DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA SUMÁRIO PROPOSTA PEDAGÓGICA …..................................................................................................................... 02 Da Terra ao Espaço: tecnologia e meio ambiente na sala de aula Petrônio Noronha de Souza Himilcon de Castro Carvalho José Bezerra Pessoa Filho PGM 1 O PROGRAMA ESPACIAL BRASILEIRO E SUAS AÇÕES DE ENSINO E DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA .... 12 Edmilson de Jesus Costa Filho Ivette Maria Soares Rodrigues João Batista Garcia Canalle PGM 2 O CONTEXTO HISTÓRICO DAS ATIVIDADES ESPACIAIS E A TECNOLOGIA DOS FOGUETES ........... 26 Danton José Fortes Villas Boas PGM 3 SATÉLITES E PLATAFORMAS ESPACIAIS: TECNOLOGIA E APLICAÇÕES ............................................. 38 Petrônio Noronha de Souza Raimundo Nonato Fialho Mussi PGM 4 SATÉLITES E O MEIO AMBIENTE ............................................................................................................. 53 Gilvan Sampaio de Oliveira Teresa Galloti Florenzano PGM 5 AS MUDANÇAS CLIMÁTICAS .................................................................................................................... 64 Ângela Oliveira da Costa Neilton Fidelis da Silva DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 1 PROPOSTA PEDAGÓGICA Da Terra ao Espaço: tecnologia e meio ambiente na sala de aula Petrônio Noronha de Souza 1 Himilcon de Castro Carvalho 2 José Bezerra Pessoa Filho 3 1. Introdução Desde tempos imemoriais, o universo exerce enorme atração sobre o homem. Os fenômenos a ele associados, tais como o dia e a noite, as estações do ano, os eclipses, o movimento dos astros próximos e das estrelas, a razão para sua existência, sua origem e significado e, eventualmente, seu papel em nosso destino como indivíduos, bem como na sociedade, sempre despertaram enorme interesse e atraíram a atenção das mentes mais geniais ao longo de nossa história. Nos dias atuais, o assombro para com os fenômenos do universo e do espaço próximo foi substituído pelo conhecimento científico rigoroso e pelo uso tecnológico amplo dessa nova fronteira, com claras e inequívocas vantagens para nossa sociedade. Os benefícios extraídos das atividades espaciais são hoje tão relevantes para o funcionamento das sociedades modernas – tanto sob o ponto de vista social quanto econômico e ambiental – que se tornou imprescindível proporcionar aos nossos estudantes um conjunto mínimo de conhecimentos que os habilite a entender as questões fundamentais associadas ao tema. Da mesma forma, esses conhecimentos, pelo seu ineditismo, devem fazer parte da formação continuada dos professores. As atividades ligadas ao espaço são desenvolvidas por um número relativamente pequeno de nações. Cada uma delas tem os seus chamados “Programas Espaciais”, e o Brasil é uma delas. Como será visto nos programas desta série, dentro do que, genericamente, se classifica como “atividades espaciais”, há uma ampla gama de iniciativas, que podem variar enormemente entre os países que as desenvolvem. Estas variações existem em razão dos interesses estratégicos de cada nação, da quantidade de recursos que elas são capazes de alocar e, finalmente, de seu nível de desenvolvimento tecnológico e científico. DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 2 Os vários programas espaciais existentes, por mais variados que sejam em porte e objetivos, compartilham algumas características em comum: são iniciativas de longo prazo; exigem grande quantidade de recursos financeiros e de infra-estrutura e, ainda, uma mão-de-obra bem formada nas várias disciplinas requeridas para o seu desenvolvimento. Como dito acima, em virtude da variedade de atividades desenvolvidas sob o manto das “atividades espaciais”, não existe uma disciplina específica que englobe todos os conhecimentos necessários, daí o fato de os programas espaciais serem iniciativas coletivas e multidisciplinares por excelência. A título de exemplo, algumas das disciplinas do conhecimento relevantes para as atividades espaciais são listadas a seguir, sem uma ordem de prioridade definida: • Matemática: Ela está presente em praticamente todas as atividades associadas a foguetes lançadores, satélites e suas aplicações, tais como: Engenharia Mecânica, Eletrônica, Aeronáutica, de Telecomunicações e de Computação; Química; Física e Economia. • Física: É necessária para o desenvolvimento dos foguetes e dos satélites e das suas aplicações, tais como observação da Terra, telecomunicações, meteorologia, astronomia e astrofísica, ciências atmosféricas, etc. Também necessária para a realização de experimentos em ambiente de microgravidade. • Química: Necessária para o desenvolvimento dos materiais e propelentes utilizados em foguetes e satélites, bem como para a realização de experimentos no espaço. • Línguas: O Português é essencial para a produção da documentação técnica, bem como para a organização e comunicação das atividades de gerenciamento. O Inglês é a linguagem técnica universal atual. Praticamente todas as normas e literatura técnica da área são produzidas e distribuídas neste idioma. Ele também é essencial para o desenvolvimento de atividades em colaboração com outras nações. • Economia e Administração: Necessárias para gerir os projetos e elaborar projeções para a demanda dos serviços prestados pelos satélites. DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 3 • Computação: Necessária por estar presente em todas as etapas da atividade de desenvolvimento e uso de satélites, tanto a bordo de satélites e foguetes, quanto no solo. • História e Política: Requerida para a completa formação do profissional da área. O conhecimento de como a política internacional, a economia e a evolução das tecnologias influenciam o setor é de suma importância para os tomadores de decisão. • Ciências Sociais: Fornecem ferramentas para o estudo do mercado e da sociedade para a elaboração de projeções das demandas futuras para o setor. • Geografia: Disciplina essencial para o desenvolvimento das aplicações em observação da Terra e ciências ambientais, dada a interação com a superfície da Terra. • Biologia: Disciplina essencial para o desenvolvimento das aplicações em observação da Terra e ciências ambientais, dada a interação com as variadas formas de vida que habitam a superfície da Terra. Também requerida para algumas classes de experimentos em microgravidade. • Direito e Diplomacia: Necessárias para disciplinar as relações entre as partes envolvidas (empresas e governos). • Educação Física e Medicina: Requeridas para as análises da segurança do trabalho dos técnicos que lidam com os satélites e com os foguetes. Também necessárias em todos os assuntos relativos a astronautas e à realização de experimentos no espaço que envolvam o corpo humano e seu funcionamento. 2. O contexto brasileiro O espaço exterior é o único local do qual se pode observar a Terra como um todo. Desse modo, em temas como mudanças globais, avaliação das florestas tropicais e estudos climáticos, o uso de satélites de observação da Terra é a única forma de obter dados de forma sistemática e consistente. A utilização de imagens de satélite é ainda fundamental quando é preciso obter informação de maneira rápida sobre eventos cuja localização e ocorrência são de difícil previsão ou acesso, como nos casos de desastres naturais (por exemplo, enchentes) ou produzidos pelo homem (queimadas ou DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 4 poluição causada por derramamento de óleo no mar), e ainda voltados ao gerenciamento de crises. Dessa forma, a atividade espacial contribui de maneira significativa para o projeto de desenvolvimento do Brasil, seja por meio das informações geradas sob a forma de imagens e dados coletados sobre o território nacional, seja pelo efeito indutor de inovação, que chega à indústria e à sociedade, derivado do esforço empregado na aquisição e desenvolvimento de tecnologias e conhecimentos críticos que respondam às necessidades do nosso Programa Espacial. Ao longo das quatro décadas da recente história das atividades espaciais no mundo, muitos benefícios econômicos e sociais, decorrentes de forma direta ou indireta dessas atividades, puderam ser bem caracterizados. Esses benefícios resultam diretamente das aplicações de satélites artificiais na solução de problemas do cotidiano, especialmente no campo das telecomunicações, da previsão do tempo e do clima, do inventário e do monitoramento de recursos naturais, da navegação e da ciência. Os benefícios indiretos decorrem principalmente da utilização dos conhecimentos científicos e tecnológicos resultantes das atividades espaciais em inúmeros setores da atividade humana, desde a medicina à produção de bens e serviços bastante diversificados, com destaque para as áreas de microeletrônica, informática e novos materiais. Os investimentos brasileiros no campo espacial, ao longo dos últimos anos, permitiram ao País formar quadros competentes de especialistas, consolidar