A HISTÓRIA POLíTICA DO RIO GRANDE DO SUL:
BREVE COMENTÁRIO
SONIA RANINCHESKI*
RESUMO
O presente trabalho, com ênfase no estudo da história política, discute a
formação do sistema político-partidário
no Rio Grande do Sul e contextualiza o
debate acerca da possibilidade de ter ocorrido um padrão eleitoral bipartidário
neste estado, mesmo em situação de pluralidade democrática.
Para tanto, é
revisada a trajetória do PDT (Partido Democrático Trabalhista) com vistas ao
questionamento
sobre a herança trabalhista pelo PDT e, portanto, se haveria
uma reedição deste bipartidarismo nos anos 90. Sem a pretensão de esgotar o
tema, acredita-se que o PDT nos anos 90 estaria manifestando uma fragilidade
de projetos para a sociedade, o que poderia estar acarretando o seu declínio
como partido grande. Talvez o PDT esteja se constituindo numa terceira força,
deixando para outros partidos de esquerda, notadamente o PT (Partido dos
Trabalhadores),
a imagem de partido de primeira grandeza.
INTRODUÇÃO
Uma discussão sobre a História política pode estar intrinsecamente
ligada às perspectivas de investigação dos temas políticos como ações
políticas coletivas, relativas à defesa de diferentes interesses inseridos na
sociedade civil e no Estado, utilizando outros aspectos além daqueles
restritivos à dinâmica individual dos fenômenos históricos. É possível,
portanto, destacar as clivagens políticas como parte de processos sociais
gerados a partir de conflitos existentes no interior das sociedades. Uma
dessas arenas de conflitos podem estar nas disputas eleitorais e nas
identidades programáticas dos partidos políticos.
O presente trabalho tem como objetivo discutir a formação do sistema
político-partidário no Rio Grande do Sul e contribuir para o debate em torno
da existência ou não de um certo sistema bipartidário, mesmo em
conjunturas de pluralidade (Trindade, 1981; Trindade e NolI, 1991).
Especificamente, buscou-se compreender a trajetória histórica de um
partido, o PDT gaúcho - Partido Democrático Trabalhista, considerado por
* Graduada em História (UFRGS); mestre em Ciência Política (UFRGS);
História na Faculdade La Salle e pesquisadora na área de História Política.
\
BIBLOS, Rio Grande, 11: 7-15,1999
\
professora
de
7
1
muitos o herdeiro do PTB - Partido Trabalhista Brasileiro . O PTB foi
considerado um dos partidos mais fortes nas disputas eleitorais da fase
pluripartidária compreendida entre os anos de 1946 e 1964.
Diferentemente dos demais Estados da federação, o Rio Grande do
Sul tem apresentado, ao longo de sua história, um sistema partidário
montado na polarização e na disputa bipartidária. Ou seja, a clivagem
política esteve associada às rivalidades agrupadas em torno de partidos
fortes ou em conjuntos de partidos - coligações. Embora tal situação pareça
estar se repetindo nestes últimos anos do século XX2, o presente trabalho
não pretende esgotar o assunto.
Dois aspectos, porém, são necessários como uma introdução ao
debate. Em primeiro lugar, diz respeito à tendência das atuais pesquisas em
história política, cujo viés tem sido direcionado para a compreensão dos
processos políticos, ampliando a visão tradicional da narrativa sobre a vida
ou ação de lideranças políticas. Perde força a tradição da história política
influenciada pelo positivismo e marcada pela abordagem individualista,
centralizada na figura dos líderes políticos.
O que se verifica, de uma maneira geral, a partir da terceira geração
dos historiadores da Escola dos Annales, que influenciaram a historio~rafia
deste final de século XX, principalmente na obra de Maurice Agulhon , é o
surgimento e crescimento de trabalhos relacionados aos processos e
conceitos envolvendo o comportamento político do povo comum. Nota-se a
preocupação com a intervenção mais geral dos atores políticos e os efeitos
na sociedade. Exemplificando, no Encontro Nacional da ANPUH, em 1997,
realizado em Belo Horizonte, o tema central foi "cidadania", conceito político
que, para muitos, é chave para compreender este nosso final de século e
milênio".
Em segundo lugar, está a visão do que seria a História. A História tem
no seu objeto de estudo o passado como ponto de partida para suas
análises e pesquisas. Ela, por outro lado, não pode assumir o caráter de
profeta. O que a História pode fazer é evidenciar mecanismos e padrões de
permanência ou mudanças ao longo das sociedades humanas. Nas
palavras de Hobsbawm, "O que ela não pode nos dizer é o que acontecerá:
apenas quais os problemas que teremos que resolver (1998, p. 47).
