AS MUDANÇAS NA POLÍTICA DE EDUCAÇÃO SUPERIOR BRASILEIRA E O REFLEXO NO SERVIÇO SOCIAL Rosiléa Clara Werner 1 Resumo: O modelo de educação superior desencadeado pela declaração de Bolonha e assumido pelo Espaço Europeu de Educação Superior é um modelo de mobilização, que influenciou a educação universitária no Brasil. As instituições de ensino superior precisam ter claro as concepções do SINAES na elaboração do projeto político pedagógico dos cursos, elaborando-o coletivamente, considerando o contexto em que o curso está inserido, perfil do egresso, e as competências e habilidades profissionais que o estudante demonstrará ao final do curso. Em abril de 2009 segundo dados do INEP/MEC há 331 cursos de Serviço Sociais sendo 83,38% privados e apenas 16,61% públicos. Palavras-chave: Educação superior, cursos de Serviço Social, competências, habilidades. Abstract: The model of Higher education unchained by Bolonha Declaration and assumed by the European Space of Higher Education is a mobilization model, that influenced the university education in Brazil. The institutions of higher education need to know the conceptions of the SINAES in the elaboration of the project pedagogical politic of the courses, elaborating whit a group, considering the context, profile of the egress, and the competencies and abilities. In April of 2009 as given of the INEP/MEC it has 331 Social Work courses, of this courses 88,38% are privates and 16,61% are in public university. Key words: Higher education, Social Work courses, competencies, abilities. 1 Mestre. Pontifícia Universidade Católica – São Paulo. E-Mail: [email protected] 1. INTRODUÇÃO: A LDB – Lei de Diretrizes e Bases de Educação - atual do país é de 1996, a partir dela houve mudanças nas normativas para a educação superior, tanto em relação a oferta de cursos, quanto em relação a organização dos cursos, propondo a flexibilização, autonomia das instituições, e não mais um currículo mínimo e sim linhas gerais capazes de desenvolver as competências e habilidades necessárias ao futuro profissional. A normativa mais e polemica é o SINAES, que objetiva a melhoria da qualidade da educação superior, a orientação da expansão da sua oferta, o aumento permanente da sua eficácia institucional, da sua efetividade acadêmica e social e, principalmente, do aprofundamento dos compromissos e responsabilidades sociais das instituições de educação superior, por meio da valorização de sua missão pública, da promoção de valores democráticos, do respeito à diferença e a diversidade, da afirmação da autonomia e da identidade institucional. O curso de Serviço social surge no Brasil na década de trinta. Na última década, em função das mudanças nas normativas para os cursos superiores, tem ampliando muito a oferta do curso no país, atualmente são 331 cursos. 2. O ENSINO SUPERIOR BRASILEIRO E AS COMPETÊNCIAS E HABILIDADES. O novo modelo de educação superior desencadeado pelo processo de Bolonha e assumido pelo Espaço Europeu de Educação Superior é um modelo de mobilização, o que não significa que vá gerar boas práticas ou resultados, mas certamente influenciou a educação universitária em todo o mundo, inclusive no Brasil2 Até pouco tempo (2002) as propostas curriculares de ensino superior no Brasil eram pautadas na educação centrada em conteúdos informacionais em que os acadêmicos absorvem conteúdos, conceitos e procedimentos compartimentalizados em diferentes disciplinas, a aprendizagem ocorria por absorção de conteúdos informativos. 2 Autores que escrevem sobre a influência do tratado de Bolonha na educação brasileira: GOMES s.d; LIMA & AZEVEDO 2008. O redirecionamento dos currículos de graduação toma fôlego com a Lei n0 9.131/95 que cria o Conselho Nacional de Educação (CNE), este órgão delibera sobre as Diretrizes Curriculares propostas pelo MEC para os cursos de graduação. A nova perspectiva de diretrizes curriculares para cursos de graduação é desenhada a partir da LDB (Lei n0 9.394/96) no primeiro mandato do Presidente Fernando Henrique Cardoso. A LDB traz como eixo articulador da proposta para o ensino superior a flexibilidade e a avaliação. O inciso II do artigo 53 da LDB determina a criação de Diretrizes Curriculares para os cursos de graduação e permite a eliminação do currículo mínimo. As mudanças propostas refletem essencialmente nos processos de elaboração curricular que, antes centrados nos conteúdos mínimos e na respectiva de grade curricular, passaram a privilegiar a flexibilidade curricular. Neste novo contexto é que se sobressai a importância das competências e habilidades que devem ser construídas ao longo dos cursos, a partir do trabalho realizado sobre os conteúdos curriculares. Esta relação, necessariamente presente em todas as disciplinas e atividades, é