I
ISSN 0102-9924
p A c u l d A d E (JE CÍÊNCÍAS ECOINÔMÍCAS CJA U F R C S
\ iNSTAbllidAdE FINANCEIRA dos
/Análise
conômica
^ N O S 9 0 : AIQUMAS iMpliCAÇÕES
PARA AS ECONOMÍAS CAPITAIÍSTAS PERifÉRiCAS
ANCIRÉ C t i s h A E DANÍEIA PRATES
\ AMpliAÇÃo RECENTE dA PARTÍCÍPAÇÃO
EsTRANqEiRA NO SíSTEMA BANCÁRÍO BRASÍIEÍRO
MARÍA CRÍSTÍNA PENÍCIO CJE FREÍTAS
INÍRA-ESTRUTURA dE INÍORMAÇÕES E SiSTEMA
NACÍONAI dE INOVAÇÃO
E D U A R D O D A MOTTA E A L B U Ç U E R P U E
O CUSTO SOCÍAI dos RECURSOS HídRicos EM
BACIAS HidRoqRÁfiCAS INTERNACIÓN Ais: O
CASO dA BACÍA do PARANÁ
J A N D Í R PERRERA D E UMA E
JOSÉ C A R R E R A ' P E R N A N D E Z
PREfERÊNCÍA PEIA LíQUídEZ E ESCOIIHA dE
PORlfÓliO
JOSÉ LUÍS OREÍRO
EfiCÍÊNCÍA, ObjETÍVO E CoORdENAÇÃO dA
PolÍTiCA MACROECONÔMICA NO
PERÍodo: 1974 ' 1979
JOÃO Slcsú
MACROECONOMIA ModERNA: KEYNES E A
ECONOMIA CONTEMPORÂNEA ' RESENUA
S Í M O N E SílvA D E D E O S
ANO
EdiçÃo
OoMEMORATiVA
I
7
5 2
SETEMBRO, 1999
90
ANOS
UNlVERSroADE FEDERAL DO RlO GRANDE DO SuL
Reitora: Prof. Wrana Maria Panizzi
FACULDADE DE CIÊNCLVS ECONÔMICAS
Diretora: Prof. Otilia Beatriz Kroeff Carrion
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CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECONOMLV
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B a r b o s a (FGV/RJ), Gustavo Franco (PUC/R.T), J o ã o R. Sansón ( U F S C ) , J o a q u i m P.
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Baer (Univ. of Illinois).
COMISSÃO EDITORLÍL
Eduardo Augusto Maldonado Filho, Fernando Ferrari Filho, Gentil Corazza, Marcelo Savino Portugal, Paulo D a b d a b Waquil; Roberto Camps M o r a e s .
EDITOR: Gentil Corazza
EDITOR ADJUNTO: Pedro Silveira Bandeira
SECRETARIA: Laize Espindula.
REVISÃO DE TEXTOS: Vanete Ricacheski.
FUNDADOR: Piof. Antônio Carlos Santos Rosa
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Análise
Econômica
Ano 17, n, 32, setembro, 1999 - Porto Alegre
Faculdade de Ciências Econômicas, UFRGS, 1999
Periodicidade semestral, março e setembro.
ISSN 0102-9924
1, Teoria Econômica - Desenvolvimento Regional Economia Agrícola - Pesquisa Teórica e Aplicada •
Periódicos. L Brasil.
Faculdade de Ciências Econômicas,
Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
CDD 330.0.5
CDU 33 (81) (05)
Preferência pela liquidez e escolha de portfolio
Estabelecendo os micro fundamentos da não-neutralidade da m o e d a
n o longo prazo*
José Luis Oreiro
S i n o p s e :Neste artigo apresentamos u m m o d e l o formal de e s c o l h a d e portfolio
baseado n o capítulo 17 d a Teoria Geral de K e y n e s , c o m o objetivo d e demonstrar
que a pohtica monetária pode ser n ã o - n e u ü a n o longo-prazo c a s o os individuos
valorizem a posse de ativos Kquidos e m seus portfóUos. N e s s e contexto, se as
autoridades monetárias r e a h z a r e m operações de open-market
c o m o objetivo d e
aumentar o estoque de ativos líquidos existentes na e c o n o m í a ; irá o c o n e r u m aumento d o preço spot d o s ativos de capital. N a m e d i d a e m que a d e c i s ã o d e investimento das firmas é t o m a d a c o m b a s e n a c o m p a r a ç ã o entre o p r e ç o spot e o preço
forward dos ativos e m consideração, tal a u m e n t o irá induzi-las a investir mais e,
conseqüentemente, irá aumentar o estoque de capital d e equihljrio d e l o n g o prazo
da e c o n o m i a e m consideração.
P a l a v r a s - c h a v e : Preferência pela liquidez, incerteza e política monetária.
A b s t r a c t : T h i s article p r e s e n t s a f o r m a l m o d e l of portfolio s e l e c t i o n i n s p i r e d in
the chapter 17 of K e y n e s ' s G e n e r a l T h e o r y in order t o s h o w that m o n e t a r y policy
can b e n o n - n e u t r a l in t h e l o n g - r u n if a g e n t s d e s i r e to h o l d liquid a s s e t s in their
portfolios. In this c a s e , if m o n e t a r y authorities d o o p e n m a r k e t o p e r a t i o n s w i t h
the p u r p o s e of i n c r e a s e the stock of liquid assets in t h e e c o n o m y , t h e n the spot
price of capital g o o d s will increase. S i n c e f i r m ' s i n v e s t m e n t d e c i s i o n s d e p e n d s
o n the c o m p a i a s i o n b e t w e e n spot a n d f o i w a r d p r i c e of this k i n d of a s s e t s ; such
increase will i n d u c e m o r e i n v e s t m e n t , r e s u l t i n g i n an i n c r e a s e o f l o n g r u n
equilibrium capital s t o c k of t h e e c o n o m y .
K e y w o r d s : L i q u i d i t y preference, u n c e r t a i n t y a n d m o n e t a r y p o l i c y .
Introdução
A teoria Keynesiana é geralmente acusada por seus críticos de não possuir sólidos f u n d a m e n t o s m i c r o e c o n ô m i c o s , o u seja, ela se b a s e a r i a e m h i p ó t e ses que n ã o são c o m p a t í v e i s ou, ao m e n o s explicitamente, d e d u z i d a s a partir
d o c o m p o r t a m e n t o otimizador individual. S e g u n d o essa linha d e crítica à teoria Keynesiana, os principais resultados teóricos p r o p o s t o s p o r K e y n e s , a saber, o
* o autor agradece os comentários e sugestões dos Profs. Drs Fernando Cardim de Carvalho e Antônio Luiz
Licha, bem como dos pareceristas que avaliaram o presente artigo. Eventuais falhas são, contudo, de minha
inteira responsabilidade
" Doutorando em Economia (lE-UFRJ) e Professor Assistente da Faculdade de Economia e Finanças do
Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (IBMEC)[E-Mail: [email protected]
desemprego involimtário da força de trabalho e a não-neutralidade da moeda no
longo prazo, só seriam sustentáveis por intermédio d a adoção de hipóteses ad hoc
a respeito do comportamento individual. E m concreto, o desemprego involuntário
da força de trabalho seria o resultado da hipótese de que os trabalhadores resistem
a reduções d e salário nominal e não a reduções de salário real (Pigou, 194.3;
Modigliani, 1 9 4 4 ) ' ; ao passo q u e a não-neutralidade seria o resultado do fato d e
que a taxa nominal de r e t o m o sobre a m o e d a é fixada e m nível istitucional, de
forma que seria impossível o ajuste de todas as variáveis nominais da economia a
u m a variação n a oferta d e m o e d a ( C f Tobin, 1969) m e s m o no longo prazo. Entretanto n e n h u m desses dois elementos p o d e ser diretamente exphcado a partir do
comportamento otimizador individual.