instituições nacionais de pesquisa e desenvolvimento, implantar importantes instalações de infra-estrutura e iniciar a formação de uma indústria espacial brasileira. Permitiram, ainda, a disseminação das técnicas de comunicações, navegação, sensoriamento remoto e meteorologia por satélites, de grande potencialidade no equacionamento de inúmeros problemas nacionais. A indústria nacional tem participado ativamente dos desenvolvimentos de projetos e possui um quadro técnico competente e com alto grau de qualificação acadêmica, similar ao encontrado nos institutos de pesquisa. O programa espacial brasileiro é denominado Programa Nacional de Atividades Espaciais (PNAE), e passou por recente revisão. Nela se procurou colocar em evidência o objetivo central do programa espacial, que é o desenvolvimento e a utilização da tecnologia espacial em benefício da sociedade e na solução de problemas nacionais, de modo a propiciar um aumento tangível na qualidade de vida. DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 5 Isso já pode ser visto com a utilização massiva de imagens de satélites nacionais (satélite CBERS) por empresas, universidades e órgãos governamentais, desde que foi implantada, em meados de 2004, a política de distribuição gratuita de imagens no Brasil, que tem contribuído para a geração de emprego, renda e serviços em benefício do país. O próprio texto do PNAE dá ênfase a este caráter estratégico do programa espacial, e procura fundamentar cada um dos grandes temas, em sua importância, e assim justificar as missões e ações do programa em função de seu retorno à sociedade, tornando mais clara e transparente a função da atividade espacial. 3. O contexto mundial Em 1961, quando o presidente Kennedy afirmou que os americanos colocariam o homem na Lua até o final daquela década, os EUA não possuíam foguetes sequer para colocar o homem em órbita da Terra. Em oito anos eles chegaram à Lua e bateram os soviéticos na Corrida Espacial. Quase meio século depois, os americanos anunciam o retorno à Lua. Prometem repetir a façanha em treze anos. Por si só, este fato é revelador do quão extraordinário foi o esforço dos americanos na década de 1960 para baterem os soviéticos na Corrida Espacial. Não fosse pela Guerra Fria, o homem ainda não teria pisado na superfície lunar. Ao anunciar o retorno à Lua, o presidente americano George Bush fez questão de ressaltar que não se trata de uma nova corrida espacial, mas sim de uma jornada para a qual estão convidadas todas as nações interessadas no bem comum. Ou seja, os americanos estão à procura de sócios para esta bilionária empreitada. Curiosamente, no momento em que surge mais uma oportunidade de cooperação internacional no espaço, surge um fato novo na ordem mundial. Trata-se da China, que muito recentemente adquiriu a capacidade de colocar homens em órbita da Terra. Ao contrário da Rússia, que tem uma economia em dificuldades, a China possui uma economia em expansão, com possibilidades de que este país asiático se torne a nova superpotência do planeta. Não custa lembrar que, para ajudar na manutenção do seu programa espacial, os russos têm vendido viagens espaciais à ISS, a bordo das espaçonaves Soyuz. Para usufruir dessa viagem, o interessado pagará 20 milhões de dólares. Três milionários já o fizeram, existindo outros na fila. É o Turismo Espacial, algo inimaginável há alguns anos. DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 6 A Guerra Fria, que levou à construção de um arsenal de milhares de armas nucleares capazes de destruir o planeta Terra centenas de vezes, também levou à Corrida Espacial, a partir da qual foram criados os meios necessários para melhorar a qualidade de vida na Terra e para permitir que o homem melhor conhecesse a sua origem e a do Universo em que vive. O mundo em que vivemos seria completamente diferente não fosse pelos engenhos espaciais, pois vejamos: • Os satélites de Comunicação (situados a 36.000 km da superfície terrestre) permitem que fatos ocorridos em um determinado local sejam transmitidos simultaneamente para todo o globo. • Os satélites Meteorológicos permitem que milhares de vidas sejam salvas, ao ajudar a antever a ocorrência de catástrofes naturais. Eles também permitem a quantificação dos fenômenos associados às mudanças climáticas. • Os satélites de Posicionamento Global (GPS), além de auxiliar na navegação terrestre, aérea e marítima, permitem a busca de desaparecidos em acidentes, bem como a localização de pessoas e objetos. • Os satélites de Observação da Terra permitem acompanhar o insano desmatamento na Amazônia e em outras partes do mundo, trazendo o assunto à discussão no seio de toda a sociedade. Eles também fornecem inestimáveis ferramentas de auxílio no planejamento urbano, uso do solo e estimativas de colheitas, entre muitas outras aplicações. • Os satélites Astronômicos, como o Telescópio Espacial Hubble, permitem a observação do espaço sideral sem a interferência da atmosfera terrestre. • Espaçonaves como a Voyager encontram-se a 14 bilhões de quilômetros da Terra, já fora do Sistema Solar, depois de terem visitado todos os planetas externos do Sistema Solar. • Outras espaçonaves (também chamadas de sondas), como a Deep Space 1, que colidiu intencionalmente com um cometa, auxiliam no estudo da sua constituição e no aumento de nosso conhecimento a respeito das origens do Sistema Solar. Outras sondas interplanetárias ampliam, de forma anteriormente inimaginável, nosso conhecimento de outros planetas do Sistema Solar, e contribuem para a busca de indícios de vida fora da Terra. DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 7 • Os instrumentos, equipamentos e técnicas desenvolvidos para uso espacial contribuem continuamente para o aperfeiçoamento de produtos e serviços que são disponibilizados de forma ampla para a sociedade (os chamados “spin-offs”). • O envio do homem ao espaço permitiu a abertura de novas fronteiras de pesquisa, como a da utilização da microgravidade em experimentos de longa duração. Além disso, também aumentou a consciência da humanidade quanto às limitações do planeta onde vivemos e da responsabilidade assumida pelo homem para a sua preservação, tendo em vista a sobrevivência de nossos descendentes. Os engenhos aqui mencionados foram, no início das atividades espaciais, colocados no espaço por meio de Mísseis Balísticos Intercontinentais transformados em foguetes. Paradoxalmente, as mesmas máquinas desenvolvidas para o transporte de artefatos que causariam a destruição da vida na Terra passaram a transportar espaçonaves que não somente ajudam a salvar vidas, como também a procuram fora de nosso planeta. 4. Os objetivos da série Pelas razões acima expostas, consideramos essencial que o sistema educacional brasileiro busque informar nossos estudantes e, por conseqüência, a nossa sociedade sobre: • a importância das atividades espaciais para nossa vida e economia; • o estágio atual das atividades espaciais brasileiras e do que já foi realizado; • a necessidade que uma nação como o Brasil tem de buscar autonomia e controle sobre o uso dessas ferramentas da tecnologia e da ciência para auxiliar na solução de seus problemas sociais, econômicos e ambientais; • a necessidade de ver o Estado brasileiro investindo na formação de novas gerações de técnicos e cientistas que ampliarão, em universidades, institutos de pesquisas, indústrias e escolas, o uso dessas poderosas ferramentas do conhecimento. Para buscar os objetivos acima, os vários órgãos que atuam em nosso Programa Espacial DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 8 desenvolvem atividades de ensino e divulgação. Estas atividades vêm se avolumando no passado recente e culminaram com a criação do Programa AEB Escola em 2003, no âmbito da Agência Espacial Brasileira (AEB). A consciência de que as tecnologias e ciências espaciais hoje fazem parte do cotidiano de nossos cidadãos, muito embora muitos não se dêem conta disso, foi um dos motivadores para a proposição desta série de programas, fruto de parceria entre o Programa AEB Escola e a TV Escola, do MEC. Ela tem os seguintes objetivos: • oferecer aos professores brasileiros conhecimentos fundamentais da área, que os habilitem a incluir com segurança o tema dentro dos conteúdos ministrados em sala de aula nas várias disciplinas regulares do Ensino Fundamental e do Ensino Médio; • apresentar de uma maneira contextualizada de que formas as tecnologias e ciências espaciais tornam o dia-a-dia do cidadão mais seguro e confortável e, • apresentar as técnicas, os métodos e as ferramentas didáticas já disponíveis para transferir esses conteúdos. Temas que serão debatidos na série Da Terra ao Espaço: tecnologia e meio ambiente na sala de aula, que será apresentada no programa Salto para o Futuro /TV Escola, de 15 a 19 de maio de 2006: PGM 1: O programa espacial brasileiro e suas ações de ensino e divulgação científica Neste programa, vamos apresentar e descrever o Programa Espacial Brasileiro desde a sua