ESTRUTURA TRIDIMENSIONAL DAS PROTEÍNAS Hélice tripla do colágeno: os resíduos de Gly estão mostrados em vermelho Duas representações da estrutura terciária da mioglobina do cachalote: o grupo heme está mostrado em vermelho Curso de Ciências Biológicas – UNESP, Campus de Jaboticabal Disciplina de Engenharia de Proteínas – 2015 Prof. Dr. Jesus Ap. Ferro Bibliografia: Princípios de Bioquímica de Lehninger - 5a.edição NELSON, D.L., COX, M.M. Artmed Editora, Porto Alegre, 2011. 1273p Existem Diversos Níveis de Estrutura Protéica Estrutura Primária Sequência de aa unidos por ligação peptídica Estrutura Secundária Arranjos estáveis dos resíduos de aminoácidos, dando origem a padrões estruturais recorrentes Estrutura Terciária Dobramento tridimensional da cadeia de aminoácidos Estrutura Quaternária Arranjo espacial de duas ou mais cadeias (proteínas oligoméricas) Cada proteína possui uma estrutura tridimensional única Molécula de Glicina Estrutura da enzima Quimotripsina, uma proteína globular ESTRUTURA TRIDIMENSIONAL DAS PROTEÍNAS Aspectos Importantes sobre a Estrutura Tridimensional das Proteínas: 1. A estrutura tridimensional de uma proteína é determinada por sua sequência de aminoácidos. 2. O arranjo espacial dos átomos em uma proteína é chamado de conformação. 3. A função de uma proteína depende de sua estrutura. 4. Uma proteína isolada tem estrutura única ou quase única. 5. As interações não-covalentes são as forças mais importantes que estabilizam a estrutura específica mantida por uma dada proteína (estrutura terciária e/ou quaternária). 6. Entre o grande número de estruturas de proteínas únicas, é possível reconhecer alguns padrões estruturais comuns que nos ajudam a organizar nossa compreensão da arquitetura protéica. CONFORMAÇÃO DAS PROTEÍNAS -Conformação é a denominação dada ao arranjo espacial dos átomos de uma proteína. -As possíveis conformações de uma proteína incluem qualquer estado estrutural que possa ser atingido sem romper as ligações covalentes rotação em torno de uma ligação simples. -Uma proteína que contenha centena de ligações simples pode, teoricamente, apresentar centenas de conformações possíveis. Entretanto, em condições biológicas predominam apenas uma ou algumas. -A conformação existente sob um determinado conjunto de condições é a termodinamicamente mais estável, tendo a menor energia livre de Gibbs (G). -As proteínas, em qualquer de suas conformações enoveladas funcionais, são denominadas de proteínas funcionais (estado nativo). A conformação de uma proteína é estabilizada em grande parte por interações fracas -Estabilidade: Tendência à manutenção de uma conformação nativa. -Proteínas nativas: são apenas ligeiramente estáveis. a diferença de energia livre (G) entre os estados enovelado funcional (proteína nativa) e desenovelado não-funcional (proteína inativa) é pequena: 20 a 65 kJ/mol -”Forças” que tendem a manter o estado desenovelado: Entropia conformacional (estado desorganizado) e pontes de hidrogênio entre os grupo da cadeia polipetídica e o solvente (água). -”Forças” que estabilizam a conformação nativa: Forças Predominantes Ponte de dissulfeto (ligação covalente) . Energia necessária para romper uma ligação covalente simples = 200 a 400 kJ/mol Interações fracas (ligação não-covalente): pontes de hidrogênio; interações hidrofóbicas, interações iônicas (pontes salina) e forças de Van der Waals. Energia necessária para romper as interações fracas = 4 a 30 kJ/mol Os padrões estruturais das proteínas seguem duas regras simples: 1. Os resíduos hidrofóbicos estão, em sua maioria, mantidos no interior da molécula protéica, afastados da água. 2. O número de pontes de hidrogênio e de interações iônicas dentro da proteína é maximizado, reduzindo o número de hidrogênios e de grupos iônicos que não estão emparelhados. As proteínas insolúveis e as de membranas seguem regras diferentes. A Ligação Peptídica é Rígida e Plana Isso limita o número de conformações que a cadeia polipetídica pode assumir, pois não há livre rotação na ligação C-N Cada ligação peptídica possui caráter de dupla ligação Caráter parcial de dupla ligação O oxigênio carbonílico possui uma carga