referenciada, para todo o desenvolvimento curricular, no Projeto Pedagógico do curso. O Parecer n0 776/97 propõe que as diretrizes curriculares assegurem a flexibilidade e a qualidade na formação, propondo os seguintes princípios: ampla liberdade na composição de estudos a serem ministrados, redução da duração dos cursos, sólida formação geral, práticas de estudos independentes, articulação teoria-prática e avaliações periódicas com instrumentos variados. Especificamente em relação a competências e habilidades, o Parecer Nº:776/97 de 03 de dezembro de 1997propõe: “Encorajar o reconhecimento de conhecimentos, habilidades e competências adquiridas fora do ambiente escolar, inclusive as que se referirem à experiência profissional julgada relevante”. (BRASIL,1997). No mesmo período, o Ministério de Educação e do Desporto, por meio da Secretaria de Educação Superior – SESu torna público e convoca as Instituições de Ensino Superior a apresentar propostas para as novas Diretrizes Curriculares dos cursos superiores, que serão elaboradas pelas comissões de Especialistas. O Edital n0 4/97 de 10/12/1997 faz uma orientação geral para a organização das Diretrizes Curriculares: As Diretrizes Curriculares têm por objetivo servir para as IES na organização de seus programas de formação, permitindo uma flexibilidade na construção dos currículos plenos e privilegiando a indicação de áreas do conhecimento a serem consideradas, ao invés de estabelecer disciplinas e cargas horárias definidas. As Diretrizes Curriculares devem contemplar ainda a denominação de diferentes formações e habilitações para cada área do conhecimento, explicitando os objetivos e demandas existentes na sociedade. (BRASIL 1997) A SESu/MEC propõe algumas orientações básicas a respeito dos seguintes princípios: perfil desejado do formado; competências e habilidades desejadas; conteúdos curriculares; duração dos cursos, estruturação modular dos cursos; estágios e atividades complementares; conexão com a avaliação institucional. A proposta da SESu/MEC é de que a discussão das diretrizes curriculares seja ampla e envolva a comunidade interessada, Instituições de Ensino Superior, Sociedades cientificas, associações profissionais e de classe, setor produtivo e outros. De acordo com o Parecer Nº:CNE/CES 583/2001 de 04 de abril de 2001, “Orientação para as diretrizes curriculares dos cursos de graduação”. Foram recebidas 1200 propostas bastante heterogêneas que foram sistematizadas por 38 comissões de especialistas. Destaca-se a variedade em termos de duração dos cursos em semestres: de quatro até 12, e de caraga horária, de 2000 até 6800horas. Na continuidade, em 2001, a Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de Educação, de maneira a garantir a flexibilidade, criatividade e responsabilidades das IES na elaboração das Diretrizes Curriculares, adotou uma orientação comum para sua elaboração. A orientação é dada através do Parecer N0 CNE/CES 583/2001 que expõe que a diretrizes devem contemplar: a. Perfil do formando/egresso/profissional – conforme o curso o projeto pedagógico deverá orientar o currículo para um perfil profissional desejado. b. Competências/ habilidades/atitudes. c. Habilitações e ênfase. d. Conteúdos curriculares. e. Organização do curso. f. Estágios e Atividades Complementares. g. Acompanhamento e Avaliação. Esta orientação vai se repetir em outras normativas como no Parecer N0 CNE/CES 67/2003 de 11 de março de 2003 que reafirma o propósito de estabelecer uma formação de nível superior contínua, autônoma e permanente, com sólida formação básica e uma formação profissional fundamentada na competência teórico-prática, observada a flexibilização curricular, autonomia e a liberdade das instituições de inovar seus projetos pedagógicos de graduação, para o atendimento das contínuas e emergentes mudanças para cujo desafio o egresso deverá estar apto. De acordo com as normativas para o ensino superior, as Instituições de Ensino Superior do Brasil têm o desafio de desenvolver uma proposta curricular por competência, o que é enfatizado pelo ENADE – Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes – no exame, são aferidas as habilidades acadêmicas e as competências profissionais. O ENADE faz parte Sistema Nacional de Avaliação de Educação Superior (SINAES) que foi implantado a partir da Lei 1086/04 de abril de 2004. O SINAES objetiva a melhoria da qualidade da educação superior, a orientação da expansão da sua oferta, o aumento permanente da sua eficácia institucional, da sua efetividade acadêmica e social e, principalmente, do aprofundamento dos compromissos e responsabilidades sociais das instituições de educação superior, por meio da valorização de sua missão pública, da promoção de valores democráticos, do respeito