criação até a fase atual, suas principais realizações e as várias organizações que o desenvolvem. Como um desdobramento das atividades do Programa Espacial, será apresentado o Programa AEB Escola, uma iniciativa da Agência Espacial Brasileira, que busca divulgar as suas atividades por meio de iniciativas de formação continuada de professores, elaboração de material didático e eventos de divulgação científica (exposições, palestras e oficinas). Complementando os tópicos anteriores, apresentaremos a Olimpíada Brasileira de Astronomia e Astronáutica (OBA), iniciativa que visa fomentar o interesse dos jovens pela Astronomia e a Astronáutica. Em complemento, será apresentada a Jornada Espacial, evento do qual participam os alunos melhor classificados nas DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 9 questões de Astronáutica da OBA. PGM 2: O contexto histórico das atividades espaciais e a tecnologia dos foguetes Neste programa, vamos apresentar um breve histórico do desenvolvimento das atividades espaciais mundiais. Será enfatizado o contexto político que cercou as iniciativas das nações envolvidas na Corrida Espacial e serão apresentados os grandes programas tripulados da época, como o que levou o homem à Lua. Em seguida, o programa abordará, de forma didática, questões que envolvem o funcionamento de um foguete, seus princípios físicos e suas características. Também será relatado o que o Brasil fez e ainda pretende fazer nesta área. PGM 3: Satélites e plataformas espaciais: tecnologia e aplicações Neste programa, vamos descrever um satélite, como ele é constituído e para que serve. Será explicada a razão para sua permanência em órbita e qual são os benefícios que ele traz para a nossa sociedade. Também serão descritas as plataformas espaciais tripuladas, como é o caso da Estação Espacial Internacional, e qual é a sua utilidade. Como complemento do segundo tópico, será descrita a Missão Centenário, que envolveu a ida de um astronauta brasileiro até a Estação Espacial Internacional, onde ele realizou uma série de experimentos científicos preparados por pesquisadores brasileiros e também por um grupo de alunos e professores de escolas da rede pública de São José dos Campos (SP). PGM 4: Satélites e o meio ambiente Neste programa, vamos descrever duas grandes aplicações das tecnologias de satélites. A primeira delas é relacionada à meteorologia, que permite as previsões do tempo de grande precisão, hoje disponíveis para toda a sociedade, aliada às chamadas ciências ambientais, que buscam descrever de forma detalhada o funcionamento dos sistemas ambientais terrestres. A segunda aplicação a ser abordada é a observação da Terra por meio de satélites. Nesta área, veremos como é possível acompanhar em detalhe os processos associados ao uso do solo, ao crescimento das cidades, à desertificação e ao desmatamento, as estimativas para as safras, as queimadas, entre outros processos dinâmicos de grande interesse econômico, social e ambiental. PGM 5: As mudanças climáticas DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 10 Neste programa, apresentaremos a questão ambiental nos dias de hoje, a responsabilidade da sociedade moderna e as grandes ameaças ambientais conhecidas. Também apresentaremos um histórico sobre o denominado Efeito Estufa e suas possíveis conseqüências para a vida na Terra. As iniciativas que visam reduzir os seus impactos serão apresentadas, como é o caso do Protocolo de Quioto. Finalmente, discutiremos como o Brasil se situa nesta questão e qual a contribuição que ele pode dar ao mundo. Notas: 1- Doutor em Engenharia e Tecnologista do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). Presidente da Associação Aeroespacial Brasileira (AAB) e consultor desta série. 2- Doutor em Engenharia e Tecnologista do INPE. É o atual Diretor de Política Espacial e Investimentos Estratégicos da Agência Espacial Brasileira (AEB). 3- Doutor em Engenharia e atual chefe da Divisão de Sistemas Espaciais (ASE) do Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE). DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 11 PROGRAMA 1 O Programa Espacial Brasileiro e suas Ações de Ensino e Divulgação Científica Edmilson de Jesus Costa Filho 1 Ivette Maria Soares Rodrigues 2 João Batista Garcia Canalle 3 1. O Programa Espacial Brasileiro O homem nutre um enorme fascínio pelo espaço desde os primórdios da civilização. Ao longo do tempo, a simples curiosidade deu lugar à ciência e, cada vez mais, tem-se buscado a integração e o entendimento de fenômenos da Terra a partir do espaço. O espaço exterior é o único local do qual se pode observar a Terra como um todo. Desse modo, em temas como mudanças globais, avaliação das florestas tropicais e estudos climáticos, o uso de satélites de observação da Terra é a única forma de obter dados de forma ampla, sistemática e consistente. A tecnologia tem trabalhado em prol da criação de ferramentas para apoio à decisão e, neste contexto, o desenvolvimento de satélites tem um papel fundamental. Uma das classes mais difundidas de satélite são os de observação da Terra, que produzem imagens da superfície do nosso planeta. Essas imagens são fundamentais quando é preciso obter informação de forma rápida sobre eventos cuja localização e ocorrência são de difícil previsão ou acesso, como nos casos de desastres naturais (por exemplo enchentes) ou produzidos pelo homem (queimadas ou poluição causada por derramamento de óleo no mar), e ainda voltados ao gerenciamento de crises. Ciente dessas demandas, o Brasil se engajou formalmente nas atividades espaciais na década de 60. O marco inicial foi a criação do Grupo de Organização da Comissão Nacional de Atividades Espaciais (GOCNAE), pelo Governo Federal, no ano de 1961. Desde então, aumentaram-se os esforços políticos e tecnológicos para a consolidação do setor no país. Ao longo das quatro décadas da recente história das atividades espaciais no mundo, muitos benefícios econômicos e sociais, decorrentes de forma direta ou indireta dessas atividades, puderam ser bem caracterizados. Esses benefícios resultam diretamente das aplicações de satélites artificiais na solução de problemas do cotidiano, especialmente no campo das telecomunicações, da previsão do tempo e do clima, do inventário e do monitoramento de recursos naturais, da navegação e da ciência. O Programa Espacial Brasileiro estruturou-se nos anos 70 com a criação de novas organizações ou DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 12 com a alteração nos objetivos de instituições já existentes. No aspecto do gerenciamento, foi criado um programa denominado de Missão Espacial Completa Brasileira (MECB). O objetivo da MECB era a colocação em órbita de um satélite nacional por meio de um veículo lançador nacional, a partir de um centro de lançamentos também nacional. Dada a envergadura de seus objetivos, a Missão foi dividida em três programas (satélites, veículo lançador e centro de lançamento). Cada um desses subprogramas foi conduzido por uma instituição diferente. No caso dos satélites, a coordenação ficou a cargo do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), organização localizada em São José dos Campos (SP). O programa do Veículo Lançador de Satélites (VLS) ficou a cargo do atual Comando-Geral de Tecnologia Aeroespacial (CTA), mais especificamente de seu Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE), também localizados em São José dos Campos. Finalmente, o programa responsável pela construção do Centro de Lançamento de Alcântara (CLA) foi gerenciado pelo então Ministério da Aeronáutica (atual Comando da Aeronáutica). O programa de satélites previa a construção de duas classes de satélites. Seriam eles os Satélites de Coletas de Dados (SCD) – que seriam responsáveis pelo monitoramento do volume de rios, dados fundamentais para as previsões do sistema elétrico nacional, acompanhamento dos índices pluviométricos em diversas regiões do país, isto tudo junto com a obtenção de dados meteorológicos, como direção e intensidade do vento, pressão atmosférica, temperatura, umidade e intensidade da radiação solar. Este objetivo materializou-se com o lançamento dos satélites SCD-1, em 1993, e SCD-2, em 1998. A segunda classe de satélites seria voltada para a observação da Terra, técnica também conhecida como sensoriamento remoto (SSR), que tem a função de captar imagens da superfície terrestre. Este objetivo não se completou na forma originalmente planejada, tendo sido atingido mais tarde por meio de uma parceria com a China. A MECB também demandou a instalação de uma ampla infra-estrutura em solo para poder utilizar seus satélites, tais como plataformas de coletas de dados, centros de controle dos satélites (centros de rastreio e controle) e laboratórios para a interpretação das imagens enviadas pelos satélites. O esforço empregado no desenvolvimento de satélites foi coroado pelo sucesso dos programas de Coleta de Dados, no escopo da MECB, e do desenvolvimento de um programa de cooperação internacional