Para alguns Keynesianos, a suposta incompatibilidade entre os resultados
teóricos propostos por Keynes e a hipótese de racionalidade
substantiva
utihzada
pela teoria econômica convencional não se constiüii n u m problema teórico para a
agenda de pesquisa Keynesiana. D e fato, para esses autores a economia Keynesiana
estaria fundamentada na hipótese de racionalidade
limitada, não n a hipótese de
racionalidade substantiva. C o m o é bem-sabido, a distinção entre racionalidade
substantiva e racionalidade limitada é devida a Simon (1982). Segundo esse autor,
n u m ambiente caracterizado pela existência de complexidade nos processos de
tomada de decisão (complexidade essa advinda que p o d e resultar, por exemplo, da
existência de interação estratégica
entre os agentes econômicos tal c o m o é suposto na Teoria dos Jogos) não é razoável supor que os agentes possuem a capacidade
cogiütiva necessária para a maximização de u m a função objetivo. A capacidade
cálculo dos agentes é limitada, sendo assim, a racionalidade dos agentes econômicos irá se expressar através do emprego de rotinas e processos de tomada de
decisão que economizem
no uso da capacidade de cálculo por parte dos indivíduos.
Independentemente dos méritos ou deméritos desse tipo de abordagem para
a questão da racionalidade dos agentes econômicos, é u m fato incontestável que
qualquer teoria econômica t e m que estar apoiada e m algum suposto a respeito da
forma pela qual os agentes t o m a m suas decisões. Simplesmente não é razoável se
considerar que os agregados macroeconômicos (consumo, investimento, renda,
emprego, etc.) não são, e m larga medida, o resultado agregado das decisões tomadas por u m a multidão de agentes econômicos.
Nesse contexto, pretendemos demonstrar ao longo d o presente artigo que a
proposição de Keynes d e que a m o e d a é não-neutra no longo prazo é plenamente
compatível c o m o suposto tradicional de maximização de u m a função objetivo.
' Oreiro (1997) demonstia que a flexibilidade de salários nominais não gaiante a convergência das economia
de mercado a posição de equilíbrio com pleno-emprego Sendo assim, a rigidez de salários nominais, ainda
que seja um fenômeno observado empiricamente, não é o fator responsável pela ocorrência de desemprego
involuntário da força de trabalho.
D e fato, a teoria Keynesiana d a escolha de portfóho, exposta no capítulo 17 da
Teoria
Geral
do Emprego,
do Juro
e da Moeda,
apresenta c o m o u m dos seus
principais resultados o fato de que as variações d o estoque de m o e d a são capazes
de influenciar o estoque de capital de equihiario de longo prazo da economia^. Isso
porque, n u m contexto de incerteza do tipo Knight-Keynes, a moeda p o d e ser dem a n d a d a como u m ativo por parte dos agentes econômicos, de forma que ela
passa a concorrer com outr-os ativos, entre eles o capital, pela preferência dos
agentes no processo de determinação da composição de portfólio dos m e s m o s (cf.
Smdart, 1995, p.28). E m outras palavras, a não-neutralidade da m o e d a no longo
prazo^ decone do fato de que m o e d a e capital são substituíveis
errtre si n o portfóüo
dos indivíduos. Essa substitubilidade, por outro lado, n ã o resulta de n e n h u m tipo
de "miopia " por parte dos agentes econômicos, m a s sim do fato de que e m u m
ambiente caracterizado pela presença de incerteza, estes p o d e m valorizar a posse
de ativos líquidos, atribuindo u m "prêmio de liquidez" a moeda. Dessa forma, a
moeda apresentaria u m retomo implícito q u e concorre c o m o r e t o m o expHcito
proporcionado pelos ativos d e capital. U m a u m e n t o d a quantidade d e m o e d a
existente na e c o n o m i a p o d e fazer c o m q u e o s agentes e c o n ô m i c o s valorizem
m e n o s a posse d e ativos líquidos, d e s l o c a n d o , portanto, a sua d e m a n d a e m
direção a outros ativos, e m particular, o s ativos d e capital. S e g u e - s e , portanto,
q u e a não-neutralidade d a m o e d a é o r e s u l t a d o d a preferência p e l a liquidez.
^ Ao longo do presente artigo estaremos utilizando os termos curto e longo prazos no sentido Marshalliano, ou seja,
curto prazo conesponde a uma situação na qual o estoque de capital é constante, ao passo que longo prazo corresponde
a uma simação na qual tal estoque é variável. Deve-se observar que tais definições contrastam fortemente com o
sentido no qual tais termos são usados pela macroeconomia convencional, em particular, pelos modelos do tipo ISLM De fato, em tais modelos o curto prazo é definido como uma situação na qual os preços nominais são rígidos (cf
McCallun, 1996, p. 121), de forma que a economia pode se encontrar fora da posição de equilíbrio com plenoemptego lá o longo prazo é uma situação na qual os preços nominais são perfeitamente ñexíveis de forma que a
economia estará operando em equihlirio com pleno-emprego No entanto, em ambos os casos se supõe uma situação
na qual o estoque de capital é constante; de forma que o equihl^rio definido pelos referidos modelos é essencialmente
uma posição de curto prazo no sentido Marshalliano. Para os objetivos deste artigo, o que interessa é analisar os
efeitos da poKtica monetária sobre o estoque de capital de eqmMbrio de longo prazo no sentido MarshaUiano, deixando
de lado as repercussões que a mesma tem sobie o nível de emprego de equilíbrio.
' Deve-se ter em mente que o conceito de não-neutralidade da moeda no longo prazo empregado nos modelos pósKeynesianos é diferente do conceito de não-neutralidade da moeda empregado nos modelos macroeconômicos de
cunlio neoclássico. Em tais modelos a moeda é dita não-neutra no longo prazo se, num contexto em que os preços são
instantaneamente flexíveis, uma variação do tipo once-and-for-all do estoque nominal de moeda tiver efeito sobre as
variáveis reais da economia, como, por exemplo, a renda real (cf McCallun, 1996, p.ll3). Já nos modelos pósKeynesianos a moeda é dita não-neutra no longo prazo se uma variação do tipo once-and-for-all do estoque de
moeda tiver efeito sobre o estoque de capital de equihlirio de longo prazo dados os piieços de todos os demais bens e
ativos dessa economia, Essa diferença na conceituação do que vem a ser não-neutralidade da moeda no longo prazo
radica não só nas difeienças existentes entre os modelos pós-Keynesianos e os modelos macroeconômicos neoclássicos
no que se refere aos conceitos de curto e longos prazos (ver nota 2), como também nas diferenças do método de
análise empregado em cada um dos diferentes tipos de modelos Enquanto os modelos neoclássicos se utilizam do
método de equüibrio geral popularizado por Hicks no seu artigo clássico de 1937; os modelos pós-Keynesianos se
baseiam no método de eqtúlíbrio parcial MarhalHano (cf Davidson, 1978).
C o m b a s e n e s s e o b j e t i v o , o p r e s e n t e a r t i g o está e s t r u t u r a d o d a seguinte forma:
N a primeira seção apresentaremos u m a versão sofisticada do modelo de
escolha d e portfolio de Keynes exposto no capítulo 17 da Teoria Geral. Nesse
modelo será anahsada a decisão individual
de alocação de riqueza entre dois
ativos, m o e d a e capital. Será demonstrado então que a alocação do estoque de
riqueza entre os ativos e m consideração irá depender, entre outras variáveis, do
prêmio de liquidez da moeda, o qual define a taxa subjetiva d e juros que os agentes irão utilizar para calcular o preço de demanda dos bens de capital, ou seja, o
preço m á x i m o que os agentes estão dispostos a pagar por u m a unidade de capital.
A partir desse preço de demanda, iremos definir a função de demanda individual
de capital, a qual e m conjunto c o m o preço de mercado desse ativo irá determinar
a quantidade de capital que os indivíduos desejam reter e m seus portfolios.
N a s e g u n d a seção, p a s s a r e m o s a questão d a determinação do p r e ç o de
m e r c a d o dos b e n s d e capital. T o m a r e m o s , então, o estoque d e capital agregado
c o m o u m d a d o (curto p r a z o marshalliano), e a g r e g a r e m o s as funções d e dem a n d a individuais d e capital c o m o objetivo d e obter a função de d e m a n d a
a g r e g a d a d e capital. O p r e ç o spot dos ativos d e capital será determinado no
ponto e m q u e a d e m a n d a a g r e g a d a d e capital for igual ao estoque disponível
do m e s m o . A relação entie o preço spot do capital e o seu custo de reposição nos
fomece a variável q de Tobin; sendo assim, no equilíbrio de curto prazo do modelo
e m consideração, estaremos determinando não só o preço spot dos ativos de capital, c o m o t a m b é m o volume de investimento desejado pelos empresários.
