A INFLUÊNCIA DO PARADIGMA BIOLÓGICO NA FILOSOFIA ENTRE OS FINS DO SÉCULO XIX E INÍCIO DO SÉCULO XX: BERGSON, VIDA E EVOLUÇÃO Jéssica da Silva Galvão Acadêmica do curso de licenciatura em Ciências Biológicas – UEMG/Ubá [email protected] Marco Antonio Barroso Doutor em Ciência da Religião Professor da UEMG/Ubá [email protected] Priscila Paschoalino Ribeiro Doutora em Letras Professora da UEMG/Ubá Margarete do Valle Werneck Mestre em Biologia Celular e Estrutural Professora da UEMG/Ubá Resumo: Résumé: O principal objetivo do trabalho foi Avaliar o impacto da Teoria Evolução no pensamento filosófico entre os fins do século XIX e início do século XX, dando visibilidade às implicações que os conceitos pautados na ideia de evolução têm sobre as concepções de vida e evolução no espiritualismo bergsoniano. L'objectif principal de ce travail était d'évaluer l'impact de la Théorie de L'évolution dans la pensée philosophique entre la fin du XIXe et début du XXe siècle, donnant visibilité aux implications que les concepts guidées par l'idée d'évolution ont sur les conceptions de la vie et de l'évolution, dans le spiritualisme bergsonienne. Palavras-chave: Biologia, Filosofia, Bergson. Mots-clés: Biologie, Philosophie, Bergson. Revista Cogitationes || ISSN 2177-6946 Vol. IV, nº 11, ago.-nov./2013 INTRODUÇÃO Tendo em vista que o estudo da história das ciências é o estudo da história dos conceitos, de seu desenvolvimento, seus limites e aplicabilidades, foi proposto, para esta pesquisa, o estudo dos conceitos desenvolvidos pela teoria da evolução. A partir de meados do século XIX, as ciências biológicas começam a ganhar contornos científicos delineados de formas mais concretas. Amparadas em pesquisas como as do naturalista inglês Charles Darwin (1809-1882) e do monge e botânico austríaco Gregor Mendel (1822-1884), por exemplo, a “biologia” traz uma visão revolucionária do conceito de vida existente até aquele período. Por muito tempo, imperou a ideia de que a vida era uma dádiva divina direcionada a um fim específico. Com sua “teoria da evolução das espécies”, Darwin introduziu sua nova visão ao mundo, em que explica a vida como o resultado de causas aleatórias, sem uma finalidade determinada. Agora o homem emerge “da lama”, não mais como um ser criado à imagem e semelhança de Deus, mas como “herdeiro” de coacervados e “macacos”. Toda essa mudança, que a mentalidade contemporânea aceita com certa facilidade, teve que ser digerida e ressignificada num primeiro momento, diante do impacto estrondoso das novas teorias. Inúmeros debates surgiram em torno das alegações de Darwin, muitos deles dirigidos por representantes da Igreja que tentavam a todo custo refutar as afirmações do cientista. As então nascentes ciências humanas, ou “do espírito”, foram construídas a partir desses e de outros debates, que envolveram, entre tantas áreas, a filosofia. Em torno das questões filosóficas suscitadas pelas novas descobertas da “ciência da vida” surge um debate que pode ser assim formulado: para os mecanicistas a vida é entendida como tendo a mesma natureza dos demais fenômenos físico-químicos e está submetida ao determinismo, à lei de causa e efeito; para os vitalistas, a vida é um fenômeno totalmente singular, com suas próprias leis. (CHAUÍ, 2003). Henri Bergson (1859-1931) foi representante do espiritualismo filosófico, que surgiu como resposta às imposições do positivismo científico, imperante nos fins do século XIX, por exemplo, se encontra em relação com o positivismo, por um lado, e com o espiritualismo, por outro, podendo-se dizer que sua filosofia realizou uma “superação simbiótica” entre os http://www.cogitationes.org 51 Revista Cogitationes || ISSN 2177-6946 Vol. IV, nº 11, ago.-nov./2013 dois extremos. O que o filósofo francês propõe é uma busca pela verdadeira experiência, que superaria o cientificismo de sua época. Em A evolução criadora, cosmologia, epistemologia e metafísica se tocam na busca pelo élan vital. É também nessa obra que encontramos o ápice do impacto das novas descobertas das ciências biológicas na obra bergsoniana, e sua tentativa de incorporar a esta crescente ciência os conceitos advindos do espiritualismo. Recentemente, um novo campo de estudo surgiu com a finalidade de obter explicações mais detalhadas no que diz respeito ao estudo da evolução e sua aplicabilidade social, assunto que foi amplamente abordado por inúmeros filósofos e pensadores sociais no período que vai do final do século XIX ao início do século XX. Trata-se da Filosofia da Biologia, que apoiada em questões Neodarwinistas, busca cada vez mais ampliar suas concepções e contribuir para o constante aperfeiçoamento das teorias evolutivas. O principal objetivo do trabalho foi Avaliar o impacto da Teoria Evolução no pensamento filosófico entre os fins do século XIX e início do século XX, dando visibilidade às implicações que os conceitos pautados na ideia de evolução têm sobre concepções de vida e evolução no espiritualismo bergsoniano. Como metodologia, optou-se pelo trabalho te tipo monográfico. Num primeiro momento foi elaborado um marco teórico referencial a partir da leitura de bibliografia primária, composta por autores que permitiram a melhor compreensão de alguns conceitos vindos das ciências biológicas, principalmente no que diz respeito ao processo de construção da teoria Darwiniana sobre a evolução das espécies. Em um segundo momento, foi realizada a leitura e o fichamento de textos escolhidos de Bergson, notadamente tendo como leitura básica a obra A evolução criadora, que, por seu conteúdo, possibilita de forma satisfatória o alcance dos objetivos estabelecidos. Empreendeu-se, também, a leitura de textos secundários, de comentadores reconhecidos que possibilitaram o aprofundamento dos temas em voga. A partir da leitura dos textos secundários, obras de comentadores sobre o assunto, torna-se possível um maior entendimento do assunto tratado, além da compreensão de conceitos filosóficos utilizados pelo autor modelo em seu trabalho. http://www.cogitationes.org 52 Revista Cogitationes || ISSN 2177-6946 Vol. IV, nº 11, ago.