parcial negativa e o nitrogênio amídico uma carga parcial positiva, gerando um pequeno dipolo elétrico. Virtualmente, todas as ligações peptídicas nas proteínas ocorrem nesta configuração trans. Configuração cis é instável razão cis/trans = 1:1000 Excessão é a Prolina O Grupo Peptídeo Planar -180o a +180o O R Carboxiterminal C N C Aminoterminal O Cα Cα N R N C O Cα R Cada ligação peptídica possui algum caráter de dupla ligação devido à ressonância e não consegue girar -Três ligações separam os carbonos α sequenciais em uma cadeia polipetídica: Cα C, C N e N Cα -As ligações Cα C e N Cα e podem sofrer rotações em ângulos denominados (fi) (psi), respectivamente. -A ligação peptídica C N não é livre para girar. As conformações dos peptídeos são definidas pelos valores de (fi) (psi) Os valores permitidos para (fi) (psi) são graficamente revelados quando é representado contra em um diagrama de Ramachandran Raios de van der Waals e ângulos de ligações conhecidos Conformações que não envolvem sobreposições estéricas, sendo totalmente permitidas Conformações que são permitidas se houver uma pequena flexibilidade nos ângulos de ligação Conformações permitidas nos limites extremos para os contatos atômicos desfavoráveis ESTRUTURA SECUNDÁRIA DAS PROTEÍNAS Estrutura secundária: refere-se à conformação local de alguma porção de um polipeptídio. Principais tipos de estrutura secundária: α-hélice conformação β (Folha β pregueada) α-Hélice : Modelos mostram aspectos diferentes de sua estrutura Eixo da hélice Hélice orientada para a direita Hélice orientada para a direita Pontes de hidrogênio intracadeia mantem a estrutura Os planos da ligações peptídicas rígidas são paralelos ao eixo da hélice Modelo bola-e-bastão mostrando as pontes de hidrogênio intracadeia α-Hélice vista a partir da extremidade superior (de cima) Grupos R ficam perpendiculares ao eixo da hélice e voltados para fora Falsa impressão de espaços vazios no interior da hélice, pois aqui não está representado os raios de van der Waals dos átomos individuais. Os átomos no centro da α-hélice estão bem próximos entre si, em contato muito estreito. Modelo espaço-cheio Método para identificar hélices orientadas à direita ou à esquerda Mão esquerda Sentido horário = hélice orientada à esquerda Mão direita Sentido anti-horário = hélice orientada à direita Nos dois casos, a hélice faz uma espiral para cima no polegar na direção dos dedos curvados A sequência de aminoácidos afeta a estabilidade da α-hélice Interações entre os grupos R de aminoácidos separados por três resíduos em uma α-hélice Arg103 Interação iônica entre Asp100 e Arg103 em uma região α-helicoidal da proteína troponina C (ligante de cálcio no músculo esquelético) Asp100 Segmento helicoidal de 13 resíduos Restrições para a formação de uma α-hélice estável -Presença de uma sequência de aminoácidos com mesma carga impede a formação de α-hélice: grupos carregados com a mesma carga se repelem -sequências contendo Glu e Asp adjacentes (carga – em pH 7,0) -Seqüências contendo Lys e Arg adjacentes (carga + em pH 7,0) -Presença de uma sequência de aminoácidos com grupos laterais (Grupos R) volumosos impede a formação de α-hélice: impedimento estérico. -sequências contendo Asn, Ser, Thr e Cys adjacentes (grupos R com grande volume que tentam ocupar o mesmo espaço) -Presença de resíduos de Pro e ou Gly -A presença de Pro introduz uma torção na α-hélice, pois neste aminoácido o átomo de N é parte de um anel rígido e a rotação sobre a ligação N C não é possível. Além disso, o átomo de N de um resíduo de Pro não possui o H para formar pontes de H com outros resíduos. Raramente Pro é encontrada em uma α-hélice. -A Gly possui maior flexibilidade de conformação do que os demais aminoácidos. Polímeros de Gly tendem a formar estruturas espiraladas bem diferentes de uma α-hélice. A conformação β organiza as cadeias polipetídicas em folhas Folha β formada por cadeias polipeptídicas adjacentes antiparalelas Vista superior Vista lateral Grupos R projetam-se para fora da folha β (para baixo e para cima) Pontes de hidrogênio intercadeias mantém a estrutura Folha β formada por cadeias polipeptídicas adjacentes