A i n d a n a s e g u n d a seção, analisaremos o impacto q u e a política m o netária t e m sobre o equilíbrio d e l o n g o p r a z o dessa e c o n o m i a . A condição de
equilíbrio de l o n g o p r a z o é definida pela i g u a l d a d e entre o preço spot dos
ativos d e capital e o seu custo d e reposição. Será d e m o n s t r a d o então q u e u m a
política m o n e t á r i a expansionista c o n d u z i d a p o r intermédio d e operações de
open-market
é capaz de a u m e n t a r o estoque d e capital d e equilíbrio d e longo
p r a z o dessa e c o n o m i a , caracterizando, portanto, a não-neutralidade da moeda.
A terceira seção sumariza as conclusões obtidas ao longo do presente artigo.
2 A teoria Keynesiana da escolha de Portfolio: O modelo
de taxa própria de juros
2.1 I n c e r t e z a e p r e f e r ê n c i a p e l a liquidez
N o capítulo 17 d a Teoria Geral, K e y n e s apresenta os fundamentos de
sua teoria d a e s c o l h a d e portfolio. S e g u n d o K e y n e s , todos os ativos existentes
e m u m a e c o n o m i a p o s s u i r i a m os seguintes atributos e m m a i o r ou m e n o r grau:
1. Quase - rendas: receitas monetárias advindas da utilização de u m
ativo n o processo d e p r o d u ç ã o (lucros) ou d a simples p o s s e do m e s m o
(juros e d i v i d e n d o s ) .
2. Custo
de manutenção:
rendimentos negativos associados à
m a n u t e n ç ã o d o ativo e m consideração no portfolio dos agentes. Tratase d o custo d e estocagem
d o ativo, não tendo n e n h u m a relação c o m os
custos resultantes d a utilização do ativo no processo produtivo, ou seja,
c o m aquilo que K e y n e s d e n o m i n o u de custo de uso d o capital.
3. Prêmio
de Liquidez:
refere-se à "conveniência" e segurança
potenciais a s s o c i a d o s à p r e s e n ç a d e u m ativo no portfolio dos agentes.
4.
Ganhos
ou perdas
esperados
de capital:
são os r e t o r n o s q u e
o
investidor espera obter n o m o m e n t o e m que ele decide v e n d e r os ativos
q u e possui e m portfolio. N o m o m e n t o da realização desses ativos, p o d e m
o c o r r e r p e r d a s ou g a n h o s d e capital r e l a t i v a m e n t e a o p r e ç o q u e o
i n v e s t i d o r p a g o u p e l o referido ativo. A s e x p e c t a t i v a s a respeito d a
o b t e n ç ã o de g a n h o s ou perdas esperados d e capital sobre a r e v e n d a d e
u m ativo p o d e ser e x t r e m a m e n t e importante n o m o m e n t o e m q u e o
investidor está d e c i d i n d o a c o m p r a de u m d e t e r m i n a d o ativo.
D e todos esses atributos, o "prêmio de liquidez" é, de longe, o atributo que
mais diferencia a teoria d e escolha de portfóHo d e Keynes das teorias convencionais. D e fato, as teorias convencionais de composição de portfóUo admitem que
certos ativos d e v e m p a g a r u m "prêmio de risco" para os investidores, de forma a
compensá-los pelo maior risco associado à posse desses ativos"*. E m outras palavras, e m equihljrio, ativos mais aniscados devem proporcionar u m a taxa de retorno maior do que ativos m e n o s arriscados. O risco associado à posse de u m ativo
pode ser de dois tipos (Kalm, 1954): risco-renda,
ou seja, o risco referente à ocorrência de variações não-previstas n o rendimento dos ativos; risco-capital,
isto é, o
risco referente à possibilidade d e ocorrência de reduções inesperadas dos preços
dos ativos'*. Via de regra, indivíduos diferentes terão "preferências" diferentes a
respeito desses dois tipos de risco; no entanto, ceteris paribus, quanto maior for o
risco de u m ativo maior deve ser a sua taxa de retomo para q u e os indivíduos se
sintam estimulados a manter tais ativos e m seus portfolios.
O "prêmio de liquidez" não é equivalente
ao "prêmio d e risco". A liquidez
de u m ativo não é m e d i d a pelo risco de perda de capital associado à posse de u m
" Um exemplo de abordagem convencional é o modelo de Tobin (1958) de demanda de moeda como
comportamento face ao risco, N o modelo de Tobin, os indivíduos devem escolher entre dois ativos,
moeda e títulos {consols), sendo que os títulos estão sujeitos a perda de capital ao longo do seu período
de retenção, ao passo que a m o e d a não está sujeita a esse risco. Nesse contexto, os indivíduos só estarão
dispostos a reter títulos e m seus portfolios se estes proporcionarem uma taxa esperada de retomo maior
do que a taxa de retomo sobre a posse de moeda; dado o maior risco associado a retenção de títulos visà-vis a retenção de moeda Sendo assim, a maior rentabilidade dos títulos em comparação a rentabilidade
da moeda deve ser entendida c o m o um "prêmio de risco", ou seja, um retomo adicional que é necessário
para compensar os agentes pelo maior risco associado à posse de títulos em seus portfolios.
determinado ativo, ou seja, u m ativo não é menos líquido do que outro só porque
se antecipa que o preço pelo qual se poderá vender esse ativo no futuro é menor do
que o seu preço de compra. A liquidez de u m ativo deve ser medida pela facilidade
com que tais ativos podem substituir a moeda como meio de pagamento (Cf. Macedo
e Silva, 1994), isto é, pela capacidade de conversão de u m ativo e m dinheiro.
Definida dessa forma, a hquidez é u m conceito bidknencional (Cf. Carvalho, 1992).
Por u m lado, u m ativo será tão mais líquido quanto mais rapidamente esse ativo
puder ser convertido e m meio de pagamento. Está claro que qualquer ativo p o d e
ser convertido rapidamente e m meio de pagamento se o preço de venda d o m e s m o
for suficientemente baixo. Chegamos assim a segunda dimensão da liquidez, a
saber: o custo envolvido no processo de transformação desse ativo e m dinheiro.
Nesse caso, u m ativo será tão mais líquido quanto maior for o preço d e realização
desse ativo relativamente
ao preço que poderia ser obtido caso se desse u m prazo
maior para a reahzação do m e s m o (Cf. Hicks, 1988, p.226). Agregando-se essas
duas dimensões da liquidez n u m único conceito, podemos afirmar, c o m base e m
Hicks, que u m ativo será tão mais líquido quanto menor for a influência do prazo
de realização
desse
ativo sobre
o seu preço
de venda
.
A liquidez, portanto, é u m atributo que confere g r a n d e flexibilidade
a
e s t m t u r a d e portfólio dos indivíduos. D e fato, q u a n t o m a i o r for a q u a n t i d a d e
d e ativos altamente líquidos q u e os indivíduos p o s s u í r e m e m seus respectivos
portfolios tanto mais facilmente poderão m u d a r a c o m p o s i ç ã o dos m e s m o s
q u a n d o e se o desejarem (Cf. H i c k s , 1974; Vercelli, 1991). A
flexibilidade
será u m a característica desejada pelos indivíduos u n i c a m e n t e e m c o n t e x t o s
nos quais os agentes s a b e m que poderão m u d a r a c o m p o s i ç ã o d e seus portfolios
n o futuro. Isso irá ocorrer t o d a a vez que os agentes s o u b e r e m q u e n o futuro
irão possuir mais informação a respeito da rentabilidade esperada d o s diferentes ativos do que t e m hoje, ou seja, q u a n d o os agentes s o u b e r e m q u e n ã o
p o s s u e m hoje toda a i n f o r m a ç ã o a respeito d a rentabilidade futura d o s ativos
e m consideração (Cf. Vercelli, 1997, p.8). U m a m b i e n t e n o qual os a g e n t e s
não t ê m toda a informação d e q u e necessitam para avaliar a rentabilidade
e s p e r a d a dos diferentes ativos é u m ambiente n o qual p r e v a l e c e a incerteza
K n i g h t - K e y n e s (incerteza forte); a qual é definida c o m o u m a situação n a qual
os agentes n ã o são capazes d e definir u m a lista c o m p l e t a d e eventos ou estados da natureza
q u e p o d e m ocorrer no futuro^, de forma q u e as probabilidades d e ocorrência dos referidos eventos são subaditivas,
ou seja, s u a s o m a é
inferior a u m (Cf. VercelH, 1997, p..5).
