MPF começou a investigar o tráfico da turmalina paraíba a partir de denúncias da imprensa Inexistência de dados oficiais sobre exploração da pedra dificultou estágio inicial da investigação A investigação sobre a extração irregular e tráfico da turmalina paraíba teve início em 2 de março de 2009, quando o Ministério Público Federal (MPF) instaurou o Procedimento Investigativo nº 1.24.001.000068/2009-38 para apurar denúncias da imprensa sobre a exploração irregular da pedra preciosa no Estado. Dado o caráter extremamente clandestino da exploração e comercialização da gema, o MPF requisitou diligências preliminares à unidade da Polícia Federal em Patos (PB), que instaurou, em 2010, inquérito policial para investigar a extração irregular da turmalina paraíba. A inexistência de dados oficiais acerca da exploração do minério dificultou o estágio inicial da investigação. Os documentos solicitados ao Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) não continham informação relevante que materializasse a exploração irregular da gema e identificasse os responsáveis. O próprio DNPM relatou dificuldades para obter informações sobre a produção e comercialização da turmalina no distrito de São José da Batalha (PB). Técnicos do órgão, em visita ao distrito, observaram muito receio das pessoas em falar sobre o assunto com estranhos. Ouviram que os empregados das empresas mineradoras “são proibidos de falar sobre a produção de gemas”. A partir das informações repassadas pelos técnicos, apurou-se que as áreas exploradas encontram-se sob vigilância permanente. Em 2013, as investigações ganharam fôlego quando fiscais do DNPM encontraram diversos exemplares lapidados da turmalina paraíba sendo vendidos na Feira Internacional de Pedras Preciosas, em Teófilo Otoni (MG). Os fiscais passaram-se por pretensos compradores e ao questionarem sobre a origem das gemas, os vendedores revelaram que a exploração da turmalina paraíba continuava ativa. Segundo os vendedores, as pedras expostas à venda na feira teriam sido fornecidas diretamente pelo dono de um dos garimpos de São José da Batalha, distrito de Salgadinho, no Cariri da Paraíba. Nesse meio tempo, um especialista em pedras preciosas, residente nos Estados Unidos, compareceu voluntariamente à sede da Polícia Federal, em Patos, e forneceu dados sobre a atuação da organização criminosa desbaratada na Operação Sete Chaves. A partir dessas declarações, descobriu-se que, além de outras explorações, existe uma empresa, responsável pela extração irregular da turmalina paraíba, a Parazul Mineração Comércio e Exportação Ltda. Em inspeção realizada nas minas, em abril de 2014, constatou-se que na empresa Parazul as minas estavam ativas e em pleno funcionamento, inclusive com furadeiras e reservatórios de água para lubrificação das brocas que extraem o caulim petrificado das rochas onde são encontradas as turmalinas. As diligências no local revelaram que é justamente na mina explorada pela Parazul que vem se verificando a mais intensa exploração da pedra preciosa. No entanto, a empresa não possui guia de utilização nem portaria de lavra, únicos documentos que autorizariam a lavrar ou pesquisar o minério bruto para obtenção da turmalina. O que a Parazul Mineração possui é apenas um alvará de pesquisa que, segundo o DNPM, expirou em 2 de agosto de 1999. Não bastasse a falta de autorização, constatou-se também que, atualmente, a mineradora também explora turmalinas paraíba fora da área outorgada para a pesquisa, cujo alvará expirou-se há 15 anos. Interceptação telefônica – A partir da quebra de sigilo telefônico dos investigados, descobriuse como a organização atuava. “O resultado das primeiras conversas interceptadas confirmou todas as informações anteriormente colhidas e revelou, em detalhes, toda a sistemática adotada pela organização criminosa, comprovando os diversos delitos praticados pelos investigados, desde a extração ilegal do minério, até a lavagem dos recursos auferidos com venda das gemas”, relata o Ministério Público Federal no procedimento investigatório. Turmalinas extraídas ilegalmente na Paraíba eram “legalizadas” no RN Após lapidar as pedras em Minas Gerais, organização criminosa enviava as gemas para os Estados Unidos, Tailândia e Hong Kong Os