paralelas Vista superior Vista lateral Grupos R projetam-se para fora da folha β (para baixo e para cima) Pontes de hidrogênio intercadeias mantém a estrutura Estruturas Terciária e Quaternária das Proteínas -Estrutura terciária: É o arranjo tridimensional geral de todos os átomos em uma proteína. -Estrutura quaternária: Algumas proteínas contêm duas ou mais cadeias polipeptídicas separadas, ou subunidades, que podem ser idênticas ou diferentes. O arranjo dessas subunidades protéicas em complexos tridimensionais constitui a estrutura quaternária. “FORÇAS” QUE MANTÉM OS NÍVEIS ESTRUTURAIS NÍVEIS ESTRUTURAIS “FORÇAS” QUE OS MANTÉM Estrutura Primária Ligação peptídica Estrutura Secundária -hélice: pontes de hidrogênio intracadeia Conformação β: pontes de hidrogênio intercadeias Hélice tripla do colágeno: ligações cruzadas covalentes não usuais envolvendo Lys, HyLys (5hidroxilisina) ou resíduos de His Estrutura Terciária Interações iônica; Pontes de hidrogênio; Interações hidrofóbicas; Forças de van der Waals, Pontes de dissulfeto Estrutura Quaternária Interações iônica; Pontes de hidrogênio; Interações hidrofóbicas; Forças de van der Waals, Pontes de dissulfeto Com base na estrutura, as proteínas podem ser classificadas em dois grupos: -Proteínas fibrosas: Possuem cadeias polipeptídicas arranjadas em longas fitas ou folhas. -Proteínas globulares: Possuem cadeias polipeptídicas enoveladas em uma forma esférica ou globular. Estes dois grupos, fibrosas e globulares, diferem funcionalmente: Proteínas fibrosas: formam as estruturas que fornecem apoio, forma e proteção externa aos vertebrados. Proteínas globulares: formam a maior parte das enzimas e proteínas reguladoras. As proteínas fibrosas estão adaptadas para a função estrutural -Queratina, Colágeno e Fibroína da seda ilustram adequadamente a relação entre a estrutura da proteína e a função biológica. Estruturas secundárias e propriedades de proteínas fibrosas Estrutura α-hélice, unidas por pontes de dissulfeto cruzadas Características Exemplos de ocorrência Estruturas protetoras insolúveis, resistentes, com dureza e flexibilidade variáveis Conformação β Filamentos flexíveis, moles Hélice tripla do colágeno Alta força de tensão, sem estiramento α-queratina do cabelo, penas e unhas Fibroína da seda Colágeno de tendões, da matriz dos ossos - As proteínas fibrosas compartilham propriedades que dão forma e/ou flexibilidade às estruturas onde elas ocorrem. - Em cada caso, a unidade estrutural fundamental é um elemento de repetição simples da estrutura secundária. - Todas as proteínas fibrosas são insolúveis em água, devido à alta concentração de resíduos de aminoácidos hidrofóbicos tanto no interior como na superfície da proteínas. Essas superfícies hidrofóbicas são largamente encobertas por muitas cadeias polipeptídicas semelhantes que, empacotadas juntas, formam complexos supramoleculares elaborados As estruturas das proteínas globulares são compactas Soroalbumina humana: 585 resíduos e Massa molecular de 64.500 Daltons A forma globular é a mais compacta e a que confere menor tamanho à molécula A diversidade estrutural reflete a diversidade funcional das proteínas Estrutura terciária da mioglobina do cachalote Grupo Heme Representação em fita Representação em fita incluindo as cadeias laterais (azul) dos aa hidrofóficos (Leu, Ile, Val e Phe) Imagem em retículas enfatiza a superfície da proteína Modelo espaço cheio com todas as cadeias laterais dos aminoácidos Imagem da superfície de contorno mostra cavidades onde outras moléculas podem se ligar A mioglobina contém uma única cadeia polipeptídica contendo 153 resíduos de aminoácidos e um único grupo heme onde se liga o O2. O grupo heme é o responsável pela cor vermelha escura da mioglobina e da hemoglobina. A mioglobina é muito abundante nos músculos dos mamíferos que mergulham (baleia, foca, boto). Nestes animais os músculos são tão ricos nessa proteína que eles tem a cor marron. Estruturas tridimensionais de algumas proteínas pequenas Citocromo C Lisozima Ribonuclease Quantidades aproximadas de -hélice e conformação β em algumas proteínas de cadeia única. Padrões de enovelamento estáveis nas