à diferença e a diversidade, da afirmação da autonomia e da identidade institucional. O ENADE avalia o potencial da aprendizagem nos estudantes do primeiro ano, e para os alunos concluintes é avaliado o domínio da área e as competências profissionais. Limana (2006) esclarece o entendimento de competências para o ENADE: Assim podemos tratar a competência como um processo de agir de maneira reflexiva e eficaz, em um determinado tipo de situação apoiada em um conjunto articulado e dinâmico de conhecimentos, saberes, habilidades e atitudes. A competência está associada ao cumprimento efetivo da ação e refere-se à capacidade de realização, com êxito, de uma determinada tarefa. Podemos falar em motivação para a competência, isto é, crenças de auto-eficácia na realização bem sucedida de tarefas, que seria a crença do indivíduo a própria habilidade para solucionar problemas com os quais se defronta. Desta maneira, as questões propostas no ENADE devem ser desafiadoras e interessantes, de forma a motivar os estudantes e responde-las. (p24) Brito (2008) no artigo “O SINAES e o ENADE: da concepção à implantação” argumenta que a competência profissional avaliada pelo ENADE é: a capacidade de mobilizar, articular e colocar em ação conhecimentos, habilidades, atitudes e valores necessários para o desempenho eficiente e eficaz de atividades requeridas pela natureza do trabalho e do desenvolvimento tecnológico. As competências reportam-se a desempenhos e atuações requeridas do concluinte e devem garantir ao profissional um domínio básico de conhecimentos e a capacidade de utilizá-los em diferentes contextos que demandam a investigação, análise, avaliação, prevenção e atuação em situações definidas, e na promoção da qualidade de vida (p. 846) E, a habilidade acadêmica avaliada pelo ENADE é a “a capacidade de um indivíduo realizar determinadas tarefas, solucionar determinados problemas, dominar com sucesso determinadas exigências do meio, obtendo e demonstrando domínio do conhecimento e de tarefas relativas a uma determinada atividade”. (BRITO. 2008:846) 3. MAPEAMENTO HISTÓRICO DAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR COM CURSO DE SERVIÇO SOCIAL NO BRASIL Diante da nova política de ensino superior para o país, a categoria dos profissionais de serviço social, discute uma proposta com base no novo currículo aprovado pela categoria em 1996, que venha a atender as exigências da LDB. A diretoria da ABEPSS na gestão 1998-2000 privilegiou como eixo de ação da gestão a temática, “política de ensino Superior no Brasil: a Regulamentação da LDB e as implicações para o Serviço Social”. Tinha o objetivo de avaliar criticamente as inovações decorrentes da LDB, identificando as conseqüências para a implementação do projeto ético-político profissional do Serviço Social. Com o intuito de fomentar o debate entre setembro e novembro de 1999 promoveu várias oficinas locais, seis oficinas regionais e um seminário nacional em Brasília3, neste seminário participaram professores, estudantes e profissionais, representando 45 unidades de ensino e 12 CRESS, e articulou as três entidades da categoria (ABEPSS, CFESS e ENESSO) na organização das ações. Além da articulação das entidades, estas estratégias permitiram unir graduação e pós-graduação para debater um tema transversal e que rebate em ambas. A ABESS acompanhou de forma sistemática a tramitação das Diretrizes Curriculares junto a Secretaria de Ensino Superior (SESu) do Ministério da Educação (MEC), Os cursos de Serviço social no Brasil iniciam na década de 1930, na região sudeste, nestes quase oitenta anos, o Brasil passou pela modernização industrial e tecnológica e muitas mudanças na área educacional. As escolas de Serviço Social no país tiveram seu início atrelado à iniciativa privada e filantrópica. Neste momento da tese, a proposta é de identificar o crescimento em número das Instituições de Ensino Superior que oferecem o curso de Serviço social no país, sua distribuição no tempo, no espaço, e na forma de financiamento.4 3 O resultado das discussões do Seminário Nacional está da Revista Temporalis n01(jan a jun) 2000. 