-nov./2013 1. REVISÃO DE LITERATURA 1.1 O Século XIX Ao longo dos séculos, diversas indagações surgiram acerca da visão imutável da Natureza. Com o advento do século XVIII, os questionamentos e críticas ao fixismo se tornaram cada vez mais fortes, principalmente na Europa. No campo filosófico, o ideal de progresso ganhava cada vez mais importância nas sociedades, que passavam por rápidas transformações. No campo observacional, os estudos mais aprofundados traziam novas evidências de um planeta em constante transformação. No campo da Botânica, da Zoologia e da Geologia, novas descobertas traziam consigo muitas questões. Os fósseis analisados, por exemplo, que apresentavam diferenças significativas de um lugar para outro e os exames das rochas, que mostravam que a idade geológica era superior à biológica. Georges Cuvier (1769 – 1832), entre outros, tentou responder de forma fixista essas questões. Segundo ele, as diversas catástrofes ocorridas na Terra extinguiram a maioria dos seres vivos e as espécies que sobravam se multiplicavam a partir daquele ponto. Os filósofos naturais poderiam, então, acreditar que todas as espécies foram criadas no início dos tempos e que as catástrofes separaram os seres extintos dos que viviam naquele momento. No final do século XVIII, o primeiro a se mostrar contra a visão fixista foi o médico Erasmus Darwin (1731 – 1802), que propôs, em seu livro Zoonomia (1794), que a transformação das espécies se deu em função de suas necessidades. Influenciado pela ousadia e falta de provas na obra de seu avô, Charles Darwin se dedicou a buscar respostas que comprovassem sua teoria. Durante cinco anos viajou pelo mundo a bordo do Beagle. Ao longo da viagem, coletou diversos espécimes de animais, plantas e rochas que foram a chave para suas descobertas. 1.2 A Teoria de Darwin Em 1831, aos 22 anos, Charles Robert Darwin recebeu um convite para participar, como naturalista, de uma expedição a bordo do H. M. S. Beagle, da armada inglesa. Durante os cinco anos de viagem no Beagle, coletou inúmeros espécimes de animais e plantas; http://www.cogitationes.org 53 Revista Cogitationes || ISSN 2177-6946 Vol. IV, nº 11, ago.-nov./2013 estudou a floresta tropical brasileira, os desertos australianos, as formações geológicas da Terra, entre tantas outras coisas. Mas foram as observações feitas nas Ilhas Galápagos que mais o surpreenderam. Lá encontrou e estudou animais e depois pode compará-los com os que existiam no continente americano. Também observou que esses animais, mesmo sendo semelhantes, apresentavam características próprias que, possivelmente, haviam desenvolvido nas ilhas como processo de adaptação aos alimentos disponíveis e ao isolamento geográfico, entre outros fatores. Ao retornar da viagem, Darwin se aprofundou na leitura de várias publicações, à procura de bases teóricas para desenvolver sua teoria. Princípios de Geologia, publicado em 1830, pelo geólogo Charles Lyell, e Ensaio sobre o Princípio da População, publicado em1798, por Thomas Robert Malthus, foram as principais obras que contribuíram para as suas conclusões. A obra de Lyell reunia estudos sobre processos naturais da alteração da superfície terrestre. Em Malthus, Darwin viu que a taxa de aumento da humanidade era reduzida por meio de doenças, acidentes e guerras e propôs que fatores semelhantes poderiam controlar a população animal e vegetal. Baseando-se na teoria de Malthus, Darwin considerou que os animais e as plantas se multiplicam em número maior que as possibilidades de alimentação e sobrevivência num meio determinado, estabelecendo, assim, uma competição pelos poucos recursos disponíveis. Como a natureza produz “variações” em cada geração, aquelas formas que terão maiores perspectivas de sobrevivência e reprodução são as mais aptas, mais capazes para a luta e mais adaptadas ao meio. Assim, surgiu a teoria da “seleção natural” ou “sobrevivência dos mais aptos”, onde se pode destacar pontos importantes: a relação sexual, pois machos mais fortes deixarão maior descendência; o clima e a natureza, pois são decisivos na manutenção do ambiente. Acreditando também que todas as formas complexas de vida, incluindo o homem, tiveram origem a partir de uma forma primordial de vida, publicou A origem das espécies, baseado na grande quantidade de dados que acumulou durante sua viagem. O livro impressionou fortemente a sociedade, principalmente o conceito de “luta pela vida”, pois as pessoas entenderam que a vida é uma batalha campal, na qual somente os fortes e os virtuosos seriam salvos; e os fracos e os pobres estariam condenados. http://www.cogitationes.org 54 Revista Cogitationes || ISSN 2177-6946 Vol. IV, nº 11, ago.