proteínas Alça β--β Conexão típica em um motivo todo β Conexão orientada à direita entre fitas β Centro-- Conexão cruzada (não observada) Conexão orientada à esquerda entre fitas β (muito raras) Folha β torcida Barril β Estrutura quaternária da hemoglobina Representação em fita Modelo espaço cheio A hemoglobina é constituída de 4 cadeias polipeptídicas (subunidades), sendo duas cadeias (iguais entre si e com 141 aa ) e duas cadeias β (iguais entre si e com 146 aa), cada uma delas possuindo um grupo heme (em vermelho) onde se liga o oxigênio. Nestas figuras está representada a estrutura da desoxihemoglobina (hemoglobina sem moléculas de oxigênio ligadas aos grupos heme), onde é possível ver como as quatro subunidades polipeptídicas estão empacotadas juntas. A perda da estrutura de uma proteína resulta na perda da função -A evolução das estruturas das proteínas para que desempenhassem uma função ocorreu em ambientes celulares específicos (pH, temperatura, força iônica, etc). -Condições diferentes daquelas presentes na célula podem resultar em grandes ou pequenas alterações estruturais da proteína. A perda da estrutura tridimensional suficiente para causar a perda da função é chamada de desnaturação. - O estado desnaturado não é necessariamente igual ao completo desenovelamento da proteína. Em muitas condições a desnaturação das proteínas existe em um conjunto de estados parcialmente enovelados que são pouco entendidos. -A maioria das proteínas pode ser desnaturada pelo calor, que afeta as interações fracas em uma proteína, principalmente as pontes de hidrogênio. Entretanto, os efeitos do calor nas proteínas não são facilmente previsíveis. Quando se compara a estrutura de proteínas homólogas de E. coli e de bactérias termofílicas que vivem em fontes de água quente de aproximadamente 100 oC, a diferença observada na estrutura é muito pequena. -Além da temperatura, outros agentes também causam a desnaturação de proteínas: extremos de pH; alguns solventes orgânicos miscíveis como o álcool ou a acetona; certos compostos como a uréia e o cloreto de guanidina; detergentes como dodecilsulfato de sódio (SDS). Cada um destes agentes desnaturantes representa um tratamento relativamente moderado para que nenhuma ligação covalente seja quebrada. Se o tratamento leva à quebra de ligação peptídica, temos então uma hidrólise da proteína, que pode ser parcial ou total. A sequência de aminoácidos determina a estrutura terciária -A estrutura terciária de uma proteína globular é determinada pela sua sequência de aminoácidos. Uma prova disso foi obtida em experimentos que demonstraram que a desnaturação de algumas proteínas era reversível. -Algumas proteínas globulares desnaturadas pelo calor, extremos de pH ou reagentes desnaturantes recuperavam suas propriedades biológicas se retornassem às condições onde a conformação nativa é estável. Esse processo é chamado de renaturação. 26 Estado nativo; catalicamente ativo Adição de uréia e de mercaptoetanol -O exemplo clássico é a desnaturação e renaturação da ribonuclease, realizado por Christian Anfinsen na década de 50. -A ribonuclease purificada pode ser completamente desnaturada pela exposição a uma concentração de uréia na presença de um agente redutor. -O agente redutor cliva as 4 pontes de dissulfeto para produzir 8 resíduos de Cys e a uréia rompe as interações hidrofóbicas, levando assim à completa perda da conformação enovelada. -A desnaturação da ribonuclease é acompanhada por perda completa da atividade catalítica. -Quando a uréia e o agente redutor são removidos (por diálise), as espirais da ribonuclease, que estavam desnaturadas e numa conformação ao acaso, se reenovelam espontaneamente na sua estrutura tridimensional correta, com restauração completa da sua atividade catalítica. Assim, como nada é adicionado no meio, a única informação utilizada para aquisição da estrutura tridimensional correta é a da sequência de aminoácidos. Estado desenovelado; inativo. Ligações cruzadas de dissulfeto reduzidas produzindo resíduos de Cys Remoção da uréia e de mercaptoetanol Estado nativo; catalicamente ativo. Ligações cruzadas de dissulfeto corretamente refeitas