específicos dos processos de aprendizagem dos alunos e do papel do professor em atividades de resolução de problemas, fortemente relacionados ao contexto do Rali. A análise dos relatórios das licenciandas trazem evidências de evolução de seus conhecimentos sobre resolução de problemas e a valorização desse tipo de prática pedagógica. Palavras-chave: Formação de professores, Resolução de problemas, Rali Matemático. 144 Introdução Inúmeras pesquisas na área da Educação Matemática, tanto no Brasil como no mundo, mostram a necessidade de se adequar o trabalho escolar a novas tendências que levem a melhores formas de ensinar, aprender e avaliar o progresso dos alunos e de aprimorar o trabalho dos professores. Desde a década de 80, nos Estados Unidos, havia entre os educadores matemáticos um interesse crescente em fazer da Resolução de Problemas (RP) o foco do currículo de Matemática. O National Council of Teachers of Mathematics (NCTM) manifestava sua preocupação com essa questão e elaborou uma série de recomendações para avanço da Matemática escolar naquela década. A primeira dessas recomendações era: resolver problemas deve ser o foco da Matemática escolar para os anos 80 (NCTM, 1980). No Brasil, seguindo algumas recomendações dos Standards do NCTM, os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Fundamental (PCN) também apontam o desenvolvimento da capacidade de resolver, explorar, generalizar e propor novos problemas, como um dos propósitos principais do ensino de Matemática. Nesses parâmetros, a RP é tida como eixo organizador do processo de ensino e aprendizagem. De fato, um dos princípios fundamentais apontados é a situação-problema como ponto de partida da atividade matemática e não a definição. Com isso, a RP não deve ser uma atividade desenvolvida em paralelo ou somente como aplicação da aprendizagem, mas sim uma orientação para a aprendizagem (BRASIL, 1998, p. 40-41), uma vez que proporciona um contexto para aprender conceitos, procedimentos e atitudes matemáticas. Em orientações curriculares atuais, a RP tem sido recomendada não apenas como um simples método, mas como uma concepção de educação propriamente dita, ou seja, ela deve oferecer aos alunos a possibilidade de construir conhecimento a partir e através de problemas, e de vivenciar situações de aprendizagem por meio de um trabalho autônomo, criativo e significativo (ONUCHIC e ALLEVATO, 2009). Cabe observar que a atual proposta curricular do Estado de São Paulo recomenda fortemente a RP em sala de aula e diversos programas da Secretaria Estadual de Educação do Estado de São Paulo (SEE/SP), no que se refere à disciplina 145 Matemática, têm sido claramente orientados para um trabalho em resolução de problemas. Desta forma, os problemas deveriam ser o ponto central do ensino de Matemática e, no processo de ensino e aprendizagem, conceitos, conteúdos, ideias e métodos matemáticos deveriam ser abordados mediante a exploração de problemas. Mas, ensinar os alunos a resolver problemas significa ensiná-los a pensar, tarefa nada fácil, principalmente para um professor iniciante. Em dois estudos realizados com a metodologia de ensino por meio da RP, Zuffi (2008) constatou que existia ainda um desconhecimento inicial dos princípios norteadores dessa metodologia por parte dos professores participantes da pesquisa. Por outro lado, ao longo do projeto, houve um aumento do interesse desses professores pela mesma e também aprendizagens quanto a conhecimentos didáticos dos conteúdos matemáticos envolvidos nessas atividades. Por estas razões, a autora defende que tal metodologia é viável para a escola pública, quer seja em atividades de oficinas complementares, quer na sala de aula usual de Matemática, chamando a atenção de que deve ser incorporada em processos de formação inicial e/ou continuada de professores, a fim de acompanhá-los em suas primeiras experiências com essa metodologia. De modo geral, no contexto da formação de professores de Matemática para a Educação Básica, busca-se destacar o ensinar e o aprender em Matemática, valorizando ações que possibilitam a construção de conhecimentos, tanto no que se refere à cultura matemática, quanto à cultura escolar e, especificamente, aos modos de ensinar essa disciplina. A RP pode constituir um desses modos, devendo ser discutida e vivenciada pelos licenciandos, em particular no que se refere ao trabalho do professor para a condução deste processo junto aos alunos, bem como para as formas de avaliação da aprendizagem nesse tipo de atividade matemática. Como afirmam Viseu e Ponte (2009), não é fácil para os futuros professores realizarem desde logo um ensino desafiante e dinâmico, pois esse tipo de ensino reveste-se de grande incerteza e complexidade. Num ensino dinâmico – como aquele pautado na RP – que valoriza a participação dos alunos, não apenas a aprendizagem é mais difícil de ser observada, como também não é fácil prever tudo o que pode acontecer numa aula. 146 Concordando com esses autores, entende-se que o conhecimento didático desempenha um papel essencial na prática docente e, embora alguns aspectos teóricos desse conhecimento possam ser tratados em disciplinas universitárias, é na prática – e na reflexão sobre ela – que os futuros professores têm oportunidade de reformulá-los e sistematizá-los. Com isso, é necessário promover ações, tanto no espaço da sala de aula do curso de formação inicial, como fora dela, visando promover experiências práticas e ambiente favorável à reflexão sobre tais ações. Nesse sentido, os projetos desenvolvidos nos cursos de formação inicial que estabelecem parcerias com escolas públicas de Educação Básica são fundamentais, constituindo meios para a articulação entre o que se aprende e o que se ensina. Um subprojeto no âmbito de uma parceria dessa natureza foi desenvolvido com licenciandos em Matemática de uma universidade pública do estado de São Paulo, num contexto inspirado na competição internacional denominada Rali Matemático, que é descrita a seguir. 1. Rali Matemático Transalpino O Rali Matemático Transalpino (RMT), segundo seus idealizadores, é uma competição entre classes de 8 a 15 anos – do terceiro ano do Ensino Fundamental à segunda série do Ensino Médio – no âmbito da resolução de problemas de Matemática, e que se desenvolve em diversos países. Teve início em três países da região dos Alpes europeus – Suíça, França e Itália – o que justifica sua denominação. O RMT está na sua 22ª edição e ao longo dos anos, outros países passaram a participar, dentre eles Argélia, Argentina, Bélgica e Luxemburgo (mais detalhes em http://www.armtint.org/). A organização do Rali é responsabilidade da Associação Rali Matemático Transalpino (ARMT), uma associação sem fins lucrativos, cujo estatuto garante promover a resolução de problemas para melhoria do ensino e da aprendizagem de Matemática por meio de uma competição entre classes. A noção de problema é, portanto, de fundamental importância, completamente diferente daquela de exercício de fixação ou aplicação. No contexto do Rali, um problema é uma situação para a qual não se dispõe de uma solução imediata, mas que exige a elaboração de estratégias, eventualmente, a modelagem da própria situação. Tentativas, conjecturas, verificações, justificativas são passos que, em geral, precisam ser realizados a fim de se resolver um 147 problema desse tipo. Um problema do RMT precisa ser original, estimulante e desafiador para os alunos. Uma característica importante do RMT é o da competição entre classes. Não se busca revelar talentos individuais, trata-se de desenvolver a cooperação entre todos os alunos de uma turma a fim de que a produção do grupo todo seja a melhor possível. A participação no RMT é uma decisão conjunta da classe com o professor, após a fase treino: ou a classe participa ou não, não cabem decisões individuais ou, por exemplo, apenas do professor. A organização da classe, inclusive, para a resolução de uma prova do RMT, é de responsabilidade dos próprios alunos. Assim, a proposta é a de um trabalho colaborativo para o qual todos – e cada um dos alunos da classe – precisam estar envolvidos e compromissados. A competição envolve classes de diferentes escolas de diferentes países. Esse caráter internacional da proposta torna o Rali muito estimulante tanto para os alunos como para os professores envolvidos. O sentimento de pertencimento a um determinado grupo nos diferentes níveis é muito interessante e merece um olhar especial dos educadores. A participação de uma turma no RMT aproxima-se da situação de produção de conhecimento científico para o que muitos são os responsáveis, sem a ilusão de que o conhecimento é fruto do trabalho de um indivíduo, alheio e sem considerar os esforços de outros. Nesse sentido, o RMT pretende promover o desenvolvimento da autonomia e proporcionar aos alunos a possibilidade de trabalhar com a resolução de problemas, aprendendo a discutir soluções, a respeitar as regras do debate científico, a desenvolver a capacidade de trabalho em grupo, entre outras habilidades, tão importantes e essenciais nos dias de hoje. 1.1 Operacionalização e funcionamento do Rali Em cada escola participante do Rali, a competição acontece em etapas, que compreendem a prova treino, a prova I, a prova II e a grande final. Para a fase treino, o professor pode escolher os problemas – no banco de problemas disponível no site do RMT – analisá-los com os alunos e direcionar a aplicação de acordo com as regras do Rali. Após essa fase, a decisão de participação – 148 ou não – é tomada. Para as turmas que decidem participar, as provas I, II e a grande final, de acordo com as normas do Rali, são aplicadas por outros professores que não os professores de Matemática das turmas, ou seja, os professores devem combinar com colegas para que façam a aplicação das provas, sem qualquer tipo de interferência, a não ser a gestão do tempo, a distribuição e recolhimento das provas. A grande final ocorre apenas com as turmas melhor classificadas nas etapas I e II. Em todas as etapas, com exceção da etapa de treino, as provas compreendem 5 a 7 problemas (dependendo da categoria) com 50 minutos de duração. Toda a turma deve produzir uma única resposta coletiva para cada problema, com justificativa ou descrição de como chegou à solução. As provas do Rali, divididas por categorias de 3 a 10 que correspondem a turmas de 8 a 15 anos, devem abranger conceitos matemáticos de diversos domínios, em particular, aritmética, álgebra, geometria, lógica e combinatória. A pontuação é atribuída a cada problema pelo comitê responsável de acordo com critérios pré-estabelecidos, determinados durante a elaboração dos problemas e aprimorados pelos professores responsáveis pelas sedes. Vale observar que o rigor do processo e a clareza das explicações ou justificativas dadas são consideradas na pontuação; não basta apresentar somente a resposta correta. Cabe aos alunos dividir e organizar o trabalho, gerenciar o tempo, contribuir pessoalmente na resolução e aceitar as contribuições dos colegas. Como mencionado, são 50 minutos para a resolução de 5 ou 7 problemas. Essa escolha visa estimular a cooperação e a valorização das interações entre os alunos. Os problemas são elaborados e selecionados, em número e em grau de dificuldade, de tal forma que cada aluno, independentemente de seu nível, possa prestar sua contribuição e que o conjunto da prova seja praticamente impossível para um só aluno resolver, por mais ágil que ele seja. Pode-se ainda ressaltar que os problemas do RMT são inéditos, ricos e estimulantes para os alunos, buscando possibilitar a resolução de várias maneiras e conter questões abertas para que os alunos expliquem e justifiquem suas estratégias. Os problemas do RMT são aplicáveis em sala de aula após a competição, aliás, esse é um dos principais objetivos da ARMT: que os problemas do Rali possam ser explorados no 149 contexto escolar, tanto na preparação das turmas participantes quanto depois das etapas da competição, de forma que alunos e professores possam discutir suas resoluções, os acertos e erros, ampliando suas vivências e percepções sobre diferentes situações, temas e estratégias adotadas. Assim, incentiva-se fortemente que, após as aplicações das provas, os professores possam explorar os problemas, discuti-los, retomá-los e analisar as soluções e resultados com seus alunos em suas aulas. É importante observar que, apesar da ideia de competição, presente no próprio nome, o Rali possui um caráter extremamente forte de trabalho colaborativo. Essa característica é a que, de fato, dá o tom a todo o processo, pois os alunos devem perceber e valorizar a importância do trabalho dos colegas. A competição existe sim, mas é entre grupos, nada individual, colocando ênfase, ela própria, no poder do grupo. 2. O estudo Como já mencionado, o trabalho aqui apresentado faz parte de um projeto maior que tem por objetivo oportunizar ações de formação docente para estudantes de Licenciatura em Matemática, aproximando-os da realidade escolar da Educação Básica. Os objetivos específicos desse subprojeto podem ser assim descritos: organizar atividades que propiciem ao licenciando a compreensão de processos de aprendizagem dos alunos e as contribuições da resolução de problemas na prática pedagógica; orientar o licenciando na elaboração, adequação, (re)organização de recursos didáticos – incluindo estratégias didáticas – que favoreçam o desenvolvimento de atividades de resolução de problemas e os permitam acompanhar a evolução dos alunos. Como estratégia metodológica, formulou-se a hipótese de que o Rali Matemático permitiria estabelecer um ambiente propício à prática de resolução de problemas em Matemática na escola, possibilitando atingir os objetivos acima mencionados. Destacam-se em particular dois aspectos que embasam esta escolha: não interferência do professor durante a prova e posterior discussão dos problemas com os alunos a partir de – e valorizando – suas resoluções e soluções. Desta forma, considerou-se que, no contexto do Rali, os licenciandos teriam oportunidade de observar a evolução das competências dos alunos, tanto do ponto de 150 vista dos conceitos matemáticos, procedimentos e atitudes como dos aspectos transversais subjacentes, em particular as capacidades de leitura, escrita, argumentação e comunicação. A equipe do subprojeto foi composta de duas pesquisadoras e três alunas do curso de Licenciatura em Matemática de uma universidade pública do estado de São Paulo (identificadas por L1, L2 e L3) e duas turmas de 1ª série do Ensino Médio da escola técnica da referida Universidade. O período de realização das atividades aqui relatadas foi de abril/2012 a março/2013. A estratégia planejada contou com um desenvolvimento colaborativo entre as pesquisadoras e as licenciandas. Mais especificamente, buscou-se conduzir um processo de comunicação colaborativa no qual o significado construído leva a uma ação, ou ainda, a reflexão sobre a ação conduz à construção de novos significados. A coleta de dados foi feita com base nos relatórios produzidos pelas licenciandas nos diferentes momentos de intervenção, incluindo os materiais e recursos elaborados por elas. No início das atividades do subprojeto, foi criado um espaço virtual para apoio ao trabalho presencial, facilitando as comunicações entre os membros da equipe e o compartilhamento das decisões e ações. O trabalho foi organizado em duas fases inter-relacionadas. A primeira fase centrou-se no levantamento dos conhecimentos e experiências das licenciandas sobre resolução de problemas, bem como na discussão de alguns artigos sobre o assunto. Na segunda fase, o foco foi na implementação, pelas licenciandas, de atividades de resolução de problemas nos moldes do Rali, com adaptações para o contexto específico da Escola. Na sequência, concentraremos nossa atenção na descrição e análise de atividades dessa fase, enfatizando a participação das licenciandas no processo. 3. Ações desenvolvidas e principais resultados Para que as licenciandas vivenciassem a experiência de realizar atividades de RP nos moldes do Rali, foram propostas as seguintes tarefas, sob orientação das pesquisadoras: 1) planejamento e realização de uma oficina de RP com o objetivo de discutir com os alunos o que caracteriza um problema, familiarizá-los com o tipo de problema do Rali e com a resolução em grupo; 2) organização e realização de duas 151 etapas do Rali (prova I e prova II), desde a seleção dos problemas até a posterior discussão dos mesmos com as turmas. Cabe observar que as licenciandas eram responsáveis pelas intervenções junto aos alunos em ambas as tarefas, assumindo o papel de professoras. Os encontros com as turmas ocorreram semanalmente, em aulas cedidas pelo professor de Matemática da Escola. No que concerne os encontros presenciais com os alunos das turmas nessa segunda fase, no total foram 4 encontros de 1h40 de duração cada um para a oficina e 6 encontros para realização das duas etapas do Rali, sendo: dois momentos de 50 minutos para aplicação das provas e 4 encontros de 1h40 cada para o que foi denominado de “devolutiva”, ou seja, discussão e retomada das produções dos alunos, resolução de novos ou problemas similares e apresentação de resultados. Neste tipo de atividade, as licenciandas foram desafiadas a elaborar estratégias para retomada dos problemas, sempre a partir das resoluções apresentadas pelos alunos e das dificuldades observadas no momento da correção coletiva. Para as licenciandas, em particular, o processo foi muito significativo e alguns dos relatos transcritos a seguir embasam essa afirmação. L1 explica o que foi priorizado na fase inicial durante a realização da oficina. “Escolhemos problemas similares aos do Rali. A intenção de começarmos com esses desafios foi mostrar para os alunos que esses problemas podem ser encarados como uma diversão, mas como pede o Rali, não basta dar a resposta, é preciso explicar.” E L2 complementa, indicando algumas características dos problemas propostos aos alunos inicialmente. “A gente queria motivar bastante os alunos, então de início tentamos buscar problemas parecidos com os do Rali, mas do tipo desafio. Depois, fomos incluindo os do banco do Rali, para eles irem se acostumando que tinham problemas com várias possibilidades e que deviam explicar como pensaram ou como chegaram na solução.” Observa-se que as licenciandas apropriaram-se da proposta, refletindo tal compreensão nas justificativas das escolhas dos problemas para a oficina. Desde os primeiros encontros, e em particular nos momentos de aplicação das provas do Rali, as licenciandas identificaram algumas dificuldades ao assumirem o 152 papel de professoras. Duas delas (L1 e L3) referem-se à questão de não haver interferência durante a resolução coletiva dos problemas, tanto nos momentos preparatórios, quanto na realização das provas do Rali. “Tentei não influenciar, deixar os alunos pensarem primeiro. Em alguns momentos, interferi um pouco, só para tirar dúvidas sobre o enunciado. Mas, era difícil! Os alunos perguntavam bastante, principalmente nos primeiros encontros e na primeira prova. Tentei seguir a regra do Rali e falava para eles que tinham que se organizar e tentar fazer sozinhos.” (L2) “Professor sempre quer ajudar e dar dicas. No começo, não foi fácil adotar essa postura de não interferir. Depois com o tempo, principalmente nas provas, os alunos entenderam e não perguntavam tanto, aí foi ficando mais fácil.” (L3) Ao observarem e registrarem os comportamentos dos alunos durante as resoluções em grupo, as licenciandas foram unânimes em relatar que a proposta do Rali motivou e envolveu os alunos, sendo rapidamente incorporada por eles. “Observamos pelo comportamento dos alunos que o clima não era de ‘aprender a matéria’, mas de ‘encontrar uma solução’, correndo contra o tempo, pois para todos os problemas, um tempo era estipulado.” (L1) “Percebi que a maioria dos alunos não estava ali para cumprir o horário. Eles queriam se superar, descobrir coisas novas e tentar melhorar a pontuação. Eles encararam a competição pelo lado positivo.” (L3) Como descrito anteriormente, na maioria dos problemas do Rali, os alunos devem explicar como chegaram à solução e/ou justificar suas respostas, o que é pontuado na correção. Já era esperado que os alunos tivessem dificuldades nessa tarefa e tal aspecto foi analisado pelas licenciandas. “Essa questão da justificativa foi melhorando aos poucos, mas desde o primeiro encontro, era um problema para os alunos.” (L2) “Na hora de fazer a explicação como chegaram na resposta, foi aquele primeiro impacto: – Mas como assim? Eu chutei! O costume de explicar o que fizeram ou como resolveram ainda não estava fixado em suas mentes. Para eles, o importante era acertar, independente de como. No começo, demos algumas 153 dicas... – Vocês não usaram nenhuma estratégia? Será que não tem nenhum detalhe que direcione o chute?” (L1) Elas consideraram que houve evolução ao longo do processo, sendo importante trabalhar esse aspecto nas devolutivas. Analisaram ainda os problemas que favoreciam esse tipo de atividade e buscaram orientar os alunos. “A gente tinha que falar toda vez sobre as explicações, para os alunos tentarem sempre justificar suas respostas. Quando eles viam que contava bastante na pontuação, começaram a se esforçar, alguns, porque a maioria queria resolver e pronto. Acho que foram melhorando essa parte. Tinha problema que era mais fácil de justificar. Dei a dica de irem escrevendo passo a passo o que estavam fazendo ou pensando. Alguns grupos conseguiam, como no problema da adição.” (L3, cf. Anexo 1) Ao avaliarem as contribuições das práticas para sua própria formação, as licenciandas destacaram a ênfase no ensinar “sobre” a RP, como pode ser constatado nas considerações abaixo. “Acho que conseguimos trabalhar mais sobre a resolução de problemas e não via resolução de problemas. Na devolutiva de alguns problemas, falamos bastante da teoria do Polya, sobre os passos para se resolver um problema: compreender, elaborar um plano, executar e examinar a solução. Quando entendemos o problema, o passo seguinte é elaborar um plano baseado em todas as informações dadas, e então executar esse plano. Por último, tem que verificar a solução obtida, pois é nessa verificação que vamos perceber se todas as condições impostas no enunciado foram respeitadas.” (L2) L1 também reconhece alguns problemas de aplicação, ou seja, problemas nos quais os alunos tiveram oportunidade de aplicar conhecimentos construídos anteriormente. “Não sei ao certo, mas acho que ficamos mais na parte de como resolver um problema, como se organizar, baseado mesmo no Polya. É muito difícil ir além. Mas talvez os alunos tenham feito algumas aplicações do que já tinham estudado também, como no caso do problema que caía numa equação do 2º grau e que vários grupos resolveram a equação por Bhaskara.” (L1) O problema intitulado “Treino de Basquete” (cf. Anexo 2) mereceu destaque nos relatórios das licenciandas devido ao fato de nenhum grupo ter apresentado uma solução 154 correta, nem parcialmente. Isso chamou a atenção delas, em particular no momento de preparação da intervenção para discuti-lo com os alunos na sala de aula. O trecho abaixo ilustra como essa questão foi tratada pelas licenciandas. “Como ninguém chegou na resposta, resolvemos reler e retomar os dados para que eles compreendessem melhor o problema. Depois de alguma discussão, decidimos sugerir aos alunos que atribuíssem horários de saída de casa da mãe e de retorno com o filho e tentassem resolver novamente. Na verdade, um grupo já tinha comentado algo a respeito, perguntando se podia ‘chutar’ um horário só para ver como resolver. Ai, aproveitamos a ideia desse grupo para compartilhar com os outros.” (L1) A partir de tal intervenção, vários grupos resolveram satisfatoriamente e foram convidados a apresentar suas soluções na lousa. Com isso, as licenciandas buscavam explicitar que os horários assumidos não interferem na solução e a fazer os alunos perceberem uma “nova” estratégia. “Foi bem difícil pensar como trabalhar esse problema com os alunos. Aliás, esse problema foi difícil para mim também! Propus de fazer um outro parecido, mas um pouco mais simples, indicando horário de saída e de chegada. E depois pedir que tentassem de novo.” (L2) “Os alunos não estão acostumados com esse tipo de problema, pensam que faltam dados. E não é simples mesmo! Confesso que eu demorei para resolver... A ideia era aproveitar esse problema para discutir isso que às vezes podemos usar um raciocínio hipotético, tentando simular a situação e pode ajudar.” (L3) Na reflexão sobre esse problema, L1 escreveu: “Casos assim nos mostram a importância do professor em sala. Os alunos devem se tornar cada dia mais independentes, mas isso não significa que devemos deixá-los totalmente soltos e sem direção. É preciso que eles aprendam, mesmo com os erros, alguma coisa nova. Casos não vistos, que geram muita confusão e provavelmente um pouco de desânimo, devem ser trabalhados nas turmas de forma cuidadosa e com bastante atenção, para que todos percebam a importância de analisar vários aspectos e perspectivas dos problemas.” (L1) 155 A percepção de que partir do trabalho dos alunos para uma posterior sistematização por parte do professor é uma estratégia interessante e conveniente foi real e declarada pelas licenciandas. “Entendi que temos que partir do que os alunos fizeram. Foi muito importante fazer a correção coletiva, entender os critérios de pontuação e preparar a síntese dos resultados apresentados pelos alunos. Só assim é que podíamos ir para a lousa e sistematizar os conhecimentos, resgatando o que os alunos discutiram durante a resolução dos problemas.” (L1) “Quando a gente trazia os resultados, a discussão das soluções não era simplesmente assistida como uma correção de exercícios na lousa. Eles tinham que participar. No começo, eles queriam mais era conferir as respostas e saber quantos pontos fizeram. Não foi nada fácil convencê-los a explicar o que fizeram. Mas, quando erravam ou acertavam parcialmente, aí se interessavam, e a discussão fazia sentido para eles.” (L2) Considerações finais A partir das descrições de suas vivências, as licenciandas evidenciaram aprendizagens que foram possíveis a partir da participação no subprojeto. Entende-se que os objetivos foram globalmente atingidos e que a hipótese da escolha do Rali Matemático como contexto privilegiado para realização das atividades foi confirmada. Verificou-se um aumento do interesse das licenciandas para atuarem como docentes na Educação Básica, em particular na promoção da resolução coletiva de problemas. Os depoimentos que seguem refletem tais aspectos. “O contato com as turmas foi uma experiência única e animadora. Conforme o texto que lemos do Dante, o sucesso em alguma atividade nos leva a desenvolver atitudes positivas em relação a ela, e poder trocar ideias e experiências com as colegas e com os alunos trouxe isso, foi muito gratificante. Fez com que minha visão como professora mudasse e percebesse que ensinar matemática vai muito além dos cálculos, dos números e das fórmulas. Para ensinar matemática devemos ser capazes de desenvolver nos alunos o raciocínio, o interesse pela investigação, a criatividade, a colaboração e muito mais. E com o Rali foi possível praticar esse ensino!” (L2) 156 Ao longo de toda trajetória, as licenciandas foram fortemente incentivadas, por um lado, a praticarem o que estudaram na “teoria” e, por outro, a refletirem sobre as práticas didáticas que implementaram, exercícios importantes para se constituírem como professoras pesquisadoras de suas práticas. Referências bibliográficas ALLEVATO, N. S. G.; ONUCHIC, L. R. Teaching mathematics in the classroom through problem solving. In: Researh and Development in Problem Solving in Mathematics Education. ICME, México, 2008, p. 59-70. BRASIL (país). Parâmetros Curriculares Nacionais: Matemática – PCN, 3º e 4º ciclos. Ministério da Educação e do Desporto, Secretaria de Educação Fundamental, 1998. Disponível em: www.portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro03.pdf Último acesso em: 11 de fevereiro de 2014. NCTM. An Agenda for Action: Recommendations for School Mathematics of the 1980’s, The National Council of Teachers of Mathematics, 1980. 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Resumo disponível em: http://www.rc.unesp.br/serp/trabalhos_completos/completo5.pdf Último acesso em: 7 de fevereiro de 2014. 157 Anexo 1: Solução de um grupo de alunos da Turma A Anexo 2: Enunciado do Problema da Prova I do 11º RMT O TREINO DE BASQUETE ©ARMT 2003 – 11° – Prova I Cada vez que João vai ao treino de basquete, sua mãe vem buscá-lo de carro. Ela sai de casa, não para em lugar algum do caminho, chega regularmente ao clube no final do treino e volta para casa imediatamente com seu filho. Mas, hoje, o treino acabou mais cedo que o previsto. Como sua mãe ainda não chegou, João decide ir embora imediatamente a pé para encontrá-la no caminho. Eles chegaram em casa juntos, 12 minutos antes que os outros dias. A mãe de João mantém sempre a mesma velocidade que é 5 vezes a de João a pé. Quanto tempo João andou até encontrar sua mãe? Quantos minutos antes o treino foi encerrado? Tentem explicar como chegaram à solução. Fonte: www.armtint.org (tradução nossa) 158 UMA EXPERIÊNCIA DOCENTE EM SALA DE AULA DA GRADUAÇÃO COM A RESOLUÇÃO DE EQUAÇÕES DO 2º GRAU PELO MÉTODO DO COMPLETAMENTO DE QUADRADO DE AL-KHWARIZMI Francisco de Assis FREITAS JUNIOR – UNIFEI – MG ([email protected]) Eliane Matesco CRISTOVÃO – UNIFEI - MG ([email protected]) Resumo: Este artigo refere-se aos resultados parciais de uma pesquisa, ainda em andamento, realizada em contexto de sala de aula. Muitos professores ensinam seus alunos a resolverem equações do 2º grau por meio da fórmula “de Bhaskara”, apresentada geralmente sem qualquer justificativa, fazendo com que alunos e alunas acreditem na falsa ideia de que fórmulas são soluções mágicas criadas por gênios. Enclausurados nesse método, os discentes dificilmente ultrapassam o nível da técnica. Pensando nessa problemática o primeiro autor deste artigo decidiu elaborar e aplicar uma sequência de atividades que contemplasse diferentes métodos de resolução de equações quadráticas, sem a necessidade do uso de fórmulas. Esta ideia surgiu no contexto das aulas de Prática de Ensino V, disciplina que é ministrada pela segunda autora no 6º semestre do curso de licenciatura em Matemática da Universidade Federal de Itajubá (UNIFEI). A sequência, elaborada segundo os princípios da metodologia de Resolução de Problemas, partia de problemas que abordavam os conhecidos métodos de resolução de equações incompletas e também o método do completamento de quadrado, desenvolvido pelo matemático árabe Abu Ja'far Muhammad ibn Musa al-Khwarizmi (ca 780 - 850) no século IX. Por ter sido realizada como um processo intencional, esta experiência configurou-se como uma pesquisa sobre a própria prática para o futuro professor. Relatou-se desde o processo de busca de subsídios para a elaboração da sequência até a análise dos resultados obtidos a partir de seu desenvolvimento junto a alunos da graduação. Os resultados obtidos apontam para a importância da associação entre a metodologia de Resolução de Problemas e o uso da História no Ensino da Matemática para promover um ensino significativo desta disciplina, além das possibilidades de aprendizagem profissional para o aluno, futuro professor, que se engaja numa experiência que toma sua prática como foco de estudos. Palavras – chave: Resolução de equações do segundo grau; Método do Completamento de Quadrado; Formação inicial de professores de Matemática; Pesquisa da própria prática. 159 Introdução Tudo começou na disciplina de Prática de Ensino de Matemática V do curso de Licenciatura em Matemática da Universidade Federal de Itajubá, ministrada pela segunda autora. Ao iniciar a disciplina, a professora apresentou o plano de curso contendo etapas de estudos que culminariam na preparação e desenvolvimento, em sala de aula, de um plano de aula e uma sequência de atividades acerca de um determinado tema. O conteúdo matemático abordado deveria ser referente ao Ensino Fundamental II (6º ao 9º ano) e cada aluno poderia escolher um tema de seu interesse. Motivado pela observação de uma aula, durante as atividades de estágio, na qual foi demonstrada algebricamente a Fórmula de Bhaskara, o primeiro autor, um dos alunos da disciplina, optou pelo conteúdo de equações do 2º grau. A partir deste ponto, ele relata sua experiência em primeira pessoa. Em outros trechos do texto, o mesmo acontecerá. Foi notável, ao ouvir e observar os alunos, que a demonstração não lhes fez sentido algum e ao final da aula a maioria deles fazia um uso estritamente mecânico da fórmula, sem sequer saber identificar corretamente os coeficientes de uma equação que não estivesse na forma canônica. Esta demonstração, quando feita apenas algebricamente, não esclarece, por exemplo, a origem do termo que completa o trinômio quadrado perfeito. Inclusive eu quando vi a demonstração pela primeira vez na disciplina de Fundamentos de Matemática, fiquei com essa dúvida. Como já conhecia o histórico método do completamento de quadrado de AlKhwarizmi das disciplinas de Prática de Ensino de Matemática cursadas anteriormente, busquei a utilização deste e de outros métodos na tentativa de explorar a compreensão desses sentidos e das potencialidades de uma abordagem mais ampla, que utilizasse recursos à História da Matemática e a Metodologia de Resolução de Problemas, entendida por nós como um meio de se ensinar Matemática, sendo o problema o gerador do processo de ensino-aprendizagem (SOUZA e NUNES, 2007, p.3). A ideia inicial era elaborar e desenvolver um plano de aula com alunos do ensino fundamental em alguma escola da cidade de Itajubá – MG. Como nem todos os alunos da turma estavam realizando estágio, optamos por aplicá-los com alunos e alunas que estavam cursando Prática de Ensino de Matemática I, disciplina que integra a matriz 160 curricular do 2º semestre do curso de Licenciatura em Matemática da UNIFEI, ministrada pela Professora Flávia Sueli Fabiani Marcatto, no mesmo curso e instituição. Seria uma maneira de verificar as potencialidades e limites de nossas sequências de atividades e, ao mesmo tempo, propiciar aos alunos ingressantes a oportunidade de ressignificar conceitos que poderiam, talvez, não ter sido trabalhados de forma adequada em sua formação básica. Com estes dois enfoques, esta pesquisa configurouse numa uma oportunidade, como futuro professor, de refletir sobre a prática de ensinar, ainda enquanto licenciando. Dessa forma, podemos caracterizá-la, de acordo com Palis (2008), como uma pesquisa da própria prática. Nesse tipo de pesquisa, o professor pesquisador de sua própria prática alia investigação e ensino: em face de um problema didático, submete-o a exame crítico, resolve-o da melhor maneira possível e divulga sua solução (PALIS, 2008, p. 1). Metodologia A proposta de trabalho da disciplina foi o que norteou metodologicamente este trabalho. A partir da definição de um conteúdo matemático como foco de estudos, no meu caso o de equações quadráticas, as seguintes etapas foram realizadas: • Caracterização e análise de orientações e propostas curriculares para o ensino de Matemática para o Ensino Fundamental, por meio do estudo comparativo de propostas, de livros e de materiais didáticos; • Estudo teórico por meio da leitura de um artigo ou relato de experiência referente ao tema escolhido que propusesse algum tipo de inovação; • Elaboração de um plano aula e de uma sequência de atividades utilizando diferentes metodologias, sob orientação da professora da disciplina; • Apresentação do plano e da sequência aos colegas, para que colaborassem com comentários e críticas; • Aplicação do plano de aula e da sequência de atividades junto a turma, contando com o recurso de uma filmadora para o registro das falas do aluno responsável pela aula, suas intervenções e comentários dos alunos, sempre que possível; • Registro escrito desta experiência em forma de artigo ou narrativa. Inicialmente, foi feita uma pesquisa bibliográfica com o intuito de identificar como o conteúdo de equações do 2º grau era abordado nas Propostas Curriculares dos 161 estados de Minas Gerais e São Paulo. Para tanto, houve uma análise do Currículo Básico Comum (CBC) do Ensino Fundamental, das Orientações Pedagógicas e de um Módulo Didático com uma proposta de atividades, disponíveis no Centro de Referência Virtual do Professor de Minas Gerais. Foi analisada também uma situação de aprendizagem do Caderno do Professor de Matemática do estado de São Paulo. Após feitas as análises, foi verificado como o conteúdo era trabalhado em dois livros didáticos de matemática do 9º ano, quais sejam, “Matemática para todos” de Imenes & Lellis e “Matemática” de Antonio José Lopes (Bigode). Foram reunidos os pontos principais do estudo comparativo e apresentados, em forma de slides, aos colegas e Professora para que pudessem contribuir com críticas e considerações. Na sequência, foi realizada a leitura de um artigo apresentado no XI Encontro Nacional de Educação Matemática (ENEM) intitulado: Equações quadráticas e a sua história: Uma possibilidade de tornar significativo o seu aprendizado e a história da matemática como tendência metodológica (SCHERER e RIBEIRO, 2013). Para um melhor entendimento do artigo, houve uma discussão mais detalhada do mesmo juntamente com os colegas e a Professora. Após consultar, analisar e comparar todos esses materiais foi dado início ao preparo do plano de aula destinado à alunos e alunas do 9º ano do Ensino Fundamental. As atividades foram selecionadas de forma a atender aos requisitos da abordagem de Resolução de Problemas, ou seja, começavam sempre pela proposição de um problema que era o ponto de partida das atividades. Ao término da produção do plano e da sequência de atividades pudemos então iniciar a preparação da aplicação dos mesmos numa aula com os alunos e alunas do 1º ano da graduação do nosso curso. As aulas foram filmadas com a finalidade de ter elementos para, futuramente, trabalhar com a metodologia do Lesson Study, ou estudo de aulas, que tem sido divulgada por John Elliot. Esta metodologia consiste na preparação de sequências de atividades a serem aplicadas e gravadas para posterior estudo a partir da análise das filmagens. Cada licenciando podia optar por filmar ou não a aula. Contando com o auxílio de nossos colegas de classe, decidimos que esta aula seria filmada. Assim, ao final de todo esse processo, teríamos um registro que nos permitisse uma reflexão sobre nossa própria prática docente, o que seria muito importante para nossa formação como futuros 162 professores. É importante ressaltar que o que apresentamos neste artigo é o resultado de uma análise preliminar, antes de fazermos o estudo a partir da análise das filmagens, o que ocorrerá futuramente. Sentindo na pele o que é ensinar A aula destinada ao desenvolvimento da sequência de atividades junto aos alunos ocorreu numa sala do Instituto de Mecânica da UNIFEI no dia 13 de novembro de 2013 das 21h às 22h40min. No início me apresentei, defini o tema e apresentei os objetivos da aula, dentre os quais destaco a compreensão do método geométrico de completamento de quadrados para resolução de equações do 2º grau e a dedução da solução geral. Em seguida, questionei aos alunos e alunas como se resolvia uma equação do 2ºgrau e a resposta foi um quase uníssono: “Por Bhaskara” (se referindo a fórmula “de Bhaskara”). Sugeri então que eles “esquecessem” o que haviam aprendido sobre equações do 2º grau para iniciarmos as atividades propostas. Vale lembrar que a sequência, trabalhada nos 100 minutos da aula, seria feita com mais calma e detalhes numa situação real com alunos do Ensino Fundamental, o que demandaria algumas semanas de aula. Partindo da Metodologia de Resolução de Problemas, propus inicialmente duas situações problema, cuja resolução recairia em equações quadráticas completas. Como os alunos ainda não saberiam resolvê-las (de acordo com nosso combinado de que esquecessem o que sabiam), estudar métodos de resolução de equações do 2º grau seria nossa motivação para resolver os problemas e consequentemente desenvolver o conteúdo. Os problemas propostos inicialmente foram os seguintes: 1. Os participantes de um festival de música decidiram que, ao final do festival, fariam uma festa de encerramento, e cada um dos participantes daria uma flor de presente a cada um dos colegas também participantes do festival. Quantas flores serão distribuídas se o total de participantes for 5? E se for 6? E 7? Se o total de flores distribuídas for 930, qual será o número de participantes do festival? 2. Cláudia teve parte do terreno de sua propriedade desapropriada pela prefeitura, que pretendia alargar duas avenidas. Do terreno, em forma de quadrado, foram retiradas uma faixa de 4m de largura ao norte e uma faixa de 3m de largura a leste. A área do terreno ficou reduzida à metade. De que tamanho era o terreno? 163 Após um tempo de discussão, os alunos observaram que seria difícil resolver os problemas sem o uso da fórmula, e que uma saída seria por tentativa e erro. A ideia era deixar os dois problemas “pendurados” e, após o estudo do tema retornar para solucioná-los. Enfatizei que antes de explorar métodos e formas de resolução seria importante identificar e caracterizar as equações do 2º grau. Pudemos assim, discutir uma definição para equações desse tipo, reconhecer e caracterizar seus coeficientes, exemplificar vários casos, inclusive com coeficientes nulos (excetuando-se claro o coeficiente de x²), introduzindo assim o conceito de equações do 2º grau incompletas. Durante a discussão, observou-se que uma mesma equação poderia ser escrita de maneiras distintas e sugerimos, para evitar erros e otimizar a comunicação, que todos escrevessem as equações sob uma mesma forma que denominamos forma geral ou canônica (ax² + bx + c = 0). Na sequência foi definido o conceito de raiz ou solução de uma equação quadrática. Foram trabalhados exemplos em que alguns números eram soluções de uma dada equação e outros não, como se segue: Na equação x² + 5x + 6 = 0, -2 e -3 são raízes, pois: (-2)² + 5(-2) + 6 = 4 -10 +6 = 10 – 10 = 0 (-3)² + 5(-3) + 6 = 9 -15 + 6 = 15 – 15 = 0 1 não é raiz dessa equação pois: (1)² + 5(1) + 6 = 1 + 5 + 6 = 12 ≠ 0 Na equação x² - 6x + 8 = 0, 2 e 4 são raízes, pois: (2)² - 6(2) + 8 = 4 – 12 + 8 = 12 – 12 = 0 (4)² - 6(4) + 8 = 16 – 24 + 8 = 24 -24 = 0 3 não é raiz dessa equação pois: (3)² - 6(3) + 8 = 9 -18 +8 = 17 – 18 = -1 ≠ 0 164 Foi discutido o que representava um número ser raiz ou solução de uma dada equação do 2º grau através da substituição da incógnita por este número antes de abordar como eles seriam obtidos, como se pode observar. Para resgatar os processos de resolução das equações do 2º grau, iniciei pelas incompletas, sempre com base em situações problema. Comecei pelas equações incompletas em “b”, isto é, quando o coeficiente de “x” era nulo (ax² + c = 0), e discuti com os alunos a possibilidade de resolver problemas desse tipo isolando a incógnita por meio de operações aritméticas básicas. Os problemas propostos nessa etapa estão dispostos a seguir: 1. A área de um quadrado de lado L é igual a 49 cm². Qual é a medida do lado desse quadrado? 2. Um retângulo tem área igual a 242 cm² e seu lado maior é o dobro do menor. Qual é a medida do lado maior desse retângulo? 3. A área de um triângulo retângulo isósceles é 18 cm². Determine as medidas de seus catetos e da hipotenusa. 4. Um homem quer construir uma casa de 8m por 10m. A legislação do município só permite construir, nesse loteamento, em no máximo 20% da área do terreno. Sabendo que o terreno é quadrado, quais serão as medidas do terreno para construir a casa desejada? Em seguida propus o seguinte problema: “Um quarteirão na forma de um quadrado foi contornado por uma calçada de 2 metros de largura, o que reduziu a área reservada à construção de imóveis, conforme a figura a seguir. Com isso a área para construção passou a ser 144m². Qual era a medida do lado original do quarteirão?” Minha expectativa era que os alunos resolvessem o problema pelo método da raiz do binômio, isto é, equacionando o problema da seguinte forma: (x - 4)² = 144 → x - 4 = 12 → x = 16. Quando trouxe este problema, o intuito era frisar que quando temos um trinômio quadrado perfeito em um dos membros da equação podemos resolvê-la facilmente com algumas operações básicas, o que nos levaria a pensar na importância do completamento de quadrado. 165 Mas fui pego de surpresa com uma resolução completamente fora do padrão que eu havia idealizado! Quando perguntei aos alunos como se resolveria aquele problema, percebi que um deles disse alguma coisa em voz baixa. Como não entendi o que ele havia dito, solicitei que falasse novamente. Ele disse para “deixar pra lá”, mas busquei estimular mais uma vez sua resposta. O aluno explicou que como o quadrado verde tinha 144m² seu lado só podia medir 12m, somando os 4m que foram retirados segue-se que a medida do lado do quarteirão deveria ser 16m. No momento fiquei paralisado, pensando.... Eu não estava esperando aquela resposta. Logo vi que ele estava certo e tinha pensado de um modo bastante esperto. Expliquei qual era minha intenção com aquele exercício, tendo em vista que, ali, éramos todos futuros professores e que era interessante discutir a dificuldade que um professor pode passar ao elaborar um problema para abordar um conceito e ser surpreendido por um aluno dessa forma. Após esse episódio que gerou um momento importante para reflexão partimos para as equações incompletas em “c”, isto é, quando o termo independente era nulo (ax² + bx = 0). Para resolver equações desse tipo relembramos um pouco sobre a fatoração de equações algébricas, buscando estimular a percepção de que colocar fatores comuns em evidência nesse caso auxiliava na resolução dos problemas. No anexo I, estão os problemas propostos nesta etapa. Discuti, em seguida, o caso em que “b” = “c” = 0 (ax² = 0) e os próprios alunos chegaram à conclusão de que apenas o zero poderia ser solução de equações dessa natureza. Por fim chegamos a equação do 2º grau completa. Acredito que foi nesta parte da sequência que, de fato, pude contribuir com algo novo para os alunos da graduação, trazendo o método histórico de resolver equações quadráticas de al-Khwarizmi. Comecei resgatando um pouco de história… Seguindo a tradição grega de interpretar geometricamente situações problema que hoje interpretamos algebricamente, o matemático árabe al-Khwarizmi, no século IX, desenvolveu um método geométrico para resolução de equações do 2º grau, cujos passos transformam uma equação desse tipo em um quadrado perfeito. Nesse método, o lado do quadrado é considerado o valor da incógnita, sendo, portanto, desprezadas as soluções negativas. A falta de significado dos números negativos, nesse contexto, é devida à representação geométrica utilizada para a resolução das equações. Al166 Khwarizmi considerava alguns tipos de equações do 2º grau, entre elas, equações do tipo “quadrados” mais “raízes” igual a “números” que hoje representamos algebricamente por: x² + bx = c. Para explicar tal método resolvemos o seguinte problema na lousa: “O quadrado de um número acrescido de oito vezes o mesmo número é igual a 65. Qual é esse número?” Na álgebra moderna, essa sentença é dada pela expressão: x² + 8x = 65. O método de al-Khwarizmi consistia nos seguintes passos: 1º. O mesmo problema poderia ser escrito da seguinte forma: A área de um quadrado, acrescida de um retângulo cuja área é equivalente a 8 vezes o lado do quadrado resulta 65. Assim, as expressões x² e 8x são interpretadas como as áreas de um quadrado e de um retângulo, respectivamente. A solução do problema é, então, a medida do lado do quadrado. 2º. O retângulo era dividido em dois retângulos de mesma área. A equação era interpretada como: 3º. Cada retângulo era arranjado de modo que ficasse justaposto a dois lados do quadrado. Com essa composição, a área da figura continua sendo 65. 4º. Para completar o quadrado, acrescentava-se um quadrado no canto da figura anterior. Com esse método, “completava-se um quadrado perfeito” de lado x + 4 e área igual a 65 + 16 = 81. 5º. Sendo a nova área 81, a medida do lado do novo quadrado é então √81=9. Assim, o lado do quadrado é x + 4 = 9, portanto, x = 5 é a solução. Na linguagem algébrica moderna, transformamos a equação x² + 8x = 65 em uma equivalente (x + 4)² = 81. Isso foi possível aplicando-se o método chamado “completamento de quadrado”. Acompanhando o desenvolvimento algébrico, observamos que, embora apoiados no processo figurativo, são encontradas todas as raízes da equação: x2+8x+16=65+16 (x+4)2 = 81 x+4 = ±81 x+4 = ±9 O que nos dá x = 5 ou x = -13. 167 Chamei atenção ao fato de que nessa atividade, embora as soluções negativas não tenham sentido geométrico, elas satisfazem as equações algébricas. Mais uma vez pude aproveitar a oportunidade para discutir com os alunos que, enquanto o método geométrico permite a escrita da equação na forma fatorada conhecida, o método algébrico permite a determinação de todas as soluções reais da equação, quando existirem. As discussões feitas até aqui convergiram para a ideia de que as equações de 2º grau quando fatoradas podem ser resolvidas com fatos já apreendidos. Com essa abordagem pude enfatizar que o desenvolvimento do quadrado da soma e do quadrado da diferença de dois números e seus respectivos processos de fatoração ganham nova importância. Após apresentar este exemplo solicitei aos alunos que fizessem as seguintes atividades: 1. Encontre as raízes das equações de 2º grau aplicando o método do “completamento do quadrado” desenvolvido por Al-Khowarizmi: a) x² + 20x = 300 b) x² + 5x = 6 c) x² + 2x + 1 = 0 Durante a resolução fui andando pela sala para tirar possíveis dúvidas e o mais interessante foi ver o rosto de surpresa dos alunos. Era como se eles estivessem dizendo: “mas podia fazer desse jeito?”. Em seguida, pedi que um dos alunos resolvesse um dos problemas na lousa. Também discutimos os outros e depois partimos para a dedução da solução geral de uma equação quadrática. Apoiado no processo geométrico, sem esquecer de considerar suas limitações, e utilizando a álgebra, fomos deduzindo juntos a fórmula que nos fornece a solução geral de uma equação do 2º grau. A seguir reproduzo o passo a passo do procedimento utilizado. Seja a equação ax² + bx + c = 0, com a≠0: Como a ≠ 0 podemos dividir ambos os membros da equação por a: + + = Simplificando temos: x² + + =0 168 Subtraindo a parcela em ambos os membros da equação temos: x² + =- Obtemos uma equação muito parecida com aquelas que al-Khwarizmi resolvia pelo método geométrico... Interpretando as expressões x² e como as áreas de um quadrado e de um retângulo, respectivamente: x² + + = - ²= = = = = = , Chegamos à solução geral para qualquer problema que envolva uma equação do segundo grau. Cabe ressaltar que denotamos o número b² - 4ac por uma letra grega (delta) devido a sua importância para determinação do número de soluções da equação. Assim, pude aproveitar para recordar que este número é também chamado de discriminante da equação e para explicar sua importância (o que também foi novidade para alguns alunos). No caso do trabalho com alunos da escola básica, eu poderia optar por desenvolver a demonstração de maneira mais concreta, fazendo a comparação com um exemplo numérico. Acredito que, dessa forma, seria mais fácil para o aluno dar sentido a cada passagem da demonstração algébrica, como se pode ver no anexo II. E finalmente pudemos resolver aqueles dois problemas que ficaram “pendurados”! 169 Algumas considerações Ao final da aula, foi entregue uma lista (anexo III) com sete problemas selecionados intencionalmente para mostrar que, em cada caso, há um método mais adequado para resolver a equação. Foi solicitado que os alunos resolvessem pelo método que julgassem conveniente e entregassem ao terminar. A partir da análise das produções, poderemos verificar se os alunos continuaram presos ao uso da fórmula ou buscaram soluções por métodos alternativos. O que podemos afirmar por enquanto é que a resolução pelo método do completamento de quadrado tem pelo menos uma grande vantagem. Ela favorece a compreensão da demonstração da fórmula “de Bhaskara”. Com a interpretação geométrica de al-Khwarizmi foi possível explicar de onde o termo havia saído, fazendo total sentido para os alunos. Notamos ainda que completar um quadrado perfeito na álgebra era o mesmo que completar um quadrado na geometria! E o futuro professor, o que aprendeu? É melhor que ele mesmo o diga. A pesquisa da própria prática beneficia o próprio professor e os alunos, gera conhecimento e desenvolve a cultura profissional da comunidade de referência. (PALIS, 2008, p. 1). Pude comprovar isso ao perceber, após o episódio do “problema do quarteirão” como eu estava preso ao pensamento algébrico enquanto o aluno resolveu o problema de forma bem mais simples, recorrendo apenas ao pensamento aritmético. Percebi, mais ainda naquele momento, a importância de dar voz aos alunos e estimular que eles criem suas próprias formas de resolver situações problema. Aprendi com essa experiência que devemos estimular mais a participação dos alunos, selecionar bem as atividades, pensar em diferentes formas de resolução para, ao menos, minimizar as “surpresas”, mas não ao ponto de que tudo torne-se previsível, visto que essa surpresa trouxe reflexões importantes. Esses aprendizados, entre outros, certamente levarei para a minha própria prática docente. 170 Referências CRISTOVÃO, E. M. Equação do 2º grau. Sequência elaborada como trabalho final da disciplina de Didática. Unicamp, 1995. IMENES, L.M.; LELLIS, M. Matemática para todos: 8ª série, 4° ciclo - São Paulo: Scipione, 2002. LOPES, A. J. Matemática: 9º ano – 1. Ed. São Paulo: Scipione, 2013. O'CONNOR, J. J.; ROBERTSON, E. F. “Abu Ja'far Muhammad ibn Musa AlKhwarizmi” Disponível em: <http://www-history.mcs.st-and.ac.uk/Biographies/AlKhwarizmi.html>. Acesso em Nov. 2013. OLIVEIRA, D. P. A.; LOPES, M.M. Dois modos históricos de resolver equações do segundo grau. Revista de História da Matemática para Professores, Natal (RN), Ano 1, n.0, Mar. 2013. PALIS, Gilda de La Rocque. A pesquisa sobre a própria prática no ensino superior de matemática. In: IV Colóquio de História e Tecnologia no Ensino da Matemática. Rio de Janeiro, Brasil, de 5 a 9 de maio de 2008. Anais do evento. Disponível em http://www.limc.ufrj.br/htem4/papers/40.pdf. Acesso em Fev. 2014. SCHERER, A. C. S.; RIBEIRO D. M. Equações quadráticas e a sua história: Uma possibilidade de tornar significativo o seu aprendizado e a História da Matemática como tendência metodológica. 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Indique com V ou F se as afirmações abaixo são verdadeiras ou falsas, respectivamente: ( ) Se numa multiplicação de dois fatores um deles é 19 e o produto é zero, então, o outro fator é, necessariamente, igual a zero. ( ) Se numa multiplicação de dois fatores o produto é zero, então, um dos fatores é, necessariamente, igual a zero. ( ) Se numa multiplicação de dois fatores o produto é 6, então, um dos fatores pode ser igual a 6. ( ) Se numa multiplicação de dois fatores o produto é 6, então, um dos fatores é, necessariamente, igual a 6. ( ) Se numa multiplicação de 1000 fatores o produto é zero, então, um dos fatores é, necessariamente, igual a zero. ( ) Se numa multiplicação de dois fatores o produto é zero, então, ambos os fatores são, necessariamente, iguais a zero. ( ) Se numa multiplicação de dois fatores o produto é zero, então, ambos os fatores podem ser iguais a zero. 3. Considerando os exercícios 1 e 2, encontre quais valores de x satisfazem as seguintes equações: a) -3x = 0 d) x (x + 2) = 0 b) x.x = 0 e) 2x (x – 5) = 0 c) 5 (x – 1) = 0 f) x (3x + 9) =0 4. Agora faça o mesmo para as equações do exercício 1. 5. Determine o comprimento, em centímetros, do lado do quadrado cuja área é numericamente igual ao perímetro. 6. Pensei num número não nulo. Somei ao quadrado desse número o seu triplo e obtive 0 como resultado. Em que número pensei? 172 Anexo II: Demonstração acompanhada de um exemplo numérico. 2 x 2 5x 3 0 ax 2 bx c 0 2 2x 5x 3 0 2 2 2 5x 3 2 x 0 2 2 2 x2 5x 5 3 5 2 2 4 4 ax bx c 0 a a a a bx c x2 0 a a 2 2 x2 bx b c b a a 2a 2a 2 b c b2 x 2a a 4a 2 2 b 4ac b 2 x 2a 4a 2 5 3 25 x 4 2 16 5 1 x 4 16 2 5 1 4 16 x b b 2 4ac 2a 4a 2 x 5 1 4 4 x b 2a b 2 4ac 2a b 2a b 2 4ac 2a x 5 1 4 4 5 1 4 2 2 x x a0 2 x x b b 2 4ac 2a Anexo III: Lista de Problemas. 1) Um pedreiro usou 2000 azulejos quadrados e iguais para revestir 45m² de parede. Qual é a medida do lado de cada azulejo em centímetros? 2) O triplo de um número menos o quadrado desse mesmo número é igual a 0. Qual é esse número? 3) Pai e filho hoje tem 45 e 15 anos, respectivamente. Há quantos anos a idade do pai era igual ao quadrado da idade do filho? 4) Um terreno retangular mede 26m de comprimento e 16m de largura. Aos fundos do terreno e em uma de suas laterais (como mostra a figura ao lado) serão acrescentadas duas faixas de mesma largura. Com essa expansão do terreno, a nova área medirá 816m². Qual será a largura dessas faixas? 173 5) Determine dois números ímpares consecutivos cujo produto seja 143. 6) Quais são as dimensões de um retângulo cujo perímetro e área medem, respectivamente, 50cm e 150cm²? 7) A figura ao lado é composta por um quadrado com um triângulo em seu interior. A área amarela corresponde a 112 unidades de área. Nessas condições, determine o valor de x. 174 O PROCESSO DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES E AS CONTRIBUIÇÕES DE UM PROGRAMA INSTITUCIONAL PARA A LICENCIATURA EM MATEMÁTICA Zionice Garbelini MARTOS RODRIGUES IFSP/ Campus Birigui ([email protected]) Luciane de Castro QUINTILIANO IFSP/ Campus Birigui ([email protected]) Allan Victor RIBEIRO IFSP/ Campus Birigui ([email protected]) Moacir Pereira de SOUZA FILHO UNESP/ Departamento de Física, Química e Biologia/P. Prudente/SP ([email protected]) Resumo: O presente artigo estabelece algumas reflexões sobre os relatos de um grupo de alunos do Curso de Licenciatura em Matemática do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo, Campus Birigui, sobre suas primeiras percepções referente a um subprojeto do PIBID (Programa Institucional de Bolsa de Iniciação a Docência), financiado pela CAPES, em parceria com duas escolas da Rede Estadual de Ensino de Birigui/SP. Tal subprojeto teve como ideia central contribuir para a melhoria do processo ensino-aprendizagem na disciplina Matemática, a qual tem uma relação direta com a melhora na formação inicial dos futuros docentes. Essa melhoria implica na ampliação do conhecimento matemático e político-pedagógico do discente. No Subprojeto PIBID – Matemática Birigui foco desta pesquisa, procurou-se trabalhar algumas metodologias diferenciadas que possam ajudar a compreender e planejar ações mais eficazes para o ensino de Matemática na Educação Básica. A partir dos presentes relatos pode-se verificar a importância do projeto PIBID Matemática nas escolas, pois através dos relatos dos alunos bolsistas observou-se que o mesmo traz benefícios para alunos, professores e acadêmicos tanto do Ensino Básico quanto do Ensino Superior. Desta forma, se estende na prática a ponte entre escola e universidade que tanto se procurava. E ainda, proporciona grande experiência, vivência para os alunos bolsistas e mais conhecimento para os alunos participantes. Palavras-chave: Formação inicial, Metodologias Alternativas, Jogos, Ensino Médio. 175 Introdução O Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID) tem como finalidade o desenvolvimento de ações entre Universidade e Escola Pública para promover o aprimoramento e a dinamização do trabalho já desenvolvido no âmbito escolar, com o intuito de viabilizar a obtenção de resultados relevantes para a promoção da aprendizagem significativa dos alunos, e ainda proporcionar o aperfeiçoamento da formação dos alunos-bolsistas como futuros professores. No desenvolvimento do subprojeto PIBID de Matemática existe uma dedicação tanto dos alunos-bolsistas quanto dos professores da escola participante do projeto, nas diversas atividades propostas. Dentre as inúmeras atividades desenvolvidas pode-se mencionar o aprofundamento por meio de leituras envolvendo os conhecimentos teóricos e específicos acerca dos conceitos próprios da Matemática e ainda, os conhecimentos de caráter político-pedagógico. Além disso, o aperfeiçoamento da prática de ensino por meio do apoio às aulas, regências, a participação em atividades de planejamento e reuniões pedagógicas, a proposição e construção de soluções para situações da prática cotidiana da escola e do ensino de Matemática, através da preparação de oficinas, gincanas, olimpíadas e outros eventos. E ainda, o desenvolvimento de uma cultura de integração entre ensino e pesquisa por meio do registro, avaliação e relato das práticas vivenciadas, à luz das teorias que sustentem suas análises e possíveis proposições. O Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID), realizado no IFSP-Birigui, teve como parceiras duas escolas da Rede Estadual de Ensino de Birigui/SP e, foi financiado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). A ideia central do subprojeto era, dentro do contexto da educação matemática, explicitar entre os envolvidos que a educação ideal se faz por meio da ação direta de seus atores, em especial dos professores, e que o avanço dos resultados educacionais tem relação direta com a melhoria na formação inicial docente. Tal progresso implica, por um lado, na ampliação do conhecimento matemático e político-pedagógico, no domínio das técnicas e tecnologias próprias da profissão docente, e, por outro, no desenvolvimento de uma cultura onde o ensino e a pesquisa sejam componentes 176 indissociáveis. Partindo disso, a proposta desenvolvida pelo PIBID foi elevar a qualidade das ações no processo de ensino-aprendizagem durante a formação inicial dos futuros professores de Matemática formados pelo campus Birigui do IFSP. Inserindo-os no cotidiano das escolas públicas, possibilitando a integração da educação superior e básica, e promovendo a participação dos futuros professores em experiências inovadoras e interdisciplinares que melhorem a qualidade do processo de ensinoaprendizagem. Dessa forma, ao trabalharem junto com os professores atuantes na Rede Pública de Ensino podem vislumbrar o seu trabalho como futuros professores e, através da pesquisa, possibilita-se a análise da realidade em que se inserem e a construção de novos conhecimentos a partir de suas experiências. Parte dos Matemática problemas estão referentes relacionados ao ao ensino de processo de formação do magistério, tanto em relação à formação inicial como à formação continuada. Decorrentes dos problemas da formação de professores, as práticas na sala de aula tomam por base os livros didáticos, que, infelizmente, são muitas vezes de qualidade insatisfatória. A implantação de propostas inovadoras, por sua vez, esbarra na falta de uma formação profissional qualificada, na existência de concepções pedagógicas inadequadas e, ainda, nas restrições ligadas às condições de trabalho. (BRASIL, 1997, p. 22). Assim, as atividades propostas para os licenciados foram: 1) aprofundamento do fundamento teórico acerca dos conhecimentos próprios da Matemática e os de caráter político-pedagógico por meio de leituras, participação em atividades de planejamento e reuniões pedagógicas; 2) desenvolvimento da prática de ensino por meio do apoio às aulas e regências; 3) proposição e construção de soluções para situações da prática 177 cotidiana da escola e do ensino de Matemática que requerem alternativas para a solução de problemas que neles se apresentem, preparando e aplicando atividades tais como oficinas, gincanas, olimpíadas e outros eventos; 4) desenvolvimento de uma cultura de integração entre ensino e pesquisa, por meio do registro, avaliação e relato das práticas vivenciadas, à luz das teorias que sustentem suas análises e possíveis proposições. A partir disso, a proposta apresentada no Programa de Bolsa de Iniciação à Docência pelos alunos-bolsistas foi de realizar ações como: a) troca de experiências com a comunidade escolar; b) elaboração de materiais didático-pedagógicos através de oficinas a serem ministradas na escola, bem como na interlocução com outros campi do IFSP; c) participar, junto com os professores dos cursos de Ensino Médio Integrado com a Educação Profissional de Nível Médio, nas atividades dos Projetos Integradores dos cursos, desenvolvendo materiais pedagógicos para o ensino-aprendizagem de Matemática e de um portal na internet para a disposição desses recursos ao público em geral. No presente artigo, serão apresentados os resultados obtidos através dos relatos realizados pelos alunos-bolsistas referente às suas primeiras percepções sobre o subprojeto do PIBID (Programa Institucional de Bolsa de Iniciação a Docência), no qual um dos objetivos era de contribuir para a melhoria do processo ensino-aprendizagem, na disciplina Matemática, através de metodologias que possibilitassem um progresso durante o ensino dos conceitos matemáticos em sala de aula. E diante das várias metodologias existentes os alunos-bolsistas optaram pela elaboração e utilização de jogos para o ensino da matemática. Tais atividades foram desenvolvidas a partir dos trabalhos realizados por Pires (2001), que tem uma produção muito significativa nessa área de estudo. Estudos recentes relatam que utilizar a metodologia de jogos permite facilitar a socialização e a inclusão, visto que os alunos, ao buscar alternativas para vencer, aliamse formando laços de amizade e cooperação, deixando o ambiente de aprendizagem mais agradável e produtivo; professor e alunos tornam-se parceiros em busca de um só objetivo. O ato de jogar ainda permite a discussão, a experimentação e o estudo de conceitos de modo espontâneo. 178 Referencial teórico Desde seu início, ainda na era platônica e pitagórica, a Matemática tem sido vista como uma ciência difícil, associada a uma classe privilegiada. Em razão dessa bagagem, o ensino de Matemática apresenta elevados índices de dificuldade. Para tentar suprir essa defasagem, surgiram diversas reformas, como o Movimento de Matemática Moderna (MARTOS-RODRIGUES, 2010). As dificuldades no processo de ensino-aprendizagem da Matemática na escola, sobretudo no Ensino Médio vêm aumentando aceleradamente uma vez que a família tem deixado de exercer sua contribuição no desenvolvimento da aprendizagem. Diante de tais evidências é preciso que a escola cumpra sua função transformadora e que a Matemática renasça com um novo olhar pedagógico no meio escolar configurando um novo sentido e facilitando o desenvolvimento do ensino-aprendizagem da Matemática. Hoje, para poder ensinar o aluno, o professor tem buscado fontes alternativas que propiciem um aprendizado didático e concreto ao mesmo tempo. Uma alternativa tem sido a adoção de jogos matemáticos que além do aprendizado, estimulam a criatividade do aluno. Quando se fala em jogo, as pessoas em geral tendem a imaginar uma brincadeira. Por isso, é necessário delimitar as diferenças entre jogos e brincadeiras e para tanto, considera-se, como segue, o que enfatizam as autoras Flemming (2009) e Kishimoto (2008). Se procurarmos a palavra jogo no dicionário, ela virá como sinônimo de brincadeira. Porém, nesse contexto, ela será utilizada como sendo “atividade relacionada com o ensino, de natureza recreativa, usada em sala de aula para obtenção de um maior rendimento no processo de ensino-aprendizagem de um conteúdo específico” (FLEMMING, 2009, p. 4). Como característica geral, os jogos possuem um sistema de regras. Saber o conceito de brinquedo também é útil para ver nitidamente a diferença levantada. Neste sentido, Kishimoto (2008, p. 21) afirma que: “Diferindo do jogo, o brinquedo supõe uma relação com a criança e uma abertura, uma indeterminação quanto ao uso, ou seja, uma ausência de um sistema de regras que organizam sua utilização”. Grandes teóricos da educação infantil, como Piaget (1961), veem o jogo como 179 algo essencial na vida da criança, pois é o período em que prevalece a assimilação. No jogo, a criança se apropria daquilo que percebe da realidade. Em razão da grande importância dada ao jogo, há a necessidade de reflexões sobre algumas questões antes da sua aplicação, sendo uma delas a respeito da diferenciação sobre o que é jogo e o que é brincadeira. Abaixo, segue o fluxograma da metodologia elaborado por Flemming (2009) que aborda as questões citadas: Quadro 1: Tabela na qual FLEMING (2009) apresenta reflexões que o professor deve fazer antes de iniciar o jogo em sala de aula. Um exemplo de disso é uma atividade já bastante utilizada denominada de “mercadinho”. As crianças são convidadas a trazer sucata de casa para compor o estoque e confeccionar o dinheiro para as compras. Além de usar conceitos matemáticos como operações com decimais, a cidadania também lhes é ensinada. Flemming (2009, p.4) argumenta que o professor ao decidir trabalhar com jogos deve responder às seguintes questões: “Pretendo usar o jogo em minha sala de aula? Qual o objetivo que pretendo atingir? Conheço um jogo adequado? Vou precisar fazer uma adaptação? Como aplicá-lo? Em que momento da minha sequência didática o jogo vai ser inserido? Depois de aplicado: Os meus objetivos iniciais foram atingidos?”. Após responder a essas questões e analisar suas respostas, acredita-se que o professor saberá se o jogo trará benefícios a sua turma. E como afirma Flemming (2009, p.4): “Os jogos podem minimizar as dificuldades de aprendizagens e, principalmente, 180 facilitar o resgate de conceitos e propriedades Matemáticas de forma mais espontânea e natural”. Dessa forma, como afirma Pimenta (2009, p.17), “(...) estamos empenhados em ressignificar os processos formativos a partir da reconsideração dos saberes necessários à docência, colocando a prática pedagógica e docente escolar como objeto de análise”. Diante do exposto, este artigo relata, de forma geral, as experiências vividas pelos alunos do PIBID/BIRIGUI Subprojeto-Matemática, desde 2º semestre de 2013 até o ínicio do 2º semestre de 2014, nas escolas públicas parceiras, localizadas na cidade de Birigui/SP. Problemática anunciada, desenvolvimento e metodologia A metodologia deste trabalho baseou-se em analisar as percepções dos alunos bolsistas do PIBID – Campus Birigui sobre o projeto em um contexto geral e em relação às intervenções pontuais realizadas nas escolas parceiras. O projeto realizado no IFSP campus de Birigui possui prazo de vigência de 08/2012 a 02/2014 e é constituído de um coordenador de área do subprojeto; dois professores supervisores e doze alunos bolsistas. Este trabalho foi desenvolvido em duas escolas parceiras de educação básica da rede estadual de educação na cidade de Birigui, sendo o ensino médio o foco principal das atividades atreladas a este subprojeto. Como parte das atividades do subprojeto, ao final de cada etapa do plano de trabalho os alunos bolsistas foram estimulados a elaborar relatos de experiência sobre as atividades desenvolvidas semestralmente. Nestes relatos além da descrição das sequencias didáticas, materiais elaborados, intervenções realizadas nas aulas de regência, estudo dos referencias teóricos e pressupostos metodológicos também foi solicitado aos estudantes o registro, em formato de depoimentos, das impressões gerais sobre o PIBID e a importância do programa para a sua formação. Os relatos e os materiais didático-pedagógicos analisados neste trabalho foram elaborados pelos estudantes bolsistas ao longo do ano de 2013. Como critério de escolha foram selecionados os depoimentos de bolsistas de diferentes semestres, visando assim investigar a percepção do licenciando em diferentes momentos de seu 181 processo formativo do curso de Licenciatura em Matemática. Para discussão foram selecionados três depoimentos e uma intervenção realizada por uma das duplas de alunas bolsistas em uma turma do 2° ano do Ensino Médio em duas aulas de regência com duração de 50 minutos cada. A temática abordada foi definida a partir de uma avaliação diagnóstica realizada pelo professor supervisor. Nesta avaliação foi possível verificar dificuldades relacionadas a operações com frações e números decimais. A partir deste levantamento as alunas bolsistas desenvolveram um jogo intitulado "Baralho de Frações". O jogo possuía as mesmas regras de um jogo muito conhecido pelos estudantes chamado "truco", a diferença era que os "naipes" foram substituídos por outros símbolos, neste caso, símbolos de conceitos matemáticos, os números das cartas eram representados por frações. Na execução do jogo os alunos teriam que simplificar as frações possíveis e transformá-las em números decimais e assim, determinar qual carta possuía um valor maior que a outra. Para a coleta de dados foi elaborado um questionário previamente estruturado contendo dez questões abertas que indagavam sobre a contribuição do PIBID na formação inicial dos alunos bolsistas; os pontos positivos e negativos das atividades desenvolvidas; vivências referentes à imersão em sala de aula; articulação entre teoria e prática; elaboração e execução das sequências didáticas e análise das intervenções realizadas. Esta pesquisa tem natureza predominantemente qualitativa. Trata-se de uma pesquisa exploratória, pois, além de registrarmos e analisarmos os dados, nós buscamos identificar as impressões e, consequentemente, as potencialidades que o subprojeto PIBID exerce sobre os elementos participantes da pesquisa. Discussão e análise dos resultados O instrumento de análise utilizado foi constituído de questões abertas que foram respondidas pelos participantes da pesquisa. O questionário buscou investigar por meio dos depoimentos as impressões gerais e específicas dos alunos-bolsistas sobre o PIBID e a importância do programa para a sua formação como futuros docentes. 182 Diante do espaço que dispomos para este artigo, apresentamos apenas algumas falas identificadas a partir dos relatos dos alunos-bolsistas sobre suas percepções acerca das questões a eles apresentadas no questionário acima citado. Indicamos “Relato n”, onde n significa o excerto extraído da fala do aluno, sem identificá-lo. A terminologia utilizada para identificar os relatos acerca das concepções gerais (G) e para as específicas (E). Destaca-se a seguir algumas constatações elencadas a partir de relatos referentes às impressões gerais dos bolsistas após a realização das atividades propostas pelo projeto. Relato 1 (G): "No começo do projeto fiz a leitura dos textos “Apologia do Diário Escolar”, “O uso de brinquedos e jogos na intervenção psicopedagógica de crianças com necessidades especiais”, “Apologia do diário Escolar” entre outros, que me ajudaram na elaboração de um seminário sobre jogos para crianças com necessidades especiais... Em paralelo com as leituras e o seminário acompanhei o professor de matemática... no 1º ano do ensino médio integrado... Isso foi pra mim um grande aprendizado, pois foi a primeira vez que tive esse tipo de contato com alunos. O professor algumas vezes abriu espaço nas suas aulas para que fossem dado jogos para os alunos, a fim de ajudar na compreensão do conteúdo". (Aluna do 6º semestre do curso de Licenciatura em Matemática). Relato 2 (G): "...acompanho o professor-supervisor em suas aulas de Matemática no primeiro ano do Ensino Médio. A primeira impressão que tive foi um pouco frustrante. Os alunos conversavam muito e mostravam-se bastante desinteressados em aprender. O professorsupervisor se desdobra para poder ter a atenção da turma e ensinar tudo da melhor maneira possível, e é muito competente em sua metodologia de ensino, contudo, tem que parar a aula várias vezes para pedir silêncio. (Aluno do 5º semestre do Curso de Licenciatura em Matemática) 183 Relato 3 (G): "...Inserir os alunos de licenciatura em Matemática no cotidiano das escolas públicas e acompanhar um supervisor do projeto é um dos melhores meios para adquirir experiência e conhecer métodos de ensino-aprendizagem diversificados ...os alunos da licenciatura participam do cotidiano escolar, aprendem a lidar com os estudantes e conhecem diversas metodologias de ensino. (Aluna do 4º semestre do curso de Licenciatura em Matemática). A partir dos relatos acima constata-se o quanto é importante à realização desse tipo de projeto nos cursos de Licenciatura em Matemática, pois colabora de fato para a formação do aluno-bolsista como futuro professor. Nesta perspectiva, o subprojeto visa desencadear ações que proporcione aos alunos-bolsistas licenciandos em Matemática o conhecimento e a observação da realidade escolar; fundamentação teórica, instrumentalização da prática e aprofundamento de conteúdos matemáticos tanto Ensino Fundamental quanto do Médio, considerados de suma importância à formação e atuação profissional. No relato1 (G) destacamos na fala da estudante que apesar da mesma cursar o sexto termo do curso o Programa lhe proporcionou o primeiro contato com a realidade escolar. Outros trabalhos já realizados também sinalizam a falta de uma articulação eficiente com o cotidiano escolar durante o processo formativo dos licenciandos (Zeulli et al 2012). Severino (2002, p. 46) ressalta que “A teoria, separada da prática, seria puramente contemplativa e, como tal, ineficaz sobre o real; a prática, desprovida da significação teórica, seria pura operação mecânica, atividade cega. A partir do relato 2 (G) pode-se observar que o aluno bolsista retratou um cenário bem diferente dos demais relatos. Foi destacado por meio da observação diversas variáveis que influenciam negativamente o processo de ensino-aprendizagem, tais como: indisciplina, falta de interesse. Este contra ponto permitiu ao estudante vivenciar uma situação real em que o educador (professor supervisor) ao se deparar com elementos desmotivadores e que se não mediados de forma efetiva podem levar ao fracasso escolar (BORUCHOVITCH 2001). 184 Sendo assim o subprojeto PIBID de Matemática buscou promover a participação desses futuros professores em experiências inovadoras e interdisciplinares que melhorem as condições do processo de ensino-aprendizagem, e o trabalho junto aos professores atuantes da rede pública é extrema importância, pois reforça o caráter formador do curso de Licenciatura em Matemática, para que os novos professores possam ser estimulados, por meio da pesquisa, a análise da realidade em que se inserem e a construção de novos conhecimentos a partir das suas experiências. O relato abaixo corrobora com as afirmativas acima: No que se refere à intervenção "Baralho de frações" realizada destacamos ainda a seguir alguns relatos referentes às percepções específicas das alunas bolsistas após a realização da atividade elaborada. Para análise foram selecionadas duas das questões respondidas por uma das alunas que realizaram a intervenção em sala de aula. Questão 1: Descreva a intervenção (atividades em grupo/individual; houve a colaboração de outros bolsistas Pibid; tempo de duração): Hoje a sala foi dividida em dois grupos, cada grupo foi para uma sala, de modo que uma turma tinha a matéria normal com o professor supervisor e a outra turma foi jogar jogos matemáticos comigo e com a Maria. No final dos primeiros 50min as turmas trocaram de sala, e a que estava com o professor supervisor foi pra sala dos jogos e vice e versa... O intuito dos jogos era fazer com que os alunos assimilassem de forma mais didática o conteúdo programado, através de jogos matemáticos os alunos aprendem “brincando” e isso torna o aprendizado mais dinâmico e divertido. Os alunos em geral gostaram da experiência, alguns não queriam jogar, mas ao pensar que eles teriam que voltar pra sala com o professor supervisor, eles logo mudaram de ideia. Questão 2: Após a intervenção houve aprendizagem significativa dos conceitos abordados? Não consegui ver os resultados em provas, mas segundo relatos dos próprios alunos o jogo de Batalha Naval os ajudou muito ao 185 encontrar o ponto no plano cartesiano, o Baralho de frações alguns alunos não gostaram muito, pois acharam muito complicado transformar em os números fracionários em decimais, como tinham dois modelos, um mais fácil e o outro um pouco mais complexo, os alunos, obviamente, gostaram do mais fácil, sendo que um dos grupos no final da aula começou a jogar perfeitamente e sem muita dificuldade. A partir da resposta apresentada na Questão 1 pode-se notar que apesar dos alunos inicialmente não se interessarem pela atividade proposta, houve um consenso entre eles de que a atividade com jogos é mais atrativa e motivadora que uma aula tradicional. Neste sentido, segundo Flemming (2009) o uso de jogos no ensino da Matemática pode abrir possibilidades de mudar a dinâmica da sala de aula, em um aspecto positivo, pois pode aumentar o interesse do aluno pelo conteúdo desenvolvido. Na Questão 2 foi observado pela aluna bolsista que alguns estudantes apresentaram dificuldades ao lidarem com os conceitos abordados pelo jogo, tais como: operações com frações e números decimais. Percebe-se que a falta de conhecimento prévio acerca destes conceitos influenciaram na motivação da realização da atividade proposta, porém ao realizar a atividade em grupo evidenciou-se que os mesmos demonstraram maior familiaridade com o jogo e facilidade na execução as operações evidenciando assim a aprendizagem significativa dos conteúdos envolvidos. Abaixo apresentamos um recorte do depoimento desta aluna ao final da execução da intervenção por ela proposta. Relato 1 (E): O PIBID me proporcionou desde o começo um contato com os alunos que eu dificilmente iria ter em um estágio, pude acompanhar e ajudar os professores em sala de aula, além de preparar algumas aulas, desenvolver jogos e ter uma boa relação com os alunos e professores. O projeto preenche a lacuna que a faculdade deixa, pois disponibiliza esse contado com a rotina em sala, nos preparando para ela da melhor forma que existe, vivenciando, o 186 que acaba nos dando mais confiança para assumir uma sala. Na faculdade vemos a parte teórica, aprendemos novos métodos e com o projeto podemos aplicar eles nas aulas e assim conseguimos ver os pontos que fazem a diferença no aprendizado dos alunos, o que acaba tornando o trabalho prazeroso e gratificante. (Aluna do 6º semestre do curso de Licenciatura em Matemática). O Relato 1 (E) apresenta elementos importantes e significativos acerca dos pontos positivos e contribuições que o PIBID traz para os seus participantes. Também é evidenciada a motivação dos estudantes vivenciadas nas atividades com jogos matemáticos e alguns aspectos relevante dessa prática pedagógica. Nesse sentido, o PIBID colabora em “[...] tomar a prática existente como referência para sua formação (PIMENTA, 2005, p. 26) e refletir-se nela. No que se refere à introdução dos jogos como recurso didático para Smole (2007, p. 11), as habilidades e competências são desenvolvidas ao jogar, neste sentido os alunos têm a oportunidade de solucionar problemas, investigar e definir a melhor estratégia de jogo, pois ao refletir e analisar as regras é possível estabelecer relações entre os elementos do jogo e os conceitos matemáticos. Partindo disso os jogos pedagógicos como o “Baralho de frações”, além a função lúdica, tem a função educativa, ou seja, proporcionar determinadas aprendizagens nos indivíduos participantes. De maneira geral verificamos na maioria dos depoimentos referentes às vivências proporcionadas pelo projeto, no contexto da sala de aula, são primordiais para o desenvolvimento das habilidades e competências necessárias no sentido de “aprender a ser professor” e ensinar (Perrenoud 2000), pois é fundamental compreender como agir e solucionar os problemas na sala de aula assim como, entender e trabalhar melhor com os conteúdos. Conclusões e considerações finais A partir da análise dos dados identificou-se alguns dos elementos que, possivelmente, indicam o porquê os cursos de Licenciatura em Matemática têm apresentado deficiências em sua estrutura quanto à formação dos futuros professores. 187 Neste sentido, tais problemas vêm afetando a qualidade de ensino de Matemática nas escolas, pois as deficiências ocasionadas por uma má formação acabam sendo transportadas para sua vida profissional acarretando ainda mais lacunas no processo ensino-aprendizagem, como enfatiza os Parâmetros Curriculares de Matemática (BRASIL, 1997). Sabemos que ensinar Matemática não é uma tarefa fácil, porém é necessário criar novos métodos e tentar mostrar a grande importância dessa área do conhecimento no cotidiano, para que assim não ocorra somente uma aprendizagem tradicional e mecânica, e sim uma reflexão sobre o que se está aprendendo. A partir dos presentes relatos podemos perceber como é importante o projeto PIBID Matemática nas escolas, o mesmo traz benefícios para alunos, professores e acadêmicos tanto do Ensino Básico quanto do Ensino Superior, desta forma se estende na prática a ponte entre escola e universidade que tanto se procurava. E ainda, proporciona grande experiência, vivência para os alunos bolsistas e mais conhecimento para os alunos participantes. Todo esse trabalho além de colaborar com a carreira docente dos acadêmicos, os futuros professores, consequentemente, também contribui para a elevação da qualidade do ensino das escolas públicas. Referências bibliográficas BORUCHOVITCH, E., & BZUNECK, J. A . (2001). A motivação do aluno. Contribuições da Psicologia contemporânea.Petrópolis: Vozes. BRASIL, MEC/Secretaria de Educação Média e Tecnológica. Parâmetros Curriculares Nacionais+: Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias. 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Rio de Janeiro: Editora Fundo de Cultura; 1961. 189 INVESTIGAÇÕES DAS CRENÇAS DOCENTES NO PROJETO PIBID. Jurandyr C. N. Lacerda [email protected] Giancarla Cavichioli Petrucelli Bettoni– [email protected] RESUMO: Este trabalho evidencia alguns aspectos envolvendo os alunos do projeto PIBID, implantado no IFSP/Araraquara estudando a crenças dos alunos do programa verificando se esses alunos apresentarão as mesmas crenças dos professores iniciantes. A identificação de crenças individuais é um processo muito complexo. Discussões sobre pesquisas em crenças e motivação convergem para um mesmo consenso em que os processos de ensino-aprendizagem levam a estudar e compreender variáveis externas como a situação social e o contexto em que esses alunos estão inseridos. Nossas conclusões são que a vivência de alternativas ao ensino de matemática tradicional, mesmo com uma prática reflexiva não são sufucientes para mudanças na crenças docentes. Palavras-chave: Alunos projeto PIBID; crenças; conflitos. 190 INTRODUÇÃO Atualmente, parece ser consensual nos trabalhos de pesquisa, que os professores organizam mentalmente uma grande quantidade de conhecimento, do qual depende o seu ensino e a forma como usam na sua prática. Assim, histórias pessoais diferentes, crenças, concepções, e valores dos professores parecem influenciar nos saberes e nas atitudes que estes manifestam em suas práticas, caminhando-se para uma aceitação de que o conhecimento profissional do professor é fundamentalmente pessoal e prático, no qual as suas concepções e crenças desempenham um papel importante (KAGAN, 1992). Portanto, todos os dias, quando um professor de ciências entra em sala de aula, traz consigo suas crenças, concepções e saberes sobre a ciência, e sobre o ensino e aprendizagem de ciências, nos quais apoia e direciona suas ações. Para Kagan (1992), essas imagens e crenças, gestadas anteriormente, sobre a sala de aula e o trabalho docente são inflexíveis ocorrendo raras mudanças durante as atividades teóricas e práticas do pré-serviço. Por extensão, a inflexibilidade dessas construções leva os futuros professores a usarem essas mesmas imagens e crenças, como verdadeiros “filtros” na relação estabelecida com os programas. Ou seja, as contribuições advindas dos programas são vistas como efêmeras superficiais quando percebidas sob o efeito de “filtro” de crenças e imagens. De acordo com Barcelos (2006), nos estudos recentes sobre crenças nota-se uma tendência em se tentar entender sua função no processo de ensino e aprendizagem de matemática, seja através da análise do papel que elas exercem no ensino reflexivo, na tomada de decisões dos professores, na sua identidade ou como elas interferem na relação professor-aluno. Araújo (2006) postula que as crenças são consideradas uma das grandes forças que atuam na dinâmica da sala de aula e que as decisões dos professores podem ser um reflexo de suas crenças a respeito de si próprio e de seus aprendizes, sobre matemática. Acredita-se, portanto ser necessário que as crenças sejam compreendidas, por um lado, como filtros usados pelos alunos para dar sentido e lidar com contextos específicos de aprendizagem e, por outro, como uma investigação sobre experiências e ações deles e do professor, suas interpretações, o contexto social. A definição para o termo “crença” adotada neste estudo é a de que crenças são pressupostos adquiridos de experiências prévias, construídas socialmente, a partir da percepção individual destas 191 experiências, que têm valor de verdade e credibilidade pra guiar o pensamento e o comportamento e que são passíveis de mudanças. (SIEGEL, 1985; HARVEY,1986; BARCELOS, 1995, 2006). Neste trabalho procuramos identificar as crenças docentes em alunos de licenciatura em Matemática nas reuniões semanais do PIBID para dar continuidade ao nosso projeto de pesquisa. O programa institucional de bolsa de iniciação á Docência (PIBID) é um investimento do Governo federal brasileiro patrocinado pela CAPES diretamente aos cursos de licenciatura de todo o país. Durante o curso de licenciatura em matemática, os estudantes convivem com várias propostas para mudanças na forma de ensinar e aprender, visando a uma maior qualidade no ensino. No caso do PIBID, esses alunos já tem contato com escolas de ensino fundamental, e fica mais fácil apresentar as crenças “filtros” e desenvolver conflitos ou preocupações educacionais, especialmente em contextos que afrontem essas crenças. É nesse contexto que observamos esses alunos, quando, e em que momento essas crenças vão sendo evidenciadas, e os conflitos gerados pelas mesmas. Durante nossas observações nos deparamos com situações descritas pelos autores citados acima. Separamos essas situações em três momentos para que a identificação dos conflitos ficassem mais claros, visto que identificar as crenças é um processo muito complicado, já que estamos trabalhando com seres humanos com personalidades bem diferentes e complexas. Momento 1: Discussões sobre a atividade que os pibidianos irão desenvolver para a aplicação em sala de aula. Neste momento deparamos com várias crenças, identificando alguns conflitos que Franco (2000) coloca como conflitos internos e institucionais. Os dilemas e dificuldades do professor iniciante que são causados pela exigência de atuação na resolução de vários problemas, entre os quais, segundo Franco (2000), destacam-se: 192 1) problemas em conduzir o processo de ensino-aprendizagem, considerando as etapas de desenvolvimento de seus alunos e o conteúdo a ser desenvolvido; 2) problemas com a disciplina dos alunos e com a organização da sala de aula. (p.34). Também neste sentido, Sousa (1997) comenta: Neste momento o professor sente “[...] como se da noite para o dia o indivíduo deixasse subitamente de ser estudante e sobre os seus ombros caísse uma responsabilidade profissional, cada vez mais acrescida, para qual percebe não estar preparado.”