com os chineses, denominado de Programa CBERS (Satélite Sino-Brasileiro de Recursos Terrestres), que tem contribuído de modo significativo para a utilização de informação DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 13 espacial na gestão governamental e para o surgimento de novas oportunidades de negócio. O Programa CBERS é hoje o mais importante programa de satélites conduzido pelo INPE. Ele já propiciou o lançamento dos satélites CBERS-1 (1999) e CBERS-2 (2003), e prosseguirá com mais três satélites previstos para serem lançados a partir de 2007 até o início da próxima década. Quanto aos foguetes nacionais destinados ao lançamento de satélites, o primeiro deles, denominado Veículo Lançador de Satélites (VLS-1), foi uma evolução de um programa iniciado nos anos 60 no CTA, denominado programa SONDA. O programa consistia em desenvolver foguetes balísticos (foguetes que descrevem uma parábola e voltam para o solo sem entrar em órbita da Terra) para a realização de pesquisas atmosféricas, com ou sem o aproveitamento do ambiente de pouca gravidade, nas áreas de física, astrofísica, química, biologia, meteorologia, etc. Foram desenvolvidos os foguetes SONDA I, II, III, IV, VS-30 e VS-40, sendo que em cada um dos modelos foi aumentado o nível de complexidade, tais como o número de estágios, seu alcance e a capacidade de carga. Assim, o VLS-1, que possui quatro estágios, auxiliando a alcançar maiores altitudes, foi construído a partir do conhecimento adquirido com os foguetes do programa SONDA. Embora assentado em um programa de desenvolvimento de foguetes de sondagem de sucesso, o projeto do VLS-1 tem passado por uma série de percalços, como indicam os três insucessos em lançamentos (1997, 1999 e 2003), sendo que o último resultou na morte de técnicos e engenheiros e na destruição de parte da infra-estrutura de lançamentos localizada em Alcântara, no Maranhão. Cabe observar que falhas e acidentes com artefatos espaciais não são raros, ocorrendo tanto com foguetes lançadores, quanto com satélites e outras naves. A título de exemplo, pode ser mencionado outro episódio ocorrido também em 2003, que foi a destruição da nave americana Columbia, quando da reentrada na atmosfera terrestre. A despeito das dificuldades, o desenvolvimento de foguetes de sondagem e do VLS-1 vem permitindo ao país, cada vez mais, consolidar os conhecimentos em propulsão, materiais e processos, controle e guiagem e experimentos científicos, que têm aumentado significativamente a participação industrial e as pesquisas científicas na área espacial. Encontra-se implantada, também, uma infra-estrutura de apoio significativa, na qual há que se destacar, além do Centro de Lançamento de Alcântara (CLA), no Maranhão, o Centro de Lançamento da Barreira do Inferno (CLBI) – localizado em Natal, no Rio Grande do Norte. Em São DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 14 José dos Campos podem ser encontrados o Laboratório de Integração e Testes (LIT), o Centro de Rastreio e Controle de Satélites (CRC), a Usina de Propelentes Coronel Abner (UCA), além de numerosos laboratórios de pesquisa. O Programa Espacial Brasileiro, a partir dos anos 80, ganhou em qualidade e complexidade. Por conseqüência, em 1994 foi criada em Brasília a Agência Espacial Brasileira (AEB), uma autarquia federal de natureza civil, hoje vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), que tem a atribuição de órgão coordenador das atividades espaciais brasileiras. Atendendo a uma antiga reivindicação da comunidade científica e tecnológica brasileira, a AEB nasceu com o objetivo de promover o desenvolvimento das atividades espaciais brasileiras de forma descentralizada. Para tanto, ela atua em estreita relação com as organizações que executam as atividades de nosso programa espacial, como o INPE e o IAE em São José dos Campos, e o CLA em Alcântara. Cabe à AEB obter os recursos governamentais necessários para cumprir os objetivos do Programa Nacional de Atividades Espaciais (PNAE), do qual falaremos a seguir. Para atender à nova realidade do programa espacial brasileiro, o PNAE foi elaborado à época da criação da AEB. O documento está em sua 3ª revisão e estabelece metas para o decênio 2005-2014. O PNAE atual foca nos grandes temas, ou missões, em torno dos quais se desenvolvem as atividades espaciais no Brasil, que são: Observação da Terra, Ciências Espaciais, Telecomunicações e Meteorologia. O documento também trata de questões associadas ao Acesso ao Espaço, InfraEstrutura, Pesquisa e Desenvolvimento, Recursos Humanos e Política Industrial. Além da continuidade dos grandes projetos, o programa retoma como prioridade o desenvolvimento dos lançadores, e não só do VLS, mas também de seus sucessores, voltados ao lançamento de satélites de maior porte, como são os de telecomunicações. A esse respeito, o novo PNAE inclui também um cronograma de lançamentos desses foguetes, atrelado ao cronograma de desenvolvimento dos satélites. Outro ponto forte é a implantação do Centro Espacial de Alcântara (CEA), um complexo de lançamento civil destinado à utilização comercial da região de Alcântara, no Maranhão. Este centro terá as instalações necessárias (energia, água, setor hoteleiro e de habitação, setor hospitalar, estradas, terminal portuário, etc.) para dar suporte aos sítios de lançamento comerciais que serão implantados na região. O Centro de Alcântara despertou interesse dos norte-americanos e ucranianos que têm acordos firmados com o Brasil para a utilização da infra-estrutura do Centro. DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 15 Em escala menos evoluída Índia, Rússia e China também têm interesse em firmar parcerias para o uso do CEA. Com relação aos satélites, além de missões de Observação da Terra e Científicas, foram incluídas no PNAE missões de Meteorologia e a construção de satélites de telecomunicações. Neste contexto, o objetivo será, principalmente, a capacitação da indústria nacional na tecnologia de satélites geoestacionários, para aumentar sua competitividade no mercado externo. Finalmente, em cumprimento ao objetivo do PNAE de divulgar amplamente os conhecimentos acumulados pelo nosso programa espacial, descobrir novas vocações e atrair novos talentos para a área, inclusive por meio de ações de divulgação científica nas escolas do país, foi criado o Programa AEB Escola, tema do próximo item. 2. O Programa AEB Escola Quantos de nós já não sonhamos, um dia, ser astronautas? O espaço e seus mistérios despertam a curiosidade dos jovens e, se curiosidade existe, porque não utilizá-la para estimular o interesse pela ciência e tecnologia? Foi assim que, em 2003, surgiu o Programa AEB Escola, uma iniciativa da AEB cujo objetivo é divulgar o programa espacial brasileiro em escolas do Ensino Médio e Fundamental do país e contribuir para despertar no estudante a criatividade e o interesse pela ciência e tecnologia, incentivando a vocação de futuros empreendedores, técnicos e pesquisadores. As ações do Programa são voltadas para estimular diretamente os estudantes com atividades práticas, que privilegiem a sua participação ativa na construção do conhecimento e contribuam para o seu efetivo envolvimento com temas de ciência e tecnologia. Para tanto, são realizadas palestras, exposições interativas, eventos para observação astronômica, oficinas para construção de lunetas com tubos de PVC, construção e lançamento de foguetes, entre outras atividades. Sendo o professor o mediador por excelência dos processos de ensino e de aprendizagem, são realizadas, também, diversas atividades especialmente voltadas para a formação continuada de professores. Esta ação visa ao desenvolvimento de competências e habilidades para se trabalhar com conteúdos de ciência e de tecnologia relacionados à área espacial. A formação continuada de professores é um dos pilares do Programa AEB Escola, pois garante a DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 16 sustentabilidade do Programa e promove a disseminação de suas ações. É implementada por meio do curso Astronáutica e Ciências do Espaço, que se constitui dos seguintes módulos: Projetos de Aprendizagem; Satélites e Plataformas Espaciais; Veículos Lançadores de Satélites; Experimentos Didáticos para o Ensino de Astronomia; Sensoriamento Remoto; Meteorologia e Ciências Ambientais. No curso Astronáutica e Ciências do Espaço são oferecidas aulas teóricas, nas quais os professores têm a oportunidade de conhecer diversos temas relacionados à área espacial, tais como: o contexto histórico da corrida espacial; o que são e como funcionam os satélites; a Estação Espacial Internacional; experimentos em ambiente de microgravidade; a tecnologia de foguetes; o que é sensoriamento remoto e quais são suas aplicações para recursos naturais; conceitos e aplicações em meteorologia; previsões de tempo e clima; mudanças climáticas; dentre outros. São oferecidas também aulas práticas por meio das quais os professores desenvolvem experimentos relacionados aos conteúdos