primeiros indícios de lavra ilegal na área da empresa Parazul Mineração Comércio e Exploração Ltda surgiram ainda em 2010, a partir da coleta de informações e verificações “in loco” realizadas por agentes federais. Conforme relatório de investigação da Polícia Federal, os sócios formais da empresa, Ranieri Addario e Ubiratan Batista de Almeida, associaram-se informalmente a Sebastião Lourenço Ferreira, João Salvador Martins Vieira e ao afegão Zaheer Azizi para explorar e comercializar irregularmente a turmalina paraíba. Apurou-se que a comercialização da gema era coordenada por Sebastião Lourenço, por intermédio da empresa Mineração Terra Branca. Após a extração sem autorização legal, feita pela empresa Parazul, os investigados encaminhavam a produção para a empresa Terra Branca, localizada em Parelhas (RN), para conferir aparente legalidade às gemas, já que a Terra Branca possui concessão de lavra garimpeira, mas a Parazul não. A Terra Branca remetia, então, os exemplares da turmalina paraíba para serem lapidados em Governador Valadares (MG), onde atuava João Salvador. De Minas Gerais, as pedras eram enviadas para os Estados Unidos, Tailândia e Hong Kong, por João Salvador e Sebastião Lourenço, que declaravam para os órgãos de fiscalização um valor muito inferior ao valor real de um exemplar de turmalina paraíba. Cabia ao afegão Zaheer Azizi, residente na Tailândia, vender as pedras no exterior, através da Azizi Enterprises Co. Ltd e Azizi Gems and Minerals Co, e lavar o dinheiro obtido com o comércio ilegal de pedras preciosas. Para realizar a exportação das pedras, os investigados simulavam compra e venda entre as empresas Terra Branca e Liberty Gems, declarando a gema preciosa como se fosse turmalina comum, o que possibilitou a exportação do minério a um preço de 1% a 10% de seu valor efetivo. A Liberty Gems tem o mesmo endereço da Terra Branca, em Parelhas (RN). Conforme apurado, a empresa Mineração Terra Branca é registrada em nome de Ricardo Marchetti Addario (detentor de 20% das cotas), irmão de Ranieri Addario, e em nome de Rômulo Pinto dos Santos (detentor de 80% das cotas do capital social), cunhado de Sebastião Lourenço. Contudo, as investigações revelaram que a empresa é de fato comandada por Sebastião e seus sócios ocultos, João Salvador e Zaherr Azizi. Para divulgar o negócio ilegal, os membros da organização criminosa participavam de eventos e feiras internacionais. Num desses eventos, o Show Gem & Jewerly Exchange, realizado em Tucson, Arizona, agentes do Federal Bureau of Investigation (FBI) filmaram Sebastião, a filha Ananda Lourenço e João Salvador, negociando as turmalinas paraíba nos estandes das empresas Liberty Gems Inc e JS Gems. Extensão transnacional – O caráter internacional das operações do grupo revela-se também nas constantes viagens realizadas. Apenas em 2013, João Salvador foi 22 vezes ao exterior. Já Sebastião Lourenço realizou 13 viagens internacionais. Conforme informações levantadas por agentes federais, os integrantes da organização desembarcavam em aeroportos, como Guarulhos (SP) e Recife (PE), em voos internacionais vindos de Houston (EUA), Tucson (EUA), Newark (EUA), São Francisco (EUA), Miami (EUA) e Johanesburgo (África). Esquema de proteção – As investigações também comprovaram que a mineradora Parazul é guarnecida por forte aparato de segurança, encontrando-se sob vigilância permanente, inclusive com policiais militares, evidenciando o elevado grau de importância da exploração ali realizada. Durante fiscalização no local da mina, a própria equipe do DNPM relatou dificuldade de acesso, tendo que esperar por cerca de 30 minutos, na presença de dois seguranças, até que fossem atendidos por Ubiratan Batista de Almeida, sócio majoritário da Parazul, que se apresentou aos fiscais acompanhado por segurança armado. A presença de policiais fazendo a segurança da mina também foi confirmada nas interceptações de diálogo mantido entre Sebastião Lourenço e Aldo Filho, em que Aldo relata desentendimento entre os vigias da mina e policiais militares, que estariam “dormindo e descansando” em vez de fazerem ronda na mina. Tráfico da turmalina paraíba: organização criminosa possui tentáculo na Ásia Afegão é principal responsável pelo comércio internacional das