1 Deve ser ressaltado que após a abertura democrática,
nos anos 80, a sigla PTB será
disputada entre Leonel Brizola - um dos líderes do antigo PTB - e Ivete Vargas. Ganha Ivete
Vargas e Brizola irá criar o PDT.
2 Se esta discussão
surge durante a abertura democrática, principalmente
a partir da
constituição de novos partidos no Brasil, nos anos 90 ganha reforço, com o crescimento do
Partido dos Trabalhadores em algumas cidades do Estado, na capital e com a sua vitória para
o governo do Estado em 1998.
3 Para maiores
informações
sobre este autor, ver BURKE, 1991. Já no caso da
historiografia americana, têm-se exemplos de trabalhos que já direcionam suas preocupações
à ligação da narrativa política e os efeitos sociais. Ver Skocpol, 1991.
4 Martins,
lokoi e Sá, 1998.
8
BIBlOS,
Reconhecer as semelhanças e as diferenças pode esclarecer situações
contemporâneas e é uma das atribuições do historiador.
Para a realização deste trabalho, além de uma breve retrospectiva da
formação econômica do Rio Grande do Sul, foi traçada historicamente a
formação político-partidária no Rio Grande do Sul até a década de 90, com
o governo do PDT no Estado. A intenção não é esgotar o tema, mas apenas
apontar al~umas considerações de ordem histórica com um olhar para a
atualidade .
1 - A FORMAÇÃO
ECONÔMICA
DO RIO GRANDE DO SUL
O Rio Grande do Sul é o Estado mais meridional do Brasil, situado no
extremo sul do país, com fortes características regionais, econômicas e
culturais, herança de uma colonização européia, principalmente de italianos
e alemães, além de ser marcado pela cultura platina.
Do ponto de vista econômico, tem sido caracterizado por apresentar
ao longo de sua formação histórica uma forte tendência a incorporar-se à
economia nacional como um Estado notadamente agrícola, constituindo-se
numa economia subsidiária voltada para dentro do país (Fonseca, 1989).
Essa característica, que lhe valeu o título de "celeiro do país" ou a vocação
para a agricultura, contudo, não inviabilizou o surgimento de uma economia
industrial.
Ao contrário do que a historiografia dos anos 60 apontava, o
surgimento da industrialização gaúcha já é notada no final do século
passado. Aliás, característica também do Brasil (Pesavento, 1979). O
crescimento e consolidação da indústria como sinônimo de projeto nacional,
no entanto, será mais intenso no pós-30. A ênfase no projeto modernizante,
com claras feições capitalistas, porém não implicará a quebra do padrão
agrário. O Rio Grande do Sul continuará mantendo o desempenho de
Estado "voltado" para a produção agrícola, apesar da sua inclusão no
sistema produtivo capitalista da indústria. Será, contudo, segundo dados do
DIEESE, na década de 1980 que se verificará uma tendência mais
marcante de refluxo da agricultura e crescimento do setor industrial
(NÚCLEO, 1990).
A condição de terceira força, assumida claramente durante a
República Velha, manifesta em outros contextos, não isolou o Estado das
decisões nacionais. A interferência do Rio Grande do Sul nas questões
maiores do país é evidenciada em inúmeras situações e na participação de
homens públicos de destaque",
5 Salienta-se
que sempre há o risco da realização de um trabalho mais próximo da
realidade do pesquisador.
6 Enquanto este trabalho estava sendo elaborado,
surgia no cenário nacional o debate
acerca da necessidade de refazer o pacto federativo.
Rio Grande, 11: 7-15, 1999
BIBlOS,
Rio Grande, 11: 7-15,1999
9
o elo destas questões econômicas com as manifestações políticas,
no Rio Grande do Sul, será sinalizado, entre os anos 40 e 60, pelo
crescimento do PTB, que irá oferecer um novo discurso político, voltado
para o crescimento industrial, pela harmonia entre o campo e a cidade e
boas condições de trabalho.
2 - A POLíTICA POLARIZADA
NO ESTADO
Quanto ao desenvolvimento político, o Rio Grande do Sul tem sido
caracterizado como um Estado atípico. Suas especificidades remontam aos
séculos XVII, XVIII e XIX, em que o Estado foi a fronteira mais militarizada
que o Brasil possuiu. Esse fato, como muitos apontam, delineou as
estruturas gaúchas, tornando-as militarizadas e privatizando a autoridade, já
que cada proprietário era também o chefe militar (Cardoso, 1962). Essa
particularidade acentuou a noção de autoridade local, concentradora e
autoritária, predominante durante longo período da história gaúcha. (Faoro,
1995; Leal, 1975; Piccoli, 1974).