vivenciados durante as aulas teóricas, os quais poderão ser utilizados para enriquecer as atividades em sala de aula. Como exemplo de oficinas tem-se: Câmara escura; A luneta Galileana; Comparação entre os tamanhos dos planetas e do Sol; O Sistema Solar em escala; Carro gravitacional; Construindo e lançando foguetes; Construindo um espectroscópio; Interpretando imagens de satélites; Como girar um satélite, etc. Outro exemplo de aulas práticas são os CDs interativos com aulas sobre diversos temas, tais como meio ambiente, satélites e seus componentes, dentre outros. As ações do Programa AEB Escola são desenvolvidas por meio de atividades educacionais interativas, com abordagem contextualizada e interdisciplinar, permitindo sua aplicação nas diversas áreas do conhecimento. Para alcançar os seus objetivos, o Programa desenvolve as seguintes atividades e produtos: • Formação continuada de professores; • Elaboração e produção de material didático; • Apoio técnico a professores; • Atividades do Programa em escolas e visitas de escolas às instituições executoras do programa espacial brasileiro; DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 17 • Olimpíada Brasileira de Astronomia e Astronáutica (OBA); • Jornada Espacial; • Participação em eventos de divulgação científica; • Exposição Interativa permanente Viagens Espaciais, na Universidade de Brasília (UnB) e Aspectos Científicos de Viagens Espaciais, na Estação Ciência – Universidade de São Paulo (USP) e • Apoio às ações do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas (FBMC). Em 2004, a partir de uma parceria entre a AEB e a Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal (SEDF), foi realizada a experiência piloto do Programa AEB Escola, no Centro Educacional 05, Taguatinga (DF). Em 2005, as ações do Programa foram expandidas para as demais escolas do Distrito Federal. Este ano, além das atividades desenvolvidas no Distrito Federal, as ações do Programa serão implementadas também no município de São José dos Campos (SP), por meio de parceria estabelecida com a Secretaria Municipal de Educação (SME/PMSJC). Alunos e professores dessas localidades terão acesso às atividades e produtos desenvolvidos pelo Programa AEB Escola, com ênfase para a formação de professores e atividades de sensibilização de alunos e professores para as temáticas espaciais, por meio de palestras, oficinas, exposições e visitas às instalações de instituições executoras do programa espacial brasileiro. É meta do Programa AEB Escola a criação de um curso de extensão para professores do Ensino Médio e Fundamental voltado para a temática espacial, o qual poderá vir a ser implementado por universidades e instituições de ensino e pesquisa do país que se interessarem em atuar como disseminadores das ações do AEB Escola. Adicionalmente, alunos e professores de outros estados poderão participar das seguintes ações: Olimpíada Brasileira de Astronomia e Astronáutica (OBA), Jornada Espacial e eventos de divulgação científica. Além disso, a partir de uma parceria com o Ministério da Educação (MEC), serão disponibilizados materiais didáticos utilizados pelo Programa. A OBA é realizada anualmente a partir de uma parceria entre a Sociedade Astronômica Brasileira (SAB) e a AEB. Em 2005, participaram da OBA em torno de 187 mil estudantes de 3.300 escolas DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 18 de todo o país. Os primeiros colocados nas questões de Astronomia e Astronáutica participam, respectivamente, da Escola de Agosto, realizada em conjunto com a reunião anual da SAB, e da Jornada Espacial, realizada em São José dos Campos. A IX OBA está prevista para o dia 12 de maio de 2006 (horário de Brasília), às 14h00, em escolas de todo o país. A Jornada Espacial tem por objetivo disseminar entre alunos e professores o desenvolvimento aeronáutico e espacial do Brasil e do mundo. As atividades são divididas em palestras, oficinas e visitas às instalações do INPE e CTA. Em 2005, participaram da 1ª Jornada Espacial representantes de 13 estados e mais o Distrito Federal. O desenvolvimento das atividades voltadas para a OBA e para a Jornada Espacial é feito com o apoio de pesquisadores e tecnologistas do INPE e do CTA. A 2ª Jornada Espacial deverá ocorrer no período de 17 a 22 de setembro de 2006. Os eventos de divulgação científica dos quais o Programa AEB Escola participa com exposições, palestras e oficinas são realizados anualmente, podendo ocorrer em diferentes localidades. São eles: • Semana Nacional de Ciência e Tecnologia (SNCT), evento de abrangência nacional que tem por objetivo mobilizar a população, em especial crianças e jovens, em torno de atividades científicas, valorizando a criatividade, a atitude científica e a inovação. Em 2006, a SNCT será realizada no período de 16 a 23 de outubro, não estando definidas ainda as localidades em que o AEB Escola se fará presente; • Reunião da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), tradicional evento de divulgação científica do qual participam sociedades e associações científicas das diversas áreas do conhecimento. Este ano, a 58ª SBPC e a XIV SBPC – Jovem deverão ocorrer em Florianópolis (SC), no período de 16 a 21 de julho e • Dia Mundial da Ciência pela Paz e pelo Desenvolvimento, evento promovido pela UNESCO em parceria com o MCT, MEC, AEB e outras instituições de ensino e pesquisa. O evento será realizado no dia 10 de novembro de 2006, em sua 2ª edição, no Distrito Federal, mas deverá alcançar abrangência nacional a partir de 2007. O sucesso das ações desenvolvidas pelo Programa AEB Escola em 2004 e 2005 possibilitou o estabelecimento de importantes parcerias com o MEC e Universidades do país, que contribuirão para a consolidação das ações do Programa em nível nacional em 2006, no que tange à elaboração, produção e distribuição de material didático. Dentre as ações em desenvolvimento, destacam-se: DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 19 • Produção da presente série para o Programa Salto para o Futuro da TV Escola, a qual intitula-se Da Terra ao Espaço: tecnologia e meio ambiente na sala de aula; • Produção de livros paradidáticos, que comporão a Coleção Explorando o Ensino, desenvolvida pela Secretaria de Ensino Básico do MEC, com o objetivo de auxiliar os professores do Ensino Médio e Fundamental (especificamente de 5ª a 8ª séries) na sua prática pedagógica. Além da impressão e distribuição de 177 mil exemplares de cada volume, o MEC também apoiará a impressão e a distribuição de um conjunto de 6 a 8 CD-ROM interativos utilizados no curso de formação de professores, os quais irão como encarte dos livros e • Produção integrada de recursos didáticos em mídias digitais para atendimento dos cursos do Programa Pró-Licenciatura do MEC, na prática de ensino em Ensino a Distância (EAD) de professores e alunos, o qual é voltado para a formação de 240 mil professores que estão exercendo a docência em salas de aula na rede pública do Ensino Médio e Fundamental sem formação legal específica. Ao divulgar as atividades espaciais e sua importância para o desenvolvimento socioeconômico do país, por meio da aproximação de especialistas da área espacial com a comunidade escolar, pretende-se contribuir para a qualidade do ensino e aprendizado nas escolas brasileiras. A gestão do Programa AEB Escola caracteriza-se pela integração de atividades de instituições públicas e privadas voltadas para o ensino da ciência e tecnologia na temática espacial e/ou interessadas em apoiar esta iniciativa. O AEB Escola é desenvolvido em parceria com a Secretaria de Ciência e Tecnologia para Inclusão Social do Ministério da Ciência e Tecnologia (SECIS/MCT), a Academia Brasileira de Ciências (ABC), a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), a Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal (SEDF), a Secretaria Municipal de Educação de São José dos Campos (SMC/PMSJC), o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE/MCT), o Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE/CTA), o Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA/CTA), a Estação Ciência da Universidade de São Paulo (USP), a Universidade de Brasília (UnB), a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), a Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC/RJ), a Sociedade Astronômica Brasileira (SAB), a Associação DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 20 Aeroespacial Brasileira (AAB) e a Associação Brasileira de Cultura Aeroespacial (ABCAer). A idéia, portanto, é privilegiar iniciativas bem sucedidas e unir esforços para a captação de recursos, formação de professores, produção de material didático e desenvolvimento de atividades em escolas, buscando a efetiva participação de todos os segmentos envolvidos. 