-nov./2013 Mesmo Darwin tendo evitado falar da condição humana em seu livro, para a Igreja 1 sua tese era considerada perigosa, pois, se fosse aceita, muitos deixariam de crer na tese criacionista. Por esse motivo, a Igreja optou por censurar a sua difusão. Contudo, essa não foi a única barreira imposta à sua obra, visto que seus estudos influenciaram não somente a biologia e a religião, mas também vários outros campos de estudo, sendo reconhecido, elogiado e duramente criticado em cada um deles. Mesmo tendo apresentado em seu livro uma grande quantidade de evidências que comprovavam suas teses, o evolucionismo de Darwin não foi prontamente aceito. As primeiras críticas vinham do conservadorismo da igreja Anglicana, que defendiam o modelo fixista e criacionista. Nos campos filosófico e científico, as críticas baseavam-se em dois aspectos. O primeiro se referia à disposição do homem no mundo, uma vez que Darwin apresentou o homem como apenas mais um ser vivo na Terra, sem nenhuma superioridade, sendo produto do acaso. O segundo relacionava-se ao processo de transformação das espécies e, para discuti-lo, um intenso debate foi travado entre duas correntes de pensamento: lamarckista e darwinista. O debate não se resolveu no século XIX, visto que foi somente no século seguinte que novas informações começaram a mudar o rumo das discussões em favor de Darwin. 1.3 Darwinismo Com a publicação de A Origem das Espécies, muitos filósofos utilizaram alguns conceitos de Darwin para escrever sobre as relações sociais. O filósofo Herbert Spencer propôs a aplicação das ideias de Darwin à sociedade, tornando-se seu maior difusor. Ele queria que os indivíduos fossem abandonados à própria sorte, sem ajuda do Estado, proporcionando assim a luta pela vida e o desenvolvimento da sociedade pelos mais aptos. Em consequência disso, Spencer substituiu a expressão “seleção natural” por “sobrevivência do mais apto” e passou a utilizar o termo “evolução” para nomear o processo de transformação das espécies. Assim, a palavra evolução não foi concebida por Darwin e sim adotada de Spencer. 1 Nesse contexto, entende-se Igreja Anglicana. http://www.cogitationes.org 55 Revista Cogitationes || ISSN 2177-6946 Vol. IV, nº 11, ago.-nov./2013 O termo evolução não aparece nas primeiras edições de A Origem das Espécies, por não possuir lugar certo nos estudos científicos de Darwin. No entanto, à medida que perde a fé religiosa, Darwin o adota, o que faz com que esse conceito de evolução seja associado ao seu nome nos dias atuais. Em seu livro, se refere à evolução como um “grande princípio”, que seria uma nova compreensão do mundo destinada a substituir a cosmologia bíblica. Assim, o evolucionismo estava se tornando uma ideologia, traduzindo as ideias de um grupo. Evolucionismo e Darwinismo são frequentemente relacionados, admitindo um mesmo significado: processo de transformação dos organismos. Contudo, o “darwinismo” não se limitou a apenas esse sentido. Segundo Frezatti Júnior (2001), dependendo de onde e por quem era utilizado, o darwinismo assumiu diferentes significados, por exemplo: como método de entender e agir sobre o mundo; como visão de mundo; como teoria social. Na sociologia, o Darwinismo assume dois significados: visão de mundo e ideologia. Segundo Frezatti Júnior (2001) as ideias de Darwin são consideradas como cosmovisão, “pois muitos de seus pressupostos, tais como a ausência de agentes sobrenaturais, a questão do acaso e da necessidade, a posição do homem na natureza, etc, são conceitos filosóficos que caracterizam determinada concepção de mundo.” Já o darwinismo como ideologia, como conjunto de ideias de um grupo, tem um sentido mais forte, uma vez que defendia ideias liberais naquele período em que a Inglaterra vivia o auge dos debates teológicos. A tese de Darwin rejeitava o criacionismo e colocava o homem como apenas uma espécie no contexto da diversidade, produzida com o passar do tempo. Mesmo temeroso e apreensivo sobre a dimensão que sua obra poderia tomar em relação à doutrina religiosa, Darwin não deixou de argumentar contra os criacionistas, afirmando que todos os seres vivos se modificavam através da seleção natural causada pela luta pela sobrevivência e não por cuidados divinos. O darwinismo assume, assim, uma característica de negação ao criacionismo. A aplicação da seleção natural por meio da luta pela vida, “a exterminação das formas menos aptas, significa também a exterminação dos mansos, dos fracos, dos famintos, dos humildes, dos inferiores, dos puros e dos pobres – significa, em suma, o http://www.cogitationes.org 56 Revista Cogitationes || ISSN 2177-6946 Vol. IV, nº 11, ago.-nov./2013 extermínio do amor de Deus!” (MEIRA PENNA, 2006, p. 93). Penna ainda ressalta a satisfação de Darwin ao arruinar a teoria criacionista na área biológica, transformando-se no principal símbolo do século XIX, sendo associado ao mito do progresso. 1.4 Darwinismo Social Com toda a especulação gerada acerca das teorias de Darwin, um grupo crescente de cientistas e jovens estudiosos de várias áreas do conhecimento utilizavam seus textos como base para fundamentação de outras teorias. Muitos pensadores sociais, como Herbert Spencer, começaram a aplicar os conceitos de evolução e adaptação no estudo das civilizações e das práticas sociais. Dessa forma, então, nasceu o “darwinismo social”, com a ideia de que algumas civilizações possuíam valores que as colocavam acima de outras. A ideia de superioridade e inferioridade deu ao darwinismo social um caráter preconceituoso, pois julgava cada sociedade e sua cultura de modo equivocado. Ao criar uma separação entre povos de origens distintas, baseada nos costumes e na tecnologia que possuíam, colocaram a Europa no topo da evolução humana e os povos africanos e asiáticos como os mais primitivos. Isso contraria os preceitos de Darwin, que, aliás, era um antiescravocrata declarado. Esse caráter