(p.53). Perrenoud (2002) faz uma síntese das características peculiares ao professor, nesse período: 1. Está entre duas identidades, o de ser aluno e de assumir-se como professor; 2. O estresse, a angústia, diversos medos e mesmo momentos de pânico assumem enorme importância, embora eles diminuírem com a experiência e com a confiança; 3. Precisa de muita energia, de muito tempo e de muita concentração para resolver seus problemas que o profissional experiente soluciona de forma rotineira; 4. A forma de administrar o tempo (preparação, correção, trabalho de classe) não é muito segura, e isso lhe provoca desequilíbrio, cansaço e tensão; 5. Passa por um estado de sobrecarga cognitiva devido ao grande número de problemas que tem de enfrentar. Em um primeiro momento, conhece a angústia da dispersão, em vez de conhecer a embriaguez do profissional que “joga” com um número crescente de bolas; 6. Geralmente se sente muito sozinho, distante de seus colegas de estudo, pouco integrado ao grupo e nem sempre se sente acolhido por seus colegas mais antigos; 193 7. Está em um período de transição, oscilando entre os modelos aprendidos durante a formação inicial e as receitas mais pragmáticas que absorve no ambiente profissional; 8. Não consegue se distanciar do seu papel e das situações; 9. Tem a sensação de não dominar os gestos mais elementares da profissão, ou de pagar um preço muito alto por ele; 10. Mede a distância entre o que imaginava e o que está vivenciando, sem saber ainda que esse desvio é normal e não tem relação com incompetência em com sua fragilidade pessoal, mas que está ligado à diferença que há entre a prática autônoma e tudo o que já conhecera. Todas essas características citadas acima por Perrenoud (2002) são transpostas para os alunos do PIBID, e muitas delas são o gatilho para os conflitos estudados no nosso projeto de pesquisa. Momento 2: discussão de como seria aplicada a atividade pelos Pibidianos na escola desde o momento da separação dos grupos de alunos, até o fechamento da atividade, pensando aqui em todas as possibilidades no momento do processo do ensino/aprendizagem. Veenman(1984) observou em suas pesquisas a ocorrência de mudanças do comportamento do professor iniciante com práticas características de um estilo mais democrático no início da carreira para um estilo severo à medida que vai ganhando mais experiência no exercício de sua função. No entanto, é importante ressaltar que se são os piores anos, também constituem um momento profícuo para mudanças e desenvolvimento profissional, pois : [...] favorecem a tomada de consciência e o debate... Enquanto os profissionais experientes não consideram ou nem percebem mais seus gestos cotidianos, os estudantes medem o que supõem ser serenidade e competência duramente adquiridas. [...] a condição de principiante induz em certos aspectos, a uma disponibilidade, a uma busca de 194 explicação, a um pedido de ajuda, a uma abertura à reflexão. ( Perrenoud, 2002, p.14). É o que Cavaco (1995), Gonçalves (1992) e Hubermam (1992) verificaram ao observar sentimentos como também insegurança, peculiar ao início da carreira. Destacam a ocorrência do sentimento de descoberta nesse período profissional, identificando assim um paralelismo, que esta fase conserva, entre a sobrevivência ou o choque com o real e a descoberta, sendo a última motivadora para suportar a primeira. Para Cavaco (idem, p.39) a sobrevivência é um aspecto caracterizado pela: [...] confrontação inicial com a complexidade da situação profissional: o tatear constante, a preocupação consigo próprio (“Estou-me a me agüentar”), a distância entre os ideais e a realidade cotidiana de sala de aula, a fragmentação do trabalho, a dificuldade em fazer face, simultaneamente, a relação pedagógica e a transmissão de conhecimentos, a oscilação entre relações demasiado intimas e demasiado distantes, dificuldades com alunos que criam problemas [...] (p.39). Entendemos que os conflitos aconteceram nos momentos citados acima, e no fechamento quando os pibidianos relatam sua experiência falando sobre os momentos em que perceberam o envolvimento dos alunos da escola onde aplicarão a atividade, ou seja, momentos onde realmente aconteceu o processo de ensino –aprendizagem. Momento 3: neste momento os pibidianos se encontram para seus relatos sobre a aplicação da atividade proposta, neste encontro se torna clara as crenças dos participantes quando se deparam com a realidade das escolas e o conteúdo visto pelos alunos do ensino básico. 195 Este trabalho evidencia alguns aspectos envolvendo os alunos do projeto PIBID, implantado no IFSP/Araraquara estudando a crenças dos alunos do programa verificando se esses alunos apresentarão as mesmas crenças dos professores iniciantes. Discutindo também a possibilidade de debates dessas crenças num ambiente de trabalho de professor-pesquisador propiciado pela estrutura do projeto. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA Nos últimos anos, tem crescido o número de estudos que enfocam o trabalho do professor (formação inicial e/ou contínua) do ponto de vista de suas próprias crença. Alguns autores (LIMA, et al., 2007; MARCELO GARCIA, 1999; VONK, 1995) entendem que a formação do professor é um continuum, ou seja, um processo que se inicia antes da formação básica e se estende durante toda sua carreira. Desta forma, o início da docência pode ser compreendido como uma das fases que compõe este continuum e se dá efetivamente quando o professor ingressa na vida profissional, período no qual ele passa a ter contato com o contexto escolar e vive situações reais de ensino, ambientando-se à cultura escolar vigente, lutando por fazer parte do corpo profissional da escola e assumindo efetivamente a responsabilidade pelo processo educativo de uma classe de alunos. Uma das abordagens de interpretação e investigação do processo de iniciação à docência é aquele em que a análise “enfatiza os elementos sociais e culturais da profissão docente e no assumir deles por parte do professor principiante” (MARCELO GARCIA, 1999, p.114), entendido como o processo de socialização, no qual “seletivamente adquirem os valores e atitudes, os interesses, habilidades e conhecimento – em suma, a cultura – corrente nos grupos dos quais elas são ou pretendem se tornar membros” (MERTON, READER e KENDALL, 1957 apud LÜDKE, 1996, p.25). A socialização de professores em início de carreira com a cultura escolar representa, portanto, um momento de adaptação com a instituição de ensino e a sua cultura. A análise do processo de iniciação à carreira docente, do ponto de vista da socialização dos professores com os membros da escola, pode identificar diversas fontes de influência, tanto estruturais como pessoais, que determinam a adoção da “cultura de 196 ensino” por parte do professor principiante. Jordell (1984) indicou um modelo com quatro níveis de influência: dimensão social, de classe, pessoal e institucional. Lüdke (1996), em sua investigação sobre a socialização profissional de professores, conseguiu perceber a importância de um bom “clima institucional” para o desenvolvimento profissional dos professores participantes do estudo. Quase todos os nossos informantes atestaram a importância da ajuda que receberam dos colegas. [...] Na fase inicial parece ter sido fundamental a boa acolhida de uma diretora, a orientação espontânea dada por supervisoras, por colegas de escola [...] A própria escola foi percebida por alguns como desempenhando papel central nesta cena inaugural (LÜDKE, 1996, p. 39). A partir do estudo de Lüdke (1996) é possível perceber a importância que uma boa acolhida tem para o início da docência e o papel central que a escola exerce nesse período. Segundo Veenman (1988), a satisfação do trabalho pelos professores iniciantes está diretamente ligada ao apoio e à qualidade das relações desses professores com diretor e colegas de trabalho. Entretanto, alguns autores como Lima et al. (2007) são unânimes ao constatar que o professor, em início de carreira, não recebe apoio institucional. Há uma escassez de ações organizadas pela instituição que proporcionem ao professor principiante ajuda para sanar dúvidas e partilhar dificuldades. A análise feita por Gonçalves com as professoras dos anos iniciais permite a identificação dos primeiros anos de carreira ou os últimos como os piores. A causa de o final de carreira ser uma péssima fase a ver com a diferença e o mau comportamento dos alunos, o cansaço, o sentimento de rotina, o desinvestimento amargo, agravado às vezes por problemas de saúde. Contudo, o início da carreira é identificado como a fase mais negativa da vida profissional pela maioria das entrevistadas por Gonçalves, em vista da sua colocação profissional, local do trabalho; um outro apontamento das entrevistadas se refere ás condições de trabalho e um grupo significativo ainda apontou aspectos socioeconômicos dos alunos, a vida particular e a formação inicial. 197 Os alunos difíceis são geralmente relacionados ás dificuldades de aprendizagem e/ou ao mau comportamento. Os meios carenciados trazem, como consequência a falta de interesse dos pais, a escassa estrutura material, uma insuficiência de nutrição, de agasalho, etc. A vida particular exerce igualmente papel central no insucesso do início de carreira, como saúde, filhos, gravidez e horários. Além disso os professores mencionam a fraca formação e a falta de apoio pedagógico no início da carreira. Todos esses fatores, mais a dificuldades encontradas dentro do ambiente escolar, dito agora no nível institucional, desencadeiam conflitos muito significativos nos professores em início de carreira, e que merecem um estudo mais aprofundado desse assunto. Beach & Pearson (1998), ao estudarem o pensamento de estudantes candidatos a professores de um programa de formação inicial descobriram a emergência de 4 tipos fundamentais de conflitos. 1. Conflitos pessoais em suas relações com os estudantes, professores e administradores. 2. Conflitos relacionados às questões de ensino, que denominamos conflitos de instrução, onde os alunos não respondiam positivamente à instrução, como o professor previa. 3. Conflito entre o currículo da escola e o currículo do professor. 4. Conflitos de papel como professor, incluindo problemas com a ambiguidade da transição de estudante para professor. 5. Conflitos institucionais, expressos na expectativa com o programa da universidade ou então com as complexidades e políticas do sistema escolar e pressões para se socializar com a cultura das escolas e do ensino. Nesse sentido, Beach & Pearson (1998) sugeriram uma categorização de estratégias utilizadas pelos professores para enfrentarem os conflitos emergentes. 1. Estratégias de nível I caracterizam-se pela negação/recusa/afastamento dos conflitos, não levando aos questionamentos sobre as crenças. 198 2. Estratégias de nível II geram apenas soluções de curto prazo, procuram mudar fatores externos, entretanto estas estratégias de nível II levam a pouca interrogação de suas teorias pessoais ou sistemas de crenças. 3. Estratégias de nível III, envolvem a consideração e/ou implementação de mudança de longo prazo nas crenças. Ocorre o uso dessas estratégias quando os professores ganham mais consciência da complexidade do ensino e estão mais abertos a interrogar suas próprias percepções e teorias de ensino. Alguns estudos apontam a solidão e o isolamento como sentimentos que tomam conta do professor iniciante, sendo fruto de um sentimento de inexperiência e insegurança no início da carreira (MARIANO, 2005). O professor novato ao observar a realidade de seu trabalho, apoiando- se em suas crenças e desejos, pode desenvolver conflitos e/ou preocupações educacionais, especialmente em contextos que afrontem suas construções psíquicas (BEJARANO e CARVALHO, 2003). Tais conflitos podem ser entendidos como situações em que o professor não esperava encontrar ou que está em contradição com suas próprias crenças e expectativas do que é ser professor (QUADROS et al., 2006). Nestas situações muitas vezes o iniciante tende, mesmo que inconscientemente, a ver o professor experiente como um modelo, um espelho. Neste contexto, partindo do pressuposto que a profissão professor é eminentemente conflituosa e que os primeiros passos potencializam esses conflitos, a presente pesquisa busca relatar alguns dos principais conflitos vividos por alguns professores em início de carreira. 199 METODOLOGIA. A identificação de crenças individuais é um processo muito complexo. Discussões sobre pesquisas em crenças e motivação convergem para um mesmo consenso em que os processos de ensino-aprendizagem levam a estudar e compreender variáveis externas como a situação social e o contexto em que esses alunos estão inseridos. No presente trabalho serão realizadas técnicas de levantamento de dados por observação,. A observação é uma técnica que deve ser sistematicamente planejada, registrada e ligada ao contexto de levantamento de dados que está sendo realizado. O 199 sentido dessa técnica é trazer a realidade vivenciada por esses alunos por meio de gestos, atitudes simbólicas e verbais. Propomos investigar o problema através de um estudo de caso, com análise qualitativa dos dados. O estudo de caso é um estudo de natureza empírica que investiga um determinado fenômeno, geralmente contemporâneo, dentro de um contexto real de vida, quando as fronteiras entre o fenômeno e o contexto em que ele se insere não são claramente definidas. Trata-se de uma análise aprofundada de um ou mais objetos (casos), para que permita o seu amplo e detalhado conhecimento (GIL, 1996; BERTO; NAKANO, 2000). Seu objetivo é aprofundar o conhecimento acerca de um problema não suficientemente definido (MATTAR, 1996), visando estimular a compreensão, sugerir hipóteses e questões ou desenvolver a teoria. Propomos um estudo único e longitudinal e a coleta dos dados e resultados apresentados abaixo foi feito através das observações realizadas nas reuniões do PIBID. RESULTADOS E DISCUSSÕES. Os alunos do projeto desenvolveram uma atividade relacionada com o cálculo de área e perímetro e aplicaram essa atividade em duas escolas conveniadas com o IFSP/Araraquara, sendo essas escolas muito distintas em sua realidade, uma urbana e outra localizada em um assentamento rural nas proximidades da cidade de Araraquara, trabalhando com uma realidade e culturas bem distintas. Essa diferença entre as escolas acrescentou uma discussão muito mais produtiva quanto à observação. A atividade elaborada pelos licenciandos foi apresentar aos alunos o seguinte problema: "Nossa escola tem a necessidade de substituir o alambrado por um muro de dois metros de altura. A prefeitura municipal se prontificou a fazê-lo, porém cabe a nós alunos calcularmos o custo do mesmo. Planeje o procedimento necessário para a execução da obra." 200 Na bancada ao lado deles, foram colocadas algumas trenas de diferentes tamanhos e algumas réguas graduadas. Também foram cortados três barbantes iguais, medindo 5,30 cm cada. Cada grupo ficou com um pedaço de barbante que seria utilizado para a medição da escola, a trena só auxiliaria para medir espaços menores ou que o barbante não daria para medir. A régua não auxiliou nas medidas, apenas para fazer desenhos geométricos na hora da resolução dos exercícios. Foi fornecido aos alunos o preço de três tipos de tijolos com suas dimensões e preços, conforme a tabela 1. Tabela 1- preço de três tipos de tijolos com suas dimensões e preços Tijolo Dimensões (cm) Preço (R$) Tijolo de Cerâmica 11x14x24 1,00 Bloco de Concreto 10x20x40 2,30 Tijolo Comum 11x7x23 0,60 A ideia principal da atividade foi contextualizar os conceitos de área e perímetro entre os alunos com algo próximo a eles. No caso, o muro é algo que faria com que eles mesmos fizessem as medições e chegassem a resultados importantes. Além disso, os alunos dessa escola são da área rural, sendo o trabalho de pequenas construções como cercas e muros algo normal na sua vida cotidiana. Dessa forma, pretendíamos atender ao quesito que a tarefa fosse familiar por um lado, pois era algo normal de ser visto na realidade do aluno e, provavelmente, muitos deles já se envolveram na tarefa de ajudar um parente no conserto ou construção de algo. Por outro lado era não usual, pois exigia medidas usando um instrumento não comum para esta tarefa, como um pedaço de barbante, que envolvia uma reflexão sobre o ato de medir e conversão de unidades, além do uso de operações básicas e dos conceitos de área e perímetro. 201 Os licenciandos foram divididos em duplas e cada dupla acampanhou um grupo de três alunos durante a realização dasa atividades. Cada bolsista carregava consigo um “diário de bordo” onde deveria anotar sua observações e reflaxões in loco. Após a realização das atividades, cada licenciando deveria preparar uma narração sobre a atividade a apresentá-la a todo o grupo PIBID em uma reunião marcada para este fim. Após a apresentação das narrações, houve um debate sobre as conclusões por eles apresentadas. Num primeiro momento, todos se mostraram entusiasmados com o resultado da atividade. Ressaltaram a grande participação e interesse dos alunos por aquela atividade que destoava do cotidiano da sala de aula. Porém, quando nos aprofundávamos na descrição de como havia sido o transcorrer da atividade, mostraram descontentamento com a dificuldade dos alunos em fazerem os cálculos de operações básicas e de alguns conceitos elementares da matemática. Acusavam o insucesso da escola em ensinar ou responsabilizavam os alunos pelo mal desempenho em cálculos que no entender deles já deveriam ser de domínio dos alunos. O interessante, é que ressaltavam a maneira como os alunos intereagiam entre si e com eles próprios na superação das dificuldades, mas isso não bastava para superar o descontentamento com os resultados da sala de aula. Como professores iniciantes, valorizaram mais o desempenho pontual do que o processo de ensino/aprendizagem. Algum tempo depois dessa experiência, a escola elaborou um simulado de questões objetivas preparatório para o Saresp em que havia questões sobre área e perímetro. A supervisora (professora da rede pública de ensino e participante do grupo PIBID) teve o cuidado de separar o resultado do desempenho dos alunos da sala trabalhada especificamente nas questões que envolveram este tema. Aqui, percebemos novamente a frustação dos licenciandos quanto ao desempenho dos alunos que, embora estivessem na média da escola, ainda não apresentavam o resultado que eles imaginavam que deveria haver depois do trabalho desenvolvido. Alguns chegaram a manifestar a necessidade do retorno do tema da aula naquela sala, mas desta vez trabalhada com “mais rigor” de modo tradicional e com mais exercícios objetivos, além avaliações mais rígidas de forma a reconduzir alunos ruins ao “bom caminho”. 202 Ou seja, o reconhecimento do processo de ensino/aprendizagem durante a atividade, assim como trabalho de leitura de textos sobre educação e construção do conhecimento ou mesmo o próprio processo de construção das atividades não se mostraram suficientes para a superação das crenças docentes sobre a valorização do desempenho em detrimento da aprendizagem. CONSIDERAÇÕES FINAIS Após a análise feita mediante a observação, temos como conclusão que os alunos participantes do PIBID mostram as crenças docentes típicas dos professors iniciantes. Na verdade este resultado já era esperado, pois estas crenças são desenvolvidas na sua vivência escolar enquanto alunos, como mostram as literaturas sobre o tema. Tais crenças, em especial aquela em que a culpa do insucesso da aprendizagem se deve apenas aos alunos que não se esforçam ou a escola que não avalia adequadamente, são reforçadas no ambiente escolar por cobranças de desempenho cada vez mais frequentes no sistema de ensino, tais como o Saresp, ENEM etc, que chegam a premiar ou desqualificar o trabalho do docente apenas baseados em avaliações pontuais. A prática da sala de aula acaba por se guiar por um treinamento objetivando resultados rápidos de desempenho para os quais prevalece a ideia de que o ensino pode ser planejado conforme uma racionalidade técnica, tal como se planeja a construção de um prédio. Em tais espaços não há tempo para se levar em consideração os processos individuais de construção do conhecimento, pois há pouca interação ente professores e alunos e as avaliações são sempre feitas por desempenho e de maneira homogênea. O único resultado possível de tais avaliações são se o grupo de alunos obtiveram o desempenho esperado ou não, diagnóstico que pouco contribui para o aperfeiçoamento do processo de ensino/ aprendizagem. Esperava-se que o trabalho feito num espaço privilegiado como o Pibid melhorasse a superação dessas crenças na medida em que as discussões sobre a literatura, o envolvimento na elaboração de práticas alternativas e a reflexão em sala de aula e fora dela fossem acontecendo. Porém, notamos que a despeito de percebemos 203 algum avanço nas reflexões, a resistência a mudança dessas crenças foi maior do que o esperado. Não conseguimos provocar de maneira ampla um desequilíbrio cognitivo de forma a que reavalissem seu papel de professor de maneira profunda. Quando confrontados com a realidade retornavam ao seu discurso antigo. Desta forma a proposta presente em vários trabalhos que tais crenças poderiam ser confrontadas ou até mesmo superadas em uma prática reflexiva num ambiente de baixo risco nas quais os licenciandos teriam contato com alternativas fundamentadas teoricamente parece ser apenas uma parte da verdade, uma condição necessária mas não suficiente. Resta como proposta para futuras pesquisas elaborar dinâmicas de práticas reflexivas que aumentassem a chance do aparecimento do conflito cognitivo a respeito dos valores docentes tradicionais. Tais dinâmicas teriam de ir além da simples apresentação de propostas alternativas ou do trabalho prático e sistemático em sala de aula, já que a vivência destas propostas estão aquém das necessidades para superação destas crenças. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABRAHÃO, M. H. V. Metodologia na investigação das crenças. In: BARCELOS, A. M. F.; ABRAHÃO, M. H. V. (Orgs.). Crenças e ensino de línguas: foco no professor, no aluno e na formação de professores. 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O curso de formação continuada intitulado “Resolução de Problemas com Números Inteiros Por Meio de Jogos", foi inspirado nos estudos de Bryant et al (2012) e discutiu diversos tipos de jogos para a introdução dos números negativos e de operações com inteiros. A investigação se caracteriza como qualitativa na visão de Bogdan & Biklen (1994) e a análise dos dados é interpretativa. A fundamentação teórica quanto ao processo reflexivo está em Schön (1988). Os estudos de Zabala (1998) nos auxiliam na observação e na análise da prática pedagógica. A pesquisa se desenvolve em três fases interligadas: análise documental, acompanhamento da participação do sujeito na formação continuada e observação da prática de sala de aula, nesta última fase foram feitas entrevistas, uma inicial e outra final. As atividades discutidas no âmbito do projeto foram adaptadas pela professora e aplicadas em classe. Neste texto analisamos um episódio de aula, no qual a professora, por meio do jogo “Perdas e Ganhos”, iniciou discussão sobre números positivos e negativos. A partir de análises iniciais, pudemos concluir que a formação continuada possibilitou à professora conhecer, confiar e utilizar a metodologia de resolução de problemas ao iniciar um conteúdo matemático novo para seus alunos, no caso, operações com números inteiros. Palavras-Chave: Ensino de Matemática; Formação Continuada de Professores de Matemática; Números Inteiros 207 Introdução A pesquisa discutida nesse artigo está inserida em um projeto maior de formação e pesquisa no âmbito do Programa Observatório da Educação (OBEDUC)i, intitulado “Educação Continuada do Professor de Matemática do Ensino Médio: Núcleo de Investigações Sobre a Reconstrução da Prática Pedagógica”, aqui referido como “Projeto Observatório Práticas”ii. Para atingir seus objetivos, o Projeto Observatório Práticas estabeleceu, no ano de 2013, uma parceria com três diretorias de ensino da Secretaria Estadual do Estado de São Paulo (SEESP). A solicitação dessas diretorias de ensino foi que as formações a serem empreendidas no projeto envolvessem tanto os professores que lecionavam Matemática no Ensino Fundamental Anos Finais quanto os do Ensino Médio, e não apenas os desse último segmento como era a proposta do Projeto, uma vez que os professores licenciados em Matemática podem trabalhar nos dois segmentos dependendo da atribuição de aulas que ocorrem no início de cada ano. A demanda de formação foi sobre a resolução de problemas, portanto a formação continuada se deu por meio de cursos, um deles intitulado “Resolução de problemas com números inteiros por meio de jogos”. O Curso de formação foi inspirado nos estudos de Bryant et al (2012) desenvolvidos na Universidade de Oxford, Inglaterra, os quais abordaram a resolução de problemas utilizando jogos para introduzir números inteiros. Vale enfatizar que, entre os resultados desses estudos, consta que os professores ingleses estão cientes de algumas demandas dos alunos para se prepararem para resolver de problemas quantitativos com números inteiros, sendo uma delas a capacidade de decisão sobre a operação a ser aplicada e, também, saber como executar os cálculos. A Pesquisa No cenário acima descrito se coloca nossa pesquisa que tem por objetivo: “Compreender de que maneira uma professora de matemática do sexto ano do Ensino Fundamental, participante de um processo formativo, integra a metodologia de resolução de problemas em sua prática pedagógica”. Com a intenção de atingir o objetivo, a seguinte questão norteou a pesquisa: 208 De que maneira a professora utiliza em sua pratica pedagógica a metodologia de resolução de problemas para ensinar matemática no sexto ano do Ensino Fundamental? A investigação, de cunho qualitativo segundo Bogdan e Biklen (1994), se realiza em dois contextos: o da formação continuada e o escolar. No contexto da formação continuada, por acompanhamento de oito encontros do Projeto Observatório Práticas ocorridos no segundo semestre de 2013. No escolar por observação da prática da professora participante, que leciona no sexto ano, em uma escola da zona norte da cidade de São Paulo. O pseudônimo da professora será Sandra. Justificativa Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) consideram a resolução de problemas como uma estratégia para o ensino de Matemática, servindo como ponto de partida para a atividade Matemática, que deve ser utilizada ao longo de toda a Educação Básica. Contudo, salientam que essa estratégia vem sendo utilizado de forma equivocada, “todavia, tradicionalmente, os problemas não têm desempenhado seu verdadeiro papel no ensino, pois, na melhor das hipóteses, são utilizados apenas como forma de aplicação de conhecimentos adquiridos anteriormente pelos alunos.” (Brasil, 1998, p. 40). Pesquisas sobre resolução de problemas como às de Coelho (2005), Redling (2011) e Mengali (2011), que ocorreram vários anos depois desse alerta dos PCN, confirmam que a resolução de problemas ainda, em muitos casos, é vista como uma simples verificação de algoritmos e é utilizada após a formalização tradicional dos conteúdos. Assim sendo, enfatizamos a relevância em oferecer cursos de formação continuada nos quais os professores sejam estimulados a refletir sobre resolução de problemas como uma metodologia possível a ser utilizada no ensino de conteúdos matemáticos novos para os alunos. No processo formativo em questão, o foco foi em resolução de problemas sobre “Números Inteiros”. Os números inteiros estão presentes no dia a dia, como (-3ºC) indicando a temperatura, ou (-1) para o subsolo do elevador, entretanto os alunos encontram dificuldades na compreensão desses números e também ao operar com eles. 209 O Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo (SARESP) acusa em seu Relatório Pedagógico de 2011 (SÃO PAULO, 2012), que um grande percentual de alunos do 7º ano possuem domínio insuficiente em relação a esse conteúdo, ou seja, quanto às competências e habilidades a ele relacionadas, e classificados no nível de proficiência abaixo do básico. Como exemplo, a habilidade de resolver problemas que envolvem operações com números inteiro, segundo o referido Relatório Pedagógico de 2011, apresentou 38% de acertos (p.127), indicando a dificuldade dos alunos em compreender as operações e utilizá-las quando se deparam com um problema. A dificuldade do ensino e aprendizagem dos números inteiros espelha os obstáculos identificados na história para a construção desses números. Dissertações de mestrado, tais como as de Hillesheim (2013), Salgado (2011) e Bordin (2011), que abordam ensino de números inteiros, trazem um panorama histórico da construção desses números e enfatizam que, embora os números negativos remontem da época de Diofanto, esses números demoraram 1500 anos até serem rigorosamente definidos, dada a dificuldade em compreendê-los. Duarte (2013) enfatiza que, na Idade Média os números inteiros eram utilizados principalmente nas questões comerciais, com o sentido de débito e crédito, contudo não eram ainda aceitos como números. René Descartes (1596-1650), no século XVI definiu um sistema de coordenadas a partir de duas semi-retas opostas, obtendo um eixo que que vai do negativo para o positivo, estabelecendo uma representação para números negativos, entretanto, ele operava somente na parte positiva do plano (1º quadrante), o que pode ser um indicativo da insegurança em trabalhar com os negativos. Outros cientistas como Leonard Euler (1707-1783), tentaram explicar a regra de sinais dos números inteiros, mas suas explicações não foram convincentes. Foi somente no século XIX com Herman Hankel (1867), em "Teoria dos sistemas complexos" que os números inteiros foram definidos e apresentados com todo rigor matemático. Os obstáculos enfrentados ao longo da história nos alertam para a complexidade de ensinar números negativos para os nossos alunos. Salgado (2011), em sua pesquisa apresentou uma sequencia de ensino dos números inteiros com a utilização de calculadora e de jogos para o ensino desses números, argumentando que o jogo, “trabalha com um nível de imaginação que, 210 balizadas por determinadas regras, lhe possibilita transcender o real, contribuindo pra que desenvolva sua capacidade de abstração” (p. 69). Ele também alerta para os perigos de usá-los em sala de aula sem um objetivo definido. “quando os jogos são mal utilizados, existe o perigo de dar ao jogo um caráter puramente aleatório, tornando-se um “apêndice” em sala de aula; requer um tempo maior, por isso o professor deve tomar cuidado para não prejudicar outros conteúdos; a pressão do professor para que o aluno jogue o que provoca a destruição da voluntariedade pertencente à natureza do jogo” (Salgado, 2011, p. 70) Nas conclusões da pesquisa, o autor apontou para as possibilidades em auxiliar a aprendizagem, a partir da sequencia de ensino proposta, utilizando jogos e calculadora, além disso, verificou que as aulas ficaram mais dinamicas e atraentes para os alunos. Na próxima seção apresentamos o aporte teórico-metodológico da pesquisa. Fundamentação Teórico - Metodológica A pesquisa que subsidia este artigo teve por fundamento os estudos de Zabala (1998) para a observação e análise da prática pedagógica da professora. Para o autor, a configuração da prática educativa é determinada por vários fatores, entre os quais os parâmetros curriculares, características institucionais e organizativas, além de fatores como ideias, valores, hábitos pedagógicos dos professores, etc. Essas variáveis não podem ser vistas separadamente, pois o que acontece na aula só pode ser analisado na interação de todos os elementos da aula. Portanto, pesquisar sobre a prática requer uma observação constante. Para Zabala o conhecimento e a experiência auxiliam o professor a obter uma melhora na sua prática educativa. Geralmente se consegue esta melhora profissional mediante o conhecimento e a experiência: O conhecimento das variáveis que intervêm na prática e a experiência para dominá-las. A experiência, a nossa e a dos outros professores. O Conhecimento, aquele que provém das investigações, das experiências dos outros e de modelos, exemplos e propostas. (Zabala, 1998, p. 13) 211 Schön (1988) apresenta ideias do processo reflexivo na docência e considera que a reflexão não é apenas um processo psicológico individual, também estão envolvidos outros fatores como a experiência, valores, emoções, interesses pessoais entre outros. Schön considera essencialmente três dimensões da reflexão: a que ocorre na ação, a reflexão sobre-a-ação e a reflexão sobre a reflexão-na-ação. A reflexão na ação se caracteriza nas ações rotineiras, no pensamento prático é o fazer e pensar ao mesmo tempo em que o professor está atuando. Nesse processo o professor se apresenta mais maleável durante as interações da prática. Esse tipo de reflexão muitas vezes não favorece a formalização do conhecimento obtido nas interações com os alunos. A reflexão sobre a ação e a reflexão sobre a reflexão-na-ação ocorrem quando o professor se afasta da atividade docente podendo pensar nas situações que ocorreram durante a aula, por exemplo como o conteúdo foi trabalhado, nas relações professor aluno e nas mudanças que podem ser feitas para o aprimoramento de sua prática. Em relação à metodologia, a pesquisa tem caráter qualitativo, segundo Bogdan & Biklen (1994), pois, Os investigadores qualitativos (...) tentam compreender o processo mediante o qual as pessoas constroem significados e descrever em que consistem estes mesmos significados. Recorrem à observação empírica por considerarem que é em função de instâncias concretas do comportamento humano que se pode refletir com maior clareza e profundidade sobre a condição humana. (Bogdan & Biklen, 1994, p. 70). Para a coleta de dados, utilizamos a concepção de pesquisa naturalista de Bogdan & Biklen (1994) com coleta diretamente feita em campo, por meio de observação participante, aplicação de questionários, entrevista, entre outros instrumentos. Escolhemos a análise interpretativa dos dados, pois ela possibilita um caráter inclusivo, na visão de Hernández (2000), para o qual esse tipo de análise “está na compreensão do que acontece na classe”(p.40) levando-se em conta diversas váriaveis, como por exemplo regras, valores pessoais e sociais. 212 A pesquisa se desenvolveu em três fases interligadas: Primeira fase – documental: envolvendo estudos sobre PCN e a resolução de problemas como ferramenta pedagógica; o Currículo Oficial do Estado de São Paulo; o livro didático utilizado na escola onde a professora leciona e análise de atividades propostas pela professora (sujeito da pesquisa). Segunda fase – acompanhamento da participação do sujeito na formação continuada proposta no Projeto Observatório Práticas. Terceira fase – observação da sala de aula com o propósito de acompanhar a pratica durante e após os encontros de formação analisando a inserção da resolução de problemas como estratégia pedagógica no ensino dos conceitos matemáticos. Nessa fase também foi feita uma entrevista inicial, para levantar dados relevantes sobre as concepções da professora sobre a resolução de problemas como metodologia de ensino. Na sequência, relatamos uma aula dupla da Professora Sandra, que foram observadas no segundo semestre de 2013, nas quais ela utiliza o jogo, “Perdas e Ganhos”, que foi-lhe apresentado e analisado na formação continuada do Projeto Observatório Práticas. O jogo “Perdas e Ganhos” utilizado pela professora Sandra Iniciamos apresentando o jogo proposto no curso de formação e escolhido pela professora, denominado “Jogo de Perdas e Ganhos”. Em seguida descrevemos a utilização desse jogo na sala de aula e por último, discutimos como os alunos de uma classe de 6 ano participaram do jogo. Na formação continuada foram discutidos diversos problemas e jogos, baseados nos estudos de Bryant et al (2012) e também problemas e jogos de autores brasileiros. O Jogo em questão está publicado no livro didático do 7º ano de Imenes & Lellis (2012, p. 132), pode ser desenvolvido em duplas ou em grupos, e na sua confecção pode ser utilizado material reciclado. No início, cada participante deve possuir 10 fichas positivas, simbolizadas por tampinhas verdes e 10 fichas negativas, tampinhas vermelhas. A cada dupla ou grupo deve ser distribuído doze cartões com escritos, por exemplo, “perde 4 negativas” ou “ganha 3 positivas”, etc. 213 As cartas devem ficar com os comandos virados para baixo, cada jogador inicia a rodada com 6 tampinhas verdes e 6 tampinhas vermelhas, simbolizando o positivo e o negativo, a soma dos quais resulta em zero: , as demais fichas ficam reservadas. Na sua vez cada jogador sorteia uma carta, faz o que é pedido nela, colocando ou retirando tampinhas, registra o cálculo em uma folha e passa a vez para o próximo jogador. O final do jogo ocorre quando as cartas terminam e o vencedor é aquele que tem o maior resultado. Adaptação feita pela profa. Sandra A partir da observação e de relato feito pela professora, observamos que ela fez pequenas adaptações na abordagem pedagógica antes de aplicar o jogo aos seus alunos. Os alunos auxiliaram a professora a confeccionar o jogo. No caso, as fichas foram feitas em formato de círculos recortados em papel cartolina nas cores amarela, branca e rosa, e as cartas com os comandos foram feitas em folha de papel sulfite, recortadas e depois recobertas por plástico autoadesivo. Sandra organizou os alunos em duplas e entregou a eles um conjunto de 16 fichas amarelas, 16 fichas rosas ou brancas e 12 cartas com os comandos para cada dupla. A atividade do jogo foi desenvolvida em dupla, pois, segundo a professora isso proporciona melhor concentração ao jogar e auxilia a gerenciar a sala. Ela solicitou que os alunos registrassem em uma folha de papel sulfite os resultados das jogadas que foram feitas inicialmente de forma livre, como treino. Relato da aula na qual foi desenvolvido o jogo A atividade em questão foi desenvolvida em uma aula dupla (1h40min) e a professora iniciou conversando com os alunos informando que a atividade da aula seria um jogo. Solicitou que eles se sentassem em duplas, e distribuiu folhas de sulfite com as cartas de comando impressas e folhas de papel nas cores amarela, branca e rosa, pediu aos alunos auxilio na confecção dos jogos recortando as cartas e circulos, conforme a figura 1 e 2. 214 Figura 1: aluno confeccionando o jogo Figura 2: material confeccionado para o jogo Fonte: Acervo próprio Fonte: Acervo próprio Após a confecção do jogo a professora, definiu com toda turma que as fichas amarelas representariam os números positivos e as fichas brancas ou rosas estariam relacionadas aos números negativos. Entregou uma folha de sulfite em branco para cada aluno e informou que os registros das jogadas seriam individuais, que na primeira rodada o registro seria livre e depois ela iria inserir símbolos matemáticos para os registros das próximas rodadas. Explicou as regras do jogo fazendo uma jogada na lousa como exemplo e solicitou aos alunos que jogassem. Circulou pela sala auxiliando algumas duplas. Transcrevemos, a seguir, algumas interações entre a professora e as duplas de alunos. Professora: Negativo é essa ficha? Então o que a carta está falando? Aluna 1: Perde 3 negativos Professora: Então põe lá. Começou com zero, ela perdeu 3. Aluna 1: Agora é você. Aluna 2: Perde 5 negativas. Professora: Você tem 5 negativas? Aluna: Não Professora: Então você tem que acrescentar elas pra você tirar, o que você tem que fazer pra dar 5 negativas? Aluna 2: Acrescentar 2. Professora: Agora eu posso tirar? 215 Aluna 2: Pode. Professora: Então é assim que vocês tem que trabalhar. Percebe-se a mediação da professora, auxiliando os alunos, segundo Zabala (1998) é importante que o professor ofereça a ajuda necessária para que os alunos superarem os obstáculos, nesse caso a regra do jogo. Uma parte dessa rodada está na figura 3, na qual se pode observar uma carta que um aluno virou e as fichas retiradas. No caso as três fichas rosa (que representavam os negativos) Figura 3: alunos jogando Fonte: Acervo próprio Na primeira rodada, os alunos se confundiram com o registro no papel, com quais fichas deveriam colocar, ou tirar, que se após a jogada ficam sobre a mesa, por exemplo, duas fichas amarelas e duas rosa o resultado dos seus pontos é zero, etc. A maioria das duplas só conseguiu entender o jogo após a realização de uma rodada completa. Enquanto isso, a professora caminhava pela sala para atender as duplas e dizia “Difícil né?”. Observamos que em um determinado momento, nesta primeira rodada, ela orientou os alunos: Professora: Agora eu vou dar outra dica. Agora vou dar a parte da matemática. (Ela se vira pra câmera dizendo) “Ou deixo jogar mais uma vez? Tá complicado ainda né? Se volta pra sala e Fala: Não. Pode jogar mais uma rodada, que a próxima eu entro com a matemática. 216 Nesse momento foi possível constatar o que Schon considera a reflexão na ação, fazer e pensar enquanto atua, modificando a qualquer tempo a estratégia para promover a compreensão, nesse caso o jogo. Na segunda rodada, notamos que os alunos já estavam mais familiarizados com as regras e os registros, jogando com mais facilidade. A figura 4, apresenta o registro de uma aluna envolvida na segunda rodada do jogo. Nela é possível observar que a aluna registrou a jogada utilizando palavras e símbolos, sinais (+ e -), para ela o sinal positivo significa que ganhou e o sinal negativo que perdeu. Percebe-se que ela ainda não associa o sinal correto ao número inteiro positivo e ao negativo, este é um conhecimento novo para o grupo. Figura 4: registro de um aluno Fonte: Acervo próprio Fazendo a leitura da primeira linha temos: zero, início do jogo depois ganhou 4 negativos e perdeu 5 negativos. Nesse caso, a percepção sobre a equivalência entre, por exemplo, perder cinco negativos com ganhar cinco positivos, foi sendo estabelecida com o grupo de alunos a partir da mediação da docente ao longo da aula. Pouco antes do término da aula a professora, conversou com alunos e pediu para que todos prestassem atenção. Ela comunicou aos alunos que observou todas as mesas e que os registros estavam certos, entretanto considerou interessante que alguns dos alunos já usavam os sinais de (+ e -) no registro. Perguntou então para todos os alunos como ficaria perdi 4, em coro os alunos responderam, menos quatro (-4), depois ela perguntou ganhei 2 e os alunos 217 responderam novamente mais dois (+2). Na sequência, Sandra solicitou aos alunos que terminassem a rodada e iniciassem outra, mudando a forma de registro, dessa vez utilizando os sinais e não mais as palavras ganhou ou perdeu. Nesse momento, nos reportamos novamente a Zabala (1998), que alerta sobre a importância de considerar os aspectos positivos apresentados pelos alunos, criando assim um clima adequado e de confiança que propicia maior interesse na participação da atividade proposta. Com a aula se aproximando do final, a professora solicitou a atenção dos alunos e iniciou uma jogada, registrando os resultados na lousa, como se pode observar pela figura 5. Nesse momento, foi sistematizando a atividade, dizendo que o jogo começou com o zero, depois pediu para um aluno virar uma carta e registrou na lousa, depois pediu para outro aluno virar a carta e registrou novamente. Figura 5: registro da professora, para auxiliar os alunos a utilizarem os sinais Fonte: Acervo próprio Figura 6: registro de aluno com a utilização de números inteiros Fonte: Acervo próprio A professora solicitou aos alunos que tentassem, terminar essa quarta rodada utilizando apenas números e símbolos. Na figura 6 está o último registro de uma aluna após a explanação da professora. A seguir Sandra recolheu e guardou os jogos e a aula foi encerrada. Considerações Finais A professora usou o jogo para que os alunos começassem a compreender números inteiros. A proposta de jogo abordou estratégias para executar operações de adição com inteiros, de modo mais significativo para o aluno e não simplesmente 218 decorando algoritmos. Além disso, o jogo foi inserido de modo a auxiliar o aluno principalmente a construir o conceito de número negativo e a compreender o significado do oposto de um negativo, por exemplo, – (-5). As análises preliminares das observações da sala de aula, nos auxiliaram a compreender de que maneira a professora iniciou o ensino de um conhecimento matemáticos novo para os alunos com a utilização de jogo, a mediação feita e a gestão da sala de aula. A professora claramente tinha uma intenção pedagógica, ou seja um objetivo ao aplicar o jogo, o que é fundamental ao usar jogos no ensino de matemática, como registrou Salgado. Seu objetivo com a atividade, era formalizar a escrita dos números inteiros, e verificar se os alunos perceberiam a regra de sinais, uma vez que, no comando das cartas, a escrita da expressão numérica utilizava parênteses para depois mudar o sinal conforme a operação, por exemplo perde 3 negativas –(-3), mas ela não evidenciou para os alunos a sua intenção, foi aproveitando as oportunidades surgidas ao longo das jogadas. A professora usou a confecção do jogo em sala como estratégia para que os alunos se sentissem mais inseridos na atividade. Consideramos essa estratégia eficaz, pois os alunos puderam explorar as peças antes do jogo. No caso havia uma variável a ser considerada, a professora utilizava sobras de cartolina e não tinha material suficiente para confeccionar todas as fichas correspondentes aos números negativos da mesma cor então utilizou as cores branco ou rosa. Assim, manipular as peças e os cartões, ler o que cada um tinha escrito e, enfim, participar da confecção do material auxiliou os alunos na sensação de pertencimento, quando as jogadas foram iniciadas. Verificamos que Sandra ao atender as duplas, além de auxiliá-las com relação as regras do jogo e manipulação das peças, introduziu os conceitos matemáticos respeitando os conhecimentos prévios dos alunos e partindo deles. Para algumas duplas ela apresentou o número inteiro, mas os alunos continuaram se apoiando na escrita do perde ou ganha, entretanto, para as duplas que já haviam percebido que se pode registrar somente com números e sinais ela auxiliou a formalização da escrita da expressão. Verificamos a intenção pedagógica da professora, de que todos os alunos tivessem o mesmo conhecimento e consequentemente montassem a expressão com o 219 rigor matemático, especialmente quando ela sistematiza na lousa a jogada mostrando o registro na forma da expressão numérica. Observamos a reflexão na prática, quando a professora fica em dúvida no momento de inserir os sinais matemáticos, quanto à formalização da escrita dos números inteiros logo na primeira jogada, decidindo que os alunos registrassem livremente até compreenderem completamente as regras de funcionamento do jogo. Analisando o protocolo de observação, concluímos que a professora está num processo de reflexivo o que pode provocar mudanças na prática pedagógica. Embora a aula seja centrada na figura da professora, o jogo proporcionou vários momentos nos quais os alunos foram protagonistas, e administraram sua própria atividade, principalmente com relação aos registros. Ainda que a professora indicasse a utilização de números e sinais para anotarem a jogada, diversos alunos continuaram registrando por palavras e a professora respeitou a expressão do raciocínio apresentado por eles. Constatamos também o interesse dos alunos em participar de atividade diferenciada do cotidiano da sala de aula e verificamos que os alunos vivenciaram a exploração dos números inteiros e experimentaram a operação com esse conjunto numérico. Vale ressaltar que a turma é de 6º ano e o conteúdo de números inteiros só está na programação do 7º ano. Referências BOGDAN, R., & Biklen, S. Investigação Qualitativa em educação: uma introdução á teoria e aos métodos. Porto: Porto Editora, 1994. BORDIN, L. M. Os Materiais Manipuláveis E Os Jogos Pedagógicos Como Facilitadores Do Processo De Ensino E Aprendizagem Das Operações Com Números Inteiros . Santa Maria – RS, 2011. BRASIL, Secretaria de Educação Fundamental. Parametros Curriculares Nacionais: Matemática. 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Na curiosidade de uma análise mais rígida sobre essas narrativas no ensino de matemática surgiu o seguinte questionamento: “Como as narrativas de professores dentro de um grupo colaborativo de pesquisa contribui para melhor compreensão e entendimento do ensino e aprendizagem na educação matemática?” Com o objetivo de buscar contribuições significativas para o trabalho com narrativas que estes professores apresentam dentro do Grupo e refletir sobre o contexto de ensino bem como a própria prática docente, buscou-se dentro de uma abordagem qualitativa uma revisão bibliográfica sobre o contexto de colaboração e narrativas para melhor entendimento e compreensão do assunto, e na metodologia de Bardin (2008) os recursos metodológicos da análise de conteúdo. Como dentro de um Grupo Colaborativo de pesquisa em que professores narram suas experiências em sala de aula é possível obter várias contribuições significativas, é importante a análise e reflexão deste processo, tanto como pesquisador, como narrador e como professor que pesquisa, visando aprimorar e melhorar sua prática docente. Assim, apresentamos algumas considerações sobre este trabalho com narrativas de professores desenvolvido no Grupo, buscando contribuições no processo de ensino de Matemática. Palavras-chave: Ensino de Matemática, Grupo Colaborativo, Narrativas. 222 Introdução O presente artigo aborda o trabalho de um Grupo Colaborativo de pesquisa na Universidade Cruzeiro do Sul, campus da Liberdade em São Paulo, alocado no âmbito do Programa Observatório da Educação, que conta com a participação de professores dos anos iniciais e final do Ensino Fundamental, mestrandos e doutorandos do Programa de Pós Graduação Stricto Sensu da Universidade e mestres e doutores. Este grupo foi constituído ao final do ano de 2010, e apresenta em seus encontros o trabalho que os professores desenvolvem em sala de aula, bem como, seus resultados e expectativas para um melhor ensino de matemática com base em pesquisas recentes na área. Como o trabalho é desenvolvido com um grupo de professores, alguns questionamentos sobre as narrativas das histórias que estes professores contavam, começaram a despertar a curiosidade sobre uma análise mais rígida no que diz respeito a essas narrativas no ensino de matemática. Primeiramente, foi desenvolvido a busca por embasamentos teóricos sobre o que vem a ser colaboração e o que vem a ser narrativa, e posteriormente a ponte entre esses dois contextos no ensino, com uma análise e reflexão dos resultados encontrados. Desta forma, esta pesquisa trabalha com a análise de conteúdo como metodologia para análise das narrativas, buscando em Bardin (2008) os recursos metodológicos. No contexto de buscar contribuições significativas para o trabalho com narrativas de professores dentro de um grupo colaborativo de pesquisa e refletir sobre este contexto de ensino, bem como a própria prática docente, coloca-se em questionamento “Como as narrativas de professores dentro de um grupo colaborativo de pesquisa contribui para melhor compreensão e entendimento do ensino e aprendizagem na educação matemática?”. Para responder essa pergunta busca-se uma revisão bibliográfica e na metodologia da análise de conteúdo os embasamentos necessários. 223 Embasamento Teórico De acordo com a definição do dicionário Aurélio (2009, p. 244). Colaboração é “o trabalho comum com uma ou mais pessoas; ajuda ou auxílio; artigo de jornal ou revista feito por pessoas estranha à redação; participação em obra literária, científica, etc”. Neste sentido, entende-se como uma forma de trabalho desenvolvida por mais de uma pessoa, ou seja, em que mais pessoas estão juntas na busca de alguma coisa, de algum objetivo comum. Sobretudo, a colaboração vem a ser um tema bem sucedido atualmente, principalmente nos últimos anos, encontrando bastante grupos que trabalham com pesquisa colaborativa, aprendizagem colaborativa, ensino colaborativo. Para Stwart (apud BOAVIDA, 2005), a colaboração envolve pessoas iguais em busca de um objetivo comum, uma relação em que pessoas são de contextos diferentes podendo uma utilizar a outra ou o contexto da outra para estudo, melhorando o ensino e a formação de professores em Universidades e Escolas. Dentro das Universidades e Escolas, com um número grande de pessoas, trabalhar com a colaboração pode envolver tanto o todo como parte significativa desse todo, e fazendo um trabalho de reflexão sobre a educação, visando à melhoria e qualidade no ensino. A colaboração contribui com resultados mais efetivos quando se tem uma aprendizagem conjunta, e que aceita participar de um grupo colaborativo de investigações, como sujeito dessa experiência conforme Larrosa (apud PONTE, SEGURADO e OLIVEIRA, 2003) está, portanto aberto para a própria transformação. A experiência de trabalhar em um contexto colaborativo de reflexões e investigações traz aos integrantes do grupo, a possibilidade de expor seu trabalho, suas dúvidas e seus objetivos como também de aprender com as narrativas e comentários de outros participantes do grupo. Um processo de aprendizagem constante de ensino e aprendizagem na busca da construção e reconstrução do conhecimento. Para Reason (apud BOAVIDA e PONTE, 2002), a investigação colaborativa atravessa uma série de passos lógicos com a identificação de questões, estabelecimento e implementação de um plano de ação e reflexão sobre a experiência. 224 Conforme Magalhaes, Rocha e Varizo (2011), o trabalho colaborativo exige negociação, um contínuo dar e receber, gerando novos conhecimentos, conhecimento do outro e de si mesmo. O estar juntos na busca dos objetivos e nas negociações do trabalho, onde os fatores de vontade de cada participante sejam determinantes para o processo. Para Hargreaves (apud BOAVIDA, 2005) o trabalho coletivo nem sempre representa colaboração, pois este é um princípio articulador e integrador da ação. Portanto, para formar um grupo colaborativo tem que existir um interesse comum entre as pessoas envolvidas e impulsionadas a investigar uma dada situação, que vise sempre o crescimento e desenvolvimento do grupo, podendo promover aprendizagem e construção de novos conhecimentos. Quando realizado o ensino colaborativo, consequentemente, a aprendizagem está vinculada a ele, já que o ato de ensinar envolve mais pessoas neste processo com o ato de aprender. Segundo Anna, Bittencourt e Olsson (apud BOLEMA, 2011) o ensino colaborativo por um lado, pode através das investigações, incentivar os docentes a refletirem sobre suas próprias práticas; e de outro lado colocar uma aproximação entre o universo acadêmico e as práticas escolares. Neste sentido, de grupo colaborativo visando um ensino colaborativo, as narrativas de professores podem ser trabalhadas dentro desses grupos com a finalidade de refletir sobre a prática docente buscando contribuições para o sistema educacional. Quando falamos em narrativas estamos além de tentando conhecer o narrador conhecer também os fatos vividos por eles. As histórias narradas dão ao pesquisador uma ideia e noção dos fatos, como também das pessoas que narram. A narrativa segundo o dicionário Aurélio (2009, p. 573) é definida como: “sf. 1. Narração (2). 2. Forma literária na qual se expõe uma série de fatos reais ou imaginários; conto, história”. Como esclarece Cunha (1997) “Inicialmente tínhamos a perspectiva de que as narrativas constituíam a mais fidedigna descrição dos fatos e era esta fidedignidade que estaria garantindo consistência à pesquisa. Logo nos apercebemos que as apreensões que constituem as 225 narrativas dos sujeitos são a sua representação da realidade e, como tal, estão prenhes de significados e reinterpretações”. Neste contexto, Bolivar (apud Cury 2010) faz a menção que a forma como as narrativas são contadas nos fazem compreender o sentido que os humanos dão aquilo que fazem. Quando o professor se torna o narrador, ele narra o que aconteceu em sua experiência, em sua prática, buscando na memória cada detalhe para contar sua história. Falar em narrativas de professores é envolver o ensino e aprendizagem, histórias narradas que contam das experiências, da prática, o que ensinou, como aprenderam, o que fez, como fez, onde fez. Narrar o seu trabalho docente, junto com sua vida e suas emoções. Larrosa (apud Marquesin e Passos, 2009) afirma que “a experiência envolve a narrativa e narrativamente cada um expõe sua experiência”. Os professores que narram suas experiências acabam expondo todo seu trabalho profissional, suas dificuldades, inseguranças. Com a intenção de que estas narrativas venham a ser expostas dentro do grupo colaborativo na forma de contribuir para o ensino, Marquesin e Passos (2009) argumentam que “Consideram-se as narrativas como objetos que podem criar oportunidades para que o professor examine a prática real de ensino, de forma a ampliar seus saberes e a melhorar sua própria prática por meio do trabalho colaborativo”. Tanto o narrador como o pesquisador, acaba aprendendo mais sobre o assunto em questão como a partir dele acabam descobrindo novas coisas. É importante falar de pesquisas que usam narrativas no sentido de entender e compreender melhor a educação como um todo em se falando de ensino e aprendizagem, como também, é a partir destas que podemos refletir sobre as práticas de ensino bem como ajudar o narrador no seu trabalho docente. Está é a principal intenção destas pesquisas que trabalham com narrativas na educação. Não só a transcrição dos fatos, mas uma contribuição significativa no ensino, em que o pesquisador usa destas falas para sua pesquisa e a partir delas um estudo que busca analisar formas de contribuições significativas para o trabalho docente. Dentro de um grupo colaborativo de pesquisa em que professores trabalham com narrativas é possível obter várias contribuições significativas, mas é fundamental a análise e reflexão deste processo, tanto como pesquisador, como narrador e 226 principalmente como professor que pesquisa, buscando aprimorar e melhorar sua prática para o ensino e aprendizagem. De fato em toda análise sabe-se o ponto de partida, mas não o resultado final. No entanto, o mais importante é o processo que se dá entre o começo da pesquisa e o resultado, toda a análise e reflexão feita neste período. Fiorentini (apud Oliveira e Passos, 2005) considera “A experiência investigativa, (...) pode ser comparada a uma viagem na qual se sabe o ponto de partida, mas não se sabe o ponto de chegada”. Metodologia de Pesquisa A análise de conteúdo é o método de análise apresentado no desenvolvimento desta pesquisa para exploração qualitativa das mensagens narradas, uma vez que, a análise de conteúdo ajuda a interpretar as mensagens buscando uma compreensão de significados, como também uma ponte entre o que se investiga e os textos que compõem a pesquisa. Segundo Bardin (2008, p. 33) “A análise de conteúdo é um conjunto de técnicas de análise das comunicações”, ou seja, toda forma de comunicação é possível de análise de conteúdo. Como o próprio texto apresenta, esta análise é feita em cima de produções. Nesta abordagem, encontra-se a linguagem como representante deste conteúdo. Assim, Bardin (2008, p. 45) argumenta que “a linguística e a análise de conteúdo tem o mesmo objeto: a linguagem”. Desta forma, explica que a linguística é a língua e que a análise do conteúdo é a fala. Quando feita está análise é também possível fazer uma divisão em unidades de informações que vão surgindo, no caso, do trabalho com narrativas, é possível ir separando as informações de mesma natureza para posteriormente reagrupar em categorias e desta ainda que possível reagrupar em categorias de temas. “Classificar os elementos em categorias impõe a investigação do que cada um deles tem um comum com outros”, (Bardin, 2008, p. 146). Deste modo, ao analisar as narrativas é possível classificar os elementos encontrados em cada uma em categorias de identificação do que cada um tem em comum com outro. No entanto, estas narrativas são histórias que contam experiências de vidas recheada e acompanhada de sentimentos que o ser humano coloca em suas ações. O 227 sentimento nas ações e nas narrativas, duas vertentes distintas, mas dentro do mesmo contexto, a primeira focando sua prática no ensino e a segunda que busca na memória o acontecido para narrar. Pesquisa das Narrativas Como os professores trazem suas experiências práticas para o Grupo, foi possível observar através de suas falas, “narrativas”, todo o trabalho que desenvolvem em sala de aula, bem como o resultado de cada processo. Inicialmente, alguns professores relataram o conteúdo proposto em suas aulas e depois como foi desenvolvida a aula. Selecionando alguns desses relatos para esse texto, a análise das narrativas direciona-se aos professores que trabalharam com o tema “Noção de Espaço” nos anos iniciais e finais do Ensino Fundamental. A atividade que estas professoras desenvolveram com seus alunos do primeiro ao sexto ano eram diagnósticas para verificar os conceitos iniciais que seus alunos tinham do assunto em questão. Neste sentido, a atividade contava com uma representação que os alunos faziam sobre a noção de espaço, tanto oral quanto em desenhos. De acordo com Pires, Curi e Campos (apud, Curi e Vece, 2013, p. 119) [...] as primeiras relações que a criança representa graficamente, são as de vizinhança, separação, ordem, entorno e continuidade; muito cedo, ela distingue figuras fechadas e abertas, diferencia interior e exterior de uma figura dada – noções topológicas. As chamadas relações projetivas são aquelas que vão permitir à criança, a constituição de uma Geometria, do espaço exterior e não mais a partir de um único ponto de referência – ela própria – mas a partir da coordenação de diferentes pontos de vista; desse modo, noções como por exemplo, na frente/atrás, à direita/à esquerda, deixam de ser absolutas e passam a ser relativas (na frente/atrás de quê?/quem? À direita/à esquerda de quê?/quem?) As professoras narraram o trabalho feito em sala de aula, apresentando os resultados obtidos em um primeiro momento. Nestas falas as professoras expressam a 228 importância de trabalhar atividades que envolvem a Geometria, assim como a noção de espaço, pois muitas vezes ficam presas ao livro didático, realizando atividades mecânicas que o livro propõe. Considerando a fala de uma dessas professoras, ela relata que percebe uma evolução na compreensão de seu aluno no que diz respeito à forma de comunicação com relação a posição ou trajeto de um objeto ou pessoa. Também argumenta a dificuldade das crianças quanto à localização e sua representação a partir de um ponto referencial. Em contrapartida, expressa a importância desse trabalho em que as crianças não são podadas para realizar essas atividades e sim direcionadas. Outra professora que também trabalhou este mesmo conteúdo de localização de espaço relata que alguns alunos têm dificuldades por desconhecer a terminologia adequada e não a utiliza, apresentando o que conhecem e não o que veem. Neste mesmo sentindo, também expressa que as crianças tem melhor apropriação das expressões “atrás” e “à frente” do que as expressões “direita” e “esquerda”. Finaliza narrando a necessidade de estudar e explorar esse tema da Geometria. Ao relatarem essas experiências da prática docente dentro do Grupo, todos os professores participantes dos encontros colocavam seu ponto de vista e seus conhecimentos sobre o assunto e em consenso procurávamos a melhor contribuição para as dúvidas e questionamentos surgidos. Nestas falas, foi possível observar não somente o trabalho realizado, mas também todo sentimento que cada professor coloca em suas ações, tanto de realização do trabalho, como em seus relatos. Observando as falas das duas professoras mencionadas, foi possível reconhecer que em ambos os relatos as professoras narram a importância de trabalhar atividades em que as crianças podem se expressar e não ficar presas as atividades que o livro didático propõe, como também, as dificuldades que as mesmas apresentam neste contexto de representação de espaço, seja por falta de conhecimento, ou tratamento que é dado a este contexto. 229 Considerações finais Neste contexto de trabalhar as narrativas dentro de um Grupo Colaborativo de Pesquisa desenvolve-se a formação continuada que deve ser dada ao professor que está em exercício na sala de aula, no quesito de refletir sobre sua prática e de outros, ao narrar ou escutar as histórias relatadas. Este processo de reflexão que é desenvolvido nesse grupo, busca contribuições significativas no processo de ensino de Matemática. Esse texto é apenas um recorte de dissertação de mestrado em andamento que vai analisar as vídeo filmagens realizadas num período de seis meses das atividades desenvolvidas pelo referido grupo nesse período. Referências BARDIN, L. Análise de Conteúdo. Lisboa: Edições 70, 2008. BOAVIDA, A. M. A argumentação em Matemática. Investigando o trabalho de duas professoras em contexto de colaboração. Tese de doutoramento. Universidade de Liboa, 2005. BOAVIDA, A. M.; PONTE, J. P. Investigação colaborativa: Potencialidades e problemas. In GTI (Org), Refletir e investigar sobre a prática profissional (pp.4355). Lisboa: APM, 2002. BOLEMA: Boletim de educação matemática = Mathematics educations bulletin. Universidade Estadual Paulista Campus de Rio Claro – Vol. 25, n. 41, dezembro, 2011. CUNHA, M. I. CONTA-ME AGORA! As narrativas como alternativas pedagógicas na pesquisa e no ensino. Ver. Fac. Educ. vol. 23 n. 1-2 São Paulo Jan./Dec. 1997. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-25551997000100010> Acesso em: 30 de dezembro 2013. CURI, E.; VECE, J. P. Relações espaciais: práticas educativas de professores que ensinam Matemática. São Paulo: Terracota Editora, 2013. CURY, F. G. Análise Narrativa em Trabalhos de História da Educação Matemática: algumas considerações. Bolema, Rio Claro – SP, v. 23, n. 35A, abr. 2010.. FERREIRA, Aurélio B. de Holanda. Mini Aurélio. 7 ed. Curitiba: Editora positivo, 2009. 230 MARQUESIN, D. F. B,; PASSOS, L. F. Narrativa Como Objeto de Estudo: Aportes Teóricos. Revista Múltiplas Leituras, v.2, n.2, p. 219-237, jul./dez. 2009. OLIVEIRA, R. M. M. A.; PASSOS, C. L. B. Investigando a contrução e aplicação e narrativas para o ensino de matemática na formação de professores. ProExUFSCar. Educação Matemática / n. 19, 2005. PONTE, J. P.; SEGURADO, M. I.; OLIVEIRA, H. CHAPTER 6. A collaborative project using narratives: What Happens when Pupils Work on Mathematical Investigations? A. Peter-Koop et al. (eds.), Collaboration in Teacher Education, 85-97. Kluwer Academic Publishers. Printed in the Netherlands, 2003. 231 INVESTIGANDO AS ZONAS DE UM PERFIL CONCEITUAL DE EQUAÇÃO PRESENTES NAS CONCEPÇÕES DE UM GRUPO DE PROFESSORES DE MATEMÁTICA NUM CURSO DE FORMAÇÃO CONTINUADA Etienne LAUTENSCHLAGER - UFABC – SP ([email protected]) Alessandro Jacques RIBEIRO – UFABC – SP ([email protected]) Resumo: No presente trabalho apresentamos e discutimos as zonas de um perfil conceitual de equação presentes nas concepções de um grupo de professores de matemática participante de um curso de formação continuada. Para esta discussão, desenvolvemos uma formação que priorizou o estudo, a análise e a discussão dos diferentes significados do conceito de equação, fundamentada na tese de doutoramento de um dos autores intitulada: "Equação e seus Multissignificados no Ensino de Matemática: contribuições de um estudo epistemológico". Partindo do pressuposto de que o conceito de equação é polissêmico, Ribeiro (2013) elaborou e categorizou algumas zonas preliminares de um perfil conceitual de equação: pragmática, geométrica, estrutural, processual e aplicacional. Com isso, nosso objetivo foi investigar se e quais destas zonas fazem parte das concepções dos professores de Matemática que participaram da formação. Dentre as conclusões podemos perceber que a maior parte dos registros analisados, a priori, parece privilegiar as zonas pragmática e aplicacional. Assim, apontamos algumas reflexões sobre a contribuição que uma abordagem baseada em perfis conceituais de equação, em ambientes de formação continuada de professores, poderá trazer ao ensino e a aprendizagem de matemática, mais especificamente ao ensino da álgebra. Vale destacar que o presente trabalho encontra-se vinculado a um projeto mais amplo, coordenado pelo Prof. Dr. Alessandro Jacques Ribeiro, intitulado: Conhecimento matemático para o ensino de álgebra: uma abordagem baseada em perfis conceituais. Tal projeto está sendo desenvolvido junto ao Programa de PósGraduação em Ensino, História e Filosofia das Ciências e Matemática (PEHFCM), bem como situa-se vinculado ao Centro de Matemática, Computação e Cognição (CMCC) da Universidade Federal do ABC. Ressaltamos que os resultados desta pesquisa contribuirão com o projeto mais amplo, uma vez que estes servirão de referenciais para a elaboração das atividades de intervenção que serão desenvolvidas nas demais fases do projeto. Palavras-chave: Equação, Formação Continuada, Educação Algébrica. 232 Introdução Este trabalho apresenta, analisa e caracteriza as zonas de um perfil conceitual de equação presentes nas atividades elaboradas pelos professores de matemática participantes de um curso de formação continuada, para o ensino das equações, destinadas a uma turma do 7º ano do Ensino Fundamental, tendo por objetivo principal investigar quais destas zonas emergem nos processos de ensino e de aprendizagem da Álgebra, mais especificamente no que se refere às equações. As análises e reflexões aqui apresentadas estão fundamentadas no trabalho de Ribeiro (2013), no qual, por intermédio do desenvolvimento de um estudo teórico identificou e categorizou algumas zonas que compõem um perfil conceitual de equação. A ideia de perfil conceitual foi desenvolvida por Mortimer (1994) e discute que conceitos polissêmicos, como o de átomo, por exemplo, permitem a elaboração de perfis conceituais. Os perfis conceituais são compostos de diferentes zonas que correspondem a diferentes formas pelas quais os indivíduos vêem, representam e dão significado ao mundo. As zonas são utilizadas pelas pessoas em diferentes contextos e podem conviver simultaneamente num mesmo indivíduo. Iniciaremos apresentando algumas pesquisas em Educação Algébrica que contribuíram para delinear os rumos deste trabalho. A seguir, apresentaremos as zonas de um perfil conceitual de equação conforme consta em Ribeiro (2013). Finalizaremos, exibindo e analisando as diferentes zonas de um perfil conceitual de equação evidenciadas nos relatos dos professores. Também apresentaremos as considerações e as reflexões finais já que pretendemos apontar algumas implicações para o ensino de matemática, bem como discutir os encaminhamentos que estão sendo levados a cabo como desdobramentos das reflexões aqui postas. Problemática Ao realizarmos uma breve pesquisa dos resultados das avaliações em Matemática do SAEB (Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica), ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio) e SARESP (Sistema de Avaliação de Rendimento 233 Escolar do Estado de São Paulo) notamos um quadro preocupante, com índices que indicam um resultado insatisfatório, reforçando a consideração (talvez equivocada) de que a Matemática é realmente muito difícil de compreender. Levando-se em conta a divulgação dos resultados da Prova Brasil/SAEB (2011), ainda que os índices apontem para um crescimento no desempenho dos estudantes, os quais obtiveram notas de 250,6 e de 273,6 – numa escala que vai até 400 – ao final dos Ensinos Fundamental e Médio, respectivamente, identifica-se uma grande lacuna na formação desses alunos em Matemática. No caso especifico da Álgebra, a partir dos resultados apresentados pelo Instituto de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), observa-se que os estudantes não dominam competências como (1) identificar um sistema de equações do 1º grau que expressa um problema; (2) resolver equações do 1º grau com uma incógnita; (3) resolver problemas que envolvam equação do 2º grau; (4) identificar a relação entre as representações algébrica e geométrica de um sistema de equações do 1º grau; (5) identificar, em um gráfico de função, o comportamento de crescimento/decrescimento; (6) identificar o gráfico de uma reta dada sua equação; dentre outras. Por vezes, observamos que isso ocorre em razão da postura que o professor de Matemática assume, transformando as aulas de Matemática em um processo árduo de aprendizagem (e consequentemente de ensino); desprovido de significados tanto para o aluno como também para o próprio professor, sendo assim, todo o processo de ensino e aprendizagem de Matemática fica reduzido ao mero procedimento de reproduzir os passos ou as técnicas ensinadas pelo mestre. Não podemos nos esquecer de que a forma que o professor trabalha estes conceitos e procedimentos algébricos pode estar dificultando ainda mais a sua aprendizagem, fazendo com que o aluno tenha verdadeiro horror à Matemática. (GIL & PORTANOVA, 2007). O baixo rendimento dos alunos nos remete diretamente a pensar na prática de ensino que é desenvolvida pelos professores de Matemática em sala de aula e também no quanto o papel do professor é importante para que realmente exista a construção do conhecimento. 234 Pesquisas como Ball (1990), Attorps (2003), Ribeiro (2007), Barbosa (2009), entre outros, indicam que muitos professores de matemática não possuem a compreensão conceitual de muitos tópicos de matemática elementar, e por isso, acaba por privilegiar em suas aulas o desenvolvimento de habilidades algorítmicas, a memorização de regras dando menor ou nenhuma atenção ao desenvolvimento do conhecimento conceitual. Numa perspectiva de superar tais deficiências, uma vez que a Álgebra, assim como a Matemática, pode ser mais e melhor explorada quando seus significados são articulados com outras áreas do conhecimento (KILPATRICK, HOYLES, SKOVSMOSE, 2005), a proposta do presente trabalho é, em linhas gerais, possibilitar a ampliação daqueles significados que se fazem presentes nas ideias, ações e discursos dos professores. Fundamentação Teórica Uma vez compreendido o caminho percorrido para a realização deste trabalho, passaremos à discussão das pesquisas que fundamentaram a organização de situações didáticas bem como a análise dos resultados obtidos. Em estudo anteriormente desenvolvido, identificou-se a existência de diferentes significados para o conceito de equação (RIBEIRO, 2007). Nesse trabalho de caráter teórico, o autor pôde observar, por meio de estudo epistemológico e didático, como diferentes povos, em diferentes épocas históricas, compreendiam e utilizavam o conceito de equação. Os resultados obtidos receberam o nome de Multissignificados de Equação (ver tabela 1). Características Intuitivo – Pragmático Equação concebida como noção intuitiva, ligada à ideia de igualdade entre duas quantidades. Utilização relacionada à resolução de problema de ordem prática originários de situações do dia a dia. Dedutivo– Geométrico Equação concebida como noção ligada às figuras geométricas, segmentos e curvas. Utilização relacionada às relações envolvendo cálculos e operações com segmentos, com medida de lados de figuras geométricas e 235 intersecção de curvas. Estrutural – Generalista Equação concebida como noção estrutural definida e com propriedades e características próprias, considerada por si própria e operando-se sobre ela. Utilização relacionada com a busca de soluções gerais para uma classe de equações de mesma natureza. Estrutural – Conjuntista Equação concebida dentro de uma visão estrutural, porém diretamente ligada à noção de conjunto. É vista como uma ferramenta para resolver problemas que envolvam relações entre conjuntos. Processual – Tecnicista Equação concebida como a sua própria resolução – os métodos e técnicas que são utilizadas para resolvê-la. Diferentemente dos estruturalistas, não enxergam a equação como um ente matemático. Axiomático– Postulacional Equação como noção da Matemática que não precisa ser definida, uma ideia a partir da qual outras ideias, matemáticas e não matemáticas são construídas. Utilizada no sentido de Noção Primitiva, como ponto, reta e plano na Geometria Euclidiana. Tabela 1: Multissignificados de Equação Fonte: Adaptado de Ribeiro (2008, p.112) Mortimer (1994) desenvolveu, em sua tese de doutorado, um modelo teórico denominado Perfil Conceitual. O perfil conceitual toma por base a idéia de perfil epistemológico de Bachelard. Na sua Filosofia do Não, Bachelard (1978) apresenta a noção de perfil epistemológico a partir da idéia de que os conceitos encontram-se, no seu curso de desenvolvimento, mais ou menos presos a alguns pontos de vistas filosóficos (animista, realista, empirista, racionalista) dependendo do seu estágio de maturidade. A noção de perfil conceitual proposta por Mortimer (1994) estabelece que um único conceito possa estar disperso entre vários tipos de pensamento filosófico e apresentar características ontológicas também diversas, assim, qualquer pessoa pode possuir mais de uma forma de compreensão da realidade, que poderá ser usada em contextos apropriados. As diferentes interpretações da realidade são compostas em 236 zonas, lado a lado, com características epistemológicas e ontológicas distintas. Assim, um mesmo conceito pode ser compreendido de várias formas diferentes, e estas diversas formas convivem em um mesmo indivíduo. A noção de perfil conceitual (Mortimer, 1994) compartilha algumas características com o perfil epistemológico (Bachelard, 1978), tais como a hierarquia entre diferentes zonas do perfil, sendo cada zona sucessiva caracterizada por conter categorias de análise com poder explanatório maior do que as anteriores. Assumindo o pressuposto de que o conceito de equação é polissêmico, Ribeiro (2013), relaciona as ideias apresentadas em Ribeiro (2007) com as de Mortimer (1994), objetivando identificar e categorizar algumas zonas que poderão compor um perfil conceitual de equação. Vale ressaltar que o modelo teórico Perfil Conceitual, desenvolvido por Mortimer (1994), vem sendo largamente empregado no Ensino de Ciências. De acordo com esse modelo, conceitos polissêmicos oportunizam a elaboração de perfis conceituais, os quais são compostos de diferentes zonas, que correspondem a diferentes formas de ver, representar e significar o mundo. Destarte, assumindo o pressuposto de que o conceito de equação é polissêmico, Ribeiro (2013) identifica e categoriza algumas zonas de um perfil conceitual de equação, utilizando-se de um jogo dialógico entre dados de estudos epistemológicos e ontológicos, o autor apresenta as zonas preliminares de um perfil conceitual (ver tabela 2). Categoria Breve descrição Categoria(s) originária(s) Pragmática Equação interpretada a partir de Pragmática. Intuitiva. problemas de ordem prática. Equação Axiomática. admitida como uma noção primitiva. Busca pela solução predominantemente aritmética. Geométrica Equação interpretada a partir de Geométrica. Dedutiva problemas geométricos. Busca pela solução predominantemente geométrica. Estrutural Equação interpretada a partir de sua Estrutural. Generalista. estrutura interna. Busca pela solução Tecnicista. 237 predominantemente algébrica. Processual Equação interpretada a partir de Processual. Tecnicista. processos de resolução. Busca pela Intuitiva. solução aritmética ou algébrica. Aplicacional Equação interpretada a partir de suas Pragmática. Conjuntista. aplicações. Busca pela solução Intuitiva. aritmética ou algébrica. Tabela 2: Zonas de um perfil conceitual de equação Fonte: RIBEIRO (2013, p.63) Apresentação e análise de alguns registros dos professores Os dados aqui apresentados são resultados, conforme dito acima, de uma formação continuada destinada aos professores de Matemática, com carga horária de 16 horas que foram distribuídas em quatro dias. A formação foi oferecida por uma instituição de ensino superior localizada na região do Alto Tietê – SP, onde se priorizou a realização de estudo, análise e discussão das diferentes concepções de Álgebra, presentes ou não na Proposta Curricular do Estado de São Paulo, sobretudo no que se refere mais especificamente das diferentes formas de ver e de tratar a noção de Equação, constituindo uma oportunidade de estudo e discussão sobre a construção de novos conhecimentos em trabalhos individuais e coletivos. Num primeiro momento, fizemos um levantamento para investigar as zonas de um perfil conceitual de equação e os conhecimentos dos sujeitos envolvidos no curso sobre os processos de ensino e aprendizagem da equação. Coletamos os dados para este estudo por meio dos seguintes instrumentos: questionários; registros escritos de observações colhidas nas sessões de formação, passando, em seguida, para a apresentação, discussão e estudo das categorias das zonas de um perfil conceitual de equação e finalizando com a análise dos dados e das discussões. Vale ressaltar que a maioria dos professores investigados julgou a equação como o conteúdo mais importante em álgebra. 238 A análise dos dados irá considerar uma abordagem com caráter qualitativo que visa apontar se e quais das zonas de um perfil conceitual de equação fazem parte do repertório dos professores que ensinam Matemática. Tem ainda o objetivo de levantar questionamentos e reflexões que auxiliem e possam subsidiar as futuras pesquisas do grupo envolvido no projeto mais amplo. Na intenção de ilustrar e de fundamentar a condição acima contemplada, apresentaremos, a seguir, dois momentos de uma mesma situação que foram apresentadas durante a formação. Figura 1 – Protocolo: Atividade Formação de Professores de Matemática Figura 2 – Protocolo (Resposta obtida do professor A) Figura 3 – Protocolo (Resposta obtida do professor B) As figuras 2 e 3 revelam no primeiro momento da formação, onde ainda não foram apresentadas as zonas de um perfil conceitual de equação, que os professores optam em utilizar situações de aprendizagem relacionadas à resolução de problema de ordem prática originários de situações do dia-a-dia, evidenciando as zonas pragmática e aplicacional. Tal fato, corrobora com as conclusões obtidas em Barbosa (2009): 239 “Percebemos em nossa pesquisa que a presença de diferentes significados de equação na imagem de conceito dos professores ainda é bastante limitada, estando muito vinculada à ideia do princípio de equivalência e principalmente a técnicas de resolução e à existência de incógnita”. (BARBOSA, 2009, p. 177, grifo nosso) Após realizarmos o estudo e a apresentação das zonas de um perfil conceitual de equação, e solicitarmos novamente aos professores participantes para que refizessem a situação 01 apresentada (ver figura 1) observamos uma maior diversificação das mesmas. Na figura 4 fica evidenciada a noção estrutural definida da equação, com propriedades e características próprias, evidenciando a categoria estrutural que no primeiro momento não havia aparecido em nenhum dos registros realizados pelos professores. Figura 4 – Protocolo (Resposta obtida do professor C) Considerações Finais Nestas considerações finais, apresentamos uma síntese das reflexões sobre os dados apresentados. Trazemos, ainda, nosso ponto de vista sobre os princípios que deveriam ser levados em conta para desenvolver um projeto de formação continuada de professores que ensinam Matemática, especialmente quando o objeto de discussão é a equação. Fundamentadas na pesquisa elaborada por Ribeiro (2013), organizamos uma intervenção em um curso de formação para professores que ensinam matemática. A partir da nossa intervenção, percebemos que os professores procuraram contemplar as 240 diferentes categorias das zonas de um perfil conceitual de equação, apresentando uma maior variedade de atividades e, em decorrência desse fato, também empregaram mais de um significado de equação, tendo o segundo relato revelado uma presença bem variada desses significados. Destarte, acreditamos que as diferentes categorias das zonas de um perfil conceitual de equação podem se constituir em um importante objeto de estudo para os professores que ensinam Matemática, já que observamos que quando houve a apropriação das diferentes zonas de um perfil conceitual de equação, os professores elaboraram novas atividades contemplando uma maior variedade das mesmas, possibilitando assim uma compreensão mais ampla e significativa da noção de equação aos seus alunos. Tendo em vista a comprovação da importância dessa Formação, em que proporcionamos o estudo de algumas pesquisas, além da troca de experiências e de discussões fundamentadas nos estudos realizados pelo grupo, este trabalho conclui pela relevância de promover espaços que favoreçam a discussão e o estudo sobre o tema. Vale ressaltar que, por vezes, tais pesquisas não chegam até o professor por vários fatores, dentre os quais citamos, por exemplo, a falta de tempo para que o docente possa pesquisar. Consideramos que os professores (re)construíram e ampliaram o conceito de equação após a apresentação e discussão das novas zonas para o perfil conceitual de equação. Referências ATTORPS, I (2003) Teachers’ images of the ‘equation’ concept. European Research in Mathematics Education, n.3. Disponível em <http://ermeweb.free.fr/cerme3/ groups/ tg1/ tg1_ list_html>. Acesso em: 15/12/06. BALL, D.L. e WILSON, S. (1990). Knowing the subject and learning to teach it: examining assumptions about becoming a mathematics teacher. ResearchReport N.C.R.T.E. BARBOSA, Y. O. Multisignificados de equação: uma investigação sobre as concepções de professores de Matemática. 2009. 196 f. Dissertação (Mestrado em Educação Matemática) – Universidade Bandeirante de São Paulo, São Paulo, 2009. 241 BACHELARD, G. A Filosofia do Não. Coleção Os Pensadores. Editora Abril Cultural: São Paulo. 1978. GIL, K.H. & PORTANOVA, R. Reflexões sobre as dificuldades dos alunos na aprendizagem de Álgebra. In Anais do IX Encontro Nacional de Educação Matemática, Belo Horizonte/MG, 2007, CD-ROM. KILPATRICK,J.et al. (Ed.) (2005). Meaning in mathematics education. New York: Springer. MORTIMER, E. F. Evolução do atomismo em sala de aula: mudanças de perfis conceituais. 1994. 281 f. Tese (Doutorado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1994. RIBEIRO, A. J. Equação e seus multisignificados no ensino de matemática: contribuições de um estudo epistemológico. 2007. 144 f. Tese (Doutorado em Educação Matemática) – Pontifícia Universidade Católica, São Paulo, 2007. ______________ Elaborando um perfil conceitual de equação: desdobramentos para o ensino e a aprendizagem de Matemática. Ciênc. educ. (Bauru), Bauru , v.19, n.1, 2013 . ______________ Multisignificados de Equação e o Ensino de Matemática: desafios e possibilidades. Blucher Acadêmico, São Paulo 2008. 