gemas extraídas ilegalmente nas minas da empresa Parazul Confira o papel de cada um dos investigados na organização criminosa, conforme apurado durante a primeira fase da Operação Sete Chaves: Sebastião Lourenço Ferreira: diálogos interceptados entre Sebastião Lourenço e Rômulo Pinto, revelam haver uma relação de subordinação do segundo para com o primeiro, mostrando que não há dúvidas sobre a efetiva administração da empresa Mineração Terra Branca por parte de Sebastião Lourenço. Diversas outras provas colhidas demonstram que os sócios formais da empresa atuam sob o comando de Sebastião. Rômulo Pinto: apesar de ser formalmente o sócio majoritário da Mineração Terra Branca, é, na realidade, uma espécie de “gerente” da empresa. Cunhado de Sebastião Lourenço e depositário de sua confiança, cabe a Rômulo fiscalizar os garimpeiros dentro da lavra e repassar para Sebastião todas as informações sobre a exploração das gemas. Ranieri Addario: sócio formal da empresa Parazul, juntamente com Ubiratan Almeida, associou-se informalmente a Sebastião Lourenço para explorar de forma ilegal a turmalina paraíba. Interceptação telefônica revelou que Ranieri vendeu a Sebastião, por um milhão de reais, percentual de sua participação na Parazul. Parte do pagamento foi realizado em dinheiro (R$ 600 mil) e outra em carros de luxo (R$ 400 mil). Ubiratan Batista de Almeida: sócio majoritário da empresa Parazul, foi casado com uma das filhas de Heitor Dimas, tido como descobridor da turmalina paraíba, mérito que Ubiratan afirma ser seu. Considerado o principal executor do esquema de extração ilegal das turmalinas, tem plena ciência das irregularidades que envolvem a extração ilegal da pedra preciosa pela Parazul e mantém nítida relação comercial com Sebastião Lourenço, escoando a produção da Parazul para a empresa Terra Branca para “legalizar” a produção. Em diálogo interceptado, Ubiratan confirma que a Parazul está “produzindo”, termo usado para afirmar que há extração efetiva de turmalina paraíba. Em determinado momento, Ubiratan afirma que “há sócio demais querendo entrar no negócio a ponto dele ter que escolher quem vai entrar na sociedade”. As investigações ainda revelam que Ubiratan representa comerciantes da região de Governador Valadares e também do exterior. Conforme o conjunto de provas já coletadas, Ubiratan Almeida pode ser processado por usurpação de matéria prima da União, exploração de minério sem licença ambiental, organização criminosa com tentáculos internacionais, evasão de divisas, lavagem de dinheiro e corrupção. João Salvador Martins Vieira: preso na noite da terça-feira, 26 de maio de 2015, quando se preparava para sair do país com um carregamento de pedras preciosas, desempenha importante papel na análise, lapidação e comércio das gemas no exterior. Juntamente com Zaheer Azizi, comanda a venda no mercado asiático das turmalinas paraíba. João Salvador mantém um escritório de sua empresa, a JS Gems, em Hong Kong, conforme revelado em ligações telefônicas interceptadas, sendo constantes os eventos em que atua tendo como principal produto de exposição a turmalina paraíba. Aldo Medeiros Filho: ex-professor de inglês e representante de Zaheer Azizi no Brasil, Aldo Medeiros, tem participação efetiva na empresa Mineração Terra Branca e é “testa de ferro” de Azizi, fato comprovado nas ligações telefônicas interceptadas. As conversas revelaram que Aldo é o responsável por representar a empresa em visitas a órgãos públicos e providenciar documentações para o seu funcionamento. Ananda Lourenço: filha de Sebastião Lourenço, exerce papel de destaque na administração dos negócios escusos e sempre é consultada para as decisões mais importantes. Interceptação de conversa entre Ananda e Sebastião mostra que ela toma a frente na resolução de quaisquer problemas do grupo. Troca de e-mails entre secretária de Zaheer Azizi e Ananda Lourenço, também revelou que a filha de Sebastião é responsável pela contabilidade do comércio ilegal e atua nas negociações internacionais. Ela ainda foi identificada por agentes do FBI, representando empresas da organização criminosa durante a exposição Gem & Jewerly Exchange, em Tucson (EUA). Zaheer Azizi: de nacionalidade afegã, aparece como um dos sócios ocultos da empresa Mineração