3. A Olimpíada Brasileira de Astronomia e Astronáutica – OBA Toda criança gosta de brincar, aliás, gosta muito mais de brincar do que ir à escola, e disso ninguém duvida, basta lembrarmos de quando fomos crianças! Tendo que ir à escola, o horário mais esperado, sem dúvida, é o do recreio, ou então o antes ou o depois das aulas! Parece que o gosto pelas brincadeiras, pela alegria, pela descontração, pela diversão enfim, é intrínseco dos seres vivos. Podemos observar que tanto bebês humanos como de outros animais brincam quando pequenos. Brincam entre si e brincam com os adultos. Muitas das brincadeiras das crianças são na forma de desafios ou competições entre elas. Estas competições podem ser individuais, mas ficam mais legais quando são em grupo. Como exemplo, os vários tipos de jogos em equipe que existem. No Brasil, em particular, poderíamos dizer que os meninos já nascem jogando futebol. Até sabemos que uma criança está doente quando ela não quer brincar. Outra característica intrínseca das crianças é a curiosidade! Que adulto ainda não foi apanhado por uma série infinita de “por quês” de alguma criança? O tipo tradicional de escola é o oposto de tudo o que está no parágrafo anterior, pois é a ausência da alegria, da descontração, do prazer, é a presença da inatividade física e mental, além de não saciar as curiosidades naturais dos alunos. Por isso, para quase todas crianças o melhor mesmo da escola é o recreio, é o encontro com os amigos, mas também podem ser os campeonatos esportivos, ou então os corais, os grupos teatrais, as gincanas e as olimpíadas esportivas! Todas estas atividades são física e mentalmente sadias, além de envolver as crianças e adolescentes na convivência social e, no caso das competições esportivas, também as levam a conviver com os prazeres intensos das vitórias e com as frustrações das derrotas. No caso das derrotas esportivas, elas são amargas, porém, os próprios alunos se organizam para obterem melhores resultados, e de que forma fazem isso? Treinando mais intensamente! Pois sabem que com mais treino os resultados serão melhores. DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 21 Como, então, conciliar a necessidade de educar cientificamente nossas crianças sem suprimir sua busca pelos prazeres? Certamente existem várias soluções como, por exemplo, aulas em escolas bem equipadas – com muitas aulas práticas, a observação direta dos fenômenos da natureza – com o envolvimento direto dos alunos, tudo isso com professores bem preparados. Infelizmente, agentes externos às escolas não têm como interferir para resolver este tipo de problema. Podemos, sim, constatar a deficiência na formação dos professores, a falta de equipamentos nas escolas, a falta de bibliotecas, a falta de tempo para um ensino com mais envolvimento dos alunos, a falta de motivação dos professores, o excesso de trabalho, a escassez de salário, etc. Como, então, agentes externos às escolas, tais como nós, astrônomos profissionais, membros da Sociedade Astronômica Brasileira (SAB) e os dirigentes da Agência Espacial Brasileira (AEB) podem atuar no âmbito da comunidade escolar, sem interferir em sua organização interna, para ajudar a melhorar o ensino dos conteúdos e Astronomia e Astronáutica para os estudantes? Sabendo dos prazeres que as crianças têm pelas brincadeiras, jogos, desafios, competições e olimpíadas em geral, resolvemos convidá-las para uma OLIMPÍADA! Uma olimpíada parecida com as esportivas, pois é preciso gostar do jogo e o conteúdo do jogo aqui é algo que mexe intensamente com a curiosidade deles, que são justamente a Astronomia e a Astronáutica! A Astronomia, dita a mais antiga das ciências, pois pela observação dos céus se previa o clima, a época dos plantios, colheitas, etc., e a Astronáutica, provavelmente uma das mais novas ciências, está nos levando a expandir nossos conhecimentos visitando luas, planetas, etc. As duas ciências caminham de mãos dadas, pois as leis que regem os movimentos dos planetas, luas, estrelas e galáxias são as mesmas que regem os movimentos dos satélites, foguetes, naves e ônibus espaciais. Qual criança, ou até mesmo adulto, não admira o céu, a beleza da Lua, a imponência do Sol, a beleza das superfícies dos outros planetas e luas já visitadas ou observadas de grande proximidade? Quem não fica feliz em ver homens caminhando sobre a Lua, morando em estações espaciais, ou então usufruindo os avanços tecnológicos tais como as transmissões de rádio e TV ao redor de todo o planeta, a telefonia de longa distância, o mapeamento da Terra para previsão do tempo e clima, observação das plantações, dos incêndios florestais, dentre tantas outras aplicações? Esta Olimpíada de Astronomia e Astronáutica, portanto, alia o gosto natural das crianças pelas DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 22 competições e desafios e, ao mesmo tempo, mexe com sua natural curiosidade. Tal como em qualquer olimpíada, nesta também são necessários a preparação e o treinamento, para bem participar. Só que a preparação aqui é intelectual. A preparação e o treinamento para esta olimpíada consistem justamente em procurar saber tudo o que for possível até o dia da olimpíada sobre Astronomia e Astronáutica, ou seja, cada estudante que desejar participar precisará ler seus livros didáticos, revistas, livros paradidáticos, visitar páginas da Internet, planetários, observatórios, observar o céu, realizar experimentos previamente distribuídos aos participantes, visitar museus aeroespaciais ou astronômicos, centros de ciências, etc. Neste processo, todos os participantes estão fazendo o que os professores mais querem, ou seja, estudando! Só que estão fazendo isso por livre e espontânea vontade e com satisfação, pois estão matando a curiosidade deles e ao mesmo tempo estão se preparando para participar da Olimpíada Brasileira de Astronomia e Astronáutica, um evento de amplitude nacional, no qual poderão ganhar medalhas. Aliás, todo mundo gosta de ganhar medalhas. Se o filho ganha uma medalha, a família toda fica feliz. Quando o aluno ganha a medalha, a escola inteira fica feliz, quando não até as autoridades locais! Por isso, esta é uma olimpíada parecida com as esportivas, com a grande vantagem de que o preparo adquirido não desaparece após o evento, pois o que se aprende com prazer se guarda para sempre. Além disso, nesta olimpíada não há perdedores, pois no fundo todos os que estão estudando estão sempre ganhando. Aliás, somente perde quem não está participando da olimpíada, pois não está estudando. Nesta olimpíada, todos recebem certificados de participação e, ao contrário das esportivas onde apenas três ganham medalhas, nesta cerca de 5% dos participantes ganham medalhas!!! E tem mais, a participação é individual, mas a preparação é em grupos, quando então se propicia a interação social. Mas as vantagens desta olimpíada não param por aí. Esta é a única olimpíada que oferece prêmios também a todos os preparadores olímpicos, ou seja, os professores destes alunos, pois como todos sabem, sem preparadores nenhum time dá bons resultados. Por isso mesmo, enviamos para todos os professores, digo, preparadores olímpicos, um kit de material didático, contendo CDs de Astronomia e de Astronáutica, disquetes com provas anteriores, cartilhas, livretos, livros, revistas, etc., além de materiais que conseguimos obter de doações das editoras e livrarias brasileiras. Mas e as provas? Como são elas? São quatro diferentes níveis de provas. A do Nível 1 é só para os DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 23 alunos da 1ª e 2ª séries do Ensino Fundamental. Esta é a mais simples e curta de todas, porém já é informativa. A de Nível 2 é para alunos da 3ª e 4ª séries. Estes alunos já sabem ler com maior fluência e a prova é um pouco mais longa. Os enunciados das questões são mais informativos e as perguntas simples o bastante para que possam responder usando o próprio raciocínio. A de Nível 3 é para os alunos de 5ª a 8ª série do Ensino Fundamental e mantém a mesma filosofia, ou seja, bem informativa e ao alcance dos alunos. A prova do Nível 4 é a mais extensa de todas e destina-se a qualquer aluno do Ensino Médio. Em cada questão desta prova, damos uma verdadeira aula de Astronomia ou de Astronáutica, para só então fazermos uma pergunta relativamente simples. Anualmente, enviamos questionários aos professores, treinadores olímpicos, para saber se a extensão e a dosagem das provas estão aceitáveis. Em função das respostas deles, vamos modificando a forma das provas. Atualmente, a maioria dos treinadores olímpicos está plenamente satisfeita com o nível das provas. Além das medalhas, certificados para alunos e professores, kit didático para estes, também organizamos um curso de Astronomia, gratuito, de uma semana, para 50 alunos e outro para os respectivos 50 professores destes alunos. Deste grupo de alunos, ao final, selecionamos 5 que representam o Brasil na Olimpíada Internacional de Astronomia. Também organizamos, juntamente com a AEB, uma Jornada Espacial de uma semana, para 25 alunos, e outra para os 25 professores destes alunos. Em complemento, doaremos em 2006 para as escolas 5 telescópios, 100 lunetas e 50 maquetes de foguetes. Veja o regulamento completo em www.oba.org.br. Bibliografia consultada: COSTA FILHO, E.J. Política Espacial Brasileira. Rio de Janeiro: Ed. Revan, 2002. ASSOCIAÇÃO AEROESPACIAL BRASILEIRA (AAB). Cronologia do Programa Espacial Brasileiro. São José dos Campos: AAB, 2005. Disponível em www.aeroespacial.org.br/aab/downloads.php. Acesso em 22 de março 2006. AGÊNCIA ESPACIAL BRASILEIRA (AEB). Programa Nacional de Atividades Espaciais 2005-2014. Brasília: AEB, 2005. Disponível em: www.aeroespacial.org.br/downloads.php . Acesso em 22 de março 2006. Notas: DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 24 1- Analista em Ciência e Tecnologia do CNPq, economista formado pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Doutorando em Política Cientifica e Tecnológica (UNICAMP), membro-fundador da Associação Aeroespacial Brasileira (AAB) e autor do livro Política Espacial Brasileira – Ed. Revan. 