' Isso resulta do fato de que uma parte considerável dos elementos do conjunto de estados da natureza é
constituído por expectativas a respeito das decisões que outros indivíduos estão tomando ou irão tomar
no futuro. Tais decisões, por sua vez, não são um dado; mas dependem em parte das expectativas que
tais agentes formam a respeito da decisão que o primeiro irá tomar; de forma que nos deparamos com um
problema de regressão infinita, o qual indetermina os elementos do referido conjunto (cf. Oreiro, 1998),
N u m contexto de incerteza, portanto, os agentes desejarão m a n t e r a l g u m
nível d e flexibilidade n a sua estrutura d e portfolio; para tanto, desejarão reter
u m a parte d e sua riqueza sob a forma d e ativos líquidos, isto é, estarão d i s p o s tos, até certo ponto, a sacrificar a possibilidade d e ter u m m a i o r r e t o r n o m o n e tário e m troca d a posse de liquidez. E m outras palavras, os ativos m e n o s líquidos d e v e r ã o proporcionar a o s seus proprietários u m a t a x a d e r e t o m o m a i s
e l e v a d a d e forma a c o m p e n s á - l o s p o r sua m e n o r liquidez. C h e g a m o s a s s i m a
definição d o conceito d e " p r ê m i o d e liquidez", a saber: consiste n o r e t o m o
implícito (subjetivo) q u e os indivíduos a t r i b u e m à posse d e ativos líquidos*'.
2.2 O M o d e l o de Taxa Própria d e Juros '
C o n s i d e r e m o s u m a e c o n o m i a q u e p o s s u a apenas dois ativos, m o e d a e
capital. O ativo capital é u m a g r e g a d o d e diferentes ativos c o m diferentes
graus d e liquidez, sendo que a liquidez m é d i a desses ativos é inferior à liquidez
d o ativo m o e d a ^ . O capital é u m ativo que p o d e ser utihzado n a processo d e
produção de bens e serviços, proporcionando, portanto, u m a quase-renda ( Q'j^)
ao seu proprietário''. Esse ativo p o s s u i u m custo d e retenção igual a C^^ p o r
u n i d a d e d e capital, u m " p r ê m i o d e l i q u i d e z " igual a 1 ^ p o r u n i d a d e d e capital
e u m p r ê m i o d e risco igual a R ^
A q u a s e - r e n d a p o r unidade de capital n a d a m a i s é d o q u e u m a estimativa
q u e os empresários f a z e m a respeito d o r e t o m o q u e p o d e r ã o obter c o m a utiliz a ç ã o desse ativo n o processo d e p r o d u ç ã o a o longo d e u m d e t e r m i n a d o perío d o d e t e m p o . N u m a m b i e n t e m a r c a d o pela p r e s e n ç a d e incerteza forte, tais
estimativas n ã o são totalmente confiáveis, u m a v e z q u e o s e m p r e s á r i o s t ê m
ciência d e q u e n ã o d i s p õ e m d e toda a i n f o r m a ç ã o n e c e s s á r i a p a r a c o n s t m i r a
distribuição d e probabilidades d o s r e n d i m e n t o s futuros desse ativo. S e n d o
assim, as suas estimativas a respeito d a rentabilidade futura desse ativo d e v e m
' Kregel (1998) define o "prêmio de liquidez" da moeda como sendo equivalente ao seu "custo de uso", ou
seja, o valor presente do ganho potencial futuro ou da perda que pode ser evitada se o agente preferir adiar
suas decisões de gasto. Em outras palavras, o prêmio de Uquidez da moeda surge quando o valor para o
agente de uma decisão tomada e m t é menor do que o valor dessa mesma decisão adiada por T períodos, ou
seja, tomada e m t+ T.
' O modelo apresentado a seguir é inspirado em Licha (1990).
' Essa hipótese corresponde à estrutura de agregação assumida por Keynes nos capítulos 13 e 15 da Teoria
Geral onde capital e títulos da dívida púbhca são tidos substitutos perfeitos entre si Devemos ressaltar a
diferença entre essa estrutura de agregação e a estrutura do modelo moeda-capital de Tobin, n o qual se supõe
que moeda e títulos da dívida pública são substitutos perfeitos entre si. Nesse caso, como ressalta Tobin
(1969), não haveria espaço para a política monetária tal como é entendida usualmente, ou seja, como operações
de open-market nas quais se realizam a troca de moeda por títulos do govemo. Ao se supor que capital e títulos
públicos são substitutos perfeitos, tal como estamos fazendo no presente artigo, abre-se espaço para a política
monetária ao mesmo tempo em que se simplifica a estrutura formal do modelo.
' Para simplificar a apresentação do modelo, iremos considerar que a apreciação esperada dos ativos de
capital está embutida na sua "quase-renda".
ser p o n d e r a d a s pelo grau de confiança
q u e eles t ê m e m suas próprias previsões (Cf. C a r v a l h o , 1992, pp.84-8.5)'«. T e m o s , e n t ã o , q u e :
Q ;
(K):= O Q J K )
;
aQ'(K)/8K<0
(1)
onde : F é o grau de confiança dos agentes em suas previsões a respeito do futaro; Qj^representa
as estimativas dos agentes a respeito da rentabilidade futura do ativo capital; e K. é a quantidade
de capital que o indivíduo i possui em portfólio.
Observa-se n a equação (1) que a quase-renda por unidade d e capital é u m a
função decrescente da quantidade de capital que o indivíduo i possui e m portfólio.
Isso é u m a decorrência d o "princípio d a rentabilidade esperada decrescente"
(Macedo e Silva, 1994). As quase-rendas esperadas se reduzem à medida que os
indivíduos aumentam a quantidade de capital e m seus portfolios porque a "escassez" d o capital se reduz c o m o aumento d e sua quantidade. Deve-se observar,
contudo, que a "escassez" de capital aqui definida nada tem a haver c o m a "escassez" n o sentido neoclássico d o termo. A " e s c a s s e z " d e capital nos modelos
neoclássicos é definida c o m relação à quantidade d o fator d e produção trabalho
existente n a economia. Para Keynes, o capital é escasso c o m relação ao tamanho
do mercado. Se as firmas estiverem operando c o m plantas muito reduzidas e c o m
u m pequeno volume de produção, então a demanda insatisfeita pelos produtos
dessa firma irá se expressar e m preços e margens d e lucro bastante elevadas. C o m
o aumento da capacidade de produção das firmas - supondo que elas se delrontam com
uma curva de demanda negativamente inclinada pelos seus produtos, ou seja, que prevalece a concorrência imperfeita no mercado de bens - os preços e as margens de lucro
irão se reduzir, dando origem a quase-rendas decrescentes.
C o m o o capital, neste modelo, se constitui n u m agregado d e ativos c o m
diferentes graus de liquidez segue-se que tal agregado deve possuir u m "prêmio de
liquidez" positivo. Contodo, esse ativo é menos líquido d o que a moeda, logo o
seu "prêmio d e hquidez" deve ser apenas u m a fração d o "prêmio d e liquidez"
desta tíltima. Essa hipótese pode ser formalizada pela seguinte equação :
l,= Y l . .