do darwinismo social foi apenas uma das inúmeras interpretações que ele recebeu. Como mostra Frezatti Júnior (2001), o darwinismo social foi usado para sustentar diversas teorias sociais, por exemplo: Roosevelt e os imperialistas britânicos utilizaram como argumento a “sobrevivência do mais adaptado”; para os militares alemães, a guerra era entendida como “necessidade biológica”. A aplicação das ideias de Darwin ao contexto social do homem influenciou o pensamento sociológico, o planejamento e a organização da sociedade e o sistema educacional, uma vez que suas obras repercutiram mundialmente no âmbito escolar. Educação intelectual, moral e física, publicada em 1861, por Spencer, influenciou fortemente a educação mundial no século XX. Na obra o autor defendia a preparação dos indivíduos para se tornarem úteis à sociedade, desenvolvendo seus conhecimentos, o patriotismo e a formação da moral. A partir daí surgiram as disciplinas Educação Moral e Cívica e Educação Física. http://www.cogitationes.org 57 Revista Cogitationes || ISSN 2177-6946 Vol. IV, nº 11, ago.-nov./2013 No Brasil, ao final do século XIX, muitos pensadores começaram a adotar a tese da existência de uma raça superior, entre eles o médico legista Nina Rodrigues e o jurista Silvio Romero. Isso culminou na intensa migração de europeus que era incentivada com a finalidade de “branquear” a população brasileira e evitar a mistura de cores. Euclides da Cunha incorporou as ideias de Spencer em Os Sertões, sua obra mais famosa. Durante a Guerra de Canudos, da qual era correspondente jornalístico, afirmou que os nordestinos eram fortes devido à miscigenação, à mistura de raças, adotando assim uma visão oposta à de Rodrigues e Romero. Para Euclides da Cunha a miscigenação levaria o Brasil a alcançar a ordem e o progresso. Já Nina Rodrigues, por exemplo, acreditava que a mistura de raças e a presença de negros causavam o “atraso” do Brasil, pois somente os brancos de origem ariana constituíam a elite. Esse tipo de pensamento influenciou a mentalidade da sociedade brasileira daquela época e ainda influenciam algumas pessoas atualmente, o que é um enorme erro de interpretação das ideias de Spencer, uma vez que a coesão da qual falava não envolvia aspectos raciais e sim culturais. Com o advento do século XX, essa ideia de superioridade foi perdendo força e a mistura de raças passou a ser vista, por muitos, como forma de agregar valores à cultura brasileira. Com o século XX, também surgiram diversos estudos acerca dos debates evolucionistas que contribuíram para o surgimento de novas áreas de estudo, que tratam de forma ainda mais abrangente do assunto. 1.5 A Filosofia da Biologia A Biologia sempre foi alvo de debates e estudos de muitos filósofos e pensadores desde Aristóteles à Descartes e Kant, e também Henri Bergson. Apesar disso, a Filosofia da Biologia como campo de estudo independente é muito recente, tendo sido desenvolvida juntamente com o Neodarwinismo, que surgiu em meados das décadas de 1930 e 1940 com a união das ideias evolucionistas de Darwin aos conhecimentos sobre genética desenvolvidos por Gregor Mendel (1822-1884), através de seus experimentos com ervilhas, e dos estudos de Algust Weismann (1834-1914) sobre hereditariedade, dando origem a uma nova teoria mais aceita sobre o surgimento das espécies. http://www.cogitationes.org 58 Revista Cogitationes || ISSN 2177-6946 Vol. IV, nº 11, ago.-nov./2013 Segundo Chediak (2008), a Filosofia da Biologia vem sendo desenvolvida desde as décadas de 1960 e 1970, abordando questões relacionadas à vida, à natureza, à diversidade e à evolução dos organismos, das populações e das espécies, estando comprometida com uma perspectiva naturalista. Ainda segundo a autora, o naturalismo é entendido como uma postura em que as teorias científicas devem ser levadas em conta em investigações filosóficas. Assim, estando comprometida com a perspectiva naturalista, a Filosofia da Biologia deverá sempre relacionar em suas pesquisas, em filosofia, os conceitos e teorias científicas de forma que contribuam para a elaboração, aprimoramento, afirmação ou rejeição de determinado tema tratado. Como destaca Pievani (2005), “a adaptação é talvez a maior evidência da biologia evolutiva. Os organismos estão mais bem adaptados aos seus ambientes.” O autor, a exemplo de Darwin, nos mostra que uma característica que possui efeito benéfico à sobrevivência e reprodução do organismo e é “selecionada” é entendida como adaptação ao meio. Tendo em vista a importância desse conceito para os estudos evolucionistas, surgiram também suas mais variadas aplicações à sociedade, como forma de planejamento e organização social, através das teorias evolutivas das espécies. A partir disso, estudos relativos à sociedade se tornam cada vez mais aceitos devido à grande quantidade de dados existentes que possibilitam a elaboração mais completa de teorias em diversas áreas como nas áreas médicas, por exemplo, em estudos psicológicos e psiquiátricos, entre outros, relacionados à compreensão dos mais diferentes comportamentos humanos. Para que o campo de estudos biológicos esteja em constante aperfeiçoamento, novas informações vêm sendo acrescentadas à teoria evolucionista de forma que ampliem a quantidade de dados disponíveis e fundamentem com mais precisão determinados assuntos relacionados ao tema, confirmando ou refutando sua veracidade. A Filosofia da Biologia vem atuando dessa forma. “Sem dúvida, uma das teorias mais importantes envolvidas, de forma direta ou indireta, com todos os temas tratados pela filosofia da biologia é a teoria da evolução.” (CHEDIAK, 2008, p. 9). A partir dela, muitos estudos conseguem ser desenvolvidos tendo bases científicas mais confiáveis, pois com a http://www.cogitationes.org 59 Revista Cogitationes || ISSN 2177-6946 Vol. IV, nº 11, ago.