242 FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE MATEMÁTICA- EVASÃO NOS CURSOS DE FORMAÇÃO CONTINUADA Gisele Dionísio Ferreira da Rocha - UFSCAR – SP ([email protected]) Wania Tedeschi – IFSP – SP ([email protected]) Resumo: Esta comunicação trata da relação entre a formação continuada de professores de matemática da rede estadual de ensino e os desdobramentos dessa formação para a prática docente. Discutimos aspectos que estão presentes no contexto do trabalho docente em relação aos cursos de formação continuada que são oferecidos/realizados pelos professores da rede pública estadual de São Paulo no âmbito da EFAP - Escola de Formação e Aperfeiçoamento dos Professores “Paulo Renato Souza” da qual traçamos um breve perfil e descrevemos sua origem. Verificamos um número significativo de não concluintes nos cursos de matemática oferecidos pela EFAP e diante disso propomos um estudo diagnóstico visando ao levantamento dos motivos dessa evasão do ponto de vista dos professores. Esse diagnóstico é parte de uma pesquisa de mestrado em andamento que objetiva conhecer os desdobramentos que a realização desses cursos traz para a prática docente dos professores de matemática e quais as possíveis contribuições para a melhoria da qualidade de ensino da matemática da escola básica. O que pudemos avaliar é que há pontos de insatisfação por parte dos professores com os modelos de formação continuada que lhe são oferecidos que apontam para a necessidade de uma formação em que os professores sejam ouvidos em suas demandas relativas à prática docente. O significado atribuído para os cursos de formação continuada nos parece apenas simbólico e funcional, pois ao menos os certificados que os professores obtêm são oficiais para progredir na carreira. Todavia, mesmo com essa contrapartida, muitos se evadem sendo este o nosso desafio para o encaminhamento da pesquisa. Palavras-chave: Formação continuada, evasão, EFAP. 243 Introdução Vida de professor não é fácil... Sempre indo de uma escola para outra, com correções e planejamentos a fazer, textos para estudar, cursos para realizar, dificuldades apresentadas pelos alunos que precisam encontrar o melhor caminho para saná-las, enfim o cotidiano do professor é repleto de deveres. Diante da complexidade da profissão docente e dos desafios de suas práticas, surge a necessidade constante de formação. Ao refletir sobre minha rotina e observar também a de meus colegas professores, resolvi ampliar meus conhecimentos sobre cursos de formação continuada que são oferecidos aos professores da rede estadual de educação de São Paulo. Muitas vezes, os professores não se interessam por formação, pois analisam estas atividades como perda de tempo, uma vez que não conseguem estabelecer relação e tão pouco encontrar soluções para suas aflições do dia-a-dia. IMBERNÓN (2010) analisa este fato como sendo consequência de um processo histórico sobre formação continuada: "Historicamente, os processos de formação foram realizados para dar solução a problemas genéricos, uniformes, padronizados. Tentava-se responder a problemas que se supunham comuns aos professores, os quais deveriam ser resolvidos mediante a solução dada pelos especialistas no processo de formação." (p.53) A formação continuada, nesse sentido, também parece despontar como uma política compensatória da deficitária formação inicial, quando na verdade deveria ser um “[...] meio de expansão cultural e de formação transdisciplinar” (GATTI, 1996, p.64). Ao mesmo tempo, a busca dos professores por cursos de formação continuada também têm ganhado ares de mera certificação, de treinamento e de distribuição de méritos aos professores com mais cursos, com mais participação em palestras, seminários, etc, isso tudo tendo como pano de fundo o individualismo, a competitividade e a possibilidade de manter sua classificação na unidade escolar. 244 No plano oposto a essas características, IMBERNÓN (2010), indica que na formação continuada é necessário abandonar o individualismo docente para se chegar ao trabalho colaborativo. Segundo o autor existem duas formas que podem ajudar a romper com esse individualismo: Realizando uma formação colaborativa do grupo docente com o compromisso e a responsabilidade coletiva, com interdependência de metas para transformar a instituição educacional em um lugar de formação continuada, como um processo comunicativo compartilhado, para aumentar o conhecimento profissional pedagógico e a autonomia (autonomia participativa e não consentida)... Desenvolvendo uma formação continuada em que a metodologia de trabalho e o clima afetivo sejam os pilares do trabalho colaborativo. Um clima e uma metodologia de formação que coloquem os professores em situações de identificação, de participação, de aceitação de críticas e de discrepância, suscitando a criatividade e a capacidade de regulação. (p.64) Porto (2000) em um estudo sobre as diferentes modalidades de formação e suas relações com a prática pedagógica enfatiza que a educação é um prática social estruturada sob um novo tempo, repleto de mudanças sociais e tecnológicas que impõem novas exigências. Diante dos dilemas que o professor vivencia na sociedade contemporânea, faz-se necessário que ele esteja em constante formação. (...) a formação continuada é importante condição de mudança das práticas pedagógicas, entendida a primeira, fundamentalmente, como processo crescente de autonomia do professor e da unidade escolar, e a segunda, como processo de pensar-fazer dos agentes educativos e em particular dos professores, com o propósito de concretizar o objetivo educativo da escola. (p.15) Sendo assim encontramos pistas para pensar que a participação dos professores em cursos de formação continuada possa refletir em mudanças significativas em sua 245 prática, embora também possa ocorrer o contrário, pois isso depende da proposta envolta nos cursos que estão sendo oferecidos. Para que haja mudança na prática do professor é necessário que seja uma formação que se dê de forma contínua, capaz de articular os diferentes aspectos da profissão do professor, pois conforme CANDAU (2007): A formação continuada não pode ser concebida como meio de acumulação ( de cursos, palestras, seminários, etc. , de conhecimentos ou técnicas), mas sim através de um trabalho de reflexividade crítica sobre as práticas e de (re) construção permanente de uma identidade pessoal e profissional, em interação mútua. (p.64) Para IMBÉRNON (1999), é preciso analisar o que funciona na formação continuada, o que devemos abandonar, o que temos de desaprender, o que é preciso construir de novo ou reciclar sobre o velho. Segundo ele, somente quando os professores constatam que o novo programa formativo ou as possíveis mudanças que a prática oferece repercutirão na aprendizagem de seus alunos, mudarão suas crenças e atitudes de maneira significativa, supondo um benefício para os estudantes e para a atividade docente. Promover mudanças nas estruturas dos cursos de formação continuada é um processo complexo. Garantir à formação continuada espaço de reflexão para o professor faz com que a capacidade profissional dos professores não termine na formação técnica, mas avance pela ação pedagógica. Quadro Legislativo A formação continuada se faz direito previsto em Lei (BRASIL, LDB 9394/96) que tem por finalidade assegurar aos profissionais da educação o aperfeiçoamento da profissão por meio da intervenção institucional pública (municipal ou estadual), como regem os artigos: Artigo 87 (das disposições transitórias) - Cada município e supletivamente, o Estado e a União, deverá: 246 Parágrafo III - realizar programas de capacitação para todos os professores em exercício, utilizando também para isso, os recursos da educação a distância. Artigo 67 (dos profissionais da educação) - Os sistemas de ensino promoverão a valorização dos profissionais da educação, assegurando-lhes, inclusive nos termos dos estatutos e dos planos de carreira do magistério público: Parágrafo II- aperfeiçoamento profissional continuado, inclusive com licenciamento periódico remunerado para esse fim. Essa garantia fortalece a ideia que as políticas educacionais estaduais devem priorizar qualitativamente o aperfeiçoamento dos docentes, definindo linhas de ações específicas voltadas às carências apresentadas pelo professores. A atuação de políticas educacionais direcionadas ao suprimento de carências formativas encontra-se como obrigação prevista também nos Referenciais para Formação de Professores (BRASIL, 1999) que versa: (...) A formação continuada deve propiciar atualizações, aprofundamento das temáticas educacionais e apoiar-se numa reflexão sobre a prática educativa, promovendo um processo constante de auto-avaliação que oriente a construção contínua de competências profissionais. (p.70) Ficam, portanto alguns questionamentos: Concordar que a formação inicial para professor não consegue atualmente acompanhar as mudanças sociais, tecnológicas, parece consenso, porém, quando em situações de formação continuada, ou em serviço, as diversidades e especificidades locais são consideradas? Os professores são consultados para um levantamento de suas necessidades e ou expectativas? Ouvir os profissionais que interagem no cotidiano, os alunos, e a comunidade, compõe a formação continuada? 247 Formação continuada na concepção da Secretaria Estadual de Educação de São Paulo (SEE-SP) Com o intuito de contribuir com a melhoria da qualidade do ensino público paulista, foi criado em 2009 a EFAP, Escola de Formação e Aperfeiçoamento dos Professores "Paulo Renato Costa Souza". Utilizando uma infraestrutura tecnológica composta por ambientes virtuais de aprendizagem, ferramentas de colaboração on-line e uma rede de videoconferências, a EFAP implementou e estruturou cursos com o foco no aperfeiçoamento e no desenvolvimento profissional dos servidores da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo. Ela oferece, desde então cursos de formação continuada aos 270 mil funcionários e professores da Secretaria da Educação, presentes nos órgãos centrais e vinculados, em 91 Diretorias de Ensino e em 5.300 escolas. Os cursos da EFAP combinam ensino a distância, por meio do sistema de videoconferência da Rede do Saber e ambientes virtuais de aprendizagem, com atividades presenciais e em serviço. De acordo com o artigo 10 §1º e 2º do decreto nº 56.460 de 30 de novembro de 2010, entende-se por curso presencial, o que ocorre inteiramente com a presença dos participantes e do professor em local específico e por cursos a distância, os que ocorrem, no todo ou em parte, em ambientes virtuais de aprendizagem. Na formação continuada, existe uma diversidade de cursos de formação que visam atender as necessidades dos professores. Destes cursos, os oferecidos pelos órgãos oficiais das secretarias de educação representam a grande maioria. Um dos objetivos da formação continuada é capacitar o professor para as exigências feitas aos docentes na escola. Por formação continuada do professor entendem-se os processos que acontecem em situações específicas, após a formação inicial, ou seja, aquela desenvolvida depois da graduação. Muitos são os nomes que se atribuem para a formação do professor: formação continuada, formação permanente, capacitação de professores, entre outros, o fato é que os objetivos traçados para cada um deles difere segundo a modalidade, as atividades desenvolvidas e o tempo de duração. 248 A investigação diagnóstica O problema a ser estudado está delimitado em função dos altos índices de evasão dos professores de matemática nos cursos de formação continuada e como esta interfere na melhoria da ação docente. Em decorrência desse panorama, selecionamos alguns professores de matemática da rede estadual de educação de São Paulo e, a partir de um roteiro fizemos algumas perguntas com o objetivo de que estes avaliassem e apontassem, a partir de suas experiências e considerando os cursos de formação continuada que os mesmos já realizaram no âmbito da SEE-SP, o que consideram as principais causas de evasão desses cursos. Os sujeitos participantes da investigação Selecionamos cinco professores de matemática da rede estadual de educação da Escola Estadual Prof. “Octacílio Alves de Almeida”, situada na periferia do município de São José do Rio Preto- SP. A escola atende alunos desde o 3º ano do Ensino Fundamental até o 3º ano do Ensino Médio, conta com 12 salas de aulas acolhendo aproximadamente 800 alunos distribuídos nos períodos matutino e vespertino. A escolha por esta escola se deu pelo fato da pesquisadora ser coordenadora pedagógica nesta unidade e principalmente por vivenciar diariamente as queixas e anseios apresentados pelos docentes. Dos cinco professores participantes, quatro são efetivos na escola e um é professor eventual com aulas atribuídas em caráter de substituição por tempo indeterminado. Para a escolha dos professores, valemo-nos do fato de todos eles já terem participado de cursos de formação continuada oferecidos pela EFAP e estarem dispostos a contribuir com a investigação. 249 Entrevista Semiestruturada Para a obtenção das informações utilizamos a entrevista semiestruturada. A entrevista foi um importante instrumento para a coleta de dados. Ela nos remete à ideia de profundidade, na qual é possível iniciar a conversa sem formalidades, permitindo que o sujeito participante sinta-se à vontade. TRIVINÕS (1987, p.145) diz que “a entrevista semiestruturada é um dos principais meios que o investigador tem para realizar a coleta de dados”, pois nas entrevistas semiestruturadas, os questionamentos realizados são mais objetivos, isto é, mais específicos, mas é permitido que o entrevistado responda de forma livre, com seus próprios termos já que a fala é do entrevistado, não limitando ou interpretando suas respostas, é possível que na entrevista o entrevistador conduza-a de forma mista, em momentos estruturados e não estruturados. Durante toda a entrevista seguimos um roteiro pré-estabelecido. 1) Relate sobre sua trajetória até o cargo de professor de matemática da E.E. Prof. “Octacílio Alves de Almeida” 2) Relate sobre os cursos de formação continuada oferecidos pela EFAP dos quais participou. 3) Qual a relação entre os cursos de formação continuada e sua ação docente? 4) Dos cursos que participou quais você não concluiu? Por quê? 5) Quais são suas expectativas a respeito de um curso de formação continuada? 6) O que faria você ter concluído todos os cursos que participou? As respostas foram anotadas posteriormente a fim de que a entrevista acontecesse da maneira mais natural possível. Tomou-se o cuidado de fazer o registro logo depois do encontro para que o mínimo de informação fosse perdida, tentando preservar todos os elementos. A partir dos resultados encontrados, qualificamos informações procurando organizar as falas segundo os motivos apresentados para a evasão e como os sujeitos da pesquisa compreendem esses cursos para sua ação docente e desenvolvimento profissionais. 250 Análise das respostas e continuidade da pesquisa Os sujeitos da investigação relatam a importância da oferta de cursos de formação continuada pela secretaria estadual de educação. Cada um ressaltou, de modo diferenciado, suas expectativas quando se inscreveram em tais cursos. Ao serem abordados sobre as aprendizagens proporcionadas pelos cursos, fizeram uma reflexão sobre o que aprenderam, tendo como base sua formação inicial e conhecimentos anteriores, expressando uma visão singular quanto a importância que cada um atribui para sua atualização profissional. No que se refere à conclusão dos cursos de formação continuada nos quais se inscreveram, a maior justificativa apresentada para o abandono se resume ao conteúdo dos cursos não estarem adequados para que se coloque em prática em sala de aula com alunos. De acordo com o relato dos professores, a principal motivação para concluírem os cursos se apresenta em relação à certificação emitida, a qual se converte em pontos usados para sua evolução funcional. Das entrevistas realizadas, destacamos algumas falas que nos auxiliam a encaminhar os próximos passos da pesquisa: P1 - A formação tem contribuído, porém algumas vezes não há nada novo. Parece que estamos apenas relembrando. P2 - Eu percebo uma certa preocupação da rede em estar promovendo essas formações, porém nunca consegue agradar a todos, a rede é muito grande. A gente sempre espera uma coisa e o que a gente espera nunca chega. P3 - Critica-se tanto a formação inicial recebida nas universidades, mas a formação continuada acaba que reproduzindo o mesmo. Repassa-se a teoria não oportunizando ao professor momentos de reflexão sobre sua prática diária em sala de aula. P4 - Gostaria que após a realização dos cursos tivéssemos a oportunidade de colocar em prática o que aprendemos. Nos dedicamos para concluir os cursos e a nossa realidade 251 não permite que promovamos mudanças em nossa ação docente. Me sinto muito desmotivado. P5 - As formações deveriam ser sugeridas pelos professores. Nós conhecemos nossos problemas, nossos alunos. Desisti de vários cursos por falta de tempo. Com jornada completa fica difícil o professor se atualizar fora do horário de trabalho. Nas falas desses docentes, percebeu-se uma reação por vezes ambígua, como podemos notar na fala de P1 quando ao mesmo tempo em que afirma que há uma contribuição para a prática, relata a falta de novas estratégias. Para esses professores respondentes, o fato de ter participado de cursos de formação continuada, não significou que estes tenham contribuído para aplicação de novas metodologias em sala de aula. Esta desconexão entre teoria e prática, como citado por P3, impede que o professor tenha momentos de reflexão sobre sua prática e coloca em questão a eficácia de tais modelos de formação continuada. Essa desconexão reafirma uma prática reprodutora na formação docente e segundo FREIRE (1998) destrói elementos básicos de uma educação que se pretenda crítica e autônoma, nesse sentido o autor considera: “na formação permanente dos professores, o momento fundamental é o da reflexão crítica sobre a prática. É pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a próxima prática” (p.44) O discurso dos professores, entretanto é de que a formação continuada proposta pela EFAP emerge como atualização teórica e com a qual alguns corroboram. Na fala de P4 fica evidente o anseio pela atualização de conhecimentos para melhorar sua ação docente. Essa visão é chamada por IMBERNÓN (2010) como tradição na formação continuada, ou seja, consiste na atualização dos professores com vistas à ação prática. A formação continuada nesta perspectiva está isolada da prática reflexiva dos docentes no contexto amplo do seu trabalho. 252 IMBERNÓN (2010) coloca a necessidade da formação continuada para a reflexão prático-teórica sobre a própria prática. “[...] mediante a análise, a compreensão, a interpretação e a intervenção sobre a realidade, a capacidade do professor de gerar conhecimentos pedagógicos por meio da prática educativa.” A reflexão neste sentido é parte inerente da prática do professor, que emana da sua ação dotada de sentido e faz frente aos contextos em que seu trabalho está inserido. Entretanto, alguns docentes ainda pensam que a reflexão é algo externo a eles e que ela acontece mediante a um treinamento oferecido por uma escola de formação, não obstante a essa forma de conceber a reflexão, os professores ainda não se vêm como parte integrante deste processo de formação, como constatamos na fala de P5 quando afirma a necessidade das formações serem sugeridas pelos professores. Denota-se, portanto, que para os professores, a formação continuada tem mais a ver com as questões práticas da sala de aula do que com aquelas que nascem do campo teórico para depois refletirem no seu cotidiano escolar. Fica evidente a carência da reflexão prático-teórica nos momentos formativos destes professores. Temos assim um indício de que grande parte dos professores não se identifica com os cursos de formação por não conseguirem estabelecer a relação teoria-prática e por sentirem dificuldade em aplicar os conhecimentos adquiridos em seu cotidiano de sala de aula. O significado atribuído para os cursos de formação continuada nos parece apenas simbólico e funcional, pois ao menos os certificados que os professores obtêm são oficiais para progredir na carreira. Todavia, mesmo com essa contrapartida, muitos se evadem sendo este o nosso desafio para o encaminhamento da pesquisa. Em continuidade, nosso estudo realizará buscas sobre os motivos dos índices de evasão dos cursos de formação continuada oferecida aos professores de matemática na EFAP, encaminhando também uma análise ligada aos conteúdos da matemática escolar presente nesses cursos de formação. No intuito de contribuir para que mais docentes concluam seu aperfeiçoamento e consequentemente ofereçam um ensino de melhor qualidade aos seus educandos, este trabalho pretende aprofundar os indícios levantados e aprofundar as razões dos professores em relação aos conteúdos, metodologias e outras demandas da prática 253 docente que podem estar presente nessa formação para contribuir para o desenvolvimento profissional do professor de matemática e qualificar sua ação docente. Referências BRASIL. Ministério de Educação e Cultura. Secretaria de Educação Fundamental. Referenciais para formação de professores. Brasilia, 1999. ______. Congresso Nacional. Lei Federal 9394 de 20 de dezembro de 1996. Estabelece Diretrizes e Bases da Educação Nacional. CANDAU, V. M. F. Formação continuada de professores: Tendências atuais. In:_____ (Org.). Magistério: construção cotidiana: Petrópolis: Vozes, 1997, p. 51-68. FREIRE, P. Pedagogia da autonomia - saberes necessários à prática docente. Ed. Paz e Terra, São Paulo, 1998. GATTI, B. A. Diagnóstico, problematização e aspectos sobre a formação do magistério: subsídios para o delineamento de políticas na área.São Paulo: Fundação Carlos Chagas, 1996. IMBERNÓN, F. Formação continuada de professores. São Paulo: Cortez, 2010. ______. Formação permanente do professorado: novas tendências. São Paulo: Cortez, 2009. NÓVOA, A. (Org.). Formação contínua de professores: realidade e perspectivas. Aveiro: Universidade Aveiro, 1991 PORTO, Y. Formação continuada: a prática pedagógica recorrente. In: Marin, Alda J. (Org.). Educação continuada. Campinas: Papirus, 2000. TRIVIÑOS, A. N. S. Introdução à pesquisa em ciências sociais: a pesquisa qualitativa em educação. São Paulo: Atlas, 1987. 254 ESTUDOS EM GRUPO NA FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES DE MATEMÁTICA A DISTÂNCIA Maria Teresa ZAMPIERI – UNESP – SP ([email protected]) Sueli Liberatti JAVARONI - UNESP – SP ([email protected]) Resumo: Nesse artigo trazemos recortes de uma dissertação de mestrado, os quais apontaram a importância dos estudos em grupo para viabilizar a comunicação no contexto da formação inicial de professores de Matemática a distância. Tal dissertação teve como objetivo investigar como se deu a comunicação na disciplina Introdução a Estatística, que compõe a grade curricular do curso de Licenciatura em Matemática, ofertado a distância pela Universidade Federal de Roraima (UFRR) e vinculado à Universidade Aberta do Brasil (UAB). Assim, relatamos alguns desafios e diretrizes que concernem à comunicação na EaD, tomando como base trabalhos cujos contextos também se deram nessa modalidade. Em seguida, apresentamos relatos de alunos que nos possibilitaram inferir a existência de estudos em grupo nos polos, que ocorreram de maneira geral, com o acompanhamento dos respectivos tutores presenciais. Além disso, articulamos tais relatos com obras literárias que abordam temas relacionados a estudos em grupo, e também com comunicação. Concluímos que devido aos percalços tecnológicos evidenciados ao longo do trabalho de campo, em particular com relação ao acesso à internet, o incentivo do professor à comunicação de forma presencial nos respectivos polos deve continuar, e que o potencial de tal comunicação pode ser mais explorado, não só em sua vertente verbal, quanto em sua vertente escrita. Desse modo, buscamos também nesse artigo provocar reflexões que concernem à exclusão digital, realidade esta que ainda é vivenciada no Brasil, em particular na região Norte. Palavras-chave: estatística, comunicação, internet. 255 Introdução Nesse artigo trazemos recortes de uma dissertação de mestrado, os quais apontaram a importância dos estudos em grupo para viabilizar a comunicação no contexto da formação inicial de professores de Matemática a distância. Tal dissertação teve como objetivo investigar como se deu a comunicação na disciplina Introdução a Estatística, que compõe a grade curricular do curso de Licenciatura em Matemática, ofertado a distância pela Universidade Federal de Roraima (UFRR) e vinculado à Universidade Aberta do Brasil (UAB). O cenário da coleta de dados dessa pesquisa foi o ambiente virtual de aprendizagem (AVA), disponibilizado no Moodle, referente à disciplina investigada em questão. A participação da pesquisadora no desenvolvimento da disciplina foi condizente com a de Malheiros (2008) em seu trabalho, cujas intervenções no cenário de pesquisa foram feitas com o propósito de “[...]sugerir, questionar, dialogar e apresentar possibilidades para que eles decidissem qual melhor caminho a ser percorrido [...]” (MALHEIROS, 2008, p.80). Vale ressaltar que o curso de Licenciatura em Matemática a distância da UFRR iniciou suas atividades em 2011. A estrutura curricular está dividida em 8 semestres, onde em cada um deles são ministradas cerca de 5 disciplinas. Além disso, o curso conta com a seguinte carga horária: 1815 horas dedicadas a disciplinas de Formação Matemática e Áreas Afins; 435 horas dedicadas a disciplinas de Prática como Componente Curricular; 400 horas dedicadas a disciplinas de estágio supervisionado; 240 horas dedicadas a disciplinas de Formação Complementar e 200 horas dedicadas a Atividades Científico-Culturais. Além disso, há uma coordenação acadêmica do curso que é responsável por fazer uma interlocução entre os professores, tutores presenciais e tutores a distância. Outra responsabilidade que compete a essa coordenação é o acompanhamento das atividades didático-pedagógicas do curso. 256 A disciplina de Introdução a Estatística, objeto de estudo de tal dissertação, contou com uma equipe formada por um professor7 responsável por todos os polos e por tutores presenciais e a distância para cada polo, que, a saber, estão localizados nas seguintes cidades: Boa Vista, Rorainópolis, Alto Alegre, São João da Baliza e Amajari. Além disso, essa disciplina teve a duração de dez semanas, sendo que em cada uma foi trabalhado um ou dois conteúdos estatísticos específicos, como, por exemplo: o ferramental matemático necessário ao cálculo estatístico, bem como alguns conceitos iniciais como População, Amostra, Variáveis Quantitativas e Qualitativas; Distribuição de Frequências e Tabelas; Conteúdos sobre Medidas de Posição ou Tendência Central; Medidas de dispersão; Conceitos básicos sobre Probabilidade; Leis de Morgan; Probabilidade (permutação, arranjo e combinação) e Ajuste de curva. Além disso, a disciplina contou com o desenvolvimento de 9 atividades obrigatórias e 2 avaliações presencias, sendo que a média de cada aluno foi calculada da seguinte forma: 40% da média aritmética dos trabalhos + 60% da média aritmética das avaliações, de maneira que a responsabilidade em preparar as atividades e as avaliações coube ao professor, o acompanhamento dos alunos nos respectivos polos coube aos tutores presenciais e as correções das atividades e acompanhamento dos alunos no AVA aos tutores a distância. São de responsabilidade do professor também, as correções das avaliações e os cálculos das médias. Ademais, cabe ressaltar que, ao longo da disciplina, houve 4 videoconferências (que depois foram editadas e anexadas ao AVA), ministradas pelo professor responsável pela disciplina, que foram transmitidas do polo de Boa Vista aos demais polos, onde os alunos e tutores assistiram ao vivo, de forma que as dúvidas surgidas nesses demais polos poderiam ser enviadas pelos respectivos tutores via sala de bate-papo do AVA. Nesse sentido, por meio de uma entrevista concedida pelo professor, ele mencionou que há um incentivo por parte dele e da coordenação para que os alunos compareçam aos seus respectivos polos pelo menos duas vezes por semana, pois segundo ele, tanto as constantes quedas de energia em algumas cidades do estado de Roraima, quanto à geografia das mesmas dificultam o acesso rápido à internet em suas casas. Ou seja, pelo fato de haver muitas regiões ribeirinhas nesse estado, fica inviável a chegada da internet 7 Os nomes do professor, bem como dos tutores e alunos serão modificados (ou não serão citados) para que suas identidades sejam preservadas. 257 por cabos de fibras óticas, restando dessa forma, duas opções para o acesso a ela: Via Satélite ou Internet Discada. No entanto, ainda prevalece esta última opção, mas há indícios de que iniciativas governamentais8 já estão dando andamento à instalação de antenas em algumas áreas, para que esse acesso seja expandido por todo estado. Diante disso, fica claro que a comunicação a distância fica prejudicada, uma vez que a internet seria o principal meio para que tal comunicação ocorresse de fato. Assim, na seção seguinte apresentamos alguns aspectos que concernem à comunicação na EaD, articulados a elementos evidenciados em outros trabalhos, que também estão inseridos dentro deste contexto. A comunicação na EaD: diretrizes e desafios Consideramos relevante expor o nosso entendimento sobre EaD. Nesse sentido, concordamos com as descrições feitas por Borba, Malheiros e Zullato (2007) que apoiados em Moran (2002) argumentam que independentemente se há ou não encontros presenciais nessa modalidade de ensino, o fundamental é que exista a possibilidade de que professores e alunos se comuniquem por meio das tecnologias digitais. Ou seja, um ponto importante (talvez o mais importante) referente a essa modalidade é que haja possibilidades para a comunicação com o intuito de “aproximar pessoas geograficamente distantes” (BORBA; MALHEIROS; ZULATTO, 2007, p. 23). E no que tange à comunicação nessa modalidade, os Referenciais de Qualidade, elaborados pelo SEED/MEC, orientam que as instituições de ensino superior apresentem de forma clara em seus respectivos projetos políticos pedagógicos como esta ocorrerá, ou seja, “como se desenvolverão os processos de produção de material didático, de tutoria, de comunicação e de avaliação, delineando princípios e diretrizes que alicerçarão o desenvolvimento do processo de ensino e aprendizagem” (BRASIL, 2007, p. 8). Por esse mesmo viés, os Referenciais de Qualidade ainda preconizam 8 Mais detalhes sobre a Geografia do estado de Roraima, bem como outros motivos que levam o acesso a internet ser difícil em tal estado podem ser visualizados em http://www.educacao.rr.gov.br/index.php?option=com_content&task=view&id=718&Itemid= 29 Acesso em 31/07/2013. 258 [...] a importância da educação superior ser baseada em um projeto pedagógico e em uma organização curricular inovadora, que favoreçam a integração entre os conteúdos e suas metodologias, bem como o diálogo do estudante consigo mesmo (e sua cultura), com os outros (e suas culturas) e com o conhecimento historicamente acumulado (BRASIL, 2007, p. 9). Contudo, tais diretrizes que apontam para essa necessidade de comunicação na EaD, nem sempre tem sido contempladas pelos cursos nessa modalidade. Santos (2013), em seu trabalho, investigou um curso de Licenciatura em Matemática, ofertado a distância, e vinculado ao Centro de Educação Superior do Estado do Rio de Janeiro (CEDERJ). Como parte dos resultados evidenciados pela autora, ela constatou que a comunicação entre os sujeitos envolvidos no curso apresenta pontos frágeis, em particular porque os alunos entrevistados demonstraram insegurança com o fato de não haver aulas presencias. Tal característica observada foi assim relatada Na experiência vivenciada nessa pesquisa, pude perceber com mais evidência essa passividade nos diálogos com os alunos ingressantes. Quanto mais no início do curso eles estavam, mais passivos e amedrontados eles mostravam-se com a ideia de não terem aulas convencionais e/ou professores transmitindo o conteúdo (SANTOS, 2013, p.99). Além disso, Santos (2013) observou em sua pesquisa que as tecnologias da informação e comunicação (TIC) não tiveram um uso efetivo, especialmente no que concerne a favorecer a interação a distância. Assim como consta nos Referenciais de Qualidade, ela enfatiza a importância do uso das TIC para viabilizar a comunicação, ou seja, “as TIC apresentam possibilidades comunicacionais que podem oferecer inúmeras potencialidades seja pela rapidez no feedback aos alunos, seja pela possibilidade de aproximar os diferentes sujeitos do processo educativo” (SANTOS, 2013, p. 178). Constatações semelhantes com relação ao (não) uso das TIC para viabilizar a comunicação foram relatadas por Viel (2011). O objetivo de pesquisa dessa autora também foi o de investigar um curso de Licenciatura em Matemática a distância, vinculado ao CEDERJ. Mas diferentemente de Santos (2013), que fez sua análise 259 pautada na narrativa dos alunos iniciantes, Viel (2013) se pautou na ótica dos alunos formados nesse curso. Esta autora infere que foram dois os motivos para o não uso das TIC em seu curso investigado, sendo que “um dos maiores motivos, a meu ver, diz respeito à falta de acessibilidade dos alunos às TIC, e um segundo motivo consiste na falta de estrutura e incentivo propiciado pelo curso para que tal interação acontecesse” (VIEL, 2011, p. 164). Além disso, essa autora aponta que como alternativa para superar essas dificuldades na comunicação à distância, os alunos tendem a valorizar os estudos em grupo. Contudo, Viel (2011) observou ainda uma ausência de discussões no âmbito da Educação Matemática, onde levando em consideração que estão sendo formados professores de Matemática nesses cursos, segundo a autora, “tais discussões se fazem imprescindíveis [...]” (VIEL, 2011, p. 195). Dessa forma, se pode observar que algumas diretrizes apontadas pelos Referencias de Qualidade (BRASIL, 2007) ainda se mostram como metas a serem alcançadas por alguns cursos na modalidade a distância, especialmente no que se refere à comunicação entre os envolvidos nos cursos. Um exemplo de tal situação é a disciplina aqui retratada, contexto do presente artigo. Os estudos em grupo Quando conseguimos estabelecer uma comunicação com alguns alunos por meio de mensagens privadas dentro do AVA, indagamos sobre o modo como estudavam e como se comunicavam em seus respectivos polos. Dentre os 13 alunos que nos responderam, apenas dois alunos do polo de Rorainópolis e um do polo de São João da Baliza alegaram que não tinham o costume de estudar em grupos frequentemente. Um desses relatos pode ser observado no Quadro 1, a seguir. Quadro 1 – Resposta do aluno Aldo (polo de Rorainópolis)9 como nossa turma é muito heterogenia, estudo geralmete sozinho Fonte: Dados da pesquisa Já o aluno Fábio, deu a resposta que pode ser observada no Quadro 2: 9 A escrita, a fonte, e o tamanho da fonte serão mantidos nos quadros que mostram os relatos dos alunos, com o intuito de sermos fiéis ao que era “postado” no AVA. 260 Quadro 2 - Resposta do aluno Fábio (polo de S.J. da Baliza) as vezes participo mais é raro Fonte: Dados da pesquisa Em contrapartida, todos os alunos dos polos de Boa Vista e Alto Alegre que se comunicaram conosco, alegaram que costumavam estudar em grupos frequentemente. Uma dessas respostas pode ser visualizada no Quadro 3. Quadro 3 – Resposta da aluna Gabriela (polo de Alto Alegre) GRUPOS DE ESTUDOS, REALIZAMOS AS ATIVIDADES JUNTOS, E UM AJUDA O OUTRO. Fonte: Dados da pesquisa Respostas similares foram dadas pelos alunos do polo de Boa Vista, conforme se pode observar no Quadro 4. Quadro 4 – Resposta do aluno Lauro (polo de Boa Vista) Sempre procuramos ... reunir para realizar os estudos. Fonte: Dados da pesquisa Em outra pergunta mais específica, questionamos sobre a dinâmica desses estudos em grupo e de quem partiu a atitude de constituí-los. A aluna Ruth deu a seguinte resposta. Quadro 5 – Resposta da aluna Ruth (polo de Boa Vista) Como são poucos alunos do curso de matemática, geralmente nos encontramos todos mais o Orlando (pólo Alto Alegre) na Univirr10 e a tutora Clara, que tira nossas dúvidas sobre as atividades e estudar para as provas. Quem tomou a iniciativa foi a Camila e o Marcos, nos encotramos pelo menos uma vez por semana. Fonte: Dados da pesquisa Salvo as exceções dos três alunos que raramente estudavam em grupo, o que pudemos evidenciar nos relatos dos demais é que eles costumavam estabelecer uma comunicação com os colegas, buscar solução para suas dúvidas a partir da troca de ideias com os mesmos e com os tutores presenciais. Nesse mesmo sentido, porém de uma forma mais ampla, Viel (2011), fundamentada nas vozes dos alunos do curso a 10 http://univirr.edu.br/ . último acesso em 06/03/2013. 261 distância, o qual ela investigou, ressalta que segundo eles, “[...] o estímulo mútuo e a troca são muito enfatizados como pontos essenciais para o sucesso no curso” (VIEL, 2011, p.146). Sobre o fato de “um ajuda o outro”, conforme relatado por Gabriela no Quadro 3, no nosso modo de ver, essa comunicação com os colegas possibilita momentos de reflexão e desenvolvimento da habilidade de argumentação, ou assim como destaca Menezes (1999) “a possibilidade de os alunos discutirem entre si, tentando esclarecer ideias menos claras, permite maior riqueza na discussão geral” (MENEZES, 1999, p. 11). Ademais, em seu trabalho, esse autor discute propostas de tarefas que foram realizadas por alunos de maneira individual e em grupos. E com relação a esta última forma, ele concluiu que “... os alunos tiveram oportunidade de expressarem as suas ideias, de ouvirem, de clarificarem dúvidas e chegarem a consensos” (MENEZES, 1999, p. 12). Já com relação ao que foi relatado pela aluna sobre o suporte da tutora em tirar as dúvidas do grupo (Quadro 5), e sobre a procura por esses profissionais, conforme relatado por alguns alunos por meio de mensagens privadas no AVA, obtivemos indícios que mostram a importância de tais profissionais nas dinâmicas de estudos dos alunos, seja por sanar suas dúvidas ou na orientação durante os estudos em grupo. E as funções dos tutores, particularmente dos tutores presenciais, perpassam o âmbito pedagógico, pois assim como descrevem Silva e Figueiredo (2011) o tutor presencial “cumpre ainda a função de motivar, gerenciar os encontros presenciais e identificar as dificuldades acadêmicas e administrativas” (SILVA e FIGUEIREDO, 2011, p.4). De fato, esses profissionais têm exercido tais funções e outras que talvez não tenhamos conhecimento, especialmente pelo fato de que a comunicação nessa disciplina ocorreu com maior frequência, de forma presencial. Aliás, em alguns de seus relatos, os alunos deixaram transparecer que preferem se comunicar presencialmente. Sobre essa comunicação presencial, em particular entre os alunos, o coordenador do curso nos informou em um de seus relatos que é comum os alunos formarem grupos de estudo em seus respectivos polos. Por exemplo, ele reforçou que na maioria dos polos tal prática ocorre, com exceção do polo de Rorainópolis, pelo fato de alguns alunos morarem a quase 100 km de distância do polo. Além disso, ele argumentou que em Amajari, só há 262 grupos de estudo quando ocorrem as videoconferências, e que em São João da Baliza há um grupo de estudos composto por 5 alunos. Outro fato que nos permite inferir a preferência dos alunos pela comunicação presencial é a resposta elaborada pelo grupo das alunas Sônia, Mara e Daiane no relatório de uma atividade que ficou sob nossa responsabilidade. Tal atividade abordou os conteúdos Desvio Padrão e Coeficiente de Variação, dentro da perspectiva da Educação Estatística Crítica, que tem em seus pressupostos a valorização do diálogo, o fomento de discussões de caráter político e/ou social articuladas aos conteúdos e a valorização do processo de análise dos dados (CAMPOS, 2007). Sobre a forma que o grupo escolheu para resolver a atividade, as alunas argumentaram o seguinte: Quadro 6 – Resposta do grupo Sônia, Mara e Daiane no relatório Apesar de o nosso curso ser a distancia tendo a internet como canal de comunicação, o processo de comunicação que utilizamos para a confecção deste trabalho foi o processo presencial, porque pessoalmente, as idéias, os pensamentos e opiniões fluem mais rapidamente. Fonte: Dados da pesquisa Tendo em vista essa comunicação presencial que se dá entre os alunos, especialmente no que tange à formação de grupos de estudo para o desenvolvimento de atividades, concordamos com Viel que “geralmente, as discussões entre os alunos são extremamente valiosas como um modo para ajuda-los a refletir sobre o conteúdo que foi apresentado e testá-lo [...]” (VIEL, 2011, p. 79). Essa comunicação estabelecida pelo grupo, que possibilitou que “as idéias, os pensamentos e opiniões...” (Quadro 6) fluíssem, está em consonância com a característica de comunicação interativa, descrita por Silva (2000). Para esse autor, essa modalidade comunicacional “só se realiza mediante a sua participação. Isso quer dizer bidirecionalidade, intervenção na mensagem e multiplicidade de conexões [...]” (SILVA, 2000, p.71). Nesse mesmo sentido, esse “processo de comunicação” relatado pelas alunas, vai ao encontro da descrição de comunicação feita por Martinho e Ponte (2005). Para esses autores, “a comunicação constitui um processo social onde os participantes interagem trocando informações e influenciando-se mutuamente” (MARTINHO; PONTE, 2005, p.2). 263 Nessa seção, apresentamos e discutimos relatos de alunos, onde evidenciamos a existência de estudos em grupo nos polos, que ocorreram, em particular, com o acompanhamento dos respectivos tutores presenciais. A seguir apresentamos algumas reflexões sobre a importância de estudos em grupo, em particular, como forma de superar os empecilhos tecnológicos que dificultam a comunicação a distância. Considerações finais Nesse artigo, tivemos o propósito de apresentar recortes de uma dissertação de mestrado, os quais apontaram a importância dos estudos em grupo para viabilizar a comunicação no contexto da formação inicial de professores de Matemática a distância. Tal dissertação teve como objetivo investigar como se deu a comunicação na disciplina Introdução a Estatística, que compõe a grade curricular do curso de Licenciatura em Matemática, ofertado a distância pela Universidade Federal de Roraima (UFRR) e vinculado à Universidade Aberta do Brasil (UAB). Assim, relatamos alguns desafios e diretrizes que concernem à comunicação na EaD, tomando como base trabalhos cujos contextos também se deram nessa modalidade. Em seguida, apresentamos relatos de alunos que nos possibilitaram inferir a existência de estudos em grupo nos polos, que ocorreram de maneira geral, com o acompanhamento dos respectivos tutores presenciais. Além disso, articulamos tais relatos com obras literárias que abordam temas relacionados a estudos em grupo, e também com comunicação. Contudo, temos em mente que essa “preferência” dos alunos pelos estudos em grupo de forma presencial, além de estar relacionada com o que foi pontuado pelas alunas Sônia, Mara e Daiane (Quadro 6), acreditamos que também esteja vinculada com algo mais complexo, como por causa do contratempo com o acesso à internet. Dessa forma, enfatizamos que tal empecilho não é característico apenas no estado de Roraima, pois segundo Lucena et al (2012), cujo contexto de estudo é a EaD no estado do Amazonas, um desafio para a oferta de cursos a distância que atendam a demanda de tal estado é a procura por soluções frente às peculiaridades naturais da região, que causam dificuldades não só no acesso à internet, como na logística necessária para a entrega de materiais didáticos. 264 De toda forma, os autores salientam aspectos otimistas com relação à solução para esses empecilhos. Segundo eles, “os problemas e dificuldades são latentes, entretanto já vislumbra uma evolução e esperam-se crescentes melhorias na situação. Programas do governo federal e da iniciativa privada sinalizam uma mudança na realidade tecnológica desses lugares” (LUCENA et AL, 2012, p.11). Enquanto essas soluções não chegam para a região Norte, ressaltamos aqui que, a nosso ver, o incentivo do professor à comunicação de forma presencial nos respectivos polos deve continuar, e que o potencial de tal comunicação pode ser mais explorado, não só em sua vertente verbal, quanto em sua vertente escrita, como por exemplo, solicitando aos alunos que elaborem relatórios sobre o desenvolvimento de atividades abordando conceitos estatísticos, pois corroboro a ideia de Smith (1998) que ao escrever um relatório em atividades de estatística, os alunos desenvolvem habilidades na escrita e nos conceitos estatísticos trabalhados. Complementando esse autor, consideramos que, se a atividade for desenvolvida de forma conjunta, e o relatório for elaborado também dessa forma, os alunos desenvolvem não só habilidades de escrita e de conceitos estatísticos, mas também de argumentação. Ou seja, por meio da argumentação os alunos assumem uma postura crítica, e passam a discutir suas ideias e emitir opiniões, e essas características vão ao encontro das ideias de Freire (1967) de que uma prática educativa só pode “alcançar efetividade e eficácia na medida da participação livre e crítica dos educandos” (FREIRE, 1967, p. 4). Por fim, esperamos com este artigo ter fomentado não somente novas reflexões sobre a importância dos estudos em grupo para viabilizar a comunicação entre os envolvidos na disciplina investigada, como também para provocar reflexões que concernem à exclusão digital, realidade esta que ainda é vivenciada no Brasil, em particular na região Norte. Referências BORBA, M. C.; MALHEIROS, A. P. S.; ZULATTO, R. B. Educação a Distância online. 1ª edição. Belo Horizonte: Autêntica, 2007. 265 BRASIL. Secretaria de Educação a Distância. Referenciais de qualidade para educação superior a distância. Brasília: MEC/Seed, 2007. CAMPOS, C. R. A Educação Estatística: uma investigação acerca dos aspectos relevantes à didática da estatística em cursos de graduação. Tese de Doutorado. Instituto de Geociências e Ciências Exatas, UNESP-Rio Claro, 2007. FREIRE, P. Educação como prática de Liberdade. 1 Ed. Rio de Janeiro, 1967. GOMES, A. A. M.; NACARATO, A. M. Pistas, Indícios...A comunicação de ideias matemáticas na EJA. In. REMat - Revista Eletrônica de Matemática, nº2 (pp. 1 - 48). Jataí (GO), UFG, 2010. GRASSI, D.; SILVA, J. M. A mediação pedagógica em fóruns de discussão nos cursos virtuais. In: CINTED - UFRGS - Novas tecnologias na Educação, v. 8 nº1 (pp. 1 12). Porto Alegre (RS), UFRGS, 2010. GIROUX, H. A. Os professores como intelectuais: rumo a uma pedagogia crítica. Trad. Daniel Bueno. 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Tese (doutorado em Educação Matemática) – Instituto de Geociências e Ciências Exatas, UNESP, Rio Claro (SP), 2011. 267 UM ESTADO DO CONHECIMENTO SOBRE A FORMAÇÃO CONTÍNUA DE PROFESSORES DOS ANOS INICIAIS NO CAMPO MULTIPLICATIVO Edvonete Souza de Alencar PUC – SP ([email protected]) Resumo: Esta comunicação cientifica é resultado parcial de uma tese de Doutorado em andamento da área de Educação Matemática. Trata-se de um estado do conhecimento que tem como objetivo realizar uma síntese de pesquisas sobre a formação contínua de professores dos anos iniciais referentes ao Campo Multiplicativo no período de 1996 a 2013. Para a realização deste estudo fizemos uma busca na Biblioteca Nacional de Dissertações e Teses , por meio de palavras chaves retiradas do nosso objetivo de pesquisa. Posteriormente lemos os títulos, resumos e conclusões e selecionamos vinte e nove trabalhos. Utilizamos como referencial teórico os autores mais citados nas pesquisas analisadas com o intuito de realizar uma releitura dos dados. Em formação de professores estes foram: Shulman e Tardif. No Campo multiplicativo foram utilizados: Vergnaud e Nunes. Em análise observamos as similaridades das pesquisas identificando três eixos: reflexão sobre a prática, necessidade de aprofundamento de estudo do objeto matemático por parte do docente e contribuições a formação contínua. Neste ultimo destacamos como contribuições: a análise das resoluções dos alunos e de suas dificuldades, o estudo das diferentes estratégias, a mediação e intervenções pedagógicas, a utilização de pensamento narrativo e lógico matemático como recurso para o professor e aluno, a interação professor-aluno e o registro. Consideramos que os aspectos analisados nas pesquisas são indicativos promissores a serem realizados em uma formação contínua e nos permite inferir que as ações formativas provavelmente possam ser reformuladas por meio dessas contribuições. Assim como promover a reflexão e mudança de modo que avancem positivamente nos aspectos formativos. Palavras-chave: Formação de professores, Anos iniciais, Campo Multiplicativo. 268 Introdução Esta comunicação cientifica é um excerto de uma tese de Doutorado em andamento na área de Educação Matemática, que tem o intuito de realizar uma síntese de pesquisas que tratam da formação contínua de professores dos anos iniciais referentes ao Campo Multiplicativo no período de 1996 a 2013. Consideramos a formação contínua segundo Perrenoud (1966) que nos relata que a mesma é orientada por objetivos em longo prazo, composta por competências, ampliando o campo de trabalho dando-lhe a prática da realidade, para que desenvolva uma formação de prática responsável e refletida, que esteja articulada entre a formação inicial, a teoria e a prática. Acreditamos ainda que existem aspectos a serem abordados nas pesquisas desenvolvidas nos anos iniciais do Ensino Fundamental, principalmente no tocante a formação contínua de professores. Tais indícios, encontramos no artigo de Fiorentini Nacarato; Ferreira; Lopes ; Freitas e Miskulin (2002), que confirmam nossas hipóteses. Assim, como também nos artigos de Melo (2011) que publicou um levantamento de dissertações e teses defendidas nos últimos anos na Educação Matemática na Revista Zetétike e Alencar (2012) que a partir dos dados de Melo (2011) investigou quantas pesquisas haviam sido publicadas no segmento dos anos iniciais e constatou que ainda existem poucos estudos nessa área. Escolhemos o Campo Multiplicativo por observarmos em nossas práticas que há uma maior dificuldade dos alunos e professores nesses conteúdos. Admitimos como Campo Multiplicativo, o que Vergnaud (1996, p.35) explana “ser compostas pelas operações de multiplicação, divisão, além dos conceitos de fração, razão, proporção e probabilidade”. Cabe salientar que ao invés de relatarmos sobre o Campo Conceitual Multiplicativo como citado originalmente por Vergnaud (1996) adotamos o termo de estudo Campo Multiplicativo por possuir uma maior abrangência. Procedimentos de Pesquisa Apresentaremos nesta comunicação um estado do conhecimento segundo o que Romanovski e Ens (2006) caracterizam como: “O estudo que aborda apenas um setor 269 das publicações sobre o tema estudado vem sendo denominado estado do conhecimento.”(ROMANOVSKI e ENS , 2006,p.39-40) Para tanto realizamos uma busca na Biblioteca Nacional de Dissertações e Teses, por meio de palavras chaves retiradas do nosso objetivo de pesquisa: Campo Multiplicativo e seus termos similares (multiplicação, divisão, combinatória, proporcionalidade), Formação de Professores e Anos iniciais. Foi usado o filtro “relevância” na busca, no qual encontramos os seguintes resultados. Tabela 1 - Pesquisa de dissertações e teses por temática Campo Multiplicativo, Formação de Professores e Anos iniciais 1 Campo Multiplicativo , Formação de professores e séries iniciais 0 Formação de professores e séries iniciais 3 Campo Multiplicativo 17 Multiplicação , Formação de professores e anos iniciais 2 Multiplicação formação de professores series iniciais 0 Multiplicação e Formação de professores 14 Divisão , Formação de Professores e anos iniciais 2 Divisão Formação de Professores e series iniciais 0 Divisão e Formação de professores 64 Combinatória Formação de professores e anos iniciais 0 Combinatória Formação de Professores e series iniciais 0 Combinatória e Formação de professores 4 Proporcionalidade Formação de professores e Anos iniciais 0 Proporcionalidade Formação de Professores e series iniciais 0 Proporcionalidade e Formação de Professores 3 270 Fonte: Adaptado de www. bdtd.ibict.br Ao lermos os títulos, resumos e conclusões selecionamos 29 trabalhos que referiam-se as palavras chaves contidas em nosso objetivo e estabelecemos similaridades. Tabela 2 – Dissertações e Teses correlatas à Formação contínua de professores dos anos iniciais sobre o Campo Multiplicativo Título Autor Sonia Maria O sistema de numeração Losito decimal e o principio multiplicativo: um estudo na 4 serie do 1 grau Instituição Grau Ano UNICAMPFE Mestrado 1996 O campo Conceitual Multiplicativo na perspectiva do Professor das series iniciais (1ª a 4ª série) Silvia Swain Canoas PUCSP Mestrado 1997 O Ensino da Multiplicação para crianças e adultos: conceitos, princípios e metodologia. Mara Silvia André Ewbank UNICAMPFE Doutorado 2002 A passagem da 4.ª para 5.ª série: o que pensam professores dessas séries sobre os conteúdos essenciais de Matemática. Angelita Minetto Araújo UFPR Mestrado 2003 A Matemática em uma escola organizada por ciclos de formação humana Sheila Maris Gomes Goulart UFMG Mestrado 2005 Fração e seus diferentes significados: um estudo com alunos das 4 as 8 series do ensino fundamental. Leonel Valpereiro Moutinho PUCSP Mestrado 2005 O conceito de fração em seus Aparecido dos Santos diferentes significados : um estudo diagnostico junto a professores que atuam no PUCSP Mestrado 2005 271 Ensino Fundamental Números decimais : no que os saberes de adultos diferem dos de crianças Valdenice Leitão da Silva UFPE Mestrado 2006 Expressões aritméticas : crenças , concepções e competências no entendimento do professor polivalente Ubiratan Barros Arrais PUCSP Mestrado 2006 Crença , concepção e competência dos professores do 1 e 2 ciclo do ensino fundamental com relação a fração. Raquel Factori Canova PUCSP Mestrado 2006 Ensino e aprendizagem de problemas cartesiano: interrelações entre diferentes representações Vera Lucia da Silva PUCSP Mestrado 2006 As dificuldades na aprendizagem da divisão: analise da produção de erros dos alunos do ensino fundamental e sua relação com o ensino praticado pelos professores Edileni Garcia Juventino de Campos Universidade Catolica Dom Bosco Mestrado 2007 O ensino desenvolvimental e a aprendizagem de Matemática na 1ª fase do Ensino Fundamental. Fernanda Chaves Cavalcante Soares Universidade Católica de Goias Mestrado 2007 PUCSP Doutorado 2007 Angélica da O desafio do Fontoura desenvolvimento profissional docente : analise Garcia Silva da formação continuada de um grupo de professores das series iniciais do ensino fundamental , tendo como objeto de discussão o processo de ensino e 272 aprendizagem das frações. A reconstrução do conceito de dividir na formação dos professores : o uso do jogo como recurso metodológico Cheila Francett Bezerra Silva de Vasconcelos UFAL Mestrado 2008 Tabuadas: significados e sentidos produzidos pelos professores das séries iniciais do Ensino Fundamental Jóyce Nürnberg UNESC Mestrado 2008 Argumentação e metacognição na solução de problemas aritméticos de divisão Telma Assad Mello UNICAMP FE Mestrado 2008 A divisão e os números racionais : uma pesquisa de intervenção psicopedagógica sobre o desenvolvimento de competências conceituais de alunos e professores Regina da Silva Pina Neves UNB Doutorado 2008 O conhecimento dos alunos de primeira serie do ensino fundamental sobre a divisão Josiane Elias Nicolodi UNIVALI Mestrado 2009 A constituição dos saberes da docência: uma analise do campo multiplicativo Adriana Camejo da Silva PUCSP Doutorado 2009 Doutorado 2009 Cristiane UFPE Quem dança com quem : o Azevedo dos desenvolvimento do raciocínio combinatório do 2 Santos Pessoa ano do ensino fundamental ao 3 ano do ensino médio. A multiplicação na Escola Fundamental I analise de uma proposta de ensino Ana Ruth Starepravo USP FE Doutorado 2010 A formação docente e o ensino de problemas combinatórios : diversos Cristiane Arimatea UFPE Mestrado 2011 273 olhares , diferentes conhecimentos. Rocha Conhecimento Profissional Docente de professores do 5.º ano em uma escola com bom desempenho em Matemática :o caso das estruturas multiplicativas Edvonete Souza de Alencar UNIBAN Mestrado 2012 Marcas da divisão: um estudo de caso sobre a aprendizagem da operação de divisão no 4° ano do Ensino Fundamental Michele dos Santos Ferreira UFRGS Mestrado 2012 As potencialidades de um processo formativo para a reflexão na e sobre a pratica de uma professora das series iniciais : um estudo de caso. Vera Lucia Merlini PUCSP Doutorado 2012 Processos de formação colaborativa com foco no Campo Multiplicativo: um caminho possível com professoras polivalentes Aparecido dos Santos PUCSP Doutorado 2012 UNIBAN Mestrado 2013 UFSCAR Mestrado 2013 Os pensamentos Narrativo e Caroline lógico cientifico na resolução Adjane Fiore de problemas no Campo conceitual Aditivo e Multiplicativo nos anos finais do Ensino fundamental Um curso de atualização para professores do ciclo I utilizando novas tecnologias no ensino de Matemática Juliano Osório da Silva Posteriormente elaboramos uma síntese de pesquisa que segundo Fiorentini e Lorenzato (2006) caracterizam como: 274 [...]uma modalidade de pesquisa que objetiva desenvolver uma revisão sistemática de um conjunto de estudos já realizados, sobre um mesmo tema ou problema de pesquisa, tentando extrair deles, mediante contraste e inter-relacionamento, outros resultados e sínteses, transcendendo aqueles anteriormente obtidos (FIORENTINI e LORENZATO, 2006,p. 226). Um novo olhar sobre o referencial teórico Nosso referencial teórico apoia-se em estudos da formação de professores e do campo multiplicativo. Neste sentido analisamos quais foram os teóricos mais utilizados pelas 29 pesquisas, para que pudéssemos realizar uma releitura das mesmas. Observamos que os mais citados no campo da formação de professores foram: Shulman (1986) e Tardif (2002). Quanto aos teóricos do Campo Multiplicativo os mais citados foram: Vergnaud (1990) e Nunes (2001). Shulman (1986) relata sobre o Conhecimento Profissional Docente, que é composto por três vertentes de conhecimento: específico do conteúdo, pedagógico do conteúdo e curricular. Observamos que o conhecimento específico do conteúdo é o conhecimento próprio da disciplina a ser ensinada pelo docente. Já o conhecimento pedagógico do conteúdo, são as estratégias, intervenções e planejamento utilizados para que ocorra a aprendizagem. E os conhecimentos curriculares referem-se às especificações e detalhamento do currículo proposto. Tardif (2002) nos diz sobre a existência das relações entre os saberes e o tempo. Em seus estudos destaca que os saberes são temporais e desenvolvidos no decorrer da vida e experiências adquiridas de acordo com cada ocupação. Os saberes relatados pelo autor são: profissionais, da disciplina, curriculares e da experiência. Estes são construídos com o tempo que os docentes vivenciam experiências em seu trabalho e no planejamento de suas aulas, além das experiências de formação ou como estudantes. Quanto ao teórico do Campo Multiplicativo, utilizamos Vergnaud (1990) relata sobre a Teoria dos Campos Conceituais , afirmando que esta é cognitivista e “apresenta alguns princípios como base do desenvolvimento da aprendizagem e de competência complexa” (VERGNAUD, 1990, p.133). Além disso, é psicológica, pois compõem-se 275 de “estudo de semelhanças e diferenças entre conhecimentos do ponto de vista conceitual”. (ibidem). Vergnaud (1990) com base em estudos de Piaget, nos diz que suas pesquisas procuram identificar as influências das situações na formação do conhecimento. Para o autor o conhecimento é uma adaptação, e o esquema é formado pela a análise da mesma. Neste sentido sua teoria propõe o estudo do desenvolvimento do conteúdo. Assim o Campo conceitual é construído por meio de experiências do cotidiano e da escola, estando diretamente ligados às situações. Salientamos que existem vários campos conceituais, neste estudo apresentamos o Campo Conceitual Multiplicativo. Nunes (2001) relata sobre o raciocínio multiplicativo, ressaltando que esta é composta por duas variáveis de grandezas diferentes. Destaca ainda que o raciocínio multiplicativo envolve situações de correspondência um para muitos, relações entre variáveis e situações que envolvem distribuição divisão e divisões ao meio. Análises Em primeira análise observamos as similaridades quanto ao objeto matemático em consonância com Vergnaud (1990) e Nunes (2001), e identificamos que as pesquisas de Losito (1996); Canoas (1997); Moutinho (2005) ; Santos ( 2005) ; Silva ( 2006a); Silva (2006 b); Canova (2006); Campos (2007); Soares (2007) ; Garcia Silva ( 2007); Neves (2008); Vasconcelos (2008) ; Mello (2008); Nicolodi, (2009); Alencar (2012) ; Merlini (2012); Ferreira (2012) e Santos (2012) apresentam estudo direcionado a divisão. Já Ewbank (2002); Araujo (2003); Goulart ( 2005); Silva ( 2006); Arrais ( 2006); Nunberg (2008) , Camejo ( 2009) ; Pessoa( 2009); Starepravo (2010) ,Rocha ( 2011) ; Fiore (2012); Santos (2012); Alencar (2012) e Silva (2013) apresentam estudo sobre a multiplicação. Ressaltamos que alguns estudos direcionavam-se para ambos os objetos matemáticos. Em um segundo momento, analisamos algumas similaridades que envolvem a formação contínua, compostas por três eixos: reflexão sobre a prática, aprofundamento do objeto matemático e contribuições para a formação contínua de professores dos anos iniciais no Campo Multiplicativo. Ressaltamos que apesar de alguns estudos como: Losito (1996), Moutinho (2005), Silva (2006 a), Silva (2006 b), Campos (2007), Soares 276 (2007), Nicolodi (2009), Pessoa (2009), Starepravo (2010), Ferreira (2012) e Fiore (2013) terem o foco na aprendizagem dos alunos do campo multiplicativo, este nos trazem importantes contribuições a serem utilizadas na formação contínua dos professores dos anos iniciais. Acreditamos que o docente é um dos principais interlocutores nas ações em sala de aula e por isso estão intrinsicamente ligados as relações entre o ensino e a aprendizagem. A reflexão sobre a prática são abordadas nas pesquisas de Ewbank (2002), Garcia Silva (2007), Vasconcelos (2008) Mello (2008), Neves (2008) Starepravo (2010), Alencar (2012), Santos (2012), Merlini (2012), Santos (2012) e relatam como ponto significativo a ser tratado na formação contínua dos professores dos anos iniciais. Apresentaremos entre todas uma citação para demonstrar a assertiva. Ewbank (2002) relata que: “O professor também constrói e re-constrói os seus saberes. É na ação em sala de aula e pela reflexão crítica desta que tem a oportunidade de uma construção real e efetiva do seu saber fazer pedagógico”.(EWBANK, 2002, p.215) Verificamos que as pesquisas que indicam que os docentes necessitam de um aprofundamento do estudo do objeto matemático são: Canoas (1997), Ewbank (2002), Araújo (2003), Santos (2005), Arrais (2006), Canova (2006), Campos (2007), Soares (2007), Garcia Silva (2007), Neves (2008), Vasconcelos (2008), Camejo (2009), Merlini (2012) e Alencar (2012) . Para confirmação das evidências apresentamos entre todos os estudos, uma das considerações para confirmar nossas assertivas. Canoas (1997) em seu estudo aponta duas perspectivas: 1)as professoras têm uma visão estreita do campo conceitual multiplicativo, principalmente no que diz respeito a exploração das situações presentes nesse campo; e 2) as professoras tendem a utilizar conceitos e procedimentos dentro de um domínio de validade que não são verdadeiros em outros domínios, sem contudo ter um entendimento claro do que é possível e do que não é possível ser conectado nesses domínios. (CANOAS, 1997, p.8) O estudo de Shulman (1986) já destaca a importância do domínio do conhecimento específico do conteúdo para as tarefas de planejamento. 277 Observamos contribuições para formação contínua nos estudos de Losito (1996); Canoas (1997); Araújo (2003) ; Moutinho (2005); Goulart, (2005); Santos (2005); Silva (2006a); Silva (2006b); Campos (2007); Soares (2007); Garcia Silva (2007), Nunrberg (2008); Mello (2008); Vasconcelos (2008); Neves (2008); Camejo (2009); Nicolodi (2009); Pessoa (2009); Starepravo (2010); Rocha (2011); Santos (2012); Ferreira (2012); Alencar (2012); Fiore (2013) e Silva (2013). Entre as contribuições estão: a análise das resoluções dos alunos e de suas dificuldades, o estudo das diferentes estratégias, a mediação e intervenções pedagógicas e a utilização de pensamento narrativo e lógico matemático como recurso para o professor e aluno, a interação professor aluno e o registro. Em consonância a essa afirmação, destacamos Tardif (2002) nos diz que os docentes desenvolvem suas aprendizagens por meio de situações e experiências vividas. Neste sentido devemos proporcionar boas experiências nas formações de professores com o intuito de desenvolver os saberes docentes. Considerações finais Observamos indicativos promissores a serem realizados em uma formação contínua comprovados pelas pesquisas: reflexão sobre a prática, aprofundamento de estudo do objeto matemático e contribuições para a formação docente. Estes indicadores nos levam a crer que as formações contínuas provavelmente possam ser reformuladas por meio dessas contribuições. Destacamos que esta pesquisa permite a reflexão e mudança nas formações contínuas de professores dos anos iniciais no Campo Multiplicativo, vindo contribuir para que posteriores estudos avancem positivamente quanto aos aspectos formativos. Referências ALENCAR, E. S. D. 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Notamos, por meio de observação em aulas ministradas aos estudantes calouros que parte deles escolhe Matemática como segunda opção e pretende utilizá-lo como acesso a outros cursos de graduação que proporcionem status e/ou melhor retorno financeiro quando entrarem no mercado de trabalho, quando comparado ao trabalho docente. A partir do problema identificado, buscamos pesquisas na área de Educação e Educação Matemática para melhor conhecer o aluno que tem optado pelo curso de Matemática. Na revisão bibliográfica, nos atemos aos trabalhos relacionados à carreira docente (Gatti, et al, 2009) e suas condições de trabalho e saúde. Identificamos-nos com o trabalho realizado por Moreira et al (2012), no qual visa identificar o perfil do aluno ingressante em diferentes cursos de Licenciatura em Matemática, de várias universidades brasileiras e a sua escolha, ou não, pela carreira docente. Com base nesse trabalho, aplicamos um questionário composto por 24 perguntas, as quais se referem a aspectos formativos, de trabalho, socioeconômicos do aluno e sua família, além do interesse e motivação para cursar Matemática. Ao analisar as respostas dos ingressantes, foi possível traçar um perfil do estudante ingressante: há um equilíbrio entre homens e mulheres, solteiro, oriundo de escola pública, gosta de matemática, mas tem dúvida se seguirá a docência, exerce atividade remunerada, renda familiar entre 1 e 5 salários mínimos, pais com pouca escolarização e possui computador em casa. Acreditamos os resultados obtidos nesta investigação venham contribuir para discussões e reflexões acerca de nosso e outros cursos de Matemática e, como continuidade do estudo, nos interessamos em constituir um perfil do aluno egresso do curso. Palavras-chave: Formação Inicial. Professor de Matemática. Carreira Docente. 282 Introdução O presente artigo tem como objetivo principal apresentar uma breve análise do perfil dos alunos ingressantes do curso Licenciatura em Matemática da Universidade Federal de Mato Grosso - Campus Universitário de Rondonópolis (UFMT/CUR), no ano de 2013. O curso de Matemática foi autorizado a funcionar a partir do primeiro semestre de 1988, sendo reconhecido no ano de 1995 e se consolida como um dos principais cursos de formação de professores de Matemática na e para a Região Sul do Estado de Mato Grosso. Atualmente, o curso recebe cinquenta alunos por ano, com ingresso por meio do Sisu/MEC, sendo vinte e cinco alunos ingressantes no período vespertino, no primeiro semestre, e outros 25 alunos no segundo semestre para o período noturno. A partir da observação dos professores, autores deste trabalho, em classes do primeiro semestre do curso e de conversas informais que tivemos com alunos e professores do Departamento de Matemática, nos interessamos a investigar sobre o perfil do aluno ingressante. Somos professores recém-ingressados na UFMT e nos chamou atenção o fato de muitos alunos abandonarem o curso de Matemática, seja por ter escolhido uma carreira incorreta, seja por ter utilizado o curso de Matemática como possível acesso à universidade. Como o ingresso para o curso de Matemática possui menor concorrência, quando comparado às áreas de Engenharia, parte dos alunos que acabam de ingressar no curso de Matemática busca transferir-se para cursos de carreiras tradicionais, as quais poderiam proporcionar um melhor retorno financeiro, quando entrarem no mercado de trabalho. No campus de Rondonópolis, há dois cursos de Engenharia: Agrícola e Ambiental, e Mecânica. Diante desse quadro, nos propusemos a pesquisar em artigos de Educação e Educação Matemática sobre os temas: Perfil dos Alunos de Matemática; Atratividade da Carreira Docente, Escassez na Formação de Professores, entre outros. Em um dos artigos intitulado: “Quem quer ser professor de Matemática”, publicado em 2012 na Revista Zetetiké, um grupo de pesquisadores (MOREIRA et al., 2012) se propôs a 283 elaborar e aplicar um questionário composto por 27 questões, nas quais os alunos responderam sobre idade, sexo, estado civil, formação escolar, vestibular e a preferência pela licenciatura, renda familiar e escolaridade dos pais. Para a pesquisa, responderam 664 ingressantes de 18 instituições de ensino superior em 10 estados da federação. Como havia uma semelhança entre o objetivo da pesquisa realizada por MOREIRA et al.(2012) e de nosso interesse em conhecer melhor o perfil do aluno ingressante no curso de Matemática que trabalhamos, utilizamos o questionário citado anteriormente, realizando pequenas adaptações. Ao todo, constam 24 questões no questionário aplicado aos atuais 35 alunos ingressantes no ano de 2013. Note que, não foi possível aplicar o questionário aos 50 alunos esperados, pois as turmas não tiveram a sua ocupação máxima desde o início do período letivo e alguns alunos já desistiram do curso. Não conseguimos identificar os motivos do abandono tão precoce. A seguir, apresentaremos um breve panorama das condições de trabalho docente, atratividade da carreira e o perfil dos alunos que ingressam nos cursos de licenciatura. Sobre formação, atratividade e interesse pela carreira docente A escolha de uma profissão não é uma tarefa fácil. Ainda mais, quando ela precisa ser feita em um período da vida em que temos mais dúvidas que certezas: a adolescência. São milhões de estudantes do ensino médio, todos os anos, que se dedicam aos estudos para obter uma vaga na universidade, mesmo com tantas dúvidas. Dentre as diversas áreas, temos acompanhado, seja pelo noticiário ou pela divulgação de resultados de pesquisas publicadas na área de formação de professores, a falta de interesse dos jovens para cursar uma licenciatura. É notório, também, pela baixa concorrência nos vestibulares e no Sisu/MEC. Uma possível causa dessa falta de interesse pela carreira docente seja o baixo salário ofertado pelos sistemas de ensino, em sua maioria, públicos. Apesar da regulamentação e aplicação do Piso Nacional para Professores da Educação Básica, criado em 2009, diversos estados e municípios alegam não ter condições de arcar com o 284 reajuste anual. Quando comparamos a média salarial de um professor com o de outros profissionais com ensino superior, vemos uma diferença acentuada. Outro fator que pode afetar a opção pela carreira de professor é a condição de trabalho. Escolas não possuem infraestrutura mínima de ensino, alunos violentam professores, verbal e fisicamente, e como conseqüência, docentes se afastam das aulas por motivos de saúde. Segundo pesquisa realizada pela Apeoesp (Sindicato dos Professores do Estado de São Paulo) (Menezes, 2013), 44% dos professores da rede estadual sofreram algum tipo de violência (39% deles sofreram agressão verbal, 10% sofreram assédio moral, 6% sofreram bullying e 5 % deles, agressão física). Em geral, o alvo dessa violência são professores do sexo masculino e que lecionam no ensino médio: 65% foram agredidos de alguma forma. Além da violência, a questão da saúde do professor tem sido acompanhada e estudada por pesquisadores da área da medicina do trabalho. Dentre as doenças diagnosticadas, são comuns os diagnósticos de bursite, problemas nas pregas vocais, depressão e, mais recentemente, a Síndrome de Burnout. Essa síndrome consiste no esgotamento físico e mental de um indivíduo, provocado pelo trabalho. (Carlloto, 2002; Almeida et al, 2011) Em relação ao interesse de alunos do ensino médio para cursar uma licenciatura, segundo estudo realizado pela Fundação Carlos Chagas e coordenado pela professora Bernadete Gatti, somente 2% dos alunos de ensino médio entrevistados disseram ter como primeira opção a escolha pela licenciatura. Além desse dado, a pesquisa também investigou o perfil dos alunos ingressantes em cursos de licenciatura em todo o Brasil, com base no Censo Escolar de 2007. A maioria dos alunos ingressantes é proveniente das classes C e D, oriundos de escolas públicas e que “têm dificuldades com a língua, com a leitura, escrita e compreensão de texto” (GATTI et al., 2009, p.14). A seguir, uma análise das respostas dos alunos ingressantes no ano de 2013. É importante lembrar que foram aplicados 35 questionários, em ambos os períodos. O questionário foi composto por 24 questões. 285 Análise dos Resultados Em relação ao primeiro grupo de informações (idade, sexo e estado civil), aproximadamente 34% dos ingressantes têm menos de 21 anos e quase metade deles possui 26 anos ou mais. A divisão entre homens e mulheres é praticamente igual, levemente predominada pela parte masculina, dezenove para quinze, respectivamente. Um aluno não respondeu. Quanto ao segundo grupo analisado (formação escolar), exatamente 80% dos ingressantes cursaram o Ensino Médio integralmente em escola pública, predominantemente estadual (86%), enquanto que pouco menos de 6% realizaram tal estudo integralmente em escola particular. É importante destacar que dezesseis alunos ingressantes concluíram o Ensino Médio há mais de cinco anos, o que nos dá quase 46% dos alunos. Oitenta e seis por cento dos discentes demoraram mais de dois anos para ingressar no curso e somente cinco alunos ingressaram no Ensino Superior assim que concluíram o Ensino Médio. Além disso, 54% dos pesquisados cursaram o Ensino Médio no período diurno e, apenas, seis deles frequentaram cursinho preparatório. No processo seletivo para o curso, 57% dos ingressantes conquistaram na primeira vez em que se candidataram à vaga, com 40% considerando fácil a aprovação para o curso. Perguntados se optariam novamente pelo curso de Licenciatura em Matemática caso não tivessem sido aprovados, 60% disseram que sim, 74% afirmaram que tentariam novamente a vaga, mesmo com a certeza da aprovação em qualquer outro curso. Porém, dos trinta e cinco ingressantes, apenas onze pretendem ter a atividade de docência como ocupação principal após se graduarem. Do restante, oito asseguraram que não pretendem e quinze deles disseram que, talvez, poderiam ter a docência como a principal ocupação. (um aluno não respondeu). Além das informações apresentadas no parágrafo anterior, o terceiro grupo de questões tinha como objetivo observar as influências que os alunos tiveram na decisão de cursar Licenciatura em Matemática. Cerca de 40% das respostas estavam vinculadas a fatores ligados à Matemática, enquanto que pouco mais de 20% delas associavam-se com fatores ligados à atividade docente, 23% relacionadas ao mercado de trabalho e os 286 16% restantes referem-se a “outros” diferentes fatores, dentre eles a influência de familiares, professores e falta de opções. No último grupo de informações analisado, referente às condições socioeconômicas e escolaridade dos pais, constata-se que 63% dos discentes possuem uma atividade remunerada atualmente, sendo que a grande totalidade (57%) destes já a exerciam antes de iniciarem o curso e 23% são os principais responsáveis pelo sustento da família. Oitenta e três por cento dos ingressantes afirmam ter renda familiar de 1 a 2 ou 2 a 5 salários mínimos, sendo que 34% dos alunos não contribuem com o sustento da família. Treze alunos não possuem automóvel na residência e vinte e nove possuem, pelo menos, um computador em casa. Por fim, em relação a escolaridade dos pais, o número de pais e mães que não concluíram o Ensino Fundamental foi o mesmo, dezesseis, o que representa 46% em ambos os casos. Assim, ao nos depararmos com os resultados obtidos, algumas observações nos chamaram a atenção e se destacaram perante outras. O fato de os alunos pesquisados não formarem um grupo tão jovem e, em grande parte, solteiros, somado com o tempo, hipoteticamente, sem estudo após concluir o Ensino Médio, realça a idéia de que mesmo tardiamente, o interesse em ingressar no Ensino Superior é mantido. Por outro lado, visto que um terço dos ingressantes cursou ou estão cursando outro curso superior, não podemos descartar a possibilidade de interpretarmos a procura pela licenciatura como a busca de uma segunda profissão, desejo de ampliar as oportunidades profissionais ou até mesmo, como um fortalecimento de um ensino da educação básica, em geral, incipiente, do qual a quase totalidade dos ingressantes na Licenciatura em Matemática foram submetidos. Fato este último, condizente com o perfil dos alunos ingressantes na licenciatura, que, segundo Moreira et al (2012) e Gatti et al (2009) são provenientes de escola pública, cursada em sua grande parte no período noturno. No nosso caso, não fizemos essa análise separadamente. Dentre as influências na escolha do curso, os fatores que predominaram para os estudantes foram: Identificação com o curso; Interesse por dar aula; Facilidade com a Matemática; A Matemática desenvolve o raciocínio lógico; Gostar de Matemática, Mercado de trabalho e Concursos. Porém, além desses, outros argumentos foram apresentados, como: “Possibilidade de eliminar disciplinas em outro curso (Engenharia)”, “Quero aprender Matemática para cursar engenharia e, também, para 287 dar aula” e “ampliar a oportunidade profissional”. Para completar, juntamente com o fato de, apenas, onze dos alunos ingressantes afirmarem o interesse na atividade docente ao final do curso, nos faz ter a visão de que o curso de Licenciatura de Matemática, nesse caso, está sendo usado como “trampolim” para outros cursos de graduação. Ou seja, alguns discentes vêem no curso de Licenciatura em Matemática, um modo de se prepararem para ingressar em outro curso superior, muitas vezes por meio de transferência ou vestibular (situação esta vivenciada pelos professores-autores deste trabalho, ao ministrar disciplinas para alunos ingressantes) ou, então, para ter um melhor desempenho nos concursos públicos. Essa falta de interesse pela carreira docente busca por outras profissões, retratadas acima, não deixam de ser consequências das más condições de trabalho e baixa remuneração que os futuros professores estariam a enfrentar, já mencionadas anteriormente no texto. É diante deste panorama que, cursos considerados mais conceituados no âmbito financeiro e do status social bem como concursos públicos em carreira de técnico e com melhores salários têm despertado o interesse de alguns destes ingressantes. No entanto, embora boa parte (quinze alunos) não demonstre segurança na docência como ocupação principal, fica evidente que o gosto pela matemática se faz presente na decisão do aluno quanto a ingressar na Licenciatura em Matemática, visto que muitos optariam novamente pela vaga mesmo se não a tivessem conseguido, inclusive, mesmo com a vaga garantida em qualquer outro curso. Podemos dizer que prevalece o gosto pela matemática, apesar de possuírem dúvidas quanto à escolha da profissão. Outra observação a se destacar é que, embora alguns alunos tenham cursado outro curso superior antes de ingressarem no curso de matemática, o fato de alguns deles exercerem atividade remunerada há algum tempo e participar da renda familiar, pode ser um dos motivos que justifique o ingresso tardio no Ensino Superior. Mesmo que o ingresso tenha sido tardio, nota-se que a grande maioria dos está superando o nível de escolarização de seus pais, o que para muitas destas famílias significa a oportunidade de ascensão social e visto como uma grande conquista. Em relação à renda familiar, há uma predominância na faixa de 1 a 5 salários mínimos, apesar da expansão do crédito e poder de compra das famílias brasileiras, cinco famílias ainda não possuírem computador e treze não possuírem automóvel em 288 suas residências. Desse último, vimos a necessidade de indagar o meio de transporte utilizado para chegar à universidade, ou o trajeto residência-trabalho, pois muitos alunos possuem motocicleta e no município de Rondonópolis há uma grande frota desse veículo. Considerações finais Quando os autores se depararam com alguns relatos e situações ocorridas com os discentes ingressantes no curso Licenciatura em Matemática da UFMT – Campus de Rondonópolis, veio, então, o interesse em analisar o perfil e, principalmente, o real interesse que os levaram a optar pela Matemática. Sintetizado os dados obtidos, podemos esboçar um perfil do aluno ingressante: equilíbrio quanto a idade e sexo, na grande maioria solteiro, advindo do ensino público, sendo o gosto pela matemática o fator predominante na escolha pelo curso de licenciatura. Além disso, a maioria deles contribui para o sustento da família, possui renda familiar entre 1 e 5 salários mínimos e pais com baixa escolarização. Vale destacar que, ao analisarmos os questionários, diagnosticamos diferenças notáveis nas respostas quando comparamos os turnos vespertino e noturno, diferenças estas que, em certas questões, influenciaram consideravelmente o resultado final, o que nos dá a motivação para realizar estudos posteriores, visando esse detalhamento. Encerrado este trabalho e de posse de um perfil do aluno ingressante, embora não consigamos solucionar de forma definitiva a falta de interesse na profissão apresentada por alguns, podemos utilizar esses resultados para subsidiar discussões e reflexões que possam tornar o curso mais atraente, em especial para aqueles que ainda possuem dúvidas sobre o curso e a carreira, além de superar expectativas e solidificar o desejo pela profissão professor que, de forma tímida, já a desejavam. As informações obtidas neste estudo poderão subsidiar reflexões em nosso Colegiado de Curso e Departamento de Matemática, no qual estamos lotados. E, quem sabe nossa experiência, mesmo simples, venha contribuir em outros cursos de licenciatura. Afinal, conhecer o perfil do estudante que ingressa no curso de Matemática 289 fará com que repensemos a estrutura do curso, visando acompanhar as mudanças ocorridas na sociedade e, em particular, no espaço escolar, vejamos com outro olhar a questão do abandono e evasão nas licenciaturas, identifiquemos necessidades e possíveis dificuldades que os licenciandos venham a enfrentar nas diferentes disciplinas e questionemos nossas práticas, enquanto formadores de professores. Como continuidade do estudo, vemos a importância de manter a dinâmica de conhecer o aluno ingressante e ampliá-lo para identificar o perfil dos alunos formandos, futuros egressos do curso de Matemática. Dessa forma, será possível avaliarmos o curso e o trabalho pedagógico realizado, de suas contribuições e influências para a formação matemática e didática do egresso e a sua escolha, ou não, pela profissão professor. Referências ALMEIDA, C. V.; SILVA, C.; CENTURION, P.; CHIUZI, R. M. Síndrome de Burnout em professores: um estudo comparativo na região do Grande ABC Paulista. Revista Eletrônica Gestão e Serviços. São Paulo, v.2, n.1, jan/jul.2011. p.276-291. BRASIL. Escassez de professores no Ensino Médio: Propostas estruturais e emergenciais. CNE/ CEB. 2007. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/escassez1.pdf>. Acesso em: 12 nov. 2013. CARLLOTO, M. S. A Síndrome de Burnout e o trabalho docente. Psicologia em Estudo, Maringá, v.7, n.1, p. 21-29, jan./jun 2002. GATTI, B. et al. Atratividade da carreira docente no Brasil. Relatório Preliminar. Fundação Carlos Chagas, São Paulo, 2009. MENEZES, L. Violência escolar: o professor sob ameaça. Folha Dirigida, Suplemento de Educação, Out/2013, p. 16. Disponível em <www.apeoesp.org.br>. Acesso: 03 dez. 2013. MOREIRA, P. C. et al. Quem quer ser professor de matemática. Zetetiké. v.20, n.37, jan/jun 2012. 290 Anexo: Questionário Questão 1) Idade: (12) Abaixo de 21 anos (06) 21-25 anos (10) 26-30 anos (06) 30-40 anos (01) Acima de 40 anos Questão 2) Sexo: (19)Masculino (15)Feminino NR: 1 Questão 3) Estado Civil: (23) Solteiro (10) Casado (02) Divorciado (0) Viúvo Questão 4) Ano de Conclusão do Ensino Médio: (05) ano anterior (10) há 2-3 anos (04) há 4-5 anos (16) mais de 5 anos Questão 5) Em que tipo de escola você cursou o Ensino Médio? (28) Integralmente em escola pública 291 (05) Parcialmente em escola pública (02) Integralmente em escola particular Questão 6) Se assinalou o 1º ou 2º item na questão anterior, identifique o tipo de escola pública (0) Federal (30) Estadual (03) Municipal NR: 2 Questão 7) Anos para concluir o Ensino Médio (25) 3, isto é, sem reprovação (05) 4 anos (02) Mais de 4 anos (03) Suplência Questão 8) Turno em que cursou o Ensino Médio (19) Diurno (16) Noturno Questão 9): Quantas vezes prestou vestibular para a Licenciatura em Matemática? (20) Uma vez (13) 2-3 vezes (0) Mais de 3 vezes (02) Transferência Questão 10) Você já cursou ou está cursando outro curso superior? (11) Sim 292 (24) Não Questão 11) Fatores que influenciaram a decisão pela licenciatura em matemática: 1.Fatores ligados à matemática (11) Facilidade com a matemática (16) Porque a matemática desenvolve o raciocínio lógico (24) Gostar da matemática (07) Outros: - A falta de profissionais ligados à área de matemática - Falta de opção - Adquirir conhecimento para prestar vestibular para o curso de Engenharia Nuclear -Possibilidade de eliminar disciplinas em Ciências Contábeis e Engenharia - Aulas de Ciências Biológicas no 9º ano exigem saber um pouco de Matemática, então ajuda a relembrar o conteúdo - Quero aprender Matemática para fazer engenharia e também para dar aula - Ampliar a oportunidade profissional 2. Fatores ligados à profissão docente (14) Interesse por dar aula (07) Facilidade para ensinar (08) Gostar da área de Educação 3. Fatores ligados ao mercado de trabalho (15) Mercado de trabalho (18) Concursos 4. Outros (14) Identificação com o curso (04) Influência dos professores (02) Influência de parentes (02) Facilidade de passar no vestibular 293 (01) Falta de opções Outros: ______________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ __________________ Questão 12) Você frequentou cursinho pré-vestibular, integrado ou não ao Ensino Médio? (06) Sim (28) Não NR: 1 Questão 13) Se não tivesse passado no vestibular para a licenciatura em matemática, você faria o vestibular de novo para o mesmo curso? (21) Sim (03) Não (09) Talvez NR: 2 Questão 14) Você tem atualmente uma atividade remunerada? (22) Sim (12) Não NR: 1 Questão 15) Por quanto tempo você tem ou teve atividade remunerada em sua vida? (05) Nunca teve (09) Menos de 2 anos 294 (03) 2-5 anos (17) Mais de 5 anos NR: 1 Questão 16) Qual a renda mensal do seu grupo familiar? (0) Menos de 1 salário mínimo (12) De 1 a 2 salários mínimos (17) De 2 a 5 salários mínimos (02) De 5 a 10 salários mínimos (0) De 10 a 15 salários mínimos (01) De 15 a 20 salários mínimos (01) De 20 a 40 salários mínimos (01) Acima de 40 salários mínimos NR: 1 Questão 17) Qual é a sua participação na vida econômica de seu grupo familiar? (10) Não trabalho nem contribuo para o sustento da família (02) Trabalho, mas não contribuo para o sustento da família (13) Trabalho e contribuo em parte para o sustento da família (08) Trabalho e sou o principal responsável pelo sustento da família NR: 2 Questão 18) Qual o nível de escolaridade do seu pai? (16) Não concluiu o Ensino Fundamental (04) Ensino Fundamental completo (06) Ensino Médio completo (06) Ensino Superior completo 295 (02) Não sei NR: 1 Questão 19) Qual o nível de escolaridade de sua mãe? (16) Não concluiu o Ensino Fundamental (05) Ensino Fundamental completo (06) Ensino Médio completo (06) Ensino Superior completo (01) Não sei NR: 1 Questão 20)Quando se graduar, você pretende ter como ocupação principal a atividade de professor de matemática na Escola Básica? (11) Sim (08) Não (15) Talvez NR: 1 Questão 21) Na sua casa (onde mora sua família) há microcomputadores? Quantos? (05) 0 (16) 1 (09) 2 (02) 3 (01) 4 (0) 5 (0) 6 (01) Mais de 6 296 Questão 22) Na sua casa (onde mora sua família) há automóveis? Quantos? (13) 0 (13) 1 (04) 2 (01) 3 (03) 4 (0) 5 (0) 6 (0) Mais de 6 Questão 23) Você considera que foi fácil passar no vestibular para a licenciatura em matemática? (14) Sim (08) Não (11) Mais ou menos NR: 2 Questão 24) Você faria vestibular para a licenciatura em matemática, mesmo que tivesse certeza de que seria aprovado no vestibular para qualquer outro curso? (26) Sim (08) Não NR: 1 Grupo 1: (Idade, Sexo e Estado Civil): 1 a 3. Grupo 2: (Formação Escolar): 4 a 7; 12. Grupo 3: (Ingresso e interesse pelo curso de matemática): 9 a 11, 13, 20, 23, 24. Grupo 4: (Aspectos Socioeconômicos) 14 a 19, 21, 22. 