2- Gerente do Programa AEB Escola. 3- Astrônomo e físico, professor adjunto do Instituto de Física da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 25 PROGRAMA 2 O Contexto Histórico das Atividades Espaciais e a Tecnologia dos Foguetes Danton José Fortes Villas Boas 1 A história dos foguetes Os primeiros foguetes foram construídos há cerca de mil anos, na China. Eram muito semelhantes aos fogos de artifício atualmente usados em comemorações e festas. Tinham aplicações militares e eram chamados de flechas de fogo. O projeto básico desses foguetes só foi alterado no século XIX, quando surgiram os foguetes militares do tipo Congreve. Em 1903, o cientista russo Konstantin Tsiolkovsky (1857-1935) apresentou a tese de que foguetes com propelentes líquidos poderiam chegar ao espaço. O primeiro lançamento moderno de foguetes foi realizado pelo americano Robert Goddard, em 1926. Já na década de 30, os militares alemães desenvolveram os foguetes V-2, que serviam para bombardear Londres a partir da Alemanha. Esses foguetes tinham a designação de A-4 na Alemanha. As bombas V2 e a II Guerra Mundial Em termos de tecnologia avançada e empenho de recursos, o lance de Hitler (1889-1945), para construir um arsenal de mísseis ofensivos, constituiu a mais ousada tentativa de aplicar a ciência de alta tecnologia aos armamentos da II Guerra Mundial. Os alemães projetaram e construíram um míssil supersônico, o A-4, que acabou sendo chamado V-2. Pretendiam lançar uma carga-útil de 1 tonelada de explosivos a 250 km, voando a 5 vezes a velocidade do som. O jovem Wernher von Braun (1912-1977) foi um dos principais responsáveis por este projeto. A partir de setembro de 1944, mais de 4 mil “armas de vingança” foram lançadas pelos alemães, matando 2.500 londrinos. Diante desta novidade, os aliados alteraram sua estratégia de guerra, visando à derrota dos nazistas. A Guerra Fria e a Corrida Espacial Finda a II Guerra Mundial, os melhores cientistas alemães do Terceiro Reich foram cortejados por soviéticos e americanos, ávidos por seus conhecimentos. Wernher von Braun foi para os Estados Unidos, levando consigo 1.500 técnicos e 14 toneladas de papéis. Outros cientistas, técnicos e DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 26 equipamentos foram levados para a URSS. A valorização dos especialistas mostrava o apogeu do poder da ciência. Ao final da guerra, a Alemanha foi dividida entre os aliados, dando origem à Alemanha Ocidental e à Oriental, esta última sob controle russo. A capital do Terceiro Reich, Berlim, que ficava na Alemanha Oriental, também foi dividida ao meio. Desde então, o mundo ficou dividido entre dois blocos político-militares. O capitalista, liderado pelos EUA, e o comunista, liderado pela URSS. Em 1948, o Partido Comunista Americano foi considerado ilegal. O período do pós-guerra até 1989 ficou conhecido como Guerra Fria. A Guerra Fria foi um período em que a guerra era improvável, e a paz, impossível. Improvável a guerra porque, a partir de 1949, a URSS passou a construir bombas atômicas. Conseqüentemente, na hipótese de um conflito armado, as duas superpotências tinham a capacidade de se destruírem mutuamente. Por outro lado, a paz era impossível, visto que cada lado representava pontos de vista políticos e econômicos antagônicos. Estavam plantadas as sementes para a Corrida Espacial. Nos EUA do pós-guerra, a idéia da felicidade no dia-a-dia estava associada à posse de bens de consumo. Os meios de comunicação difundiam a imagem de que só poderia ser feliz o americano que tivesse em casa todos os eletrodomésticos disponíveis no mercado, além de pelo menos um automóvel na garagem. Coisas de um consumismo assumido, que não existia nos países socialistas. Nesta época, os cientistas alemães levados para os EUA e para a URSS deram início a um intenso programa de desenvolvimento de mísseis. Não tardou para que o projeto da V-2 se transformasse em projetos de mísseis balísticos intercontinentais (ICBM: Intercontinental Ballistic Missile), capazes de carregar em suas ogivas bombas nucleares e de hidrogênio a qualquer ponto do território inimigo. Utilizando-se de um foguete derivado de um ICBM, os russos surpreenderam o mundo com o lançamento do primeiro satélite artificial da Terra. Era 4 de outubro de 1957 e o satélite chamava-se Sputnik, esfera metálica de 84 kg, com 58 cm de diâmetro, que transmitiu sinais à Terra por 21 dias. Em 3 de novembro de 1957, os soviéticos lançaram o Sputnik 2, com a cadela Laika a bordo. Atônitos, os americanos reagiram e, em 1958, o presidente Dwight Eisenhower (1890-1969) criou a NASA, centralizando nas mãos de civis as pesquisas do Exército, da Marinha e da Aeronáutica. O significado do Sputnik pode ser depreendido da fala do então senador Lyndon Johnson (1908-1973), que, ao saber do Sputnik, disse: “Quem controlar a posição privilegiada do espaço controlará o mundo. O Império Romano controlava o mundo porque abria estradas. Depois, o Império Britânico foi dominante porque tinha navios. Na era da aviação fomos poderosos porque tínhamos avião. Agora, os comunistas firmaram presença no espaço. Logo eles terão plataformas espaciais e jogarão bombas atômicas DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 27 sobre nós, como pedras do alto de uma ponte!” Poucos anos depois, os russos surpreendem novamente quando, em 12 de abril de 1961, Yuri Gagarin (1934-1968) deu uma volta completa ao redor da Terra a 28.800 km/h. Era o primeiro homem em órbita da Terra. Em seguida, em 5 de maio de 1961, o americano Alan Shepard tornouse o segundo homem a viajar ao espaço, mesmo que em um vôo suborbital com 15 minutos de duração. Finalmente, em fevereiro de 1962, a bordo da Mercury 6, John Glenn (1921-) completou três órbitas em torno da Terra, tornando-se o primeiro americano em órbita. Ciente de que os americanos estavam ficando para trás na disputa com os russos, o jovem presidente John Kennedy, então com 44 anos, fez o célebre discurso no qual disse: “Penso que esta nação deve empenhar-se para que o objetivo de pousar um homem na Lua e trazêlo de volta à Terra a salvo seja atingido antes do fim desta década. Nenhum outro projeto será mais importante para a humanidade, mais difícil ou mais caro de ser alcançado.” Estava consolidada a Corrida Espacial e o prêmio era a Lua. Entre os anos de 1957 e 1969, russos e americanos desenvolveram uma corrida pela conquista deste prêmio. Além da supremacia militar, o objetivo dessa corrida era mostrar a superioridade de um sistema político-econômico sobre o outro. Era a Guerra Fria alimentando a Corrida Espacial. A chegada do homem à Lua Os anos 60 viram um incrível desenvolvimento da tecnologia de foguetes e satélites nos dois lados do mundo. No final da década, cumprindo a promessa do presidente Kennedy, a Apollo 11 marcou a História da Humanidade. Lançada em 16 de julho de 1969, a Apollo 11 pousou na Lua (alunissou) 4 dias depois, num domingo, para deslumbramento de milhões de pessoas do planeta Terra. Às 15h18min (horário de Houston, EUA) do dia em que Santos-Dumont, se vivo fosse, completaria 96 anos, Neil Armstrong (1930-) e Buzz Aldrin (1930-) pousaram no solo lunar. Era o dia 20 de julho de 1969 e o homem já tinha inventado o satélite e a TV. Dessa forma, quase um bilhão de pessoas assistiram, ao vivo, à concretização de um sonho acalentado desde que o homem surgiu na face da Terra. Eram 21h56min, horário de Houston, quando Neil Armstrong pisou no solo lunar e proferiu a seguinte frase: “Este é um pequeno passo para o homem, mas um salto gigantesco para a humanidade” DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 28 Os russos continuaram com o seu programa de exploração lunar não tripulado. Para chegarem à Lua, os americanos tiveram que desenvolver novos foguetes. Para tanto, continuavam a contar com os extraordinários talentos de Wernher von Braun. Coube a ele a responsabilidade pelo desenvolvimento do Saturno V, o qual permanece até hoje como o maior e mais potente foguete construído pelo homem. Com 110 metros de comprimento e 10 metros de diâmetro, pesava 3 milhões de quilos (equivalente ao peso aproximado de 3.000 