-nov./2013 Teoria Sintética da Evolução2, as ideias de Darwin se tornaram mais aceitas, uma vez que os estudos sobre genética e hereditariedade foram incorporados para seu aperfeiçoamento. Dessa forma, a Filosofia da Biologia se torna mais precisa, pois por ser recente, trata das questões evolutivas já aprimoradas possibilitando a realização de estudos mais detalhados, complexos e confiáveis. 1.6 Henri Bergson: A Influência do Paradigma Biológico na Filosofia “Um grande filósofo, é aquele que cria novos conceitos [...].” (DELEUZE, 1999, p. 125). Assim o autor descreve em sua obra Bergsonismo (1999), o filósofo francês Henri Bergson, como um dos nomes mais importantes no mundo filosófico, que criou uma nova perspectiva quanto ao conceito evolucionista. Filho de pais judeus, Bergson nasceu em Paris, em 1859. Tinha muita habilidade com as ciências, mas optou pela filosofia. Em 1900 se tornou professor no Collège de France e em 1927 ganhou o Prêmio Nobel de Literatura. Escreveu vários livros, entre eles A Evolução Criadora, que fizeram dele um “divisor de águas” do pensamento moderno, visto que edificou sua filosofia sobre quatro conceitos fundamentais: a intuição, a durée, a memória e o élan vital. A intuição seria o conhecimento interior, aquilo que Bergson chamou de “simpatia espiritual”, um conhecimento imediato da realidade; a durée (duração) seria um intervalo de tempo vivido entre um início e um fim, ou seja, uma percepção subjetiva do tempo; a memória entendia-se, segundo Vieillard-Baron (2007), como a própria consciência capaz de se dilatar ou contrair em função da necessidade do momento, também sendo entendida como percepção pessoal da durée; e o élan vital, compreendia o movimento da vida que se iguala à durée, sendo objeto de estudo da intuição. Com esses conceitos, Bergson explica sua teoria de evolução como um ato pelo qual a vida se divide, sendo produzida por uma diferenciação. Segundo Deleuze (1999), a intuição é o mecanismo que rege o Bergsonismo. Para ele, a intuição não é apenas uma impressão pessoal ou um impulso, mas sim um dos mais elaborados métodos já usados pela filosofia, pois é no método intuitivo que Bergson se apoia 2União dos conceitos de Darwin, Mendel e Weismann. http://www.cogitationes.org 60 Revista Cogitationes || ISSN 2177-6946 Vol. IV, nº 11, ago.-nov./2013 para estabelecer a filosofia como disciplina absolutamente “precisa”. O autor ainda reafirma sua visão quando diz: “Do ponto de vista do conhecimento, as próprias relações entre Duração, Memória e Élan Vital permaneceriam indeterminadas sem o fio metódico da intuição.” (DELEUZE, 1999, p. 8). O conceito foi uma das peças fundamentais para o desenvolvimento de seu pensamento, no que diz respeito à explicação do que seria então a Vida. Como mostra Vieillard-Baron (2007), para Bergson a vida não pode ser explicada através dos conceitos de adaptação desenvolvidos por Darwin, se estes forem tidos como único sentido da evolução, pois seria como explicar a evolução do élan vital apenas por meio das condições exteriores do ambiente que corresponderia à plasticidade da vida. Para ele, a adaptação deve ser entendida como uma força que deve ser levada em conta pela evolução. Bergson acreditava que a evolução se dá, em parte, pela individualidade que diferencia cada organismo e não apenas pelas condições do ambiente. Ainda segundo ele, a vida tende a estabelecer sistemas isolados, uma vez que busca a individualidade. Contudo, a individualidade não é perfeita, como demonstrado em A Evolução Criadora, quando revela que a individualidade em parte alguma, nem mesmo no homem, se realiza plenamente. Bergson acentua que a “vida é tendência”, já que se desenvolve criando, através de seu crescimento, direções diferentes em que seu élan irá se repartir. É preciso supor um único élan original que lança a vida em direções evolutivas diferentes, mas que também é responsável pelas semelhanças de alguns pontos, como a relação do olho com a luz. As divergências nas linhas de evolução, ou seja, a bifurcação do élan ocorre devido à superação dos obstáculos encontrados. Sendo assim, a evolução é uma criação constantemente renovada, criando gradativamente as formas de vida e também desenvolvendo as ideias que possibilitariam compreender a vida. Para Bergson a evolução ocorreu em três direções: Torpor Vegetativo, Instinto e Inteligência. A vida animal tem função ativa, sendo então instinto. A inteligência caracteriza o homem, pois possibilita sua atuação racional na natureza. Inteligência e instinto conservam uma origem comum, ambos se opõem e se completam como nos mostra Bergson quando diz que “não há inteligência onde não se descobrem vestígios de instinto, não há instinto que http://www.cogitationes.org 61 Revista Cogitationes || ISSN 2177-6946 Vol. IV, nº 11, ago.