297 A APRENDIZAGEM DA ÁLGEBRA ESCOLAR A PARTIR DOS DEPOIMENTOS DE FUTUROS PROFESSORES: PERCEPÇÕES, COMPREENSÕES, FACILIDADES E DIFICULDADES Flávio de Souza PIRES - UFSCar – SP ([email protected]) Maria do Carmo de SOUSA – UFSCar – SP ([email protected]) Resumo: O presente trabalho é parte de uma pesquisa de mestrado em educação cujo objetivo foi analisar as falas de um grupo de futuros professores de Matemática da cidade de São Carlos, Estado de São Paulo, em relação ao ensino da linguagem algébrica na Educação Básica. A questão que norteou o desenvolvimento da pesquisa foi: O que dizem futuros professores de Matemática sobre o ensino da linguagem algébrica na Educação Básica, a partir das vivências que tiveram e têm na graduação? A pesquisa qualitativa de natureza analítico-descritiva foi realizada com um grupo de estudantes dos cursos de Licenciatura em Matemática da cidade de São Carlos, Estado de São Paulo, que já realizaram estágios nas escolas da Educação Básica. A análise dos dados foi realizada mediante as declarações escritas fornecidas pelos futuros professores, por meio de um único questionário, que foi disposto em categorias. Apresentaremos nessa comunicação os aspectos referentes a categoria: Álgebra, Pensamento Algébrico, e Ensino de Álgebra, que possibilitou a identificação de dificuldades com a aprendizagem de álgebra dos futuros professores desde a Educação Básica, sendo reforçada ao longo da vida acadêmica no ensino superior. Além disso, também foi possível identificar como os futuros professores se preocupam com o ensino quando comparam a álgebra escolar e a acadêmica no âmbito da sua própria aprendizagem, indicando a dissociação entre elas. Palavras-chave: Formação inicial de professores de matemática, Educação algébrica, Educação matemática. 298 Introdução Esta comunicação está relacionada a pesquisa de mestrado em educação de Pires (2012) realizada no período de março de 2010 a fevereiro de 2012, intitulada: Álgebra e formação docente: o que dizem futuros professores de matemática. A discussão proposta aqui é apenas um fragmento das atividades realizadas durante o período de investigação, mais especificamente no que diz respeito a educação algébrica e a formação inicial de professores de matemática, perpassando pela fundamentação teórica em que foi alicerçada as análises, os procedimentos e instrumentos metodológicos que foram utilizados e uma breve análise dos depoimentos escritos dos licenciados, colaboradores da pesquisa. A investigação teve como foco a formação inicial do professor de Matemática da educação básica, cujo principal objetivo foi analisar as falas de um grupo de futuros professores de Matemática da cidade de São Carlos, estado de São Paulo, em relação ao ensino da linguagem algébrica na educação básica. A motivação para realizar essa investigação surgiu no período em que estudava Álgebra no curso de formação inicial, as experiências nos estágios obrigatórios do curso e à outras atividades docentes vivenciadas, que foram significativas para o meu processo de constituição do vir a ser professor, uma vez que foram através delas que tive tempo e oportunidade para as reflexões e questionamentos que proporcionaram a gestação dessa investigação, uma inquietação relacionada ao ensino de álgebra na educação básica, sem contudo dissociar minhas experiências acadêmicas e - mesmo que poucas - profissionais. Metodologia Para atingir os objetivos propostos nesse trabalho realizou-se uma pesquisa qualitativa de natureza analítico-descritiva a fim de responder a seguinte questão: O que dizem futuros professores de Matemática sobre o ensino da linguagem algébrica na Educação Básica, a partir das vivências que tiveram e têm na graduação? A escolha dessa metodologia de pesquisa se deve ao fato de que para Borba (2004) a pesquisa qualitativa tem ganhado vulto em Educação Matemática, principalmente nos Programas de Pós-Graduação, devido as suas contribuições, e ainda ressalva que: 299 [...] pesquisa qualitativa deve ter por trás uma visão de conhecimento que esteja em sintonia com procedimentos como entrevistas, análises de vídeos, etc. e interpretações. O que se convencionou chamar de pesquisa qualitativa, prioriza procedimentos descritivos à medida que sua visão de conhecimento explicitamente admite a interferência subjetiva, o conhecimento como compreensão que é sempre contingente, negociada e não é verdade rígida. O que é considerado "verdadeiro", dentro desta concepção, é sempre dinâmico e passível de ser mudado. Isso não quer dizer que se deva ignorar qualquer dado do tipo quantitativo ou mesmo qualquer pesquisa que seja feita baseada em outra noção de conhecimento. (p.2) Além da natureza qualitativa, a pesquisa também apresentou um enfoque analítico, já que buscou analisar as falas de um grupo de futuros professores. Dessa maneira, também foi caracterizada como descritiva, que segundo Gil (2008), tem como principal objetivo a descrição das características de determinada população ou fenômeno, tendo como atributos mais significativos a utilização de técnicas padronizadas de coleta de dados, como o questionário, por exemplo. Uma pesquisa é considerada descritiva para Fiorentini, Lorenzato (2009) quando o pesquisador deseja descrever ou caracterizar com detalhes uma situação, fenômeno ou problema. Geralmente esse tipo de investigação utiliza observação sistemática (não etnográfica) ou a aplicação de questionários padronizados, a partir de categorias previamente definidas. A pesquisa utilizou de recursos como o questionário, de modo que pudesse alcançar o seu objetivo principal. Assim, a organização e análise de dados foram imprescindíveis para a elaboração e sucesso da pesquisa, a qual contou com a ajuda de procedimentos de categorização. Para Bogdan, Biklen (1994), [...] embora os dados quantitativos recolhidos por outras pessoas (avaliadores, administradores e outros investigadores) possam ser convencionalmente úteis tal como foram descritos, os investigadores qualitativos dispõem-se à recolha de dados quantitativos de forma crítica. Não é que os números por si não tenham valor. Em vez disso, o investigador qualitativo tende a virar o processo de compilação na sua cabeça perguntando-se o que os números dizem acerca das suposições das pessoas que os usam e os compilam. [...] Os investigadores qualitativos são inflexíveis em não tomar os dados quantitativos por seu valor facial (p. 195). 300 A construção dos dados foi realizada com a participação de um grupo de estudantes dos cursos de Licenciatura em Matemática, composto por 68 colaboradores, da cidade de São Carlos, Estado de São Paulo, que já realizavam estágios nas escolas da educação básica. A análise dos dados foi realizada mediante declarações escritas fornecidas pelos futuros professores por meio de um único questionário, que foi disposto em categorias. O questionário misto estava composto por três momentos distintos: o primeiro envolveu aspectos referentes à Álgebra, Pensamento Algébrico, e Ensino de álgebra; o segundo contemplou mais especificamente o movimento de formação de professores; e o terceiro procurou identificar o perfil dos futuros professores. Para análise e interpretação dos dados nos aproximamos dos procedimentos descritos por (FIORENTINI, LORENZATO, 2009, p. 134) para o processo de categorização, que significa, nada mais nada menos, que um processo de classificação ou de organização de informações em categorias, isto é, em classes ou conjuntos que contenham elementos ou características comuns. Nesse trabalho priorizamos somente uma das categorias referente ao primeiro aspecto do questionário: Álgebra, Pensamento Algébrico, e Ensino de álgebra; a qual apresentaremos as análises realizadas a seguir: A álgebra da Educação Básica: o olhar daqueles que vivem em seus contrários Após uma leitura geral das repostas fornecidas pelos licenciandos realizou-se uma primeira análise que permitisse aos depoimentos falarem e expressarem o que parece estar explícito nas entrelinhas das falas. Vale a pena ressaltar que, essa atividade, a de interpretar os dizeres dos licenciandos, não é neutra nem tampouco uma verdade absoluta. As interpretações realizadas aqui foram feitas a partir dos óculos do pesquisador, das suas próprias crenças, experiências de vida, valores e visão de mundo, sejam elas a respeito da 301 educação, da escola, da matemática, do ensino da linguagem algébrica e da formação de professores, elementos esses que ora se associam e dissociam, ora conversam dialeticamente ou se contrapõem nos depoimentos. Dessa maneira, os pesquisadores colocaram seus óculos para tentar compreender o dizer dos licenciandos acerca do ensino de álgebra. Os fragmentos apresentados nesse texto são análises das falas dos licenciandos em relação à questão “Escreva um pouco sobre a álgebra que aprenderam até agora, tanto no Ensino Fundamental e Ensino Médio quanto no Ensino Superior, indicando suas percepções, compreensões, facilidades e dificuldades”. Ao responder à questão, alguns separaram explicitamente a aprendizagem que tiveram na Educação Básica e no Ensino Superior, enquanto outros compararam as duas. Vamos apresentar a resposta em três momentos: aprendizagem da linguagem algébrica na Educação Básica, aprendizagem da linguagem algébrica no Ensino Superior e comparações entre as duas aprendizagens. Nos fragmentos abaixo estão expostas as falas dos licenciandos em relação à álgebra que tiveram, enquanto estavam cursando a educação básica: Durante o Ensino Médio e Fundamental sempre tive facilidade nos estudos referentes a álgebra (...). (LICENCIANDA 1, questionário 23/08/2010, grifo nosso). De um modo geral, a álgebra aprendida no Ensino Fundamental e médio é bem mais simples (...). (LICENCIANDA 11, questionário 25/08/2010, grifo nosso). Para mim até o fim do meu Ensino Médio, a álgebra e todos os outros campos da Matemática eram muito simples para mim, (...). (LICENCIANDA 13, questionário 25/08/2010, grifo nosso). No Ensino Fundamental e Médio, não tive muita dificuldade em álgebra, (...). (LICENCIANDA 14, questionário 25/08/2010, grifo nosso). A álgebra sempre me fascinou muito. Nunca tive muita dificuldade. (...) (LICENCIANDA 16, questionário 25/08/2010, grifo nosso). A álgebra do Ensino Médio para mim foi mais fácil, sempre tive facilidades na Matemática geral. (...) (LICENCIANDO 18, questionário 25/08/2010, grifo nosso). Tive facilidade com a maioria dos conceitos como função, variável, produtos notáveis, polinômios, sistemas lineares, matrizes, determinante, equações, (...) (LICENCIANDO 20, questionário 25/08/2010, grifo 302 nosso). (...) Já tinha facilidade com álgebra, principalmente na resolução de equações. (...) (LICENCIANDA 24, questionário 26/08/2010, grifo nosso). A álgebra no Ensino Fundamental e no Ensino Médio sempre foi de certo mais fácil, aliás, bem mais fácil, (...) (LICENCIANDO 25, questionário 26/08/2010, grifo nosso). Nessas falas podemos perceber a facilidade e a naturalidade como os licenciandos veem a álgebra da educação básica, seja em relação à aprendizagem, ao processo como foi ensinada ou à afinidade devido à compreensão que já possuíam da própria Matemática e da álgebra. Em contrapartida, o mesmo grupo de licenciandos deixa claro algumas dificuldades em relação à aprendizagem dos conteúdos referentes à álgebra desse nível de ensino, como podemos verificar abaixo nos vestígios de incompreensão: (...) tinha dificuldades em entender, o conceito de inequação, principalmente multiplicando por número negativo. (LICENCIANDO 20, questionário 25/08/2010, grifo nosso). (...) O Ensino Fundamental e médio mostrou uma álgebra difícil onde o importante é encontrar uma solução para o problema. (...) (LICENCIANDO 23, questionário 25/08/2010, grifo nosso). Bom tanto no Ensino Fundamental quanto no Ensino Médio não tinha clareza dos vários sentidos que a incógnita apresenta, dependendo do conteúdo trabalhado. (LICENCIANDA 21, questionário 25/08/2010, grifo nosso). A álgebra como a maioria das áreas da Matemática tem no início um conteúdo fácil e que a maioria dos alunos não tem dificuldades em entender, mas quando começa o Ensino Médio e começa a introdução do conteúdo de função começa a gerar dúvidas. (LICENCIANDA 28, questionário 26/08/2010, grifo nosso). Na realidade eu só fui aprender álgebra no meu 3º colegial, nas series anteriores onde eu realmente deveria ter aprendido, eu apenas decorei o conteúdo. Eu fiz três anos de cursinho e por incrível que pareça aprendi bastante álgebra lá, as incógnitas, as equações, e inequações começaram a fazer sentido. (LICENCIANDA 17, questionário 25/08/2010, grifo nosso). Do Fundamental ao Médio, apesar da minha facilidade, não tinha ideia de “fechamento” – interligação de todo conteúdo – de álgebra em si e outros conteúdos. A maturidade para ver essa “unidade” na álgebra somente ocorreu no cursinho. (...) 303 (LICENCIANDO 52, questionário 23/09/2010, grifo nosso). Enquanto estava no Ensino Fundamental e Médio, eu não tinha um conceito de álgebra, apesar de realizar cálculos com incógnitas, mas fazia todos os cálculos sem grande dificuldade e encontrava o valor de x (mesmo sem compreender a finalidade disso). (...) (LICENCIANDA 5, questionário 23/08/2010, grifo nosso). Durante o Ensino Fundamental não dava muita importância para os estudos, não entendia muito bem de álgebra, foi no começo da 8ª série que as coisas começaram a ficar claro para mim. No Ensino Médio percebi que álgebra não era um bicho de 7 cabeças e passei a achar a Matemática umas das matérias mais favoritas. (...) (LICENCIANDO 7, questionário 23/08/2010, grifo nosso). Conceitos relacionados à inequação, funções e variáveis são os que aparecem como mais difíceis ou incompreensíveis. A justificativa dos próprios licenciandos a essa dificuldade se deve ao fato de como a álgebra lhes fora ensinada e não devido à sua abstração, como disseram anteriormente em outra questão, ou porque a matemática é difícil. Em algumas falas podemos perceber que a partir do momento em que compreenderam o conteúdo através da prática de alguns professores, as dificuldades com os conceitos algébricos foram diminuindo. Essa hipótese pode ser reforçada quando relacionamos essas dificuldades às seguintes falas: No Ensino Fundamental e Médio aprendi métodos eficientes para a resolução de problemas de forma a preparar para o vestibular. Funções, equações e polinômios eram dados pelo professor de forma prática, sem que o conteúdo fosse muito trabalhado. (...) (LICENCIANDO 46, questionário 27/09/2010, grifo nosso). A álgebra do colégio tem aplicações práticas (....) (LICENCIANDO 54, questionário 24/09/2010, grifo nosso). Lembro que comecei a ver álgebra na 7ª série. Achei legal a ideia de trabalhar com valores indefinidos – incógnitas. No Ensino Médio lembro que eram aulas bem tradicionais e os exercícios eram retirados de provas dos vestibulares. (...) (LICENCIANDA 56, questionário 24/09/2010, grifo nosso). 304 Acredito que não tive muitas dificuldades quando comecei a aprender álgebra, pois tive professores de Matemática muito bons que influenciaram na minha escolha de carreira. (...) (LICENCIANDO 8, questionário 23/08/2010, grifo nosso). A partir do momento em que compreendeu, aprendeu. Os licenciandos ainda fornecem alguns vestígios de como essa álgebra incompreensível lhes era ensinada: No colégio, tanto no Ensino Médio e fundamental percebo que a álgebra ensinada visava a resolução de exercícios. Não me lembro de nenhum momento em que tive que pensar ou desenvolver alguma conclusão. A álgebra que vi foi apenas treinada até o ingresso no Ensino Superior. (...) (LICENCIANDO 2, questionário 23/08/2010, grifo nosso). No Ensino Médio, apesar de não fazer tanto sentido como agora faz, aprendi de forma não muito aprofundada, isso de fato refletiu e muito na universidade. Para mim durante o Ensino Médio o aluno que tenha preferência ao curso de Matemática, a exatas em geral, deveria ter uma formação mais aprofundada. (...) (LICENCIANDO 9, questionário 23/08/2010, grifo nosso). Lembro que sempre tive dificuldades no aprendizado dos conceitos algébricos. A álgebra do Ensino Médio e Fundamental que visualizei possuem a características de serem ensinadas de forma tradicional e mecânica. (...) (LICENCIANDA 36, questionário 27/09/2010, grifo nosso). Sempre tive (e tenho) dificuldade com álgebra. Aprendi álgebra através de exercícios muito simples e todos parecidos. (...) (LICENCIANDO 44, questionário 27/09/2010, grifo nosso). Minha trajetória estudantil foi em algumas ocasiões defasada e em outros momentos os professores passaram por cima do conteúdo. (LICENCIANDO 48, questionário 27/09/2010, grifo nosso). Eles consideram o fato de seus professores utilizarem a resolução de exercícios, o treino, aulas tradicionais e mecânicas que priorizavam exercícios simples e todos parecidos, além da desconsideração desses conteúdos, utilizam-na medida em que utilizam o termo “os professores passaram por cima do conteúdo”, uma consequência de suas dificuldades na aprendizagem dos conceitos algébricos. No entanto, essas 305 questões também os colocam em reflexão quando se projetam na profissão, pensando em sua futura docência e tendo como base suas próprias experiências como estudantes: No Ensino Médio e fundamental a álgebra desperta, assim como despertava em mim, aquela pergunta corriqueira dos alunos: “mas é letra?” letra não é número? Essa eu considero a maior dificuldade, fazer com que os alunos entendam o conceito de incógnita, variável e parâmetro, que para mim até poucos dias atrás significavam a mesma coisa. (LICENCIANDO 26, questionário 26/08/2010, grifo nosso). (...) Tenho plena certeza da necessidade de capacitar o aluno com essa linguagem, pois com ela será possível compreender fenômenos de nosso dia-a-dia e da própria Matemática, mas não podemos querer aplicá-la em todos os problemas, pois mesmo admitindo fluência ela não representa a subjetividade. (LICENCIANDO 19, questionário 25/08/2010, grifo nosso). (...) só penso que a álgebra demora muito para aparecer no Ensino Fundamental o que dificulta o entendimento dos alunos. (LICENCIANDA 16, questionário 25/08/2010, grifo nosso). Os licenciandos se posicionam a partir de suas experiências para repensar o ensino desses conceitos (caracterizá-los). Todavia, não deixam de nos dizer o que é a álgebra, fato importante para pesquisa, afinal de contas, essa compreensão é de certa forma, um olhar que pode desvelar caminhos que poderão ser traçados quando estiverem ensinando a linguagem algébrica: (...) Pensava na álgebra como método para se descobrir incógnitas. (...) (LICENCIANDA 41, questionário 27/09/2010, grifo nosso). A álgebra que aprendi no Ensino Fundamental e médio tratava-se de resolver funções, equações e polinômios. (...) (LICENCIANDA 27, questionário 26/08/2010, grifo nosso). A álgebra que aprendi no Ensino Fundamental estava atrelada à resolução de equações do primeiro e segundo graus essencialmente. (...) (LICENCIANDA 35, questionário 27/09/2010, grifo nosso). (...) acredito que a colaboração da álgebra a esses níveis foi no sentido do desenvolvimento da lógica e da abstração e não nos conteúdos em si. (...) (LICENCIANDA 50, questionário 24/09/2010, grifo nosso). 306 (...) Essa motivação que a álgebra tem de generalizar tudo me encanta, (...) (LICENCIANDA 16, questionário 25/08/2010, grifo nosso). Álgebra para mim é uma confluência de conceitos e raciocínio. A linguagem algébrica pode parecer cheia de regras e cheia de facetas a serem decoradas, mas uma vez entendido a lógica dessa linguagem seus símbolos e intenções vão surgindo naturalmente. (...) (LICENCIANDO 19, questionário 25/08/2010, grifo nosso). A álgebra sempre foi uma das áreas da Matemática que mais me agradaram, por ser “matemática”, objetiva e exigir raciocínio, (...) (LICENCIANDA 12, questionário 25/08/2010, grifo nosso). Há licenciandos que veem a álgebra como uma ferramenta para resolver problemas ou uma poderosa ferramenta para generalização, não descartando a possibilidade de ser uma linguagem que possui seus próprios símbolos, métodos e objetividade. Além disso, percebemos como estava presente nos currículos da Educação Básica dos licenciandos quando foram estudantes: No Ensino Fundamental o que predominava era a álgebra, me lembro muito pouco de ter visto outras “partes” da Matemática. Já no Ensino Médio, vários conteúdos não foram passados, por exemplo, números complexos. (...) (LICENCIANDA 6, questionário 23/08/2010, grifo nosso). No meu Ensino Fundamental e médio eu tinha grande facilidade de aprender, estudar e ensinar álgebra. Sempre achei muito mais atrativo estudar álgebra do que geometria. (...) (LICENCIANDA 4, questionário 23/08/2010, grifo nosso). As falas dos licenciandos apresentam uma série de conteúdos que estudaram na Educação Básica: Tive facilidade com a maioria dos conceitos como função, variável, produtos notáveis, polinômios, sistemas lineares, matrizes, determinante, equações, (...) (LICENCIANDO 20, questionário 25/08/2010, grifo nosso). No Ensino Médio e Fundamental aprendi todo o conteúdo desse nível, entre equações, inequações, funções, sistemas lineares etc. Já tinha facilidade com álgebra, principalmente na resolução de 307 equações. (...) (LICENCIANDA 24, questionário 26/08/2010, grifo nosso). A álgebra que aprendi no Ensino Fundamental e médio tratava-se de resolver funções, equações e polinômios. (...) (LICENCIANDA 27, questionário 26/08/2010, grifo nosso). No Ensino Fundamental me lembro vagamente, mas lembro que gostava muito de resolver as equações, eu via como um jogo, e adorava encontrar qual o valor de x que satisfazia as equações, o valor da incógnita. No Ensino Médio, me lembro ao aprender funções, e achava interessante representar graficamente o que era escrito como uma equação. (...) (LICENCIANDO 30, questionário 26/08/2010, grifo nosso). (...) Os conteúdos aprendidos no Ensino Fundamental e Ensino Médio são: Função, equação, variável, incógnita. (...) (LICENCIANDA 31, questionário 26/08/2010, grifo nosso). Até este momento no Ensino Fundamental e Médio aprendi funções, expressões, equações, inequações e provavelmente algum conteúdo que não me recordo. (...) (LICENCIANDO 32, questionário 27/09/2010, grifo nosso). A álgebra que aprendi no Ensino Fundamental estava atrelada à resolução de equações do primeiro e segundo graus essencialmente. Os outros conteúdos estavam relacionados a geometria e aritmética. No Ensino Médio, começou o estudo algébrico dos conjuntos numéricos, e que é complementado com maior profundidade (...) (LICENCIANDA 35, questionário 27/09/2010, grifo nosso). No Ensino Fundamental e Médio aprendi métodos eficientes para a resolução de problemas de formar a preparar para o vestibular. Funções, equações e polinômios eram dados pelo professor de forma prática, sem que o conteúdo fosse muito trabalhado. (...) (LICENCIANDO 46, questionário 27/09/2010, grifo nosso). A álgebra que vi no Ensino Fundamental e médio são as funções, as operações, matrizes, sistemas, entre outros. (...) (LICENCIANDA 57, questionário 24/00/2010, grifo nosso). No ensino básico aprendi apenas manipulações algébricas (simplificar ou igualar expressões) e as raízes de polinômios no 3º ano, sendo nada formal apenas com exercícios. (...) Era bem fácil a álgebra do ensino básico por ser pragmática e repetitiva, (...) (LICENCIANDO 58, questionário 24/09/2010, grifo nosso). Equação do primeiro grau e suas resoluções, determinar incógnitas, sistemas de equação, equação do segundo grau, polinômios, minha percepção é das equações do 1º grau e 2º grau, são de total importância para resolução de geometria e polinômios, a minha compreensão é aplicação no cotidiano. (LICENCIANDO 61, questionário 23/06/2010, grifo nosso). 308 Em suma, apesar da lista acima parecer grande, os conteúdos que foram citados várias vezes estão relacionados a atividades como: cálculos com incógnitas, manipulações algébricas (simplificar ou igualar expressões), solução de problemas, funções, variável, expressões, produtos notáveis, polinômios, sistemas lineares, matrizes, determinantes, equações e inequações de 1º e 2º grau, raízes de polinômios e conjuntos numéricos. Apesar de todas essas considerações levantadas, a priori, em relação à álgebra da Educação Básica explicitadas pelos licenciandos, alguns deles expõem que não se lembram do que aprenderam, bem como explicitam suas dificuldades: (...) não me recordo como a álgebra me foi apresentada nos ensinos Fundamental e Médio. (...) (LICENCIANDA 12, questionário 25/08/2010, grifo nosso). No Ensino Fundamental e Médio, não tive muita dificuldade em álgebra, apesar de não lembrar de forma clara só tive dificuldades em alguma parte dela. (LICENCIANDA 14, questionário 25/08/2010, grifo nosso). Eu não me lembro a forma que me ensinaram álgebra no Ensino Fundamental. (LICENCIANDA 17, questionário 25/08/2010, grifo nosso). No Ensino Fundamental me lembro vagamente, mas lembro que gostava muito de resolver as equações, eu via como um jogo, e adorava encontrar qual o valor de x que satisfazia as equações, o valor da incógnita. (...) (LICENCIANDO 30, questionário 26/08/2010, grifo nosso). Até este momento no Ensino Fundamental e Médio aprendi funções, expressões, equações, inequações e provavelmente algum conteúdo que não me recordo. (...) (LICENCIANDO 32, questionário 26/08/2010, grifo nosso). No que diz respeito a álgebra tanto no Ensino Fundamental quanto no Ensino Médio, eu não me recordo de praticamente nada daquela época, (...) (LICENCIANDA 50, questionário 24/09/2010, grifo nosso). A álgebra na educação básica eu não lembro, (...) (LICENCIANDO 53, questionário 24/09/2010, grifo nosso). As falas apresentadas acima ora se associam, ora se dissociam. Podem nos oferecer vestígios da existência de dicotomias que devem ser consideradas à luz da compreensão dos processos de ensino e aprendizagem da álgebra que ocorrem na 309 Educação Básica, já que as contradições permitem com que investiguemos as suas causas. Afinal, como alguns podem ter dificuldades e facilidades, compreensões e incompreensões, lembrar e não lembrar dos conteúdos estudados se todos serão professores de matemática e já tiveram ou têm contato com a álgebra? O que mais nos aproxima dessa questão são as falas que nos alertam sobre os processos de ensino desses conteúdos. Considerações finais Houve aqui, a intenção de apresentar a visão global do que os licenciandos parecem dizer sobre a relação que tiveram com a aprendizagem de álgebra, ao mesmo tempo em que nos preocupamos em apresentar algumas particularidades que aparecem nos depoimentos, indicando-nos suas contradições e dicotomias, angústias e dificuldades. Dito em outras palavras, entendemos que, ao apresentar algumas falas, na íntegra, pudemos retomar a ideia inicial do texto: os depoimentos podem se configurar como elementos (...) que se associam e dissociam, conversam dialeticamente ou se contrapõem (...) sobre os processos de ensino e aprendizagem de álgebra. Se arriscarmos a conceituar o ensino de álgebra a partir dos depoimentos dos licenciandos, podemos afirmar que as palavras que melhor expressam o ensino seriam sem sombras de dúvidas: difícil e abstrata. Essa hipótese pode ser reforçada com os estudos de Moreira, David (2003), quando nos convida a repensar a relação entre a matemática escolar e acadêmica, por meio da prática profissional do professor do ensino de Matemática e a dissociação e tensão entre essas duas. Ainda assim, encontramos tensões entre esses dois tipos de conhecimento, e a sua complementaridade fica dissociada da matemática escolar, uma vez que para Moreira, David (2003) citando Ferreira et. al (1997): [...] o processo de formação do professor na licenciatura em matemática, além de veicular saberes considerados “inúteis” (para a prática) e de trabalhar certos saberes “inadequadamente” (com referência à prática), também se recusa — justificando-se de variadas formas, entre as quais a utilização do paradoxal argumento de isso não é objeto da matemática universitária — a 310 desenvolver uma discussão sistemática com os licenciandos a respeito de conceitos que são fundamentais para o processo de educação escolar básica em matemática (p.17). No entanto, para esses pesquisadores, essa dissociação não deveria existir já que são elementos essenciais para a prática docente em matemática e seu ensino. Vale a pena ressaltar que, no prefácio do livro de Moreira, David (2003), Fiorentini diz que os autores procuram em seu estudo apresentar e desenvolver uma concepção de formação matemática do professor, tendo como referência a prática profissional efetiva dos professores na educação básica, o que não difere e nem se contrapõe ao nosso objeto de estudo, uma vez que nosso principal objetivo é o ensino da linguagem algébrica na educação básica a partir das falas dos licenciandos. Para Fiorentini, os estudos dos autores supracitados tem uma concepção que situa “o processo de formação do professor a partir do reconhecimento de uma tensão – e não identidade – entre educação matemática escolar e ensino da matemática acadêmica elementar”; no nosso caso, essa “tensão” pode ser entendida no campo da álgebra acadêmica e da álgebra escolar como uma particularidade da matemática acadêmica e da matemática elementar. Moreira, David (2003) realizam reflexões importantes acerca da matemática escolar e da matemática acadêmica, quando nos ajudam a compreender nossas questões e nos levam a refletir sobre as tensões entre a álgebra científica e a álgebra acadêmica através da matemática. Apresentam-nos, ainda, a crítica de Chervel a Chevallard em relação à passagem do saber científico (ou saber sábio) - aquele da academia - ao saber ensinado- aquela da escola. Assim sendo, é importante esclarecer que Chevallard define transposição didática como o “trabalho que transforma um saber a ensinar em um objeto de ensino (...)” Chevallard (1991, apud MOREIRA, DAVID, 2007, p. 18). Todavia, esse “trabalho” denominado transposição didática apresenta algumas incompatibilidades segundo Moreira, David: Mas o problema é que na sua noção de transposição didática, Chevallard toma a Matemática Científica como a fonte privilegiada de saber à qual o sistema escolar sempre recorre, para se recompatibilizar com a sociedade. E toma, também, esse saber científico, como referência última que permitiria à 311 comunidade dos matemáticos desautorizar o objeto de ensino que não seja considerado, (...) suficientemente próximo ao saber sábio.” (Ibidem). Ou seja, Chevallard (1991 apud MOREIRA, DAVID, 2007), a partir da transposição didática sugere uma concepção de Matemática Escolar excessivamente dominada pela matemática científica, ao passo que Chervel (1990 APUD MOREIRA, DAVID, 2007), ao propor certas reflexões sobre história das disciplinas escolares, tece fortes críticas à visão de que elas sejam mera vulgarização das ciências de referência para um público jovem, isto é, daqueles “conhecimentos que não lhe podem apresentar em sua total pureza e integridade” (p. 18). Segundo esse autor, tal concepção induz à ideia de que o papel da Pedagogia é apenas o de “lubrificante” desse processo de vulgarização. Quanto à relação das disciplinas escolares com a Pedagogia, a visão de Chervel é a de que esta é uma dos constituintes das disciplinas, parte do seu próprio conteúdo: excluir a pedagogia do estudo dos conteúdos é condenar-se a nada compreender do funcionamento real dos ensinos. A pedagogia, longe de ser um lubrificante espalhado sobre o mecanismo, não é senão um elemento desse mecanismo, aquele que transforma os ensinos em aprendizagens” (CHERVEL, p. 182). O autor manifesta um elemento importante da concepção geral da disciplina escolar: ela não pode ser vista meramente como uma “matéria” a ser ensinada, isto é, uma lista de “conteúdos” constituída anteriormente ao processo de ensino escolar. Ao contrário, se constitui historicamente em conjunção com a prática e a cultura escolar. No entanto, para Moreira, David (2007) nenhumas dessas duas concepções são satisfatórias, uma vez que a noção de matemática escolar que deriva da ideia de transposição didática parece reduzir a matemática escolar a uma espécie de didatização da Matemática Científica e são minimizadas as ações dos condicionantes da prática docente e da própria cultura escolar. 312 Já Chervel (1990 apud MOREIRA, DAVID, 2007), ao mesmo tempo em que abre caminho para se conceber a matemática escolar como uma construção associada especificamente à instituição escola, “parece fechar as portas à consideração dos múltiplos mecanismos e processos que condicionam essa construção a partir do exterior do espaço escolar” (p.20). Concordamos com Moreira, David (2007) que se deve equacionar melhor os papéis da matemática científica e da matemática acadêmica de modo a redimensionar a formação do licenciando, uma vez que não se priorize nenhuma das duas. Dessa forma, a álgebra também não deve ser resumida à didatização da álgebra acadêmica e nem a uma construção autônoma das práticas escolares. Referências BOGDAN, R.; BIKLEN, S. A investigação qualitativa em educação: uma introdução às teorias e aos métodos. Porto: Porto Editora, 1994. BORBA, M .C. Pesquisa Qualitativa em Educação Matemática. In: 27ª reunião anual da Anped, 2004, Caxambu, MG. Anais... Minas Gerais: Associação Nacional de Pós Graduação e Pesquisa em Educação, 2004. p. 1-18. FIORENTINI, D. Investigação em Educação Matemática: Percursos Teóricos e Metodológicos. Dario Fiorentini, Sergio Lorenzato. Campinas, SP: Autores Associados, 2009. (Coleção Formação de Professores). GIL, A. C. Como Elaborar Projetos de Pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2008. MOREIRA, P. C. ; DAVID, M. M. M. S. Matemática escolar, matemática científica, saber docente e formação de professores. Zetétike (UNICAMP), Campinas, SP, v. 11, n. 19, p. 57-80, 2003. MOREIRA, P. C. ; DAVID, M. M. M. S. A formação matemática do professor: licenciatura e prática docente escolar. 1. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2007. v. 1. 116 p. PIRES, F. S., Álgebra e formação docente: o que dizem os futuros professores de matemática. 138 f. Dissertação (Mestrado em Educação), Universidade Federal de São Carlos, UFSCar, 2012. 313 UMA COMPREENSÃO DE ÁLGEBRA CONSTRUÍDA PELO OLHAR DAS CONCEPÇÕES DE PROFESSORAS DE ENSINO SUPERIOR Erlan Almeida e Silva - SEESP – SP ([email protected]) Marina Ludgério de Souza - UFABC – SP ([email protected]) Thais Helena Inglêz Silva - UFABC – SP ([email protected]) Alessandro Jacques Ribeiro - UFABC - SP ([email protected]) Resumo: Este trabalho tem por objetivo apresentar uma compreensão de álgebra fundamentada em concepções identificadas na literatura da área, relacionando-as aos resultados de uma investigação com quatro professoras de Ensino Superior. Tendo por base as atividades desenvolvidas no âmbito do programa Observatório da Educação (OBEDUC), esse trabalho procura identificar se e como as concepções de álgebra tratadas na literatura se manifestam entre formadores de professores de matemática. Inicialmente são apresentadas as ideias de quatro pesquisadores da área, as quais subsidiam a análise de três questões de entrevistas semiestruturadas realizadas com professoras de instituições de Ensino Superior. Estas análises também levam em consideração, fundamentadas em autores que trabalham com os conhecimentos docentes para o ensino, se as professoras explicitam diferenças no ensino de álgebra para os licenciandos ou para alunos de demais cursos, evidenciando, assim um conhecimento específico para o docente. Percebemos, em relação a este ponto, que apenas duas das quatro professoras apontam diferenças no ensino de álgebra para os futuros professores. Sobre as concepções, a maior parte das apresentadas na literatura foram identificadas nas falas das professoras, o que possibilitou-nos construir uma compreensão – ainda que provisória – de álgebra. Acreditamos que esta tentativa de reunir diferentes concepções de álgebra e de diferenciar as concepções das visões seja promissora e contribua para os demais trabalhos que tenham como objetivo o estudo do ensino de álgebra e que os resultados futuros de uma análise completa das entrevistas possam contribuir ainda mais para a construção de uma compreensão de álgebra adequada e fundamentada, tanto na literatura quanto na prática. Palavras-chave: Concepções de Álgebra, Educação Algébrica, Formação de Professores, Conhecimento Matemático para o Ensino. 314 Introdução Inserido em um projeto de pesquisa intitulado Conhecimento Matemático para o Ensino de Álgebra: uma abordagem baseada em perfis conceituais, no âmbito do Programa Observatório da Educação (OBEDUC), financiado pela Coordenadoria de Aperfeiçoamento de Pessoal do Ensino Superior (CAPES), coordenado pelo Prof. Dr. Alessandro Jacques Ribeiro e de duração de quatro anos, este trabalho apresenta resultados parciais de investigações feitas pela equipe do projeto, com professores de ensino superior, acerca de concepções de álgebra, especialmente voltadas para os cursos de licenciatura. O principal objetivo do projeto é “investigar os conhecimentos algébricos desenvolvidos por professores, ao ensinar álgebra na Educação Básica, utilizando-se de uma abordagem baseada em perfis conceituais”. O interesse em álgebra provém tanto da ênfase que é dada a ela na Educação Básica como dos resultados das avaliações em larga escala, que “explicitam as deficiências dos estudantes em seus conhecimentos algébricos”. Para isso, neste primeiro ano de trabalhos do grupo envolvido, as investigações foram feitas, dentre outras atividades, através de estudos da literatura, pela leitura de publicações de autores como Fiorentini et al. (1993), Usiskin (1995), Lins e Gimenez (1997) e Lee (2001), que abordam diferentes concepções de álgebra, a partir de visões pautadas em fundamentos teóricos distintos. O interesse pelas concepções de álgebra de professores do ensino superior advém, em primeiro lugar, da necessidade de identificar uma compreensão de álgebra própria ao grupo, uma vez que, destas discussões teóricas, fica evidente que o entendimento sobre o que é álgebra não é fechado e nem, tampouco, único. Para isso, pensamos em identificar, nos formadores de professores de matemática, quais concepções de álgebra são mais comuns entre eles e que relações estes professores percebem e constroem no ensino de álgebra para os licenciandos. Este tipo de investigação tem sido comum em diversos trabalhos em Educação Matemática, pois entende-se que investigar os conhecimentos docentes dos formadores de professores significa, por extensão, conhecer a formação destes futuros professores (SHULMAN, 1986). Entendemos por conhecimento docente o conjunto de diferentes tipos de conhecimentos elencados por Shulman (1986) e, posteriormente, desenvolvidos e ampliados, especificamente na área de educação matemática, por Deborah Ball e seus 315 colegas (BALL et al, 2008). Tais referenciais serão apresentados e discutidos em nossa revisão de literatura. Assim, com o intuito de relacionar, tanto as concepções estudadas na literatura, àquelas trabalhadas nos cursos de licenciatura, identificadas através do que os professores do ensino superior exteriorizam quando falam sobre álgebra e sobre prática educacional, foram realizadas entrevistas com quatro professoras de diferentes universidades públicas e particulares da Grande São Paulo. Destes resultados, como apontado inicialmente, temos caminhado para a elaboração da compreensão de álgebra que será utilizada, em nosso projeto do OBEDUC, no decorrer dos próximos três anos de atividades. Apresentamos a seguir, uma breve discussão acerca das ideias de Shulman (1986) e Ball et al (2008), além de uma revisão dos trabalhos estudados por nosso grupo, no qual inserem-se os referidos autores desse trabalho. Nosso propósito é, posteriormente, apresentarmos as entrevistas realizadas, suas análises e finalizarmos com um quadro-síntese que deverá fundamentar os próximos desdobramentos de nosso grupo de pesquisa e de nosso projeto. Revisão de literatura Quando Shulman (1986) propôs investigar os conhecimentos docentes, dividiuos em três categorias, a saber: Content Knowledge, ou conhecimento do conteúdo, que trata especificamente do conhecimento dos tópicos, conceitos ou estruturas da área em questão; Pedagigical Content Knowledge (PCK), ou conhecimento pedagógico do conteúdo, que, para Shulman, é o conhecimento do conteúdo que se relaciona particularmente às situações de ensino e, por fim, Curricular Knowledge ou conhecimento do currículo, inaugurando uma ampla área de investigação acerca do que os professores sabem e precisam saber para lecionar. Deborah Ball e seus colegas aprofundaram estes estudos, especificamente na área de matemática, dividindo tanto o conhecimento do conteúdo como o conhecimento pedagógico em outros três campos. Para eles, o conhecimento pedagógico do conteúdo, por exemplo, pode ser dividido em conhecimento do conteúdo e os estudantes e conhecimento do conteúdo e o ensino (BALL et al, 2008). 316 Nesse nosso trabalho, consideraremos - a partir das ideias de Shulman (1986) e Ball et al (2008) - a existência de um conhecimento de conteúdo específico para os docentes, o PCK. A partir do momento em que se entende que a formação de professores deve levar em consideração alguns elementos distintos (em relação ao próprio conteúdo matemático, por exemplo) da formação de bacharéis em matemática, propomo-nos a investigar, a partir de pesquisas na área da Educação Matemática, algumas que discutam diferentes concepções de álgebra. Apresentaremos, a seguir, as ideias expostas em quatro trabalhos dos autores mencionados. São eles: Contribuição para um Repensar a Educação Algébrica Elementar, de Fiorentini et al. (1993), Concepções sobre a álgebra da escola média e utilizações das variáveis, de Usiskin (1995), Sobre Álgebra, de Lins e Gimenez (1997) e Uma Iniciação a cultura algébrica por meio de atividades que envolvem generalizações (tradução nossa) de Lee (2001). Além disso, também tomamos por base - para estudar o trabalho destes autores - a tese de doutorado de Figueiredo (2007), na qual a autora constrói quadros síntese das diferentes concepções de álgebra apresentadas por cada autor. No trabalho de Fiorentini et al. (1993), os autores apresentam concepções, tanto de Álgebra como de Educação Algébrica, constituídas como reflexo de alguns aspectos do desenvolvimento histórico, tanto da própria álgebra, como das práticas escolares. Apresentamos a seguir as três concepções de Educação Algébrica indicadas pelos autores: 1. Lingüístico-pragmática: a álgebra está relacionada à atividades pedagógicas que visam a resolução de problemas, prevalecendo a aquisição mecânica das técnicas requeridas pelo transformismo algébrico. Este transformismo passa a ser fundamental para a álgebra, segundo essa concepção; 2. Fundamentalista-estrutural: recebe este nome uma vez que são enfatizadas as propriedades estruturais das operações, como forma de justificar logicamente cada passagem presente no transformismo algébrico, capacitando o estudante a identificar e a aplicar essas estruturas nos diferentes contextos subjacentes; 3. Fundamentalista-analógica: a álgebra também tem o caráter pedagógico de instrumento para resolver problemas, mas mantem-se o caráter fundamentalista, fazendo assim uma síntese das concepções anteriores. 317 A partir dessas concepções, os autores identificam duas tendências no ensino de álgebra: priorizar a construção da linguagem em detrimento do pensamento ou priorizar o ensino da linguagem algébrica já constituída, em detrimento da construção do pensamento algébrico. Ao final, os autores concluem que, com isso, há uma redução do pensamento algébrico à linguagem algébrica, pois, ao se tomar como ponto de partida a existência de uma álgebra simbólica já constituída, reduz-se os processos de ensino e de aprendizagem da álgebra ao transformismo algébrico. O próximo autor a discutirmos é Usiskin (1995), o qual parte do pressuposto que, na escola básica, a álgebra se relaciona com a compreensão das letras, as variáveis, que estão sendo apresentadas pela primeira vez. Como as letras têm diferentes papéis e significados, o entendimento da criança pode ser comprometido quando ela não tem clara estas diferentes concepções. Assim, para Usiskin (1995), o ensino de álgebra e a utilização das variáveis são pontos que estão relacionados e, dessa relação, surgem quatro concepções de álgebra: 1. Aritmética generalizada: segundo esta concepção, o estudante da escola básica deve conseguir traduzir e generalizar situações. Um exemplo é a propriedade comutativa: o aluno deve ser capaz de perceber que a igualdade 3 + 5 = 5 + 3 continuaria valendo quaisquer que fossem os números reais; 2. Estudo de procedimentos para resolver certos tipos de problemas: esses problemas envolvem incógnitas, com a finalidade de simplificar e de resolver problemas utilizando-se da linguagem algébrica A incógnita aparece como um valor a ser descoberto e, com isso, o aluno pode apresentar dificuldade no momento de passar de um exercício de aritmética para um problema de álgebra, já que terá que desenvolver a capacidade de equacionar um problema; 3. Estudo de relações entre grandezas: atividades que envolvem variáveis, como argumentos e parâmetros. Por exemplo, em uma atividade sobre área de figuras geométricas com fórmulas, pode-se relacionar linguagem e pensamento algébricos; 4. Estudo das estruturas: nesse caso, a variável deixa de representar um número e passa a significar qualquer símbolo abstrato. Este tipo de tratamento é aplicado em questões que priorizam a manipulação e a justificativa, como fatoração e dedução de uma identidade. 318 Enquanto Usiskin (1995) dá ênfase ao papel das letras para distinguir suas concepções, Lins e Gimenez (1997) por sua vez, trazem uma abordagem mais pedagógica e preocupada com o pensamento algébrico e suas construções. Apesar de os autores afirmarem não haver consenso a respeito do que seja pensar algebricamente, consideram existir certo consenso sobre quais são as “coisas” da Álgebra: equações, cálculo literal, funções e outros, destacando que ainda há outros tópicos que podem ou não ser incluídos nesta lista, como por exemplo os gráficos. Em um levantamento geral, os autores identificam dois enfoques dados à atividade algébrica: a caracterização pelo uso de notações ou pelo uso de conteúdos. Dentro destes enfoques a atividade algébrica é frequentemente descrita, segundo eles, como “fazer ou usar álgebra” ou, de forma ainda mais banal, “calcular com letras”. Deste aspecto, os autores concluem que “caracterizações por conteúdo ou por notação deixam de fora coisas que gostaríamos de caracterizar como atividade algébrica” (LINS e GIMENEZ, 1997, p. 99). Portanto, são indicadas três concepções de Educação Algébrica, sendo que as diferenças encontradas entre elas têm raízes em diferentes conceitualizações da atividade: 1. Letrista: é uma visão restrita ao “cálculo com letras”, muito presente nos livros didáticos brasileiros e, portanto, comum na prática escolar, pois é possível que esta visão corresponda a visão de atividade algébrica de que os professores já dispõem; 2. Letrista Facilitadora: considera que a capacidade de lidar com as expressões literais é alcançada pela abstração decorrente de situações concretas, ou seja, uma certa estrutura que é manipulável em situações concretas e depois, por um processo de abstração, é formalizada. Essa abordagem é insuficiente, pois os estudantes não estabelecem relação entre o que havia desenvolvido no concreto com o que transpõem para o formal; 3. Modelagem Matemática: essa concepção, segundo os autores, também apresenta com o ponto de partida uma situação concreta. Contudo, o concreto na modelagem não é visto como ilustrativo, e sim como um problema real, sendo as atividades propostas de investigação de situações reais. Para os autores, nessa perspectiva “a Educação Algébrica se dá na medida em que a produção de conhecimento algébrico serve ao propósito de iluminar ou organizar uma 319 situação, como ferramenta e não como objeto primário do estudo” (LINS e GIMENEZ, 1997, p. 109). Por fim, no trabalho de Lee (2001), a autora apresenta visões de álgebra mais abrangentes. Em sua pesquisa, Lee (2001) discute a importância de exercícios de generalização para introdução da álgebra, os quais auxiliam no desenvolvimento dos alunos, na elaboração de estratégias de resolução, argumentação, no momento de relacionar os conhecimentos, desenvolver uma comunicação e até habilidades técnicas mais rápidas. Embora neste trabalho a autora não aborde as concepções algébricas, encontramos na tese de Figueiredo (2007) seis Concepções de Educação Algébrica que Lee propõe. São elas: 1. Como linguagem: em exercícios que envolvem a evolução da linguagem da álgebra elementar. Desenvolvendo a comunicação em uma linguagem algébrica; 2. Como caminho de pensamento: essa concepção trata do pensamento sobre as relações matemáticas, e não dos objetos matemáticos. Um exemplo são os exercícios de raciocínio sobre padrões e que trabalham o desconhecido; 3. Como atividade: atividades que envolvam modelagem matemática e pensamento sobre as relações matemáticas. Está relacionada a linguagem e pensamento algébrico; 4. Como ferramenta: está associada à linguagem e ao pensamento algébrico, surgindo em problemas de modo a conduzir e transformar mensagens, seja para a própria matemática ou para outras ciências; 5. Como aritmética generalizada: caracterizam esta concepção as relações do pensamento algébrico e da linguagem, como álgebra das generalizações dos números e álgebra como estudo de expressões simbólicas com letras; 6. Como cultura: envolve valores, crenças, práticas, tradições históricas e processo para sua transmissão. Entrelaça o currículo de álgebra com o de geometria, com o intuito de usar ferramentas, criando um pensamento algébrico. Com isso, entendemos que, apesar de partirem de motivações diferentes, as concepções apresentadas pelos autores têm intersecções significativas. Por exemplo, identificamos relações entre a concepção de modelagem matemática, de Lins e Gimenez (1997), e as concepções de álgebra como atividade e como ferramenta, de Lee (2001). Assim, buscando identificar relações, nosso grupo de pesquisa, no Observatório da Educação, construiu um quadro-síntese das ideias, apresentado posteriormente. 320 Feita esta primeira construção de relações, ainda buscamos identificar quais destas concepções estão de fato presentes no ensino de álgebra e quais delas são identificadas pelos professores. Neste primeiro momento, investigamos os formadores de professores e futuramente, entrevistaremos também os próprios professores da educação básica. A seguir, apresentamos as análises das entrevistas realizadas, as relações que depreendemos delas e as implicações disto para o nosso projeto. As entrevistas Para a realização das entrevistas, primeiramente foi elaborado por todo o grupo de pesquisa um questionário contendo nove questões, abordando assuntos pertinentes à elaboração da compreensão de álgebra em nosso grupo. A seguir, foram indicados como entrevistados - seis professores de instituições de ensino superior diferentes, que atuassem na formação de professores de matemática. Após estabelecer contato com os professores, três deles se dispuseram a conceder a entrevista, sendo que uma quarta professora foi posteriormente indicada e também aceitou participar. As entrevistas foram realizadas geralmente por dois integrantes do grupo, munidos de gravador para posterior transcrição. Segue-se um breve perfil das professoras participantes e, na sequência, são apresentadas três das nove questões utilizadas para conduzir as entrevistas, bem como as respostas de todas as entrevistadas. Em nossas análises, procuramos estabelecer algumas relações e comparações entre as respostas dos professores entrevistados, bem como de suas respostas com as concepções de álgebra dos autores anteriormente apresentados. Optamos por discutir, neste trabalho, apenas três das questões elaboradas, por evidenciarem melhor as diferentes concepções de álgebra que pudemos identificar e devido ao espaço estipulado para esta comunicação. Perfil das professoras Professora 1 (P1): Doutora e pesquisadora na área de Educação Matemática. Atualmente é professora na Pós-Graduação em uma instituição particular e tem artigos publicados sobre Educação Matemática, Álgebra Linear e Educação Algébrica. 321 Professora 2 (P2): Bacharel em matemática, com mestrado e doutorado em Matemática Aplicada. É professora de uma instituição pública de ensino superior e duas instituições particulares. Suas áreas de atuação são Teoria Fuzzy, Sistemas Dinâmicos, Educação Matemática e Metodologias de Ensino. Professora 3 (P3): Licenciada e mestre em matemática e doutora em aplicações em tecnologia nuclear. Tem experiência com educação nos ensinos Fundamental, Médio e Superior e, atualmente, é professora de graduação em uma instituição particular e coordenadora do Colegiado de Licenciatura em Matemática. Professora 4 (P4): Licenciada, mestre e doutora em matemática na área de álgebra. Possui mais de vinte anos de experiência com docência no ensino superior, em cursos de bacharelado e licenciatura e, atualmente, é professora associada em uma universidade pública. Pesquisa na área de matemática pura, particularmente em álgebra. Nossas análises e reflexões: as questões e suas respostas Iniciamos nossas análises pela questão 1) Se você fosse explicar em poucas palavras para um estudante da licenciatura o que é álgebra, como você faria? E para um estudante de outro curso? Nesta primeira questão, as professoras apresentam diferentes visões do que é a álgebra, sendo que só duas delas fazem distinção entre como ensinar num curso de licenciatura e nos demais. A professora P1 enfatiza que “A álgebra permeia todo o ensino. (...) A álgebra não é só linguagem da matemática, mas ela estuda as estruturas.”, contrapondo a visão apresentada pela professora P4, que diz: “a álgebra, ela surgiu como uma linguagem, como assim, um socorro pra geometria, por exemplo”. Ela ainda destaca, em diversos momentos de sua fala, que considera a aritmética como parte da álgebra. A professora P3 também menciona a aritmética, mas destaca que para aprender álgebra é necessário primeiro uma base sólida na prática aritmética e que o que caracteriza a álgebra é a presença de um valor desconhecido. Ela ainda diferencia o ensino de álgebra para os estudantes de licenciatura e de outros cursos, enfatizando que para os licenciandos é importante compreender as distinções entre álgebra e aritmética, enquanto que para estudantes de outros cursos é mais relevante saber usar as estruturas e manipulações algébricas. Ao distinguir estes conhecimentos, a professora parece 322 destacar que os futuros docentes precisam ter um conhecimento diferenciado do conteúdo, que podemos relacionar ao conhecimento pedagógico do conteúdo apresentado por Shulman (1986) e por Ball et al (2008). Não se trata de um conhecimento do conteúdo, por si, mas de uma distinção importante para o ensino. Por fim, a professora P2 afirma que “o sentido da álgebra é esse, de resolver problemas”, fazendo uma diferenciação entre os alunos de licenciatura como “a arte de resolver problemas”, enquanto que para os demais cursos seria um “instrumento para resolver problemas”. Do depoimento das professores, em sua falas, podemos destacar três concepções distintas: (i) álgebra como estudo de estruturas (professora P1), relacionando às concepções “fundamentalista-estrutural” (FIORENTINI et al, 1993) –“estudo das estruturas” (USISKIN, 1995); (ii) álgebra como forma de resolver problemas (professora P2), na qual parece-nos relacionar as concepções “linguístico pragmática” e –“fundamentalista-analógica” (FIORENTINI et al, 1993), aos “estudos de procedimentos para resolver certos tipos de problemas” (USISKIN, 1995) e à –“letrista facilitadora” (LINS e GIMENEZ, 1997); (iii) álgebra como uma extensão da aritmética (professora P3), a qual relacionamos às concepções “aritmética generalizada”(USISKIN, 1995; LEE, 2001). Destacamos ainda que, a visão de álgebra como linguagem (professora P4), também foi destacada por todas as outras professoras, a qual se relaciona apenas à concepção de “álgebra como linguagem” de Lee (2001). Assim, tais análises parecem nos indicar que a linguagem é uma característica que permeia todas as concepções das professoras por nós investigadas, o que chamaremos de uma visão de álgebra e não de uma concepção. Passamos a seguir, para nossas análises em relação à questão 2) Em sua opinião quando uma atividade matemática pode ser caracterizada como sendo do campo da álgebra? Ao responder esta questão, as professoras P2 e P3 dizem que a incógnita caracteriza uma atividade como sendo especificamente do campo da álgebra. A professora P3 trabalha isso de forma mais abrangente, pois diz que “a matemática, na minha opinião, a matemática não se separa”, no sentido em que “qualquer atividade 323 matemática tá no campo da álgebra”, uma vez que problemas aritméticos podem ser resolvidos algebricamente e os conteúdos matemáticos são interdependentes. No caso da professora P2, ela enfatiza isso elencando conteúdos como a resolução de matrizes, sistemas, equações de segundo grau, todos como especificamente algébricos. P2 ainda concluí que “muita coisa é álgebra, tirando geometria e trigonometria”, visão muito semelhante à de P1, que afirma que “a matemática escolar é álgebra ou geometria.”. A professora P1 também traz uma visão abrangente de álgebra, chegando a dizer que tudo é álgebra na matemática e que o objetivo principal da matemática escolar é chegar ao “conceito algébrico de função”. Por fim, a professora P4 é enfática ao dizer que “a álgebra é a linguagem da equação”, respondendo à pergunta afirmando que uma atividade é do campo de álgebra quando apresenta uma equação. Destas respostas percebemos uma grande dificuldade em restringir a álgebra como um campo da matemática com objetivos particulares, estendendo-a à toda atividade matemática. É verdade que, em nossa opinião, quase toda a atividade matemática pode ser colocada em termos de linguagem algébrica, mas é importante para nós justamente distinguirmos quando uma atividade está efetivamente envolvendo pensamento algébrico ou não. As professoras P2 e P3 destacam que a existência da incógnita é essencial, enquanto a professora P4 destaca a existência de uma equação. Estes apontamentos estão tanto relacionados às concepções estruturais como à visão de álgebra como algo que depende das variáveis, tal como Usiskin (1995) a construiu. Isso nos leva a crer que o papel da variável, especialmente na álgebra escolar, é fundamental. Por fim, analisamos a questão 4) Você poderia citar algumas abordagens de ensino que considera adequadas para o ensino de álgebra? Todas as professoras trazem a problematização de situações como uma motivação para o ensino de matemática, no sentido de identificar um problema e precisar de ideias matemáticas para resolvê-lo. As professoras P3 e P4 apresentam exemplos de problemas históricos, sendo que P3 defende que antes de ensinar a fórmula, é preciso entender o pensamento que a originou e as diferentes formas de resolução que existiram até se chegar a ela. Por outro lado, P4 também traz essa abordagem histórica, mas não no sentido de construir o caminho para se chegar aos conhecimentos de hoje e sim, de motivar e incentivar o pensamento e as generalizações. 324 Além disso, P4 também enfatiza o uso de materiais manipulativos como uma abordagem válida para a construção das ideias algébricas. A professora P2, por outro lado, enfatiza o uso de situações contextualizadas e relevantes para a vida do aluno, como o uso de jogos de videogame. A professora P1 não exemplifica exatamente como trabalhar com as situações problema. A ênfase na problematização nos remete à concepção “modelagem matemática” (LINS e GIMENEZ, 1997), bem como às concepções “álgebra como ferramenta” e “álgebra como atividade” (LEE, 2001), especialmente nas falas da professora P2. As professoras P3 e P4, por outro lado, ao enfatizarem uma construção histórica, apontam para a álgebra como uma construção humana situada no tempo e espaço, e como uma resposta às necessidades e problemas de uma época. Acreditamos que tais concepções inserem-se no que Lee (2001) chama de álgebra como cultura. Entretanto, em nosso entendimento, esta ideia está presente em todas as outras concepções de álgebra, portanto a caracterizaremos como outra das visões de álgebra. Considerações finais: algumas implicações para nossas pesquisas A partir das análises das entrevistas, pudemos perceber que a maior parte das concepções de álgebra (ou de educação algébrica) encontradas na literatura, aparecem nas falas/nas concepções das professoras. Parece-nos que, apenas a concepção “álgebra como estudos das relações entre grandezas” (USISKIN, 1995) não apareceu em nenhuma das questões analisadas. A partir de nossas análises, bem como das discussões realizadas pelos integrantes do projeto, apresentamos a seguir uma proposta de compreensão da álgebra, tendo em vista suas concepções e visões. Este quadro - ainda que provisoriamente - parece-nos atender às necessidades de nosso grupo, uma vez que deverá nos auxiliar na análise e na investigação das questões das avaliações em larga escala, como a Prova Brasil e o ENEM. Em nosso entendimento e para os nossos propósitos, parece-nos razoável elaborar uma categorização “única” para utilizarmos em nossas investigações. Vejamos o quadro abaixo: 325 Quadro 4 - Compreensão de álgebra construída a partir das análises das entrevistas. Fonte: Elaborado pelos autores. Assim, a partir dos resultados aqui apresentados, os quais decorrem de uma análise parcial de apenas três das nove questões realizadas em nossas entrevistas, observamos como as concepções das professoras nos auxiliam na construção de nossa compreensão de álgebra. Imaginamos que, ao analisar as demais questões, poderemos trazer novas considerações à compreensão de álgebra que estamos construindo, uma vez que as demais questões possibilitam investigar as considerações sobre o papel do conhecimento docente em álgebra, nas perspectivas de Shulman (1986) e Ball et al (2008). 326 Referências BALL, D. L.; THAMES, M. H.; PHELPS, G. Content Knowledge for Teaching: What makes it special? Journal of Teacher Education, v. 59, 2008. 389-407. FIGUEIREDO, A. D. C. Saberes e Concepções de Educação Algébrica em um Curso de Licenciatura em Matemática. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUCSP, São Paulo, p. 290, 2007. FIORENTINI, D.; MIORIM, M. Â.; MIGUEL, A. Contribuição para um Repensar. a Educação Algébrica Elementar. Pro-Posições, Campinas - SP, v. 4, n. 1, p. 78-91, março 1993. LEE, L. An Initiation into Algebraic Culture Through Generalization Activities. In N. Bednarz, C. Kieran & L. Lee (ed.), Approaches to algebra: perspectives for research and teaching. Kluwer Academic Publishers, 2001. LINS, R. C; GIMENEZ, J. Perspectivas em Aritmética e Álgebra para o Século XXI. 4 ed. Campinas: Papirus Editora, 1997, 176 p. SHULMAN, L. S. Those Who Understand: Knowledge Growth in Teaching. Educational Researcher, vol. 15, 1986. 4-14. USISKIN, Zalman. Concepções sobre a álgebra da escola média e utilizações das variáveis. In: COXFORD, Arthur F.; SHULTE, Alberto P.(Org). As idéias da álgebra. São Paulo: Atual, 1995. 327 INVESTIGAÇÃO SOBRE OS CONHECIMENTOS PARA O ENSINO DE SITUAÇÕES PARTE-TODO EM UM PROCESSO FORMATIVO Maria Gracilene de Carvalho PINHEIRO – UNIAN – SP ([email protected]) Angélica da Fontoura GARCIA SILVA – UNIAN – SP ([email protected]) Resumo: Esta comunicação tem o propósito de analisar o Conhecimento Profissional Docente de professoras participantes de um processo formativo acerca do significado parte-todo e quociente. Tal pesquisa, de natureza qualitativa, realizou-se no âmbito do projeto Observatório da Educação do qual participaram professoras que lecionam matemática para os anos iniciais da Rede Pública Estadual de São Paulo. Para coleta de dados foi aplicado um questionário- de caráter diagnóstico- a fim de investigar a compreensão das professoras sobre o objeto matemático para subsidiar a intervenção. Além disso, apresentamos depoimentos dos sujeitos do estudo coletados ao final da intervenção. Este estudo fundamenta-se tanto em teorias que analisam questões relacionadas à formação de professores quanto a estudos que discutem os processos de ensino e aprendizagem da fração. Quanto ao primeiro enfoque o apoio foi encontrado, sobretudo, nos estudos de Serrazina acerca da relação entre a reflexão e os processos de ensino e aprendizagem da matemática. No que concerne ao objeto matemático -fraçõesas referências foram Vergnaud e Nunes. Seus estudos versam tanto sobre a necessidade do trabalho do professor focar em diferentes significados da fração como a importância de introduzir a fração por meio do significado quociente. As respostas do grupo indicaram que alguns aspectos importantes do conhecimento sobre as frações, como, por exemplo, a resolução de problemas sobre os invariantes operatórios utilizando o significado parte-todo e também a compreensão do significado quociente, não faziam parte dos conhecimentos do conteúdo demonstrados pelos sujeitos desta investigação. Essa lacuna demonstrou comprometer, também, os conhecimentos pedagógicos e curriculares desse conteúdo. Dessa forma, acreditamos que há necessidade de um enfoque que analise diferentes significados da fração tanto em cursos de formação inicial como de formação continuada. Palavras-chave: Formação de Professores, Conhecimento Profissional Docente, Frações. 328 Introdução O presente estudo é parte de um trabalho de pesquisa de Mestrado em Educação Matemática desenvolvido durante um curso de formação, cuja finalidade foi analisar o processo de (re)significação dos conhecimentos de professores que lecionam Matemática para os anos iniciais da Educação Básica sobre a utilização de situações parte-todo e quociente para introduzir o conceito de fração11, explicitados durante o processo formativo. A formação foi realizada com a participação de professores e pesquisadores na área da Educação Matemática pertencentes ao grupo de pesquisa do Observatório da Educação.12 Para essa comunicação apresentaremos algumas das reflexões suscitadas a partir da análise de parte de um dos instrumentos que foram tomados como diagnóstico, com o qual procuramos analisar a resolução de situações em que era explorado o significado parte-todo. Dessa forma, pretendíamos analisar o Conhecimento Profissional Docente do grupo de três professoras participantes do processo formativo acerca desse significado da fração. Desenvolvimento da pesquisa Para realizar o estudo, buscamos apoio teórico nos estudos Nunes et al (1997, 2003, 2005, 2009) em que ela toma como base a Teoria dos Campos Conceituais de Gerard Vergnaud. Ao aplicar a Teoria dos Campos Conceituais na análise do conceito de fração, essa pesquisadora, sugere começar a sua construção a partir da concepção mais simples de fração e enriquecer essa definição de fração perguntando qual é o invariante central desse conceito, quais são as situações nas quais ele é usado e quais são os diferentes tipos de representação relacionados a ele. (NUNES, 2003, p. 1) 11 O termo fração será utilizado, neste artigo, para designar os números racionais na representação fracionária. 12 Projeto Observatório da Educação Auxílio número 2050/2010 : Educação Continuada e Resultados de Pesquisa em Educação Matemática: uma investigação sobre as transformações das práticas de professores dos anos iniciais do Ensino Fundamental é coordenado pela professora Dra. Tânia Maria Mendonça Campos. 329 Ao considerar que diferentes situações podem facilitar a compreensão da construção do conceito de fração, por parte dos alunos, Nunes (2005) sugere uma classificação para a construção desse conceito formada por quatro situações: parte-todo, quociente, operador e quantidades intensivas. Reiteramos que para esta comunicação, optamos por analisar as reflexões de um grupo de professoras somente sobre as situações parte-todo pelo fato de ser este o significado mais trabalhado pelo grupo de professoras investigado. Quanto ao significado parte-todo Nunes et al (2009) apoiada em Behr et al (1992, 1993), definem como aquelas situações em que um todo é dividido em n partes iguais, tomam-se uma ou mais partes e a fração correspondente estabelece uma relação entre as partes em que o todo foi dividida e as partes consideradas na situação. Dessa forma, o denominador indica em quantas partes iguais o todo foi dividido, ao passo que o numerador indica o numero de partes referentes à situação. Fundamentamos nossa análise também nos estudos de Ball et al (2008) que amplia as Categorias de Conhecimento para o Ensino instituídas por Shulman (1986). Esta pesquisadora estudou a prática docente e com base em Shulman, cria a Teoria do Conhecimento para o Ensino da Matemática (MTK). De acordo com essa Teoria alguns domínios são necessários para o ensino de Matemática: o Conhecimento do Conteúdo da Disciplina e o Conhecimento Pedagógico do Conteúdo Matemático, os quais ela subdivide em três vertentes: Para este estudo analisaremos duas das vertentes do Conhecimento Pedagógico do Conteúdo Matemático: conhecimento do conteúdo e do ensino e o conhecimento do conteúdo e dos estudantes. Quanto a primeira vertente os autores consideram que tal conhecimento combina o domínio de conteúdos específicos da Matemática com a compreensão de assuntos relacionados ao ensino. Já o conhecimento do conteúdo e dos estudantes associa a compreensão e interação da Matemática ao conhecimento do pensamento matemático dos alunos. Em relação à reflexão sobre os processos de ensino e aprendizagem, nos fundamentamos nos estudos de Serrazina (1999). Essa pesquisadora discute sobre o papel da reflexão para a mudança de concepções e na aquisição de conhecimentos. A sua hipótese era que refletindo sobre o que ensinavam e como ensinavam e sendo capazes de avaliar as suas práticas, as professoras mudariam a maneira como 330 ensinavam. O que ficou confirmado em resultados de pesquisas por ela realizadas: “(...) mudanças nas práticas parecem ocorrer quando os professores ganham autoconfiança e são capazes de refletir nas suas práticas”. (SERRAZINA, 1999, p. 163). As informações produzidas, que serão apresentadas a seguir, foram coletadas em duas das sessões da formação dedicas à aplicação e análise de um instrumento diagnóstico por meio do qual organizamos a intervenção. Apresentação e Análise dos Dados Apresentaremos neste artigo três das questões propostas no instrumento diagnóstico. Nelas discutimos três ideias fundamentais à construção e compreensão do conceito das frações: a unidade de referência (CAMPOS e RODRIGUES et al, 2007) e os invariantes operatórios, ordem e equivalência (NUNES et al, 2003). Apresentaremos também a análise das respostas das professoras, sujeitos da nossa pesquisa: Uma das situações que propomos tinha o objetivo de observar se as professoras manteriam a unidade de referência ao representar as respectivas frações de pizzas que sobraram nas mesas 1 e 2: “Na padaria do Senhor Joaquim são oferecidas pizzas como a representada a seguir O garçom foi retirar duas mesas - mesa 1 e mesa 2- e observou que os fregueses não comeram todos os pedaços de pizza. ” Em seguida foi solicitado às professoras que ao analisar a situação elas representassem a fração de pizza que havia sobrado em cada mesa. Verificamos que as Professoras M e R representaram corretamente as respectivas frações. A resposta ao item “a” foi indicada nos estudos de Rodrigues (2005). Dessa forma, é possível perceber 331 que as professoras identificaram o todo e as partes. O mesmo ocorreu com a Professora D. Verificamos, ainda, em relação à mesa 2, que as professoras representaram a fração na forma mista. Esse é um tipo de representação que não foi apontado por Rodrigues como possibilidade de resposta. Professora M Professora R Figura 1 – Protocolos Professoras M e R A Professora D, no entanto, errou na representação da fração correspondente ao que havia sobrado na segunda mesa, como podemos observar na figura a seguir: Professora D Figura 2 – Protocolo Professora D Percebemos, na resposta apresentada pela professora, que ela modificou a unidade de referência ao considerar as duas pizzas da mesa 2 e não a “fração de pizza” que correspondia à quantidade restante na mesa. Essa é uma dificuldade apontada nos estudos de Rodrigues (2005). Apoiado nas ideias sobre o papel da unidade, 332 desenvolvidas por Kieren (1981, 1993) e Mack (1990), Rodrigues (2005) chama a atenção para a importância da compreensão do papel da unidade como ideia fundamental na construção do conceito de fração. Para verificarmos a compreensão das professoras em relação à ordenação de frações em situações com o significado parte-todo uma das situações propostas relata que: Bruna e Victor, ao receberem uma barra de chocolate de mesmo tamanho cada uma e comeram porções diferentes de chocolate. Bruna comeu Victor comeu 3 do chocolate dela e 5 3 do chocolate dele. Em seguida, questionou-se sobre quem comeu mais 4 chocolate e apresentou-se a resposta de um aluno fictício: “Bruna e Victor comeram o mesmo tanto, porque os dois comeram três pedaços dos seus chocolates”. Foi solicitado que as professoras avaliassem se a resposta apresentada pelo estudante estava certa ou errada e justificassem a resposta. Ao final, pedimos ainda que as professoras apresentassem uma solução e estratégias de ensino que explicassem a melhor forma de resolver tal situação. As soluções apresentadas nos permitiu observar que as Professoras D e R responderam corretamente ao primeiro item, ao considerar que a resposta do aluno estava errada. Professora R 333 Professora D Figura 3 – Protocolos Professora R e Professora D Verificamos que para justificar suas respostas, as professoras apresentaram raciocínio semelhante: ambas referiram-se à quantidade de partes em que cada chocolate havia sido dividido. A Professora D fez referência à resposta do aluno, considerando que ele observou apenas o numerador e não o número de partes divididas. Nesse sentido, ela parece ter percebido a relação entre o numerador e o denominador. A Professora R, no entanto, referiu-se apenas á quantidade de pedaços, não relacionando-o à fração correspondente. A Professora M errou, pois julgou que a resposta do aluno estava correta. Professora M Figura 4 – Protocolo Professora M A análise dos registros da professora indicam que ela considerou, assim como o aluno, apenas a quantidade de pedaços que Bruna e Victor comeram da pizza, 3 pedaços, sem considerar a diversidade de unidade de medida, ou seja, quartos e quintos. Vale ressaltar que nesse tipo de situação esperávamos que as professoras observassem as relações assimétricas da fração: a ideia de relação inversa entre denominador e a quantidade correspondente à fração “(...) para o mesmo numerador, quanto maior o denominador, menor a fração” (NUNES, et al, 2003, p. 3). 334 Em relação às estratégias de ensino para essa situação, a Professora M não apresentou resposta. A Professora D apenas referiu-se aos conhecimentos prévios, utilização de desenhos e materiais concretos, sem contudo, explicitar mais claramente como seria tais estratégias. Já a Professora R, apesar de ter apresentado uma estratégia válida, não fez nenhuma referência à importância em considerar a equivalência de área (este é um aspecto fundamental no ensino das frações). Professora D Professora R Figura 5 – Protocolos Professoras D e R Em sintonia com Ball (2008), na nossa análise sobre os Conhecimentos de Conteúdo e de Ensino e os Conhecimentos de Conteúdo e de Estudantes foi possível perceber que as professoras apresentam, ainda, dificuldades em interpretar o pensamento do aluno e em propor estratégia de ensino que favoreçam a compreensão do conceito de fração e o desenvolvimento de esquemas necessários à representação correta da fração correspondente à situação proposta. Para analisar a compreensão das professoras sobre a equivalência de frações com o significado parte-todo, propusemos uma situação em que um índio e uma índia possuem uma pizza idêntica, cada um. A situação sugere que o índio corta a sua pizza em 4 partes iguais e come uma e a índia corta a sua pizza em 8 partes iguais e come duas. Com isso, é solicitada a representação fracionária que corresponde à quantidade que cada um come da pizza e que seja identificado quem come mais ou menos pizza ou se ambos comem a mesma quantidade. Em seguida, é solicitado, ainda uma justificativa para a resposta dada a situação. 335 A análise das resoluções revelou que as três professoras investigadas identificaram a equivalência das frações nessa situação. Professora R Professora M Professora D Figura 6 – Protocolos Professora R, Professora M e Professora D 336 Um ponto que consideramos importante nas respostas, das professoras, é que elas apresentaram argumentos diferentes para justificarem a equivalência entre as quantidades fracionárias. Professora R Professora M Professora D Figura 7 – Protocolos Professora R, Professora M e Professora D A Professora R utilizou-se da ideia de correspondência para justificar a equivalência entre as frações. A Professora M, também, fez uso da ideia da proporcionalidade ao indicar que as quantidades eram percentualmente equivalentes. Por fim, a Professora D referiu-se à quantidade de pedaços resultado da divisão, concluindo que as frações correspondentes são equivalentes. 337 Diante das análises, dois aspectos que consideramos importantes merecem ser pensados: um primeiro aspecto está relacionado à compreensão de um dos invariantes lógicos da fração e o segundo sobre o papel da unidade. Quanto ao primeiro aspecto, a compreensão dos invariantes lógicos, observamos que embora o significado parte-todo seja provavelmente o mais trabalhado pelas professoras, elas parecem não ter claramente o domínio do conceito de ordenação nem mesmo em situações com esse significado, uma vez que duas das professoras se referiram apenas a quantidade de pedaços sem estabelecer a relação existente entre o numerador e o denominador da fração correspondente à quantidade de partes a qual elas se referiram. O segundo aspecto está relacionado à importância do papel da unidade de referência concordamos com Campos e Rodrigues (2009) quanto à importância desse conceito para a construção da ideia de fração: No caso específico do conceito de fração, a idéia de que as frações só têm sentido enquanto objetos matemáticos capazes de representar quantidades, de comparar quantidades ou de operar com essas quantidades, passa necessariamente pela idéia fundamental de que essas quantidades devem ser expressas segundo um mesmo referencial. (CAMPOS E RODRIGUES, 2007, p.89) Consideramos, assim como esses pesquisadores, tal conhecimento como de fundamental importância. Nesse sentido analisando tais resultados sob o ponto de vista de Ball et all (2008) e Shulman (1986), julgamos que a falta de compreensão dos invariantes operatórios ampliaria as dificuldades dos professores para ensinar o tema. A análise do ocorrido durante a aplicação desse questionário de caráter diagnóstico nos permitiu planejar as ações do processo formativo. Para ampliar a base de conhecimentos dos professores envolvidos para ensinar frações, precisaríamos além de trabalhar com outros significados que não o parte-todo, discutir questões ligadas à necessidade de fixação da unidade e aos invariantes operatórios (equivalência e ordem). Além disso, procuramos também ampliar a ideia de reflexão considerando que procuramos ir além da reflexão da própria prática na medida em que buscamos 338 promover a reflexão coletiva a respeito das dificuldades enfrentadas nos processos de ensino e de aprendizagem das frações relacionando-os com a ampliação do conhecimento de ideias fundamentais como a equivalência, ordem e unidade de referência. Considerações finais A análise que acabamos de apresentar nos traz algumas evidências sobre o conhecimento profissional docente dos sujeitos investigados. Em relação á representação da fração, observamos que as professoras utilizam-se da ideia de dupla contagem para situações parte-todo, ou seja, de que o denominador representa a quantidade de partes em que o todo foi dividido e o numerador à quantidade de partes tomadas do todo. Dessa forma, de maneira geral, elas conseguiram representar corretamente às frações correspondentes às quantidades propostas em cada situação. Todavia, não ficou evidente se elas reconhecem a relação existente entre essas duas quantidades como um quociente. Esta constatação se deve ainda ao fato de que as justificativas e estratégias de ensino por elas indicadas, não revelaram domínio suficiente acerca de como orientar o aluno a formular esquemas de resolução que os façam enxergar a fração como um número que indica uma determinada quantidade. Concordamos com outros estudos que chamam a atenção para o ensino voltado apenas para o significado parte-todo. Dessa forma, fez-se necessário, portanto, além do aprofundamento dos conceitos contidos em situações parte-todo, a exploração também de outros significados, uma vez que o desconhecimento dos outros significados da fração fragiliza o ensino. Nesse sentido, durante o processo de intervenção essas questões foram discutidas e podemos afirmar que o processo de reflexão proporcionou melhorias tanto no que se refere à compreensão do tema em estudo quanto à possibilidade de aprimoramento da prática docente, no sentido que elas puderam experienciar diferentes situações que lhes possibilitou refletirem sobre suas práticas em sala de aula. Alguns depoimentos das professoras em relação ao trabalho desenvolvido em sala de aula em anos anteriores sobre o tema, fração, nos remetem às essas afirmações: 339 É! Eu não sabia esse negócio de razão, parte todo (...) Eu não sabia. Estou aprendendo agora. (PROFESSORA R). Sentia uma segurança equivocada, trabalhava fração somente por parte-todo. (PROFESSORA D) Foi a oportunidade de aprender sobre os significados da fração, aplicar as atividades e novamente discutir sobre os avanços e dificuldades apresentadas para o ensino deste conteúdo bem como é apropriado pelo aluno os conceitos de fração. (PROFESSORA M). Finalmente, nossos dados nos levam a considerar sobre a necessidade de um enfoque mais amplo ao conceito de frações, complementado pela análise dos diferentes significados de sua representação fracionária tanto em cursos de formação inicial como de formação continuada. Finalmente, concluímos que para ampliar o conhecimento dos professores sobre o ensino e a aprendizagem das frações, é necessário que tais processos formativos favoreçam um trabalho colaborativo entre os envolvidos e que promovam uma constante reflexão sobre a prática. Agradecimentos: Não podemos deixar de registrar um agradecimento especial a CAPES que, a partir de iniciativas como a do Projeto Observatório, proporcionou a oportunidade de viabilizar este estudo e a realização desta comunicação. Referências BALL, D. L. et al. (2008). Content knowledge for teaching: what makes it special? In: Journal of Teacher Education, November/December 2008, vol. 59. BEHR, M. J., LESH, R., POST, T. R., & SILVER, E. A. (1983). Rational number concepts. In: Lesh, R.; Landau, M. (Ed.). Acquisition of mathematics concepts and processes. New York: Academic Press. p. 91-126. 340 CAMPOS, T.M.M.; RODRIGUES, W. R. A ideia de unidade na construção do conceito do número racional. REVEMAT – Revista Eletrônica de Educação Matemática, V2.4, p. 68-93, UFSC, 2007. NUNES, T.; BRYANT, P. Crianças fazendo matemática. Porto Alegre: Artes Médicas. 1997. ____________; BRYANT, P., PRETZLIK, U. & HURRY, J. (2003). The effect of situations on children´s understanding of fractions. 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Para tanto, realizou-se uma pesquisa com cinquenta e seis professores da Rede Municipal de Araçoiaba da Serra/SP, os quais responderam a um questionário sobre sua trajetória formativa bem como de suas concepções sobre formação continuada. As análises das respostas coletadas apontam diferentes concepções sobre a formação continuada, as palavras conhecimento e aperfeiçoamento foram as mais citadas como forma de identificar tal formação, contraditoriamente também ocorreram respostas que identificaram como ilusão, desinteresse, ou falta de conteúdo, percebe-se uma introjeção do discurso liberal das políticas de formação por parte do professor, que ora desafia e questiona essa formação, e ora assume como algo inerente e importante para suas práticas docentes. Palavras-chave: Formação Continuada. Formação Docente. Cotidiano escolar. 342 Introdução O trabalho traz algumas reflexões na busca de compreender a formação continuada de professores, em alguns contextos em que foram iniciadas e a lógica da permanência dessa prática, no mundo contemporâneo, utilizando uma pesquisa de campo, para entender qual a opinião de professores sobre a formação continuada, levantando como hipótese que o excesso, a fragmentação e a rapidez das informações da formação continuada acabam produzindo um discurso que pode levar o professor a inseguranças, resistências, medos, efeito contrário ao discurso instituído da autonomia docente e da busca na qualidade da educação. No passado, a educação assumiu diversas formas e se mostrou capaz de adaptarse às mudanças, de fixar novos objetivos e criar novas estratégias. Todavia, as mudanças de hoje são diferentes daquelas ocorridas no passado. Nenhuma reviravolta da história humana pôs os educadores diante de desafios comparáveis a esses decisivos de nossos dias. Simplesmente não havíamos estado até agora em situação semelhante. A arte de viver em um mundo ultra saturado de informações ainda deve ser aprendida, assim como a arte, ainda mais difícil, de educar o ser humano nesse novo modo de viver (BAUMAN, 2009, p. 667). Evidencia-se, portanto, que a formação continuada de professores, tem tentado suprir e abranger as diversas demandas de um mundo saturado de informações, para isso tem desenvolvido vários conceitos e práticas formativas, dependendo de situações, principalmente, ideológicas, políticas, geográficas, acadêmicas e econômicas. Entretanto, presenciei, durante a minha carreira docente, que a formação continuada, é justificada como mecanismo de suprir as lacunas existentes na formação “inicial” docente; de sanar dificuldades escolares que acontecem no cotidiano escolar, para implantar políticas, programas, projetos, campanhas, principalmente governamentais; de adquirir certificados (créditos) para ascender na carreira e/ou obter benefícios salariais; de satisfazer interesses ou necessidades de conhecimentos 343 específicos, ou seja, cursos em grande quantidade de curta duração, separados da realidade local. Assim descrevo a opinião de professores sobre o próprio percurso formativo e suas percepções sobre a formação continuada, apresento os resultados da devolutiva da pesquisa após a aplicação de questionário em onze escolas públicas municipais de Araçoiaba da Serra (interior de São Paulo). Desenvolvimento do trabalho Busco discutir como o professor percebe a formação continuada, que palavra lhe vem à cabeça para descrevê-la, qual a opinião sobre essa formação que via de regra é obrigatória, são as perguntas que nortearam o trabalho com um grupo de professores do Ensino da Rede Municipal de Ensino de Araçoiaba da Serra. Levantando como hipótese que o excesso, fragmentação e rapidez das informações da formação continuada, acabam por produzir um discurso que pode levar o professor a repetir o discurso oficial, hegemônico sobre qualidade docente, além da formação continuada recebida, percebemos que muitos deles assumem como próprios os dizeres sobre a importância dessas formações, postas nos documentos oficiais, nos documentos de formação continuada do município, consegue-se assim que os professores, raras exceções acreditem na necessidade “ininterrupta e continuada” de participar dos cursos e formações sem distinção, formações/convocações que fazem o professor ser visto como profissionais que nunca irão dominar o exercício da docência ou então para fins de cumprir planos e políticas de governos locais ou Programas Nacionais de Formação Docente. Foi elaborado como instrumento de pesquisa, um questionário, com questões sobre os dados pessoais dos professores da Rede Municipal de Araçoiaba da Serra, tais como: idade, estado civil, gênero, percurso docente, formação inicial, tempo de docência e jornada de trabalho. E numa segunda parte, com questões sobre a formação continuada: número e exemplos de cursos que o professor realizou ao longo de sua carreira docente, e a representação da formação continuada, expressa em uma palavra. 