0 < y < l
(2)
'° Segimdo Vercelli (1997), o grau de confiança dos agentes em suas previsões está relacionado com o grau de nãoaditi vidade da distribuição de probabilidades relevante para o problema em consideração. De fato, o grau de confiança
nada mais é do que aquilo que Keynes (1921) havia definido como "peso do argumento". O peso de um argumento
x/h - ou seja, o conjunto x de resultados obtidos a partir do conjunto h de hipóteses - é definido como V(x/h) = K / (K
+ M), onde K é a informação relevante possuída pelo agente e M é a informação que o agente não possui. Obviamente
que M + K = 1 . 0 grau de não aditi vidade da disüibuição de probabilidade é definido como c (P, A) = 1 - P(A) - P( A'
), onde A é um evento e A° o seu complementar. É intuitivo que c (RA) = M / (M+K), de onde concluímos que v(x/
h) = 1 - c (P, A), Em palavras: quanto maior for o grau de não aditividade da distribuição de probabilidades menor será
a confiança que os agentes terão em suas previsões, ou seja, menor será o peso do argiunento (VercelM, 1997, pp.4-5).
Por fim, o ativo capital possui u m prêmio de risco
, o qual será tido c o m o
u m a fiinção crescente e m K., ou seja, quanto maior for a quantidade de capital
possuída pelo indivíduo i maioi- será o "prêmio de risco d o capital". Isso decorre
do "princípio d o risco financeiro crescente" (Cf. Kalecki, 1954), segundo o qual
quanto maior for a participação de u m ativo no portfólio dos agentes maior será o grau
de exposição dos mesmos a u m a eventual perda de capital sobre a retenção desse ativo
ou a uma possível írusü-ação das expectativas iniciais a respeito da rentabilidade do
mesmo. E m ambos os casos, quanto maior for a participação desse ativo no portfólio
dos agentes maior será o risco de inadimplência (default risk). Temos, então, que:
R, = R , ( K i )
idR^/dK
>0
(3)
O ativo m o e d a é definido c o m o aquele ativo para o qual
= C^ = R^ = 0.
O prêmio de liquidez da moeda, por outro lado, é m á x i m o e não varia c o m o
aumento de sua quantidade.
Deve-se ter claro qual o papel que a m o e d a desempenlia no portfólio dos
agentes. Se os agentes d e m a n d a m o ativo capital é porque o m e s m o proporciona
u m rendimento monetário explícito sob a forma de quase-rendas; a demanda de
m o e d a a d v é m d o fato de que a sua presença no portfólio dos agentes confere ao
m e s m o flexibilidade de adaptação face a eventos imprevistos. Por exemplo, se o
agente se defrontar c o m u m a necessidade não prevista d e fundos líquidos para
fazer face a u m pagamento contratual, a retenção d e m o e d a e m portfólio permite
que essa necessidade seja rapidamente atendida a u m baixo custo. Essa flexibilidade não é possível no caso do ativo capital, pois a utilização do m e s m o para esse
fim envolve a sua conversão prévia e m meio de pagamento. Dada a menor liquidez
dessa ativo vis-à-vis a moeda, a perda de capital envolvida nesse processo será tão
maior quanto maior for a urgência c o m a qual se tenha que realizar esse ativo c o m
vistas ao atendimento da necessidade d e fundos l í q u i d o s ' ' .
Consideremos u m indivíduo que possua u m estoque W de riqueza, o qual
ele deverá alocar entre m o e d a e capital. Suponhamos, também, que esse indivíduo
deseje reter esses ativos por apenas u m período, ao final d o qual ele irá converter
todo o estoque d e riqueza e m dinheiro. E s s e i n d i v í d u o deseja escolher as quantidades K.* e M . * dos ativos capital e m o e d a , r e s p e c t i v a m e n t e , q u e ele deseja
" Devemos observar a diferença entre o papel que a moeda desempenha nos modelos pós-Keynesianos
do papel que ele desempenha no modelo de Tobin (1958) de escolha de portfólio. Neste, a função da
moeda é minimizar o risco de perda de capital associado à posse de ativos cujo preço de mercado está
sujeito a variações e m função do comportamento da taxa de juros. Nos modelos pós-keynesianos, a
demanda de moeda se origina do fato de que este é o único ativo cujo prazo de realização não tem
nenhuma influência sobre o seu preço de mercado, de forma que é o ativo ideal para fazer frente a
imprevistos desfavoráveis. Qualquer outro ativo sofreria uma perda de capital no processo de sua conversão
em meio de pagamento, perda essa que será tão maior quanto (i) menor for o prazo de realização desse
ativo e (ii) menor for o grau de organização do mercado no qual esse ativo é transacionado.
m a n t e r e m portfolio d e f o r m a a maximizar
o retorno esperado d o m e s m o .
Segue-se, portanto, q u e o p r o b l e m a de m a x i m i z a ç ã o d o indivíduo p o d e ser
apresentado d a seguinte f o r m a :
MAX Z={ [OQ^(Ki)-C^-R^(Ki)+LJ
P,. K. -I- P „ .
W
k l
m I
onde :
é o preço spot
moeda ( P = 1 ) .
K -P^K } + {L_^M,-P^M. }K.,M.
(4)
s.a
d o ativo capital ; e P ^ é o preço spot
do ativo
O primeiro t e r m o e m (4) n a d a mais é d o q u e o lucro esperado resultante
do " i n v e s t i m e n t o " na c o m p r a d o ativo capital. D e fato, o termo e m colchetes
r e p r e s e n t a o r e n d i m e n t o unitário esperado d o ativo capital; o qual é d e d u z i d o
do i n v e s t i m e n t o inicial n a c o m p r a d o ativo e m consideração p a r a se obter o
lucro d e s s a aplicação. D e f o r m a análoga, o lucro da aplicação e m m o e d a é
d a d o p e l a diferença entre o seu " r e t o r n o " implícito so b a forma de liquidez e o
" i n v e s t i m e n t o " feito i n i c i a l m e n t e na a q u i s i ç ã o desse ativo.
Deve-se observar também que o indivíduo e m consideração não é capaz de influenciar os preços spot dos ativos que mantêm e m seu portfóho, ou seja, estamos supondo
que prevalece a concorrência perfeita nos mercados dos referidos ativos' ^.
A s condições de primeira o r d e m para a maximização de (4) são dadas por :
aZ/aM.= l - 1 - 9 1 = 0
3Z/3K. = { O
dzidX=
-
-
= \
-1
+ I J + K, { O ( 3 Q / a K . ) -
(5a)
( a R / d K ) } - (1+?l)P, = o
(5b)
P.K-i-M, - W = 0
(5c)
onde : À, é o multiplicador de lagrange^ ^.
A introdução da hipótese de concorrência imperfeita não traria nenhum resultado qualitativamente diferente
dos resultados obtidos com a hipótese de concorrência perfeita; além do que, como se observa em Licha
(1990), a introdução de concorrência imperfeita toma consideravelmente mais complicado, do ponto de vista
matemático, a derivação dos estoques de capital e moeda que os indivíduos desejam reter em portfóho. Com
base, portanto, no "princípio da simplicidade" de Ocean, podemos descartar a hipótese de concorrência
imperfeita, concentrando nossa atenção apenas no caso de concorrência perfeita,
" O valor de X representa o a u m e n t o n o valor da função Z, e m função do aumento de W em u m a
unidade (Cf. Barro, R & Sala-i-Martin, X. , 1995, p p 49.3-494), ou seja, o multiplicador de lagrange
mostra o aumento dos lucros esperados do portfólio do indivíduo quando o valor de seus ativos
aumenta e m uma unidade. Segue-se, portanto, que o multiplicador de lagrange mede a contribuição
de cada unidade d o estoque de riqueza para o r e t o m o total do portfólio do indivíduo e m consideração.
Esse conceito é análogo ao conceito d e "eficiência marginal do capital em geral" (Keynes, 1936,
pp. 135-136), ou seja, oferece u m p a d r ã o de comparação para o indivíduo no m o m e n t o e m que ele
está decidindo se vai adquirir u m a u n i d a d e adicional de m o e d a ou de capital (Cf. Licha, 1990, p. 5).
Em outras palavras, ao decidir se deve ou não fazer u m investimento adicional n a aquisição de
m o e d a ou de capital, o indivíduo deverá comparar a taxa esperada de retorno desses ativos com o
valor de X; tal investimento só será realizado se a sua taxa esperada de retorno for igual ou superior
aX.