-nov./2013 não esteja envolto por uma franja de inteligência” (BERGSON, 2005, p.8). Com relação à inteligência humana, a invenção mecânica foi o exercício fundamental, pois o ato de moldar, de fabricar um instrumento, possibilitou o reconhecimento da inteligência, que, em sua forma mais simples, anseia fazer a matéria agir sobre a matéria. Para que houvesse o desenvolvimento da inteligência, Bergson acreditava que apenas o ato de fazer seria capaz de valorizar seu aprendizado, uma vez que para ele a inteligência seria mecânica. Devido a isso, o autor sustenta que a sociedade se desenvolveu como um organismo que foi submetido às leis necessárias, que se assemelham às leis da natureza em muitos pontos. O fato de desenvolver a inteligência era crucial aos indivíduos, pois era uma forma de grande importância para conseguir sobreviver naquela sociedade primitiva, onde a vida social seria “um sistema de hábitos mais ou menos fortemente enraizados, que correspondem às exigências da comunidade” (BERGSON, 2005, p.8). A maioria desses hábitos que visam à obediência e a minora são de mandar. Assim, obedecer, seja a uma pessoa que manda ou à própria sociedade, é tido como obrigação. As pessoas se sentem pressionadas a cumprir com tal hábito, realizando a vontade de um indivíduo ou da sociedade, que se reflete de modo particular para cada membro. Devido a isso, o desenvolvimento da inteligência seria vital para que o indivíduo compreendesse essas exigências feitas pela sociedade a qual pertencia, uma vez que uma ordem geral era originada pela sociedade, mas entendida de forma pessoal, podendo se diferenciar de acordo com a concepção de cada um. Assim, aqueles que não entendessem seu verdadeiro significado, não conseguiriam viver dentro daquela sociedade. Contudo, na concepção de Bergson, todos esses hábitos se mostram relacionados, desde um círculo próximo de amizades até o seu limite máximo, que seria a sociedade; sendo cada círculo considerado, direta ou indiretamente, uma obrigação social, o que não aconteceria se esses hábitos se mostrassem de forma isolada. O autor afirma que “o coletivo sempre reforça o singular, e a fórmula ‘é o dever’ triunfa sobre as hesitações que pudéssemos ter frente a uma dever isolado.” (BERGSON, 2005, p.9). Bergson nos mostra ainda que o que entendemos por obrigação, na maioria das vezes, nada mais é que o nosso próprio sentimento de necessidade, pois a obrigação não http://www.cogitationes.org 62 Revista Cogitationes || ISSN 2177-6946 Vol. IV, nº 11, ago.-nov./2013 vem precisamente de fora, mas também é produzida por nossa consciência, revelando a personalidade e nos unindo às outras pessoas cujo aspecto superficial se mostra semelhante, estabelecendo uma disciplina que cria uma interdependência entre elas. Assim, forma-se todo um conjunto de ideias e leis subjetivas que unem indivíduos a partir de sua interpretação pessoal, “agarrando-se” uns aos outros pela superfície, estando assim, socializados. Dessa forma, “a obrigação que liga os homens, liga primeiro cada um de nós a si mesmo” (BERGSON, 2005, p.12), uma vez que é nossa própria consciência que nos reflete nossas verdadeiras decisões. Sendo assim, não há uma moral social se os deveres individuais forem abandonados. Referida afirmação é acentuada quando Bergson revela que: Mesmo que fôssemos obrigados, teoricamente, apenas para com outros homens, sê-lo-íamos, de fato, para com nós mesmos, dado que a solidariedade social só existe a partir do momento em que um eu social se acrescenta em cada um de nós ao eu individual. (BERGSON, 2005, p.12). Segundo o autor esse “eu social” é parte indispensável da nossa obrigação com a sociedade, afinal, essa obrigação é o que nos liga à sociedade, pois sem uma parte de nós, ela não exerceria poder algum sobre nós. Essa condição para viver em sociedade, é, segundo Bergson, dada pela natureza. A inteligência e o instinto falados anteriormente, são as direções tomadas pela evolução e, somente aqueles que possuem a inteligência como caminho evolutivo – os homens – estão totalmente aptos para sobreviver em sociedade, afinal sua capacidade de desenvolver meios adaptativos a diversas situações proporciona-lhes maior garantia de sobrevivência. Ao passo que os animais seguem o instinto, ou seja, não conseguem desenvolver meios para adaptação, sua sociabilidade não é garantida. No caso da separação entre plantas e animais, Bergson afirma que nenhuma característica precisa conseguiu distingui-los. Segundo o autor, ambos compartilham as mesmas propriedades relativas à vida. Para ele, toda a manifestação de vida divide as mesmas características essenciais e a definição de cada grupo está na tendência a acentuálas. Uma forma de divergência entre os grupos é como ocorre a obtenção do alimento em cada caso. Mas como coloca Deleuze (1999): http://www.cogitationes.org 63 Revista Cogitationes || ISSN 2177-6946 Vol. IV, nº 11, ago.-nov./2013 [...] Já vimos que não basta dizer que a diferença de natureza está entre duas tendências, entre duas direções, entre o espaço e a duração... Pois uma das duas direções é portadora de todas as diferenças de natureza; e todas as diferenças de grau caem na outra diferença, na outra tendência. (DELEUZE, 1999, p. 74) Todas as diferenças qualitativas são compreendidas através da duração, onde a memória é a diferença e a matéria é a repetição, onde a duração também seria um grau contraído da matéria e a matéria seria o grau mais distendido da duração. (DELEUZE, 1999). 