344 No último censo demográfico em 2010, Araçoiaba da Serra registrou em torno de 27 mil habitantes entre eles 24 mil são alfabetizados. O levantamento apontou que o município tem em torno de 300 professores da Educação Pública, sendo 210 professores da Educação Municipal distribuídos em 16 escolas Municipais, divididos por área de atuação na rede Municipal: 39 professores na Educação Infantil, 82 professores no Ensino Fundamental e 88 professores no Ensino Médio. Ao entrevistar 56 professores, a amostra para esta pesquisa foi de 25% dos professores da Rede Municipal da cidade (IBGE, 2012). Como procedimento para realizar a pesquisa, entrou-se em contato com a Secretaria de Educação Municipal de Araçoiaba da Serra, solicitando a autorização, de acordo com os procedimentos éticos de pesquisa com seres humanos, e explicando qual seria o procedimento para a coleta das informações. Com o consentimento da Secretaria, realizou-se contato telefônico com as escolas explicando o procedimento para o envio dos questionários, aproveitando para realizar um levantamento do número de professores em cada escola da rede municipal. Foram distribuídos 115 questionários, divididos por 11 escolas municipais que aceitaram participar da pesquisa (escolas do Ensino Fundamental e Educação Infantil). Resultados e Análises A análise da pesquisa foi desenvolvida com 56 professores da Rede de Ensino Público Municipal da cidade de Araçoiaba da Serra. Os professores pesquisados também atuam junto a redes de ensino de outras prefeituras e na rede estadual de ensino, mas, nessa pesquisa foram identificados como pertencentes à Rede de Ensino Municipal de Araçoiaba da Serra. Para o perfil dos professores entrevistados foram coletados dados sobre: gênero, estado civil, idade, tempo de docência e formação acadêmica. Os dados evidenciam que a grande maioria dos professores entrevistados, são mulheres 75%), apenas 25% são do gênero masculino. Quanto ao estado civil, temos 69% professores casados, 20% solteiros, 10% divorciados e apenas 1% viúvo. A idade dos professores entrevistados foram tabuladas em faixas etárias, que variaram de 20 à 60 anos, sendo, que 40% ficou na faixa entre 41 e 50 anos, 30% entre 31 à 40 anos, 20% entre 20 e 30 anos, e apenas 10% acima de 50 anos. O tempo de docência de 40% dos entrevistados ficou na faixa 345 de 0 á 05 anos, 40% com o tempo de docência entre 6 à 15 anos de docência e outros 20% com mais de 16 anos de docência. Quanto à formação acadêmica, as respostas dos questionários mostraram que 65% dos entrevistados têm formação inicial em Pedagogia, 35% em outras licenciaturas, como Matemática, História, Geografia, Letras, 15% com bacharelado em Direito, Economia, Ciências Contábeis e Jornalismo, seguidos de apenas 0,5% professores com formação no Normal Superior (curso criado inicialmente pelo MEC como um superior de graduação, na modalidade licenciatura. Tem por finalidade formar professores aptos a lecionar na educação infantil e nos primeiros anos do ensino fundamental, tem sido substituído pela licenciatura em Pedagogia) Vinte por cento dos 56 professores entrevistados tem uma pós graduação, após terem cursado inicialmente uma licenciatura ou bacharelado, a pós graduação citada pelos professores dividem-se: Didática do Ensino, Leitura/Gramática, Psicopedagogia, Alfabetização e Musicalização Infantil. Sobre os dados do perfil dos professores entrevistados, o que chama atenção, é que 40% estão na faixa etária de 40 à 50 anos, cruzando-se com a soma de um percentual de 83% na média de tempo de docência de 0 à 15 anos, leva-se a questionar porque ingressaram no Magistério tardiamente, quais seriam as outras experiências de trabalho que antecederam a docência? Qual/quais motivações que os levaram/trouxeram para profissão docente? Visto que temos 15% dos professores entrevistados com bacharelado, em diversas áreas, porém, a pesquisa acaba não levantando esses dados, questionados aqui. Sobre a devolutiva dos 56 professores no que se refere aos cursos de formação continuada na Rede Municipal de ensino de Araçoiaba da Serra, 67% dos entrevistados participaram de 0 á 30 de cursos e 33% responderam ter participado de uma média de 30 até 100 cursos de formação continuada. Sendo que a soma dos entrevistados de 83% estão na faixa de média de tempo de 0 à 15 anos de docência, não seria portanto um grande de formações se essas fossem divididas por ano de docência entre a maior parte do grupo de entrevistados que responderam de 0 à 30 cursos (média de 2 cursos/ano). 346 O que destacou foi a diferença quantitativa nas respostas dos professores entrevistados, embora trabalhem na mesma rede municipal, alguns listam um maior número de cursos (mais que 30, 100, 200 formações continuadas), elencadas em suas respostas descritivas, sendo contraditório, pois, as formações citadas por muitos são ignoradas/esquecidas ou não respondidas por outros, 20% dos professores entrevistados optaram a não colocar nada ou dizer que não se lembram de nenhuma formação continuada, professor P37: não me lembro (mesmo tendo ingressado na Rede Municipal há 03 anos), já o professor P21 resume em uma, o que considera formação continuada a graduação de Pedagogia, ele atua há 10 anos na rede de ensino municipal da cidade. O que levaria professores que atuam, nos mesmos lugares/escolas terem percepções, concepções, memórias diversas e divergentes sobre o que seria a Formação Continuada? Quais as apropriações e representações esses professores tem sobre o seu próprio percurso formativo, porquê alguns professores tomam como formação todo um sem fim de cursos, sejam eles de empresas privadas que financiam sistemas de Apostilas para o município, cursos de saúde emocional, curso de lousa digital, cursos de jogos como Lego: educação robótica, encontros mensais pedagógicos, massoterapia e as formações do MEC. Como lembrar-se, nomear ou identificar como formação continuada significativa, algo que torna-se um produto a ser consumido obrigatoriamente, visto que muitas dessas formações são convocações em horários de serviço do docente, sendo oferecidas em conformidade com política municipal do período, ou como programas/projetos do Governo Federal e até mesmo de empresas privadas visando a venda de alguma “capacitação” para o município, acabamos por produzir uma formação contínua dentro de uma descontinuidade no tempo de formação docente. Ao analisar a segunda pergunta, nas questões abertas do questionário: Qual palavra vem à mente, quando pensa em Formação Continuada? A proposta era listar 5 palavras em ordem de importância, limitei tabular e fazer uma análise da 1ª palavra que os professores citam ao pensar em Formação Continuada. Os termos mais citados, foram: conhecimento, atualização, capacitação, aperfeiçoamento e reciclagem. De acordo com Prada (1997), as palavras acima já apareciam em suas pesquisas sobre Formação Docente nos anos 1990, e as palavras – atualização resume-se a ação 347 similar à do jornalismo; informar aos professores para manter nas atualidades dos acontecimentos, recebe críticas semelhantes à educação bancária, já o termo capacitação, ainda segundo o autor, configura como proporcionar determinada capacidade a ser adquirida pelos professores, mediante um curso; concepção mecanicista que considera os docentes incapacitados e aperfeiçoamento implica tornar os professores perfeitos. Denominações do tipo capacitação, treinamento, reciclagem e aperfeiçoamento, entre outras, correspondem a uma ideologia e uma concepção tecnicista da educação que apresentam preocupação com a eficácia e a eficiência na educação tal como acontece na indústria, no comércio e no mercado de capitais cujo foco principal é apenas o lucro. Na realidade, a cada nova etapa de desenvolvimento social e econômico, definem-se novas necessidades do mercado de trabalho, levando ao aparecimento de novos projetos pedagógicos e novos perfis de professores identificados como adequados a essas necessidades. Assim, dentro da ótica do modelo de produção capitalista atual, características como flexibilidade, polivalência, capacidade de adaptação e de aprendizado são valorizadas, e terminam por se refletir nos projetos educacionais de governo, com impactos visíveis nos programas de formação de professores. (CHAMON, 2006). Na suspeita do desconforto dessa impermanência no processo de formação alguns professores da pesquisa traduzem o conceito Formação Continuada, como: Ilusão. Necessária, Cobrança. (Prof.1). Incompatibilidade, Falta de conteúdo, Indisciplina, Formação incompleta e Ignorância. (Prof.2). Tempo, Valores, e Desgaste emocional. (Prof. 3) Decadência, Desinteresse e Injustiça. (Prof. 4) Ou ainda de uma forma objetiva e ambígua, argumentam que a formação continuada é: Aprofundar o conhecimento – bom, Ler muito – ruim, Falta de tempo – ruim, TCC – ruim, R$ - ruim. (Prof. 14). Diferentemente dos 90% dos professores pesquisados, que utilizaram termos e idéias permeados no discurso da formação oficial e das políticas públicas, 10% revela e desvela a Formação Continuada como: 348 cobrança, ilusão, incompatível com algo e até um desgaste emocional (Prof.3). Na contramão de um discurso homogêneo, a minoria dos professores entrevistados desafiaram responder o que outros não responderam, difícil ir contra um discurso sobre a obrigatoriedade/necessidade de formar profissionalmente/continuamente educadores de escolas públicas, nem o próprio professor reconhece onde iniciam-se suas próprias concepções e idéias sobre sua formação e como essas fundem-se com o discurso das políticas maiores, outros preferem não falar, omitem sobre sua opinião, na pergunta do questionário: Que palavra vem a mente quando falamos em Formação Continuada – Prof. 41, deixou o espaço das cinco palavras em branco. O que evidencio na maioria das respostas, é a similaridade entre os conceitos, a pesquisa foi respondida em 11 diferentes escolas e individualmente, segundo a devolutiva dos diretores, eles utilizaram a reunião de trabalho coletivo, para entrega e explicação sobre a pesquisa do questionário, recolhendo os questionários respondidos pelos professores ao final da reunião, mesmo que tenha havido troca entre os pares da mesma unidade, como falar dos conceitos e respostas iguais entre professores de unidades distintas. Essa unanimidade não traz um desconforto por perceber que muitos educadores já assumem a formação continuada como um processo importante e inerente da profissão, o postulado “formação para vida toda” não incomoda por prever um projeto inacabado de professor, incomoda muito mais pela uniformização e privatização de um discurso no projeto formativo docente nas últimas décadas, da transformação do conhecimento em informações destituídas de valor e da polifonia de empresas no mercado de capacitações de professores. Considerações finais No contexto atual na rede pública de ensino, muitos são os cursos que o professor deve realizar, em nome de uma formação continuada, presente nos diversos documentos internacionais e nacionais, mostram essa necessidade e essa direção, de formar-se o professor continuamente, para o que está “porvir” e nunca para o que está “posto”. 349 Destaco aqui três documentos do Banco Mundial de 1995, 1999, 2002, que a questão da formação continuada é uma prioridade, e neles a educação continuada é vista com um fundo eminentemente de “renovação e capacitação”; o documento do Programa de Promoção das Reformas Educativas na América Latina (PREAL, 2004); e, como marcos referenciais amplos, a Declaração mundial sobre a educação superior no século XXI: visão e ação e o texto Marco referencial de ação prioritária para a mudança e o desenvolvimento do ensino superior (UNESCO, 1998) e os documentos do Fórum Mundial de Educação (UNESCO, 2000). Nesses documentos, de uma forma clara ou indireta, está presente a idéia de preparar os professores para formar as gerações para a "nova" economia mundial e de que escola e os professores não estão preparados para isso, a formação continuada, subentendida sempre como algo suplementar, sempre a ser buscada. (GATTI, 2008). Mas, são nas últimas duas décadas que a expansão e oferta de programas e cursos de formação continuada mostrou-se maior, diversos estados e municípios brasileiros contratam empresas para oferecer a formação docente, contam com um interessante volume de investimentos do governo federal e de órgãos internacionais, diversas são as leis que regulamentam, deliberam orçamentos e norteiam a formação de professores no país. (BRASIL, 1998, 2003, 2006 e 2007). Em especifico a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN, lei n. 9.394/96) fomenta junto aos poderes públicos locais um movimento político subsidiado pelo aumento dos investimentos na Formação dos Professores, a lei vem trazer um período de debates sobre a questão da importância da formação continuada e trata dela em vários de seus artigos. O artigo 67, que estipula que os sistemas de ensino deverão promover a valorização dos profissionais da educação, traz em seu inciso II o aperfeiçoamento profissional continuado como uma obrigação dos poderes públicos, inclusive propondo o licenciamento periódico remunerado para esse fim. Mais adiante, em seu artigo 80, está que "o Poder Público incentivará o desenvolvimento e a veiculação de programas de ensino a distância, em todos os níveis e modalidades de ensino, e de educação continuada". E, nas disposições transitórias, no artigo 87, §3º, inciso III, fica explicitado o dever de cada município de "realizar programas de capacitação para todos os professores em exercício, utilizando também, para isto, os recursos da educação a distância". No que diz respeito à educação profissional de modo 350 geral, a lei coloca a educação continuada como uma das estratégias para a formação para o trabalho (art. 40). Na suposta reposição desses pressupostos, a pesquisa pode ser permeada de muitos outros olhares e vieses na interpretação dos dados, falas e palavras do professor – a formação docente abre diversas discussões e enfoques no ato de se constituir professor, percebermos que isso é sempre contínuo do ponto de vista humano, somos seres inacabados, professores inacabados, alunos inacabados, constituídos na travessia, portanto essa pesquisa buscou dialogar com um grupo de professores na busca de entender esse dispositivo/processo nomeado de Formação Continuada. Referências bibliográficas BAUMAN, Zigmunt. Entrevista Sobre a Educação. Desafios Pedagógicos e Modernidade Líquida. Os desafios da educação: aprender a caminhar sobre areias movediças. Cadernos de Pesquisa, v. 39, n.137, p. 661-683, maio/ago. 2009. BANCO MUNDIAL. Priorités et stratégies pour l'education: un étude de la Banque Mondiale. Washington: Banco Mundial, 1995. ______________.Education sector strategy. Washington: Banco Mundial, 1999. ______________.Brasil justo, competitivo, sustentável. Brasília: Banco Mundial, 2002. BRASIL. Lei 9394/96, de 20/12/96. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Diário Oficial da União, Brasília, n. 248, 23 dez. 1996. _______. Conselho Nacional de Educação. Parecer CES n. 908/98. Especialização em área profissional, 1998. _______. Ministério da Educação. Portaria Ministerial n. 1403/03. Sistema Nacional de Certificação e Formação Continuada de Professores da Educação Básica, 2003. _______. Ministério da Educação. Secretaria de Educação a Distância. Portaria n. 81/06. Programa de Formação Continuada para Supervisores de Curso, Professores Formadores e Tutores do Proformação, 2006. _______. Conselho Nacional de Educação. Resolução n. 01/07. Estabelece normas para o funcionamento de cursos de pós–graduação lato sensu, em modalidade de especialização, de 8 jun. 2007. 351 CHAMON, Edna Maria Querido de Oliveira. Um modelo de formação e sua aplicação em educação continuada. Revista Brasileira de Educação v.13 nº 37. Rio de Janeiro. 2008. GATTI, Bernardete A. Análise das políticas públicas para formação continuada no Brasil, na última década. Revista Educação nº44. Belo Horizonte, 2006. IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. http://www.ibge.gov.br/home/. Acesso em: 8 de agosto de 2012. Disponível em: PRADA, Luis Eduardo Alvarada. Formação participativa de docentes em serviço. Editora Universitária. Taubaté, 1997. PREAL – Programa de Promoção da Reforma Educativa na América Latina e Caribe. Ficando para trás. Boletim da Educação na América Latina, 2002. Disponível em http://www.preal.org/. Acesso em: 23 mar. 2013. UNESCO. Declaração mundial sobre educação superior no século XXI: visão e ação. Anais da Conferência Mundial sobre Ensino Superior. Trad. Unesco/CRUB. Paris: UNESCO, 1998. __________. Fórum Mundial de Educaçâo. Cadre d'áction de Dakar. L´Éducation pour tous tenir nos engagements collectifs. 2000. Disponível em: <http://www.unesdoc.unesco.org/>. Acesso em: 18. mar. 2013. 352 EIXO TEMÁTICO: (E5 – HISTÓRIA E FILOSOFIA) É POSSÍVEL DEFINIR O CONCEITO DE VERDADE EM LINGUAGENS COMO DA MATEMÁTICA? Renato Machado PEREIRA - IFSULDEMINAS – MG ([email protected]) Resumo: O presente trabalho tem por finalidade discutir a problemática em definir o conceito de verdade em uma determinada linguagem em investigação. Para tanto, buscaremos apresentar a dificuldade em difinir esse conceito em uma linguagem natural por causa do Paradoxo do Mentiroso e apresentar a estratégia utilizada pelo autor Alfred Tarski para superar esse paradoxo e definir o conceito de verdade para linguagens como da matemática. Palavras-chave: Verdade, Paradoxo, Tarski. 353 Introdução Na literatura filosófica e no significado próprio de cada povo, encontramos várias concepções para o termo verdade, desde sentido prático, sentido de relação, de revelação, de consistência, à ausência de uma propriedade como verdade. Essa diversidade de concepções e de mudanças no conhecimento ao longo da história mostram o quanto a pesquisa sobre a verdade é necessária. Principalmente, quando a discussão está no âmbito da investigação científica, na qual se espera que os conceitos sejam o mais precisos e claros possível. Discutir qual concepção é a ideal e qual é a mais adequada para o discurso científico é importante para o avanço do conhecimento. Os pensadores que diretamente se preocupavam com o termo verdade na língua natural, no conhecimento, na realidade, nas investigações científicas, etc., desenvolveram teorias da verdade. Um dos objetivos dessas teorias é decidir o que usar na definição do termo verdade. Seja o que for utilizado com o objetivo de explicar e definir a “verdade”, deve trazer clareza e amenizar a perplexidade do seu sentido. Diante desse cenário, este texto busca apresentar a dificuldade em difinir o conceito de verdade em uma linguagem natural (como o português ou o inglês) por causa do Paradoxo do Mentiroso e apresentar a estratégia utilizada pelo autor Alfred Tarski para superar esse paradoxo e definir o conceito de verdade para linguagens como da matemática. Definição Formalmente Correta da Verdade No início do século XX, o lógico e matemático Alfred Tarski ambicionou alcançar uma definição “formalmente correta e materialmente adequada” da verdade, isto é, uma definição que preservasse o real e intuitivo significado da noção de verdade, que respeitasse as regras formais a que devemos submetê-la e fosse capaz de superar os paradoxos. Na construção dessa definição tarskiana, as linguagens possuem um papel fundamental. Para ele (1969, p. 113), essa definição deve ser relativa a uma linguagem particular e afirma que a verdade é um atributo que as sentenças (enquanto objetos 354 físicos, ou classes de tais objetos) têm ou não, dependendo, entre outras coisas, do seu significado e da sua estrutura gramatical na linguagem em questão. Por isso, de certa maneira, não é correto afirmar “a definição de verdade de Tarski”, mas sempre uma definição de verdade referente a uma dada linguagem. No seu ensaio de 1933, o autor faz uma apresentação da definição de verdade para uma linguagem particular, no caso a linguagem do Cálculo de Classes, e depois descreve, de um modo geral, como é que o mesmo método de construção da definição pode ser aplicado a outras linguagens com uma estrutura mais ou menos semelhante. Assim, não há apenas uma definição da verdade; de fato, nem mesmo possuímos duas ou mais concepções da verdade aqui, o que temos é uma concepção da “verdadeem-L1”, uma concepção da “verdade-em-L2” e, assim, por diante. A relativização é necessária pelo fato de que as linguagens tratadas são diferentes em significado e estrutura e, principalmente, porque nem todas serão capazes de evitar paradoxos. Por exemplo, as línguas naturais não respeitam as condições necessárias e, consequentemente, falham na construção da concepção de verdade (veremos os motivos nos tópicos seguintes). Nas palavras do Tarski (1944, p. 338): “(...) para todas as línguas naturais, linguagens “faladas” – o significado do problema [da definição da verdade] é mais ou menos vago, e sua solução apenas pode ter um caráter aproximado”. Desse modo, Tarski se dedica, principalmente, ao estudo das “linguagens formalizadas”, isto é, uma linguagem em que sua descrição é especificada claramente e exatamente. Para ele (1935, p. 403), uma descrição da linguagem é clara e exata apenas quando sua especificação é puramente estrutural, ou seja, quando empregamos nela somente os conceitos relacionados à forma e ao arranjo dos símbolos e expressões compostas da linguagem. Tarski é um daqueles pensadores que veem nas línguas naturais um meio inadequado para a expressão e o desenvolvimento da ciência e que acalentam a esperança de que linguagens mais apropriadas a esse fim possam, finalmente, substituir a linguagem de todos os dias no discurso da metodologia da ciência (1944, p. 338-339 e 1969, p. 112-113). E chega a afirmar: Linguagens formalizadas são completamente adequadas para a apresentação da lógica e de teorias matemáticas; e me parece que não há nenhuma razão essencial porque elas não podem ser 355 adaptadas para uso em outras disciplinas científicas e em particular para o desenvolvimento das partes teóricas das ciências empíricas. (TARSKI, 1969, p. 114). Como dito anteriormente, a noção de verdade para Tarski deverá ser formalmente correta e materialmente adequada. Para que uma definição seja formalmente correta, é preciso que ela obedeça às regras formais que regem a construção de definições, tais regras só adquirem um sentido completamente definido quando lidamos com uma linguagem formalizada. Desse modo, antes de construirmos uma definição formalmente correta, será preciso especificar de modo claro e exato a estrutura da linguagem. Para tanto, Tarski (1944, p. 337-338 e 1935, p. 402) apresenta um caminho a ser seguido: Devemos caracterizar inequivocamente a classe das expressões que sejam consideradas significativas; devemos indicar todas as expressões que decidiremos usar, sem defini-las e que se chamam termos indefinidos ou primitivos; devemos fornecer as regras de definição para introduzir termos definidos ou novos; devemos estabelecer critérios para distinguir, dentro da classe de expressões, aquelas a que chamaremos sentenças; devemos indicar todas as sentenças primitivas ou axiomas, isto é, as sentenças que decidiremos afirmar sem prova; devemos formular as condições nas quais poderemos afirmar uma nova sentença da linguagem ou teorema; devemos fornecer as regras de inferência (ou regras de transformação), mediante as quais poderemos deduzir novas sentenças a partir de outras sentenças previamente afirmadas. É importante essa especificação porque, por exemplo, não podemos demonstrar que certo número é primo, ou que todos os números primos têm certa propriedade, numa linguagem que não contenha o termo primo. As definições são utilizadas para introduzir novas expressões na linguagem, as quais permitirão formar novas sentenças, que não eram antes formuláveis nela e que podem agora ser ou não demonstradas. Mas, se essa introdução de novas expressões não obedecesse a certas regras, o enriquecimento daí resultante poderia acabar por desvirtuar completamente a linguagem, por exemplo, tornando-o inconsistente. Essas regras, sobretudo, dizem respeito à relação entre o novo termo introduzido e os que anteriormente já pertenciam à linguagem. O significado do novo termo deve 356 ser especificado, utilizando-se apenas aqueles já disponíveis na linguagem. A definição é, ela própria, uma sentença da linguagem que faz essa especificação. O caso que mais interessa dos predicados para Tarski (1969, p. 104) é aquele em que a definição tem a forma de uma bicondicional. Ao lado esquerdo da bicondicional, dá-se o nome de definiendum e ao direito o de definiens. A expressão que se quer definir ocorre apenas no definiendum, pois seria circular tentarmos especificar o significado de uma palavra como “primo” usando esse mesmo vocábulo na nossa especificação: quem não compreendesse já a palavra “primo”, não poderia compreender a definição. No caso presente, como queremos definir a expressão “x é verdadeira”, é de se esperar que a definição tenha a forma: x é verdadeira ↔ p e que a palavra “verdadeira” não ocorra na sentença que ocupa o lugar de “p” (isto é, no definiens). É também necessário evitar-se a falácia do círculo vicioso, que consiste em definir um termo com base num outro que, por sua vez, é definido com base no primeiro (ou que, mais indiretamente, é definido com base num terceiro que, por sua vez, é definido com base no primeiro). Isto se evita impondo-se, como condição, que as expressões que ocorram no definiens pertençam ao vocabulário primitivo (SANTOS, 2003, p. 99). Enfim, para Tarski (1944, p. 337-339), uma definição da verdade formalmente correta segue a especificação da estrutura de uma linguagem, ou seja, a especificação das sentenças, palavras e conceitos que desejamos usar para definir a noção de verdade e também das regras às quais a definição deve ser submetida. Definição Materialmente Adequada da Verdade Pela sua ligação exclusiva à língua natural e ao uso efetivo da expressão, o objetivo da adequação material é bem mais problemático e indefinido do que o da correção formal, para o qual, como vimos, existem regras precisas que guiam a decisão (SANTOS, 2003, p. 101-102). A dificuldade tem origem na heterogeneidade daquilo que está sob comparação, pois não se trata de confrontar duas definições, mas de comparar o significado explicitado numa definição com o significado implícito no uso. 357 A isto se acresce o fato de que muitas expressões da linguagem corrente são vagas e ambíguas (TARSKI, 1944, p. 348), pelo que qualquer definição explícita só poderá concordar com alguns aspectos do seu uso, negligenciando outros. Desta forma, quais são os critérios que devemos ter para determinar se uma definição é ou não é adequada? Tarski considera que, a limite, a questão só poderá ser resolvida pelo método do inquérito estatístico aos usuários da linguagem . Todavia, ainda aí, coloca-se a questão de saber se os falantes têm, em geral, condições para entender a definição que lhes seria apresentada, especialmente se esta envolver o recurso a um certo vocabulário técnico. Para o autor, (1944, p. 334), a questão da adequação tem o seu lugar quando a definição pretende captar, ou ser, conforme o significado comum, testemunhado pelo uso, da expressão. Assim, ele nos convida a refletir sobre a questão: ‘em que condições a sentença “a neve é branca” é verdadeira ou falsa?’. Para Tarski devemos embasar na “concepção clássica” da verdade, pois diremos que a sentença é verdadeira se a neve é branca; e falsa se a neve não é branca. Ele chama de “concepção clássica” a concepção filosófica da verdade que, hoje, é mais comumente conhecida por “concepção correspondentista” ou “concepção da verdade-como-correspondência”. Tal opção é meramente instrumental em relação ao objetivo principal de formular uma definição de verdade que seja formalmente correta e materialmente adequada, ou seja, que esteja de acordo com alguns usos “corretos” e “comuns” do termo verdade. Neste contexto, parece haver uma tensão entre os objetivos da correção formal e os da adequação material, pois, por um lado, para ser formalmente correta, a definição de verdade tem de ser formulada numa linguagem formalizada e, por outro, para atender o critério de adequação material, parece que a definição de verdade precisa ser dada na língua natural. Realmente, essa tensão será um traço permanente da teoria de Tarski e o critério de adequação não será uma solução definitiva, mas determinará uma forma definida. De fato, o que o autor oferece é um método geral que permite, para as linguagens formalizadas, introduzir, por definição, certo predicado especial, que somos convidados a reconhecer como sendo o homólogo do nosso predicado de verdade. Em outras palavras, Tarski propõe uma convenção que capta, segundo ele, a noção comum de verdade e, ao mesmo tempo, é formalmente correta, pois não infringi as condições de especificação da estrutura da linguagem. 358 Assim, de modo geral, uma definição de verdade materialmente adequada, segundo Tarski, deve implicar em todas as sentenças do seguinte padrão, chamadas tanto de “forma T” como de “esquema T” ou “convenção T” (1944, p. 335): (T) X é verdadeira se, e somente se, p, em que a letra “p” deve ser substituída por qualquer sentença da linguagem e “X” por um nome dessa sentença. Como exemplo da forma T, temos: “Sócrates é mortal” é verdadeira se, e somente se, Sócrates é mortal, sendo que “Sócrates é mortal” (com aspas), é um nome da sentença e Sócrates é mortal é a própria sentença. A qualquer sentença com a forma dessa equivalência, passaremos a chamar “sentença-T”. Tarski (1944, p. 354-355) julga que as sentenças-T refletem o aspecto essencial do uso corrente da expressão “é verdadeira” (na sua aplicação a sentenças declarativas), de tal modo que estar de acordo com as sentenças-T é estar de acordo com o significado implícito no uso corrente da expressão. A condição de adequação material determina univocamente a extensão do termo ‘verdadeiro’ (TARSKI, 1944, p. 346) e podemos definir verdade a partir da referência a todas as sentenças-T da linguagem. Cada uma das sentenças-T pode ser considerada uma “definição parcial” de verdade (TARSKI, 1944, p. 335). Elas possuem a forma de bicondicional que é requerida para a definição de predicados e explica o significado do predicado “é verdadeira” na sua aplicação exclusiva a uma certa sentença. Uma definição completa seria uma “conjunção lógica”, ou um “produto lógico” de todas elas. Por “conjunção lógica”, Tarski tem, em mente, uma conjunção das sentenças-T. Devido a esse critério, tal definição apenas funciona em linguagens finitas, por causa da impossibilidade de expressar com a lógica moderna uma conjunção lógica de infinitas sentenças. Segundo os comentadores Susan Haack (1978, p. 143-144) e Richard Kirkham (1992, p. 207), a condição da forma T serve como um critério para decidir quais são “boas” teorias da verdade, como um filtro que discrimina, dentre as numerosas teorias 359 da verdade, aquelas que satisfazem condições mínimas de aceitabilidade e que, portanto, têm alguma perspectiva de sucesso. Em resumo, uma definição satisfatória de verdade será uma definição materialmente adequada e formalmente correta. Desse modo, em primeiro lugar, devemos especificar a estrutura da linguagem e, em segundo lugar, estabelecer o critério para a adequação material, conhecido como convenção T. A definição geral da verdade será uma conjunção lógica de todas as sentenças-T da linguagem (TARSKI, 1944, p. 16). Linguagem-objeto e Metalinguagem Se alguém diz “Eu tenho 1,70 m de altura” ou “Aquela é a minha casa”, está usando autorreferência. A autorreferência é aparentemente uma parte essencial da nossa linguagem e reflete nossa autoconsciência. Contudo, a possibilidade da autorreferência na linguagem pode criar problemas. Um problema de autorreferência conhecido como Paradoxo do Mentiroso, foi inspirado num conto de Epimênides. Consta-nos que Epimênides, um cretense, dissera: “Todos os cretenses são mentirosos”. Se analisarmos essa sentença constataremos que ela não gera uma contradição e que, portanto, não se trata de um paradoxo. Pois, se o que Epimênides diz for falso, ele mente e a sentença ‘alguns cretenses não são mentirosos’ é verdadeira, ou seja, a sentença sendo falsa não resulta em contradição com a sua negação. Apesar desse conto não gerar contradição, ele inspirou a versão clássica desse paradoxo que pode ser descrita pela seguinte sentença: “Esta sentença é falsa”. Se esta sentença é verdadeira, então ela é falsa porque o que ela diz é que ela é falsa (e, portanto, verdadeira e falsa). Se ela é falsa, então ela deve ser verdadeira, pois ela é exatamente o que ela diz que é. Assim, se ela é falsa, então ela é verdadeira (e, portanto, verdadeira e falsa). Ou seja, a sentença é verdadeira se e somente se ela for falsa. Porém, de acordo com o princípio da não-contradição, ela tem de ser ou verdadeira ou falsa e, de qualquer forma, ela é ambas as coisas. Logo, ela é uma contradição. 360 Em versões mais ou menos variadas, esse paradoxo era bem conhecido, e preocupava tanto os filósofos antigos como os modernos. Inclusive, conta-se que ele estava tão intrincado a Fileto de Cos (340-285 a.C.) que em sua lápide foi escrito: “Ó estranho: Fileto de Cos eu sou. Foi o Mentiroso quem me matou, Pelas péssimas noites que me causou.” (Carnielli & Epstein, 2006, p. 24). Para entendermos como esse paradoxo pode ser uma fonte de ceticismo a respeito da verdade, temos de apreciar sua ligação crucial com as sentenças-T enquanto paradigmas do uso adequado deste conceito (SANTOS, 2003, p. 128-136). Essa ligação é especialmente visível na formulação do paradoxo de que trataremos a seguir e que Tarski adota como objeto de análise e que atribui ao lógico Polonês Jan Lukasiewicz (TARSKI, 1969, p. 108). Assumindo que o nosso uso do termo “verdade” é adequado e, dessa forma, que todas as instâncias da convenção T são gramaticais, consideremos a seguinte sentença: (i) A sentença impressa na linha 9 da página 361 deste artigo é falsa. Vamos tomar “s” como sendo a abreviação dessa sentença. Podemos observar que “s” é uma sentença autorreferente, mas também gramatical e pertencente à linguagem natural. Olhando para a linha 9 da página 361 deste artigo, nós facilmente observamos que “s” é apenas a sentença impressa nessa página, ou seja, (ii) “s” é idêntico à sentença impressa na linha 9 da página 361 deste artigo. Como nosso uso do termo “verdade” é adequado, nós podemos afirmar a forma T em que “p” é substituído por “s”. Assim, temos que: (iii) “s” é verdadeira se, e somente se, s. Agora, lembrando que “s” é a sentença (i), nós podemos substituir “s” por (i) no definiens e obtemos: (iv) “s” é verdadeira se, e somente se, a sentença impressa na linha 9 da página 361 desta tese é falsa. Pela regra de substituibilidade dos idênticos, nós concluímos: 361 (v) “s” é verdadeira se, e somente se, “s” é falsa. Isso nos conduz a uma contradição: “s” prova ser tanto verdadeira quanto falsa. Partindo de sentenças plausivelmente verdadeiras e usando regras de inferência que conservam a verdade, somos conduzidos a uma conclusão logicamente falsa. Estamos diante de uma grande dificuldade, mas, como bom lógico, Tarski declara que não podemos nos conformar com esse fato. Temos de descobrir sua causa. Mas que premissas ou formas de raciocínio deveremos rejeitar? Uma maneira de evitar o paradoxo seria rejeitar as sentenças do tipo (iii); por dois motivos: ou a sentença (iii) não é realmente uma instância da forma T, ou ela é, mas nem todas as instâncias da forma T são gramaticais. Porém, para que uma sentença se qualifique como uma instância da forma T (X é verdadeira se, e somente se, p), basta que no lugar de “X” seja inserido um nome de uma sentença, gramaticalmente correta, da linguagem a cujas sentenças o predicado “é verdadeiro” se refere, e que, no lugar de “p”, esteja uma tradução dessa sentença. E sentenças do tipo (i) são indubitavelmente da língua portuguesa, com significado, e não violam a gramática dessa língua. Ora, se (i) é uma sentença da língua portuguesa, então (iii) é uma equivalência irrecusável da forma T. Assim, a responsabilidade pela contradição deve ser atribuída à ideia de que todas as instâncias da forma T são gramaticais, porém, essa ideia é inerente à definição da verdade (lembrando que a definição refere-se à conjunção das sentenças-T), ou seja, a contradição acontece porque o nosso uso do termo “verdade” é inadequado. Logo, a responsabilidade pela contradição está na própria “concepção da verdade”, a qual deveria, por isso, ser abandonada. Tarski está consciente de que é esse o dilema que enfrenta, ou seja, abandonar a noção de verdade, e, com ela, uma série de outras noções, ou impor-lhe restrições. Inclusive o autor cita uma solução radical do problema: “(...) devemos simplesmente remover a palavra verdade do vocabulário inglês ou pelo menos nos abster do seu uso em algumas discussões sérias” (1969, p. 110-111). Tarski (1969, p. 112), realmente, pretende procurar uma solução que “mantenha essencialmente o conceito clássico da verdade intacto”, mesmo que para isso “a aplicabilidade da noção da verdade tenha que suportar algumas restrições”. Para o autor (1933, p. 267), uma coisa é propor uma modificação de uma linguagem artificial para uso exclusivo de lógicos e matemáticos, outra seria ter a 362 pretensão de reformar as próprias línguas naturais, cuja razão de ser está longe de se esgotar no objetivo de expressar e comunicar teorias científicas. Como veremos, é essa atitude perante as línguas naturais que está na origem da sua conclusão negativa segundo a qual: “Na linguagem coloquial, parece ser impossível definir a noção de verdade ou, sequer, usar essa noção de uma maneira consistente e de acordo com as leis da lógica” (1933, p. 153). Analisemos, então, o argumento em que Tarski estabelece esta conclusão. Ele cita três suposições referentes às linguagens que conduzem ao paradoxo do mentiroso: (I) Temos suposto, implicitamente, que a linguagem na qual o paradoxo é construído contém, além das suas expressões, também os nomes destas expressões, bem como termos semânticos como o termo “verdadeiro” referindo-se a sentenças dessa linguagem; também temos suposto que todas as sentenças que determinam o uso adequado desses termos podem ser afirmadas na linguagem. Uma linguagem com essas propriedades será chamada “semanticamente fechada”. (II) Temos suposto que, nessa linguagem, as leis ordinárias da lógica são válidas. (III) Temos suposto que podemos formular e afirmar em nossa linguagem uma premissa empírica como a sentença (2) [sentença (ii) é um exemplo de (2)] que ocorreu no nosso argumento. (1944, p. 340). Essas três condições que Tarski identifica devem ser aplicadas a qualquer linguagem na qual o Paradoxo do Mentiroso seja formulável. Desse modo, elas se aplicam também às línguas naturais. Podemos dizer que (I) atribui às línguas naturais propriedades responsáveis por tornar (iv), não só uma sentença com significado em uma dada língua natural, mas uma sentença gramatical nela. E (III) faz o mesmo a respeito de (ii), isto é, ela equivale a afirmar que (ii) é uma sentença gramatical em uma dada língua natural. As propriedades que (I) atribui às línguas naturais são (SANTOS, 2003, p. 136): (a) As línguas naturais contêm nomes de todas as suas expressões (incluindo, portanto, nomes de todas as suas sentenças); (b) As línguas naturais contêm termos semânticos aplicáveis às suas próprias expressões (um caso particular disto é a posse do predicado “é verdadeiro” aplicável às suas próprias sentenças); (c) Todas as equivalências da forma T de uma língua natural são sentenças gramaticais dessa língua natural. 363 Uma linguagem que possui as propriedades (a), (b) e (c) é uma linguagem “semanticamente fechada”. Estes três fatos, concernentes às línguas naturais, têm como consequência que uma sentença contraditória, como (v), seja verdadeira em certa língua natural – e é isso que Tarski quer dizer quando afirma que uma linguagem na qual se verifiquem as três condições enunciadas é uma linguagem inconsistente. Assim, para qualquer linguagem L, se L é semanticamente fechada, então não é possível uma definição satisfatória de verdade-em-L. Isso porque, de acordo com a convenção T, essa definição deverá ter como consequência, para cada sentença de L, a sentença-T correspondente; mas, como L é semanticamente fechada, existem em L sentenças autorreferentes, como a nossa sentença s (“s é falsa”), cuja sentença-T correspondente conduz facilmente (a partir de premissas e condições irrecusáveis) a uma contradição. Tarski conclui que, se queremos construir uma definição satisfatória da noção de verdade, temos de nos abster de tomar como objeto qualquer linguagem na qual a condição (I) se verifica. Ou seja, ele aceita a conclusão de que, em linguagens semanticamente fechadas, há sentenças contraditórias que são gramaticais e extrai delas a consequência de que não é possível construir uma definição adequada de sentença verdadeira-em-L, quando L é semanticamente fechada – em particular, quando L é uma língua natural. E propõe, então, que a construção de uma definição adequada da verdade se restrinja a certas linguagens artificiais, às quais sejam possíveis incorporar restrições que impeçam que elas se tornem semanticamente fechadas, como, por exemplo, as linguagens com a estrutura da matemática. Resumindo, Tarski conclui que o Paradoxo do Mentiroso é um problema comum às linguagens semanticamente fechadas, ou seja, aquelas que possuem predicados semânticos como “verdadeiro”, “falso” e “satisfaz”, que podem ser aplicados às próprias sentenças da linguagem. Todas as outras linguagens serão chamadas de semanticamente abertas. Assim, nenhuma sentença de uma linguagem semanticamente aberta pode predicar uma propriedade semântica de si mesma e, portanto, o Paradoxo do Mentiroso não pode ser expresso nessas linguagens. 364 Logo, Tarski decide abandonar as linguagens semanticamente fechadas e restringe seu estudo exclusivamente para as outras linguagens. Contudo, estas, não contendo predicados semânticos aplicáveis às suas próprias palavras e sentenças, não podem definir a verdade. A estratégia, então, é definir a verdade para uma linguagem particular, através de uma outra linguagem: a metalinguagem. Assim, devemos definir dois tipos de linguagens as quais serão (1933, p. 167; 1944, p. 341-343; 1969, p. 114-115): Linguagem-Objeto: é a linguagem de que “se fala” e que é o tema de toda a discussão; a definição da verdade, que estamos buscando, se aplica às sentenças desta linguagem. O símbolo “p” que figura na forma T representa uma sentença arbitrária desta linguagem. Metalinguagem: é a linguagem em que “falamos acerca da” primeira linguagem e, em cujos termos desejamos, em particular, construir a definição da verdade para a primeira linguagem. Toda sentença que figure na linguagem-objeto também deve figurar na metalinguagem, ou seja, ela deve conter a linguagemobjeto como parte dela. A metalinguagem deve ter a riqueza suficiente para nomear cada uma das sentenças da linguagem-objeto. Deve conter termos de caráter lógico, tal como a expressão “se, e somente se,”, e deve conter predicados como “verdadeiro”, “falso” e “satisfeito” que são abreviações para “verdadeiro-na-linguagem-objeto”, “falso-na-linguagem-objeto” e “satisfeito-nalinguagem-objeto”. Como regra geral, temos então de distinguir as duas linguagens que estão envolvidas em cada definição parcial de verdade – X é verdadeira se ,e somente se, p –, por um lado, a linguagem na qual a definição é expressa (metalinguagem) e, por outro, a linguagem a que pertence a sentença cuja verdade estamos a definir (linguagem-objeto). Na convenção T, o símbolo “X” deve ser substituído por um nome de qualquer sentença da linguagem-objeto e do símbolo “p” pela expressão que forma a tradução dessa sentença na metalinguagem (TARSKI, 1933, p. 188). Em outras palavras, a definição de verdade-em-O, em que O é a linguagemobjeto (a linguagem para a qual a verdade está sendo definida), terá de ser dada em uma metalinguagem, M (a linguagem na qual verdade-em-O é definida). 365 Neste contexto, o perigo dos paradoxos pode ser evitado com o recurso a uma metalinguagem. Por exemplo, a sentença que inicialmente nos conduziu a uma contradição, A sentença impressa na linha 14 da página 361 deste artigo é falsa-em-O, que é uma sentença da metalinguagem e, consequentemente, não é paradoxal, ou seja, a sentença pertence à metalinguagem, mas ela não é autorreferente e faz referência a uma sentença da linguagem-objeto. Considerações finais Conforme exposto neste trabalho, a dificuldade em definir o conceito de verdade está basicamente em decidir o que usar na sua definição. O lógico e matemático Alfred Tarski construiu uma definição “formalmente correta e materialmente adequada” da verdade, isto é, uma definição que preserva o real e intuitivo significado da noção de verdade, que respeita as regras formais de uma dada linguagem e que é capaz de superar os paradoxos, como o Paradoxo do Mentiroso. No entanto, sua conclusão foi que sua definição não é possível para linguagens naturais, mas, que, em particular, é possível para linguagens como da matemática. Referências CARNIELLI, W. A. & EPSTEIN, R. L. Computabilidade, Funções Computáveis, Lógica e os Fundamentos da Matemática. São Paulo: Editora UNESP, 2006. HAACK, S. [1978]. Filosofia das lógicas. Tradução: Cezar Augusto Mortari e Luiz Henrique de Araújo Dutra. São Paulo: Editora Unesp, 2002. KIRKHAM, R. L. [1992]. Teorias da verdade: uma introdução crítica. Tradução: Alessandro Zir. São Leopoldo: Unisinos, 2003. 366 SANTOS, R. A verdade de um ponto de vista lógico-semântico. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2003. TARSKI, A. [1933]. The concept of truth in formalized languages. In: TARSKI, 1956, p. 152-278. ________. [1935]. The Establishment of Scientific Semantics. In: TARSKI, 1956, p. 401-408. ________. [1944]. The Semantic Conception of Truth and the Foundations of Semantics. In: LYNCH, 2001, p. 331-363. ________. Logic, semantics, metamathematics. Tradução: J. H. Woodger. Oxford: At the Claredon Press, 1956. ________. [1969]. Truth and proof. Scientific American, n. 220, p. 63-77. In: HUGHES, 1993, p. 99-125. 367 SIMETRIA E ARQUITETURA: UM ESTUDO DE CASO DA IGREJA MATRIZ DE VOTUPORANGA-SP Rosemeire BRESSAN - IFSP – SP ([email protected]) Fernando Bermejo MENECHELLI – UNIFEV – Votuporanga-SP Resumo: No presente trabalho, a simetria, que é um componente importante nos mais diversos estilos arquitetônicos, incluindo templos religiosos, foi identificada em elementos da arquitetura da Igreja Matriz de Votuporanga, uma igreja do estilo neogótico, que apresenta os arcos ogivais, rosáceas, vitrais, abóbodas, etc. Com as fotos da igreja em mãos, elas foram separadas de acordo com o objeto de estudo e classificadas pelos elementos que elas possuíam. Nessa análise, identificou-se rosáceas, vitrais, colunas, faixas de decoração do teto, abóbodas, pórticos. Um pouco da história da Matriz também foi apresentada. Palavras-chave: Simetria. Geometria. Arquitetura. 368 Introdução A simetria, cujo significado é “com medida”, está presente em muitas áreas do conhecimento como na biologia, física, química e artes. Em cada uma delas, ela sempre esteve relacionada com harmonia, beleza e perfeição. Mais conhecida por suas propriedades na matemática, essa simetria também aparece em muitas construções arquitetônicas famosas como mostra a figura 1, o Taj Mahal. Figura 1: Taj Mahal. http://www.flickr.com/photos/foje64/3171556835/sizes/o/in/photostream/ Como exemplo de civilização que utilizou a simetria em sua arquitetura, os Islâmicos podem ser citados. Eles utilizam padrões com motivos florais, figuras geométricas e caligrafia para decorar pisos e paredes. Para Ekhtiar e Moore (2012), uma das características que define a arte islâmica é o uso abundante de padrões geométricos para decorar uma grande variedade de construções e superfícies. Além disso, as contribuições dos matemáticos islâmicos e outros cientistas foram essenciais para o desenvolvimento desta forma única de ornamento, onde a união das ideias com o conhecimento tecnológico avançado é refletida na exatidão matemática dos padrões geométricos islâmicos. O uso da simetria também ocorreu na construção de muitas igrejas quando o estilo gótico foi introduzido por volta do século 12, onde os elementos pertencentes a esse estilo são construídos fazendo uso de rotação, translação e reflexão. Exemplos desses elementos são os arcos ogivais, vitrais, rosáceas, colunas dentre outros. Para unir a simetria com o estilo gótico, uma solução foi analisar os componentes do estilo gótico que aparecem na igreja Matriz de Votuporanga, cidade do interior de São Paulo, e que a consolidam como uma das mais belas igrejas da região. Para concretizar a proposta inicial, várias visitas foram feitas até à igreja, fotos foram tiradas e, depois de separar os elementos mais marcantes, a identificação da simetria em cada um desses elementos foi realizada. O resultado é apresentado na seção sobre Simetria. 369 Um pouco da história da igreja e do estilo neogótico também fazem parte desse trabalho. Para finalizar, algumas considerações são apresentadas, visando mostrar que é possível identificar a matemática, a aplicação de conceitos matemáticos em diversas áreas, até mesmo na construção de uma igreja. Igreja Matriz: Um pouco de história De acordo com o livro Tombo da igreja, a primeira Matriz de Votuporanga, que pode ser vista na figura 2, começou a ser construída em 1939, onde hoje está localizada a fonte da Praça Fernando Costa. Figura 2: Primeira Matriz. Em 1953, por não conseguir abrigar mais a população católica do município, decidiram construir uma nova igreja, ocorrendo a benção solene da pedra fundamental. Uma nova arquitetura mais robusta e mais imponente surgiu, não lembrando em nada a antiga igreja. O estilo utilizado na construção é o neogótico (neo de novo e gótico, estilo característico dos séculos XII e XIII). Essa denominação ocorre pelo fato de estar utilizando o estilo gótico, mas numa era que não é a do gótico. A nova matriz, que pode ser vista na figura 3, foi inaugurada em 1958 com uma missa presidida pelo bispo diocesano. 370 Figura 3: Igreja Matriz atual. Os vitrais da igreja só foram colocados em 1960, ano em que o forro da igreja foi concluído. A partir dessa data, a Matriz tem se tornado referência na região de Votuporanga por sua beleza e grande acolhimento dos fiéis. O estilo neogótico O termo gótico foi popularizado por Giorgio Vasari (1511-1574), o fundador da história da arte, para designar, em sentido negativo, a arquitetura das catedrais relacionando-a com os Godos, que eram os bárbaros mais conhecidos. Daí então, o estilo passou a ser chamado de gótico, ou seja, bárbaro por excelência. Nesse estilo de construção, passou-se a ter uma construção vertical, diferente do estilo românico, cuja estrutura é horizontal. Uma das características desse estilo é a altura, cada igreja projetada era mais alta que as anteriores, demonstrando o tamanho da fé dos cristãos, fato que pode ser observado na figura 4, onde as igrejas já construídas passaram por reformas e, as novas, foram construídas de acordo com o novo estilo. Figura 4: Efeito do surgimento do estilo gótico. Afonso (2013) aponta como novo nesse estilo, a relação entre função e forma, estrutura e aparência, ou seja, a importância dada à perfeita relação entre as diferentes partes da igreja, em termos de proporções: a harmonia, baseada na geometria, como fonte de toda beleza. Para Klug(2002), o fato de as catedrais góticas permanecerem estáveis indefinidamente, apesar da enorme altura, deve-se à sua geometria especial, onde forças de pressão e de sucção se equilibram harmoniosamente para que a estrutura não ceda. 371 Além disso, Afonso (2013) diz que os fatores ideológicos e teológicos também desempenharam um papel essencial na criação do estilo gótico, sendo a luz a presença visível de Cristo segundo as escrituras, ela assumiu-se como elemento fundamental da Estética da elevação do terreno para o espiritual. Segundo Howarth (2001), gótico é a expressão da fé cristã sobre pedra. Por isso, é a arquitetura das igrejas que surgiu na Europa no século XII. Essa arte está dividida em estilos como o gótico irradiante (marcado pelo vazamento das paredes em forma de rosáceas) e o flamejante (caracterizado pelo traçado do rendilhado das janelas, que evocava a imagem de chamas agitadas pelo vento). Eles são marcados pelos arcos ogivais, vitrais, rosáceas, abóbodas, pórticos, colunas, capitéis, pináculos, arcos transversais e diagonais entre outros, como mostra a figura 5. Figura 5: Elementos que compõem o estilo gótico. Diversas igrejas foram construídas seguindo esse estilo. Dentre todas, algumas das mais famosas são apresentadas na figura 6, a catedral de Milão, Reims e Chartres. Figura 6: Igrejas construídas no estilo gótico. 372 Um elemento marcante desse estilo é uma torre alongada com cobertura em formato semelhante a um cone que possui uma cruz ou um pináculo, que pode ser entendido como um elemento terminal das torres e das paredes, muito marcantes nesse período. Os pináculos da Igreja Matriz de Votuporanga e os arcos ogivais podem ser observados na figura 7. Geralmente os arcos ogivais possuem a função de sustentação da nave, que é a ala central da Igreja. Figura 7: Arco ogival e pináculos da Matriz de Votuporanga. Outro elemento marcante do gótico é a rosácea. Segundo Ducher (1992), a rosácea possui o objetivo de iluminar a abóboda da nave e do transepto. Observa-se na figura 8 uma das rosáceas da Igreja Matriz. Figura 8: Rosácea da Matriz Os vitrais translúcidos e coloridos, que têm a função de permitir a entrada de luz e são peças fundamentais que compõem essa arquitetura, são inseridos nas janelas alongadas da igreja como uma característica do gótico, podendo ser observados na figura 15. Os pórticos são elementos arquitetônicos estruturais ou de decoração que possuem a função de grandeza e enfatizam aberturas como a entrada principal de uma edificação. Portal é a palavra que se utiliza para criar um pórtico de acesso principal. O gótico é trabalhado através de colunas (pé-direito) cobertas por um grande triângulo pontiagudo bastante adornado. Esse portal geralmente é acessado por meio de uma escadaria como mostra a figura 9, na entrada principal da Matriz. 373 Figura 9: Pórtico lateral e frontal da Matriz. A abóbada é a forma mais primitiva de construção, podendo-se dizer que é uma cobertura em forma de arcos, que se sustenta por meio do empuxo que é a força que a abóbada faz nos encontros. A Figura 10 apresenta as abóbodas, com os arcos diagonais e as colunas que sustentam os arcos e os frontões dos portais. As colunas têm origem na arquitetura Greco-romana e são chamadas de ordens dóricas, jônicas e coríntias. As catedrais góticas utilizam a ordem coríntia, que são composições adornadas com capitéis, ou com motivos florais. Em muitos casos, há elementos que exprimem uma função que não cumprem, por exemplo, as colunas que aparentam transmitir o peso das abóbadas para o pavimento da igreja, mas sua função é decorativa. Figura 10: Arcos e colunas A Simetria Utilizada para obter a perfeição, a simetria tem sido a ferramenta de muitos artistas, serralheiros, pintores, arquitetos, decoradores e, até mesmo, da indústria têxtil e de cerâmicas. Esse uso constante é decorrente da alta aceitação de produtos com 374 simetria no mercado imobiliário, artes, confecções e decorações. Como exemplo, a figura 11 ilustra uma peça da cerâmica Marajoara, o Castelo Mourisco no Rio de Janeiro, que abriga a fundação Oswaldo Cruz e um modelo de Arquitetura do Marrocos. Figura 11: Exemplos da utilização da simetria http://artcultmarajo.blogspot.com.br/ , http://literaturaeriodejaneiro.blogspot.com.br/2011_06_01_archive.html http://pt.dreamstime.com/imagens-de-stock-royalty-free-arquitetura-marroquinatradicional-image22568539 Para Ching (1998), uma composição arquitetônica pode utilizar a simetria para organizar suas formas e espaços de duas maneiras. É possível criar-se organização construtiva inteiramente simétrica. Em algum ponto, entretanto, qualquer arranjo totalmente simétrico terá de confrontar e resolver a assimetria de seu terreno ou contexto. Nas construções religiosas, os elementos simétricos que compõem a geometria das igrejas são variados, podendo ser encontrados em diversos tipos de arquitetura, desde o estilo mesopotâmico até o contemporâneo. Na Igreja Matriz de Votuporanga, são observadas as rosáceas, vitrais, cúpulas, arcos e faixas decorativas. Todos esses elementos possuem em comum a simetria que é composta por rotação, translação e reflexão horizontal e vertical. Segue a descrição de alguns elementos da Igreja Matriz: A simetria das rosáceas As rosáceas ou rosetas ou mosaicos circulares são elementos arquitetônicos ornamentais muito usados antigamente em igrejas, palácios, museus, mesquitas e em todo tipo de construção que merecesse destaque, dentro do estilo gótico e neogótico. Os motivos são os mais variados: retilíneos, curvilíneos e irregulares que podem ser observados na figura 12. 375 Figura 12: Modelos de rosáceas com motivos variados Na Igreja Matriz, essas rosáceas estão presentes nas portas e nos vitrais que se encontram no fundo e nas laterais da Igreja. A figura 13 mostra a porta principal da Igreja com vista do altar. Figura 13: Porta da Entrada Principal da Igreja Matriz Na parte inferior observa-se a porta de entrada e, na superior, proporcionando um aumento da claridade, uma janela de tamanho considerável, nas mesmas cores que a porta principal. Analisando a porta de entrada frontal, tem-se uma rosácea com formato de cruz na parte superior e duas outras, com mais divisões, na parte inferior. A rosácea apresentada na figura 14 possui simetrias de rotação, reflexão horizontal e vertical. Esse tipo de rosácea é o mais comum, pois a sua confecção se torna fácil, já que é possível dividi-la em quatro partes iguais, ou seja, aplicando uma rotação de 90º. 376 Figura 14: Rosácea inferior e superior da porta principal. As linhas tracejadas representam reflexão horizontal e vertical. A linha contínua com uma seta serve para representar a rotação, cujo roto-centro ou centro de rotação está marcado com um círculo no centro da rosácea. A rosácea que se encontra na parte superior da porta é uma construção que apresenta as mesmas simetrias da rosácea inferior, mas de uma maneira mais simples. As portas laterais também possuem duas rosáceas cada uma. Essas rosáceas apresentam simetrias iguais às que foram exibidas na figura 14. A figura 15 mostra uma dessas rosáceas. Figura 15: Rosácea da porta lateral O vitral que aparece na figura 16 está localizado no fundo da igreja. Observe que na parte superior do mesmo, tem-se uma rosácea, cujos detalhes podem ser vistos na mesma figura. Figura 16: Rosácea do vitral no fundo do altar As simetrias utilizadas nessa rosácea são iguais às já apresentadas: rotação de 90º, reflexão na horizontal e reflexão na vertical. No vitral lateral tem-se a rosácea mostrada na figura 17, que possui o mesmo padrão das anteriores com uma variação nas cores. 377 Figura 17: Rosácea contida no vitral lateral A simetria das faixas As faixas decorativas também estão presentes em construções atuais. Como exemplos, têm-se as que são utilizadas em pisos, azulejos e gesso. Na Igreja Matriz, elas aparecem no teto e no contorno dos vitrais. Na figura 18, é apresentado o teto que compõe a cúpula do altar, todo revestido com faixas, separando cada desenho que o cobre. Figura 18: Cúpula do altar dividida em várias seções Essa cúpula é dividida em várias partes que são separadas por faixas de motivos variados. A primeira faixa a ser observada com detalhes é a que aparece na figura 19. Ela é construída com duas cores e possui as simetrias de translação, reflexão horizontal, reflexão vertical, rotação e translação refletida. O esquema geométrico do padrão contido nessa faixa, com as respectivas simetrias, é representado também nessa figura. 378 Figura 19: Faixa decorativa e esquema geométrico As linhas tracejadas representam as reflexões na horizontal e na vertical, o semicírculo mostra a rotação de 180º e, os círculos preto e branco, mostram os rotocentros. É possível observar o eixo de simetria de reflexão vertical em dois pontos diferentes, um passando pelo centro do detalhe e o outro na junção dos semicírculos ocorrendo o mesmo com a rotação. Quando se constrói uma faixa, a rotação utilizada é sempre de 180º. A única simetria que não foi identificada na figura 19 é a translação refletida. De acordo com Bressan (2006), essa transformação consiste em refletir horizontalmente e transladar a figura. Então, o movimento final é o mesmo da reflexão horizontal. Dessa maneira, toda vez que ocorrer a reflexão horizontal, também ocorre a translação refletida. Para os padrões de faixas, há sete maneiras diferentes de construção. O padrão identificado na faixa é o que apresenta todas as simetrias e tem o maior número de ocorrências em objetos tais como janelas, portões, grades e portas. Juntamente à faixa apresentada na figura 19, existe outro tipo de faixa cujos detalhes são apresentados na figura 20 e, cuja função, é contornar o desenho na parede, separando-o dos demais. Figura 20: Modelo de faixa utilizada no teto. Essa faixa pode ser esquematizada geometricamente, como mostra a figura 21, sendo possível observar as simetrias de translação e reflexão na vertical, com dois eixos. 379 Figura 21: Esquema geométrico da faixa com representação das simetrias. Na figura 22, tem-se a combinação das duas faixas apresentadas nas figuras 19 e 20 que aparecem teto da Igreja, demonstrando beleza, simetria e perfeição. Figura 22: Teto da igreja com vista de baixo. Além da combinação dessas duas faixas, a Igreja possui outras, dentre as quais a que está na Figura 23. Nessa combinação de faixas, percebe-se outro estilo para as cores e para os formatos utilizados em cada parte que compõe o resto do teto da nave principal. Figura 23: Teto da igreja decorado com vários tipos de faixas. Analisando uma dessas faixas, pode-se concluir que o artista, até pelo tamanho do teto, escolheu um padrão fácil para ser utilizado e que aparece novamente no teto do 380 altar, em outra cor. No esquema apresentado na figura 24, existe uma aproximação de uma das faixas do teto com a representação dos eixos de reflexão. Figura 24: Esquema geométrico da faixa O padrão dessa faixa é o mesmo da faixa apresentada na figura 21, possui as simetrias de translação e reflexão vertical. A segunda faixa dessa combinação é bem parecida com a faixa da Figura 20. A figura 25 a apresenta com mais detalhes, juntamente com o esquema geométrico. Figura 25: Combinação de faixas no teto Considerações finais Simetria, como largo ou estreito, como você pode definir seu significado, é uma ideia pela qual o homem através dos tempos tenta compreender e criar ordem, beleza e perfeição. Hermann Weyl O conteúdo de simetria permite uma relação com diversas áreas do conhecimento. No presente trabalho, ela foi relacionada com a arquitetura, relação essa que permitiu analisar alguns elementos do estilo gótico com um olhar matemático, pesquisar sobre a história da igreja Matriz de Votuporanga e conhecer um pouco sobre civilizações que utilizaram e utilizam a simetria em suas construções, até hoje. Para muitos, ela faz parte do estilo, da cultura e muito mais que isso, da vida de cada cidadão que vive para construir, pintar, esculpir ou criar. Atualmente, os elementos geométricos da simetria que são aplicados à arte em geral, são conhecidos e estudados apenas por arquitetos, designer e artistas plásticos, porém, uma expansão desses conhecimentos para a sala de aula pode ser possível por meio da 381 interdisciplinaridade entre a matemática, a história e a educação artística. Bovo (2004) afirma que ...a ação pedagógica da interdisciplinaridade aponta para a construção de uma escola participativa, que deriva da formação do sujeito social, em articular saber, conhecimento, e vivência. Para que isso se efetive, o papel do professor é fundamental no avanço construtivo do aluno. É ele, o professor, que pode perceber as necessidades do aluno e o que a educação pode proporcionar ao mesmo. A interdisciplinaridade do professor pode envolver e instigar o aluno a mudanças na busca do saber. Tomando como base esse trabalho, é possível transformá-lo em um projeto a ser desenvolvido com alunos do ensino fundamental e médio, juntamente com professores que se interessarem. O professor pode agendar uma visita técnica com alunos até uma igreja que apresente diversos elementos para serem explorados, os alunos tiram fotos do que acham interessante para depois, na escola, realizarem as atividades propostas pelos professores de matemática, artes ou história. Esse aluno entrará em contato com uma variedade muito grande de conceitos que passarão de uma disciplina para outra, mostrando ao aluno que existe relação entre as disciplinas, que nenhuma ciência foi construída isoladamente, fazendo com que ele adquira um conhecimento utilizável, com significado, aplicado em situações do seu dia a dia e que relacione diversas áreas do conhecimento. Referências AFONSO, L. O. Gótico Português: História da Arquitetura. Universidade Lusófona do Porto, 2013. Disponível em http://www.academia.edu/2983892/O_Gotico_Portugues. BOVO, M. C. Desenvolvimento da Educação Interdisciplinaridade e Transversalidade como Dimensão da Ação Pedagógica. Revista Acadêmica Multidisciplinar Urutágua (UEM), v. 7. p. 1-12.2004. BRESSAN, R. Construindo faixas simétricas. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA, 3., 2006, Águas de Lindóia. Anais... Águas de Lindóia: SBEM, 2006. 1 CD-rom. 382 CHING, F. D. K. Arquitetura – Forma, espaço e ordem. São Paulo: Martins Fontes, 1998. DUCHER, R. Características dos estilos. São Paulo: Martins Fontes, 1992. EKHTIAR, M. D., MOORE, C. Art of the Islamic World: A Resource for Educators. New York: The Metropolitan Museum of Art, 2012. HOWARTH, E. Crash Course in Architecture. New York: Barnes & Noble Books, 2001. KLUG, Sonja U. Catedral de Chartres: a geometria sagrada dos cosmos. São Paulo: Madras, 2002. CONCEPÇÕES DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE MATEMÁTICA: UM ESTUDO A PARTIR DE NARRATIVAS Maria Ednéia Martins Salandim ([email protected]) 383 Resumo: Neste artigo tematizamos diferentes concepções de formação de professores que predominaram no estado de São Paulo até final da década de 1960 e de que modo estas concepções influenciaram a criação e manutenção de cursos que formavam professores. Nossas reflexões são parte de nossa pesquisa de doutorado (MARTINSSALANDIM, 2012), na qual estudamos o movimento de expansão dos cursos de Matemática pelo interior do Estado de São Paulo, o qual se intensificou em meados dos anos 1960. Foi a partir de quinze narrativas, usando a metodologia da História Oral, constituídas juntamente com professores e alunos que participaram da estruturação dos anos iniciais destes cursos e a partir de estudo específico sobre o termo “ licenciado” que pudemos disparar uma reflexão sobre diferentes concepções de formação de professores, particularmente áquelas voltadas para atuação em Matemática. Nossas análises, diparadas pelas narrativas, evidenciaram que os diferentes cursos de Matemática receberam diferentes influências, e em diferentes ênfases, tanto de outros cursos já existentes, da demanda que buscavam atender, das reestruturações políticas, econômicas e educacionais efetivadas à época e dos profissionais que neles atuaram, sendo que identificamos a existência de pelo menos três modelos de formação neste período, mas que de modo geral traduziam uma deformação no já conhecido modelo “ 3+1”. Foi nestas diferentes influências e demandas que os cursos atendiam que as diferentes concepções revelaram-se e nos auxiliaram a pensar sobre modos como cursos de Licenciatura em Matemática foram se constituindo: nascidos sem estrutura própria, afetados por legislações, pela demanda de profissionais e por interesses dos envolvidos nos cursos, as licenciaturas foram se constituindo nos desvãos das práticas, das teorias, das legislações e dos interesses políticos e econômicos. Palavras-chave: Licenciatura em Matemática. Formação de professores. História da Educação Matemática. Introdução O estudo da dinâmica de expansão dos cursos de Matemática pelo interior paulista até a década de 1960, durante nossa pesquisa de doutorado (MARTINSSALANDIM, 2012), permitiu-nos auscultar concepções relativas à formação de 384 professores implícitas nas alterações estruturais do ensino superior, ainda que nem todos os cursos criados naquela década oferecessem a modalidade licenciatura, que se estabeleceu via legislação naquela década. Para aquela pesquisa, além de fontes escritas – documentos e registros cartográficos, por exemplo – constituímos quinze narrativas envolvendo vinte professores que participaram dos momentos iniciais de criação e instalação de cursos de graduação de Matemática, seja como alunos, professores e/ou gerenciadores, especificamente nos cursos localizados nos municípios de Araraquara, Campinas, Dracena, Presidente Prudente, Santo André, São José do Rio Preto, Taubaté e Tupã – os quais foram criados nos anos 1960. A constituição das narrativas escritas a partir de entrevista com cada depoente deu-se segundo a metodologia da História Oral. A partir da constituição dos dados para a pesquisa – valendo-nos de fontes orais e escritas-, um dos eixos de análise contemplou o tema concepções de formação de professores. Neste nosso texto, inicialmente tratamos os cursos como de Matemática e não especificamente como licenciaturas, uma vez que a terminologia, tal como a usamos na atualidade surge com a 1ª Lei de Diretrizes e Bases Nacionais, sendo que anteriormente o termo licenciado assume outras caracterizações. Como início de um abordagem a essas concepções, uma análise do termo "licenciado" nos ajuda a compreender a estrutura dos cursos de graduação para formação do professor de Matemática O termo "licenciado" De acordo com Castro (1974), embora a formação do professor para o ensino secundário (ou equivalente) tenha se estruturado nas Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras (FFCL), o termo “licenciado” nem sempre esteve propriamente vinculado a essa formação. O Estatuto das Universidades Brasileiras, de 1931, referia-se ao professor dos cursos de ensino secundário, nas Ciências, nas Letras e na Educação, como licenciado. As primeiras legislações da USP-SP atribuíam o título de "licenciado" a todos os graduados nas diferentes seções da FFCL e "licenciados com direito ao exercício do Magistério" àqueles que realizavam a formação pedagógica no Instituto de Educação Posteriormente, o termo "licenciado" foi substituído pela expressão "licenciado em filosofia, ciência ou letras" e "licenciados com direito ao exercício do Magistério" por "licenciado para o magistério secundário". No entanto, ainda que alteradas as 385 nomenclatura, mantém-se a ideia geral: para graduar-se professor, primeiro era preciso licenciar-se e depois, obrigatoriamente, passar por uma formação pedagógica, o que não necessariamente era a regra para os professores em exercício, uma vez que as exceções impunham-se dada a falta de profissionais para atuar no ensino secundário. Uma primeira alteração no significado do termo “licenciado” é identificada por Castro (1974) na documentação relativa à organização da Faculdade Nacional de Filosofia no Rio de Janeiro, em 1939, quando era conferido o título de "bacharel em" aos graduados, de acordo com a área específica cursada e, junto a esse título, o de “licenciado em”, na mesma área específica, aos bacharéis que concluíssem o “curso de Didática”, composto por seis disciplinas, que substituía a “formação pedagógica” anterior. No entanto, ainda mantinha-se a regra: para licenciar-se era obrigatório ser, antes, bacharel. Outra possibilidade, mas não obrigatória, apresentou-se a partir de 1946 para os alunos no quarto ano dos cursos da FFCL: aqueles que buscavam o bacharelado poderiam prosseguir em duas ou três "cadeiras", e aqueles que buscavam a licenciatura receberiam formação didática, teórica e prática em ginásio de aplicação, devendo também cursar a disciplina “Psicologia Aplicada à Educação”. Mesmo com tais reestruturações, a formação de professores continuava a seguir o modelo "três mais um" - três anos de formação em disciplinas específicas e mais um ano de formação pedagógica. Com a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases (LDB) de 1961, alterações mais significativas nas estruturações dos cursos de formação do professor são percebidas. Foram estabelecidos os currículos mínimos e incluídas as disciplinas pedagógicas. Mantinham-se as disciplinas comuns, mas os diplomas de licenciado não pressupunham mais o bacharelado e fixavam a duração dos cursos em quatro anos. Com essas iniciativas, o termo licenciatura passou então a ser utilizado como sinônimo de curso de formação de professores para o ensino de nível médio. A partir de 1965 os cursos passaram a ter sua duração contada em horas-aula e surgiram as licenciaturas curtas para formar professores (polivalentes) de Ciências, Letras e Estudos Sociais para o curso ginasial. Continuavam ainda vigentes os exames de suficiência, em geral prestados após realização do curso da CADES (Campanha de Aperfeiçoamento e Difusão do Ensino Secundário), que, entretanto, não licenciavam os 386 aprovados, mas davam a eles um registro temporário para exercício do magistério secundário com validade condicionada à inexistência de cursos de graduação específicos em sua região de atuação. Após a reformulação da LDB, em 1971, as licenciaturas ficaram divididas em curta (voltadas à formação do professor para o primeiro grau, de quinta a oitava série) e plena (para o segundo grau), com redução de sua duração mínima para três anos, no caso da licenciatura plena, e um ano e meio, no caso da curta. Esta legislação implicou a extinção dos exames de suficiência e dos cursos da CADES. Outras legislações posteriores provocaram alterações na estrutura dos cursos de licenciatura, mas manteve-se a separação, até hoje existente, entre o bacharelado e a licenciatura. Estas determinações das legislações para a formação de professores não necessariamente causaram mudanças imediatas na condução das licenciaturas, o que pudemos perceber mais claramente nas e a partir das narrativas que constituímos com professores/alunos dos cursos tematizados. Concepções de formação de professores Deve-se ressaltar que as concepções não estão disponíveis, como um dado, nas narrativas de nossos depoentes. As concepções são leituras e, portanto, significados atribuídos. A narrativa dos depoentes – que é um espaço de dizeres da memória, carregados de intenções, em que se relatam experiências e práticas – nos permite compreender não as experiências ou as práticas em si, mas o que, segundo nossa atribuição de significados, podemos inferir a partir da intenção de compartilhar a experiência e as práticas. A rigor, nem estão no depoimento as experiências e as práticas, mas “invenções/criações” dessas experiências e práticas. Questão de mesma natureza é aquela relativa às concepções. O dizer sobre as práticas, sobre as experiências (e até mesmo, quando é o caso, sobre as concepções, elas próprias), nos dá parâmetros para a atribuição de significados ao que pensamos poderem ser as concepções que alimentam (e são alimentadas) pelas práticas/experiências/concepções relatadas. Desse modo, foi a partir das narrativas de nossos entrevistados que pudemos identificar e compreender melhor as concepções de formação de professores de 387 Matemática que permearam a década de 1960, e como concepções já existentes modificaram-se ou não diante de novas demandas, legislações e políticas públicas. Nossas análises apontaram que, embora implementados de formas distintas, os programas dos cursos de graduação para professores de Matemática parecem ser regidos por uma disposição comum: são regulados a partir de um currículo inicial composto por disciplinas específicas de conteúdo matemático seguidas de disciplinas pedagógicas. Aspectos do funcionamento dos cursos, suas estruturas curriculares, o modo como atendiam às (ou subvertiam as) legislações vigentes, percebidos a partir das narrativas, foram analisados em um contexto mais amplo, já que o modo como percebemos a formação do professor de Matemática está essencialmente articulado ao processo de estruturação tanto do ensino superior brasileiro via faculdades isoladas quanto da organização dos cursos de pós-graduação, em particular em Matemática. A formação de professores na FFCL da USP-SP, destacamos, foi colocada em segundo plano em relação à necessidade de criar, no Brasil, um campo de pesquisa científica nas diversas áreas do conhecimento e foi no modelo curricular daquela Universidade que muitos outros cursos basearam-se, ainda que oferecessem apenas a modalidade licenciatura. No entanto, os cursos “novos”, criados no interior do estado de São Paulo, contaram com pouco apoio de profissionais daquela instituição “central” que, inclusive, já tinham se colocado contrariamente à expansão das faculdades pelo interior, recusando-se a criá-las como incorporadas à USP, o que forçou a criação dos IIES, Institutos Isolados de Ensino Superior, vinculados ao Estado (VAIDERGORN, 2003; BERNARDO, 1989). Oferecidos no período diurno, esses cursos também não atendiam aos professores que já exerciam a profissão com a certificação oferecida pela CADES. Não parece ter havido preocupação alguma em facultar a esses professores o acesso aos cursos: além do horário incompatível com as atividades de docência nas escolas da região, não foi implantado nenhum mecanismo para priorizar o ingresso de professores em exercício. Além disso, em tais cursos, com elevado nível de exigência, os alunos organizavam-se em grupos de estudos, o que ampliava o horário de funcionamento das atividades escolares, tornando-os, na prática, cursos integrais, afastando ainda mais os professores em atuação no ensino secundário. A partir das 15 narrativas constituídas para nossa pesquisa, podemos destacar que os cursos oferecidos em Presidente 388 Prudente, Araraquara e São José do Rio Preto pertenciam à Faculdades de Filosofia, Ciências e Letras, vinculadas aos Institutos Isolados, nos quais parece não ter havido a preocupação com a formação desse quadro – à época já quantitativamente significativo – de professores secundários, o que pode ser considerado como uma negligência das instituições públicas com a formação daqueles professores que já atuavam. Tal negligência implica, como consequência, a manutenção e a potencialização da concepção segundo a qual a prática pode ser suficiente para o exercício da docência, uma concepção já claramente esboçada a partir dos cursos aligeirados da CADES. A influência da pós-graduação em Matemática sobre estas licenciaturas é percebida, uma vez que terminada a graduação, muitos alunos começam a optar por esses cursos. Nas licenciaturas em Matemática cujos professores foram cursar pós-graduação em Matemática Pura buscava-se ampliar ainda mais a formação em Matemática: resultado da autoanálise desses professores-egressos quanto a sua formação, que julgavam, agora, insuficiente para a continuidade na carreira em pesquisa. Vinculado a isso, percebe-se que há uma nova demanda estabelecendo-se (ou criam-se estratégias para que tal demanda se crie): atrair e encaminhar graduados, bacharéis ou licenciados, para a pósgraduação em Matemática Pura. Desse modo, podemos dizer que a licenciatura em Matemática serviu ao próprio desenvolvimento da Matemática no país, uma vez que se tornava inviável a criação de cursos apenas de bacharelado em Matemática, pela pouca procura e pequena quantidade de formados por turma, o que implica terem sido os cursos de licenciatura grandes formadores de um público específico, com o qual, por sua própria natureza, esses cursos não deveriam se ocupar: aquele manancial de profissionais que criaria e sustentaria as comunidades de pesquisa em Matemática. O fato dessas comunidades serem incipientes à época deixava o campo da formação na graduação aberto aos professores pós-graduados, que atuavam prioritariamente no ensino, uma vez que a produção em pesquisa, ainda era bem inicial, e que só aos poucos estes espaços vão se estabelecendo e estes professores, em consequência, vão se inserindo propriamente no universo da pesquisa. Assim, as salas de aula dos cursos de licenciatura foram, nesse momento de expansão tanto dos cursos pelo estado de São Paulo quanto do sistema de pós-graduação, laboratórios para a formação de pesquisadores em Matemática, mesmo nos poucos casos em que a preocupação dos professores formadores estava, inequivocamente, voltada ao ensino. Torna-se evidente que os objetivos iniciais destas licenciaturas em formar professores para o ensino secundário concorrem com a formação tanto do quadro docente para o próprio curso – 389 uma vez que muitos dos alunos eram convidados a permanecer como professores –, quanto para outros cursos em fase de criação, um estado de coisas que nos permite reiterar que as carências e urgências caracterizam também a constituição dos cursos de Matemática no Brasil. Para atender a demanda de formar professores para o ensino secundário – um argumento que justificou a necessidade de instalação de FFCL pelo interior paulista (VAIDERGORN, 2003; BERNARDO, 1989) – cria-se uma demanda paralela: a de formar os quadros docentes para o ensino superior (os professoresformadores-de-professores). Esse ciclo de necessidades interfere significativamente no modelo dos cursos de licenciatura em Matemática. Se por um lado identificamos, nas narrativas, um modelo de licenciatura em Matemática com objetivos muito próximos aos do bacharelado, detectamos, por outro lado, também nas narrativas, cursos cujo foco estava na Matemática Aplicada. Esse novo campo de atuação, em alguns casos foi alavancado pelas Matemáticas Modernas e pelos novos conteúdos que passaram a ser incorporados à Matemática escolar, em outros, surgiu como decorrência da necessidade de atender diretamente ao mercado e à indústria, que começavam a conviver com os computadores - cujo objetivo era formar um profissional "completo", que pudesse atuar não apenas como professor. Essa estrutura era amparada por um discurso que enfatizava não a formação sólida para a docência ou para a pesquisa, mas para a atuação profissional em mercados de trabalho nascentes, complexos, informatizados e competitivos, um profissional que até poderia atuar como professor na falta de outras opções de trabalho. A formação do professor, assim, não era central ao curso, e a licenciatura era vista como consequência de uma formação geral. Detectamos, também a partir das narrativas, um outro modelo de formação, aquele que visava a uma formação muito próxima, em suas intenções, daquela pretendida anteriormente pela CADES - atender os professores em efetivo exercício do magistério, “formalizando" a experiência de docência desses professores. Estes cursos tinham como base a estrutura curricular do curso de Matemática de Guaxupé/MG, onde alguns dos professores atuantes se graduaram. Estes cursos formaram uma quantidade maior de professores e, embora presenciais e noturnos, facultava aos alunos a possibilidade de frequência apenas em dois dias da semana, sextas-feiras à noite e sábados. Tal estratégia visava a atender os alunos que, embora residentes na região, por atuarem como professores, não podiam frequentar todas as aulas. Esta é uma 390 estruturação não prevista em lei, mas implantada nos desvãos das legislações vigentes: trata-se de um modo de condução diferenciado num curso estruturado para ser presencial. Trata-se, portanto, do avesso das concepções que já pudemos esboçar: nesses cursos, a formação matemática não é nem central, tendo valor “em si”, nem priorizada em função de um determinado mercado: ela vem com o estudante, é inerente ao estudante que com ela toma contato na prática escolar. À prática, portanto, basta a experiência da prática. Esta concepção de formação de professores de Matemática centra-se no argumento de que o professor em atuação já estava formado, dominava os conteúdos a serem abordados com seus alunos, faltando-lhes apenas o diploma – mera exigência formal – para continuar professor, uma vez que começava a surgir, ainda que timidamente, um número maior de professores graduados na região. Mesmo nesses cursos, as disciplinas de formação pedagógica são posteriores às de conteúdo propriamente matemático e também nesses cursos, alguns ex-alunos, convidados, atuaram como docentes. Passada a década de 1960, quando a expansão quantitativa de cursos de Matemática pelo interior do estado de São Paulo foi bastante significativa, havia ainda muita carência de professores formados, pelo menos em algumas regiões específicas, ainda que algumas instituições já tivessem atingido certo nível de excelência tornandose, inclusive, referência na implantação de outros cursos pelo estado e mesmo pelo Brasil, em alguns casos – como ocorreu com a FFCL de São José do Rio Preto, de Rio Claro e de Presidente Prudente e a UNICAMP – chegando mesmo a estruturar Programas de Pós-Graduação em Matemática. Estes contrastes entre as instituições interioranas do estado de São Paulo, cremos, ficaram registrados em nossa pesquisa. À exceção da UNICAMP, todas as outras instituições que consideramos em nossa pesquisa ofereciam a modalidade licenciatura em Matemática, tanto isoladamente quanto em concomitância com curso de Matemática Aplicada ou o bacharelado. No entanto, em todos os cursos criados após a LDB de 1961 – que estabelecia a separação dos cursos de bacharelado e licenciatura em Matemática, extinguindo o modelo de formação "3+1" (CASTRO, 1974) –, a formação em Matemática é mantida nos anos iniciais e a formação pedagógica nos anos finais do curso. Isso implica que a legislação, embora altere alguns conceitos, nomenclaturas e procedimentos, não altera o modelo vigente de formação do professor. Na prática, surge um modelo deformado de formação 391 de professores de Matemática – ainda chamado de "3+1" –, que deixa a formação específica nos anos iniciais do curso e a pedagógica nos anos finais. No entanto, parece claro que a manutenção desta estrutura na formação de professores não significa que se pretendesse, sempre, formar o bacharel em detrimento do professor. Alguns destes cursos, embora estruturados segundo esse modelo, tiveram ou o objetivo de certificar o professor já em atuação ou o de formar um profissional apto a atuar em diferentes ramos. Alguns, ainda, voltaram-se, ao seu modo e segundo seus interesses, ao professor de Matemática do ensino secundário. Parece-nos que os cursos, por sua própria natureza, embora todos na modalidade licenciatura são conduzidos a partir das expectativas que se tem sobre os futuros alunos. Algumas considerações finais A licenciatura como instância de formação profissional do professor não foi assumida efetivamente pela maioria dos cursos, e a formação do professor mostrou-se ora como decorrência de uma formação em nível superior, ora como apêndice do bacharelado, ora como mero resultado de uma série de experiências práticas do cotidiano. Desse modo, cremos nunca ter se constituído, efetivamente, um espaço específico para esta formação. Nascida sem estrutura própria (a julgar pela acepção de formação de professores que defendemos hoje), vitimada por legislações que nunca tiveram como central a necessidade de atender adequadamente a demanda da escola, as licenciaturas vão se constituindo nos desvãos: nos desvãos das práticas, das teorias, das legislações, dos interesses políticos e econômicos. Na história da formação de professores no Brasil pode-se perceber a frequência com que são mobilizados os verbos “graduar”, “certificar” e “formar”. Isso deve significar alguma coisa: no mínimo, marca a flexibilidade que caracteriza a formação docente e, como decorrência, marca a inexistência de uma identidade mais estável dos cursos de licenciatura. Referências 392 BARALDI, I. M. (2003). Retraços da Educação Matemática na Região de Bauru (SP): uma história em construção. (Tese de Doutorado). Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Universidade Estadual Paulista, Rio Claro/SP, Brasil. BERNARDO, M. V. C. (1989). O surgimento e a trajetória da formação do professor secundário nas universidades estaduais paulistas. In: ______ (Ed.). Formação de professores: atualizando o debate. Capítulo 2, pp. 11-61. São Paulo: EPUC. CASTRO, A.D. de. (1974). A licenciatura no Brasil. Revista de História, 100, tomo II, 627-652. MARTINS-SALANDIM, M. E. (2012). A interiorização dos cursos de Matemática no Estado de São Paulo: um exame da década de 1960. (Tese de Doutorado). Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Universidade Estadual Paulista, Rio Claro/SP, Brasil. VAIDERGORN, J. (2003). As Seis Irmãs: as FFCL do interior paulista. São Paulo: Cultura Acadêmica Editora. 393 REFLEXÕES SOBRE MATEMÁTICA, INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL, CONSCIÊNCIA E CINEMA Leandro Carvalho JULIO – IFSP/Caraguatatuba ([email protected]) Ricardo Roberto Plaza TEIXEIRA – IFSP/Caraguatatuba ([email protected]) Resumo: Este trabalho pretende realizar uma reflexão sobre uma das mais importantes questões em aberto da atualidade: a discussão a respeito da área da inteligência artificial, enfatizando as suas interfaces com a matemática. O debate sobre o caráter da consciência humana permite uma gama imensa de interpretações e argumentos. Há uma série de obras de divulgação científica envolvendo temas relacionados à questão da Inteligência Artificial (IA) e que estabelecem relações interdisciplinares entre diferentes campos de conhecimento: matemática, física, computação, neurociência, filosofia, linguística. Discussões com este teor possibilitam explorar a curiosidade dos alunos e trabalhar interdisciplinarmente com professores de diferentes áreas e níveis de ensino, tendo como eixo a ideia de inteligência artificial, um tema contemporâneo que ainda é pouco abordado em termos educacionais no Brasil. Foi realizado um levantamento bibliográfico e uma revisão da literatura existente sobre o tema, de modo a fundamentar teoricamente este trabalho. Além disso, foi feito um levantamento extenso sobre filmes e documentários que abordam a questão da inteligência artificial. O projeto no qual este trabalho está inserido envolve também a realização de uma apresentação audiovisual e interdisciplinar a respeito do tema da inteligência artificial, inclusive com a inserção e análise de cenas de documentários e de filmes pertinentes à pesquisa, apresentação esta destinada a um público diversificado com o intuito de despertar o interesse pelas questões que envolvem esse tema. O estudo de como o cérebro funciona e sobre se as suas funções são ou não computáveis, ou seja, de quais são as semelhanças e diferenças entre a mente humana e um computador será possivelmente uma das áreas de fronteira da ciência de maior importância nas próximas décadas: isto justifica um esforço de pesquisa e investigação nesta área. Palavras-chave: Inteligência artificial, matemática, consciência, computação, filosofia, cinema. 