A equação (5a) mostra que o indivíduo irá investir na aquisição de m o e d a
até o ponto e m que a "eficiência
marginal
do capital
em geral"
for igual à taxa
esperada de retomo sobre o ativo moeda. Essa taxa esperada de retomo nada mais
é do q u e a taxa subjetiva
de juras,
ou seja, a taxa mínima de r e t o m o que os
indivíduos desejam obter para abrir m ã o de u m a unidade do arivo moeda. C o m o o
"prêmio de liquidez" da m o e d a é constante'
segue-se que a quantidade de m o e d a
que os indivíduos desejam reter n ã o é determinada a partir dessa equação (Cf.
Licha, 1990, p . 5). Tal afrrmação pode ser visualizada por intermédio da figura 1.
X
^
M.
Figura 1
Se definirmos 1^-1 = j ^ , substituirmos essa definição n a e q u a ç ã o (5b),
t e m o s , após os a l g e b r i s m o s necessários q u e :
{ q) Q, - C , - R , + I J
K {<D (dQjdK)
- 0R,/9K.) }
(6)
(1+JJ
O lado direito da equação (6) nada mais é do que o preço
de demanda
do
ativo capital, ou seja, o preço m á x i m o que o indivíduo está disposto a pagar por
u m a unidade de capital. O preço de demanda d e qualquer ativo nada mais é do q u e
o valor presente
do fluxo de rendimentos que se espera obter desse ativo ao longo
do período no qual ele é mantido e m portfólio (Cf. Keynes, 1936, p . 137). C o m o
estamos supondo que o indivíduo irá manter seus ativos e m portfólio por apenas
u m lírüco período, e que os rendimentos que tais ativos proporcionam só estarão
disponíveis ao final do período; segue-se que o preço m á x i m o q u e o indivíduo
estará disposto a pagar pelo ativo capital será igual ao valor dos rendimentos esperados desse ativo descontado pela taxa subjetiva
de
juros.
Segundo M a c e d o e Silva (1994), a m o e d a é o único ativo que não está sujeito ao "princípio da
rentabilidade esperada decescente", isso porque, por um lado, é o único ativo cujo acúmulo coOntínuo no
portfólio dos agentes não implica u m maior risco de inadimplência e m função da ocorrência de eventos
imprevistos, dada a sua natureza de meio de pagamento Por outro lado, como a moeda não é um ativo
produtivo, ou seja, como a quase-renda da moeda é igual a zero; segue-se que um aumento na quantidade
de moeda n o portfólio dos agentes não deverá produzir uma redução no seu rendimento.
N e s s e contexto, a e q u a ç ã o (6) nos diz q u e o indivíduo irá d e m a n d a r o
ativo capital até o p o n t o e m que o p r e ç o d e d e m a n d a desse ativo for igual ao
seu p r e ç o d e m e r c a d o , isto é, o seu p r e ç o spot.
O preço de demanda do ativo capital é inversamente relacionado com a quantidade de capital que o indivíduo possui em seu portfólio, ou seja, quanto mais capital o
indivíduo possuir menor será o preço que o indivíduo estará disposto a pagar por uma
unidade adicional desse ativo. De fato, diferenciando (6) com respeito a e K. temos :
dPjdK.
=
{ 2 [ 0) (dQjdK)
- ( dñjdK)
]}
<
(7) ' 5
O
A d e t e r m i n a ç ã o d o estoque de capital que o indivíduo deseja reter e m
portfólio p o d e ser visualizada por intermédio da figura 2.
Pk
onde :
P\ : p r e ç o d e
demanda do
capital
Ki
Figura 2
A e q u a ç ã o (6) define implicitamente o estoque de capital que os indivíduos d e s e j a m reter e m portfólio c o m o u m a função (i) d o p r e ç o spot dos ativos
d e capital, (ii) da taxa subjetiva d e j u r o s , (iii) d o grau de confiança d o indivíd u o e m suas previsões a respeito d a rentabilidade futura do ativo capital e (iv)
do " p r ê m i o d e l i q u i d e z " desse ativo. T e m o s , então, que :
K*. = K. ( P,, j ^ , <I>, I,)
; dKJdP^
< O, dK/d^
< 0; dK/d^
> O, dK/d{
>0
(8)
U m a v e z d e t e r m i n a d o o estoque de capital que o indivíduo deseja reter
e m portfólio, a restrição orçamentária irá determinar qual é a quantidade d e
m o e d a q u e será d e m a n d a d a por esse agente. T e m o s , então, que :
M*. = W - P,. K*.
(9)
Para obter esse resultado tivemos que supor d^QJdK'. = d^RJdK'. = O, ou seja, que as funções Q|,(K.)
e R|,(K.) são lineares em K.,
3 A determinação do preço Spot dos ativos de capital e a
não-neutralidade da moeda no longo prazo^ ^
N a seção anterior se analisou a decisão individual de alocação do estoque de
riqueza entre dois ativos, moeda e capital, tomando-se como dados os preços de
tais ativos. Resta agora saber como os preços de tais ativos, e m particular, o preço
spot do ativo capital é determinado.
A o longo da História do Pensamento Econômico surgiram dois métodos
para se lidar c o m a questão da determinação dos preços dos bens e serviços e m
geral. O primeiro método consiste no equilíbrio parcial marhalliano.
Este m é t o d o
se fundamenta n a desconsideração de todo o tipo de inter-relação existente entre
os diversos mercados q u e c o m p õ e m u m a economia qualquer. E m outras palavras,
ao s e analisar a d e t e r m i n a ç ã o d o p r e ç o de u m b e m e m particular, d e v e - s e
desconsiderar a influência que os demais mercados t ê m sobre a determinação
desse preço, b e m c o m o a repercussão que este t e m sobre os demais mercados.
O s e g u n d o m é t o d o consiste n o equilíbrio
geral walrasiano.
A o contrário d o equilíbrio parcial, o equilíbrio geral leva e m conta as inter-relações
existentes entre o s d i v e r s o s m e r c a d o s q u e c o m p õ e m u m a e c o n o m i a . S o b e s s e
a s p e c t o e l e seria m a i s realista e apropriado p a r a se analisar a d e t e r m i n a ç ã o
dos p r e ç o s d o s ativos d o q u e o m é t o d o de equiliTjrio parcial. C o n t u d o , c o m o é
o b s e r v a d o p o r C h i c k ( 1 9 9 3 , p . 1 7 ) , se o e q u i l í b r i o p a r c i a l m a r s h a l l i a n o
d e s c o n s i d e r a as inter-relações existentes entre os diversos m e r c a d o s ; o equilib r i o geral w a l r a s i a n o desconsidera a existência d o t e m p o e da incerteza. D e
fato, n o s m o d e l o s d e equililjrio geral A r r o w - D e b r e u , a incorporação d o t e m p o
é feita u n i c a m e n t e através d a i n d e x a ç ã o dos diversos b e n s e serviços c o m
b a s e n a data
na qual
eles
serão
entregues;
s e n d o q u e , t o d a s as t r a n s a ç õ e s
e n v o l v e n d o tais m e r c a d o r i a s são efetuadas n u m tínico instante d o t e m p o (Cf.
F a r m e r , 1 9 9 3 , p . 80). C o m o todas as transações o c o r r e m n o m e s m o instante
d o t e m p o , n ã o existe e s p a ç o p a r a q u e o s indivíduos p o s s a m d e m a n d a r m o e d a
(Cf. H a h n , 1981); u m a v e z que a retenção de m o e d a só será u m a atitude racio n a l p o r parte d o s a g e n t e s e c o n ô m i c o s n u m a economia
seqüencial,
isto é,
n u m a e c o n o m i a n a qual as transações são efetuadas a o longo d e u m a s e q ü ê n cia d e p e r í o d o s .