2. RESULTADOS E DISCUSSÃO A Teoria da Seleção Natural se tornou um fato revolucionário no que diz respeito ao estudo da evolução humana. Da mesma forma, teve grande influência sobre outras áreas do conhecimento, como se percebe, tanto na área acadêmica quanto social, como forma de idealismo ou como fonte de estudos espiritualistas e que envolvem, entre outros assuntos, o desenvolvimento da moral, da sociedade e da vida. A introdução de uma teoria tão bem fundamentada sobre a evolução das espécies rendeu à área científica grande quantidade de material para estudos e formulação de novos pensamentos e conceitos. Herbert Spencer, como principal difusor do Darwinismo Social, concebeu grandes ideias que fizeram parte dos mais variados contextos sociais pelo mundo. Sua filosofia baseada no conceito de adaptação rendeu questionamentos memoráveis acerca do biotipo “ideal”. Para alguns, a ideia de miscigenação era aceitável e a melhor “escolha”, para outros a ideia de uma raça pura prevalecia, e foi por uma dessas interpretações que o mundo vivenciou um dos episódios mais obscuros de sua história, o Nazismo. A questão de civilização superior e inferior com base nos avanços tecnológicos também proporcionou intensa discriminação de diversos países, e culminou na classificação de “países de primeiro mundo” e “países subdesenvolvidos” ou “em desenvolvimento” como são chamados atualmente. Muitas são as questões de aplicação das ideias de Darwin, mas nem sempre elas foram incorporadas em seu sentido original, uma vez que muitas das suas interpretações eram feitas de forma equivocada para servir a um determinado fim. http://www.cogitationes.org 64 Revista Cogitationes || ISSN 2177-6946 Vol. IV, nº 11, ago.-nov./2013 Em Bergson, está a representação de sua concepção espiritualista de vida relacionada com o pensamento darwinista de evolução. Em sua obra percebe-se a espiritualização da vida, desde seu “início”, que é, segundo o autor, um sopro de vida, algo metafísico que faz com que surja vida a partir de um determinado ponto. O élan vital seria o mecanismo que compreende o movimento da vida, à qual é produzida através da diferenciação do élan, por meio da superação dos obstáculos encontrados, produzindo novas formas de vida a cada bifurcação. Bergson não concordava com o conceito de adaptação ao ambiente como forma de evolução proposto por Darwin, pois, para ele, a evolução não pode ser entendida apenas como resultado da adaptação às condições exteriores, mas pela individualidade que diferencia cada organismo. Acreditava que a constante renovação da evolução cria as formas de vida e desenvolve as ideias que proporcionam a compreensão da vida, sendo a inteligência obtida apenas através do ato de se fazer algo. Anteriormente ao surgimento da Filosofia da Biologia como campo de estudo, o filósofo francês Henri Bergson desenvolveu sua teoria com base nos estudos de Darwin e também de Spencer. O autor tentou explicar o surgimento da vida e qual sua essência. Segundo ele, a vida surgiu a partir de um único élan vital entendido como um “impulso original de vida”, que se repartiu através da diferenciação originando as mais diversas formas existentes. Para Bergson, a individualidade era responsável por essa diferenciação que dividia o élan vital proporcionando o surgimento de novas vidas. Mas o que vinha a ser VIDA para Bergson? Como representante do espiritualismo, o filósofo acreditava que “vida é tendência”, que o ato de viver é uma transformação contínua e permanente em busca de aperfeiçoamento. Para tanto, acentua que a inteligência só pode ser obtida através do ato de fazer, uma vez que seria mecânica. Por isso essas mudanças constantes possibilitariam o aprimoramento da inteligência e consequentemente da vida de cada organismo. Para ele, esse era o princípio da evolução e assim também da construção de uma sociedade. Bergson admite assim, que existe evolução. Ele se volta à natureza para explicar tal afirmação, quando diz que a diferenciação do élan vital gera novas formas de vida, evidenciando sua posição. Bergson também entendia a vida como um propósito a ser http://www.cogitationes.org 65 Revista Cogitationes || ISSN 2177-6946 Vol. IV, nº 11, ago.-nov./2013 alcançado e não apenas como algo que está ali por acaso, sem um fim, como acreditava Darwin. Para ele, essa tendência a se modificar faria parte de algo maior, espiritual. O autor acreditava que “a atividade espiritual era independente da atividade cerebral, mas ao mesmo tempo limitada por ela.” (MARQUES, 2003, p. 82). Sendo assim, Bergson destaca que somente a intensidade da vivência é capaz de esclarecer a atividade humana. Segundo Abrantes (2011), em se tratando de Ética e Evolução, a Filosofia sempre utiliza seus conceitos para explicar de forma selecionista ou adaptacionista o comportamento moral, assim como Bergson os utiliza para defender suas ideias espiritualistas no que diz respeito às práticas sociais. Para ele, a vida em sociedade se define através do desenvolvimento da inteligência, pois é ela que caracteriza o homem possibilitando sua atuação racional na natureza. É ela, também que proporcionou o surgimento da moral, a partir de uma sociedade primitiva onde um sistema de hábitos caracterizava a vida social, sendo necessário o desenvolvimento da inteligência para compreender aqueles sistemas que iniciaram a vida em sociedade. Em linhas gerais, as inúmeras formulações de teorias a partir de A Origem das Espécies, desencadearam uma nova forma de pensar e agir em diversas áreas, originando uma busca incessante pela compreensão do movimento da vida e sua essência e também por formas distintas de explicá-la. 3. CONCLUSÃO O século XIX foi responsável por inúmeras mudanças e transformações no pensamento social. Mudanças essas que foram motivadas pelas grandes descobertas ocorridas nesse período, as quais envolveram praticamente todas as áreas científicas. O século das Ciências, como é chamado, testemunhou vários acontecimentos, desde a Literatura, com o Romantismo e o Realismo, à Arquitetura, com o advento da Revolução Industrial. Na Física, os estudos sobre termodinâmica e eletricidade, o telefone e a telegrafia; na Medicina, a descoberta de vacinas contra a raiva e varíola; nas Ciências Naturais, os estudos sobre as células, a hereditariedade e a evolução das espécies, entre tantos acontecimentos que revolucionaram a mentalidade da época. http://www.cogitationes.org 66 Revista Cogitationes || ISSN 2177-6946 Vol. IV, nº 11, ago.