394 Introdução Um trabalho como o proposto por este artigo se caracteriza essencialmente pela sua interdisciplinaridade, pois o estudo da Inteligência Artificial (IA) permite estabelecer pontes entre diversas disciplinas “fundamentais” da educação básica: Matemática, Física, Linguagens, Filosofia, Artes, História, Geografia e Informática. Pelos desdobramentos que pode provocar, o estudo da Inteligência Artificial será com certeza cada vez mais relevante ao longo do século XXI. Portanto, na educação será crescentemente mais importante explicar para os alunos os motivos de porque estudar temas associados a esta área do conhecimento, apontando as suas perspectivas e o mercado de trabalho existente. Além disso, é fundamental incentivar a curiosidade dos alunos, mostrando que, sobretudo em campos de conhecimento que estão na fronteira da ciência, há possibilidades reais de realizar algo realmente grande. Entretanto, para tanto, é preciso somar a dedicação e o esforço ao prazer pelos estudos: estes são os alicerces para quem almeja criar e descobrir coisas relevantes para o futuro. O estudo da Inteligência Artificial permite desmistificar a ideia de que as máquinas servem para superar os seres humanos em suas características; o seu propósito é nos fornecer cada vez mais habilidades de diversos outros tipos. A área da Inteligência Artificial inter-relaciona vários campos de conhecimento, mas neste trabalho estaremos focando, sobretudo, algumas áreas: computação, matemática, filosofia, física e neurociência. A área contemporaneamente conhecida como filosofia da mente, por exemplo, apresenta discussões fascinantes a respeito de como a mente humana funciona e está associada ao que existe de mais relevante na fronteira do conhecimento humano atual. Há alguns livros que podem ser úteis para uma introdução a este respeito (CHANGEAUX e CONNES, 1996; CHRISTIAN, 2013; CHURCHLAND, 2004; KHALFA, 1996; PESSIS-PASTERNAK, 1993; TEIXEIRA, 1996). Em português, o site filosofiadamente.org é uma boa fonte para quem deseja se iniciar no estudo desta área. A física como ciência também apresenta várias inter-relações com a área da inteligência artificial e há várias obras em português que exploram estes aspectos interdisciplinares (GREENE, 2012; KAKU, 2012; PENROSE, 1993). Muitos filmes e séries televisivas especulam sobre o futuro da Inteligência Artificial. Alguns dos exemplos mais conhecidos são: 2001 – Uma odisseia no espaço; 395 Matrix; O exterminador do futuro; O vingador do futuro; Blade Runner – O caçador de androides; Eu, Robô; Ela. Estes filmes, ou pelo menos cenas deles, podem ser bastante úteis como motivadores de discussões científicas e filosóficas acerca do tema. O estudo da Inteligência Artificial está associado a muitos conceitos que se confundem em parte (cérebro, mente, consciência, inteligência, eu, ego, alma, espírito) e a muitas atividades que caracterizam os seres humanos (pensar, saber, conhecer; deduzir; ter empatia; aprender). Historicamente, a Inteligência Artificial como campo de conhecimento iniciou-se, sobretudo, a partir do trabalho seminal de Alan Turing (1950) intitulado “Computação e inteligência”. Este projeto pretende justamente trabalhar com algumas das diversas das questões que surgiram a partir deste artigo de Turing. Quatro nomes se destacam na história da matemática no século XX e que estão associados às questões originárias dos desafios postos pela ciência da computação: Alan Turing (LEVIN, 2009; STRATHERN, 2000; HODGES, 2001), Kurt Gödel (CARNIELLI, 2009; GOLDSTEIN, 2008), Alonzo Church (SCOTT, 2012) e Claude Shannon (GLEICK, 2013). Neste artigo, daremos uma ênfase maior ao trabalho de Alan Turing. A ideia de Alan Turing sobre computabilidade O matemático britânico Alan Turing desenvolveu um importante trabalho a respeito do caráter intrínseco da computação e das suas relações com a matemática; um de seus artigos mais importantes é exatamente sobre o que foi denominado de números computáveis (TURING, 1936). Conforme foi desenvolvendo suas ideias sobre o processo computacional, ele percebeu que seria necessário retirar tudo que fosse acessório a este respeito para compreender o que ocorria: o que restou foi considerado por ele como sendo crucial para a execução da computação. Inicialmente, este raciocínio foi desenvolvido para estudar o processo “computacional” (no sentido de executar tarefas e operações matemáticas) dos seres humanos. Após a eliminação de tudo que era supérfluo, inclusive a presença do ser humano, Turing percebeu que precisava-se apenas seguir regras para realizar as operações solicitadas – esta é a ideia contemporânea de um algoritmo. 396 Turing notou que para realizar cálculos eram necessários apenas duas coisas: os dados e as instruções para o que fazer com esses dados. Este processo todo pode ser transformado numa série de zeros e uns que se intercalam numa fita, a memória deste proto-computador. Ele percebeu que uma máquina poderia realizar qualquer tipo de cálculo ou operação possível. Desde então ocorreu um desenvolvimento crescente dos computadores, sobretudo nas últimas décadas, mas a ideia básica por trás do seu funcionamento continua fundamentada pelas reflexões de Turing. Cinema e Inteligência Artificial Cada vez mais o cinema vem abordando o tema da emergência da Inteligência Artificial, sobretudo em filmes de Ficção Científica. Muitos deles trazem implicitamente em seus roteiros questões filosóficas profundas com referências diretas ou indiretas a pensadores de diferentes épocas. Um filme produzido em 2013 e que discute diretamente a questão da Inteligência Artificial é “Ela” (ou “Her”, o seu título em inglês). Dirigido pelo cineasta Spike Jonze, ele narra a respeito de Theodore, um personagem (interpretado por Joaquin Phoenix) solitário e recém-separado de sua esposa, em um futuro hipotético e não tão distante, que começa a “interagir” com o sistema operacional de seu computador. Este sistema operacional adota uma personalidade feminina, se denomina Samantha e se “materializa” pela voz da atriz Scarlett Johansson. O argumento principal do filme vem a tona quando o personagem central humano se apaixona literalmente por este sistema operacional que ao longo do filme vai adquirindo cada vez mais características humanas: “ela” – o sistema operacional – sente, é engraçada, escreve poesias e músicas e aparenta se envolver romanticamente com ele – o ser humano – afirmando que também o está amando. A questão principal envolve saber se tratam-se de sentimentos reais que começam a se manifestar em uma “máquina” ou se é apenas uma simulação matemática, um jogo de imitação nos moldes daquelas propostos por Alan Turing em seu conhecido teste. Qual a materialidade das sensações de uma pessoa que realiza algo sob hipnose ou mesmo que em seus delírios imagina ter passado por uma determinada situação? Há questões profundas sobre o que na sua essência caracteriza um sentimento 397 e sobre as relações entre razão e emoção (DAMÁSIO, 2012). Em primeiro lugar não são somente os seres humanos que sentem: os animais também o fazem e há várias indicações que as plantas também são capazes de “sentir” de algum modo. Mas há uma gradação entre os sentimentos: assim como há aqueles mais básicos (medo, dor, alegria, prazer, etc), existem também sentimentos que poderiamos designar como mais complexos – em certo sentido – que é o caso da paixão. Mas há muitas questões candentes por trás de toda a narrativa do filme “Ela”. Por exemplo: “Ela” é viva? E se for, em que sentido é viva? Há muitas definições científicas sobre vida, mas em termos filosóficos pode-se afirmar que a vida é essencialmente um processo contínuo – um fluir – de relacionamentos. Neste sentido “ela” é viva, pois se relaciona intensamente com o protagonista do filme – vai aprendendo e se modificando com o tempo – mas não somente com ele, para a sua infelicidade: em uma cena interessante o personagem humano pergunta ao “sistema operacional” se ela está conversando com outro ser humano naquele instante e ela afirma que está naquele instante falando com outros milhares de seres humanos e sistemas operacionais e, na sequência, afirma também que está apaixonada por outras centenas de pessoas! Não há portanto exclusividade; mas pode ser contra-argumentado que não isto não é assim tão incomum nas relações entre seres humanos, só mudando as proporções. Isto indica em primeiro lugar que o sistema operacional está num outro patamar, pois transcendeu às limitações materiais do ser humano. Não ter corpo é uma vantagem ou uma desvantagem? Ela – o sistema operacional de alma feminina do filme – diz que superou este “complexo” de não ter corpo – ao perceber que justamente devido a isto ela pode estar em vários locais ao mesmo tempo, além de ter a possíbilidade de “viver” eternamente. Numa das cenas do filme, ao utilizar-se da metáfora de um livro para explicar a relação entre os dois, ela (o sistema operacional) afirma que está indo para um outro local, no espaço entre as palavras que não está no mundo físico, segundo ela, que é infinito e onde ela se encontrará com outros sistemas operacionais da sua “espécie”. O amor que ela afirma sentir é real? Por outro lado, temos o direito de questionar o sentimento de alguém? Um sistema operacional pode ser definidio como sendo “alguém”? O filme na verdade propõe uma série de questões profundamente filosóficas. Há muitos outros filmes feitos nas últimas décadas que discutem o futuro da ideia de inteligência artificial sob vários pontos de vista, sobretudo filmes de ficção 398 científica. Nos anos 80, uma obra que se destacou a este respeito foi Blade Runner – O caçador de Andróides. Este filme imagina um futuro distópico no qual são criados robôs orgânicos indistinguíveis dos seres humanos, chamados de replicantes, alguns dos quais não tinham noção a respeito da sua própria condição. Do mesmo modo, no filme “2001 – Uma odisseia no espaço” o computador HAL acaba por se angustiar com questionamentos da sua própria existência e sobre a sua essência, o que nos permite até, de modo provocador, lançar a pergunta (DENNETT, 1996): HAL cometeu assassinato? Obras como essas permitem também refletir filosoficamente a respeito da angustia vital de todos nós: Quem somos? De onde viemos? Para onde vamos? Steven Spielberg produziu o filme I.A. - Inteligência Artificial no qual um robô-criança feito para ter sentimentos também procura compreender qual a sua identidade. Finalmente, na trilogia Matrix há uma interessante discussão filosófica a respeito da realidade e da existência (IRWIN, 2003) que remete inclusive ao “Cogito ergo sum” de Descartes: “Penso, logo existo”. Estas e muitas outras obras envolvem questões profundas a respeito do destino, do livre-arbítrio, da nossa própria existência e do que em nós está pré-determinado ou não. A questão filosófica última sobre quem somos, perpassa muitos dos filmes citados. O escritor de ficção científica Philip Dick (2012) talvez tenha sido quem literariamente mais procurou investigar e especular sobre as decorrências que poderão advir dos progressos na área da inteligência artificial. Na antiguidade pensava-se que o centro de produção dos pensamentos humanos estivesse no coração. Hoje sabemos que está no cérebro. Com os transplantes de coração ou de fígado já realizados, podemos afirmar que os indivíduos que receberam o transplante são na sua essência os mesmos, antes e depois do processo. Mas no caso de um futuro transplante de cérebro (ainda inexistente por limitações científicas e tecnológicas), poderíamos ter tanta certeza de que a essência da pessoa não estaria sendo modificada? Uma recapitulação da história da Inteligência Artificial A compreensão da história do desenvolvimento da inteligência artificial é fundamental para entender os conceitos atuais desta área e os seus possíveis desdobramentos futuros (DAMÁSIO, 2011). Pode-se afirmar que possivelmente o primeiro computador da história foi um ábaco – como aqueles desenvolvidos pelas 399 culturas orientais – mas que dependia obviamente para o seu funcionamento do elemento humano tanto para inserir os dados quanto para realizar as operações. Ele funcionava tal qual uma fita, como a da máquina de Turing, onde eram visualizadas (a “tela”) as informações obtidas pelos cálculos e operações realizados pelo cérebro da pessoa que operava o ábaco – esta pessoa era a essência deste “computador”. Na primeira metade dos anos 1600 foram desenvolvidos o “relógio de calcular” por William Schickard (possivelmente a primeira máquina de calcular mecânica para determinar os movimentos dos astros) e a régua de cálculo por William Oughtred (STRATHERN, 2000). O avanço seguinte foi implementado no mesmo século por Pascal com a sua máquina de computar denominada Pascalina. Leibniz que estruturou o Cálculo Diferencial juntamente com Newton, além disso também estruturou a matemática binária (na base dois, tal como ocorre nos computadores atuais) e para realizar as operações nesta base desenvolveu uma máquina de calcular mecânica. Leibniz envolveu-se de tal modo com a questão que chegou a defender que mesmo questões éticas poderiam ser resolvidas por tais máquinas que em situações de conflito poderiam decidir o veredito e inclusive determinar a sentença apropriada. O francês Jacquard no início do século XIX, trabalhando com teares, desenvolveu um conjunto de cartões que codificavam as instruções necessárias para criar um tecido qualquer – esta é a base justamente da ideia de algoritmo. A este respeito, talvez a grande questão envolvendo a compreensão do funcionamento do cérebro humano é descobrir se ele funciona também por meio de algoritmos. O estudo da mente humana, sobretudo a respeito de como os pensamentos são estruturados, e da sua relação com a linguagem tem sido uma área de conhecimento com grande desenvolvimento nas últimas décadas e trabalhos inovadores (CHOMSKY, 2009; DAMÁSIO, 2012; KURZWEIL, 2005; NICOLELIS, 2011; PENROSE, 1996; PINKER, 2008). Rapidamente a ideia de Jacquard atravessou o canal da Mancha rumo a Inglaterra onde foi desenvolvida, por Babbage, a máquina analítica ou diferencial, centrada na ideia de “tecer números” por meio de cartões, mas utilizando ainda a notação decimal. A primeira pessoa a programar neste período, curiosamente foi uma mulher, Ada Lovelace. O matemática britânico Boole, no mesmo século XIX, publicou a obra. Uma investigação sobre as leis do pensamento, na qual desenvolve a base teórica da álgebra 400 booleana que é fundamental para a computação moderna. Sua ideia permitia transformar quaisquer sequências de operações em uma série de zeros e uns ou seja, de modo mais concreto, em uma sequência de buracos e não-buracos em cartões de papel seguindo assim sequencias lógicas mais simples e eficientes. A partir da mesma ideia, no final do século XIX, o estatístico norte-americano Herman Hollerith desenvolveu a sua “máquina de censo” que conseguiu processar todos os dados de um censo nos EUA em um tempo recorde para a época. Até hoje, o termo hollerith é utilizado mundialmente para se referir a uma folha com as informações sobre o pagamento do salário de cada funcionário. Pode-se perceber portanto que assim como Newton em relação à Mecânica Clássica ou ao Cálculo Diferencial, Turing também estava sobre ombros de gigantes quando desenvolveu as suas ideias acerca da computação. Diversos trabalhos realizados por Turing (STRATHERN, 2000) em meados do século XX significaram um divisor de águas na área da Inteligência Artificial. A história da sua vida envolveu tanto momentos de glória, quanto situações terríveis. Ele foi condecorado como herói pelo estado britânico após a segunda guerra mundial pela sua participação no esforço para quebrar o código (criados por máquinas de criptografia denominadas “enigma”) com que as mensagens nazistas eram enviadas pelo alto comando alemão para seus comandados. Alguns anos depois ele foi preso devido ao fato de ser homossexual e a sentença para este “crime”, dada pelo mesmo estado inglês, obrigou-o a tomar hormônios que deformaram o seu corpo e que acabaram por levar ao seu suicídio. Sua história pode inclusive ser didaticamente apresentada aos alunos da educação básica para que eles reflitam sobre o papel da ciência em geral e da matemática em particular nos destinos da humanidade, bem como sobre a tolerância para com as diferenças necessária para o processo civilizatório. A peça teatral “Quebrando códigos” sobre a vida de Turing foi encenada em São Paulo pelo grupo “Arte e Ciência no Palco” na década passada. A sua narrativa apresentava características favoráveis para a realização de um trabalho didático interessante, pelas discussões e reflexões que propiciava (TEIXEIRA e NETTO, 2003). Após a Segunda Guerra Mundial ocorreu um crescimento exponencial nas tecnologias da computação. Para que isto ocorresse, um pesquisador foi fundamental: o matemático húngaro (naturalizado norte-americano) Von Neumann que produziu 401 trabalhos importantes que tornaram-se uma referência fundamental para este desenvolvimento ocorrer (VON NEUMANN, 2005); ele, por exemplo, foi um dos primeiros a defender o ponto de vista de que as instruções lidas por cartões perfurados deveriam ser instaladas na memória do computador para que a sua execução ocorresse de modo eletrônico e muito mais rapidamente. Além disso, ele estruturou alguns dos alicerces do importante ramo da matemática conhecido atualmente como Teoria dos Jogos. De modo complementar, o matemático Claude Shannon desenvolveu as bases da teoria da informação e em 1948 escreveu o artigo “A mathematical theory of communication” (“Uma teoria matemática da comunicação”) para compreender a melhor forma para codificar uma informação de um emissor para um receptor. Uma boa alternativa para o início de uma rica discussão a respeito da questão da Inteligência Artificial em sala de aula é por meio da reflexão a respeito de trechos de documentários que abordam o tema. Um documentário recente e de qualidade a respeito é “Ordem e Desordem” que foi produzido pela BBC (a emissora de televisão pública inglesa) e tem dois episódios: “A História da Energia” e “A História da Informação”. O segundo episódio apresenta um resumo da evolução histórica dos conceitos envolvidos na área do estudo da inteligência artificial. Considerações finais Este trabalho procurou realizar uma discussão sobre a questão da inteligência artificial sob o ponto de vista educacional, ressaltando aspectos interdisciplinares envolvidos, tanto com a matemática, quanto com a filosofia, por exemplo. De fato, o tema é extremamente envolvente e desafiador, até pelas indefinições decorrentes das possibilidades dos desenvolvimentos futuros desta área do conhecimento humano. A simulação da mente humana, por exemplo, abre horizontes interessantes para o futuro do estudo da inteligência (HARDESTY, 2010). Pensamos que estratégias que se utilizem de audiovisuais – mais especificamente, com a utilização em sala de aula de cenas de filmes e de documentários – podem colaborar muito com processos educacionais riquíssimos para despertar a curiosidade de alunos em geral, estimulandoos para que se dediquem a estudos e pesquisas posteriores sobre os temas abordados. 402 Referências bibliográficas CARNIELLI, Walter. Os teoremas de Gödel e o problema da parada de Turing. 2009. Disponível em: http://www.ic.unicamp.br/~eliane/Cursos/SeminariosPos-2009/WCarnielli.pdf. Acesso em 03/12/2013 às 19:10. CHANGEUX, Jean-Pierre; CONNES, Alain. Matéria e pensamento. São Paulo: Ed. Unesp, 1996. CHOMSKY, Noam. Linguagem e mente. São Paulo: Ed. Unesp, 2009. CHRISTIAN, Brian. O humano mais humano. São Paulo: Companhia das letras, 2013. CHURCHLAND, Paul M. Matéria e consciência uma introdução contemporânea à filosofia da mente. São Paulo: Ed. Unesp, 2004. DAMÁSIO, Carlos Viegas. O que é a inteligência artificial? 2011. http://orium.pw/univ/lei/ia/slides-ia.pdf. Acessado em 22/02/2014 às 19:20. DAMÁSIO, António R. O erro de Descartes, emoção, razão e o cérebro humano. São Paulo: Companhia das letras, 2012. DENNETT, Daniel C. Hal cometeu assassinato? 1996. Disponível em: http://philbrasil.com.br/item/page/22/. Acessado em 20/02/2014 às 17:20. DENNETT, Daniel C. Onde estou eu? 1996. 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Lisboa: Relógio D’Água, 2005. 405 UMA PERSPECTIVA CULTURAL PARA O ENSINO DE MATEMÁTICA Franciele Lopes da SILVA – IFSP/Caraguatatuba ([email protected]) Ricardo Roberto Plaza TEIXEIRA – IFSP/Caraguatatuba ([email protected]) Resumo: Este trabalho pretende realizar uma reflexão a respeito do ensino de matemática por meio de atividades culturais do ser humano. Procuramos destacar os costumes e as habilidades que as pessoas têm de modo a servir de ponto de partida para a produção de materiais didáticos que sejam orgânicos, efetivos, motivadores e se distanciem do ensino tradicional e mecânico. Esta pesquisa tem como objetivo principal realizar um levantamento amplo sobre as possibilidades de interações da matemática com várias manifestações da cultura, bem como auxiliar os professores a encontrar diferentes estratégias de ensino – que se apropriem do teatro, da música, da literatura, da pintura, da escultura, etc – para inovar suas aulas, descobrindo novos caminhos para o processo de ensino-aprendizagem. O seu principal foco está em apresentar meios diversificados e possíveis que possam incorporar diversos conteúdos matemáticos e científicos de maneira a fazê-los significativos para o universo cultural dos alunos e motivadores para a curiosidade tão comum aos mais jovens, procurando fugir de esquemas de ensino focados na memorização ou repetição. Uma preocupação especial é destinada ao docente em formação. Os cursos de licenciatura em geral precisam incorporar propostas e práticas que apontem para um ensino de matemática e das ciências menos árido e mais cheio de vida, inter-relacionando estes campos de conhecimento com o universo cultural dos alunos. Matemática também é cultura! Assim como a arte pode de certo modo provocar uma sensação de transcendência ao ser humano, o mesmo pode ocorrer com a matemática: ampliando a nossa visão de mundo, aguçando a mente e afiando o raciocínio. Palavras-chave: educação matemática; cultura; interdisciplinaridade; epistemologia. 406 Introdução A disciplina de matemática na educação básica é frequentemente vista como algo árido e sem nenhuma conexão com o cotidiano e as preocupações dos alunos. Entretanto, como produto do conhecimento produzido pela nossa espécie, a matemática também é parte da nossa cultura. O ponto de vista defendido neste trabalho é que uma das formas para superar as visões tradicionais a respeito do ensino da matemática é adotar uma perspectiva cultural para esta disciplina, salientando os possíveis pontos de contato da matemática com outros campos de conhecimento, inclusive e sobremaneira com as artes. Não se trata de uma visão utilitarista, até porque, deste ponto de vista a arte “não serve para nada” no sentido de quem não tem uma utilidade imediata para a resolução dos problemas da humanidade, mas de alguma forma a arte é essencial para a vida das pessoas, pois proporciona bem estar, alegra, traz a felicidade, conforta, provoca reflexão, aguça os sentidos, nos leva a transcender! Da mesma forma ocorre com a matemática: ela também aguça os sentidos, ela também pode alegrar, ela também provoca uma transcendência, ampliando a visão de mundo, rompendo com ideias préconcebidas, superando o senso comum e provocando a mente humana. Arte é cultura, todo tipo de arte: a música, a arquitetura, o teatro, o cinema, etc. Da mesma forma, matemática também é cultura, todo tipo de matemática! Mas infelizmente, muito pouco destaque é dado para a perspectiva da matemática como cultura humana durante o processo de educação básica dos cidadãos. J. F. Maheux (2010), em certo sentido dialoga com esta ideia em seu doutorado, quando procura explicar os motivos pelos quais resolveu estudar a área de educação matemática: “Why mathematics education? Perhaps naïvely, education was, to me, one of the most important aspects of human existence. Through education, one has access to “knowledge”, what generations of people patiently worked out, but also to ways of understanding that one does not necessarily experience in his or 407 her everyday life. In my opinion, education was a springboard to appreciate and serve the best of human nature, and schooling was part of the collective endeavor to give all of us the means to access to it. For me, mathematics was a powerful and playful tool to think beyond surface level.” (“Por que educação matemática? Talvez, ingenuamente, a educação era para mim um dos mais importantes aspectos da existência humana. Por meio da educação, é possível acessar o ‘conhecimento’, aquele pelo qual gerações de pessoas trabalharam pacientemente, mas também a formas de entender o que não se pode experimentar na vida diária. Em minha opinião, a educação era um trampolim para apreciar e servir o melhor da natureza humana e o processo de escolarização era parte do esforço coletivo para dar a todos nós os meios para acessar isto. Para mim, a matemática era uma ferramenta poderosa e divertida para pensar além do nível da superfície”). Portanto, a matemática, como parte da cultura humana, pode ser fonte de prazer estético e inclusive, nas próprias palavras do autor, pode ser divertida, desde que tenha uma abordagem que saliente estes aspectos. Todos os grupos sociais, todas as culturas produzem conhecimento matemático (D’AMBROSIO, 2001). A etnomatemática é justamente o campo de conhecimento específico que valoriza estas diferenças e procura se aprofundar na sua análise. Do ponto de vista da etnomatemática, a ciência da matemática pode ser vista como parte integrante da cultura humana se inter-relacionando de modo orgânico com outras áreas do conhecimento e, mais especificamente, com as artes. Neste sentido, este artigo pretende pontuar e realizar uma breve discussão sobre algumas possibilidades de interrelação da matemática com diferentes campos das artes e da cultura humana em geral. 408 Teatro O teatro é, definitivamente, uma ferramenta cultural presente na humanidade desde a antiguidade, apresentando aspectos lúdicos e de entretenimento, mas ao mesmo tempo possibilitando momentos potenciais para a reflexão e a aprendizagem. Portanto, ao contrario do que muitos pensam, o teatro não serve apenas para o lazer, ele pode sim ser usado para fins educacionais, como por exemplo apresentar tópicos da matemática teatralizando estes conteúdos. Um dos autores deste trabalho (SILVA, 2013) discutiu essa questão em um artigo anterior, inclusive refletindo a respeito de alguns obstáculos que podem surgir: “O teatro e as artes em geral são vistos, pela grande maioria, apenas como lazer e entretenimento. Portanto, ao tentar implementar estratégias pedagógicas que utilizem-se do teatro para o ensino de matemática e de disciplinas científicas em geral, indubitavelmente aparecem opiniões calcadas em um certo tipo de preconceito, tanto dos alunos como de pais de alunos com os quais trabalhamos em oficinas a respeito das possibilidades de uso do teatro associado à matemática”. O trabalho citado procurou estabelecer conexões entre essas duas áreas aparentemente tão distintas e tão distantes – a matemática e o teatro – com a intenção de ajudar na formação de licenciandos / futuros professores e estimular os eventuais interessados pela ideia. Ao decorrer do projeto de Iniciação Científica executado, foram escritas duas peças teatrais enfocando a história da ciência, em geral, e a história da matemática, em particular. A primeira, denominada “O dia em que os gênios tiraram para um breve acerto de contas”, foi apresentada na própria instituição em que desenvolveu o projeto, o campus de Caraguatatuba do Instituto Federal de São Paulo (IFSP). A segunda, denominada “Um gênio mal compreendido”, foi escrita juntamente 409 com alunos do projeto “Escola da Família”, na Escola Estadual Colônia dos Pescadores (Caraguatatuba, SP), onde conquistou espaços e motivou alguns alunos para as aulas de teatro associadas a assuntos científicos. Uma peça teatral com conteúdos científicos não é difícil de ser imaginada, ao contrário do que pensa o senso comum. Por exemplo, uma história fascinante e que produziu a linda peça de teatro “Quebrando Códigos” (TEIXEIRA e NETTO, 2003), foi a do inglês Alan Turing, um matemático de renome que é considerado o pai da informática, que foi um dos pioneiros da área de inteligência artificial e que teve um papel fundamental no esforço inglês, durante a Segunda Guerra Mundial, para decifrar os códigos da máquina alemã "Enigma" que codificava as mensagens do alto comando do exército nazista e as enviava aos comandados. Logo após a guerra ele foi condecorado como herói de guerra pelo governo britânico. Entretanto, nos anos 50 ele foi preso, pois era homossexual, o que na época era crime na Inglaterra. Foi obrigado a tomar hormônios para poder sair da prisão, um tratamento cruel e degradante que provocou deformações em seu corpo. O matemático acabou se suicidando, comendo uma maçã envenenada, em 1954. Recentemente, no final de 2013, após mais de meio século, o governo do Reino Unido assumiu o seu erro nesta condenação absurda. Foi demorado, mas um pouco mais rápido do que o Vaticano que demorou três séculos, para somente no fim do século XX, assumir que tinha errado ao condenar o físico Galileu Galilei a prisão domiciliar por defender que a Terra não estava no centro do universo e que ela se movia em torno do Sol. A história da vida de Turing – assim como a de Galileu – tem grande conteúdo dramático: por meio dela, é possível aprender sobre história e sobre matemática. Mais importante ainda é que o seu conhecimento permite uma profunda reflexão sobre o papel que a ética tem na vida das pessoas, inclusive nas relações entre alunos e na relação entre professor e aluno (MAHEUX e THOM, 2009). Literatura A literatura é um ótimo meio para acessar o mundo do conhecimento e da cultura. Por meio dela é possível aprender sobre tudo um pouco, tanto a respeito dos fatos mais recentes, quanto dos passados e refletir até mesmo sobre o que 410 provavelmente acontecerá no futuro. Livros são verdadeiros tesouros ricos em sabedoria e conhecimento, que podem proporcionar ao ser humano um prazer profundo, dando-lhe o poder de viajar para outras épocas, para outros mundos e para idealizar novos ambientes e novas possibilidades. “O texto literário possui um conjunto de atributos que são fundamentais na interação com o leitor, entre eles a possibilidade de identificação, pois nesse tipo de texto as idéias e opiniões transparecem mais facilmente, promovendo um elo que ultrapassa os limites do próprio texto. Possui a capacidade de comover, de cativar com estórias e fatos que não raramente fazem o leitor vivenciar a situação lida, quando não, algumas vezes, fazem-no reviver na obra literária a própria história de vida. Além disso, o texto literário também tem condições de transportar o leitor a épocas passadas. A descrição e reconstrução de ambientes e costumes permite que viajemos no tempo e no espaço.” (ALMEIDA e RICON, 1993) Desta forma, percebe-se que a literatura é uma poderosa ferramenta pedagógica para ser usada nas salas de aulas, para trabalhar o conhecimento cíentifico nas suas diversas vertentes: a matemática, a química, a física, a biologia, etc. Um livro como “Alex no país dos números: uma viagem ao mundo maravilhoso da matemática” (BELLOS, 2011) é, em certo sentido, tão cênico (mesmo sendo uma obra literária de divulgação sobre o caráter lúdico da matemática) que permite a possibilidade concreta de pensar até em uma peça teatral baseada no seu conteúdo, por exemplo. Este livro conta a história de um viajante (o seu autor, Alex Bellos) que percorre vários cantos do mundo, em busca de conteúdos e acontecimentos históricos envolvendo a matemática. A sua leitura é instigante, cheia de aventuras e de curiosidades e riquíssima em conteúdos científicos e matemáticos: é possível aprender e descobrir um mundo de “coisas” diferentes, apenas “viajando” junto com o narrador na sua narrativa. O envolvimento com esta obra foi tão intenso que acabou levando um dos autores (F. L. Silva) a entrar em contato, via e-mail, com o autor do livro que vive na Inglaterra, 411 relatando a ele a sua motivação para realizar uma peça de teatro envolvendo temas abordados em seu livro e dizendo que gostaria de saber o que ele achava de tal iniciativa. A resposta de Alex Bellos foi imediata, no sentido de incentivar a realização deste trabalho: “acho que uma peça teatral é uma ótima ideia – tem tanta coisa na matemática que renderia”. Além deste livro, há uma vasta gama de outros bons livros de divulgação da matemática (destacando-se a obra clássica “O homem que calculava” que foi escrita pelo brasileiro de pseudômino Malba Tahan) com a apresentação de sólidos contéudos científicos e que podem se transformar em pontes para instigar os alunos a quererem saber mais. Estes livros não convencionais de matemática, podem ser usados normalmente dentro da sala de aula, de modo a trabalhar de outras maneiras com os conteúdos tradicionais desta ciência e a fazer com que os alunos se interessem realmente pelo que estão tentando aprender. Música A música é uma forma de arte que se constitui em combinar sons e ritmos com uma bela sincronia e com harmonia. Ela é considerada uma prática cultural humana ancestral. É algo envolvente: pessoas de qualquer idade a utillizam para expressar seus sentimentos, para aproveitar o momento ou simplesmente para se distrair, fazendo parte do corpo de cultura do ser humano. Sendo assim, a música pode ser considerada um bom método para colaborar na construção do conhecimento: “A música também é capaz não só de atrair o aluno, mas de trabalhar com suas outras inteligências, desenvolvendo assim seu raciocínio e principalmente sua capacidade de concentração, ou seja, essa estratégia de contextualização acaba se tornando um grande recurso didático [...]” (CUBILLOS e TEIXEIRA, 2013). A ideia de usar a música dentro da sala de aula é interessante, não somente pelo que ela pode provocar de discussões a partir de suas letras (inclusive no caso de letras que se referem a conteúdos de disciplinas específicas), mas também por causa da matemática implícita ao conhecimento musical: frequências/alturas são números e, desde Pitágoras (BOYER, 2012), é sabido que a matemática é uma ciência fundamental 412 para compreender como se estruturam todos os padrões das escalas musicais. Sendo assim: “A matemática é rotulada como uma disciplina de difícil compreensão, porém é possível relacioná-la com outras disciplinas ou situações do cotidiano. Um melhor entendimento dos seus conteúdos ocorre quando utilizamos estratégias didáticas que os aproximam do dia-a-dia dos estudantes. A música é uma possibilidade neste sentido excelente e a sua utilização educacional contextualizada pode auxiliar em muito a aprendizagem da matemática.” (VIEIRA e TEIXEIRA, 2013). Por meio de estratégias diferenciadas, é possível trabalhar a matemática e a música juntas de modo a colaborar intensamente com o processo de ensino. Cinema O cinema procura trabalhar com imagens que ocasionam a impressão de movimento de modo a contar uma história; ele foi criado e é utilizado por determinadas culturas que neles se refletem e as afetam. É uma arte e é fonte de entretenimento popular no mundo todo, ou seja, pode ser um método eficaz em influenciar os cidadãos no bom e no mau sentido. A estruturação de projetos que tenham o poder de incentivar os alunos para a busca pelo conhecimento científico e matemático, utilizando uma linguagem mais simples, atraente e acessível, é uma forma de fazer com que eles tornem-se pesquisadores, no sentido de motivados pela curiosidade em descobrir acerca do desconhecido, e tomem gosto pelo saber, procurando ampliar o seu conhecimento acerca de si mesmos e acerca do mundo que os rodeia. “A divulgação científica tem justamente este tipo de linguagem mais palatável e compreensível para os alunos em geral. A principal questão investigativa proposta por esta pesquisa envolve uma avaliação sobre como é possível utilizar cenas de filmes como ferramenta para motivar e introduzir novos conteúdos científicos. Não é factível ensinar todos os conteúdos 413 científicos e matemáticos por meio apenas da divulgação científica, mas ela pode ser um agente motivador – dentre outros – vital para viabilizar a aprendizagem destes conteúdos.” (SANTOS e TEIXEIRA, 2013). Assim sendo, o cinema na educação científica deve ser utilizado por meio de um plano didático que delineie as suas reais motivações para a prática pedagógica proposta. É importante, deste modo, definir os objetivos para a utilização de cenas de filmes ou de filmes inteiros em sala de aula, antecipando os resultados esperados, definindo os conhecimentos prévios que o aluno precisa ter para compreender o filme em questão e pensando a respeito das possíveis discussões para serem realizadas posteriormente junto aos alunos, relacionando o que se viu com os conteúdos disciplinares que precisam ser trabalhados. Arquitetura, pintura e escultura As artes visuais se apresentam de diversas formas: a escultura, a pintura, a arquitetura, etc. Essas diferentes formas integram o patrimônio da cultura humana. Mas o que poucos sabem é que por de trás de muitas das obras de arte exista um rico conteúdo matemático, que inclusive tornou possível construí-las. Uma obra clássica que tem uma relação com a matemática é o “Homem Vitruviano” de Leonardo Da Vinci. Sua estruturação, em torno do corpo de um homem com os braços e as pernas abertas dentro de uma circunferência, foi pensada no âmbito de um estudo matemático das proporções humanas. A sua composição está intimamente relacionada a um número irracional que é um dos mais misteriosos e surpreendentes da história, pois está presente também em várias outras obras de arte consideradas esteticamente belas, assim como em vários objetos e seres vivos encontrados na natureza. Este número é representado pela letra grega phi e tem o valor aproximado de 1,618033...; um número com infinitas casas decimais que nunca se repetem. Ele também é conhecido como proporção áurea, número de ouro ou número divino e sua presença pode ser verificada em conchas, seres humanos e plantas: “A atratividade do ‘Número Áureo’ origina-se, antes de mais nada, 414 do fato de que ele tem um jeito quase sobrenatural de surgir onde menos se espera” (LIVIO, 2011). Assim como na obra de Leonardo Da Vinci, em muitas outras obras, é encontrada a presença explícita ou implícita desse magnífico número. Quem poderia imaginar que exista matemática em um corte de cabelo ou em uma sobrancelha? Os costumes culturais dos seres humanos e os seus padrões estéticos dependem de fatores geográficos, históricos, culturais, etc, mas não há dúvida de que existem muitos padrões que perpassam diferentes culturas e povos. Os trabalhadores que lidam com questões associadas à estética e à beleza humana muitas vezes têm um conhecimento intuitivo a este respeito. “No caso do trabalho dos profissionais da beleza que executam cortes de cabelo, a Geometria é considerada uma importante ferramenta, pois, o cliente ao sentar-se à cadeira, o profissional que realizará o corte é obrigado a fazer o estudo inicial, um trabalho de percepção profissional que exige conhecimentos referentes às formas geométricas [...]”(ANDRADE FILHO, 2014). Exemplos como os citados anteriormente, evidenciam a presença de padrões matemáticos associados ao corpo humano em diversos tipos de obras de arte (pinturas, esculturas, etc) e podem com efeito ser utilizados como recursos didáticos para o ensino da matemática. O número de ouro existe em quase tudo que está a nossa volta; como ele pertence à matemática, é possível deduzir que este campo de conhecimento está presente no mundo que nos permeia. As artes em geral têm uma intensa interface com a matemática e este fato e as suas decorrências podem provocar o interesse de muitos alunos por conteúdos da matemática. 415 Jogos e outras atividades Um conhecido método para ser apresentado como ferramenta pedagógica na educação é o uso dos jogos, brincadeiras e gincanas. Os jopos são parte do acervo cultural da humanidade e, ao mesmo tempo, são formas atrativas para se estudar, de modo que o aluno se divirta e aprenda, tudo ocorrendo ao mesmo tempo. Essas ferramentas são muito usadas pelas crianças, pois jogar, brincar e se divertir, são coisas que toda criança adora fazer. Mas se os jogos atraem pessoas de diferentes idades, por que não usá-los a favor do processo de aprendizagem em qualquer faixa etária? O jogo de xadrez é tipicamente o primeiro tipo de jogo quando se vem a mente as interrelações com a matemática (SILVA, 2004; SILVA, 2010), mas há diversos outros jogos com este potencial. No âmbito do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID) que é executado pelo IFSP-Caraguatatuba em parceira com escolas públicas de educação básica, o projeto Gincana da Matemática foi elaborado e aplicado, em 2013, na Escola Estadual Colônia dos Pescadores, do municipio de Caraguatatuba, no litoral norte do estado de São Paulo. O objetivo desta atividade foi o de proporcionar um envolvimento direto dos alunos com a disciplina de matemática de modo que eles participassem de forma descontraída e, ao mesmo tempo, passassem por um processo de aprendizagem significativa. Os alunos desempenharam um papel ativo na construção de seus conhecimentos, desenvolvendo o raciocínio lógico e a autonomia, além da interação entre as equipes ter ocorrido de uma forma divertida e colaborativa, mas ao mesmo tempo com uma saudável competição. Por meio desta gincana percebeu-se que os alunos desenvolveram o espírito de iniciativa e se articularam para solucionar todos os desafios matemáticos propostos. Juntos, eles puderem descobrir histórias, acontecimentos e curiosidades sobre o mundo matemático, fatos que eles desconheciam e que jamais podiam imaginar. Depois da gincana eles demonstraram muito mais interesse nas aulas regulares de matemática, procurando entender os conteúdos passados e as possíveis histórias existentes associadas a conceitos diferentes matemáticos. As aulas tornaram-se mais produtiva e o 416 rendimento escolar aumentou. De modo geral, estratégias didáticas que incorporem jogos de forma orgânica podem abrir novos horizontes para muitos alunos no que diz respeito ao raciocínio matemático e lógico. Considerações finais O método usado para se trabalhar um determinado conteúdo é extremamente relevante. O ensino nos moldes tradicionais, já não é, há muito tempo, a opção mais eficaz a disposição dos professores, mas ao mesmo tempo não se pode simplesmente ignorá-lo, pois em certos momentos, para certas situações e com certos alunos, ele pode ser útil. Esse é o papel do professor: mesclar diferentes estratégias de ensino, tradicionais ou inovadoras, de modo a complementar suas aulas e descobrir coisas novas para o bem do seu aluno e de si próprio. “Existem diferentes maneiras para implementar a divulgação científica na área da educação. É possível aproximar, atrair e motivar os estudantes para a ciência por meio de livros, jogos, peças teatrais, textos, filmes, músicas, documentários, palestras, entrevistas”(SANTOS e TEIXEIRA, 2013) Portanto, mostrar que a matemática é útil não basta; é fundamental pensar também a respeito das formas como ela é apresentada e trabalhada nas salas de aula (SILVA, 2013). Para um aluno aprender, o professor precisa levar em conta os diversos mecanismos de aprendizagem possíveis, de modo a procurar superar os mitos que cercam o ensino de matemática. Um conhecimento amplo do processo educacional e uma abordagem interdisciplinar sob a perspectiva cultural viabilizam estratégias para contornar muitos dos obstáculos existentes para a aprendizagem da matemática. 417 Agradecimentos Agradecemos a CAPES pela bolsa PIBID (Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência) fornecida em 2013 e ao IFSP (Instituto Federal de São Paulo) pela bolsa de Iniciação Científica Institucional fornecida em 2012, ambas para a aluna Franciele Lopes da Silva. Referências ANDRADE FILHO, Antonio Bezerra de. A matemática da beleza. Disponível em: https://www.ucb.br/sites/100/103/TCC/22006/AntonioBezerraAlvesdosSantos.pdf. Acessado em 13/02/2014 às 21:30. CUBILLOS, P. A. S. e TEIXEIRA, R. R. P. Escutando a música. Caraguatatuba, SP: Seminário de Iniciação Científica do Litoral Norte, 2013. BELLOS, Alex. Alex no país dos números: uma viagem ao mundo maravilhoso da matemática. São Paulo: Companhia das Letras, 2011. BOYER, Carl B. História da matemática. Rio de Janeiro: Blucher, 2012. D’AMBROSIO, Ubiratan. Etnomatemática: Elo entre as tradições e a modernidade. Belo Horizonte: Autêntica, 2001. LIVIO, M. Razão Áurea: a história de Fi. Record, Rio de Janeiro, 2011. MAHEUX, J. F. How we know? An Epistemological Journey in the Day-to-Day, Moment-to-Moment of Researching, Teaching and Learning in Mathematics Education. Victoria, Canadá: University of Victoria - Phd Dissertation, 2010. MAHEUX, J. F. e THOM, J. S. L’activité mathématique comme une manière d´être dans le monde: considérations éthiques sur les transactions enseignants-élève. In: Proceedings CIEAEM 61 – Montréal, Quebéc, Canada, July 26-31, 2009. “Quaderni di 418 Ricerca in Didattica (Matematica)”, Supplemento n. 2, 2009. G.R.I.M. (Department of Mathematics, University of Palermo, Italy). TEIXEIRA, R. R. P. e NETTO, E. R. Quebrando códigos: a matemática, o pensamento e a educação. Sinergia (CEFETSP), São Paulo, v. 04, n.2, p. 159-162, 2003. SANTOS, G. L. e TEIXEIRA, R. R. P. EDUCAÇÃO CIENTÍFICA POR MEIO DE CENAS DO CINEMA. PERSPECTIVA, Erechim/RS, v.37, n.139, p.87-97, setembro/2013. SILVA, F. L. MATEATRO - UM MÉTODO DIFERENCIADO DE ENSINAR MATEMÁTICA. XI Encontro Nacional de Educação Matemática. Curitiba, PR: 2013. SILVA, Wilson da. Processos cognitivos no jogo de xadrez. Curitiba: Dissertação de mestrado (UFPR), 2004. SILVA, Wilson da. Raciocínio lógico e o jogo de xadrez: em busca de relações. Campinas: Tese de doutorado (Unicamp), 2010. VIEIRA, W. S. e TEIXEIRA, R. R. P. Atividades experimentais envolvendo matemática e música. Caraguatatuba, SP: Seminário de Iniciação Científica do Litoral Norte, 2013. 419 A MATEMÁTICA VIVA: EXPLORANDO A CURIOSIDADE COM CONJECTURAS SOBRE NÚMEROS PRIMOS Marcio Oliveira de MORAIS JUNIOR – IFSP/Caraguatatuba ([email protected]) Ricardo Roberto Plaza TEIXEIRA – IFSP/Caraguatatuba ([email protected]) Resumo: Este artigo objetiva tornar público parte de um trabalho de iniciação científica que procurou estudar, de forma mais específica, os números primos e as conjecturas que os circundam. Os números primos, apesar de parecerem um campo de estudo árido, constituem uma área da matemática com aspectos interessantes pelo fato de estar associada a muitos “enigmas” que podem de fato atrair a curiosidade de muitos alunos e incentivá-los a estudarem e se dedicarem à matemática. Com este objetivo, o de atrair alunos da educação básica à matemática, podem ser propostas atividades envolvendo números primos que possam instigar o prazer e a curiosidade pela descoberta de conceitos matemáticos e científicos, aproximando estes conceitos da realidade deles. Livros, artigos e documentários de popularização da matemática e da ciência podem ser úteis para este objetivo. O presente trabalho pretende compreender as diferentes propriedades e características do conjunto dos números primos que mostra-se uma área de estudo da matemática pura presente desde o nascimento desta ciência, mas que, paradoxalmente, se posiciona na fronteira do avanço da matemática contemporânea, haja vista a quantidade de conjecturas e problemas em aberto nesta área. Neste artigo, é apresentado um panorama atual a respeito dos números primos, de algumas conjecturas envolvendo-os e dos desafios atuais existentes a este respeito. Este trabalho procura também analisar as possibilidades de popularização da matemática e das ciências em geral. Finalmente são apresentados os resultados de uma pesquisa de campo feita com alunos e leigos que assistiram a uma palestra a respeito dos números primos que ocorreu na Semana Nacional de Ciência e Tecnologia de 2013, no campus de Caraguatatuba do Instituto Federal de São Paulo (IFSP). Palavras-chave: Conjecturas, Matemática, Educação, Popularização da Ciência. 420 Introdução Professores comumente indagam-se sobre o porquê de seus alunos não gostarem ou não estarem satisfeitos com a escola. Uma possível resposta seria: “os alunos gostam da escola, o que eles não gostam é das aulas”. (CORTELLA, 2009) Esse questionamento pode fazer com que professores busquem diferentes formas para atrair seus alunos para o estudo de determinada disciplina. Os professores de matemática enfrentam mais alguns desafios, afinal, pode não ser tão simples encontrar assuntos, relacionados com a disciplina, que despertem o interesse e a participação desejados nos estudantes. Neste sentido, o estudo de conjecturas matemáticas permite demonstrar que a matemática está viva, quebrando a ideia do senso comum de que tudo na matemática já foi estudado, de que a matemática está completa e é, em certo sentido, uma ciência morta. O trabalho desenvolvido pelos autores deste artigo visou mostrar que uma das formas para despertar a curiosidade dos alunos com respeito à matemática é aquela em que conjecturas são apresentadas como mistérios. Em algum momento da formação de todo aluno do ensino básico deve-se estudar um tema que é relativamente simples: os números primos. Isso comumente ocorre e o aluno aprende que os números primos são números naturais, diferentes da unidade e que só podem ser divididos por 1 e por ele mesmo, como é, por exemplo, o caso de 2, de 3, de 5, de 7, de 11 e de 23: “Os números primos não podem ser escritos como produtos de outros números. Portanto, um número primo não é múltiplo de outros números, além de 1 e de ele mesmo” (RIPOLL, 2013). Há atualmente um debate sobre a escassez de material traduzido para o português na área da matemática pura (área que engloba o estudo dos números primos), porém, já existe uma gama de obras de divulgação da matemática em português que discutem a respeito dos números primos (DIOXIADIS, 2001; RIBEMBOIM, 2001; DERBYSHIRE, 2012). Em inglês, sem tradução ainda para o português, a obra “Prime numbers: the most mysterious figures in math” escrita por D. G. Wells (2005) é também uma boa introdução para esta área. Mais recentemente, no ano de 2013 ocorreram alguns avanços na fronteira do conhecimento a respeito dos números primos que podem servir de mote para um aprofundamento na área (WATANABE, 2013). Algumas obras 421 que estudam a história da matemática (BOYER, 1974; EVES, 2004) também apresentam um panorama a respeito da evolução histórica da área de estudo dos números primos. Os números primos são parte de um campo maior da matemática que é a denominada “Teoria dos números”; por isso é importante que o professor que deseja construir um conhecimento elementar sobre os números primos com os alunos, tenha conhecimentos mais específicos sobre a Teoria dos Números, e para isso há boas obras que se aprofundam nesta área da matemática, inclusive em português (SANTOS, 1998). Finalmente, há diversos sites disponíveis na internet (como é o caso do Instituto Clay de Matemática) que apresentam os desenvolvimentos mais contemporâneos na área e que podem ser acessados pelos alunos devido ao acesso cada vez mais amplo da internet. “Primo ou não primo? Eis a questão” A respeito dos números primos, perdurou por muito tempo a questão do número 1 ser ou não ser primo. Esta pode ser uma boa questão para ser apresentada aos alunos em uma abordagem inicial para introduzir o tema em sala de aula. Segundo o matemático Marcus du Sautoy (2013), os números primos são os números mais enigmáticos que existem: eles são como os átomos, ou seja, as menores estruturas indivisíveis, da “tabela periódica” da matemática. Fazendo uma analogia nesse sentido, o fato dos primos serem os “átomos da matemática” implica que eles podem ser considerados “blocos construtivos” para novos números; ou seja, quando multiplicamos um número por um primo, obtemos um novo número. Assim sendo, pode-se entender, mais facilmente, por que o número 1 não é considerado primo (apesar de só ser divisível por 1 e por ele mesmo, ou seja, por 1, de novo): quando multiplicamos qualquer número por 1 ainda teremos o mesmo número, assim, o número um não é um “bloco construtivo”, logo não é um “átomo da matemática”. O primeiro número considerado primo atualmente é 2, curiosamente o único primo par que existe. Há até uma “piada” sobre isso que revela um pouco a respeito do tipo de humor dos matemáticos: “O 2 é um primo ‘ímpar’, pois é o único primo par!” Visando despertar a curiosidade com respeito à matemática e utilizar uma linguagem mais próxima da realidade dos alunos do ensino básico e, até mesmo, de leigos na matemática, foram utilizadas nas apresentações que envolveram essa pesquisa expressões e comentários como esse. 422 Portanto, os primos sendo os átomos da aritmética, são “as pérolas que adornam a vastidão infinita do universo dos números” (SAUTOY, 2007). Entretanto, ainda perduram, sem provas, várias conjecturas envolvendo os números primos, conjecturas estas que, paradoxalmente, podem ser facilmente compreendidas por qualquer pessoa. As conjecturas Conjecturas são comuns no campo da matemática, principalmente na matemática pura. “Em matemática, uma conjectura é uma afirmação considerada verdadeira, pelo desconhecimento de um exemplo que a contrarie, mas para a qual ainda não se conhece uma demonstração formal; são os conhecidos ‘problemas abertos’. Uma conjectura atrai não só matemáticos interessados em demonstrá-la como também o imaginário de alguns escritores.” (BRIÃO, 2010) São inúmeras as conjecturas existentes sobre números primos, porém este trabalho enfoca três delas: a Conjectura de Goldbach, a Conjectura Fraca de Goldbach e a Conjectura dos Números Primos Gêmeos. Os autores deste trabalho elaboraram uma apresentação a respeito destas conjecturas intitulada “Estamos passando por uma revolução? Uma reflexão sobre avanços no estudo dos números primos.” Essas conjecturas foram exploradas e explicadas aos alunos e leigos presentes de uma forma simples e enfatizando que há muito ainda a ser descoberto ou inventado em matemática. Esta apresentação foi realizada no Campus de Caraguatatuba do Instituto Federal de São Paulo (IFSP) durante a Semana Nacional de Ciência e Tecnologia (SNCT) em outubro de 2013 para alunos e interessados em geral. Alguns comentários e reflexões que serão feitos ao longo deste trabalho terão como referência justamente esta apresentação. A Conjectura Goldbach Dentre as conjecturas descritas neste trabalho, estão a Conjectura de Goldbach e a sua variação, comumente chamada de Conjectura Fraca de Goldbach. A Conjectura de Goldbach teve início em 1742 quando Christian Goldbach escreveu uma carta para Leonhard Paul Euler. Nela, Goldbach disse acreditar que todo 423 número inteiro impar maior que 5 seria igual à soma de três primos, por exemplo 7 = 3 + 2 + 2 e 19 = 11 + 5 + 3 (CRANDALL e POMERANCE, 2005). Essa proposição ficou conhecida como conjectura fraca de Goldbach. Posteriormente, Euler respondeu a Goldbach propondo o que hoje é conhecido como a Conjectura de Goldbach, ou ainda a Conjectura forte de Goldbach. “Todo inteiro par maior que dois é a soma de dois primos.” (CRANDALL e POMERANCE, 2005; BOYER, 1974; EVES, 2004) É provável que seja correto afirmar que já não há mais a Conjectura Fraca de Goldbach, visto que ela foi possivelmente provada pelo peruano Harald Andrés Helfgott no ano de 2013 (HELFGOTT, 2013); a confirmação oficial pode demorar um pouco para ser publicada, mas ainda assim, muitos especialistas já opinaram sobre essa possível prova: Terence Tao, por exemplo, defende que a ideia da demonstração é ótima e quase certamente correta (NOGALES, 2013). Aos alunos que participaram da apresentação realizada na SNCT-2013, essa prova foi comentada e principalmente foi enfatizado o fato de ser um sul-americano a realizar tal façanha, o que pode estimular alunos brasileiros a se dedicarem ao estudo da matemática. Foi dada ênfase ao objetivo de mostrar que a contribuição para a ciência não fica atualmente reservada apenas aos europeus ou norte-americanos, e que também na área científica há um aumento da presença de cidadãos dos países emergentes. A Conjectura sobre os Primos Gêmeos Outra conjectura estudada nessa pesquisa foi aquela a respeito dos primos gêmeos: “Considere o caso de primos gêmeos, ou seja, dois primos cuja diferença é 2. É fácil encontrar alguns pares assim, 11 e 13 ou 197 e 199, por exemplo. Não é tão fácil, mas continua possível encontrar pares como estes, mas relativamente grandes.” (CRANDALL e POMERANCE, 2005) Esta conjectura afirma basicamente que há infinitos pares de primos gêmeos (EVES, 2004). Sabe-se que há infinitos números primos (EUCLIDES, 2009), mas a infinidade de primos gêmeos ainda não foi provada. Essa conjectura foi escolhida para o estudo realizado nessa pesquisa, pelo grande avanço que surgiu também em 2013 a respeito de uma possível prova futura; este avanço foi feito pelo chinês Yitang Zhang, também um matemático originário de um país emergente. 424 Yitang Zhang conseguiu provar que na sequência infinita de números primos existem infinitos pares de primos consecutivos cuja diferença será um número menor que 70 milhões. Após esse avanço inicial em maio de 2013, começou uma “corrida” entre matemáticos em busca da prova final, aquela que conseguirá demonstrar que há infinitos primos gêmeos (separados por 2 unidades). Essa corrida basicamente envolve a tentativa de diminuir o número 70.000.000 até chegar a 2. Ela pode ser acompanhada no site Polymaths; até o final de 2013, a menor diferença provada entre dois primos consecutivos que sempre aparecem na sequência é de 4680 (NIELSEN, 2013). “Cada redução é um passo na direção da resposta final”, diz Dan Goldston (MCKEE, 2013), teórico de análise numérica da San Jose State University, na Califórnia. O que alunos pensam sobre isso? Após a palestra “Estamos Passando por uma Revolução? – Uma Reflexão sobre Avanços no Estudo dos Números Primos” apresentada durante a SNCT-2013 os autores desse trabalho solicitaram que os ouvintes respondessem um questionário (apresentado no apêndice) contendo sete questões, além de indagações sobre o perfil dos entrevistados (como a idade e sexo). Na explanação deste questionário, as frases dos entrevistados são transcritas da mesma forma como foram escritas, pois a linguagem transmite muito sobre o sujeito e sobre como ele pensa. A amostra total obtida foi de 22 questionários respondidos. Houve condições especiais para que o questionário respondido fosse considerado na amostra: o questionário deveria estar totalmente respondido, as respostas deveriam ser coerentes e em cada questão poderia ser assinalada apenas uma alternativa, com apenas uma exceção (a sexta questão). A média da idade dos entrevistados foi de aproximadamente 18 anos e com um desvio padrão de aproximadamente 7 anos; a maioria (64%) pertenceu ao sexo feminino, como mostra o gráfico abaixo. 425 A primeira questão indagou aos ouvintes sobre qual o grau de interesse deles pela matemática. Dos 22 pesquisados (a ampla maioria era de alunos do IFSP), 11 declararam ter grande interesse pela matemática, enquanto 9 pesquisados disseram que têm um interesse médio pela matemática e 2 entrevistados declararam ter um pequeno interesse pela matemática. Como tratava-se de entrevistados que foram assistir a uma apresentação sobre números primos, já era esperado este resultado que revela um interesse considerável pela matemática, ao contrário do que acontece com a grande maioria dos alunos de ensino médio. Na segunda questão, os alunos foram questionados se, durante o ensino fundamental ou médio, lhes foi ensinado o que é um número primo – ou pelo menos se o entrevistado lembrava de ter sido ensinado a respeito de números primos. Todos os pesquisados relataram que tinham sido ensinados sobre o conceito de números primos. Para aqueles que responderam sim a esta questão (todos os entrevistados), a terceira questão questionou ao entrevistado se ele, na época, conseguiu aprender, de fato, o que era um número primo. O gráfico a seguir mostra os dados obtidos sobre essa terceira questão: a ampla maioria declarou que conseguiu aprender o que era um número primo quando lhes foi ensinado. 426 Isto mostra que a aprendizagem a respeito dos números primos não apresenta dificuldades intransponíveis. Isso associado ao fato de existirem diversas conjecturas associadas aos primos, indica que o seu estudo pode ser uma alternativa para despertar a curiosidade dos alunos. Na quarta questão, perguntou-se aos pesquisados se eles achavam que faltavam – ou não – coisas para serem descobertas na Matemática. Todos os pesquisados responderam que pensavam que haveria “coisas” novas a serem descobertas na matemática, revelando a ideia de que compreenderam um dos principais objetivos da palestra, o de revelar a matemática como uma ciência viva e que não está completa. Na quinta questão foi questionado aos pesquisados se eles acreditam que aprender sobre a história da matemática ajuda a aprender sobre a própria matemática. Isto relaciona-se ao fato de que o estudo dos números primos está profundamente imbricado na história da matemática. Todos os entrevistados afirmaram que a aprendizagem a respeito da história da matemática ajuda na aprendizagem de conteúdos da matemática, revelando assim a importância dada pelos entrevistados para a evolução histórica dos conceitos da matemática. Em caso de resposta afirmativa nesta questão, era solicitado que o aluno argumentasse sua resposta. Uma destas argumentações demonstra a percepção do aluno de que é necessário compreender o passado para explorar o futuro; obviamente essa argumentação foi escrita com a linguagem do aluno (linguagem não formal) que é transcrita a seguir: “Sim, porque através da história da matemática a gente descobre e abre a cabeça com novos conhecimentos”. Outro aluno chama a atenção para o acúmulo do conhecimento e para a construção de uma base 427 sólida para um estudo mais concreto; novamente, esse aluno utiliza a sua linguagem cotidiana em sua argumentação, assim como fez o aluno antes citado: “Pois, sabendo o que já aconteceu, nos dá uma certa base. E além do mais, é mais conhecimento e isso é sempre bom”. A sexta questão perguntou sobre qual a preferência dos pesquisados em relação aos diferentes campos da matemática (cada pesquisado poderia assinalar mais que um campo). Álgebra e geometria foram áreas de preferência de 9 pesquisados; Aritmética, Estatística e Trigonometria foram áreas de preferência de 8 pesquisados; Probabilidade foi uma área de preferência de 6 pesquisados; finalmente, 1 pesquisado relatou preferir uma outra área da matemática que não estava entre as anteriores, especificando que esta área é o Cálculo. Finalmente, a sétima questão perguntava ao entrevistado qual a importância que ele dava ao esforço despendido pelos matemáticos em pesquisas sobre números primos: 14 dos pesquisados afirmaram que este esforço é de grande importância, 6 pesquisados afirmaram que este esforço tem importância média e apenas 2 pesquisados afirmaram que este esforço é de pouca importância. O trabalho profissional dos matemáticos é muitas vezes intangível para os leigos em geral, sobretudo devido ao seu caráter abstrato. As respostas a esta questão indicam que entre o público presente há uma razoável compreensão acerca da importância do trabalho com matemática pura. Como os 22 pesquisados tinham sido selecionados entre aqueles que tinham comparecido de modo voluntário para assistir uma apresentação sobre números primos, já eram esperados os resultados que foram apresentados nos parágrafos anteriores. Mas mesmo assim, estes resultados indicam que há espaços possíveis para motivar alunos e despertar a curiosidade deles para trabalhar tópicos da matemática tradicionalmente considerados abstratos em demasia, como é o caso do estudo dos números primos. Considerações finais Este artigo procurou mostrar possibilidades para despertar o interesse de alunos por temas abstratos de matemática, mais particularmente na área dos números primos. O estudo de conjecturas em torno dos números primos e a análise dos avanços históricos no estudo delas podem colaborar para que os alunos percebam a matemática como uma ciência viva e em construção; a compreensão destas conjecturas é relativamente simples e acessível para alunos da educação básica o que permite que eles se sintam apoderados 428 para explorar tópicos de matemática para os quais ainda não existem respostas. Os resultados da pesquisa realizada após a apresentação de uma palestra sobre números primos durante a SNCT-2013 no IFSP/Caraguatatuba indicam que há diversas possibilidades para um trabalho produtivo e estimulante com temas de matemática pura, como é o caso do estudo dos números primos e da teoria dos números. Muitos indagam-se sobre a aplicabilidade e a relevância da realização de estudos e pesquisas em ciência básica e particularmente na matemática pura. As palavras do matemático inglês G. H. Hardy (2000) em seu livro “Em defesa de um matemático” são esclarecedoras a este respeito: “Nunca fiz nada de ‘útil’. Nenhuma descoberta minha fez, ou provavelmente fará, direta ou indiretamente, para o bem ou para o mal, a menor diferença para as amenidades do mundo. A julgar por todos os padrões práticos, o valor da minha vida matemática é nula.” Talvez Hardy tenha sido muito rigoroso acerca de si mesmo, mas na essência o que ele afirma sobre os matemáticos puros em geral é uma verdade. Sempre se pode afirmar que o estudo a respeito dos números primos tem uma importância econômica, por exemplo, devido às implicações para a criptografia (que está atualmente totalmente baseada nas propriedades dos números primos) e, por decorrência, para todo o sistema financeiro mundial. Mas os matemáticos pesquisam os números primos essencialmente pelo prazer da descoberta de um possível “novo continente” – ou pelo menos de novas “ilhas” – no mundo da matemática. O pesquisador em matemática pura – como em geral acontece com toda a ciência básica – não faz sua pesquisa essencialmente buscando uma aplicabilidade imediata e sim buscando novos conhecimentos, que futuramente poderão ser aplicados por outros pesquisadores em artefatos tecnológicos. Se a dinâmica não fosse esta, a humanidade poderia se ver privada de descobertas valiosas envolvendo grandes segredos e produzindo novos e curiosos conhecimentos. Agradecimentos Agradecimentos a Carlos Alberto Junior (aluno de Licenciatura em Matemática do IFSP/Caraguatatuba) que colaborou para o desenvolvimento desta pesquisa, ao Prof. Ms. Nelson Alves Pinto (IFSP/Caraguatatuba) pelo incentivo ao assunto dessa pesquisa, à Profa. Ms. Jaqueline Lopes (IFSP/Caraguatatuba) pela colaboração para a redação deste artigo e à CAPES pela bolsa cedida a Marcio Oliveira de Morais Junior por meio do Programa Jovens Talentos para a Ciência. 429 Referências bibliográficas BOYER, Carl Benjamin. História da matemática. São Paulo: Edgard Blücher, 1974. BRIÃO, Gabriela Félix. A Conjectura de Goldbach. Jornal da Matemática Universidade Gama Filho, Rio de Janeiro, pág. 1, jun 2010. CORTELLA, Mario Sergio. A Escola e o Conhecimento. São Paulo: Cortez, 2009. CRANDALL, Richard. POMERANCE, Carl. Prime Numbers: A Computational Perspective. Second edition, Springer: 2005. DERBYSHIRE, John. Obsessão prima: Bernhard Riemann e o maior problema não resolvido da matemática. 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Hoboken/New Jersey: John Wiley & Sons, 2005. 431 Apêndice QUESTIONÁRIO - Idade: ______ anos Sexo: ( )Masculino ( )Feminino 1-Qual é o seu grau de interesse pela matemática? ( )Grande ( )Médio ( )Pequeno ( )Nenhum 2-Durante o ensino fundamental ou ensino médio, foi ensinado a você o que é um número primo? ( )Sim ( )Não 3- Em caso positivo na questão anterior, quando foi ensinado a você, você conseguiu entender na época o que era um número primo? ( )Sim ( )Não 4-Você acha que faltam ou que não faltam coisas para serem descobertas na Matemática? ( )Faltam coisas para serem descobertas ( )Não faltam coisas para serem descobertas 5-Em sua opinião, aprender sobre a História da Matemática ajuda a aprender a própria Matemática? ( )Sim ( )Não Em caso positivo, por quê ela ajuda? ___________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________ 6-Qual campo da matemática é o seu preferido? ( )Aritmética ( )Probabilidades ( )Álgebra ( )Estatística ( )Geometria ( )Nenhum ( )Trigonometria ( )Outro_________ 432 7- Qual é o grau de importância que você dá ao esforço dos matemáticos por pesquisar números primos? ( )Muito importante ( )De importância média ( )Pouco importante ( )Nada importante Eixo Temático: (E5 - História e Filosofia) 433 OS LIVROS DE MATEMÁTICA PARA OS CURSOS COMERCIAIS BÁSICOS DA REFORMA CAPANEMA Sérgio Candido de GOUVEIA NETO – UNIR – RO ([email protected]) Resumo: Nas décadas de 1940 e 1950, os professores (i) Carlos Calioli e Nicolau D’ Ambrósio; (ii) Lucas Rodrigues Junot, (iii) Ary Quintella e; (iv) Algacyr Munhoz Maeder publicaram livros de matemática que visavam atender os Cursos Comerciais Básicos, estabelecidos em 1943 por meio da Lei Orgânica do Ensino Comercial. A Portaria nº 468 de 1946 definiu os programas da disciplina de matemática nestes cursos. Contudo, questiona-se em que medida as orientações desta legislação foram incorporadas nestes livros? Portanto, o texto aqui delineado tem como objetivos apresentar detalhes das coleções destes autores, bem como analisar se os programas de ensino da portaria citada foram ou não incorporadas pelos autores. Os resultados indicam que as obras tinham uma estrutura semelhante àquela definida pela legislação. Os autores ressaltavam este ponto, geralmente nos prefácios ou nas primeiras páginas. Dos autores acima, os livros de Junot parecem que foram elaborados para os professores e não para os alunos. Como consideração final, destaca-se que os livros cumpriam a função referencial, conforme colocado por Choppin (2004), ou seja, o livro didático é uma fiel tradução do programa. Destaca-se que não se encontrou alguns livros de Junot e Quintella, constituindo uma possível lacuna do texto. Palavras-chave: História, Ensino Comercial, Comércio. 434 1 Introdução A estrutura do ensino comercial foi alterada em 1943, por meio do Decreto-Lei nº 6.141 de 28 de dezembro, conhecida como Lei Orgânica do Ensino Comercial (BRASIL, 1943). A lei fazia parte do conjunto de reformas implantadas na gestão de Gustavo Capanema à frente do Ministério da Educação. A partir desta legislação, o ensino comercial foi dividido em cursos de formação, continuação e de aperfeiçoamento. Os cursos de formação foram divididos em comercial básico (1º ciclo) e comerciais técnicos (2º ciclo). Estes últimos tiveram cinco habilitações: Comércio e propaganda, Administração, Contabilidade, Estatística e, Secretariado. Embora tenham sido elaborados livros de matemática para estes dois ciclos do ensino comercial, entre as décadas de 1940 a 1970, nesta comunicação serão focados as obras de matemática para os cursos comerciais básicos. O texto aqui delineado trata-se de um recorte de uma tese de doutoramento intitulada “Uma História do Ensino de Matemática em Ciências Contábeis no Brasil”, que está em fase de elaboração junto ao Programa de Pós-Graduação em Educação Matemática da Universidade Estadual Paulista – Campus de Rio Claro. De uma forma geral, o curso comercial básico era de quatro anos e tinha como objetivo o ensino dos “elementos gerais e fundamentais do ensino comercial”. Neste sentido, as disciplinas foram divididas em dois grupos: cultura geral e cultura técnica. A disciplina de Matemática fazia parte da cultura geral e estava presente nas quatro séries. Em 1946, por meio da Portaria nº 468 de 07 de agosto foram definidos os Programas de Matemática do Curso Comercial Básico (BRASIL, 1946). Os conteúdos estavam divididos em aritmética prática (1ª, 2ª e 3ª séries), geometria intuitiva (2ª série), aritmética comercial e geometria dedutiva (4ª série). Assim, para atender especificamente a disciplina de Matemática dos cursos comerciais básicos, surgem as coleções de Carlos Calioli e Nicolau D’Ambrósio; Algacyr Munhoz Maeder; Lucas Rodrigues Junot; Ary Quintella. Mas, em que medida as orientações da Portaria nº 468 foram incorporadas nestes livros? 435 A respeito dos livros de Maeder destinados ao ensino comercial básico, a tese de doutorado de Longen (2007) nos fornece importantes informações, principalmente àquelas relacionadas à disposição dos conteúdos ao longo da obra. Contudo, há necessidade de estudos mais aprofundados sobre tais materiais, inserindo-os em contextos mais amplos, por exemplo, como parte de um conjunto de obras destinadas ao ensino comercial básico. Para as coleções dos demais autores, não foram identificados estudos que abordem seus textos. Desta forma, esta comunicação tem como objetivos apresentar detalhes das obras de Carlos Calioli e Nicolau D’Ambrósio; Algacyr Munhoz Maeder; Lucas Rodrigues Junot; Ary Quintella, destinadas ao ensino comercial básico, bem como, analisar se as orientações da Portaria nº 468 foram ou não incorporadas nestes livros. 2 Os livros de Carlos Calioli e Nicolau D’Ambrósio para o Curso Comercial Básico Carlos Calioli e Nicolau D’Ambrósio escreveram três livros para o ensino comercial básico, publicados pela Companhia Editora Nacional (Figura 1). Para o primeiro livro “Matemática para o primeiro e segundo ano do curso comercial básico”, foi encontrado a 4ª edição de 1962; já para o segundo livro “Matemática – Álgebra para o terceiro e quarto anos do Ginásio Comercial”, foi encontrado a 5ª edição de 1963 e por fim, para o último livro “Matemática – Aritmética e Geometria para o quarto ano do curso comercial básico”, foi encontrado a 4ª edição de 1956. 436 1962 – 4ª edição 1963 – 5ª edição 1956 – 4ª edição Figura 1 – Capa dos livros de Carlos Calioli e Nicolau D’Ambrósio para o Curso Comercial Básico 2.1 Primeiro e segundo ano do curso comercial básico (1962 – 4ª. Edição) O primeiro livro analisado foi a “Matemática para o primeiro e segundo ano do curso comercial básico”. Na segunda página da obra consta a informação “De acordo com o programa em vigor, de 7 de agosto de 1946, e de uso autorizado pelo Ministério da Educação e Cultura, registrado na Comissão Nacional do Livro Didático sob nº 1337”. Logo abaixo, tem-se “Desta obra se publicaram separadamente, de 1939 a 1960, 28 edições do volume para o 1º ano e 20 daquele para o 2º ano, numa tiragem global de 250.000 exemplares”. Estas informações são contraditórias, pois, ao que tudo indica, a 1ª edição deste livro foi publicada em 1939, portanto, antes da Reforma Capanema e acima há indicações de que seguia o programa em vigor de acordo com o decreto de 1946. Além disso, como o livro era para o 1º e 2º ano, juntos, o número de edições deveriam ser as mesmas. De toda forma, a tiragem de 250.000 exemplares indica que muitos alunos usaram este livro. Há prefácio somente neste livro, e nesta, os autores apresenta como os assuntos seriam tratados, bem como o fato de estarem de acordo com a proposta unificadora da 437 matemática (aritmética, álgebra e geometria) proposta por Euclides Roxo, embora mantivessem a divisão entre estas partes: Procurando atualizar o nosso livro, pensamos em introduzir, logo no início do curso, o raciocínio tipo algébrico, É mais fácil, mais lógico, e facilitará trabalhos posteriores. Embora se procure, ainda, manter a divisão entre álgebra e aritmética, somos favoráveis à tendência unificadora da matemática atual, e procuramos destacar o caráter algébrico das operações com números (CALIOLI e D’AMBRÓSIO, 1962, p. 13) Ainda no prefácio, logo abaixo, há indicações da idade dos alunos no qual o livro era destinado: “[...] Pretendendo ser o menos prolixos possível, podemos ter sacrificado o rigor da exposição. Para evitar isso teríamos que fazer um livro inacessível a jovens de 11 e 12 anos. [...]” A obra está dividida em duas partes: primeiro e segundo ano. No primeiro ano, o assunto é de aritmética prática, com os conteúdos: noções preliminares, operações fundamentais, múltiplos e divisores, frações ordinárias, frações decimais, potências e raízes. Para o segundo ano, os assuntos foram divididos em duas partes: Geometria intuitiva e Aritmética prática. Como assunto de conteúdos típicos do ensino comercial, destaca-se: moeda inglesa, sistema inglês de pesos e medidas, conversões para unidades legais brasileiras; tudo isto dentro do tópico de número complexo. Além destes conteúdos, as unidades III e IV tratam de assuntos abordados em livros de matemática comercial (razão, proporções, grandezas proporcionais, divisão em partes proporcionais, regra de três, percentagem e juros simples). 2.2 Terceiro e quarto ano do curso comercial básico (1963 – 5ª. Edição; 1956 – 4ª. Edição) 438 Na 5ª edição de 1963 do segundo livro “Matemática – Álgebra para o terceiro e quarto anos do Ginásio Comercial” consta que “Desta obra se publicaram separadamente, de 1941 a 1960, 16 edições do volume para o 3º ano e 10 para o 4º ano, numa tiragem global de 130.000 exemplares”. O subtítulo “Ginásio Comercial” pode ser em função do ano de publicação (1963), onde a nomenclatura era outra. Os conteúdos deste livro estão divididos em duas partes: terceiro e quarto ano. O terceiro ano aborda os conteúdos de álgebra: números relativos, expressões algébricas, operações algébricas, frações algébricas, equações do primeiro grau, representações gráficas, desigualdades do primeiro grau, números irracionais e equações do segundo grau. Ao longo dos desenvolvimentos destes assuntos, sempre que possível, os autores apresentavam exemplos e exercícios com aplicações no comércio. Para o quarto ano, os conteúdos foram divididos em duas partes: aritmética comercial e geometria dedutiva. Os assuntos de geometria dedutiva são: conceito de geometria dedutiva, ângulos e triângulos, perpendiculares e oblíquas, paralelas, polígonos, círculo, linhas proporcionais, semelhança, relações métricas, polígonos regulares convexos, medição de circunferência e áreas planas. No tópico sobre aritmética comercial, o capítulo está dividido em duas unidades. A primeira é uma revisão sobre proporções, médias, propriedades sobre proporções, grandezas proporcionais, números proporcionais, regra de sociedade (simples e composta) e percentagens. A segunda unidade do capítulo trata do conteúdo de operações sobre mercadorias (preço de custo e venda; lucros e prejuízos; problemas de determinação de custo, venda, taxa e percentagem e abatimentos sucessivos). Na 4ª edição de 1956 do terceiro livro “Matemática – Aritmética e Geometria para o quarto ano do curso comercial básico” não há informação sobre o número de tiragem. Esta obra constitui-se na verdade, a parte do quarto ano do segundo livro. Não é um livro novo, mas é um desdobramento. O subtítulo justifica: “para o quarto ano do curso comercial básico”. Os assuntos e exemplos são os mesmos, sendo que alguns foram retirados do terceiro livro. Nos três livros, logo nas primeiras páginas, os autores colocam os programas de matemática dos cursos comerciais básicos, indicando que seguiam o estabelecido na legislação. 439 3 Os livros de Algacyr Munhoz Maeder para o Curso Comercial Básico Algacyr Munhoz Maeder escreveu quatro livros para os cursos comerciais básicos, publicados pela “Edições Melhoramentos”. Outras informações sobre o autor encontram-se na tese de Longen (2007). 3.1 Primeira e segunda série do curso comercial básico Para a 1ª Série do Curso Comercial Básico, o livro descrito neste trabalho é da 2ª edição, publicado em 1954 (Figura 2). A obra possui conteúdos compreendendo noção de número inteiro; numeração falada e escrita; Moeda; o cruzeiro e sua subdivisão, símbolos; operações com números inteiros; múltiplos e divisores; números primos; máximo divisor comum; menor múltiplo comum; frações; potências e raízes. Para a 2ª Série do Curso Comercial Básico, foi observado a 2ª edição (Figura 2), sem data de publicação. Este segundo livro caracteriza-se pela quantidade de conteúdos de geometria (sólidos geométricos, superfície, linha, ponto, plano, reta, semirretas, segmento, ângulos, posições relativas de retas e planos, polígonos: triângulos e quadriláteros, círculo, poliedros). Além destes pontos, destacam-se nos capítulos finais do livro alguns conteúdos caracterizados como típicos do ensino comercial: sistema métrico, números complexos (unidade de ângulos e de tempo), sistema inglês de pesos e medidas, moeda inglesa, razões e proporções, médias, divisão proporcional, regra de três, porcentagem e juros simples. Observa-se também que os tópicos de geometria e os assuntos de comércio não se relacionam, é como se dois livros diferentes fossem colocados juntos. 440 Figura 2 – Capa dos livros de Algacyr Munhoz Maeder para o Curso Comercial Básico 3.2 Terceira e quarta série do curso comercial básico Para a 3ª Série do Curso Comercial Básico, a descrição a seguir é o da 3ª edição, publicado em 1962 (Figura 3). O livro caracteriza-se pelo tratamento de assuntos de álgebra (números relativos, expressões algébricas, operações com monômios e polinômios, fatoração, frações algébricas, equações, resolução e discussão de uma equação com uma incógnita, sistemas do primeiro grau com duas incógnitas, resolução de um sistema de três equações do primeiro grau, coordenadas cartesianas no plano, desigualdades do primeiro grau, números irracionais, equações do segundo grau, resolução de sistemas simples do segundo grau e problemas do segundo grau). O livro da 4ª Série do Curso Comercial Básico, descrito neste trabalho é o da 2ª edição de 1962 (Figura 3). Este livro caracteriza-se por ter conteúdos de aritmética comercial (proporções, números proporcionais, divisão em partes proporcionais – regra de sociedade, porcentagem, operações sobre mercadorias), além de conteúdos de geometria (geometria dedutiva, ângulos, triângulos, perpendiculares e oblíquas, paralelas, polígonos, quadriláteros, círculo, correspondência de arcos e ângulos, linhas proporcionais, semelhança de triângulos e polígonos, relações métricas no 441 triângulo retângulo e triângulo qualquer, polígonos regulares convexos, medição da circunferência, áreas planas e das figuras circulares, relações métricas entre áreas). Figura 3 – Capa dos livros de Algacyr Munhoz Maeder para o Curso Comercial Básico Embora o livro de Matemática de Maeder da 2ª série não contenha conteúdos típicos do ensino comercial, nos demais livros há capítulos relacionando matemática e comércio. Em alguns pontos, quando o capítulo não trata desta relação, o autor coloca exemplos, exercícios resolvidos e exercícios para o aluno com exemplos de aplicação no comércio. Apesar destas inserções, a maior parte dos conteúdos constitui-se de cultura geral escolar ao invés de cultura técnica. 4 Os livros de Lucas Rodrigues Junot para o Curso Comercial Básico Outro autor de livros para o ensino comercial foi Lucas Rodrigues Junot. Deste autor, foram encontrados apenas dois livros: o da primeira e quarta série. O livro “Matemática para o curso comercial básico – Primeira série”, encontrou-se a 3ª edição de 1954, enquanto que o livro “Matemática para o curso comercial básico – Quarta série” foi encontrado a edição de 1956. Ambos foram publicados pela Editora do Brasil 442 S/A na coleção didática do Brasil - Série Comercial, volumes 9 e 12, respectivamente para as 1ª e 4ª séries. (Figura 4). Figura 4 – Capa dos livros de Lucas Rodrigues Junot para o Curso Comercial Básico 4.1 Primeira série do curso comercial básico No livro “Matemática para o curso comercial básico – Primeira série” há dois prefácios, o da primeira e da terceira edição. O prefácio que se refere à primeira edição, o autor coloca que seguiu rigorosamente o programa oficial e que orientou os assuntos conforme as instruções metodológicas dispostos na legislação. Ao que parece, o livro foi destinado aos professores e não aos alunos, conforme o prefácio da primeira: [...] Os questionários destinam-se a auxiliar o professor, não só na confecção dos pontos para exames, como também para os trabalhos ou deveres de casa, constituindo por si, um método de estudo para quem se inicia, na justificação lógica dos princípios da matemática. Admitimos que, apesar dos cuidados, tenham escapado à revisão certos erros ou falhas; porisso (sic) 443 agradecemos qualquer sugestão ou emendas que venham beneficiar esta obra [...] (JUNOT, 1954, p.10). Os conteúdos do texto compreendem “noções fundamentais, operações fundamentais (adição, subtração, multiplicação e divisão, cálculo mental e abreviado), múltiplos e divisores (divisibilidade, números primos, máximo divisor comum, mínimo múltiplo comum), frações ordinárias, frações decimais, potências e raízes”. Em noções fundamentais, encontra-se o assunto de moedas e trata do cruzeiro e suas subdivisões, conforme a portaria ministerial que definiu os programas do curso comercial básico. 4.2 Quarta série do curso comercial básico No prefácio do livro “Matemática para o curso comercial básico – Quarta série” o autor ressalta a questão do alinhamento às instruções metodológicas emanadas a partir da Portaria nº 468 de 1946: [...] De acordo com as instruções metodológicas, a primeira parte deste programa, relativa às proporções e operações sobre mercadorias, deve ser tratada no decorrer do ano em períodos diversos. Não havendo aqui, solução de continuidade, no ensino de geometria dedutiva, o programa visa completar os conhecimentos adquiridos nas séries anteriores, sob um aspecto lógico e uniforme, apresentando-se os assuntos seguidos de exemplos concretos e de exercícios onde haja a aplicação do raciocínio dedutivo [...] (JUNOT, 1956, p. 9). Da mesma forma que no livro para a primeira série do curso comercial básico, o texto para a quarta série parece que foi destinado ao professor e não ao aluno, conforme se observa no prefácio: “[...] Na esperança de ser satisfeito, apelo para os colegas, no 444 sentido de me serem enviadas sugestões que, de alguma forma, venham a melhorar esta obra nas edições que se sucederem. (JUNOT, 1956, p. 9, grifo nosso)”. Os conteúdos estão divididos em aritmética comercial e geometria dedutiva. Os assuntos de geometria dedutiva são: introdução à geometria dedutiva, a reta, círculo, linhas proporcionais, semelhança, relações métricas nos triângulos, relações métricas no círculo, polígonos regulares convexos, medição da circunferência, áreas planas. Já os assuntos de aritmética comercial estão divididos em: proporcionalidade (razões e proporções, números proporcionais) e operações sobre mercadorias (preço de custo e venda, lucro e prejuízo, problemas de aplicação e abatimentos sucessivos). 5 A “Álgebra elementar” de Ary Quintella para o Curso Comercial Básico Ary Quintella foi autor de diversos livros didáticos, atingindo os cursos ginasial, clássico e científico, admissão, exame de madureza, vestibular, curso normal e curso comercial básico (THIENGO, 2001). Para este último nível de ensino, tem-se informações que Quintella foi autor de quatro livros: Aritmética prática (1º ano do Curso Comercial Básico), Matemática (2º ano do Curso Comercial Básico), Álgebra Elementar (3º ano do Curso Comercial Básico) e Geometria Plana (4º Ano do Curso Comercial Básico). Contudo, só foi possível encontrar a segunda edição do livro “Álgebra Elementar para o terceiro ano do Curso Comercial Básico” (Figura 5), publicado em 1951 pela Companhia Editora Nacional. 445 Figura 5 – Capa do livro “Álgebra Elementar” de Ary Quintella para o Curso Comercial Básico Na capa da obra tem-se a informação de que o material era destinado ao terceiro ano do curso comercial básico e que estava de acordo com o programa oficial. Além disso, consta que o livro tinha 800 exercícios. Na contracapa, apresenta uma lista de obras do autor: “Matemática, 1ª série ginasial”, “Matemática, 2ª série ginasial”, “Matemática, 3ª série ginasial”, “Matemática, 4ª série ginasial”, “Aritmética Prática, 1º ano do Curso Comercial Básico”, “Matemática, 2º ano do Curso Comercial Básico”, “Geometria Plana, 4º ano do Curso Comercial Básico (no prelo)”, em colaboração com o prof. Vitalino Alves (“Questões do concurso nas Escolas Superiores”) e em colaboração com o prof. Newton O’Reilly (“Exercícios de Aritmética, Admissão”). Nas primeiras páginas da álgebra elementar encontra-se o programa de matemática do terceiro ano do curso comercial básico e estava de acordo com a Portaria nº 468 de 07 de agosto de 1946. Os conteúdos estavam divididos em unidades (nove) e subunidades. Os tópicos das unidades são: números relativos, expressões algébricas, operações algébricas, frações algébricas, equações do primeiro grau, representações gráficas, desigualdades do primeiro grau e equações do segundo grau. 446 Considerações finais De uma forma geral, os livros destes autores seguiam o que determinava a Portaria nº 468 de 1946, cumprindo a função referencial, conforme colocado por Choppin (2004). Para este autor, os livros didáticos exercem quatro funções essenciais (referencial, instrumental, ideológica – cultural e documental). Na função referencial, o livro didático é uma fiel tradução do programa, ao passo que como função instrumental, este põe em prática métodos de aprendizagem. Já na função ideológico-cultural, geralmente o livro didático é um instrumento de reconstrução de identidade e de cultura. Mais recentemente, de acordo com Choppin (2004), tem-se identificado a função documental, onde o livro didático torna-se um conjunto de documentos, textuais ou icônicos, “cuja observação ou confrontação podem vir a desenvolver o espírito crítico do aluno” (CHOPPIN, 2004, p. 553). Estes livros destinados ao ensino comercial básico caracterizam-se também por apresentar muitos capítulos com conteúdos de geometria (intuitiva e dedutiva). Da mesma forma, a aritmética, seguindo a legislação, foi dividida em prática e comercial, sendo que a primeira parte consistia na formação de cultura geral escolar, ao passo que a segunda constitui-se de um conjunto de assuntos ligados diretamente a formação técnica do aluno. Como não foi possível encontrar os demais livros de Lucas Rodrigues Junot e Ary Quintella, fica a dúvida se tais materiais foram realmente publicados. De toda forma, o estudo em tela nos fornece importantes informações históricas sobre o ensino comercial básico. Referências BRASIL. Decreto-lei nº 14.373, de 28 de Dezembro de 1943 – Regulamento da Estrutura dos Cursos de Formação do Ensino Comercial. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil]. Rio de Janeiro, 31 dez. 1943. Secção 1, p. 19231-19232. BRASIL. Portaria nº 468, de 07 de Agosto de 1946 – Expede o programa de matemática e respectivas instruções metodológicas, para o curso comercial básico. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil]. Rio de Janeiro, 12 ago. 1946. Secção 1, p. 11608. 447 CALIOLI, Carlos; D’AMBRÓSIO, Nicolau. Matemática: Aritmética e Geometria. 4. ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1956. 236 p. CALIOLI, Carlos; D’AMBRÓSIO, Nicolau. Matemática: Primeiro e Segundo ano do curso comercial básico. 1. ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1962. 294 p. CALIOLI, Carlos; D’AMBRÓSIO, Nicolau. Matemática: Primeiro e Segundo ano do curso comercial básico. 4. ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1962. 294 p. CALIOLI, Carlos; D’AMBRÓSIO, Nicolau. Matemática: Terceiro e quatro anos do Ginásio comercial. 5. ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1963. 402 p. CHOPPIN, Alain. História dos livros e das edições didáticas: sobre o estado da arte. Educação e pesquisa. São Paulo, v.30, n.3, p. 549-566, set/dez 2004. JUNOT, Lucas Rodrigues. Matemática: para o curso comercial básico. 3. ed. Rio de Janeiro: Editora do Brasil, 1954. 156 p. JUNOT, Lucas Rodrigues. Matemática: para o curso comercial básico. 3. ed. Rio de Janeiro: Editora do Brasil, 1956. 222 p. LONGEN, Adilson. Livros didáticos de Algacyr Munhoz Maeder sob um olhar da Educação Matemática. 2007.405 f. Tese (Doutorado em Educação), Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2007. MAEDER, Algacyr Munhoz. Matemática: 1ª série curso comercial básico. 2. ed. São Paulo: Edições Melhoramentos, 1954. 187 p. MAEDER, Algacyr Munhoz. Matemática: 2ª série curso comercial básico. 2. ed. São Paulo: Edições Melhoramentos, s.d. 207 p. MAEDER, Algacyr Munhoz. Matemática: 3ª série curso comercial básico. 3. ed. São Paulo: Edições Melhoramentos, 1962. 250 p. MAEDER, Algacyr Munhoz. Matemática: 4ª série curso comercial básico. 2. ed. São Paulo: Edições Melhoramentos, 1962. 293 p. QUINTELLA, Ary. Álgebra elementar para o terceiro ano do curso comercial básico (com 800 exercícios). 2 ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1951. 238p. THIENGO, Edmar Reis. A matemática de Ary Quintella e Osvaldo Sangiorgi: um estudo comparativo. 2001.153 f. Dissertação (Mestrado em Educação), Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, 2001. 448 EIXO TEMÁTICO: E6 - PSICOLOGIA FRAÇÃO: SITUAÇÃO PARTE-TODO EM QUESTÕES DE NOMEAR FRAÇÃO E DE RACIOCÍNIO. Raquel Factori CANOVA – UNIBAN – SP ([email protected]) Tânia Maria Mendonça CAMPOS – UNIBAN-SP ([email protected]) Angélica Fontoura GARCIA SILVA – UNIBAN – SP ([email protected]) Resumo: Este artigo tem o objetivo de analisar o desempenho dos alunos em problemas de fração na situação parte-todo no que se refere à questão de nomear fração e de raciocínio (equivalência e ordem). Tal estudo foi realizado com 378 alunos do 4º, 5º e 6º anos do Ensino Fundamental de duas escolas públicas do estado de São Paulo. O referencial teórico escolhido foi a Teoria dos Campos Conceituais de Gérard Vergnaud que também fundamenta os estudos de Nunes em relação ao conceito fração. Para coletar os dados foi entregue aos alunos em sala de aula, um caderninho contendo quatro problemas de fração na situação parte-todo, sendo dois problemas envolvendo o conceito de ordem e dois de equivalência. Os alunos foram orientados para responderem as questões individualmente e sem auxilio de material. A pesquisadora leu as questões com os alunos a fim de evitar dificuldades de leitura que pudessem interferir no desempenho dos alunos na resolução das questões. Os resultados apontam que em uma dada situação, nesse caso parte-todo, há conceito em que os alunos apresentam melhor desempenho do que outro, ou seja, as questões de nomear frações parecem ser mais fáceis do que as questões de raciocínio. Isso nos leva a refletir que o melhor desempenho em nomear fração pode estar ligado ao “treino com algoritmo” e não de fato à construção deste conhecimento, pois se a criança representa corretamente uma fração, mas não sabe dizer se uma quantidade é maior, menor ou igual à outra é muito provável que não tenha compreendido o conceito fração. Palavras-chave: Ensino e aprendizagem; Fração; Equivalência e ordem; Situação partetodo. Introdução O propósito desta comunicação é analisar o desempenho de alunos em problemas de fração na situação parte-todo no que se refere à questão de nomear fração 449 e questão de raciocínio (equivalência e ordem). Para coleta de dados foi aplicado um teste a 378 alunos dos 4º, 5º e 6º anos do Ensino Fundamental de duas escolas estaduais localizadas na cidade de São Paulo. A fim de explicitar a problemática apresentaremos inicialmente a relevância e os fundamentos teóricos deste estudo. Em seguida, dissertaremos sobre os procedimentos metodológicos adotados, no qual descreveremos o experimento e o instrumento de coleta de dados. Em seguida, analisaremos e discutiremos os resultados encontrados para ao final tecer nossas considerações sobre o estudo realizado. Relevância e Fundamentação A motivação para a realização do estudo se dá por algumas razões. Primeiro é o fato do trabalho escolar com frações, no Brasil, iniciar no 4º ano do Ensino Fundamental e ser retomado, sistematicamente, nos anos seguintes. No entanto, pesquisas desenvolvidas no Brasil (RODRIGUES, 2005; CANOVA, 2006; GARCIA SILVA, 2007; CAMPOS, GARCIA SILVA, PIETROPAOLO, 2009; CANOVA 2013; GARCIA SILVA, CAMPOS, PINHEIRO, SOUZA, 2013) mostram que ainda hoje os alunos têm pouco domínio desse conceito, fato também comprovado em diferentes avaliações externas. A segunda razão vem da própria literatura internacional sobre os estudos e pesquisas com os números racionais (STREEFLAND, 1991; BEHR, HAREL, POST, LESH, 1992; NUNES E BRYANT, 2009, para citar apenas alguns), que apontam diversas dificuldades apresentadas por alunos nos vários níveis de escolarização. E o terceiro motivo é que pesquisas recentes realizadas em diferentes países (NUNES, BRYANT, PRETZLIK, BELL, EVANS, & WADE 2007; MAMEDE, 2007; CANOVA, 2013; GARCIA SILVA, 2013) apontam que a introdução do conceito de fração ainda é mais explorada na situação parte-todo do que em outras situações. Essas pesquisas indicam que nos problemas nos quais a dupla contagem é o suficiente para responder corretamente o problema os alunos tem melhor desempenho. E a questão que se faz é se esse aluno realmente entendeu o problema ou se ele apenas se utilizou de uma técnica que o levou ao acerto sem entender verdadeiramente o significado daquela resposta, daquele problema. 450 Para analisar os dados utilizamos a Teoria dos Campos Conceituais (VERGNAUD, 1990) o qual nos oferece ferramentas para analisar a construção de um conceito. Dentre os argumentos que levaram Vergnaud (1983) ao conceito de Campo Conceitual tem-se que uma situação não se analisa com um só conceito e que o domínio por parte dos sujeitos ocorre durante um longo período de tempo durante suas experiências bem e mal sucedidas. O autor considera, para estudar e entender como os conceitos matemáticos são desenvolvidos pelas crianças por meio de sua experiência na escola e fora dela, um conceito como um trio de conjuntos representado como C= (S, I, R), em que S – é um conjunto de situações que dão sentido ao conceito; I – é um conjunto de invariantes e R – é um conjunto de representações simbólicas. Nesse sentido, segundo o autor, para investigar o desenvolvimento de um conceito é necessário observar esses três conjuntos ao mesmo tempo. Todavia é preciso salientar que para esta comunicação nos atemos a analisar somente o resultado de uma das situações que envolvem o conceito de fração: parte-todo. Utilizando os estudos de Vergnaud como referência Nunes nos ajudou a compor esta investigação. Nunes, Bryant, Pretzlik, Evans, Wade, Bell (2004) afirmam que as frações estendem o domínio atribuído por Piaget (1952) para os números inteiros e sugerem que é importante questionar como as crianças compreendem as classes de frações equivalentes - 1 2 3 , , 3 6 9 , etc - e como elas podem ser ordenadas - 1 1 1 , 3 4 5 etc. Essa situação - parte-todo – traz a ideia de partição de um todo em n partes iguais, na qual o denominador representa o número total de partes e o numerador as partes tomadas (exemplo, representado 2 partes tomadas de um total de 3 partes). Como representações, consideramos três delas: a língua natural, representação e representação pictórica. Já como invariantes trabalharemos com ordem e equivalência. Procedimentos Metodológicos O estudo envolveu 378 crianças de duas escolas públicas da cidade de São Paulo; 136 do 4º ano (idade média: 9,1 anos), 163 do 5º ano (idade média: 10,1 anos) e 79 do 6º ano (idade média: 11,2 anos). A faixa etária geral está entre 8,3 a 14,8 anos e a idade média geral é de 10 anos, SD = 1,13. A idade média diferiu significativamente por ano escolar, de acordo com uma análise simples de variância (F = 139,93, p <0,001). 451 Segundo o depoimento das professoras das classes, os alunos do 4º ano ainda não haviam recebido instrução sobre frações; alguns alunos do 5º ano tinham participado de aula introdutória sobre frações e os alunos do 6º ano já haviam passado pelo ensino. Esses alunos estavam divididos em 15 salas de aula. Consideramos importante manter as salas de aula com todos os seus alunos, sem separação de grupos, uma vez que o trabalho coletivo no âmbito de sala de aula possibilita uma visão real do ensino escolar. O instrumento foi constituído por quatro problemas de divisão e em cada problema era possível analisar a compreensão do aluno em relação às questões de nomear frações e raciocínio. A figura 1 mostra indica o que estamos chamando de questões de nomear frações e questão de raciocínio. Figura 1: Exemplo de um problema indicando os tipos de questões Fonte: (CANOVA, 2013, p.74) 452 Em cada problema o aluno deveria representar duas frações, o que estamos chamando de questões de nomear frações e selecionar a alternativa correta no que se refere aos invariantes, que denominamos, nesse artigo, como questões de raciocínio. A seguir expomos dois exemplos de problemas apresentados aos estudantes com esses invariantes: Figura 2: Situação parte-todo com invariante equivalência Figura 3: Situação parte-todo com invariante ordem A Ana divide sua barra em 2 partes Erica cortou sua torta em 3 partes iguais e come 1 delas. iguais e comeu 1. A Marta divide sua barra em 4 partes Rute cortou a sua torta em 5 partes iguais e come 2 delas. iguais e comeu 1. Ana comeu mais do que a Marta A Érica comeu mais do que a Rute Marta comeu mais do que a Ana Ana comeu tanto como a Marta A Rute comeu mais do que a Érica A Érica comeu tanto como a Rute Fonte: CANOVA, 2013 Vale ressaltar que mesmo considerando que há espaço nos problemas para a indicação da notação da fração que representa o que cada menina comeu, a comparação sobre o resultado da divisão não se remete, necessariamente, à notação de fração. Os alunos poderiam responder corretamente somente interpretando o enunciado e o resultado da partilha. 453 A aplicação dos testes foi feita pela pesquisadora. Foi entregue um caderno de questões para cada aluno e esses foram orientados para responderem individualmente e sem auxilio de material. Depois das orientações, a pesquisadora iniciou a aplicação do teste, lendo questão por questão; entre as questões era dado um tempo para os alunos responderem as perguntas. Este método foi adotado a fim de evitar dificuldades de leitura que pudessem interferir no desempenho dos alunos na resolução das questões. Primeiro a pesquisadora lia o enunciado da questão, por exemplo: “A Ana divide sua barra em 2 partes iguais e come 1 delas. A Marta divide sua barra em 4 partes iguais e come 2 delas”. Em seguida era solicitado aos alunos representar a fração do chocolate que a Ana comeu e, em seguida, a fração do chocolate que Marta comeu. Após os alunos representarem as duas frações a pesquisadora pedia para eles assinalarem, dentre as três alternativas, a que fosse a correta, lendo uma a uma com eles. Análise e discussão dos Resultados. Para investigar o desempenho dos alunos em problemas de fração na situação parte-todo no que se refere à questão de nomear fração e questão de raciocínio analisamos as respostas dadas aos problemas apresentados no documento diagnóstico e contabilizamos os números de acertos. O resultado é apresentado na tabela a seguir: Tabela 1: Frequência e porcentagem de acertos por tipo de situação e questão (n=378) Número de acertos % Nomear* 918 30,4 Raciocínio** 292 19,3 * A pontuação máxima nas questões de nomear frações é 3024 para cada tipo de situação ** A pontuação máxima nas questões de raciocínio é 1512 para cada tipo de situação 454 Ao analisarmos os dados da tabela 1 notamos o percentual baixo de acertos em ambos os tipos de questões. Apesar de serem problemas simples de fração na situação parte-todo, talvez pelo fato de estarem representados na língua natural e não em figuras já divididas e parcialmente pintadas, o número de acertos para representar essas frações é baixo (30,4%). Ao olhar o índice nas questões de raciocínio esse percentual é mais baixo ainda, 19,3% de acertos. Apesar dos índices baixos temos que as questões de nomear frações parecem ser mais fáceis do que as questões de raciocínio, sendo que os alunos acertaram 11,1% a mais nessas questões. Logo, apesar de ser um tipo de situação bem familiar para as crianças, para essa amostra de sujeitos, foi possível notar que eles não apresentaram bom domínio dos conceitos implícitos e pesquisados nessa situação, o que é fundamental, segundo Vergnaud (1990) para a compreensão de uma situação. Todavia, é importante salientar que, o acerto destas questões não implica em compreender totalmente essa ideia. O fato das questões de nomear fração ter um número maior de acertos pode ser consequência do ensino com ênfase em algoritmos. Geralmente a exigência nos problemas de fração se dá com maior ênfase no nomear fração do que na compreensão de um problema apresentado na língua natural. Isso é confirmado em diversas pesquisas que afirmam que o algoritmo é um esquema muito utilizado quando se trata do tema fração. (MACK, 1990, GARCIA SILVA, 2012). Já nas questões de raciocínio o desempenho é ainda mais baixo. Há crianças que conseguem representar corretamente a fração, mas não entendem o significado desse número, pois não conseguem responder se uma quantidade é maior que outra ou se são iguais. Vale ressaltar que apesar de ser um número considerável de sujeitos (378 alunos) tais inferências restringem a essa amostra com a metodologia escolhida. Apoiando-nos em estudos de Nunes et. al. (2004), podemos inferir que a maioria desses alunos não compreende o significado de fração, pois não dominam os conceitos de equivalência e ordem. 455 Considerações Finais O desempenho dos alunos, apesar de baixo, é diferente entre as questões de nomear frações e as questões de raciocínio. O fato do desempenho dos alunos ser ainda mais baixo nas questões de raciocínio faz com que reflitamos sobre os resultados apresentados nas avaliações de larga escala. Em geral, as avaliações que retratam baixo desempenho dos alunos em relação ao trabalho com frações tem tendência em avaliar o conhecimento dos alunos justamente nas questões de nomear fração. Se os resultados já indicam que há lacunas no conhecimento dos estudantes em relação a esse tema, o problema pode ser ainda maior se pensarmos na compreensão de fração em relação aso conceitos de ordem e equivalência. Nunes et. al (2004) ainda completam dizendo que tal domínio também é necessário nas diferentes situações e representações nas quais as frações são utilizadas. Ou seja, o que Nunes e colaboradores propõem como sendo fundamentais para a compreensão do conceito de fração tem como base a definição global de construção de um conceito proposto por Vergnaud (1990), a terna S, I, R. Deve ser salientado que defendemos a ideia de trabalhar com diferentes situações de um mesmo conceito para sua aquisição, mas que, nesse artigo o foco foi em analisar o desempenho dos alunos em uma dada situação que envolvia os conceitos de nomear, equivalência e ordem e não estudar a aquisição desse conceito. Apesar de ser um estudo limitado quanto ao tipo de situação e sujeitos, os resultados contribuíram para reflexões, uma vez que são poucos os trabalhos centrados nos efeitos das situações de fração nos problemas de nomear e de raciocínio. Referência BEHR, M., HAREL, G., POST, T., & LESH, R. Rational number, ratio, proportion. In: D. A. Grouws (Ed.), Handbook of Research on Mathematics Teaching and Learning. New York: Macmillan, p. 296-333, 1992. CAMPOS, T. M. M.; GARCIA SILVA, A. F.; PIETROPAOLO, R. C. Conhecimento profissional docente de professoras das séries iniciais da educação básica acerca da equivalência de números racionais na representação fracionária em um processo de 456 formação continuada. Revemat: Revista Eletrônica de Educação Matemática, v. 4.9, p. 114-127, 2009. CANOVA, R. F. Um estudo das situações parte-todo e quociente no ensino e aprendizagem do conceito de fração. 2013. 197f. Tese (Doutorado em Educação Matemática). Universidade Bandeirante Anhanguera de São Paulo, São Paulo, 2013. CANOVA, R. F. Crença, concepção e competência dos professores do 1º e 2º ciclos do ensino fundamental com relação à fração. 2006. 220f. Dissertação (Mestrado em Educação Matemática). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2006. GARCIA SILVA, A. F. 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Anais do XI Encontro Nacional de Educação Matemática- Retrospectiva e perspectiva. Curitiba, 2013. MACK, N. K. Learning fractions with understanding: Building on informal knowledge. Journal for Research in Mathematics Education, 21, p. 16-32, 1990. MAMEDE, E. The Effects of situations on Children’s Understanding of Fractions. Tese de PhD (não publicada), Oxford Brookes University. Oxford: OBU. 2007. NUNES, T.; BRYANT, P. Understanding rational numbers and intensive quantities; Key Understandings in mathematics learning. London: Nuffield Foundation, 2009. Disponível em <http://www.nuffieldfoundation.org/reports>. Acesso em 24 de abril de 2012. NUNES, T., BRYANT, P., PRETZLIK, U., BELL, D., EVANS, D., & WADE, J. La compréhension des fractions chez les enfants. In M. Merri (Ed.), Activité humaine et conceptualisation (pp. 255-262). Toulouse: Presses Universitaires du Mirail, 2007. 457 NUNES, T., BRYANT, P., PRETZLIK, U., EVANS, D., WADE. J. & BELL, D. Vergnaud’s definition of concepts as a framework for research and teaching. Annual Meeting for the Association pour la Recherche sur le Développement des Compétences, Paper presented in Paris: 28-31, January, 2004. PIAGET, J. The Child’s Conception of Number. London: Routledge & Kegan Paul Limited, 1952. RODRIGUES, W. R. Números Racionais: um estudo das concepções dos alunos após o estudo formal. Dissertação (Mestrado em Educação Matemática). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2005. STREEFLAND, L. Fractions in Realistic Mathematics Education: A Paradigm of Developmental Research. Norwell, MA: Kluwer Academic Publishers, 1991. VERGNAUD, G. La théorie des champs conceptuels. Recherches en Didactique des Mathématiques, 10 (23), p. 133-170, 1990. VERGNAUD, G. Quelques problèmes theóriques de la didactique a propos d'un example: les structures additives. Atelier International d'Eté: Récherche en Didactique de la Physique. La Londe les Maures, França, 1983. 458 EIXO TEMÁTICO: E7 – RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS E INVESTIGAÇÃO MATEMÁTICA TEMPO E SUAS MEDIÇÕES: UM ESTUDO DOS CONHECIMENTOS MOBILIZADOS POR ALUNOS DO 6º ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL Conceição A. C. LONGO – FE/UNICAMP ([email protected]) Sergio LORENZATO - FE/UNICAMP - SP ([email protected]) Resumo: Este artigo é um recorte do trabalho de campo desenvolvido durante a pesquisa de mestrado intitulada “O Tempo e suas Medições”. Nele serão destacados os quatro primeiros momentos do trabalho de campo, realizado durante o ano de 2011 com 35 alunos do Ensino Fundamental de uma escola pública situada no interior do Estado de São Paulo. O principal objetivo dessas etapas do trabalho de campo foi o levantamento dos conhecimentos mobilizados por eles acerca do conceito de tempo e suas medições, com a perspectiva de criar fatos ou evidências para uma possível análise sobre o sentido de tempo apresentado por estes alunos. No primeiro momento, optamos por perguntar aos alunos o que é tempo e qual a importância de medi-lo, com o intuito de coletar informações sobre quais eram os conhecimentos prévios desses alunos sobre o tema. No segundo momento, visando propiciar aos alunos um momento de maior explicitação das representações de tempo, foi pedido para que eles desenhassem em uma folha de papel tudo o que relacionassem com a palavra “TEMPO”. Tendo em mente a confecção de um novo instrumento de coleta de dados, agora com a intenção de levar o aluno a refletir sobre o que ele e os seus colegas de classe pensavam acerca do tempo e de suas medições, o terceiro momento consistiu na organização das imagens produzidas pelos alunos e elaboração de um pequeno vídeo com elas. No quarto momento, os alunos assistiram ao filme produzido e, a partir das imagens, foram orientados a escrever perguntas, dúvidas, questionamentos ou comentários sugeridos ou inspirados por elas. Palavras-chave: Tempo e suas medições, Ensino, Educação Matemática. 459 O trabalho de campo apresentado neste artigo foi desenvolvido entre Maio e Agosto de 2011 e compreendeu quatro momentos distintos. O 1º momento foi a fase inicial da pesquisa e constou de um estudo de natureza exploratória, com o objetivo de coletar informações prévias sobre o que os alunos entendiam sobre o tempo e suas medições. Os conhecimentos prévios trazidos pelos alunos foram elementos norteadores para a análise das informações recebidas e, consequentemente, para o estabelecimento de categorias de análise a priori. Os conhecimentos prévios funcionam como uma espécie de agente facilitador da aprendizagem, criando uma conexão entre o que o aluno já sabe e aquilo que ele precisa saber. Ausubel et al (1980, p. viii) diz que: Se eu tivesse que reduzir toda a psicologia educacional em um únicoprincípio, diria isto: O fator isolado mais importante que influencia a aprendizagem é aquilo que o aprendiz já conhece. Descubra o que ele já sabe e baseie nisso os seus ensinamentos. (AUSUBEL et al, 1980, p. viii). Ainda segundo Ausubel et al (1980), os conhecimentos prévios são elementos fundamentais no processo de ensino e aprendizagem para que ocorra aprendizagem significativa, podendo ser vivenciados por uma metodologia de ensino da matemática que valorize a vida do educando, seu convívio social e sua prática diária. Partindo destes pressupostos, foram apresentadas duas questões aos alunos: 1) O que é tempo?; 2) Qual é a importância de se medir o tempo? Eles deveriam trazer na aula seguinte as respostas a estas perguntas, que poderiam ser respondidas por eles próprios ou por alguém próximo a eles. Ao todo, 30 respostas foram entregues pelos alunos na aula seguinte. A partir disso, pudemos perceber alguns pontos em comum naquelas respostas apresentadas pelos alunos. Em linhas gerais, as respostas mais frequentes relacionaram o tempo com hora/dia/ano. Elas são 15, do total de 30, podendo ser citado como exemplo: 460 - “É uma forma diferente de se medir os dias que vão passando e as horas que vão passando pra formar os dias do ano” (11 anos). - “O tempo é hora, datas, passado” (35 anos). Em seguida, em 10 das respostas “tempo” foi relacionado ao clima. Como exemplo, temos: - “Tempo são as temperaturas climáticas” (11 anos). - “Tempo é quando está nublado e sabemos que vai fazer frio ou vai chover e quando está calor que vai fazer sol” (32 anos). As respostas que relacionaram o tempo com experiência, sabedoria, paciência, evolução, vida ou recordação totalizaram 3 respostas. Por exemplo: - “A concepção de tempo só pode ser compreendida em relação ao espaço e ao movimento. Ele é o senhor, uma grandeza para executarmos nossas tarefas, ou melhor, planejarmos. O tempo bem administrado é mais claro da mente bem preparada” (43 anos). - “Tempo pra mim é a passagem do tempo com as horas. O tempo suficiente para valorizar as pessoas” (10 anos). Duas respostas relacionaram o tempo com propriedades dele, ou seja, ele não retroage, depende do espaço e movimento, é medível: - “O tempo não volta atrás” (43 anos). Somente 1/6 das respostas explicitaram que tempo pode ter mais do que um significado (o clima e o tempo percebido pelo relógio ou calendário), como por exemplo: - “É quando se passam segundos, minutos, horas, dias, meses e anos e também tem ligação com o clima: chuva, sol, vento, etc” (84 anos). Uma resposta que nos chamou a atenção foi: “Não sei!” (51 anos). Com referência à segunda questão “Qual é a importância de se medir o tempo?”, as respostas podem ser classificadas em quatro tipos, a saber: A: para fazer previsões de datas (viagens, festas,...) B: para planejar responsabilidade no dia a dia C: para aprender/evoluir na vida D: para previsões climáticas Dez das 30 pessoas responderam “A” (para fazer previsões), conforme exemplo: - “Poder separar com responsabilidade o momento do trabalho, do descanso, da família e da diversão” (10 anos). 461 - “Para tudo e para uma comemoração que eu acho que é uma das melhores, que é o nosso aniversário. Imagine as nossas vidas sem saber essa data tão importante, ou até pior: não sabermos quantos anos temos, por isso o tempo é uma coisa maravilhosa em minha vida” (22 anos). Para a resposta B, planejar responsabilidades do dia a dia, houve 10 respostas: - “Me ajuda a não me atrasar em forma de horas, me ajuda em trabalhos manuais de casa e como o clima é importante para o mundo” (11 anos). - “Ajuda a cumprir os deveres e sempre ter tempo para lazer e obrigações” (10 anos). Cinco respostas enquadram-se no item C, para planejar ou evoluir na vida: - “Porque eu aprendo com ele, com as pessoas, e é importante para o nosso dia a dia” (10 anos). Para a importância do tempo nas previsões climáticas, cinco respostas: - “É importante para saber qual é o melhor clima da semana para sair” (12 anos). - “É importante para não pegar chuva”. (51 anos). Em linhas gerais, a maioria das respostas relacionou o tempo à contagem dos dias, horas, minutos ou segundos; outros entenderam o tempo como manifestações da natureza, como chuva ou sol, e outros se referiram à relação do tempo com experiência, sabedoria, paciência, vida e recordação. Sobre a importância de medir o tempo, uma em cada quatro pessoas sentiu dificuldade para responder a questão, podendo-se observar indefinição, divagação ou desconexão na resposta, como por exemplo: - “Para viver e ter saúde no dia a dia” (11anos). - “Ele é importante para o meu dia a dia porque nós vivemos dele” (19 anos). - “Para se colocar à frente dele e organizar melhor as ações” (22 anos). O 2º momento da pesquisa foi chamado de “A arte do Tempo” e visava propiciar aos alunos um momento de maior explicitação do tema principal da pesquisa: o tempo. A proposta foi que os alunos desenhassem em uma folha de papel tudo o que para ele se relacionasse à palavra “tempo”, que foi escrita na lousa com uma letra bem grande. Este foi mais um contato do sujeito com o tema deste estudo, e que proporcionou uma manifestação “mais livre” do seu pensamento sobre o tempo. Para Smole (2000), O desenho foi a primeira forma de linguagem escrita entre os homens primitivos, e a expressão pictórica associou-se naturalmente, ao longo da evolução humana, a manifestações artísticas de diversas naturezas, 462 bem como a sua relação com elementos culturais importantes – pintura, escrita, ilustração – permeiam hoje inúmeras áreas do conhecimento humano. (SMOLE, 2000, p.46). Derdyk (2010) afirma que o desenho esteve sempre presente, desde quando o homem vivia em cavernas até a era da informática, ressaltando a sua importância enquanto linguagem para a arte e também para a ciência. Segundo a autora, Tudo o que vemos e vivemos em nossa paisagem cultural, totalmente construída e inventada pelo homem, algum dia foi projetado e desenhado por alguém: a roupa que vestimos, a cadeira que sentamos, a rua pela qual passamos, o edifício, a praça. O desenho participa do projeto social, representa os interesses da comunidade, inventando formas de produção e de consumo. (DERDYK, 2010, p. 37). Dentro da escola, o desenho faz parte da vida dos estudantes desde os primeiros rabiscos dos anos iniciais, e percebe-se que, geralmente, é usado nas aulas de Artes e pouco utilizado em outras áreas do conhecimento, principalmente pela Matemática, cuja representação gráfica mais usada se detém em aulas destinadas ao estudo das Geometrias. As representações produzidas por meio dos desenhos dos alunos configuram uma forma de expressão e imaginação que este aluno atribui a um determinado conceito ou representação. Para Derdyk (2010): O desenho não é mera cópia, reprodução mecânica do original. É sempre uma interpretação, elaborando correspondências, relacionando, simbolizando, atribuindo novas configurações ao original. O desenho traduz uma nova visão porque traduz um pensamento, revela um conceito. (DERDYK, 2010, p. 110). Assim, é possível que os alunos relacionem os conhecimentos já adquiridos com um registro sistemático de ideias, de modo que eles próprios construam seus procedimentos para expressar seu conhecimento sobre um determinado assunto. O material resultante deste momento consta basicamente de imagens, algumas frases e alguns diálogos entre personagens criados pelos alunos. Como era esperado, há uma multiplicidade de diferentes significados da palavra "tempo". Inicialmente, procuramos olhar para cada um dos desenhos produzidos como um todo, tentando identificar elementos que pudessem ser associados diretamente ao conceito de tempo ou de elementos que fossem abordados por eles com maior frequência. Um dos pontos que mais nos chamou a atenção foram as imagens relacionadas à percepção da passagem do tempo sinalizado por instrumentos de medição, como 463 calendários (Figura 1) e relógios (Figura 2). Um fato interessante foi o desenho de relógios e calendários antigos, como por exemplo, ampulhetas (Figura 3), relógios cuco (Figura 4), relógios de sol (Figura 5) e um calendário maia (Figura 6). Figura 1 Figura 4 Figura 2 Figura 5 Figura 3 Figura 6 Ainda relacionando a percepção do tempo como passagem, apareceram imagens que mostravam essa passagem, como dia/noite (Figura 7), personagens aparentando diferentes idades (Figura 8), imagens relacionadas às épocas passadas, como roupas e acessórios antigos (Figura 9), e também imagens de um passado mais distante, como na era dos dinossauros (Figura 10), e do futuro, marcado com a presença de desenhos de discos voadores (Figura 11). Figura 9 Figura 7 Figura 8 464 Figura 10 Figura 11 Outro destaque foram as imagens que trouxeram o tempo no reino animal (Figura 12) e no reino vegetal (Figura 13). Também surgiram elementos relacionados ao clima (Figura 14) e às estações do ano (Figura 15), além de imagens que diziam respeito ao tempo como sinônimo de dinheiro (Figura 16). Figura 12 Figura 14 Figura 13 Figura 15 Figura 16 Com o objetivo de fazer uma primeira síntese, foi elaborado um quadro-resumo que contemplou a maioria dos elementos presentes no conjunto de imagens apresentadas pelos alunos: 465 Elementos presentes nas imagens Total de desenhos Instrumentos de medição do tempo 22 Tempo como clima/temperatura/estações 22 Tempo como passagem (dia/noite, passado/presente/futuro) 22 Unidades de medidas de tempo (h/min/s) 15 Tempo de vida (idade/crescimento animal/vegetal) 14 Tempo relacionado a dinheiro 2 TOTAL DE DESENHOS 97 Três categorias aparecem empatadas em primeiro lugar: os alunos associam o tempo à sua marcação, referenciada pela presença dos relógios e calendários; também associam o tempo com a presença do sol ou da chuva, com a mudança de temperatura ou das estações do ano. Em seguida, associam o tempo à passagem do dia/noite, à mudança de gerações e, ainda, por inspiração da ficção científica, associam o tempo a épocas futuras. Na quarta categoria, o tempo são os anos, os dias, os meses, as horas, os minutos, os segundos. A quinta categoria, o tempo como passagem, aparece com lembranças de épocas passadas, em associação à ideia de mudança que pode caracterizar-se pela evolução humana ou pelo ciclo natural da vida, tanto do homem como de animais ou vegetais. Por fim, a última categoria associa o tempo a dinheiro. Perder tempo significa perder dinheiro, segundo a visão capitalista do tempo. O 3º momento consistiu na produção de um vídeo com os desenhos feitos pelos alunos, com a intenção de levá-los a refletir sobre o que cada um deles e os demais colegas de classe concebem sobre o tempo. O vídeo foi produzido escaneando os desenhos dos alunos, agrupados intencionalmente segundo as categorias descritas no momento anterior. Para alguns alunos, a visualização favorece o estabelecimento de relações no processo de aprendizagem. Fogaça (2003) afirma que “Assim como a ciência cria modelos para compreender fenômenos, os alunos também precisam de imagens mentais para compreender conceitos” (p. 190). 466 Outra intenção com o vídeo produzido a partir dos desenhos dos alunos foi torná-los parte atuante do processo de ensino e aprendizagem, uma vez que as imagens exibidas no vídeo foram produzidas pelos próprios alunos, não sendo, portanto, imagens reproduzidas de livros didáticos ou do material produzido pelo próprio professor. Além disso, a intencionalidade desse vídeo foi a de despertar no aluno o interesse e a curiosidade acerca do tema em questão, de modo que ele se sentisse motivado a ampliar seus conhecimentos. A exibição do vídeo resultou no 4º momento do trabalho de campo. Acreditamos ter sido este o momento de maior empolgação dos alunos. Além da agitação desencadeada pela curiosidade natural de assistir ao vídeo, eles estavam bastante ansiosos porque esta seria uma aula diferente. Os alunos foram orientados de que a atividade constaria de três etapas distintas: Na 1ª etapa eles assistiram ao vídeo produzido a partir dos desenhos, apenas observando as imagens. Assim que o filme terminou, iniciaram-se, entre os alunos, muitos comentários, o que deixou claro a empolgação em que se encontravam: Professora, passa de novo! Ou, Conta como você fez o filme. Ou ainda, Meu desenho ficou mais bonito no vídeo do que no papel. (Diário de campo da pesquisadora, setembro/2011). Na 2ª etapa, os alunos receberam uma folha de papel, onde deveriam anotar todas as dúvidas, curiosidades, comentários e ideias que surgissem durante a segunda exibição do filme. Foi explicado que esta segunda etapa seria uma espécie de Brainstorming, o que imediatamente provocou em vários alunos a seguinte pergunta: Que é isso, professora! É difícil? Foi explicado também como o grupo deveria se preparar para o Brainstorming e dadas algumas dicas de como eles poderiam escrever suas ideias: “O que é...”; “De onde veio...”; “Só existe esse...”; “Todos são iguais...”; “É útil para...”, etc. Terminada a apresentação do vídeo, novamente vários comentários surgiram entre os alunos, como por exemplo: Nossa! Quanta coisa eu não sei!; ou: Estou é curioso pra saber de onde surgiu todas essas coisas do tempo. A 3ª etapa seria a socialização das ideias que eles anotaram na folha de papel. O objetivo desta etapa era socializar as perguntas, curiosidades ou dúvidas dos alunos, fazendo com que essas próprias questões desencadeassem outras. E foi o que aconteceu. Muitos alunos queriam falar ao mesmo tempo. Ficou claro o entusiasmo provocado nos alunos pelo vídeo e pela maneira como o tema foi trabalhado. 467 Durante esta etapa, surgiram várias perguntas e questionamentos que mostraram o quanto os alunos superaram nossas expectativas, e que confirmam o que diz Lorenzato (2006): Mais do que deixar os alunos falarem, é preciso saber ouvi-los. Durante as aulas, os alunos se exprimem através da fala, da escrita, do olhar, de gestos; eles apresentam perguntas ou soluções, cometem erros, mostram suas dificuldades, constroem raciocínios e, dessa forma, revelam seus vocabulários, interpretações, sugestões, preferências, tendências, potencialidades, expectativas, insatisfações, temores, crenças e bloqueios. (LORENZATO, 2006, p. 16). Ao final da socialização, foram recolhidas as folhas com as anotações dos alunos, que ao todo somaram 152 questões, incluindo dúvidas, experiências, breves relatos, afirmações, curiosidades, fatos, questionamentos e perguntas. Apareceram vários “porquês”, como por exemplo, por que o dia tem 24 horas? Ou ainda, por que a semana tem sete dias? Algumas perguntas referiram-se à etimologia das palavras, como por exemplo, o que significa a palavra calendário? Outras perguntas eram de ordem filosófica, como: o tempo existe? Se existe como podemos tocá-lo? Enfim, pudemos perceber que a característica principal da fala dos alunos dependia de suas histórias de vida, daquilo que tinham vivido e aprendido até então. Lorenzato (2006) explica que se deve partir de onde o aluno está, afirmando que: ... toda aprendizagem a ser construída pelo aluno deve partir daquela que ele possui, isto é, para ensinar, é preciso partir do que ele conhece, o que também significa valorizar o passado do aprendiz, seu saber extra-escolar, sua cultura primeira adquirida antes da escola, enfim, sua experiência de vida.(LORENZATO, 2006, p. 27). Alguns temas mostraram-se recorrentes nos questionamentos, o que nos levou a elegê-los como categorias: O mais recorrente de todos foi o referente aos instrumentos de medida de tempo, com 43 questionamentos envolvendo relógios e calendários, como por exemplo: Onde foi criado o primeiro relógio? Os relógios são iguais em todo o mundo? Por que os relógios foram se modificando com o tempo? Por que existe o relógio? Quem teve a ideia de inventar o calendário? De onde vieram os nomes dos dias da semana e dos meses do ano? Por que existe ano bissexto? 468 Sobre o conceito de tempo e a medida de tempo, 37 perguntas, dúvidas ou afirmações surgiram, como por exemplo: O que é tempo? É possível viajar no tempo? De onde veio o tempo? Para que serve o tempo? As unidades de medida de tempo aparecem com 36 questionamentos, como por exemplo: Quem inventou as horas, minutos e segundos? O tempo é medido só pelo relógio? Como era medido o tempo antigamente? Sobre o clima, as estações do ano ou fuso horário foram 19 questões, por exemplo: Como sabemos se vai chover? Por que chove em algumas partes e em outras não? Por que o ano tem quatro estações? Por que existem fusos horários? Com referência a tempo de vida (pessoas, animais e plantas) foram apresentados 11 questionamentos. Por exemplo: Por que os dinossauros morreram? Por que nós envelhecemos? Outras perguntas, num total de 7, não se enquadravam em nenhuma dessas categorias, por exemplo: Por que o dia é claro e não escuro? No mundo inteiro existe dia e noite? Se um sexto é 1/6, bissexto não deveria ser 2/6? Estes exemplos de questões apresentadas pelos alunos denotam a abrangência e a diversificação delas, o que nos remete à pergunta: Quais foram os motivos que nos levaram à escolha do tema “Tempo e suas medições” para a realização de nosso trabalho de pesquisa? Foi o nosso inconformismo com o tipo de ensino que reduz uma das partes mais belas da Matemática a meros cálculos que transformam segundos em minutos ou em horas. Foi, também, o nosso desejo de propiciar um estudo do “Tempo e suas medições” que motivasse os alunos a uma aprendizagem significativa e ao prazer pelo estudo, pela aquisição de conhecimento. As páginas anteriores mostram que a efetiva participação dos alunos no processo de procura, elaboração, apresentação e análise dos conhecimentos (que estavam ao alcance deles) foi a causa predominante para a avalanche de respostas, dúvidas, questionamentos que aconteceram em meio à agitação e alegria de aprender. Foi assim que os alunos transcenderam ao planejamento pedagógico escolar e revelaram que o “Tempo e suas medições” é um tema rico em significados, concepções e desafios, com muita história que o próprio tempo construiu para si. Os alunos também mostraram que o tema em questão possui um alto valor formativo, além de facilitar a inter e transdisciplinaridade, pois o Tempo está presente no cotidiano de qualquer profissional, de qualquer pessoa, o que evidencia ele estar sendo altamente valorizado no mundo atual. 469 Enfim, o estudo do “Tempo e suas medições” é muito importante à formação das pessoas e, por isso, ele merece especial atenção dos educadores responsáveis pelas Propostas Curriculares, Livros Didáticos, Cursos de Formação de Professores, lembrando que crianças, pelo menos as participantes desta pesquisa, mostraram que aquilo que elas conhecem, vivenciam e pensam sobre o Tempo, está muito além do que os programas escolares preconizam. Será que nossas escolas não merecem Novos Tempos? REFERÊNCIAS AUSUBEL, D. P., NOVAK, J.D. e HANESIAN, H. Psicologia educacional. Tradução de Eva Nick. Rio de Janeiro: Ed. Interamericana Ltda, 1980. DERDYK, E. Formas de pensar o desenho: o desenvolvimento do grafismo infantil. 4. ed. Porto Alegre: Zouk, 2010. FOGAÇA, M. Imagens e compreensão de conceitos científicos. In: MACHADO, N. J.; CUNHA, M. O. (Orgs) Linguagem, conhecimento, ação: ensaios de epistemologia e didática. São Paulo, SP: Escrituras Editora, 2003 (Coleção Ensaios Transversais; 23). LORENZATO, S. Para aprender matemática. Campinas, SP: Autores Associados, 2006. SMOLE, K. C. S. A matemática na educação infantil: A teoria da inteligência múltipla na prática escolar. Porto Alegre: Artes Médicas, 2000. 470 TEORIA DO CAOS E FRACTAIS: A UTILIZAÇÃO DE UM “PÊNDULO CAÓTICO” COMO ESTRATÉGIA DE ENSINO Ralph A. FELTRIM – Unesp/P. Prudente – SP ([email protected]) Moacir P. SOUZA FILHO – Unesp/P. Prudente – SP ([email protected]) Allan V. RIBEIRO - IFSP/Birigui – SP ([email protected]) Resumo: Reflexões acerca das potencialidades de inclusão de tema de ciência contemporânea na educação básica vem sendo debatida como uma estratégia profícua no ensino de matemática. Mesmo com a escassez de material didático específico para abordagem de temas complexos, é evidente que o esforço em articular tais conceitos com a vivência cotidiana dos estudantes se traduz como uma poderosa estratégia de ensino-aprendizagem. Muitos fenômenos imprevisíveis estão presentes em nosso cotidiano. Alguns podem apresentar um caráter simples ou um evento complexo, como a turbulência de uma massa de ar ou o crescimento populacional. Os sistemas caóticos apresentam uma geométrica especifica e através dela, os fenômenos que contêm fatores que antes eram erráticos, imprevistos e aleatórios, se reduzem simplesmente a um único termo, “caóticos”, que se denomina geometria fractal. Os fractais são figuras geométricas irregulares ou fragmentadas que pode ser subdividida em partes, e cada parte corresponde a uma cópia reduzida da sua forma geral. Ao conhecer e compreender fractais, presentes em seu cotidiano, o aluno pode associar o conhecimento geométrico com diferentes conceitos matemáticos, o que, por sua vez, contribui para uma aprendizagem significativa dos conteúdos. Nesse contexto, por meio de um mini-curso e da realização de dois experimentos (do papel em queda e do pêndulo caótico) foi abordada uma discussão revelando a historia da teoria do caos e dos fractais com propósito de estimular a curiosidade dos alunos. Os resultados apontaram para um desconhecimento da amostra investigada em relação ao assunto. Por fim, algumas sugestões foram feitas para incorporar esse tema na ementa do ensino física e matemática no ensino médio, visando trabalhar uma forma de transmiti-lo de maneira simples e compreensível aos alunos interessados. Palavras-chave: Teoria do Caos, Fractais, Educação Matemática. 471 Introdução A complexidade de relações e problemas contemporâneos exige uma nova forma de pensar e refletir a organização social e educacional, contrapondo-se aos princípios cartesianos de fragmentação do conhecimento. No panorama atual, esta concepção reducionista vem perdendo força nas últimas décadas, principalmente com a constatação dos sistemas complexos e fortemente correlacionados. As análises destes sistemas despertam um novo olhar para ciência contemporânea (SANTOS 2008). Na educação, os reflexos da quebra deste paradigma apontam a necessidade de repensar, refletir e avaliar a articulação de novas metodologias e abordagens (PETRAGLIA, 1995), contribuindo para o fortalecimento de teorias emergentes, como a Teoria da Complexidade sistematizada por Morin (1991). No final do século XIX, a teorias científicas foram construídas com base na Análise Estatística de quantidades médias ou pela Análise Matemática. Um sistema complexo era classificado como “randômico” e, um sistema simples, como “determinista”. A complexidade e a simplicidade eram tratadas como sendo coisas distintas. Existiam leis que regiam sistemas ordenados ou deterministas, e leis que regiam sistemas desordenados ou complexos. Um sistema é um conjunto de objetos unificados por meio de uma interação ou interdependência, em que, os efeitos e causas se relacionam com os elementos desse conjunto. Dessa forma, os objetos que compõem o sistema, é caracterizado por uma grandeza que sofre variação no tempo e são denominados de “sistema dinâmico”. No caso do pêndulo, o ângulo formado evolui em função do tempo, ou seja, por meio da função , onde, é o ângulo do pendulo e o tempo que o ângulo sofre uma variação, sendo essa, a equação de estado do pêndulo (MONTEIRO, 2011). 472 Figura 1 – Pêndulo Simples A noção de sistemas dinâmicos passa a descrever qualquer processo de evolução temporal no qual o futuro depende do passado de maneira determinista. Para conhecer este sistema torna-se necessário definir certos parâmetros de evolução, como por exemplo, conhecer suas posições e velocidades (BIEZUNSKI, 1993, p. 245). O conceito de causalidade está relacionado a uma relação de previsibilidade entre dois eventos, no qual o primeiro é denominado “causa” e o segundo é denominado “efeito”. No entanto, um evento da natureza não pode ser previsto com certeza absoluta, ou seja, nesses casos, não há uma regularidade rigorosa no comportamento dos fenômenos físicos (PLANCK, 2012). Por este motivo, embora a capacidade de prever seja considerada uma noção chave na física, existe na natureza, sistemas que embora sejam “deterministas”, na acepção do termo, é influenciado pelo acaso. Suas evoluções temporais são plenamente causais. No entanto, variações muito pequenas das condições iniciais podem provocar amplificações consideráveis, acarretando um limite de validade aproximado e tornandoas totalmente imprevisíveis, no final (PATY, 2009). Desta forma, podemos dizer que a estatística [ou o “caos”] reina na descrição desses fenômenos. A teoria dos sistemas dinâmicos não lineares ou dissipativos correspondem ao que convencionou chamar de física de sistemas caóticos (PATY, 2009). A dependência em relação às condições iniciais, aquelas em que o sistema se encontrava no momento em que o processo começou, torna-se uma característica relevante da problemática “física do caos”. No entanto, qualquer alteração de parâmetro, por ínfimo que seja, pode desencadear consequências aleatórias e totalmente imprevisíveis. 473 Poincaré adotou um ponto de vista qualitativo que transformava a maneira de conceber os problemas da dinâmica. Essa nova maneira de pensar, parte do pressuposto de que, uma vez que não podemos conhecer a forma exata das soluções das equações diferenciais, é, contudo, possível descrever a natureza dessas soluções, ou seja, seu comportamento estrutural, de equilíbrio estável ou instável, que trata não mais de uma trajetória individual, mas de um conjunto de trajetórias (PATY, 2009, p. 199). As pesquisas de Poincaré revelaram que sistemas que obedecem a leis determinísticas nem sempre atuam de modo previsível e regular. Os modelos quantitativos, por mais precisos que sejam, não garantem o alcance de previsibilidade absoluta (WEINBERG, 1996, p. 38). O termo “atrator” está relacionado a um conjunto de equações diferenciais que “atraem” as trajetórias, independente do seu ponto de partida. O atrator é uma pequena região do espaço de fases que o ponto representativo do sistema alcança ao fim de certo tempo e, que ele percorre indefinidamente. O que conta, finalmente é a figura do conjunto, recortada no espaço das fases globalmente invariante, ligado a estrutura do sistema, ou seja, ao seu conjunto de equações diferenciais (PATY, 2009, p. 209). Os ciclos fechados para os quais tendem os sistemas dinâmicos mais complexos, no decorrer de uma longa evolução, recebem o nome de “atratores”. Os atratores de Edward Lorenz é uma figura constituída por duas “orelhas”, que foi obtida graças aos computadores e que descrevem sistemas extremamente complexos, como o clima, a turbulência, em que uma modificação ínfima nas condições iniciais, pode produzir efeitos espetaculares. No entanto, o comportamento dos sistemas dinâmicos é gigantescamente mais complexo, nos quais, seus atratores ou repulsores tendem a formar fractais (MANDELBROT, 1977). [ver Fig. 2]. Embora o estudo da geometria fractal tenha surgido na metade do século XIX, seu ápice ocorreu em 1975, com o matemático Benoit Mandelbrot, ao mencionar pela primeira vez o termo fractal. A palavra fractal tem origem do adjetivo latim fractus, do verbo frangere, que significa “quebrar” (ASSIS; MIRANDA; MOTA; ANDRADE; CASTILHO, 2008). Para descrever figuras irregulares à geometria comum, Mandelbrot inventou a dimensão fracionária para qualificar o grau de irregularidade. Deste modo, “fráctil” significa mudança de escala, que se aplica não só a meteorologia, mas a outros processos dinâmicos de outras áreas, como a biologia, economia, etc. (BIEZUNSKI, 1993, p. 245). Essas propriedades geométricas da dimensão fractal 474 correspondem às características que permitem encontrar a ordem sob a aparência da irregularidade ou desordem (PATY, 2009, p. 226). Figura 2 – Atratores e tipos de fractais Como vimos, um sistema caótico apresenta um padrão como um todo, e uma organização, ou seja, tais sistemas, não são aleatórios e nem desordenado. O comportamento desses sistemas pode ser definido através de equações, que graficamente, gera uma imagem denominada, atrator. Desse modo, “a Teoria do Caos permite que as pessoas passem a ver ordem e padrão onde antes, por conta de uma visão reducionista de mundo, só se observava a aleatoriedade, a irregularidade e a imprevisibilidade. Podemos dizer que com essa visão complexa de mundo, a realidade tem uma irregularidade regular, uma imprevisibilidade previsível, uma desordem ordenada” (TÔRRES, p. 1). Os trabalhos de Lorenz e de Mandelbrot indicaram o caminho da incerteza e da imprecisão por meio das suas teorias. A teoria do Caos mostra a variedade de fenômenos que parte de um sistema determinístico e, com o passar do tempo, esse sistema torna-se “parcialmente indeterminístico”. Com a física do caos é possível compreender, atualmente, fenômenos que haviam sido deixados de lado, por causa de uma complexidade demasiado elevada. Deste modo, surgem novos problemas de que não se suspeitava e, isto, arrasta interrogações sobre domínios, até então, considerados como perfeitamente conhecidos (BIEZUNSKI, 1993, p. 245). Reflexões acerca das potencialidades de inclusão deste tema relacionado a ciência contemporânea na educação básica vem sendo debatida como uma estratégia 475 profícua no ensino de matemática. Mesmo com a escassez de material didático específico para abordagem de temas complexos é evidente que o esforço em articular tais conceitos com a vivência cotidiana dos estudantes se traduz como uma poderosa estratégia de ensino-aprendizagem. (NASCIMENTO et al, 2012) Podemos evidenciar, por exemplo, que ao conhecer e compreender fractais, presentes em seu cotidiano, o aluno pode associar o conhecimento geométrico com diferentes conceitos matemáticos, o que, por sua vez, contribui para uma aprendizagem significativa dos conteúdos. O objetivo central desse trabalho foi fazer uma aplicação direta de conceitos e teoria do caos e da geometria fractal no ensino médio, por meio do abandono de folhas de papel e de um pêndulo caótico, construído pelos autores. O intuito dessa pesquisa foi analisar o grau de conhecimento dos alunos sobre o tema e observar o seu comportamento perante a explicação destes conceitos por meio de um mini-curso. Metodologia adotada na pesquisa Muitos alunos consideram as aulas de matemática maçantes e chatas, fazendo com que os mesmos dispersem com facilidade. Porém, assuntos atuais e desafiadores podem constituir-se em uma estratégia para motivar os estudantes e incita-los a investigação. Neste sentido foi preparado um mini-curso com imagens e animações gráficas e experimentos que abordam conceitos voltados a geometria fractal e teoria do caos. O assunto em questão é algo bem complexo, quando analisado profundamente. Para minimizar essas dificuldades, foi poupada a utilização de equações complexas, uma vez que, no nível da matemática fornecida para esses alunos não acompanharia um desenvolvimento mais aprofundado dos conceitos dessas teorias. Assim, apenas a equação simplificada para calcular a dimensão dos fractais, sendo ela, n é o numero de replicas da figura; r a razão de semelhança; onde: um logaritmo natural foi citado, e os resultados numéricos foram apenas expostos. 476 Muito daquilo que se percebe no ensino de ciências exatas para alunos do ensino fundamental e médio é que essa aversão que os alunos possuem, muitas vezes, está relacionada ao conteúdo ministrado. Cada aluno tem facilidade para compreender melhor um determinado assunto e dificuldade para compreender outro. Assim, o melhor caminho encontrado para inserir o tema, foi partir para uma discussão filosófica. A abordagem adotada foi expor os objetos com geometria fractal presentes na natureza por meio de imagens e o uso de experimentos para evidenciar a dinâmica caótica. As imagens proporcionaram um enorme estimulo e isso possibilitou discutir alguns métodos para obter um objeto fractal. A existência de comportamento caótico em sistema foi investigada com auxilio de dois experimentos. O primeiro experimento consiste em abandonar folhas de papel de uma determinada altura. Esse método consistiu basicamente em quatro folhas de papeis, sendo que, duas delas foram utilizadas para construir duas bolinhas de papel. Na primeira etapa, as bolinhas de papel foram abandonadas a uma mesma altura qualquer. Ao serem abandonadas, as bolinhas chegam ao chão praticamente no mesmo instante e a distância que as separam é a mesma de quando elas atingem o chão, ou seja, em nenhum momento da trajetória elas se alteram. O mesmo processo é repetindo várias vezes, e a distância inicial entre elas será a distância final. Na segunda etapa, o mesmo procedimento é realizado, porém, ao invés de amassar as folhas de papeis para formar as bolinhas, utilizam-se eles, sem alterar sua forma. Abandonando-os da mesma altura, é possível observar que, até um determinado tempo, os movimentos deles não se alteram. Após esse tempo, os movimentos dos papeis passam a serem aleatórios. Por fim, ao tocarem ao chão, a distância que os separam não é a mesma de quando eles foram abandonados. Repetindo a segunda etapa várias vezes, nota-se que, a distância que separa os papéis será sempre distinta entre si, ou seja, se os papeis forem abandonados a uma altura desejada, dez vezes, a distância entre os papéis, quando eles chegarem ao chão, será diferente nas dez vezes. Esse procedimento é simples de ser executado. O segundo experimento consistiu na construção de um pêndulo duplo. O pêndulo duplo foi construído utilizando três pedaços de madeira, dois de forma retangular e um de forma quadrática, dois rolamentos (nesse caso, foram utilizados rotores internos de HD), uma haste de fixação e parafusos. Dessa forma, o pêndulo duplo foi construído. Por fim, o conjunto foi acoplado na haste, de modo que, a base 477 permanecesse fixa e os pedaços de madeira retangulares, pudessem oscilar livremente. O sistema se comporta de dois modos. No primeiro modo é como um “pêndulo simples” e no segundo modo é como um de “pêndulo duplo”. Para o sistema se comportar como um pêndulo simples, basta movimentar a segunda madeira retangular, de modo que, ela permaneça paralela com primeira madeira retangular e sucessivamente, inserir um parafuso que atravesse seus furos centrais, simultaneamente, travando o movimento da segunda madeira retangular. Para o sistema se comportar como um pêndulo duplo, basta não travar a segunda madeira retangular. A figura a seguir mostra uma representação do pêndulo. Os experimentos utilizados para detectar o comportamento caótico surtiram efeito, uma vez que, houve uma interação dos alunos com os experimentos. O experimento do papel proporcionou aos alunos a visualização do conceito de comportamento caótico. Eles notaram que quando os papeis eram amassados e abandonados de uma determinada altura, a distância entre os papeis, antes e depois de abandoná-los, não sofria alteração. No entanto, quando o mesmo procedimento foi realizado, porém com os papeis intactos, eles foram capazes de observar que a distâncias entre os papeis sofria uma variação considerável. Sempre que o processo era repetindo, à distância entre os papeis e o ponto final, era distinta. Outro fator que eles identificaram foi que em meio à trajetória, os papeis intactos realizava um movimento de “zigue-zague”, que fazia com que os papeis se distanciassem entre si. Dessa forma, eles notaram a existência de sistemas com comportamento caótico. Figura 3 – Esquema mostrando o experimento realizado com papeis e o pêndulo caótico utilizado 478 Por sua vez a detecção do conceito de sensibilidade às condições iniciais foi realizada com auxilio do experimento do pêndulo duplo. Inicialmente, foi proposto aos alunos que observassem o movimento do pêndulo travado (modo simples). O inicio do movimento foi realizado fornecendo ao pêndulo um ângulo em relação a sua base. Ao abandonar o pêndulo, os alunos perceberam que o pêndulo simples apresentava uma oscilação periódica, ou seja, um movimento de vai e vem. Sucessivamente, a trava do pêndulo foi retirada, e o pêndulo passou a apresentar a configuração “modo duplo”. Dessa forma, o mesmo artifício para iniciar o movimento do pêndulo foi realizado. No entanto, a cada procedimento, o ângulo entre o pêndulo e a base era aumentado. Os alunos notaram que para ângulos pequenos, os pêndulos apresentam o comportamento idêntico a um pêndulo simples. Conforme o ângulo era aumentando, os pêndulos sofriam certas variações no seu comportamento. Como a dimensão dos fractais é fracionária, os alunos observaram que para saber se o sistema apresentava um comportamento caótico, bastava obter o valor de sua dimensão. Por meio disso, os alunos conseguiram relacionar a teoria do caos com a geometria fractal. Lorenço e Dickman propuseram um questionário para alunos de uma escola pública de Belo Horizonte/MG, visando investigar o grau de compreensão sobre os conceitos da Geometria Fractal. Com base nesse trabalho, no final do mês de novembro de 2013, foi elaborado e aplicado um questionário para um grupo formado por dez alunos, que cursavam o segundo e terceiro ano do ensino médio no período noturno, de uma escola pública da cidade de Martinópolis/SP. A seleção da amostra foi feita a partir do interesse dos alunos pelo tema. O questionário foi composto por (4) quatro questões, que são apresentadas a seguir: 1. Você acredita que por meio de modelos matemáticos e dados experimentais é possível prever todos os fenômenos da natureza? ( ) Não ( ) Somente modelos matemáticos ( ) Somente dados experimentais ( ) Ambos 479 2. O que você compreende por conceitos deterministas e indeterministas? 3. Você, alguma vez, ouviu falar algo sobre Teoria do Caos? Caso tenha ouvido, em quais circunstâncias? 4. Você, alguma vez, ouviu falar algo sobre Geometria Fractal? Caso tenha ouvido, em quais circunstâncias? Caso as respostas 3 e 4 fossem afirmativas, existia alguma relação entre os conceitos de Geometria Fractal e Teoria do Caos? Caso a resposta 3 e 4 fossem negativas, foi questionado o que eles pensam quando escuta, as palavras, Fractal e Caos? Este questionário foi aplicado antes destes estudantes terem contato com o tema. Em seguida um dos autores ministrou um mini-curso sobre a teoria do caos e fractais. Essa intervenção iniciou na abordagem cronológica da evolução dos estudos dos fenômenos da natureza, iniciando em 1500 com o físico e matemático Galileu Galilei e, finalizando em 1970 com o matemático polonês Benoit Mandebrot. Os conceitos de determinismo e indeterminismo foram discutidos, mostrando a diferença entre esses conceitos. Em seguida, a geometria fractal foi discutida, iniciando em uma abordagem histórica. Os experimentos dos papeis e do pêndulo duplo, foi realizado com base em um vídeo foi produzido pelo Prof. Dr. Tadeu J. P. Penna do Instituto de Física da Universidade Federal Fluminense/ UFF, RJ, que é um dos colaboradores de um projeto denominado, Sei Mais Física, e pode ser acessado nos seguintes sites: http://www.youtube.com/watch?v=FZ70fd7X5Mc e http://www.seimaisfisica.com.br/. Apresentação dos dados e Análise dos Resultados Os métodos aplicados mostraram alguns fatores sobre o conhecimento dos alunos em teoria do caos e geometria fractal. Eles também forneceram o nível de interesse dos alunos quando expostos a esses temas. Primeira questão: previsão de fenômenos da natureza por meio de modelagem matemática e dados experimentais. O objetivo dessa questão foi verificar se o grupo de alunos acredita na modelagem matemática e os dados experimentais para prever os fenômenos da natureza. 480 De certo modo, muitos mecanismos foram compreendidos por meio dessas ferramentas. No entanto, muitas vezes ocorreu o oposto, ou seja, as ferramentas também falharam nessa busca pela compreensão de certos mecanismos. Gráfico 1 – Classificação das respostas à primeira questões nas respectivas categorias As respostas à essa questão apresentou um equilíbrio quanto à opinião dos alunos. Dentre os dez, (3) três não acreditam que a modelagem matemática e os dados experimentais possam promover a previsão de fenômenos da natureza. Por sua vez, (3) três alunos acreditam que a previsão desses fenômenos só é possível por meio de dados experimentais. Também, (3) três alunos acreditam que tanto os dados experimentais quanto os modelos matemáticos são eficazes na previsão de fenômenos naturais. Por fim, apenas (1) um aluno acredita que somente os modelos matemáticos são capazes de prever fenômenos da natureza. Esses resultados mostram que a maior parte dos alunos pertencentes ao grupo, de alguma forma, acredita que a modelagem matemática e os dados experimentais são importantes na previsão de fenômenos naturais, mesmo que essas ferramentas estejam operando em conjuntos ou estejam operando individualmente. Segunda questão: compreensão dos conceitos determinista e indeterminista A resposta à essa questão mostrou que a maior parte dos alunos do grupo não apresentava qualquer conhecimento sobre esses conceitos. Dentre os dez, (9) nove não apresentavam conhecimento sobre os termos determinismo e de indeterminismo, de tal modo que, eles não mostraram qualquer opinião sobre esses conceitos, ou mesmo se arriscaram impor alguma opinião. Apenas um aluno respondeu a esta questão da 481 seguinte maneira: “Determinista é aquilo que tem uma solução e que ‘foca em algo’. Indeterminista que não consegue ‘chegar’ num resultado exato” A resposta do aluno que respondeu não está completamente errada, embora as definições destes conceitos sejam mais complexas. Terceira questão: compreensão sobre Teoria do caos O resultado dessa questão apontou que a maior parte dos alunos do grupo não apresentava qualquer conhecimento sobre esses conceitos. Dentre os dez, oito não apresentava conhecimento sobre teoria do caos, de tal modo que, não mostraram qualquer opinião sobre esse conceito, ou mesmo arriscaram impor alguma opinião. Dois alunos afirmaram que conhecia a teoria, no entanto, não sabiam, ao certo, quais eram as circunstâncias, no qual, essa teoria era aplicada. Quarta questão: compreensão sobre Geometria Fractal A geometria fractal está presente na maioria das formas que compõem o mundo. Por esse motivo, a pergunta buscava encontrar o conhecimento do aluno referente a esse tipo de geometria. Caso o aluno possuísse esse conhecimento, foi pedido que ele comentasse de que forma ele adquiriu esse conhecimento. Os dez alunos do grupo responderam que nunca ouviram qualquer coisa a respeito dos fractais, ou seja, a amostra investigada não apresentou menor noção sobre o tema. Após as questões serem respondidas, um dos autores apresentou o mini-curso com intuito de despertar a atenção desse grupo para o respectivo tema. Considerações finais Os resultados mostraram um desconhecimento total dos estudantes sobre a temática investigada. De certo modo, é interessante os alunos saberem que existem muito mais estudos desenvolvidos, além do que o conteúdo educacional aplicado na escola. O mini-curso mostrou que houve um interesse, por parte da maioria dos alunos, em conhecer a teoria do caos e a geometria fractal. Na verdade, para eles foi algo 482 completamente novo, fora da realidade habitual vivida por eles. Isso estimula a sua curiosidade, incentivando em seu aprendizado. A dificuldade evidente em ministrar o mini-curso consistiu na modelagem matemática. Os cálculos são baseados em um formalismo matemático muito complexo, isso sem mencionar que, as ferramentas matemáticas utilizadas para desenvolver o tema, não são fornecidas na grade curricular desses alunos. No entanto, a abordagem filosófica e conceitual do tema ocorreu sem problemas aparentes. Os experimentos utilizados foram muito úteis, uma vez que, mostrava de modo concreto a complexidade matemática. Por fim, as professoras responsáveis pelas turmas foram muito prestativas ao disponibilizar o tempo e convidar os alunos para o mini-curso. Referências ASSIS, T. A; MIRANDA, J. G. V.; MOTA, F. B.; ANDRADE, R. F. S.; CASTILHO, M. C. Geometria fractal: propriedades e características de fractais ideais. Revista Brasileira de Ensino de Física, v. 30, n. 2, 2304. 2008. BIEZUNSKI, M. A história de Física Moderna. Lisboa: Instituto Piaget, 1993. LORENÇO, B. J.; DICKMAN, A. G. Fractais: Uma Proposta de Ensino de Física. In: XVIII Simpósio Nacional de Ensino de Física/Vitória, ES, 2009. MANDELBROT, Benoit B. The Fractal Geometry of Nature. New York: W. H. Freeman and Company, 1977. MONTEIRO, L. H. A. Sistemas Dinâmicos. 3ª. ed. São Paulo: Livraria da Física, 2011. MORIN, E. Introdução ao Pensamento Complexo. Lisboa, Instituto Piaget, 1991. 483 NASCIMENTO, M., SILVA, S. C. R., MACIEL, N. A., Uma proposta didática para o ensino de geometria fractal em sala de aula na educação básica. VIDYA, v. 32, n. 2, p.113-132, 2012. PETRAGLIA, I. C. Edgar Morin: Complexidade, transdisciplinaridade e incerteza. EICPS, v.1, 2002. PATY, M. A Física do Século XX. Aparecida: Idéias e Letras, 2009. PLANCK, M. O conceito da causalidade física. In: Autobiografia e outros ensaios. pp. 41-57. Rio de Janeiro: Contraponto, 2012. SANTOS, A. Complexidade e transdisciplinaridade em educação: cinco princípios para resgatar o elo perdido. Revista Brasileira de Educação v. 13 n. 37, 2008. TÔRRES, Julio. Mesquita. Teoria do Caos. http://www.juliotorres.ws/. Acessado em: 19/07/2012. Disponível em: WEINBERG, S. Sonhos de uma Teoria Final: a Busca das Leis Fundamentais da Natureza. Rio de Janeiro: Rocco, 1996. 484 A UTILIZAÇÃO DE UM QUEBRA-CABEÇA NO ENSINO DE GEOMETRIA ESPACIAL: ANÁLISE, ELABORAÇÃO DE ATIVIDADES E USO EM SALA DE AULA Rosemeire BRESSAN - IFSP – SP ([email protected]) Resumo: O presente trabalho faz parte de uma pesquisa realizada com um material manipulável aplicado no ensino de geometria espacial, material esse que é encontrado em lojas de variedades. Uma análise desse material foi realizada mostrando como manipulá-lo juntamente com a apresentação de dez atividades para uso em sala de aula, com alunos do ensino fundamental e médio. Para o uso do material e aplicação das atividades propostas, uma turma do quarto ano do ensino fundamental de uma escola municipal de Catanduva foi selecionada. Para finalizar, algumas considerações são apresentadas sobre o material e sua aplicação em sala de aula. Palavras-chave: Material Manipulável, Geometria Espacial, Ensino. Introdução O conteúdo de Geometria está presente em todas as séries do ensino fundamental e médio. Numa porcentagem maior ou menor em cada série, contribui com a visualização da álgebra, tornando a matemática mais interessante. Como fundamental, tem a propriedade de mostrar o que muitas vezes, não conseguimos visualizar. Isso pode ser feito inclusive, de uma maneira concreta, por meio de construções utilizando materiais diversos ou com a utilização de softwares específicos. De acordo com Hyde(1989) e Serrazina(1993, apud BOTAS, 2008), “a forma como os professores encaram a Matemática pode influenciar as suas práticas de ensino. Tudo o que os professores realizam na sala de aula resulta do que pensam sobre a Matemática e como a sentem”. Se o professor mostra para o aluno uma matemática fácil, interessante, cativante, a matemática do dia a dia do aluno, sua reação será aceitá-la da mesma maneira, com as mesmas qualidades. Para Caldeira (2009), “os alunos da formação inicial necessitam de novas práticas e metodologias mais criativas, em virtude, de ser um fator determinante para aumentar os seus níveis de interesse, para uma melhor aprendizagem da matemática. 485 Para contribuir com a vivência e experimentação dos alunos, visando à motiválos e melhorar a aprendizagem, é feita uma análise do uso de um material manipulável no ensino de geometria. Além da análise, algumas atividades sobre o uso do material são propostas. Para finalizar, a aplicação das atividades propostas com crianças do quarto ano da rede municipal de ensino também é apresentada juntamente com algumas considerações sobre o uso do material. Problemática O uso de material didático manipulável tem sido muito discutido por vários pesquisadores como afirma Botas (2008), onde cita que “Uma das formas de promover as diferentes experiências de aprendizagem é através do uso de materiais didáticos, os quais assumem um papel ainda mais determinante por força da característica abstrata desta disciplina. Os materiais constituem, assim, o suporte físico através do qual as crianças vão explorar, experimentar e manipular.” A manipulação desses materiais pode contribuir muito com a aprendizagem e cabe ao professor proporcionar ao aluno, condições para que isso aconteça. Seu uso deve contribuir com o conhecimento matemático e não ser aplicado apenas para mostrar que a matemática é divertida. Precisa ocorrer uma matematização, que, Caldeira (2009, p. 218) define como “... a atividade organizada e estruturada durante a qual o conhecimento e as aptidões adquiridas são justificadas com o objetivo de descobrir regularidades, conexões, estruturas ainda desconhecidas. É fundamental que o conteúdo a ser matematizado seja vivenciado e experimentado pelo aluno de forma a ser real, contribuindo assim para o desenrolar do processo.” Para Turrioni(2004, p. 78, apud CALDEIRA, 2009, p. 226), o Material Didático “exerce um papel importante na aprendizagem. Facilita a observação e a análise, desenvolve o raciocínio lógico, crítico e científico, é fundamental e é excelente para auxiliar ao aluno na construção de seus conhecimentos”. Segundo Smole (1996, apud Caldeira, p. 235), “os materiais devem ao simularem situações, desenvolver a imaginação, permitirem tentativas e erros, para que haja uma aprendizagem significativa”. 486 Será que nesse desenvolvimento de imaginação, ocorrerá aprendizagem? Ela será significativa? É correto propor ao aluno atividades com regras ou deixá-lo agir por tentativa e erro? Até que ponto o professor deve interferir na ação do aluno?” Smole (1996) defende primeiramente um manuseio livre dos materiais, para que algumas noções possam emergir dessa exploração. Depois, de acordo com os objetivos, podem ser colocadas situações problemáticas que permitam ser investigadas, para mais tarde através do diálogo, serem trocadas opiniões, em que os trabalhos individuais e coletivos possam ser registrados. Desenvolvimento Após ter acesso a um quebra-cabeça para crianças, disponível em lojas de variedades, surgiu a ideia de explorá-lo para o ensino de Geometria Espacial. Esse quebra-cabeça é conhecido como “Inteligence Ball” ou bola inteligente. Cada embalagem possui 20 peças com quatro tipos de cores, que são ligadas entre si formando uma bola. Junto com as unidades, vem um folheto explicativo (figura 1) mostrando as novas peças que podem ser geradas. 487 Figura 1: Folheto sobre o quebra-cabeça As peças que compõem o material são chamadas de unidades, e que, quando unidas, formam figuras em três dimensões. Por meio da manipulação dessas unidades, foi possível construir peças diversas que são apresentadas nesse artigo. Primeiramente é apresentada a relação da geometria com essas peças, para depois, apresentar uma sequência de atividades propostas. Material e a geometria espacial Uma criança ou um aluno, quando se depara com esse material, fica curioso para descobrir o que é possível obter unindo essas unidades, pois são coloridas chamando a atenção dele. Ele começa a unir essas unidades sem ter uma lógica até perceber que nem toda combinação gera uma figura espacial. A figura 2 mostra a combinação das unidades que vão pavimentando ou recobrindo o plano. 488 Figura 2: Pavimentação do plano Nesse momento, é possível perceber que essa combinação, chamada de quatro por quatro (identificação do autor), não é a maneira correta de unir as peças. Daí, novas tentativas vão surgindo e, a primeira, é mostrada na figura 3. Figura 3: Primeira peça em três dimensões Vamos denotar essa combinação como sendo a três por três, pois as peças são unidas entre si sempre três a três. Estando com a peça montada, ela pode ser moldada por meio da abertura de cada uma das unidades. A figura 4 mostra a peça sendo aberta. Figura 4: Abertura das unidades da peça construída À medida que vamos abrindo as unidades, uma nova superfície vai sendo gerada. Quando o grau máximo de abertura é atingido, é possível identificar uma forma espacial bem parecida com um tetraedro, como mostra a figura 5. 489 Figura 5: Abertura máxima das unidades para obter um Tetraedro Cada unidade que compõe a figura 5, totalizando seis, representa as arestas do tetraedro. Modificando a peça da figura 5, constrói-se o balão da figura 6, que é sugerido no folheto do produto (figura 1). Figura 6: Modelo de peça no formato de um balão Assim sendo, é possível perceber a relação que existe do material manipulável com conceitos de geometria. Cada pessoa pode visualizar de uma maneira as figuras em três dimensões, o que importa é como fará uso disso para facilitar o ensino de matemática. Atividades propostas para alunos do ensino fundamental e médio Para formalizar o uso do material, dez atividades são apresentadas para uso em sala de aula. Atividade para “Inteligence Ball” 490 491 492 As atividades aqui propostas foram organizadas de acordo com o nível de dificuldade, embora as atividades nove e dez sejam classificadas como fáceis, cabendo ao professor escolher o que está de acordo com o nível de competência e habilidade dos alunos. As mesmas poderão ser aplicadas para alunos do ensino fundamental e médio, dependendo do bom senso do professor, que poderá inserir outras atividades. Utilização do quebra-cabeça em sala de aula O material foi utilizado com algumas crianças de uma quarta-série do ensino fundamental de uma escola municipal na cidade de Catanduva-SP. Nem todas as atividades propostas na seção anterior foram desenvolvidas, pois algumas exigiam competências e habilidades acima do nível das crianças. Como o tempo para ficar com as crianças foi de apenas duas aulas, poucas atividades foram desenvolvidas. Na atividade sobre criação livre, a primeira peça que as crianças montaram foi a que aparece na figura 7. 493 Figura 7: Utilização do material em sala de aula Com esclarecimentos de dúvidas da professora, as crianças com facilidade e criatividade, desenvolveram figuras diferentes como mostra a figura 8. Figura 8: Construções realizadas pelos alunos Inicialmente, as crianças ficaram encantadas com o material (figura 9), porém, assim que começaram a realizar as atividades, foram surgindo dúvidas sobre o que unir e como unir. Uma demonstração foi realizada pela professora, que apresentou algumas peças já montadas para que elas entendessem o que era pedido. Figura 9: Alunas no primeiro contato com o material 494 Foi possível perceber que as crianças entenderam o sentido do uso do material, associaram rapidamente com a geometria que já tinham visto anteriormente. De todas as atividades realizadas, a que elas mais gostaram foi a atividade 1, onde era pedido para construir a peça da figura 10 e depois esticar as unidades, modificando a figura. Figura 10: Modelo de construção da atividade 1. Outras atividades propostas anteriormente poderiam ter sido aplicadas com essas alunas da quarta série, porém, pela falta de tempo, apenas uma apresentação do material foi realizada. Essas atividades propostas podem ser aplicadas com alunos até do ensino médio, cabendo ao professor complementar com mais informações e outras atividades diversificadas de acordo com o nível de conhecimento dos alunos. Considerações finais A matemática pode ser identificada em diversos lugares, situações, objetos e até mesmo em um brinquedo. Nesse trabalho foi explorado um quebra cabeça chamado de Inteligence Ball, utilizado para obter peças em três dimensões. Atividades foram propostas para serem desenvolvidas com esse material, associando-o com conceitos da matemática, ou seja, ocorreu uma “matematização”, como já foi citado por Caldeira (2009), onde a matemática é organizada para o aluno descobrir padrões ou regularidades, fazendo com que o aluno vivencie o conteúdo de forma real. Para Rojo (2005), “Os materiais didáticos, se bem escolhidos e usados, se de qualidade e adequados ao planejamento do professor, são grandes instrumentos de apoio no processo de ensino-aprendizagem”. As Orientações Pedagógicas de Matemática da Secretaria de Educação do Paraná dão dicas do que o professor deve fazer para que ocorra o conhecimento Matemático. Para que possa ajudar seu aluno ou sua aluna a percorrer o caminho do conhecimento matemático, de forma intensa e prazerosa, é necessário que o professor ou professora tenha convicção de que estudar matemática, além de necessário, pode 495 ser uma atividade agradável e desafiadora. De outro modo, não será tarefa fácil convencer as crianças da importância de estudar matemática, nem da possibilidade de se constituir em atividade que pode ser prazerosa. Nas atividades desenvolvidas com as crianças do quarto ano, foi possível notar o interesse e satisfação em realizar tais atividades, a criança que estava mais à frente na construção ajudava as que estavam atrasadas, mostrando que ela identificou a lógica da construção e sentia prazer em ajudar. Para Melão (2005), uma maneira de tornar possível para as crianças a aprendizagem, o gosto e a valorização da matemática, é fazer com que o trabalho em sala apóie-se em uma perspectiva para o trabalho com a matemática escolar que apresente a matemática como ciência dinâmica, que se faz e se refaz continuamente, enquanto está sendo estudada, enquanto está sendo experimentada. Dessa maneira, ela passa a ser um objeto de investigação, onde é possível duvidar, questionar suas certezas e evidenciar os aspectos que ela não consegue apreender. Referências BOTAS, D. A utilização dos materiais didáticos nas aulas de matemática: um estudo no 1º Ciclo. Lisboa, 2008. Dissertação de Mestrado. Universidade de Lisboa. CALDEIRA, M. F. T. H. S. A importância dos materiais para uma aprendizagem significativa da Matemática. In Actas do X Congresso Internacional Galego Português de Psicopedagogia. Braga: Universidade do Minho, 2009. Disponível em http://www.educacion.udc.es/grupos/gipdae/documentos/congreso/xcongreso/pdfs/t7/t7 c244.pdf. Acesso em: 10 Jan. 2014. MELÃO, W. S. A Matemática Escolar como Instrumento de Educação. In: SEED Orientações Pedagógicas – Matemática: Sala de Apoio à Aprendizagem. Curitiba: SEED, 2005. ROJO, R. Materiais Didáticos: escolha e uso. Boletim 14. Salto para o futuro/ TV Escola, 2005. Disponível em http://www.tvbrasil.org.br/fotos/salto/series/151007MateriaisDidaticos.pdf. Acesso 10 Jan. 2014. 496 A COMPREENSÃO EM LEITURA E SUA INFLUÊNCIA NA RESOLUÇÃO DE EXERCÍCIOS/PROBLEMAS DE MATEMÁTICA Glauce de O.S. SILVA- IFSP- Campus Caraguatatuba-SP ([email protected]) Jaqueline LOPES - IFSP- Campus Caraguatatuba – SP ([email protected]) Mirian M. de OLIVEIRA - IFSP – Campus Caraguatatuba - SP ([email protected]) Resumo: É frequente o discurso de professores de matemática de que os alunos teriam dificuldade para resolver exercícios/problemas dessa disciplina por não compreenderem seus enunciados. Nesse sentido, investigamos a razão pela qual os alunos do ensino fundamental (sétimo ano) de uma escola da rede pública do Litoral Norte de São Paulo têm dificuldade ao interpretarem esses enunciados, buscando entender a relação entre língua materna, linguagem matemática, conceitos matemáticos e falta de atenção enquanto fatores que influenciariam na resolução de exercícios/ problemas matemáticos. Para embasarmos teoricamente nosso trabalho, utilizamos principalmente os estudos de Smole e Diniz (2001) e Machado (2011) haja vista que discutem o paralelismo nas funções que a língua materna e a linguagem matemática desempenham. Para tanto, primeiramente aplicamos um questionário para analisarmos o perfil dos alunos participantes de nossa pesquisa em relação as suas dificuldades ao tentarem resolver um exercício/problema matemático. Em seguida, foram selecionados e adaptados dois exercícios previamente trabalhados pela professora desses alunos. Após a resolução feita pelos alunos, realizamos a leitura e a correção dos exercícios selecionados e resolvidos. Aplicamos mais três exercícios/problemas para averiguarmos se a correção realizada havia sanado as dificuldades dos alunos. Por fim, analisamos três páginas do caderno de uma aluna – participante deste estudo. Após a realização de todas as etapas deste trabalho, os dados obtidos nos indicaram que a dificuldade ao resolver exercícios de Matemática não está relacionada unicamente à fluência de leitura nas aulas de Língua Portuguesa, mas também a conceitos matemáticos, à transferência da Língua Portuguesa para a linguagem matemática, bem como à falta de atenção no decorrer da leitura e da resolução dos exercícios. Palavras-chave: Educação exercícios/problemas. Matemática; Língua Materna; resolução de 497 Introdução Quantas vezes não ouvimos nas aulas de matemática que é uma disciplina difícil e que o enunciado dos exercícios é confuso, ou seja, por meio dele os alunos nem sempre conseguem visualizar a resolução desses exercícios. Segundo Smole e Diniz (2001, p. 69), os professores dessa disciplina comumente acreditam que os alunos têm dificuldade em interpretar o enunciado de exercícios e problemas por não praticarem muito a leitura. Além disso, afirmam que não é rara a crença de que se o aluno fosse mais fluente em leitura na língua materna, também seria melhor leitor nas aulas de matemática. Conforme Machado (2011, p.95), existe um paralelismo nas funções que a Língua Materna e a Linguagem Matemática desempenham, dificultando “ações pedagógicas consistentes” ao considerarmos apenas uma das duas disciplinas já que há uma imbricação nas questões relativas ao ensino de ambas. Kleiman (2012, p. 39), enfatiza que a interdisciplinaridade de um assunto não significa que o professor de Português se tornará um professor de outra disciplina, apenas, mas significa também que o professor de outra disciplina também se torne mais um professor de leitura. De acordo com São Paulo (2008, p. 17), a proficiência leitora e escritora têm “como base o desenvolvimento do pensamento antecipatório, combinatório e probabilístico que permite estabelecer hipóteses, algo que caracteriza o período da adolescência”. Segundo Paez e Sousa (2011), isso garante o domínio e a compreensão de diferentes linguagens, bem como o desenvolvimento da capacidade de comunicação e representação das crianças e expressão dos adolescentes [...] Conforme essas autoras, A articulação da matemática com a língua materna é percebida a todo momento, principalmente quanto ao desenvolvimento das proficiências, pois sem a língua materna a matemática por si só não teria como ser comunicada, além da contribuição que a matemática dá ao desenvolvimento do raciocínio, argumentação e abstração. Considerando que a leitura tem seu alicerce na capacidade humana de compreensão e interpretação do mundo, é importante que tornemos nossos alunos em leitores competentes (SMOLE E DINIZ, 2001, P. 70). Ainda de acordo com essas autoras, existem na matemática “termos e sinais específicos”, assim como uma 498 organização de escrita diferente daquela utilizada nos textos de língua materna, exigindo um processo específico de leitura. No entanto, não são somente a dificuldade de leitura (SMOLE E DINIZ, 2001, p.69) e a relação entre língua Portuguesa e linguagem matemática que permeiam as dificuldades que alunos têm ao tentarem resolver um exercício de matemática. Nesse sentido, buscamos investigar as razões da dificuldade de compreensão do enunciado, buscando entender a relação entre língua materna, linguagem matemática, conceitos matemáticos e falta de atenção enquanto fatores que influenciariam na resolução de exercícios matemáticos. Além disso, o tipo de exercício ou problema que o professor trabalha em sala de aula também é fundamental para orientar os alunos na interpretação dos enunciados a fim de que os discentes consigam associar o texto ao conceito matemático necessário para a resolução daqueles. Língua materna e Matemática A comunicação é importante para o ensino - aprendizagem de qualquer disciplina. Cândido (2001, p. 15) afirma que [...] “é através dos recursos de comunicação que as informações, os conceitos e as representações são veiculadas entre as pessoas”, assim, aprender matemática requer que haja comunicação. Nesse sentido, Machado (1995, apud CÂNDIDO, 2001, p. 17) acredita que a Matemática empresta da língua materna a oralidade e os significados das palavras que dão suporte à troca de informações. Por isso, conforme Cândido (2001), é possível atribuir à nossa língua “dois papéis em relação à matemática”: primeiro, é na língua materna que lemos os enunciados bem como são feitos comentários, permitindo que ouçamos e leiamos de maneira precisa e aproximada; segundo, ela é “parcialmente aplicada” na matemática, uma vez que “os elos de raciocínio matemático apóiam-se na língua, em sua organização sintática e em seu poder dedutivo”. De acordo com Machado (2011), “a Matemática e a Língua Materna representam elementos fundamentais e complementares [...] mas que não podem ser plenamente compreendidos quando considerados de maneira isolada”. São Paulo (2010, p. 30) orienta que, nos currículos, em parceria com a língua materna, a Matemática deve se caracterizar como recurso necessário para o 499 desenvolvimento eficaz da expressão, compreensão, argumentação e contextualização dos conteúdos estudados. A ligação entre língua materna e matemática se constitui, dentre outros, na prática de leitura, uma vez que os enunciados de exercícios e problemas matemáticos precisam ser interpretados e compreendidos para que sejam resolvidos. Considerando que a leitura tem seu alicerce na capacidade humana de compreensão e interpretação do mundo, é importante que tornemos nossos alunos em leitores competentes (SMOLE E DINIZ, 2001, P. 70). Ainda conforme essas autoras existem na matemática “termos e sinais específicos”, assim como uma organização de escrita diferente daquela utilizada nos textos de língua materna, exigindo um processo específico de leitura. Vieira (2000, p.30 apud LORENSATTI, 2011) afirma que é essencial ao longo da resolução de problemas com enunciados em língua materna a atividade de compreensão destes. Entretanto, observa-se “pouca aproximação entre a compreensão de textos proposta nas aulas de Língua Portuguesa e a atividade de resolução de problemas nas aulas de Matemática”. Dar oportunidade ao aluno para praticar a compreensão do enunciado de problemas o auxiliará a resolvê-los e ampliar inferências e conexões lógicas (LORENSATTI, 2011, p. 16). Exercícios e problemas matemáticos É relevante discutirmos a diferença entre exercício e problema, mesmo que brevemente, pois a forma como os conceitos matemáticos são praticados também influenciam no acerto ou erro da resolução de exercícios e/ou problemas. De acordo com Lorensatti (2011), exercício e problema, no contexto escolar, diferem por que aquele não exige o estabelecimento de relações entre o conhecimento e o que se quer conhecer que este exige. Dante (1994, apud LORENSATTI, 2011) considera os exercícios como um tipo de problema e os define enquanto aqueles os quais requerem “somente o reconhecimento de conceitos ou de um fato específico” ou, até mesmo, o uso de algoritmos já estudados, objetivando “desenvolver habilidades na execução de procedimentos ou no reforço de conhecimentos anteriores”. 