4 Para uma leitura aprofundada sobre a política educacional, o desenvolvimento e expansão dos cursos de Serviço Social n Brasil, recomendo a tese de PEREIRA (2007), e o item Ensino Universitário e Formação Acadêmico-profissional; do livro de IAMAMOTO (2008) Segundo a base de dados do MEC/INEP, de abril de 2009, existem 331 cursos de Serviço Social no país, destes 49% estão em universidades, 32% em faculdades, 12,9% em Centro Universitário e 5,7% em Instituto de Ensino superior. Somando as Universidades e Centros Universitários que possuem o curso de Serviço Social, são 206 cursos, conseqüentemente 62,23 % dos cursos oferecidos no Brasil obrigatoriamente desenvolvem projetos de pesquisa e extensão. Há uma concentração de cursos de Serviço Social na região sudeste (49%) com 163 cursos e na região Sul (22%) com 73 cursos, a visualização é possível no gráfico. Há uma concentração de instituições de ensino nestas regiões que possuem maior desenvolvimento econômico e perspectivas para o mercado de trabalho. Há uma concentração de cursos de Serviço Social em IES privadas dos 331 cursos 83,38% (276) são privados e apenas 16,61% (55) são públicos este é um fenômeno histórico no Serviço Social, que desde seu inicio no Brasil se concentrou em IES privadas. O crescimento rápido do número de IES privadas empresariais tem mostrado que, estas instituições dão ênfase ao ensino em detrimento da pesquisa e extensão, e que a lógica empresarial penaliza os docentes nas relações de trabalho, com contratos de professores horistas (hora/aula), com uma carga horária excessiva em disciplinas, e muitas vezes sem carga horária para desenvolvimento de pesquisa, extensão, sem falar no não pagamento de horas atividades, aquelas horas que o professor prepara suas aulas, material para aluno e correção de provas. Especificamente no serviço social, as horas para orientação de Trabalho de Conclusão de Curso e supervisão acadêmica têm sido sucateadas pelas IES. A modalidade de ensino a distância em cursos superior é nova no Brasil, das dez IES que oferecem o Curso de Serviço Social, duas são de 2006, três de 2007, quatro foram criadas em 2008 e uma em 2009. É importante lembrar que a instituição sede do ensino a distância se localiza em uma determinada região, mas sua ação pode ser em qualquer localidade, pois pode contar com pólos de ensino. A IES com ensino a distância pode ofertar um número de vagas muito maior que o ensino presencial, por exemplo, enquanto a maioria das IES presenciais oferece 50 a 100 vagas, o ensino a distância oferece mais de mil vagas. Das dez IES, nove são privadas, destas quatro são filantrópicas, e uma IES é pública estadual, que apesar de ser publica cobra pelos cursos oferecidos, a referida Instituição é a Fundação Universidade do Tocantins (Unitins) que no final do mês de fevereiro/09 foi notificada pelo MEC, terá que deixar de cobrar as mensalidades em cursos de graduação a distância, pois na condição de instituição pública, ela desrespeita a Constituição por não oferecer cursos gratuitos. A IES também terá que investir na melhoria da qualidade do ensino. Na década de 1970 houve crescimento de instituições de ensino em todo o país, fato decorrente da reforma universitária de 1968 e conseqüente privatização do ensino superior, com isto se criaram 20 cursos de Serviço Social na referida década. Mas o maior crescimento ocorreu a partir de 2000, com a implementação da LDB de 1996, e conseqüentemente a ampliação da privatização do ensino superior. Até 1999 eram ao todo 83 cursos de Serviço Social, e entre 2000 e 2007 foram criados 233 cursos, ou seja, 70% dos cursos de serviço social oferecidos em 2009 são recentes e não acompanharam movimento histórico da profissão. De acordo com dados da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) do Ministério de Educação em abril de 2009 consta 27 cursos de mestrado acadêmico e dez cursos de doutorado. Estes dados evidenciam que o crescimento de cursos de graduação em Serviço Social na última década, não acompanha o número de IES formadoras em cursos de pós-graduação (mestrado e doutorado) fato que pode dificultar a formação do novo alunado devido a carência de professores com formação para o ensino e para o desenvolvimento de projetos de pesquisa e extensão. 4. CONCLUSÃO As mudanças na educação superior têm ocorrido em todo o mundo na última década. Em relação ao curso de Serviço Social no Brasil, as mudanças tem provocado uma ampliação na oferta de cursos, em espacial nas instituições privadas. As novas instituições não participaram da historia da profissão e das mudanças curriculares discutidas pela categoria profissional na década de 1990. Outro problema é a falta de profissionais capacitados para atuar como professores nos novos cursos. Com isto se tem o receio da desqualificação das futuras gerações profissionais. 5. Referencia bibliográfica BRITO, Márcia Regina F de. “O SINAES e o ENADE: da concepção à implantação.” Avaliação 13, n 3 (nov 2008): 841-850. LIMANA, Amir, e Márcia Regina F. de BRITO. “O Modelo de Avaliação Dinâmica eo DesenvolvimEnto de Competências: algumas considerações a respeito do ENADE.” Educação Superior em Debate- ENADE: Perspectiva de Avaliação Dinâmica e Anásile de Mudança (INEP/MEC) 2 (2006): 17 - 44. IAMAMOTO, Marilda Villela. Serviço Social em Tempo de Capital Fetiche: capital financeiro, trabalho e questão social. 3 ed. São Paulo: Cortez, 2008.