Nos anos da República Velha - 1889-1930, a influência do
positivismo comteano na condução da política e na organização políticoadministrativa conformará um perfil de certa forma personalista e
concentrador (Pesavento, 1979; Trindade e NolI, 1991).
O positivismo no Rio Grande do Sul notabilizou-se pela defesa do
progresso, incentivador da modernização, porém com a preservação da
ordem estabelecida. As lideranças políticas, influenciadas pelo Positivismo,
dariam ao Estado as feições de ordenador lógico-racional da sociedade,
eliminando os conflitos, defensor dos interesses de todas as classes sociais
e sobretudo aquela que burocraticamente controla a modernização do
Estado. O poder de decisões estava centralizado no Executivo, ficando ao
Legislativo apenas a função de apreciar os orçamentos encaminhados pelo
governo.
O fim da política oligárquica e o surgimento de um novo modelo
econômico e político iria ocorrer sob a liderança do gaúcho Getúlio Vargas
em 1930 no Brasil. Estas reações já seriam sentidas no Rio Grande do Sul
com a unificação política no Estado. Considerado da segunda geração de
republicanos, Getúlio Vargas, juntamente com Flores da Cunha, Lindolfo
Collor, Osvaldo Aranha, João Neves da Fontoura, formando a Aliança
Liberal, iriam implantar um novo padrão - o da modernização pela via
autoritária (Trindade e NolI, 1991 p. 53).
Após os longos 15 anos de governo de Vargas no plano federal e de
interventores no Rio Grande do Sul, abre-se em 1945 a fase de
redemocratização política. Essa abertura foi encaminhada pelas lideranças
de Getúlio. Como afirma Kinzo (1994), apesar do quadro pluripartidário esse
período continuará marcado pelo legado getulista. Será um contexto de
10
crescimento do eleitorado, embora ainda persista a proibição de voto para o
analfabeto.
Dessa maneira nascem os partidos complementares criados por
Getúlio Vargas: o Partido Social Democrático (PSD) e o Partido Trabalhista
Brasileiro (PTB). O PSD apoiava-se inicialmente nos políticos e burocratas
que controlavam as máquinas administrativas estaduais, ou seja, nas
interventorias do Estado Novo. Já o PTB tinha como objetivo a cooptação
da classe trabalhadora
emergente, sobretudo através do sistema
previdenciário e da base sindical controlada pelo Ministério do Trabalho. O
PTB nasceu com a tarefa de ser a cunha entre a classe trabalhadora e o
Partido Comunista, além de ter sua força na condição de partido montado
em nível federal (Gomes, 1994, p. 266).
De outro lado, são fundados os partidos oposicionistas, a União
Democrática Nacional (UDN), compondo uma ampla frente antigetulista,
com um projeto liberal modernizante, além do Partido Comunista Brasileiro
(PCB), para citar os partidos mais expressivos.
Quanto ao Rio Grande do Sul, nesse período, forma-se aqui um
quadro partidário eleitoral atípico. Os partidos iriam se organizar mais em
função de clivagens ligadas ao padrão político-eleitoral distinto do cenário
nacional. A estrutura partidária gaúcha seria composta pelo Partido
Libertador (PL), essencialmente gaúcho e antigetulista, e o Partido
Republicano Popular (PRP), herdeiro das idéias integralistas, além daqueles
já citados, além do PTB.
Apesar da multiplicidade partidária, o PTB se converteria em uma das
principais forças políticas. A sua criação se daria a partir da confluência de
três vertentes distintas, simbolizadas pela corrente sindicalista, pela
corrente doutrinária de Alberto Pasqualini e pela corrente pragmáticogetulista (Bodea, 1992, p. 20). A força eleitoral do PTB no Estado, ao longo
dos pleitos eleitorais, provocaria a formação de coligações partidárias para
combater suas vitórias na urnas.
O comportamento eleitoral do gaúcho, no período rnultipartidárlo"
anterior a 1964, seria, portanto, caracterizado pela presença de uma
padronização de disputa político-partidária, conforme tese de Xausa e
Ferraz (1981) e Trindade (1981), baseada em: 1) um bipartidarisrno" de fato,
em que a polarização se dava entre as duas forças políticas distintas (PTB e
forças anti-PTB); (2) a dominação do trabalhismo, ideologia do PTB; (3) a
inviabilidade de uma terceira força eleitoral capaz de significar uma
7 Multipártidário, segundo Duverger, se apresenta quando não há coincidência entre os
grandes dualismos
de opiniões e quando as diferentes
posições forem largamente
independentes umas das outras (1983, p. 267).