Terra Branca, juntamente com Sebastião Lourenço e João Salvador. Tentáculo da organização criminosa na Ásia, mais precisamente na Tailândia, é o principal responsável pela comercialização, no exterior, das turmalinas Paraíba oriundas da Parazul. Segundo informações apresentadas por embaixadas brasileiras no exterior, pesariam, ainda, sobre Zaheer Azizi e seus familiares, fundadas suspeitas da prática de vários crimes. Mais informações levantadas no curso da Operação Sete Chaves, revelam que Azizi também seria responsável pelas empresas Azizi Trading Corporations, situada em Peshawar, Paquistão; Hamid Azizi Construction, em Kabul, Afeganistão, Azuga Mining Company, na Nigéria, e Azizi Enterprises, no Tajiquistão. MPF obtém prisão preventiva de oito envolvidos no tráfico da turmalina paraíba Objetivo é garantir instrução criminal e assegurar a aplicação da lei penal O Ministério Público Federal obteve a prisão preventiva dos investigados Sebastião Lourenço Ferreira, Ranieri Addario, Ubiratan Batista de Almeida, João Salvador Martins Vieira, Aldo Medeiros Filho, Ananda Lourenço, Rômulo Pinto e Zaheer Azizi. Como o investigado Azizi reside fora do Brasil, a Justiça Federal autorizou a difusão da ordem de prisão preventiva no canal de difusão vermelha da Interpol. Além dos pedidos de prisão preventiva, também foram obtidos mandados de busca e apreensão e sequestro de bens. O objetivo é garantir a ordem pública, a conveniência da instrução criminal e assegurar a aplicação da lei penal. Busca e apreensão - O pedido de busca e apreensão, feito com base em representação da Polícia Federal, objetivou a apreensão de documentos e objetos que comprovam as ilicitudes narradas e abrangem computadores, mídias de armazenamento de dados, aparelhos celulares, smartphones, tablets; câmeras fotográficas, fotografias, documentos, exemplares de turmalina paraíba, maquinário para exploração e lapidação de pedras, veículos e objetos estritamente relacionados à prática das infrações penais sob apuração. Entre diversos locais, alvos dos mandados de busca e apreensão, está a sede da empresa Mineração Terra Branca, em Parelhas (RN), o escritório da Terra Branca, em Natal (RN); as residências de Sebastião Lourenço, em Parelhas e Natal; as residências de Ubiratan Almeida, Thiago Lourenço Ferreira Santos Rômulo Pinto, Ricardo Marchetti Addario, Aldo Medeiros, todas em Parelhas; a sede e as minas da Parazul Mineração Comércio e Exportação Ltda, em São José da Batalha (PB), as minas da empresa Mineração Terra Branca; a residência de João Salvador, em Governador Valadares (MG) e a sede da JS Gems, também em Governador Valadares. Sequestro de bens – Também foi obtida medida liminar de sequestro de todos os bens móveis e imóveis, até o montante de R$ 50 milhões, de Sebastião Lourenço, Ranieri Addario, Ubiratan Almeida, João Salvador Vieira, Aldo Filho, Ananda Lourenço, Rômulo Pinto e Zaheer Azizi. Crimes cometidos - O conjunto de provas obtidas durante investigações demonstrou que os investigados, agindo de forma livre e consciente, usurparam matéria-prima da União, ao extrair turmalina Paraíba, sem autorização do Departamento Nacional de Produção Mineral ou do Ministério de Minas e Energia, bem como executaram extração de recursos minerais sem a competente autorização, permissão, concessão ou licença do órgão ambiental, ambos na área da propriedade rural pertencente à empresa Parazul Mineração, Comércio e Exportação Ltda, localizada no distrito de São José da Batalha, município de Salgadinho (PB). A empresa Parazul Mineração só tem uma autorização de pesquisa caduca, cujo prazo venceu em 1999 e o DNPM não deferiu requerimento de lavra mineral feito pela empresa em 2000. Turmalina paraíba é uma das pedras preciosas mais caras do planeta Embora haja turmalinas em outras regiões do Brasil e do mundo, apenas as gemas do distrito de São José da Batalha (PB) conseguem alcançar teores de cobre acima de 2% A turmalina paraíba é uma das pedras preciosas mais caras do planeta. Em razão de suas características particulares, de seu azul incandescente, a gema paraibana exerce fascínio em todo o mundo, sendo utilizada nas joias confeccionadas por grifes nacionais (Amsterdan Sauer e H Stern) e internacionais (Dior e Tiffany & Co