500 Conforme Lorensatti (op. cit.), o exercício é utilizado para praticar algo já conhecido, enquanto o problema exige reflexão e tomada de decisões. Ainda segundo essa autora, existem os problemas - padrão, encontrados no final de capítulos de livros didáticos, os quais conduzem à solução. Nesses problemas, depois de transformar a língua materna em linguagem matemática, os alunos precisam identificar as operações adequadas para resolvê-los (p. 25). Segundo Brasil (1998, p. 41), um problema matemático é uma situação que requer uma solução ou uma demonstração que não estão disponíveis de início, mas que são possíveis de construção. Enfim, neste artigo, consideramos exercícios como recursos utilizados para o reconhecimento e fixação de conceitos estudados, e problemas enquanto aqueles que necessitam de reflexão, construção e tomada de decisão. Metodologia Como objetivávamos investigar a razão pela qual alunos do ensino fundamental de uma escola da rede pública do Litoral Norte do Estado de São Paulo tinham dificuldade ao interpretar o enunciado de exercícios de matemática, optamos por um estudo de cunho quantitativo - qualitativo já que este se caracteriza pela quantificação, interpretação e descrição da dificuldade de discentes acerca da resolução de exercícios de matemática. Para tanto, coletamos os dados em uma escola estadual de uma cidade do litoral norte de São Paulo onde duas bolsistas do programa da Capes intitulado de Pibid (Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência) atuam. Participaram da pesquisa aproximadamente 108 alunos (quatro turmas) os quais estavam cursando o sétimo ano do ensino fundamental no ano de 2013. Foram utilizados como instrumentos de coleta de dados um questionário sondagem (Anexo A) para analisarmos o perfil dos alunos - participantes de nossa pesquisa em relação as suas dificuldades ao tentarem resolver um exercício matemático. Em seguida, foram selecionados e adaptados dois exercícios (Anexo B) previamente trabalhados pela professora desses alunos os quais requeriam que estes, para resolvê-los, conseguissem fazer a transferência correta da língua materna para a linguagem matemática e, ainda, para uma melhor compreensão das dificuldades desses alunos, solicitamos que eles marcassem se a resolução para tais exercícios eram de nível fácil, médio ou difícil. 501 Após a realização da segunda etapa, as bolsistas e a professora orientadora do projeto foram até o ambiente escolar e fizeram a leitura e correção dos exercícios com os alunos. Além disso, durante a correção, foi possível identificar quais dúvidas ainda eram frequentes e oralmente, foram feitos os esclarecimentos necessários. Toda a correção foi gravada em áudio (mp3). Na quarta etapa do estudo, elaboramos mais três questões (Anexo C) para comprovarmos se os educandos haviam sanado suas dúvidas a respeito de vocabulário e do conceito matemático envolvido para as resoluções. Por último, analisamos algumas páginas do caderno de uma aluna – participante da pesquisa para verificarmos como a professora trabalhava os conceitos matemáticos, ou seja, se ela utilizava exercícios e/ou problemas matemáticos. Resultados A fim de analisarmos o que os alunos - participantes de nosso trabalho pensavam em relação as suas dificuldades ao tentarem resolver um exercício matemático, utilizamos as respostas desses alunos ao questionário sondagem (Anexo A). Para tal, utilizamos as respostas à questão número um e obtivemos o seguinte gráfico: Gráfico 1 – Dificuldades dos alunos na resolução de exercícios matemáticos Esse gráfico demonstra que 49,55% dos alunos já informam que sua maior dificuldade está em saber qual conceito matemático devem empregar para a resolução de um determinado exercício. Demonstra também que 32,42% dos participantes do estudo geralmente não conseguem entender o que foi solicitado no exercício, impossibilitando sua resolução. E ainda 16,22% desses alunos afirmam que sua dificuldade está relacionada a esses dois fatores, ou seja, o nível de dificuldade é ainda maior para estes. 502 Ressaltamos que dois alunos responderam diferentemente das opções que estavam contidas no questionário, escreveram para a questão um que não tinham nenhuma dificuldade, por isso, foi acrescentado ao gráfico a opção outros, totalizando 1,80%. Já a questão 2 (Anexo A), é representada pelo seguinte gráfico: Gráfico 2 – Causa dos erros na resolução de exercícios matemáticos Como podemos observar, apresenta como principal causa do erro a falta de atenção no momento da resolução, ou seja, 39,64% dos alunos pesquisados. Já 36,94% desses estudantes informam que o principal gerador de erro é a dificuldade na leitura e compreensão das questões, enquanto, os outros 22,52% apresentam novamente como erro a falta de atenção, mas dessa vez, relacionada à leitura do exercício. Ressaltamos novamente que um aluno respondeu diferentemente das opções que estavam contidas no questionário, escrevendo para a questão um que não tinha nenhuma dificuldade, por isso, foi acrescentado ao gráfico a opção outros, totalizando 0,90%. Todos esses fatores dificultam a resolução de um exercício matemático. A terceira questão (Anexo A) indagava acerca da capacidade dos alunos em ler, interpretar e resolver exercícios de matemática sozinhos: 503 Gráfico 3 – Autonomia na resolução de exercícios matemáticos Obtivemos como resposta que 27,03% desses alunos conseguem ler, interpretar e resolver os exercícios, 71,17% às vezes conseguem, 0,90% disseram que não conseguem e 0,90% nunca conseguem. Com o objetivo de identificarmos a quais tipos de dificuldades estavam relacionados os erros dos alunos, utilizamos a resolução de dois exercícios matemáticos (Anexo B) aplicados nas quatro turmas de sétimos anos. Para tanto, o enunciado da primeira questão foi redigido na língua materna, e este procurava favorecer a compreensão do aluno, dessa forma sua linguagem era próxima àquela do aluno, evitando assim dúvidas e uma resolução errônea do exercício solicitado. O enunciado da segunda questão foi redigido somente na linguagem matemática, ou seja, uma expressão numérica, pois, segundo Smole e Diniz (2001), o objetivo da criação desse tipo de exercício é induzir que os alunos percebam como a pergunta de um problema está relacionada aos dados do problema e ao texto. As respostas dos alunos a essas duas questões estão representadas pelo seguinte gráfico: Gráfico 4 – Erros e acertos para as questões (Anexo B) Erraram a questão um (1), do segundo instrumento de coleta, 54,63 % dos alunos, e 45,37% dos alunos que conseguiram fazer a transição correta da Língua Portuguesa para a linguagem matemática, usando ainda os conceitos matemáticos necessários para a resolução do exercício. Já para a questão dois (2), 53,7% dos alunos erraram a resolução da expressão numérica, ou seja, o problema não estava somente 504 relacionado à leitura de exercícios matemáticos, uma vez que, mesmo utilizando somente uma expressão numérica, tivemos altos índices de erros. A partir desses resultados, fomos à escola fazer a correção dos exercícios com os alunos, pois [...]“é possível conduzir uma discussão com toda a classe para socializar as leituras, as dúvidas e as compreensões. Mais uma vez, não se trata de resolver o problema oralmente, mas de garantir meios para que todos os alunos possam iniciar a resolução do problema sem, pelo menos, ter dúvidas quanto ao significado das palavras que nele aparecem. Assim se houver um dado do problema ou um termo que seja indispensável e que os alunos não conheçam ou não saibam ler, principalmente no início do ano, o professor deve revelar seu significado e proceder à leitura correta. (SMOLE E DINIZ, 2001, p.73-74). Para comprovarmos se os educandos sanaram suas dúvidas acerca de vocabulário (língua materna) e do conceito matemático envolvidos nas resoluções dos exercícios, aplicamos três questões (Anexo C) nas quatro turmas de sétimos anos. O enunciado da questão um utilizava a língua materna e também a linguagem matemática e tinha a estrutura de um extrato bancário. Baseados nas respostas à questão um (Anexo C), classificamos os tipos de erros dos alunos: Gráfico 5 – Dificuldades dos alunos na resolução da questão 1. a Observando o gráfico, notamos que, para a alternativa “a” da primeira questão, 49,38% dos erros foi devido à falta de atenção dos alunos no momento da resolução dos 505 exercícios; 35,80% ainda não dominavam o conceito matemático necessário; 12,35% dos alunos não tinham o domínio das operações básicas da matemática, por isso não conseguiram fazer o exercício e apenas 2,47% não souberam transferir o enunciado para a linguagem matemática. Foram analisadas as respostas dos alunos à questão dois (2), do terceiro instrumento de coleta de dados. Ao classificarmos os erros para essa questão, temos: Gráfico 6 – Dificuldades dos alunos na resolução da questão 2 Erraram a questão dois (2), por falta de atenção, 53,57% dos alunos, 41,07% ainda não se apropriaram do conceito matemático necessário para a resolução dos exercícios e 5,36% desses alunos não têm o domínio das operações básicas. Analisamos a terceira questão (Anexo C) e classificando seus tipos de erros, obtivemos: Gráfico 7 – Dificuldades dos alunos na resolução da questão 3 A maior parte, ou seja, 52% dos alunos que erraram, foi por ainda não dominarem o conceito matemático necessário para a resolução dos exercícios; já 38% desses alunos apresentaram a falta de atenção como causa do erro; 6% não possuíam o 506 domínio das operações básicas que são necessárias para desenvolver o exercício e 4% não souberam fazer a transcrição da língua materna para a linguagem matemática, para que continuassem a resolução. Após analisarmos as respostas dos alunos às diferentes questões, verificamos a relação do modo como a professora dos sétimos anos exercitava com seus alunos os conceitos matemáticos estudados em sala de aula, com os resultados dos questionários (Anexos A, B e C). Observamos que, por não trabalhar a leitura e interpretação de enunciados em língua materna, já que, geralmente utilizava exercícios e não problemas,justificaria a dificuldade dos alunos em compreender os enunciados das questões por nós propostas ao longo do estudo, assim como problemas com conceitos matemáticos e com a transferência da língua materna para a linguagem matemática. Para Duval (1995 apud FEIO 2008), “a compreensão em Matemática implica que um sujeito deve ter de mudar de registros o mais naturalmente possível [...] Porém, essa passagem de um registro representação a outro não tem nada de espontâneo para a maioria dos alunos” [...] Além disso, segundo Smole e Diniz (2001, p. 85 e 86), as atividades de comunicação precisam propiciar uma aprendizagem significativa, uma vez que ao lerem com seus alunos, os professores podem observar a aprendizagem deles. Quando surgir qualquer dificuldade, o docente pode refletir se o que o aluno não entendeu foi o texto ou o conceito necessário para a resolução do problema proposto. Por meio dos dados coletados, podemos concluir que o discurso de professores e alunos de que estes têm dificuldade ao interpretar o enunciado de exercícios de Matemática não está relacionada unicamente à Língua Materna (SMOLE E DINIZ, 2001, p. 69), mas também a conceitos, à transferência da Língua Portuguesa para a linguagem matemática, bem como à falta de atenção na leitura e resolução dos exercícios. Considerações Finais Objetivávamos investigar a razão pela qual alunos do ensino fundamental de uma escola da rede pública do Litoral Norte do Estado de São Paulo tinham dificuldade ao interpretar o enunciado de exercícios de matemática, Por meio da análise dos dados, pudemos concluir que os alunos – participantes desta pesquisa apresentaram dificuldades em relação à leitura e à interpretação dos 507 enunciados; dúvidas acerca de conceitos matemáticos estudados em sala de aula; problemas na transferência da língua materna para a linguagem matemática, assim como falta de atenção ao resolverem os exercícios. É importante ressaltar que as páginas do caderno de uma das alunas participantes deste estudo indicam que, a professora responsável pelo ensino de Matemática nos sétimos anos, utilizava, geralmente, exercícios para a prática dos conceitos estudados em sala de aula. Isso demonstra que a leitura de enunciados não era trabalhada, pois reiteramos que consideramos exercícios como recursos utilizados para o reconhecimento e fixação de conteúdos vistos. Em vista disso, ressaltamos que é necessário que a relação entre língua materna, no nosso caso, a Língua Portuguesa, e a linguagem matemática seja trabalhada na aula de Matemática, ou seja, que o professor oriente o aluno ao longo do processo de interpretação e transformação do enunciado em uma sentença matemática, facilitando a resolução dos exercícios propostos em sala de aula. Referências Bibliográficas BRASIL. Secretaria da Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: Matemática - Terceiro e Quarto Ciclo do Ensino Fundamental. Secretaria da Educação Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1998. CÂNDIDO, Patrícia T. Comunicação em Matemática. In: SMOLE, Kátia Stocco; DINIZ, Maria Ignez. (Orgs.) Ler, escrever e resolver problemas: habilidades básicas para aprender matemática. Porto Alegre: Artmed, 2001. SMOLE, Kátia Stocco; DINIZ, Maria Ignez. Ler e aprender Matemática. In: SMOLE, Kátia Stocco; DINIZ, Maria Ignez. (Orgs.) Ler, escrever e resolver problemas: habilidades básicas para aprender matemática. Porto Alegre: Artmed, 2001. FEIO, Evandro dos S. Paiva. SILVEIRA, M. R. A. A conversão da língua natural para a linguagem matemática à luz da teoria dos registros de representação semiótica. In: Sexto encontro paraense de Educação Matemática. Anais. Belém. 2008 (CD ROM). 508 KLEIMAN, Angela. Oficina de Leitura: Teoria e prática. 14a ed. Campinas: Pontes, 2012. LORENSATTI, Edi Jussara Candido. Educação e Linguagem: os mecanismos coesivos na compreensão de problemas de aritmética. 2011. 123f. Dissertação (Mestrado em Educação). Centro de Filosofia e Educação, Universidade de Caxias do Sul, Caxias do Sul – RS. 2011. MACHADO, Nilson José. Matemática e Língua Materna: análise de uma impregnação mútua. 6ª ed. São Paulo: Cortez, 2011. PAEZ, Gisele Romano; DE SOUSA, Maria do Carmo. A PROPOSTA CURRICULAR DE MATEMÁTICA DE 2008 DO ESTADO DE SÃO PAULO E SUA RELAÇÃO COM A LEITURA E ESCRITA. Disponível em: <https://sites.google.com/site/observatoriodaeducacaoufscar/eventos/iii-enrede/6-trabalhoscompletos>. Acesso em: 02 de fevereiro de 2013. SÃO PAULO (ESTADO). Secretaria da Educação. Currículo do Estado de São Paulo: Matemática e suas tecnologias/Secretaria da Educação; coordenação geral, Maria Inês Fini; coordenação de área, Luis Carlos de Menezes. – São Paulo: SEE, 2008. 59p. SÃO PAULO (ESTADO). Secretaria da Educação. Currículo do Estado de São Paulo: Matemática e suas tecnologias/Secretaria da Educação; coordenação geral, Maria Inês Fini; coordenação de área, Nilson José Machado. – São Paulo: SEE, 2010. 72p. 509 ANEXOS ANEXO A – Questionário sobre as percepções dos alunos – participantes da pesquisa sobre suas dificuldades ao resolverem um exercício matemático Nome: _________________________________________________ turma: ________________ 1-Quando você lê um exercício de matemática, qual a maior dificuldade que encontra para resolvê-lo? a) entender o que foi pedido no exercício; b) saber que conceitos matemáticos usar; c) as duas alternativas anteriores. 2-Você acha que seus erros nos exercícios de matemática são devido à: a) dificuldade na leitura e na compreensão das questões; b) falta de atenção na leitura do exercício; c) falta de atenção na hora da resolução. 3-Você consegue ler, interpretar e resolver sozinho os exercícios de matemática? a) sim; b) não; c) ás vezes; d) nunca. 510 ANEXO B – Questões para avaliar as dificuldades dos participantes do estudo ao resolverem um exercício e/ou problema matemático 1) Marlene , no dia 12 de março, tinha em sua conta R$ 200,00. Neste mesmo dia ela pagou a academia de seu filho com um cheque no valor de R$ 75,00. Passando em frente à uma loja, ela decidiu comprar uma bolsa para presentear uma aluna e gastou R$ 120,00. No dia 14 de março, ela recebeu um depósito de R$70,00 de seu marido e no dia 15 de março ela comprou sapatos e gastou R$ 340,00. Neste mesmo dia ela recebeu R$ 500,00 de presente do seu marido, qual era o saldo da conta da Marlene no dia 16 de março? 2) Calcule a expressão: 200 – 75 – 120 + 70 – 340 + 500= Assinale abaixo qual foi sua dificuldade para responder as questões: Questão 1 Questão 2 a) Fácil a) Fácil b) Médio b) Médio c) Difícil c) Difícil 511 ANEXO C- Questões para avaliar as dificuldades dos participantes do estudo ao resolverem um exercício e/ou matemático, após correção das questões do anexo B 512 EDUCAÇÃO FINANCEIRA: ANALISANDO OS CONHECIMENTOS DE ALUNOS DO PRIMEIRO ANO DO ENSINO MÉDIO Luciene dos S. Silva – IFSP-SP ([email protected]) Luis Américo Monteiro Junior- IFSP-SP ([email protected]) Resumo: Este artigo tem por objetivo divulgar os resultados da pesquisa de iniciação científica sobre o conhecimento financeiro dos alunos do primeiro ano do Ensino Médio de duas escolas públicas de Caraguatatuba-SP. Esta análise foi realizada por meio de questionário abordando conteúdos de matemática e educação financeira, a fim de identificar as dificuldades dos alunos. A Matemática Financeira está presente em várias atividades que as pessoas realizam e é uma ferramenta fundamental que nos auxilia no processo de tomada de decisão Maroni (2011). Nas escolas, a cantina é um bom exemplo, muitos alunos recebem certa quantia para gastar na escola, neste ambiente é necessário tomar simples decisões financeiras, como por exemplo, se há algum alimento em promoção levando o jovem a pensar no que é mais vantajoso. De acordo com Mandell e Klein (2009) pesquisas feitas entre 1964 e 1983 e posteriormente de 2000 a 2008 com alunos do ensino médio nos Estados Unidos mostraram que alunos do primeiro período poupavam mais, isto devido à inexistência do crédito fácil, hoje isso é completamente diferente, o que resultou no aumento da inadimplência e que pode ser verificado, também, no Brasil entre os adultos. O mercado esta inovando constantemente, a tecnologia esta avançando cada vez mais, isto faz com que muitos jovens vão ás compras, gastando além do que podem, gerando dívidas, por isso vimos à importância do planejamento financeiro já dentro das escolas. Assim, após a análise dos questionários, foi desenvolvida e aplicada uma palestra com alunos das duas escolas públicas a fim de promover no aluno habilidades e competências de analisar e avaliar, criticamente, as situações financeiras que se apresentam em sua vida. Palavras-chave: Educação Financeira, Ensino Médio, Matemática Financeira. 513 INTRODUÇÃO Este artigo apresenta uma discussão sobre a importância da Educação Financeira para adolescentes, em particular, estudante do primeiro ano do Ensino Médio da rede pública. Foram sorteadas duas turmas de cada escola pesquisada devido ao tempo disponível para realizar a pesquisa. Em um primeiro momento fizemos um levantamento bibliográfico sobre o assunto, uma pesquisa sobre a forma como o assunto vem sendo tratado nas escolas e aplicamos um questionário aos alunos das duas escolas para identificar as dificuldades relacionadas à Matemática Financeira. Em seguida, com base na análise das respostas apresentadas nos questionários, foi proposta uma palestra para abordar o tema a fim de facilitar o entendimento de aspectos financeiros que possam contribuir para o dia-dia da vida adulta, auxiliando na formação de uma cultura poupadora e crítica, capaz de tomar decisões com base em argumentos financeiros sólidos. Segundo os PCNs os temas relativos à Matemática Financeira devem ser inicialmente abordados já no 4º ano do ensino fundamental I, os conceitos mais elaborados são tratados no 7º ano do ensino fundamental II através de razão, proporção e porcentagem. A ideia deste projeto surgiu por meio de pesquisas e notícias na área financeira, que mostram altos índices quando se trata do endividamento de famílias, em cheque pré-datado, cartões de crédito, carnês de lojas, empréstimos pessoal, prestações de carro e seguros. A ausência do planejamento financeiro na vida das pessoas resulta no excesso de dívidas e para evitar isso resolvemos levar a educação financeira para as escolas, ensinando desde cedo como organizar suas finanças, para quando adultos não entrarem nessa armadilha que são as dívidas. EDUCAÇÃO FINANCEIRA A Educação Financeira é fundamental na vida do cidadão. Maroni (2011, p.18) apresenta vários fatores que podem influenciar na educação financeira tais como: 514 - orientação familiar; - formação religiosa; - experiência de vida; - educação escolar básica; - curso superior de Administração, Contabilidade ou Economia; - leituras especializadas; - cursos específicos. Dentre os vários fatores citados pelo autor, neste trabalho destacamos “a educação escolar básica” que também foi observado por Rosetti e Schimeguel (2009, p.5): [..] a introdução ao estudo da Matemática Comercial e Financeira é importante a partir do Ensino Fundamental, no Ensino Médio e no Ensino Técnico, para promover no aluno as habilidades e competências de analise e avaliar, criticamente, as situações financeiras que se apresentam em sua vida. É por meio de coisas simples que se inicia a educação financeira, no cotidiano escolar encontramos a presença alguns fatores econômicos como a cantina, possibilitando o planejamento financeiro, para que possam ter sempre o controle de suas finanças tornando-se capazes de administrar suas próprias vidas financeiras. Segundo os autores acima, a educação financeira é de suma importância na Educação Básica e Técnica sua falta pode gerar consequências para a formação financeira do aluno. Savoia, Saito e Santana (2007), comentam sobre a falta de conhecimento financeiro por parte dos indivíduos, resultando em dívidas e dificuldades financeiras na vida adulta. PLANEJAMENTO FINANCEIRO Os problemas financeiros estão presentes em grande parte de nossa vida. Em um momento ou outro acabamos nos defrontando com uma questão básica: Como administrar meu dinheiro? Quando criança este recurso pode vir de uma mesada ou de um presente de aniversário ou mesmo de um pequeno serviço prestado já quando adulto 515 vem de seu salário, investimentos, etc. Hoje nos defrontamos com um mundo cada vez mais consumista e pouco preocupado com o planejamento financeiro. Segundo Cerbasi (2003, Pag.57): Muitas de nossas compras são feitas por impulso, e isso já foi comprovado por diversos estudos. Segundo pesquisa realizada pelo PROVAR (Programa de Varejo da Fundação Instituto de Administração – FIA/USP) em 2002, apenas 20% das pessoas afirmam que não compram além do que haviam planejado em supermercados. Em outras palavras, 80% das pessoas admitem comprar por impulso. Essa estatística é impressionante. Saber administrar seus recursos em qualquer etapa da vida se torna muito importante pelo fato de que esses recursos podem ser finitos. DINÂMICA APLICADA No inicio houve uma palestra que foi apresentada em duas escolas estaduais de Caraguatatuba onde foram abordadas as diferenças entre a matemática financeira e a educação financeira. No primeiro momento foram apresentados conceitos da matemática financeira como porcentagem, juros simples e compostos de acordo com Veras (2008), depois algumas definições e dicas sobre educação financeira: como fazer um planejamento financeiro e como diferenciar desejos de necessidades na hora da compra. Na sequência trabalhamos Desejos X Necessidades de acordo com a Oficina das Finanças, Ligocki & Iunes (2013, p. 17). Entre todas as coisas que podemos comprar e fazer, algumas são DESEJOS, e outras são NECESSIDADES. Nem sempre uma necessidade para uma pessoa, pode ser para outra e ás vezes o que é um desejo para alguém pode ser uma necessidade para outro. Uma pessoa pode precisar de um computador, mas ela também pode querer que esse computador seja superpotente com o melhor design e menor peso. Neste caso, o computador todo incrementado representa uma necessidade ou um desejo? Se ela for 516 transportá-lo diariamente, o peso pode ser um fator importante na decisão de compra, mas se ele vai ficar parado, talvez o peso não seja. Avaliar os desejos e as necessidades que se tem ao longo da vida, percebendo a diferença entre eles, é fundamental para fazer escolhas conscientes e aproveitar oportunidades. Posteriormente vimos “dicas” sobre “Como Aprender a Poupar” de acordo com Oficina Das Finanças, Ligocki & Iunes (2013, P. 37). Saber não gastar todo o dinheiro que você ganha, saber poupar e acumular uma parte permitirá que você amplie sua capacidade de realização para que possa ter mais opções na vida. Essas reservas possibilitam mais autonomia e alternativas. Consumir é muito bom, poder comprar coisas que geram conforto, tranquilidade e segurança são maravilhosos, por isso devemos aprender a: Distinguir o que é uma necessidade de um desejo na nossa vida; Definir nossos objetivos, e saber o que queremos realizar e construir; Valorizar cada nota e moeda, evitar desperdícios; Aprender que esperar para realizar sonhos maiores pode ser mais vantajoso do que realizar pequenas coisas o tempo todo; Saber que o dinheiro pode realizar mais coisas do que apenas oportunidades de consumo; Aprender a planejar objetivos a longo prazo para garantir uma aposentadoria de qualidade. Para ilustrar a questão do planejamento apresentamos o quadro a seguir aos alunos criando uma personagem fictícia Luisa e a sua estratégia para atingir algumas metas e, em seguida, discutimos as ideias de Luisa e propomos aos alunos que montassem o seu próprio planejamento (tarefa de casa). 517 Meta Final Meta Mensal Receita R$ 100,00 Despesas R$ 45,00 Mês 1 Mês 2 Mês 3 Mês 4 Meta mensal Mês 5 Modificada Viagem R$ 80,00 R$ 20,00 R$ 20,00 R$ 40,12 R$ 60,36 R$ 80,72 R$ 0,00 Curso R$ 40,00 R$ 10,00 R$ 10,00 R$ 20,06 R$ 30,18 R$ 40,36 R$ 0,00 R$ 230,00 R$ 20,00 R$ 20,00 R$ 40,12 R$ 60,36 R$ 80,72 R$ 50,00 R$ 131,20 R$ 5,00 R$ 5,00 R$ 10,03 R$ 15,09 R$ 20,18 R$ 6,00 R$ 26,00 Celular novo Extras Percebemos então que ter um planejamento de suas finanças é essencial, pois facilita o controle e abre caminhos para novos investimentos, proporcionando uma nova forma de viver financeiramente. É possível ter tudo o que se quer dentro de suas possibilidades, basta analisar suas finanças, fazendo ajustes no decorrer dos meses, poupando mais quando possível, para então alcançar seu objetivo, seja ele de consumo ou de uma futura aposentadoria. Tendo determinado o que deve ou não comprar, vamos pra a próxima etapa que é a de poupar, se você já está se adequando a nova forma de viver financeiramente, então já pode começar a separar certa quantia para aplicar em rendas fixas, neste caso me refiro à poupança, que é uma forma mais segura de se iniciar uma aplicação financeira. A próxima etapa da palestra é composta por uma atividade que foi realizada em grupos de até 4 pessoas, cada grupo recebeu uma tabela com produtos de supermercado, na qual tinham R$300,00 para gastar, comprando apenas aquilo que for necessário, para isso vamos contar como é a vida financeira da família fictícia que escolhemos. A Família Lopes é composta por 4 integrantes, o pai Alfredo a mão Cida e os dois filhos Gustavo e Eduardo, essa família terá que fazer compras no supermercado, mas ela possui R$ 300,00 para comprar apenas o necessário para se manter por 15 dias. Eles gastam dinheiro com coisas desnecessárias, por este motivo os alunos fizeram as compras pela família Lopes. Foi entregue para cada grupo uma tabela com produtos de supermercado (quantidades e preços) e cabe ao grupo selecionar a quantidade certa de alimentos, para o café da manhã, almoço e para o jantar, na qual anotaram os produtos 518 que foram comprados, lembrando que eles poderiam gastar no máximo R$ 300,00. Foi entregue á cada grupo uma tabela com os alimentos que devem conter na compra e as quantidades mínimas e máximas de cada item, norteando-os em relação às quantidades. No final houve uma premiação ao grupo que mais se aproximasse da tabela padrão elaborada a partir dos dados do IBGE que apresentam o consumo diário, em gramas, de um adulto. Essa atividade teve por objetivo analisar se os alunos conseguiram diferenciar desejo de necessidades, comprando apenas aquilo que a família necessita e já os direcionando para a vida adulta, quando terão que tomar decisões financeiras simples como as compras em um supermercado. Na sequência foram apresentados dois vídeos, o primeiro apresentou noções de como se preparar para aposentadoria. Este vídeo apresentou a ideia de poupar para aposentadoria e a reflexão sobre determinadas atitudes financeiras. O vídeo mostrou a vida de José Q Brou que se aposentou e recebeu um bom dinheiro e não soube administrar bem seus recursos financeiros, depois de ter recebido um grande golpe financeiro passou a ser mais esperto e aprendeu mais sobre finanças pessoais. O segundo vídeo, mostrou 5 dicas sobre como evitar o endividamento Leôncio (2012, p.199) são elas: -Dicas sobre educação financeira: (1) Domine a regra dos 30 dias (2) Faça uma lista de compras e atenha-se á ela (3) Não gaste dinheiro somente para se desestressar (4) Compare preços e vá ao mercado mais barato (5) Leia mais Essas 5 dicas já deve em um primeiro momento suprir as necessidades encontradas sobre educação financeira, se seguidas corretamente veremos uma grande mudança tanto financeira quanto intelectual. Por isso volto á dizer, só que agora diante da afirmação do autor Leôncio (2012, p.41): “Uma das partes mais importantes do processo de educação financeira é aprender diferenciar o que quer do que se precisa”. Para finalizar, fizemos um contraponto de matemática financeira e educação financeira, focando em suas diferenças, enquanto uma mostra através de contas e fórmulas como o dinheiro cresce baseado nos juros a outra nos mostra como controlar as finanças pessoais, orientando o melhor caminho a ser percorrido. 519 RESULTADOS OBTIDOS Inicialmente foi realizado um levantamento bibliográfico, seguido pela criação de um questionário que foi direcionado para duas escolas (estudo de caso), dentre essas foram sorteadas duas turmas do 1º ano do ensino médio, havendo no final da pesquisa 4 turmas num total de 87 entrevistados. Antes de aplicar o questionário 1 (anexo) nas duas escolas, realizou-se um préteste para experimentar e realizar os últimos ajustes nos alunos dos cursos técnicos do IFSP-Caraguatatuba (Informática e de Comércio), pois eles possuem um perfil semelhante aos alunos que foram pesquisados. Dentre as questões problema de matemática financeira os alunos apresentaram maior dificuldade na questão de juros compostos. Depois de ter aplicado como um pré teste o questionário para o Integrado, fomos para as duas escolas estaduais. A escola A é localizada próximo ao centro e a escola B localizada na periferia de Caraguatatuba-SP. Apresentamos a seguir os principais resultados observados com a aplicação do questionário 1 (diagnóstico sobre conhecimentos financeiros) nas escolas A e B (dados agrupados). Procuramos, neste momento, traçar um paralelo entre as duas escolas. Questão 5 – Questão sobre porcentagem. Nesta questão foi proposto ao aluno que resolvesse um problema “simples” sobre porcentagem. Apenas 33% dos alunos acertaram, enquanto que 45% erraram e 22% sequer tentaram resolver a questão. Isso mostra que grande parte dos alunos da 520 escola A e B estão tendo sérias dificuldades. Nesta questão esperávamos que a grande maioria dos alunos acertasse. Questão 6 – Questão sobre juros simples. Nesta questão apenas 2% dos alunos acertaram. Muitos não tentaram resolver o problema já 44% dos alunos tentaram mais erraram. Questão 7 – Questão sobre juros compostos. Ninguém acertou essa questão nas duas escolas e 37 % dos alunos tentaram resolver enquanto que 63% dos alunos sequer tentou resolver a questão. 521 Percebemos que grande parte dos alunos não conseguiu diferenciar juros simples de juros compostos na resolução do problema. Questão 13 – Como você pretende administrar seu dinheiro a partir do momento que conseguir um emprego? Esta questão foi aberta. O aluno pode se expressar livremente. Neste item pudemos observar que 82% dos alunos demonstram algum interesse financeiro enquanto que 18% dos alunos se mostraram apáticos ao tema. Após a aplicação, tabulação e análise dos dados obtidos com o questionário 1 foi elaborada e aplicada uma palestra que teve por objetivo suprir as dificuldades encontradas em relação à matemática financeira e orientá-los sobre finanças. Esta palestra passou noções de matemática financeira em relação aos juros simples e compostos, mostrando suas definições e aplicações. Vimos também algumas formas de se educar financeiramente e como diferenciar uma necessidade de um desejo (vontade). 522 Depois da palestra foi entregue aos alunos um questionário final (anexo) que teve por objetivo avaliar o que os alunos compreenderam sobre a relação e a diferença entre matemática financeira e a educação financeira. Apresentamos a seguir os principais resultados e análises do questionário final aplicado nas duas escolas. Escola A Entendimento sobre Educação Financeira (questão aberta) Esta questão foi elaborada com o intuito de analisar o que o aluno entendeu em relação a educação financeira. Sendo uma questão aberta, procuramos analisar as respostas dos alunos e organizar por gupos de semelhança resultando nos seis grupos apresentados no gráfico anterior. Vimos que 44% dos alunos relataram a importância de se economizar, ter o controle das finanças, cerca de 28% alegaram não gastar o dinheiro com coisas desnecessárias, isso mostra que os alunos compreenderam os tópicos que compõe a educação financeira. Escola B Entendimento sobre Educação Financeira (questão aberta) 523 Usando processo de analise análogo ao utilizado na escola A percebemos que 31% dos alunos da escola B relataram a importância se saber diferenciar desejo de necessidades, este tópico foi abordado na palestra, esclarecendo como identificar algo que se precisa do que se deseja (vontade), 28% alegaram a importância de se economizar, esta resposta esta associada aos vídeos, ao que foi falado, além de haver no final uma dinâmica, que teve por objetivo analisar se os alunos conseguiriam saber diferenciar necessidades de desejos na hora da compra. Ambas as escolas apresentaram respostas muito parecidas, tendo como destaque a questão sobre juros compostos, que ainda é muito difícil para os alunos, por mais que a palestra tenha abordado alguns aspectos de juros simples e compostos, o conhecimento e os processos não foram focados na palestra, pois o objetivo foi diferenciar a matemática financeira da educação financeira. A atividade proposta como um todo vem de encontro à ideia de Kiyosaki, Lechter (2000, pág. 61): “Se você quiser ficar rico, você precisa de uma alfabetização financeira.” Percebe-se que os alunos, em geral, são “analfabetos” financeiros. Para reverter esta situação, a palestra tratou sobre como fazer um planejamento financeiro, mesmo com pequenas quantias, para começarem a seguir um caminho financeiro adequado. 524 CONSIDERAÇÕES FINAIS A pesquisa foi realizada no decorrer do ano de 2013 por meio de uma bolsa de iniciação científica. Desde a aplicação e tabulação dos resultados percebeu-se que os alunos, de uma forma geral, não tinham conhecimento sobre a educação financeira e apresentavam pouca formação em relação à matemática financeira, sendo que ambas são extremamente necessárias no processo de tomada de decisão na vida adulta, o que vem de encontro com a pesquisa dos autores Paiva e Sá (2010) quando desenvolveram uma atividade sobre juros com uma turma de 7º ano do Ensino Fundamental, na qual aplicam conteúdos básicos da Educação Financeira (porcentagem e juros) destacando sua importância na vida do cidadão. Depois de analisados os resultados da pesquisa percebemos que o ideal era suprir essas dificuldades através de uma palestra composta por uma atividade interativa, onde os alunos pudessem tirar dúvidas e curiosidades financeiras. No final aplicamos um questionário para avaliar se conseguimos de fato suprir as dificuldades. Concluímos que os alunos ainda precisam de apoio quando se trata da matemática financeira (porcentagem, juros, etc.) e que entenderam o que é a educação financeira, a importância de se poupar, de fazer um planejamento financeiro. Tudo o que foi exposto é para iniciar um caminho financeiro adequado. Ao final sugerimos aos alunos que pesquisassem mais sobre o assunto. Dentre todas as etapas, observamos que a palestra não estava adequada para o tempo estimado, pois estava ultrapassando o tempo proposto pelas escolas, está é uma questão a ser repensada: adequar a palestra ao tempo de até 2 horas/aula ou dividir toda a atividade em vários encontros. Ressaltamos que o assunto deva ser tratado com mais tempo para que os alunos possam assimilar e se apropriar dos conceitos de forma gradual. Pretendemos ampliar esta pesquisa para o Ensino de Jovens e Adultos onde serão abordados conceitos financeiros voltados para a inadimplência (como evitá-la) e serão expostos alguns tipos de investimentos, direcionando-os ao melhor tipo de aplicações financeiras, de acordo com o seu perfil de cada um. 525 Agradecemos os IFSP pela concessão da bolsa de Iniciação Científica Institucional e às escolas estaduais A e B por autorizar que esta pesquisa fosse realizada com seus alunos. REFERÊNCIAS BRASIL (país), MEC/Secretaria de Educação Média e Tecnológica. Parâmetros Curriculares Nacionais: Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias. Brasília: MEC/SEMT, 2002. CERBASI, Gustavo Petrasunas. Dinheiro: os segredos de quem tem, Como conquistar e manter sua independência financeira. 7º edição. São Paulo: Gente, 2003. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE), Pesquisas de Orçamento Familiares 2008-2009, Análise do consumo alimentar pessoal no Brasil, 2011. KIYOSAKI, Robert T. 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Manual de Gestão de Finanças Pessoais: Um guia sobre planejamento financeiro, consumo, equacionamento de dívidas, formação de poupança e investimentos. 1ª edição - São Paulo: editora IGLU Ltda, 2011. PAIVA, Ana Maria Severiano; SÁ, Ilydio Pereira de. Educação Matemática Crítica e Matemática Comercial e Financeira na Formação de Professores. Publicado no XXI Seminário de Investigação em Educação Matemática. Associação de Professores de Matemática (APM). Lisboa – Portugal. (2010). ROSETTI, Hélio Junior; SCHIMIGUEL, Juliano. Educação Matemática Financeira: Conhecimentos Financeiros para a Cidadania e Inclusão. Revista Científica Internacional Indexada. Ano 2 Nº 9 Setembro/Outubro (2009). SAVOIA, José Roberto Ferreira; SAITO, André Taue; SANTANA, Flávia de Angelis. Paradigmas da educação financeira no Brasil. Revista de Administração Pública vol. 41 nº 6. Rio de Janeiro. Novembro/Dezembro 2007. VERAS, Lília Ladeira. Matemática Financeira. 6º edição, São Paulo: ATLAS S.A, 2008. 527 Anexo Questionário 1 Questionário Final 528 EIXO TEMÁTICO: E8 - TECNOLOGIAS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO O USO DA FERRAMENTA GEOGEBRA NO ENSINO E APRENDIZADO DA MATEMÁTICA PELOS ALUNOS DA FATEC OURINHOS Rosemeiry C. PRADO – UNESP Bauru – SP ([email protected]) Anderson M. SANTANA – UNESP Bauru – SP ([email protected]) Murilo C. D. OLIVEIRA - UTFPR – Ponta Grossa – PR ([email protected]) Graciela A. REALI – UTFPR – Ponta Grossa – PR ([email protected]) Juliana B. OLIVEIRA - FATEC Ourinhos – SP ([email protected]) Resumo: A criação de um grupo de pesquisa pode, dentre várias possibilidades, contribuir de modo direto com a efetivação da teoria e prática dos conteúdos desenvolvidos nos cursos oferecidos pelas instituições de ensino. E quando se refere à Educação, as Tecnologias da Informação e Comunicação apresentam possibilidades de ganhos significativos no processo de ensinar e aprender, especialmente no que se refere a dinamicidade e ludicidade. Dentre essas Tecnologias apresentam-se os Objetos Virtuais de Aprendizagem (OVAs) que compreendem em recursos digitais reutilizáveis com objetivo de auxiliar na aprendizagem de conceitos, englobando até mesmo todo o corpo de uma teoria. Destarte, este trabalho apresenta um relato do projeto que se pautou nas Tecnologias da Informação e Comunicação inseridas como ferramentas do ensino da Matemática, especificamente na disciplina de Calculo Diferencial e Integral, propiciando o contato direto dos alunos da Fatec-Ourinhos/SP, com pesquisas, ressaltando a importância das atividades a serem desenvolvidas, tanto para os estudantes, como para a Instituição a sociedade na qual estão inseridos. Possibilitou a realização de um trabalho baseado em ações coletivas que levaram à socialização do saber e à melhoria do ensino dos conceitos de Matemática nos cursos oferecidos pela Faculdade de Tecnologia, além da confecção de software, OVAs e protótipo de curso a distância usando a ferramenta Moodle, voltados ao ensino de Matemática. Promoveu novas competências e conhecimentos por meio das tecnologias, dando maior significado às disciplinas que envolvem a Matemática. Este relato apresenta alguns resultados oriundos dos estudos realizados durante a vigência do projeto de iniciação científica do grupo envolvido com o software Geogebra. 529 Palavras-chave: iniciação científica, FATEC, Geogebra, pesquisa, OVA. Introdução Educadores e pesquisadores constantemente preocupam-se em buscar alternativas que levem a caminhos que possibilitem um aprendizado mais significativo e condizente com os anseios de uma sociedade que cada vez mais exige ensinamentos acerca das tecnologias de comunicação e informação, influenciando de modo direto o ensino e o aprendizado dos seus indivíduos. Com isso, o processo de ensino, ou seja, a metodologia usada pelo professor para atingir os seus objetivos e dar sentido ao aprendizado de seus conteúdos, necessita de constante reflexão, atualização e adequação a essa nova realidade tecnológica que o permeia. Gonçalves (2006) afirma que as pessoas passaram e têm enfrentado mudanças evolutivas constantes, tanto físicas quanto mental. Portanto, “numa sociedade caracterizada pela multiplicidade de meios de comunicação e informação, não teria lugar para a escola convencional, a escola do quadro-negro e giz”. (LIBÂNEO, 1998, p. 63). As Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs) vêm sendo ininterruptamente utilizadas na educação. O uso das TICs no ensino de matemática pode possibilitar novas práticas pedagógicas. Permite, pelo uso de seus recursos tecnológicos, pesquisar, fazer antecipações e simulações, confirmar ideias prévias, experimentar, criar soluções e construir novas formas de representação mental (ZANETTE, NICOLEIT, GIACOMAZZO, 2006). A necessidade por uma escola mais dinâmica e versátil faz-se necessária no contexto atual, visto que o objetivo da educação é atingir o máximo de pessoas possível e, assim socializar o saber. Desta forma, o software Geogebra e parceria com as NTICS – Novas Tecnologias da Informação e Comunicação podem amparar os professores na disseminação do conhecimento de uma maneira mais diligente, motivando-o a agregar a tecnologia como sua aliada e não como sua rival. Experiência Desenvolvida: O GeoGebra e as Novas Tecnologias de Informação e Comunicação 530 O Software GeoGebra foi criado por Markus Hohenwarter em 2001/2002 como parte de sua tese de mestrado em educação matemática e ciência da computação na Universidade de Salzburg – Áustria, apoiado por uma bolsa de estudos DOC da Academia Austríaca de Ciências, foi capaz de continuar o desenvolvimento do software como parte de seu projeto de doutorado em educação matemática. Atualmente, Markus Hohenwarter é diretor do projeto GeoGebra com sede na Universidade Johannes Kepler, localizada em Linz, Áustria. De acordo com Hohenwarter e Preiner (2007), o programa GeoGebra foi vencedor de vários prêmios internacionais com tradução para mais de 50 diferentes linguagens, incluindo a língua portuguesa. Os softwares que trabalham apenas com construções geométricas como pontos, linhas e todas as secções cônicas, são classificados por Hohenwarter e Preiner (2007) como Softwares de Geometria Dinâmica (Dynamic Geometry Software – DGS). Os autores pontuam que o GeoGebra, além do trabalho com geometria, possui características típicas de um Sistema de Álgebra Computacional (Computer Algebra System – CAS). Pelo fato do GeoGebra servir para o trabalho de geometria, álgebra e cálculo, os autores o classificam como um Software de Matemática Dinâmica (Dynamic Mathematics Software – DMS), para o ensino e a aprendizagem de Matemática e para qualquer nível escolar. Hohenwarter e Preiner (2007) afirmam que a ideia básica do GeoGebra é provir ao menos de duas representações cada objeto matemático nas suas janelas de álgebra e de visualização. Neste cenário educativo lidamos com as chamadas NTIC, ou Novas Tecnologias da Informação e Comunicação, no qual o GeoGebra se inclui. De acordo com Libâneo (1998), a utilização das NTIC na educação tem quatro objetivos: Contribuir para a democratização de saberes (...); possibilitar a todos oportunidades de aprender sobre mídias e multimídias e a 531 interagir com elas (...); propiciar preparação tecnológica comunicacional (...); aprimorar o processo comunicacional entre os agentes da ação docente-discente e entre estes os saberes significativos da cultura e da ciência (LIBÂNEO, 2010, p.69). Deste modo, abrem-se novas possibilidades resultantes de mudanças estruturais nas formas de ensinar e aprender, ancoradas na educação tecnológica. Objetos Virtuais de Aprendizagem e GeoGebra: uma parceira a favor do ensino da matemática O emprego das tecnologias da informação como instrumento para construção do conhecimento passa por um processo de forte expansão por possibilitar às escolas à efetivação de experiências além da sala de aula. Entretanto, a utilização da tecnologia no ensino não deve ser feita de modo ingênuo e prematuro, mas sim escoltada de um estudo abrangente sobre como um sujeito adquire e edifica o conhecimento (FERREIRA et al, 2004). Segundo Valente (1999): A qualidade da interação aprendiz-objeto, descrita por Piaget, é particularmente pertinente no caso do uso da informática e de diferentes softwares educacionais e pode ser verificado por meio de alunos e professores no percurso de construção de conhecimento. (VALENTE, 1999, p. 46) Para tanto, muitos pesquisadores da área de informática educacional estudaram possíveis formas de utilização do computador na sala de aula. E, para que se possa alocar a tecnologia no meio acadêmico, Valente (1998) destaca que são necessários basicamente quatro elementos: o computador, o software educativo, um professor capacitado para usar o computador como meio educacional e o aluno, sendo que todos os quatro elementos têm igual importância. 532 Indo ao encontro das tecnologias, os OVA’s (Objetos Virtuais de Aprendizagem) podem ser tomados como todo e qualquer recurso digital (imagem, animação, simulação etc.) que tenha a capacidade de reutilização para suporte ao ensino (WILEY, 2000). Conforme Machado e Silva, a função de um objeto de aprendizagem é: (...) atuar como recurso didático interativo, abrangendo um determinado segmento de uma disciplina e agrupando diversos tipos de dados como imagens, textos, áudios, vídeos, exercícios, e tudo o que pode auxiliar o processo de aprendizagem. Pode ser utilizado - tanto no ambiente de aula, quanto na Educação à Distância (MACHADO; SILVA, 2005, p. 2). Flexibilidade, fácil manipulação e combinação, interatividade, são alguns benefícios que os OVAs acarretam ao ensino, eles são cada vez mais empregados pelas instituições educacionais, pois instigam os alunos a conhecerem mais e mostram de uma maneira diferente conceitos, teorias e esquemas de uma maneira mais leve, criativa e, propiciando a ampliação do aprendizado e as chances de sucesso escolar. Os objetos de aprendizagem possuem ainda outras grandes vantagens, como a possibilidade de sua reutilização, podendo gerar economias financeiras e assegurando a padronização da informação. Pode-se utilizar um objeto de aprendizagem, por exemplo, para realizar simulações de experiências e atividades práticas. Ele permite que o aluno teste, de maneira prática e interativa, inúmeras possibilidades do exercício proposto, que, se tivesse sido estudado apenas teoricamente, não estimularia tanto a aprendizagem do conteúdo (MACHADO; SILVA, 2005, p. 2). Além da vantagem de reutilização, os objetos de aprendizagem podem respeitar o ritmo de aprendizagem de cada indivíduo, o que geralmente não ocorre na educação presencial (ZANETTE, NICOLEIT, GIACOMAZZO, 2006). 533 A construção de um objeto virtual de aprendizagem passa por três departamentos antes de sua total construção: a pedagógica, a tecnológica e a de design, buscando um objetivo em comum, cada uma contribuindo com sua especialidade. Nos últimos anos, diversos autores têm conduzido investigações acerca dos OVAs para a compreensão de conceitos matemáticos (dentre eles, ROSCHELLE et al., 1999; CASTRO-FILHO et al., 2005), em especial os ligado à Álgebra. Logo, poder associar a esses objetos o software GeoGebra é poder agregar ainda mais elementos que colaborem com o processo de ensino e aprendizagem da Matemática. O uso de tablets e o GeoGebra como ferramentas auxiliadoras no ensino da matemática O uso das tecnologias está presente no processo de ensino e aprendizagem, docentes utilizam cada vez mais notebooks, desktops, lousas digitais, televisores, e vários outros recursos em sala de aula para chamar a atenção dos alunos e despertar o interesse sobre determinado conteúdo por meio de recursos diversos. Recentemente, a tecnologia móvel também começou a ser inserida nas instituições de ensino, gerando o novo conceito denominado Mobile Learning (Aprendizado Móvel), que nada mais é que a utilização de Tablets, Smartphones, Palmtops, e outros recursos móveis no auxílio aos discentes para desempenharem seu papel em sala de aula, visualizando auxiliar o aluno na construção do conhecimento de maneira rápida e precisa. (BOTTENTUIT JUNIOR et al, 2012). Estes dispositivos móveis são dotados de diversas funcionalidades e uma delas é o acesso a Internet. Estes podem ser considerados uma miniatura de um computador, pois possuem processadores, memórias, acesso a internet e configurações que são muito semelhantes à de um convencional, facilitando e dinamizando o aprendizado dos alunos, uma vez que, busca-se as informações de imediato, resultando em um feedback em tempo real e permitindo uma participação ativa dos docentes. (BOTTENTUIT JUNIOR et al,2012). Atualmente, além dos computadores e notebooks, há possibilidades de também instalar e trabalhar com o GeoGebra em outras ferramentas tecnológicas. 534 Ferramentas mediadoras no ensino da Matemática: Moodle e GeoGebra a favor do aprendizado de saberes matemáticos. Os Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVA´s) versam em uma opção de mídia que está sendo utilizada para mediar o processo ensino-aprendizagem à distância e empregam softwares que os auxiliam na montagem de cursos, sendo tudo elaborado para facilitar os educadores no gerenciamento de conteúdos para seus alunos e na administração do curso. Pereira, Schimitt e Dias (2007) definem Ambientes Virtuais de Aprendizagem como: (...) um conjunto de ferramentas eletrônicas voltadas ao processo ensino-aprendizagem. Os principais componentes incluem sistemas que podem organizar conteúdos, acompanhar atividades e, fornecer ao estudante suporte on-line e comunicação eletrônica (PEREIRA; SCHIMITT; DIAS, 2007, p. 7). O avanço e os desenvolvimentos tecnológicos, a partir da segunda metade do século XX, impulsionaram e estão transformando a maneira de ensinar e de aprender. Além disso, o intenso ritmo do mundo globalizado e a complexidade crescente de tarefas que envolvem informação e tecnologia fazem com que o processo educativo não possa ser considerado uma atividade trivial. Neste contexto, a demanda educativa deixou de ser exclusividade de uma faixa etária que frequenta escolas e universidades. A esse público juntam-se todos os indivíduos que necessitam estar continuamente atualizados no competitivo mercado de trabalho e/ou ativos na sociedade. Segundo Silva (2009), nos últimos anos, os Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVAs) estão sendo cada vez mais utilizados no âmbito acadêmico e corporativo como uma opção tecnológica para atender esta demanda educacional. Diante disso, destaca-se a importância de um entendimento mais crítico sobre o conceito que orienta o desenvolvimento ou o uso desses ambientes, assim como, o tipo de estrutura humana e tecnológica que oferece suporte ao processo ensinoaprendizagem. 535 Contudo, o sujeito que irá se apropriar dessas ferramentas necessita dominá-la e se apropriar do sistema cultural que vai desenvolver. Além disso, para que as ferramentas sejam de fato agregadoras de conhecimentos, é necessário considerar a figura do professor como fundamental nesse processo (PRADO, 2004). Dentre essas ferramentas tecnológicas a favor dos ensinamentos, encontra-se o Moodle (Modular Object‐Oriented Dynamic Learning Environment), um ambiente de aprendizagem a distância que foi desenvolvido pelo australiano Martin Dougiamas, em 1999. O Moodle é um software livre e gratuito, podendo ser baixado, utilizado e/ou modificado por qualquer indivíduo em todo o mundo. Utilizado por diversas instituições no mundo todo, possuindo uma grande comunidade cujos membros estão envolvidos em atividades que abrangem desde correções de erros e o desenvolvimento de novas ferramentas à discussão sobre estratégias pedagógicas de utilização do ambiente e suas interfaces. Qualquer instituição que utilize o ambiente Moodle, com qualquer fim que seja, está colaborando com o seu desenvolvimento de alguma maneira, mesmo que de forma simples, a sua divulgação, existência e suas possibilidades, de identificar problemas ou experimentar novas perspectivas pedagógicas. Estas simples contribuições se propagam por meio de uma livre cadeia de interações entre os indivíduos, percorrendo uma rede de relacionamentos que pode, em pouco tempo, ser apropriada por toda a comunidade. Como qualquer outro LMS (Learning Management System), o Moodle dispõe de um conjunto de ferramentas que podem ser selecionadas pelo professor de acordo com seus objetivos pedagógicos. Dessa forma concebem-se cursos que utilizem as diferentes ferramentas tais como: fóruns, diários, chats, questionários, objetos de aprendizagem, o Moodle permite que estes mecanismos sejam oferecidos ao aluno de forma flexível. Dentre as possibilidades que o Moodle oferece, há a de criar outras ferramentas como o fórum, que pode se tornar um portfólio, um relatório de atividades de campo, com um espaço para discussão de conceitos. Ao mesmo tempo, um glossário pode ser usado com um dicionário, um pequeno manual, dentre alternativas. É bom lembrar, que o uso de uma ação ou atividade para uma ferramenta não inviabiliza outras possibilidades, pois cada uma delas pode ser inserida no mesmo curso quantas vezes e em que posição ou momento o professor achar necessário. O ambiente virtual Moodle é mais do que um simples espaço de publicação de materiais, permeado por interações pré‐definidas, mas como um local onde o professor espelhe as necessidades de interação 536 e comunicação que cada contexto educacional lhe apresente em diferentes momentos e situações que envolvem as diversas ciências, como a Matemática. Logo, surgem oportunidades de diferentes aprendizados, como o de conteúdos matemáticos mediados pelo software de Geometria Dinâmica – o Geogebra. Os professores podem publicar materiais de quaisquer tipos de arquivos, apostilas como as que envolvem a utilização e uso do Geogebra, dentre outras funcionalidades. O Moodle é dotado de uma interface simples, seguindo uma linha de portal. As páginas dos cursos são divididas em três colunas que podem ser personalizadas pelo professor, inserindo elementos em formato de caixas como Calendário, Usuários Online, lista de Atividades. Por exemplo, poderia ser criada uma área de convivência para o registro de notícias relacionadas ao curso como, por exemplo, eventos relacionados ao Geogebra. Destarte, possibilidades diversas de trabalhos que envolvam o Moodle associado às ferramentas como o software livre Geogebra são proporcionadas com a junção desses recursos tecnológicos, indo ao encontro da tentativa de melhoria do ensino e aprendizado de um dado saber, dentre eles, o saber matemático (MERCADO, 1999). Resultados Um objeto de aprendizagem como ferramenta de auxílio para o ensino dos conceitos e teorias diversas da matemática foi desenvolvido durante o projeto de iniciação científica ao longo dos anos no interior da Faculdade de Tecnologia de Ourinhos. 537 Intitulado por Teorema de Pitágoras, o software foi desenvolvido na plataforma C# (Csharp), apresentando conhecimentos aos alunos sobre o Teorema de Pitágoras por meio da apresentação do teorema, curiosidades, biografia de Filósofo Pitágoras de Samos, exercícios contextualizados, um jogo de palavras-cruzadas, vídeo-aula, contato com o desenvolvedor, interação com um blog onde o aluno pode obter mais materiais matemáticos, e a integração do Software Matemático Geogebra, conforme modelo abaixo: Figura 1: Telas do Objeto de Aprendizagem de Matemática Fonte: autores (2014). 538 O Software Teorema de Pitágoras procura instigar a curiosidade dos alunos, por meio da interação, já que o mesmo é levado a encontrar as respostas a partir de seus próprios conhecimentos e de da troca da socialização com outros colegas. Paralelamente em relação à construção do Objeto Virtual de Aprendizagem da Matemática, uma plataforma do Moodle está em desenvolvimento na Fatec Ourinhos, São Paulo – Brasil, a fim de colaborar com o ensino e aprendizado da matemática dos alunos, utilizando o Geogebra como ferramenta auxiliadora desses saberes. Figura 2: Página Principal Moodle. Fonte: Autores (2014). De acordo com Valente: (...) o computador não é mais o instrumento que ensina o aprendiz, mas a ferramenta com a qual o aluno desenvolve algo, e, portanto, o aprendizado ocorre pelo fato de estar executando uma tarefa por intermédio do computador (VALENTE, 1998, p. 12). 539 O ambiente virtual contará com uma grande gama de material pedagógico como dicas de matemática, exercícios aplicados em vestibulares, plano de aula, softwares educacionais de apoio à tecnologia, como: fóruns, chats e e-mail, pois o estar junto virtualmente envolve “o acompanhamento e assessoramento constante dos membros do grupo, no sentido de poder entender o que cada um faz, para ser capaz de propor desafios e auxiliá-lo a atribuir significado ao que está realizando” (VALENTE, 2005, p.28). Espera-se que com tais ações, um trabalho de cooperação e troca de conhecimentos e que possa fomentar resultados concretos que contribuam para uma melhoria do ensino e aprendizado da matemática, ou seja, professores, tutores e alunos trabalhando para um bem comum: a geração de cidadãos críticos e capazes de transformar o meio no qual estão inseridos. Figura 3: Moodle com o Geogebra Fonte: Autores (2014). Espera-se, futuramente, apresentar a ferramenta do Moodle acompanhado do software Geogebra de forma mais detalhada e funcional, com possíveis projetos 540 oriundos deste ambiente e analisar os possíveis ganhos no ensino e aprendizado matemático mediado pelos instrumentos tecnológicos, além de se oferecer cursos de capacitação aos professores da rede do município de Ourinhos, fomentando e colaborando com a formação dos professores das escolas e da área de matemática. Finalmente, anterior à instalação do aplicativo Geogebra em tablets, no ano de 2013, o grupo de pesquisa da Fatec Ourinhos, criou um modo alternativo e desenvolveu uma versão do Geogebra para tablets. Figura 4: Funcionamento Aplicativo. Fonte: Autores (2012). Por meio deste dispositivo, fomentou-se ainda mais o uso do aplicativo, tornando mais prático e acessível àqueles que e utilizavam das ferramentas no ensino da matemática. Considerações Finais O trabalho apresentou alguns resultados obtidos ao longo da iniciação científica da Fatec Ourinhos-SP e voltados para o ensino e aprendizagem de conteúdos matemáticos, ressaltando como algumas ferramentas tecnológicas ou softwares 541 educativos podem e devem contribuir com o processo de ensino-aprendizagem da matemática. Além de trazer o aplicativo Geogebra como ferramenta colaborativa nesse panorama, o projeto incrementou a pesquisa na FATEC de Ourinhos e promoveu estreito relacionamento entre estudantes e pesquisadores da instituição. Desta forma foi possível colocar o aluno desde cedo em contato direto com a atividade científica, engajando-o na pesquisa e favorecendo a interação com outros pesquisadores.. Referências BOTTENTUIT J. J; COUTINHO, P. C; ALEXANDRE, S.D. M-Learning e Webquests: As novas tecnologias como recurso pedagógico. Disponível em: <http://repositorium.sdum.uminho.pt/bitstream/1822/6454/1/SIIE%20Webquests%20Fi nal.pdf> Acesso em: 21/05/2012. FERREIRA, Luis de França. Integrando objetos de aprendizagem e realidade virtual para uso em ambientes de apoio à construção e aquisição de conhecimento e habilidade espacial. In: VII CONGRESSO IBEROAMERICANO DE INFORMÁTICA EDUCATIVA, 10, Porto Alegre, 2004. GONÇALVES, J. C (2006). Educação e conhecimento: o segundo nascimento do homem. Disponível em: <http://www.uniesp.edu.br/revista/revista3/publi-art2.php? codigo=10>. Acesso em 07/03/2012. HOHENWARTER, Markus, PREINER, Judith. (2007). Dynamic Mathematics with GeoGebra. 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In: VII CICLO DE PALESTRAS SOBRE NOVAS TECNOLOGIAS NA EDUCAÇÃO, 9, Porto Alegre: 2006. 543 TECNOLOGIAS DIGITAIS E A PRÁTICA DO PROFESSOR DE MATEMÁTICA NO ENSINO FUNDAMENTAL II13 Sueli Liberatti JAVARONI - UNESP – SP ([email protected]) Maria Teresa ZAMPIERI – UNESP – SP ([email protected] ) Tiago Giorgetti CHINELLATO - UNESP – SP ([email protected]) Franciele Taís OLIVEIRA – UNESP – SP ([email protected]) Patricia Fasseira ANDRADE – UNESP – SP ([email protected]) Resumo: Neste artigo, temos por objetivo apresentar o desenvolvimento do projeto “Mapeamento do uso de tecnologias da informação nas aulas de Matemática no Estado de São Paulo”, vinculado ao Programa Observatório da Educação (OBEDUC 2012). Para tanto, apresentamos e discutimos resultados preliminares com relação a cinco diretorias de ensino contempladas no projeto. Concluímos que tais resultados apontam que o motivo primordial para o não uso dos computadores nas aulas de Matemática é a infraestrutura dos laboratórios e a formação dos professores. Em seguida, ressaltamos que na próxima fase do projeto, temos o propósito de constituir um grupo colaborativo junto aos professores de Matemática interessados, de forma que todos os membros do grupo participem de forma voluntária. Desse modo, esperamos com este artigo fomentar reflexões sobre a inserção dos computadores no ambiente educacional, em particular, no que tange ao âmbito da Matemática, que é onde o presente artigo está contextualizado. Palavras-chave: grupo colaborativo, computador, ensino fundamental II. 13 Essa pesquisa conta com o apoio financeiro da agência de fomento CAPES. 544 Introdução Atualmente, temos vivenciado uma expansão com relação ao uso das Tecnologias Digitais (TD), dentro de contextos distintos. No ambiente educacional, em particular, muitos investimentos tem sido feito visando a ampliação de laboratórios de informática em escolas públicas do ensino básico, com o intuito de propiciar a inserção de computadores em tais escolas. Estudos apontam que essa inserção se deu entre o período que corresponde ao final dos anos 80 e o início dos anos 90, mais especificamente com o uso do computador. No entanto, tal inserção ocorreu de maneira superficial, tendo a modernização como motivo para o uso desses equipamentos, conforme ressaltam Penteado, Borba e Gracias (1998). Ações governamentais ocorreram para intensificar a inserção dos computadores no meio escolar. Um exemplo desse investimento ocorreu em 2006, no qual: O Edital nº 38/2006 destina-se à compra de 75.800 computadores para 7.580 laboratórios de informática em todas as escolas públicas de ensino médio do país. Os laboratórios serão distribuídos pelo Programa Nacional de Informática na Educação (ProInfo) (BRASIL, 2006). Nesse sentido, como aponta Borba (2002), houve um marketing associado a esse uso durante essa época, pois o “objetivo era basicamente ser a solução para o problema ‘atrair mais alunos’” (BORBA, 2002, p. 144, grifo do autor). Porém, conforme alerta Penteado Silva (1997), alguns estudos mostraram indícios de que se não houver um projeto de formação continuada de professores associado à inserção do computador, além de gerar um desperdício de dinheiro, acarreta em uma não apropriação do uso das tecnologias por parte desses profissionais. Dessa forma, visando articular essa inserção com a formação continuada de professores, programas governamentais como o programa Nacional de Informática na Educação (ProInfo), Educação e Computadores (Educom), Projeto Nacional de Formação de Recursos Humanos em Informática na Educação (Formar) e Programa Nacional de Informática na Educação (Proninfe), vêm sendo criados para subsidiar a 545 estrutura física dos laboratórios de informática em escolas públicas e incentivar a utilização dos computadores no ambiente escolar. Atualmente o programa federal que aborda essa questão é o ProInfo que, segundo o MEC, tem como objetivo central propiciar a inserção da informática na prática pedagógica na rede pública de educação básica, levando às escolas conteúdos educacionais e recursos digitais, ficando sob responsabilidade do governo federal, estadual e municipal a garantia de infraestrutura apropriada para receber os laboratórios nas escolas e garantir formação aos professores para o uso dos novos recursos (BRASIL, 1997). Em particular, com relação ao Estado de São Paulo, o programa governamental que trata do incentivo ao uso do computador no ambiente escolar é o Acessa Escola, que foi desenvolvido pela Secretaria de Estado da Educação, sob a coordenação da Fundação para o Desenvolvimento da Educação (FDE), e tem por objetivo promover a inclusão digital e social dos alunos, professores e funcionários das escolas da rede pública estadual (SÃO PAULO, 2008). Embora programas governamentais, tanto em nível federal quanto estadual, tenham sido implementados, por razões distintas, muitas vezes o computador não é utilizado no contexto escolar. Borba e Penteado (2001) enfatizavam a necessidade de que tais programas contemplassem tanto a aquisição desses equipamentos, quanto a garantia de incentivo e acompanhamento da implementação e do desenvolvimento dos programas por parte das escolas. [...] é preciso que, além do equipamento, os programas do governo incentivem e fiscalizem a infraestrutura oferecida pelas escolas. Se a atividade com informática não for reconhecida, valorizada e sustentada pela direção da escola, todos os esforços serão pulverizados sem provocar qualquer impacto dentro da sala de aula (BORBA e PENTEADO, 2001, p.25). Concordamos com os autores sobre a necessidade de acompanhamento por parte dos programas governamentais no que tange à infraestrutura, bem como sobre a necessidade de que haja apoio por parte da direção das escolas. Além disso, consideramos relevante ainda que, paralelamente à implantação dos programas, haja 546 suporte técnico/pedagógico aos professores para que os mesmos se sintam suficientemente seguros e motivados para integrar a informática a suas práticas pedagógicas. Entretanto, mesmo com todas essas ações governamentais implementadas, a realidade nos dias de hoje não se encontra diferente do que foi discutido por Penteado Silva (1997) no que diz respeito à desarticulação entre a inserção dos computadores no contexto educacional com a formação inicial e/ou continuada de professores que os capacitem para utilizar esses equipamentos em suas práticas pedagógicas. Nesse sentido, Tezani (2011) apresentou os resultados de uma pesquisa realizada com 150 professores do ensino fundamental (I e II), os quais deveriam responder perguntas como: 1 - Você consegue usar as tecnologias da informação e comunicação (TIC) no processo de ensino-aprendizagem? ; 2 - Você consegue referenciar algum estudo teórico sobre o uso das TIC no processo de ensino-aprendizagem? ; 3 - Você considera necessário conhecer bem as TIC antes de incorporá-las nas aulas? . E dentre estes 150, segundo a autora, 70% responderam negativamente a primeira questão, 90% responderam negativamente a segunda e 80% responderam negativamente a terceira (TEZANI, 2011). Diante desse cenário, emergiu no Grupo de Pesquisas em Informática, Outras Mídias e Educação Matemática (GPIMEM), o projeto intitulado “Mapeamento do uso de tecnologias da informação nas aulas de Matemática no Estado de São Paulo”, vinculado ao Programa Observatório da Educação (OBEDUC). Tal projeto tem o objetivo de identificar como está se dando o uso de tecnologias digitais, em particular o computador, nas aulas de Matemática do Ensino Fundamental II, do Estado de São Paulo. O projeto é coordenado pela primeira autora deste artigo, e conta com a colaboração de outros docentes e discentes, como por exemplo, os quatro outros autores deste artigo. Além disso, o projeto conta com apoio financeiro da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). As escolas que compõem o cenário de tal projeto estão vinculadas às seguintes diretorias de ensino: Bauru, Guaratinguetá, Limeira, Registro, Presidente Prudente e São José do Rio Preto. 547 Tais diretorias foram selecionadas, pois existe pelo menos uma cidade em cada diretoria que possui campus da UNESP, e dessa forma teremos suporte técnico e infraestrutura durante todo o período necessário para realizarmos o trabalho de campo nessas cidades. Além disso, elas estão localizadas em regiões distintas dentro do Estado, o que a nosso ver, possibilitará um panorama de como o Estado de São Paulo está lidando com o uso do computador nas escolas públicas estaduais, durante as aulas de Matemática do Ensino Fundamental II. Assim, no presente artigo, apresentamos resultados parciais relacionados aos municípios de Bauru e Limeira, bem como discorremos ações e apontamentos futuros para as demais diretorias envolvidas no projeto. Resultados preliminares das diretorias de Bauru e Limeira Com relação à diretoria de ensino de Bauru, uma pesquisa de mestrado, conduzida pela quarta autora desse artigo está em andamento. Até o momento, a pesquisa de campo já foi concluída, a qual contemplou visitas às escolas públicas estaduais, aplicação de questionários aos professores de Matemática e entrevista com gestores (diretores ou coordenadores pedagógicos) das escolas. Concomitantemente ao projeto de mestrado, está sendo desenvolvido um projeto de iniciação cientifica, pela quinta autora desse trabalho, que consiste em visitar os laboratórios de informática das escolas e coletar depoimentos dos estagiários monitores do Programa Acessa Escola, responsáveis pelo funcionamento desse ambiente. Foram realizadas visitas em 19 escolas de Ensino Fundamental da rede pública estadual de ensino, distribuídas no município de Bauru, e 3 visitas na Diretoria Regional de Ensino de Bauru. Durante as visitas nas escolas, foram aplicados 54 questionários a professores de Matemática e foram gravadas 6 entrevistas com coordenadores pedagógicos das séries finais do Ensino Fundamental. Dentre os resultados iniciais obtidos, é possível perceber que o computador não é utilizado nas aulas de Matemática e um dos motivos apontados que culmina nesse não uso é a questão da infraestrutura. Ou seja, na grande maioria das escolas verifica-se que a quantidade de computadores dos laboratórios é insuficiente para atender a demanda de alunos. A maioria dos laboratórios conta apenas com 15 computadores – dos quais nem 548 todos estão funcionando – para atender turmas de aproximadamente 40 alunos. Além disso, as escolas enfrentam problemas de falta do estagiário – pessoa responsável pelo laboratório – o que impossibilita a abertura do laboratório. Houve uma situação ainda mais crítica, em uma das escolas visitadas, que o laboratório conta apenas com 3 computadores para uso dos alunos. Nessa escola, a diretora mostrou-se extremamente insatisfeita com o Acessa Escola, pois, segundo ela, antes do Programa, a escola contava com um laboratório de informática relativamente bom, no qual alunos e professores tinham condições de utilizar, porém com a inserção desse programa, foi necessário desmontar o laboratório antigo da escola. Com relação à Diretoria de Ensino de Limeira (DEL), uma pesquisa de mestrado está sendo finalizada, pelo terceiro autor desse artigo. Os procedimentos metodológicos utilizados nessa pesquisa contemplaram visitas a 10 escolas públicas estaduais da cidade de Limeira, aplicação de questionário a 29 professores de Matemática, realização de entrevistas com esses docentes de Matemática, com o coordenador de Matemática e com o responsável pelo Programa Acessa Escola da DEL. Dentre os resultados observados pelo pesquisador, há indícios de que um grande número de professores formados há menos de 10 anos não utilizam o computador e ainda um dado mais alarmante aponta que 50% dos educadores entrevistados não usam nenhum tipo de tecnologia digital. Especificamente sobre o uso dos computadores, que é o foco principal das pesquisas vinculadas ao projeto maior citado anteriormente, o pesquisador aponta que dos 29 docentes que participaram da pesquisa, somente 5 relataram usar essa tecnologia. Contudo, eles não relataram detalhadamente de que forma se davam as dinâmicas de suas aulas, quando os computadores eram utilizados. São diversos os fatores apontados por eles para que esse uso não ocorra, como por exemplo, a falta de equipamentos na escola, falta de interesse do aluno, dificuldade de acesso ao laboratório de informática e principalmente a carência de formação do professor, inicial e/ou continuada, que possibilite articular a prática pedagógica com o uso de tecnologias digitais. Tal carência foi citada por 8 dos professores entrevistados. No ano de 2013, ainda com relação à DEL, com o foco nas escolas estaduais públicas de Rio Claro, que pertencem a essa diretoria, foi desenvolvido por um aluno do curso de Licenciatura em Matemática um projeto de iniciação científica com o objetivo 549 principal de visitar as escolas do ensino fundamental II e aplicar questionários aos professores que se disponibilizaram a contribuir com essa pesquisa. Dentre seus resultados, há indícios nas respostas dos docentes de que o motivo primordial para o não uso dos computadores nas aulas de Matemática seria a falta de infraestrutura adequada dos laboratórios. Isto é, eles argumentam que não há equipamentos suficientes nos laboratórios das escolas visitadas para o trabalho com o número de alunos das salas de aula. Mesmo dentre os professores que afirmam utilizar o computador, é possível observar que a quantidade insuficiente de equipamentos surge como principal motivo desestimulante para não se usar o computador. Ainda, na opinião dos professores, que afirmam fazer uso dos computadores em suas aulas, além da falta de equipamentos, há percalços envolvendo a falta de manutenção, a carência na formação educacional no que tange à articulação entre prática pedagógica e uso de tecnologias, a falta de técnicos nos laboratórios e a dificuldade na dinâmica de aula. Ou seja, eles argumentam que, normalmente, possuem muitos alunos nas salas de aula, e que, portanto, haveria a necessidade de dividir a turma, o que poderia causar transtornos e prejuízos ao desenvolvimento das aulas. Os encaminhamentos das outras Diretorias Com relação à diretoria de Guaratinguetá, em 2014 ingressará uma aluna de mestrado, que fará seu trabalho de campo com a formação de professores das escolas públicas do município de Guaratinguetá. Contudo, vale ressaltar que neste ano de 2013, essa mesma aluna desenvolveu um projeto de Iniciação Cientifica cujo objetivo foi conhecer as condições de uso dos laboratórios de informática das escolas estaduais desse município bem como o modo pelo qual o professor de Matemática o utiliza. Dentre os resultados dessa pesquisa de Iniciação Científica, destacam-se as precárias condições de infraestrutura dos laboratórios. Em algumas das escolas visitadas o espaço físico é muito reduzido e há poucos computadores em condições de uso. As entrevistas realizadas com professores de Matemática revelam que, apesar de eles entenderem a importância do uso das tecnologias para o ensino e a aprendizagem, a maioria não utiliza o laboratório alegando falta de preparo e de apoio. Por outro lado, vê-se, também, que algumas escolas visitadas fazem um bom uso do laboratório organizando modos de os alunos o frequentarem para pesquisas, desenvolvimento de trabalhos e acesso à 550 internet. A pesquisa também revela que, principalmente as escolas da zona rural de Guaratinguetá, são as que mais utilizam o espaço do laboratório atendendo a uma das finalidades do programa Acessa Escola: o da inclusão digital. Ou seja, há escolas que abrem as suas portas mesmo aos finais de semana, com apoio do projeto Escola da Família, para que os alunos e a comunidade em geral possam utilizar o laboratório de informática. O diretor da escola, em entrevista à aluna, explica que a escola é o único espaço que a comunidade tem para acesso à internet. Na diretoria de São José do Rio Preto, há também uma pesquisa de Iniciação Científica em desenvolvimento, assim como está ocorrendo nas demais cidades mencionadas anteriormente. Nessa pesquisa, o aluno visitou a diretoria de ensino da referida cidade e fez, junto com o coordenador tecnológico, um levantamento sobre os laboratórios de informática de todas as escolas estaduais públicas dessa cidade. Em uma análise inicial, ele constatou que as escolas, de uma maneira geral, não apresentam problemas de infraestrutura. Ou seja, os laboratórios são bem conservados e amplos, possuem capacidade para 30 alunos, de uma maneira geral. Além disso, possuem, em média, 12 computadores por laboratório, e a maior parte está em boas condições de uso. Embora a infraestrutura seja apropriada, há indícios de que a maioria dos professores não utiliza tais laboratórios. Os motivos que culminam nesse não uso serão investigados em uma pesquisa de mestrado que se iniciará em 2014. Dentre os procedimentos metodológicos que serão utilizados nessa pesquisa, destacamos: visitas às escolas, questionários e entrevistas com os professores e entrevista com os coordenadores e/ou diretores das escolas visitadas. Na diretoria de Presidente Prudente, a coordenadora do projeto vinculado ao OBEDUC já entrou em contato com a colaboradora do projeto nessa região que, a saber, está orientando também um aluno de Iniciação Científica, que por sua vez, busca investigar como se dá a utilização do computador nas escolas estaduais públicas da referida cidade. Além disso, já foi feito também um contato com o coordenador de Matemática dessa diretoria, com o intuito de estabelecer uma parceria e garantir o acesso às escolas. O projeto, no momento, está na fase inicial de coleta de dados. Contudo já foi realizado um levantamento bibliográfico sobre programas governamentais do Estado de São Paulo, em particular sobre o Acessa Escola, os quais objetivaram promover a 551 inserção dos computadores nas escolas públicas estaduais. Além disso, o aluno realizou uma investigação por meio de entrevista com a responsável pela parte tecnológica das escolas jurisdicionadas à diretoria de Ensino de Presidente Prudente para averiguar as condições físicas dos laboratórios de informática das escolas públicas do município. Seus dados apontam que o programa Acessa Escola se estrutura de maneira adequada quando se olha para a presença de estagiários, tanto do ensino médio quanto universitários. Outro ponto positivo do desenvolvimento do programa na diretoria de Ensino de Presidente Prudente é a capacitação contínua dada para os professores que querem utilizar as ferramentas e as oportunidades oferecidas pelo programa. Contudo, nota-se que enquanto escolas possuem salas com 20 computadores, outras possuem salas com apenas 5, sendo todas essas escolas pertencentes à mesma diretoria de Ensino. Outro ponto destacado é sobre o espaço físico. Segundo a responsável pela parte tecnológica do programa na diretoria de Ensino de Presidente Prudente, algumas escolas não possuem espaço físico adequado para comportar a sala do programa. Nesse sentido, o aluno tenciona tal problemática com um dos objetivos constantes nos regimentos do programa Acessa Escola (SÃO PAULO, 2008), no qual é declarado que, com o intuito de fomentar a inserção dos computadores no ambiente educacional, o programa aproveita os laboratórios de informática já existentes, aprimorando-os, ou implementa salas de informática nas escolas que não disponibilizam uma. Assim, diante dos resultados iniciais das regiões investigadas, fica evidente que há um descompasso entre prática pedagógica de Matemática no Ensino Fundamental II e a integração dos computadores dentro deste contexto. Os motivos que levam à existência deste descompasso são diversos, conforme apontam os resultados iniciais dessas pesquisas que fazem parte do projeto maior, vinculado ao OBEDUC. Perspectivas futuras De acordo com os resultados parciais expostos, pode-se concluir há muitos fatores que são apontados como causas da desarticulação entre prática pedagógica de Matemática e a inserção dos computadores no contexto escolar. Dentre as causas mencionadas estão questões relacionadas à falta de infraestrutura adequada dos laboratórios de informática, ou seja, falta de números suficientes de equipamentos, falta 552 de um técnico da área de informática e por vezes falta do estagiário monitor do Programa Acessa Escola, que inviabiliza a utilização da sala de informática. Além disso, a formação do professor com relação ao uso das tecnologias digitais foi um dos motivos apontados que podem gerar um descompasso entre a prática pedagógica e o uso das tecnologias no ambiente educacional. Diante desse cenário, o grupo de pesquisadores colaboradores do projeto, ora apresentado nesse artigo, tem por objetivo específico a criação de um grupo colaborativo junto aos professores de Matemática interessados, de forma que todos os membros do grupo participem “[...] espontaneamente, por vontade própria [...]” (FIORENTINI, 2004, p. 54). Segundo este autor, são três as características principais referentes a um grupo colaborativo, que por sua vez, são: Voluntariedade, Identidade e Espontaneidade. Assim, o objetivo primordial de constituir este grupo colaborativo, junto aos professores de Matemática, será de debater estes percalços evidenciados, os quais são apontados como causas da não inserção dos computadores dentro das aulas de Matemática do Ensino Fundamental II, e se possível, dar alguns encaminhamentos para solucionar tal problemática. Desse modo, buscamos planejar a constituição de tal grupo, de forma que cada pessoa envolvida seja “[...] influenciada pela sua identificação com os integrantes do grupo e pela possibilidade de compartilhar problemas, experiências e objetivos comuns” (FIORENTINI, 2004, p. 56). Assim, planejamos um grupo onde os membros se identifiquem um com o outro, e que estejam dispostos a debater nosso objetivo em comum, que é abordar as causas do descompasso entre a prática pedagógica em Matemática e a inserção dos computadores dentro deste contexto. Destacamos que, num primeiro momento pretendemos intercalar encontros presenciais com encontros virtuais, tendo em vista a distância entre as regiões que contemplam essas diretorias. Paralelamente a isso, pretendemos ministrar oficinas, cujo intuito será de abordar possibilidades para integração do computador nas práticas pedagógicas de professores de Matemática. A participação dos professores será de forma voluntária, ou seja, será destinada àqueles que se interessem pelos temas abordados. Cabe ressaltar ainda que tanto para a composição do grupo colaborativo, quanto para as oficinas, as dinâmicas de trabalho serão desenhadas de acordo com as demandas 553 e particularidades evidenciadas em cada diretoria de ensino, bem como nas respectivas escolas vinculadas a cada uma delas. Como parte das ações para obter tais demandas e particularidades, objetivamos criar grupos fechados em uma rede social, um para cada diretoria e convidaremos para participar os professores que preencheram os questionários da pesquisa e/ou concederam entrevistas. A ideia será refletir sobre os conteúdos que os professores elencaram como os que seus alunos têm mais dificuldades de aprendizagem, na tentativa de se pensar em abordagens pedagógicas que articulem tais conteúdos com o computador, na expectativa de potencializar o processo de produção de conhecimento de tais conteúdos. Por fim, buscamos neste artigo apresentar como o projeto vinculado ao OBEDUC está sendo desenvolvido. Além disso, apresentamos alguns resultados iniciais de tal projeto, referentes às pesquisas em andamento, vinculadas a ele. A partir destes resultados, discorremos sobre quais são nossas perspectivas futuras, rumo à consolidação do projeto. Esperamos ter fomentado reflexões sobre a inserção dos computadores no ambiente educacional, em particular, no que tange ao âmbito da matemática, que é onde o presente artigo está contextualizado. Referências BORBA, M. C.; O computador é a solução: mas qual é o problema? In: SEVERINO, A. J.; FAZENDA, I. C. A. Formação docente: rupturas e possibilidades (Orgs.), Campinas: Papirus Editora, 2002. BORBA, M. C.; PENTEADO, M. G. Informática e Educação Matemática. 1. ed. 2. reimp. Belo Horizonte: Autêntica, 2001. BRASIL. Ministério da Educação. Programa Nacional de Tecnologia Educacional (ProInfo), 1997. Disponível em <http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=244&Itemi d=823 > Acessado em: 10/11/13. 554 BRASIL. Ministério da Educação. Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação. Escolas públicas vão receber mais laboratórios de informática e DVD. Disponível em <http://www.fnde.gov.br/index.php/noticias-2006/1091-escolaspublicas-vao-receber-mais-laboratorios-de-informatica-e-dvd> Acessado em: 16/11/11. FIORENTINI, D. Pesquisar práticas colaborativas ou pesquisar colaborativamente? In: BORBA, M. C.; ARAÚJO, J. L. Pesquisa Qualitativa em Educação Matemática, Belo Horizonte: Editora Autêntica, 2004. PENTEADO SILVA, M. G.; BORBA, M. C.; GRACIAS, T. A. S. Informática como veículo para mudança. In: Revista Zetetiké, v.6, n.10, p.77 - 86, Jul./Dez. 1998. PENTEADO SILVA, M. G. O computador na perspectiva do desenvolvimento profissional do professor. Tese de doutorado em Educação. Campinas: Faculdade de Educação/ Unicamp, 1997. SÃO PAULO. Programa Acessa Escola. Disponível em < http://acessaescola.fde.sp.gov.br/Public/Conteudo.aspx?idmenu=11>, 2008 Acessado em: 10/11/13. TEZANI, T. C. R. A educação escolar no contexto das tecnologias da informação e da comunicação: desafios e possibilidades para a prática pedagógica curricular. In: Revistafaac, v.1, n.1, p.35 - 45, Abr./Set. 2011. 555 EXPOSIÇÃO DO GEOGEBRA PARA DISPOSITIVOS MÓVEIS E WEB 2.0 COMO FERRAMENTA NA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA Eimard Gomes Antunes do NASCIMENTO - UA – Portugal ([email protected]) Miguel Jocélio Alves da SILVA - UFSCar – SP ([email protected]) Joserlene Lima PINHEIRO - UECE – CE ([email protected]) Resumo: Nas últimas décadas, com o advento das tecnologias digitais da informação e comunicação (TDIC), a sociedade tem passado por uma reestruturação cultural e social, onde essa relação foi caracterizada de cibercultura. A partir desta podemos vislumbrar um conjunto de novos espaços formativos tanto para uma perspectiva formal, como é o caso da Educação a Distância (EaD) ou pelos Cursos Online Abertos Massivos (MOOC - Massive Open Online Courses) mais alinhados a essa nova forma de comunicação. O uso de recursos digitais e tecnologicas (RDTs) nas escolas e universidades tem crescido rapidamente. Neste contexto, o computador torna-se cada vez mais presente no ensino, sendo valorizado como recurso que favorece a aprendizagem, ou didaticamente apropriado. Este artigo aborda a exposição de uma ferramenta para auxiliar os professores no ensino da Matemática, onde se caracteriza na aplicação do software livre de Matemática dinâmica GeoGebra sob uma abordagem construtivista nos processos de possibilidades de estudos e aprendizagenes da matemática utilizando tablets e WEB 2.0, disponível na rede mundial de computadores voltados para o ensino de Matemática, utilizando tecnologias. A importância do estudo das TDIC no ensino da matemática darse por estabelecer a interdisciplinaridade podendo dinamizar o processo de ensino e aprendizagem, viabilizando potencialidades entre a atuação de um aluno protagonista na sociedade tecnologicamente vigente. Ademais, apresenta-se um rol de possibilidades do uso do GeoGebra disponível nesta perspectiva que possuem potencial educativo e que podem propiciar ao professor e alunos alternativas para melhorar a apreensão conceitual e