8 Bipartidário,
na compreensão de Duverger, está balizado, também, pela situação
ideológica a qual não haveria partidos de centro, mas toda a política implicaria a escolha entre
dois tipos de soluções - direita e esquerda (1983, p. 254).
BIBLOS. Rio Grande. 11: 7-15.1999
BIBLOS, Rio Grande. 11: 7-15, 1999
11
alternativa ao eleitorado 9.
Dessa forma, o sistema político bipartidário instalado pelo regime
militar, com a ARENA e MDB, encontraria no Rio Grande do Sul ambiente
favorável, haja vista que já estava ocorrendo a rivalidade entre duas forças
políticas. Alguns traços característicos do sistema anterior, principalmente
no que se refere à antiga rivalidade PTB/anti-PTB, é transferida para os dois
partidos criados pelo Ato Institucional n." 2, em 1967.
Tal situação de bipartidarismo, segundo Fleischer, teria ocorrido,
igualmente, em escala nacional, nestes anos de 1946 a 1964. Para ele,
apesar da diversidade de partidos, teriam sido construídos dois blocos de
partidos. De um lado a Frente Parlamentar Nacional - FPN, apoiando as
reformas de base e de cunho progressista, e de outro lado a Ação
Democrática
Parlamentar
ADP
com
posições
nitidamente
conservadoras. E esses dois blocos pós-64 estariam se agrupando em
torno do apoio ou não ao presidente Castelo Branco até o momento do AI-2
(Fleischer, 1989).
A partir da abertura política, em 1979, com a nova lei eleitoral,
permitindo a viabilidade de um sistema multipartidário, novos partidos
surgem no cenário nacional e regional. Grupos partidários abrigados na
ARENA e no MDB começam a manifestar sua identidade própria. Alguns,
porém, nitidamente reivindicam herança de partidos extintos no regime
militar. É o caso do PDT, pretendido herdeiro da sigla do PTB, reivindicada
por Leonel Brizola e perdida para Ivete Vargas em disputa no Tribunal
Superior Eleitoral.
O PDT, portanto, é fundado em 26 de maio de 1980, já no quadro da
reorganização partidária. Segundo Cabrera (1995, p. 57), os debates acerca
da fundação do partido já vinham se realizando sob a liderança do gaúcho
Leonel Brizola, originando o primeiro documento do PDT, conhecido como a
Carta de Lisboa, fruto do Encontro Trabalhista realizado na capital
portuguesa, em junho de 1979.
Na Carta de Lisboa, estão dispostos os pilares do conteúdo
programático do novo partido - PDT -, no qual é frisado o compromisso
com a herança getulista, social-democrata, nacionalista, trabalhista e de
cunho popular, que constará no Manifesto do PDT, por ocasião de sua
fundação (Cabrera, 1995).
3 - O PDT NO RIO GRANDE DO SUL
O PDT ganharia força e expressão eleitoral no Rio de Janeiro e no
Rio Grande do Sul na década de 80. No Estado gaúcho, o PDT disputaria o
9 A tese de bipartidarismo,
Tavares (1997).
12
traduzida pela disputa PTB e anti-PTB, é contestada
por
peso político da oposição com o PMDB. Já nas primeiras eleições para o
governo, em 1982, embora o PDS de Jair Soares tivesse vencido o pleito, o
PDT fez uma votação expressiva: 18,42% no interior e 31,73% na capital,
totalizando no Estado 20,42%, atrás do PDS e do PMDB (Baquero, 1988).
A trajetória do PDT no Rio Grande do Sul, até a vitória para o governo
do Estado em 1990, seria marcada pelas oscilações em pleitos eleitorais,
até a votação expressiva de Leonel Brizola no primeiro turno das eleições
presidenciais de 1989. Nessa primeira eleição presidencial, embora Collor
de Mello, responsável pela introdução das medidas neoliberais no país, com
base num discurso de ruptura com o velho, o atrasado, tenha saído
vencedor, o Rio Grande do Sul se notabilizou pelo voto de oposição,
escolhendo maciçamente o candidato Brizola, no primeiro turno, e Lula no
segundo turno.
Nas eleições de 1990, para governos estaduais, no Rio Grande do
Sul, o PDT teve como uma das estratégias para viabilizar o seu candidato,
Alceu Collares, a ligação com a grande votação de Brizola em 89. Durante a
campanha, procurava-se frisar que Collares poderia ser uma espécie de
Brizola no Sul. É o que se verifica em slogans que afirmavam: Collares vai
fazer no Rio Grande o que não deixaram Brizola fazer no Brasil: um grande
governo (Contracapa do Programa de Campanha: Projeto Povo Grande do
Sul).