Pode-se argumentar, n o entanto, que os modelos de equilíbrio geral ArrowDebreu não são incompatíveis c o m a existência de seqüencialidade nas transações. D e fato, se os agentes puderem transacionar u m ativo - p o r exemplo, se o s
agentes puderem emprestar ou tomar emprestado u n s dos outros - entre os períodos nos quais os mercados estão "abertos", segue-se que as restrições orçamentárias de cada u m a desses agentes para os diversos períodos p o d e m ser colapsadas
e m u m ú n i c a restrição o r ç a m e n t á r i a intertemporal (Cf. Farmer, 1 9 9 3 , p . 8 1 ) .
A argumentação apresentada a seguir é baseada em Davidson (1978) e Carvalho (1992).
N e s s e caso, a solução d e equilíbrio e n c o n t r a d a p a r a o m o d e l o n o q u a l os mercados a b r e m apenas e m u m único p e r í o d o é idêntica à solução e n c o n t r a d a n o
m o d e l o n o qual os m e r c a d o s a b r e m e m todos o s p e r í o d o s .
Contudo, como b e m observado por Farmer [Ibid, p.81), essa argumentação
só é válida n u m contexto n o qual os agentes t ê m informação a respeito d a distribuição de probabilidades
dos eventos futuros. E m outros termos, tal argumentação é incompatível c o m o conceito Keynesiano d e incerteza. Sendo assim, o método d e equilíbrio geral será descartado e m benefício d o método d e equilíbrio parcial; fazendo-se u m a ressalva, contudo, para o manifesto irrealismo deste último.
Tendo definido o m é t o d o d e análise a ser e m p r e g a d o , p o d e m o s p a s s a r
p a r a a análise d a determinação d o p r e ç o d o s ativos d e capital.
O p r e ç o d o s ativos d e capital, c o m o o p r e ç o d e q u a l q u e r b e m ou serviço,
é d e t e r m i n a d o n o p o n t o e m q u e a demanda
e a oferta
de mercado
desses
ati-
vos se equalizam.
N o curto p r a z o , o estoque existente d e capital é fixo, ou
seja, a função oferta d o ativo capital é r e p r e s e n t a d a p o r u m a reta vertical n o
plano < P|^, K > ( Figura 3). N o l o n g o - p r a z o , c o n t u d o , o estoque d e capital
p o d e variar livremente, d e v i d o à possibilidade d e se e n c o m e n d a r n o v o s b e n s
d e capital j u n t o às fábricas q u e p r o d u z e m tais b e n s . S u p o n d o q u e as firmas
q u e p r o d u z e m o p e r a m c o m retornos d e escala c o n s t a n t e s ; segue-se q u e o preço de oferta d o s referidos ativos n ã o irá variar c o m a q u a n t i d a d e p r o d u z i d a d e
capital. E m r e s u m o , a oferta d e capital é c o m p l e t a m e n t e inelãstica
n o curto
p r a z o ; m a s é perfeitamente
elástica n o l o n g o p r a z o .
A d e m a n d a d e m e r c a d o d o s ativos d e capital é obtida através d a agregação d a s d e m a n d a s individuais d o s ativos e m q u e s t ã o . T e m o s , e n t ã o , q u e :
K ^ - E K - ( P J ^ , 0 , g
onde :
;i^1,...,n
(9)
é a demanda de mercado d o s ativos d e capital , n é o n ú m e r o de
d e m a n d a n t e s desse ativo.
onde :
K ' : e s t o q u e d e capital
existente n o curto p r a z o .
K * : e s t o q u e d e capital d e
equilíbrio d e longo p r a z o .
P* k : p r e ç o spot
P* ^ : p r e ç o d e oferta.
\
P%
•
K'
Figura 3
K*
•
K
N a Figura 3 observa-se que a curto prazo, o preço dos ativos de capital d e v e se ajustar de f o r m a a f a z e r c o m q u e os i n d i v í d u o s f i q u e m d i s p o s tos a r e t e r e m s e u s p o r t f o l i o s t o d o o e s t o q u e d e c a p i t a l q u e e x i s t e n a e c o n o m i a . O p r e ç o spot a s s i m d e t e r m i n a d o só p o r p u r a c o i n c i d ê n c i a s e r á i g u a l
ao p r e ç o de oferta d o s a t i v o s d e c a p i t a l . N o p o n t o A o b s e r v a - s e q u e o
p r e ç o spot é m a i o r d o q u e o p r e ç o d e o f e r t a d o s a t i v o s e m c o n s i d e r a ç ã o .
I s s o significa q u e os a g e n t e s e c o n ô m i c o s e s t ã o d i s p o s t o s a p a g a r u m p r e ç o
mais elevado pelos ativos de capital do que o preço que custa para produzi-los. Essa situação deverá estimular a p r o d u ç ã o de n o v o s b e n s de capital
(Cf. C a r v a l h o , 1 9 9 2 , p p . 1 2 0 - 1 2 9 ) . O s e m p r e s á r i o s c o n t i n u a r ã o i n v e s t i n d o
n a c o m p r a d e n o v o s b e n s d e c a p i t a l até o p o n t o e m q u e o p r e ç o spot d e s s e s
a t i v o s for i g u a l a o p r e ç o d e o f e r t a d o s m e s m o s . N e s t e p o n t o o i n v e s t i m e n to será igual a z e r o , e e s t a r á d e t e r m i n a d o o e s t o q u e d e c a p i t a l d e e q u i l í b r i o
de l o n g o p r a z o ( p o n t o B ) .
Resta, p o r fim, analisar a p r o p o s i ç ã o de K e y n e s d e q u e a m o e d a é n ã o neutra n o longo prazo. D e a c o r d o c o m K e y n e s :
The theory which I desiderate
would deal...
with an economy
in
which money plays a part of its own and affects motives
and
decisions
and is, in short, one of the operative
factors
in the situation,
so that the
course of the events cannot be predicted,
either in the long period
or in
the short ( grifo nosso),
without
a kwowledge
of the behavior
of
money
between
the first state and the last.
(CWJMK,
XIII, pp.
408-9).
A m o e d a é dita não-neutra
sobre as variáveis reais n o l o n g o p r a z o se e
s o m e n t e se variações d o estoque d e m o e d a existente n a e c o n o m i a f o r e m capazes de produzir variações n o e s t o q u e d e capital d e equilíbrio d e l o n g o p r a z o
da e c o n o m i a e m c o n s i d e r a ç ã o .
Para d e m o n s t r a r a n ã o - n e u t r a l i d a d e d a m o e d a , c o n s i d e r e m o s q u e o
" p r ê m i o d e l i q u i d e z " dos ativos d e capital é, e m larga m e d i d a , d e t e r m i n a d o
pelo estado de liquidez p r e v a l e c e n t e n a e c o n o m i a . E s s e e s t a d o d e liquidez,
por seu t u m o , d e p e n d e d a r e l a ç ã o entre o e s t o q u e de h a v e r e s m o n e t á r i o s existentes n a e c o n o m i a e o e s t o q u e d e h a v e r e s n ã o - m o n e t á r i o s . Isso significa que
quanto maior for o estoque de h a v e r e s m o n e t á r i o s r e l a t i v a m e n t e a o e s t o q u e de
haveres n ã o - m o n e t á r i o s , m a i s ''fácil"
d e v e r á ser a c o n v e r s ã o d e s t e s últimos
e m m e i o de p a g a m e n t o , ou seja, m a i o r d e v e ser a liquidez d o s ativos n ã o monetários. E s s a hipótese p o d e ser formalizada d o seguinte m o d o :
'y = Y ( M / K ) ; Y ' > 0
(10) 1 7
" Uma hipótese semelhante a essa é feita por Minsky (1975, pp.102-105) no contexto da teoria do
investimento. De acordo com Minsky, o fator de capitalização aplicado à determinação do valor presente
dos rendimentos de um ativo de capital (C^) seria apenas uma fração do valor do fator de capitalização
utilizado na determinação do valor presente dos rendimentos dos ativos financeiros (C), ou seja, C|^= |i,
C|, 0 < n < l . Um aumento da oferta de moeda seria capaz não só de aumentar o valor de C,, como também
pode mudar a relação entre
e Cj.