UK). Estima-se que um quilate (0,2 grama) da pedra custa em média U$ 30 mil e pode chegar a custar até U$ 100 mil, dependendo das características da gema. A maior dessas pedras já encontrada, a Ethereal Carolina Divine Paraíba, tem 191,87 quilates e é de propriedade do filantropo canadense Vicente Boucher. A pedra foi avaliada em até U$ 125 milhões. As turmalinas são um minério comum encontrado em várias localidades. Entretanto, a autêntica turmalina paraíba possui traços de cobre, manganês e ouro em percentuais únicos, o que proporciona um efeito de fluorescência que não se encontra em nenhuma outra gema. Embora haja turmalinas em outras regiões do Brasil e do mundo, apenas as turmalinas do distrito de São José da Batalha (PB), conseguem alcançar teores de cobre acima de 2%. No Rio Grande do Norte e África, onde se exploram também turmalinas, os teores de cobre não chegam a 0.80%. A pedra foi batizada de turmalina paraíba por ter sido encontrada pela primeira vez em São José da Batalha, distrito do Município de Salgadinho, na região do Cariri, interior da Paraíba, a 244 km da capital. Segundo relatos da imprensa, a primeira turmalina paraíba foi descoberta em 1982 por Heitor Dimas Barbosa, dono da Mina da Batalha. Na época da descoberta, Heitor Barbosa foi citado em revistas estrangeiras como o homem que descobriu a raríssima turmalina paraíba. A qualidade excepcional da pedra foi comprovada pelo Gemological Institut of America (GIA) nos Estados Unidos. Descoberta de U$ 1 bilhão – Os diálogos interceptados durante a Operação Sete Chaves revelam a descoberta de nova reserva de turmalinas Paraíba, negócio “muito bom”, segundo os investigados. Eles comentam que lucrarão cerca de “um bilhão de dólares” com o negócio e que estarão “bem de vida até a sexta geração da família de todos eles”. Diálogo interceptado, em abril de 2014, revela a visita de especialistas do Gems Institute of America à mina em São José da Batalha. No trecho, um dos investigados comenta que na semana anterior havia extraído pedras de qualidade e que a visita dos americanos foi encomendada por Sebastião Lourenço e Azizi, com o objetivo de analisar a qualidade da extração das turmalinas paraíba. Entre os dias 31 de março de 2014 e 17 de abril do mesmo ano, uma expedição do GIA visitou minas brasileiras nos estados de Minas Gerais, Rio Grande do Norte e Paraíba. A expedição tinha o objetivo de “reunir informações e documentar o estado atual das minas de pedras coloridas, particularmente esmeralda e turmalina”. Pobreza contrastante - O brilho, o luxo e o valor exorbitante da turmalina paraíba contrastam com a vida precária dos habitantes do distrito de São José da Batalha, berço da pedra preciosa. Como a extração é irregular, os exploradores não recolhem tributos pela utilização econômica dos recursos minerais localizados nas minas da região. Paralelamente aos lucros exorbitantes, obtidos com a extração ilegal da gema, a população do pobre município de Salgadinho (PB) convive sem qualquer contrapartida da riqueza que é usurpada de seu solo. Segundo dados do aplicativo Identificação de Localidades e Famílias em Situação de Vulnerabilidade (IDV), do Programa Brasil Sem Miséria, do Governo Federal, 65,7% dos domicílios de Salgadinho estão localizados na zona rural. Dos 3.508 habitantes do município (Censo IBGE 2010), 815 são pessoas, de 15 anos ou mais de idade, que não sabem ler e escrever. Dos domicílios particulares permanentes, 63% têm saneamento inadequado e outros 22,2% possuem saneamento semi-adequado. Ainda segundo o IDV, 26,3% das pessoas residentes em domicílios particulares permanentes possuem renda de até 70 reais, e 42,6% dos habitantes permanentes de Salgadinho possuem renda de até 1/4 do salário mínimo. “As pedras que são exibidas em eventos luxuosos por celebridades e magnatas internacionais, e que são alugadas por atrizes de Hollywood para desfilarem no tapete vermelho do Oscar, deveriam também proporcionar aos habitantes de São José da Batalha e Salgadinho o progresso social, possibilitando melhores condições de vida, direitos fundamentais básicos para o desenvolvimento do ser humano, como proclamado pela Constituição Federal e pelos tratados internacionais”, propõe o procurador da República João Raphael Lima.