-nov./2013 Todos esses estudos contribuíram para o desenvolvimento da sociedade, uma vez que possibilitaram maior comunicação entre as pessoas, maiores chances de cura em casos de doenças. Também possibilitaram uma maior compreensão da vida e de sua origem, a partir dos estudos feitos por Darwin, os quais proporcionaram uma variada gama de desdobramentos no que diz respeito tanto ao campo da biologia como da sociedade humana. Como foi visto, ao contrário do que muitos acreditam, Darwin não influenciou apenas estudos relacionados à Biologia, mas também foi o ponto de partida para estudos filosóficos e sociais. Com relação à Biologia, seu trabalho se tornou um divisor de águas, pois solucionou todos os questionamentos acerca da visão imutável da natureza que existiam até aquele momento. No entanto, como mencionado, seus conceitos também se espalharam por diversas áreas do conhecimento, influenciando principalmente os estudos sociais com a aplicação dos conceitos de evolução e adaptação no estudo das civilizações. Assim, surgiu o Darwinismo Social, com um caráter preconceituoso atribuído devido à ideia de superioridade e inferioridade que distinguiam os povos de acordo com sua cultura, seus costumes e seu grau tecnológico. Essa distinção equivocada gerou o preconceito sobre os povos africanos e asiáticos, o qual perdura até os dias de hoje. A utilização da obra de Charles Darwin na elaboração de conceitos biológicos, filosóficos ou sociais evidencia a grande expansão e singularidade de suas conclusões. A Teoria da Seleção Natural ultrapassou vários campos e se reafirmou em muitos deles, ao contribuir para a elaboração de conceitos cada vez mais específicos e válidos. A criação da Filosofia da Biologia comprova esse avanço, pois a partir da ideia original de Darwin, amparada sob uma visão filosófica, vem servindo de base para inúmeros debates que se seguem nos mais variados campos de pesquisa. Dessa forma, a utilização da biologia em estudos filosóficos ou sociais, que poderia para alguns ser apenas mera obra do acaso, ou ainda impossível, pode ser entendido como a união de conceitos que se mostraram coerentes e adaptáveis a inúmeras interpretações com estudos, cada vez mais aprimorados, e pensamentos que podem ser compreendidos em sua essência a partir da aplicação do conhecimento e da busca por entendimento que deve ser http://www.cogitationes.org 67 Revista Cogitationes || ISSN 2177-6946 Vol. IV, nº 11, ago.-nov./2013 incessante. A realização deste trabalho permite uma reflexão sobre assuntos cotidianos que podem estar relacionados com a obra Darwiniana e com suas diversas interpretações e aplicações que servem como fonte de pesquisa e forma de compreensão de um pensamento filosófico e social que permeia as ciências biológicas. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABRANTES, Paulo César Coelho. (et al). Filosofia da Biologia. Porto Alegre: Artmed, 2011. BARROSO, Marco Antonio. Vida e criação: A religião em Bergson. Juiz de Foira: UFJF, 2009. [Dissertação de mestrado]. BERGSON, Louis-Henri. A evolução criadora. São Paulo: Martins Fontes, 2005. _____. Memória e vida. Tradução Claudia Berliner. São Paulo: Martins Fontes, 2006. CHAUÍ, Marilena. Convite à filosofia. São Paulo: Ática, 2003. CHEDIAK, Karla. Filosofia da Biologia. Rio de Janeiro: Zahar, 2008. COIMBRA, Leonardo. A filosofia de Henri Bergson. Lisboa: Imprensa Nacional da Casa da Moeda, 1994. DELEUZE, Gilles. O Bergsonismo. Tradução Luiz B. L. Orlandi. São Paulo: editora34, 1999. FREZZATI JÚNIOR, Wilson Antonio. Nietzsche contra Darwin. São Paulo: Discurso editorial/Unijuí, 2001. LE ROY, Eduard. Bergson. Buenos Aires: Labor, 1932. MARQUES, Silene Torres. Significação da Vida e Liberdade: Ciência e Metafísica na Filosofia de Bergson. Paraná, 2003. Disponível em: <http://www.cle.unicamp.br/cadernos/pdf/Silene %20Torres.pdf>. Acesso em 20 de maio de 2014. MARRATI, Paola. Uma teoria do conhecimento é inseparável de uma teoria da vida: o antikantismo bergsoniano. In, IHU-online. São Leopoldo, 2007, ed. 237, p.15. Disponível em: http://www.cogitationes.org 68 Revista Cogitationes || ISSN 2177-6946 Vol. IV, nº 11, ago.-nov./2013 <www.unisinos.br/ihu>. Acesso em 20 de maio de 2014. MEIRA PENNA, José Osvaldo de. Polemos – Uma análise crítica do darwinismo. Brasília: UnB, 2006. PIEVANI, Telmo. Introdução à filosofia da biologia. São Paulo: Loyola, 2010. PRADO Jr., Bento. Presença e campo transcendental... São Paulo: EDUSP, 1988. ROSSETI, Regina. Movimento e totalidade em Bergson. São Paulo: EDUSP, 2004. SILVA, Franklin Leopoldo e. Bergson: Intuição e discurso filosófico. São Paulo: Loyola, 1994. SILVA, Adelmo José da. A relação entre a moral e o misticismo em Bergson. (Tese de doutorado em filosofia). Rio de Janeiro: UGF, 2001. VIEILLARD-BARON, Jean-Louis. Conhecer Bergson. Tradução Mariana de Almeida Campos. Petrópolis: Vozes, 2007. WORMS, Frédéric. Bergson ou les deux sens de la vie. Paris: PUF, 2004. _____. A concepção bergsoniana do tempo. Dois Pontos, América do Sul, pp. 129-149, 1 18 03 2005. Disponível em: <http://ojs.c3sl.ufpr.br/ojs2/index.php/doispontos/article/view/1922/1607>. Acesso em: 06 de junho de 2014. http://www.cogitationes.org 69