O traço dessa eleição foi marcado muito mais pela relevância do perfil
das candidaturas e da coligações partidárias do que propriamente pelo peso
dos partidos. Dois nomes se destacaram formando duas grandes alianças:
Alceu Collares, pela Frente Popular Gaúcha (FPG) apoiada pelo PDT,
PSDB e PCdoB, e Nelson Marchezan pela União para um Novo Rio Grande
(UPNRG). Venceu a coligação de Collares, no segundo turno, fazendo
45,66% dos votos contra 28,99% do candidato concorrente da UPNRG. A
disputa entre as duas coligações, porém, não reverterá numa situação de
fato bipolar ou mesmo bipartidária.
Vencidas as eleições, o contexto em que assume Collares, no Rio
Grande do Sul, no dia 1.Q de março de 1991, foi de um Estado em crise
econômica e de intensas articulações políticas, haja vista não ter sido
viabilizada uma maioria na Assembléia Legislativa, o que exigiu do novo
governo habilidade nas negociações. Somada a essa conjuntura, o novo
governo enfrentaria, nos primeiros dias após a posse, uma greve do
magistério estadual.
O novo governo, hegemonizado pelo PDT, iria, portanto, enfrentar,
além das dificuldades apontadas, uma imensa expectativa por parte da
opinião pública, em função de se constituir no primeiro governo considerado
de centro-esquerda a ocupar o Estado, no período de redemocratização.
Até então, o Rio Grande do Sul fora comandado pelas forças tradicionais do
PDS e do PMDB. É relevante destacar que a expectativa quanto ao
desempenho do novo governo fora incentivada durante a agenda de
BIBLOS. Rio Grande. 11: 7-15. 1999
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13
campanha da Frente Gaúcha, na qual foi exposto um conjunto de intenções
visando a mudanças para o Estado.
Na eleição de 1994, o PDT terá um fraco desempenho eleitoral. Não
conseguirá eleger um sucessor para Collares, além de perder cadeiras no
Legislativo. A fragilidade do PDT será mantida no pleito de 1998, no qual
haverá uma situação de disputas acirradas, ocasionando debates em torno
da possibilidade de estar sendo novamente reeditada a bipolaridade ou
bipartidarismo.
A disputa entre duas forças políticas parece que se manifesta já no
primeiro turno. Dentre as forças políticas, no entanto, não estava o PDT. A
disputa se deu entre a candidatura de Antônio Britto pela Coligação Rio
Grande Vencedor (PMDB/PTB/PSDB/PFUPPR/PSC/PSD/PSL)
e a de
Olívio Dutra da Frente Popular (PT/PSB/PcdoB/PCB). Caberia ao PDT um
papel de terceira força, mas sem o peso de um grande partido.
O que teria gerado este declínio do PDT no Rio Grande do Sul?
Neste primeiro momento, um dos elementos possíveis de explicação pode
ser um certo sentimento de frustração por parte da população gaúcha diante
do governo do PDT. Collares não teria conseguido manter-se como
liderança de oposição às medidas neoliberais 10 do governo federal. Tal
explicação vai ao encontro das afirmações de Cabrera (1995) sobre a falta
de alternativa por parte do PDT nacional, no início dos anos 90, às reformas
neoliberais. Segundo esse autor, somente em 1994, com a formulação de
um programa de desenvolvimento para o país, apresentado nas eleições
presidenciais, é que o PDT daria indícios de construção de oposição ao
neoliberalismo.
A tese de o processo político gaúcho Ter como um dos eixos a
bipolarização, enfim, ainda precisa ser aprofundada. Não só pelos seus
aspectos conceituais, como também pela sua continuidade. Estabelecer
padrões de formação política sem o beneficio da dúvida pode ser arriscado.
Um dos padrões mais aceitos, evidente pelos seus resultados, ou seja, a
alternância no executivo da capital gaúcho, estaria sendo quebrado pela
permanência do PT na Prefeitura, já por três mandatos. Dito em outras
palavras, do ponto de vista histórico, é muito prematuro definir qual o
padrão político para o Rio Grande do Sul, nestes anos após o regime militar.
Talvez, o máximo que se pode estabelecer seja um paralelo do período de
46 a 64 com os anos 90.
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10
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PROGRAMA
Sobre a proposta de reforma de Alceu Collares, ver Ranincheski,
BIBLOS,
1998.
Rio Grande,
11: 7·15,1999
BIBLOS,
Rio Grande,
11: 7·15,1999
15
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