A e q u a ç ã o ( 1 0 ) a p r e s e n t a o fator d e p r o p o r c i o n a l i d a d e e n t r e o " p r ê mio de liquidez" dos ativos de capital e o "prêmio de liquidez" da moeda
como u m a função da relação entre o estoque de moeda e o estoque de
a t i v o s d e c a p i t a l . Q u a n t o m a i o r for o e s t o q u e d e m o e d a r e l a t i v a m e n t e a o
e s t o q u e d e a t i v o s d e c a p i t a l e x i s t e n t e n a e c o n o m i a , m a i o r s e r á , ceteris
paribus,
o estado de liquidez
p r e v a l e c e n t e n a e c o n o m i a ; ou seja, m a i s fácil s e r á a c o n v e r s ã o d o s a t i v o s d e c a p i t a l e m m e i o d e p a g a m e n t o , a u m e n tando, c o m isso, o seu "prêmio de liquidez".
S u p o n h a m o s , a g o r a , q u e a s autoridades
monetárias
resolvam aumentar o e s t o q u e d e m o e d a e x i s t e n t e n a e c o n o m i a a t r a v é s d e u m a o p e r a ç ã o d e
open-market.
S e g u e - s e , p o r t a n t o , q u e D M = - D K , ou seja, o e s t o q u e d e
capital existente na e c o n o m i a irá se reduzir na m e s m a proporção na qual o
e s t o q u e d e m o e d a a u m e n t a . N o s t e r m o s d a figura .3, e s s a p o l í t i c a d e v e r á
ter d o i s e f e i t o s : e m p r i m e i r o lugar, e l e d e s l o c a r á a c u r v a q u e r e p r e s e n t a a
quantidade d e capital q u e a economia possui no curto prazo para a esquerd a ; p r o d u z i n d o , p o r t a n t o , u m a u m e n t o d o p r e ç o spot d o s ativos d e c a p i t a l .
C o m o r e s u l t a d o d a e l e v a ç ã o d o p r e ç o spot d e s s e s a t i v o s , s e g u e - s e q u e a
diferença
e n t r e o p r e ç o spot e o p r e ç o d e o f e r t a d o s r e f e r i d o s a t i v o s d e v e
a u m e n t a r , e s t i m u l a n d o o s e m p r e s á r i o s a i n v e s t i r m a i s . P o r t a n t o , o s efeitos
de curto p r a z o da política monetária expansiva são os seguintes: aumento
d o p r e ç o spot d o s a t i v o s d e c a p i t a l - ou seja, u m a u m e n t o d a c o t a ç ã o d a s
ações nas bolsas de valores - seguido por u m aumento do dispêndio na
c o m p r a d e b e n s d e c a p i t a l , isto é, u m a u m e n t o d o i n v e s t i m e n t o a g r e g a E m s e g u n d o lugar, a p o l í t i c a m o n e t á r i a e x p a n s i v a , a o alterar o estado
de liquidez
existente na economia, deverá deslocar a curva de demanda de
m e r c a d o d o s a t i v o s d e c a p i t a l p a r a c i m a ( F i g u r a 4 ) . I s s o d e c o r r e d o fato
de q u e o aumento do estado de liquidez da economia - medido pela relação
M / K - à m e d i d a q u e a u m e n t a o "prêmio de liquidez" dos ativos de capital
vis-à-vis o "prêmio de liquidez da m o e d a " , irá aumentar a taxa de retorno
d o s a t i v o s d e c a p i t a l ; e s t i m u l a n d o , d e s s a f o r m a , a substituição
de
moeda
por
ativos
n e u m novo
de capital
ponto
no portfólio
de equilíbrio
dos agentes.
de longo
prazo
C o n s e q ü e n t e m e n t e , se d e f i ( p o n t o C da F i g u r a 4 ) , n o
qual o estoque de capital de equilíbrio é mais elevado. E m outras palavras,
a o p e r a ç ã o d e open-market
conduzida pelas autoridades monetárias, ao
a l t e r a r o e s t a d o d e l i q u i d e z p r e v a l e c e n t e n a e c o n o m i a , foi c a p a z d e deslocar as preferências
dos investidores
em direção
aos ativos
de capital.
Dessa
" o aumento do investimento agregado explica a não-neutralidade da moeda no curto prazo. De fato, esse
aumento do investimento irá produzir um aumento do volume de demanda efetiva, por intermédio do
multiplicador do investimento, o qual resultará e m um aumento do nível de emprego e de produção de
equilíbrio, dado o nível de salário nominal e as condições técnicas de produção.
forma, o estoque de capital de equilíbrio de longo prazo aumentou relativ a m e n t e a s i t u a ç ã o inicial n a q u a l o estado de liquidez
era m e n o r . S e g u e se, p o r t a n t o , q u e a p o l í t i c a m o n e t á r i a é n ã o - n e u t r a s o b r e as v a r i á v e i s r e a i s
da economia, m e s m o no longo-prazo.
P\
Conclusão
K:
Ko
K
K
A o longo do presente artigo, apresentamos os microfundamentos
K e y n e s i a n o s d a n ã o - n e u t r a l i d a d e da m o e d a n o longo p r a z o . Foi d e m o n s t r a d o
q u e a p r o p o s i ç ã o d a não-neutralidade d a m o e d a n o l o n g o prazo d e v e ser analisada n o c o n t e x t o d e u m m o d e l o de escolha de portfólio n o qual os agentes
l e v e m e m conta, n o m o m e n t o e m que estão decidindo a respeito de q u e ativos
m a n t e r e m carteira, todos os atributos
dos diferentes ativos. E m particular,
d e v e - s e c o n s i d e r a r explicitamente o atributo "prêmio
de liquidez",
o qual é
i g n o r a d o pelas abordagens convencionais a respeito da c o m p o s i ç ã o de
portfólio, que t e n d e m a considerar esse atributo c o m o u m sinônimo do
"prêmio de risco".
A i n c l u s ã o d o " p r ê m i o de l i q u i d e z " n a decisão d e escolha de portfólio
t e m c o m o r e s u l t a d o a idéia de que as operações
de open-market
são c a p a z e s
de alterar o e s t o q u e d e capital de equilíbrio d e longo p r a z o de u m a e c o n o m i a ;
t o r n a n d o , p o r t a n t o , a m o e d a não-neutra n o l o n g o p r a z o .
D e v e - s e observar que a não-neutralidade da m o e d a n o modelo Keynesiario
d e e s c o l h a de portfólio não se deriva de n e n h u m tipo d e imperfeição
ou rigidez nominal.
D e fato, o m o d e l o K e y n e s i a n o de escolha d e portfólio é perfeitam e n t e c o m p a t í v e l c o m a existência de concorrência
perfeita
nos m e r c a d o s
dos diferentes ativos; b e m c o m o , não se baseia n a hipótese d e q u e a t a x a n o m i n a l de r e t o r n o d a m o e d a é fixada institucionalmente, tal c o m o ocorre e m
o u t r o s m o d e l o s d e inspiração Keynesiana, c o m o , por e x e m p l o , o m o d e l o de
e s c o l h a d e portfólio d e J a m e s Tobin. T u d o o q u e é necessário p a r a fundamentar a n ã o - n e u t r a l i d a d e da m o e d a n o longo p r a z o é a idéia d e que, sob incerteza
forte, os indivíduos v a l o r i z a m a p o s s e d e ativos líquidos; e s t a n d o , p o r t a n t o ,
dispostos a sacrificar a l g u m rendimento monetário e m troca da "conveniência" e da "segurança" proporcionadas pela posse de ativos líquidos.
Nesse contexto, a política monetária é capaz de influenciar o estoque d e capital de equilíbrio de longo prazo à m e d i d a q u e ela p o d e alterar a
relação entre o "prêmio de liquidez" da m o e d a e o "prêmio de liquidez" dos
ativos d e capital. E m concreto, u m a política monetária expansiva p o d e a u m e n tar o " p r ê m i o de liquidez" dos ativos d e capital, a u m e n t a n d o , d e s s a forma, a
t a x a d e r e t o m o d e s s e s a t i v o s . T a l f a t o , i r á e s t i m u l a r a substituição
por ativos
de capital;
de
moeda
o q u e irá a u m e n t a r o e s t o q u e d e capital d e equilíbrio d e
longo prazo dessa economia.
D.O.G
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