automóveis pequenos). Era tão pesado que, mesmo antes da sair do solo, consumia dezenas de toneladas de combustível (querosene e oxigênio). Sua altura era equivalente a um edifício de 36 andares. Destes, apenas um era ocupado pelos astronautas. Os demais eram tanques de combustível. Dividido em três estágios, o primeiro estágio possuía cinco motores que queimavam querosene e oxigênio líquidos. O segundo e terceiro estágios usavam hidrogênio e oxigênio líquidos. Uma maravilha tecnológica, mesmo para os padrões atuais. O pós Lua Após a conquista da Lua, os americanos retornaram em várias missões até que, em dezembro de 1972, os últimos homens pousam na Lua na missão Apollo 17. No primeiro vôo do programa Apollo-Soyuz, a Apollo 18, com três astronautas, acopla-se à Soyuz 19, com dois cosmonautas a bordo. Era o fim da Guerra Fria no espaço. A década de 70 marcou também o início do uso de estações espaciais com a Salyut russa e o Skylab americano. Ainda na década de 70, a pesquisa interplanetária se intensificou, com o lançamento de diversas sondas, como as Viking, Pioneer 10, Venera, entre outras. Entre 1975 e 1981, nenhum americano orbitou a Terra. O Ônibus Espacial Columbia inaugurou, em 12 de abril de 1981, o programa americano do Space Shuttle, 20 anos após o vôo tripulado inaugural de Gagarin. Nas décadas de 80 e 90, o uso de estações espaciais se consolida, com a estação Mir russa, que orbitou a Terra entre os anos de 1986 e 2001. A Estação Espacial Internacional começou a ser montada em 20 de novembro de 1998, sendo transportada pelo Ônibus Espacial e por foguetes russos. Nas últimas décadas, os lançamentos comerciais e o uso de satélites, nas suas várias aplicações, se expandiram e tornaram-se comuns. Em função de ser reutilizável, acreditava-se que o Ônibus Espacial traria uma grande redução nos custos da exploração espacial. Com exceção do tanque de combustível líquido, a nave e os tanques de combustível sólido são reutilizáveis. No entanto, os custos operacionais do ônibus espacial, da ordem de 500 milhões de dólares por vôo, consomem cerca de 40% do orçamento anual da NASA. Para completar, houve dois acidentes. O primeiro em 1986 e o último em 2003, ceifando as vidas de 14 astronautas. DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 29 Como funcionam os foguetes Os princípios físicos básicos dos fogos de artifício são os mesmos que lançam uma nave ao espaço. Os foguetes e os fogos de artifício funcionam da mesma maneira: o combustível é misturado com um material chamado oxidante, que é rico em oxigênio e necessário para a combustão. Essa mistura, chamada de propelente, é queimada formando gases quentes que se expandem e escapam por um dispositivo, denominado bocal ou tubeira, fazendo o foguete subir. São os gases escapando à velocidade elevada que geram a força (empuxo) necessária para mover o foguete em direção oposta. O mesmo efeito ocorre com uma bexiga de aniversário, quando a enchemos de ar e a soltamos, como mostrado na Fig. 1. Esse efeito físico foi explicado pela primeira vez no século XVIII, pelo cientista inglês Isaac Newton. Trata-se da Terceira Lei do Movimento, que explica que a cada ação (os gases escapando), há uma reação em sentido contrário e de mesma magnitude (a força que movimenta o foguete). O movimento de um objeto em resposta a uma força externa foi descrito pela primeira vez há cerca de 300 anos por este mesmo cientista, através de suas três leis do movimento. Os engenheiros e físicos usam as leis de Newton para projetar e calcular o vôo de foguetes reais. Figura 1: Princípio da Ação e Reação. Figura 2: Forças no foguete. DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 30 Ao descrever a ação das forças, deve-se descrever sua magnitude e o seu sentido. Durante o vôo, um foguete é sujeito a quatro forças: seu peso, o empuxo do motor e duas forças aerodinâmicas, a força lateral e o arrasto. A magnitude da força peso depende da soma das massas de todas as peças do foguete e da aceleração da gravidade (g). A força peso sempre é dirigida para o centro da Terra e age sobre o centro de gravidade (CG) do foguete, o ponto amarelo na Fig. 2. Ela atua no sentido de manter o foguete preso à superfície terrestre, da mesma forma que atua sobre os nossos corpos mantendo-os fixos à Terra. O valor de empuxo depende do fluxo de massa dos gases escapando através da tubeira, da velocidade de escape desses gases e da pressão na saída do tubeira. Esses gases são expelidos para baixo, fazendo que o foguete se desloque para cima. A força de empuxo age normalmente ao longo da linha central longitudinal do foguete e passa, conseqüentemente, pelo centro de gravidade. Algumas tubeiras de foguete podem mover-se para produzir uma força que não seja alinhada com o centro de gravidade. O torque resultante sobre o centro de gravidade pode ser usado para manobrar o foguete. O valor das forças aerodinâmicas depende da forma, do tamanho, da velocidade do foguete e das propriedades da atmosfera. A resultante das forças aerodinâmicas age através do centro da pressão (CP), o ponto preto e amarelo na Fig. 2. Uma delas, o arrasto, resulta da resistência que a atmosfera terrestre oferece ao movimento dos corpos e atua no sentido contrário ao movimento do foguete. Quando você está andando, você quase não percebe esta força. Entretanto, ao correr com a sua bicicleta você já deve ter experimentado a resistência do ar sobre o seu corpo. Durante o vôo, se fizermos o somatório das forças, considerando o sentido e a magnitude, nós obtemos uma força externa resultante no foguete. É então possível calcular o movimento do foguete através das leis de Newton do movimento. Propulsão Sólida versus Propulsão Líquida Os sistemas propulsivos empregados nos foguetes baseiam-se no escape de gases a alta velocidade por um orifício. A geração desse gás pode ser feita através da combustão de propelente sólidos ou líquidos. A queima do propelente no interior da câmara de combustão gera gases a alta pressão e DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 31 temperatura. Uma vez que a pressão interna é superior à externa, os gases no interior do motor escapam através de um orifício. Na engenharia de foguetes esse orifício é denominado de garganta da tubeira. Em um propulsor sólido (Fig. 3), o combustível e o oxidante são misturados formando uma massa que é inserida no envelope motor. Sob condições de temperatura ambiente, o propulsor não entra em combustão. A combustão se iniciará sob uma fonte externa de calor. Um dispositivo de ignição, chamado de ignitor, é usado para iniciar a queima do propelente, sendo instalado normalmente em uma das extremidades do motor. Durante a queima, gases serão produzidos, até que todo o propelente seja consumido. Em um propulsor líquido (Fig. 4), o combustível e o oxidante são armazenados em tanques separados e injetados na câmara de combustão, onde se misturam, e ocorre a combustão. Os propelentes líquidos podem ser do tipo em que o simples contato do combustível e oxidante é suficiente para iniciar a combustão. Esse é o caso, por exemplo, dos propulsores do módulo lunar, que pousou e tirou o homem da Lua. Nos outros casos, é necessário o uso de um sistema de ignição semelhante aos usados nos propulsores sólidos. Figura 3: Propulsor sólido. Figura 4: Propulsor líquido. Veículos lançadores de satélites e foguetes de sondagem Os foguetes de sondagem têm a missão de levar uma carga útil até a altitude requerida, ou prover um certo tempo de permanência acima de determinada altitude. Já os lançadores de satélites têm a missão de colocar um ou mais satélites em órbita da Terra. O que distingue um foguete de sondagem de um lançador de satélites é a velocidade imprimida à carga útil. No caso do lançador, DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 32 essa capacidade é muito maior, uma vez que para manter o satélite em órbita é necessário impor-lhe uma velocidade de aproximadamente 28.800 km/h. Por isso, os lançadores de satélites têm uma massa de propelente e um tamanho muito maior do que os foguetes de sondagem. No caso dos foguetes de sondagem e foguetes suborbitais, a velocidade orbital não chega a ser atingida e a carga útil descreve uma trajetória parabólica retornando à Terra. A queda pode ser no solo ou no mar, e o local é previsto antes do lançamento, para que esse seja feito com segurança. O legado de Santos Dumont Em 1891, o brasileiro Alberto Santos Dumont (1873-1932) mudou-se para a capital francesa, com o propósito de se tornar aeronauta. Vários especialistas dão a Alberto Santos-Dumont o crédito de ter sido a primeira pessoa a realizar um vôo numa aeronave mais pesada do que o ar, por meios próprios, no vôo que foi assistido por centenas de pessoas em Paris. Era 23 de outubro de 1906 e o 14-Bis desafiava a Lei da Gravidade executando um vôo impulsionado apenas pela força de seu motor. No livro "O que eu vi, o que nós veremos", escrito por Santos Dumont em 1918, em um trecho encontramos as seguintes palavras: “É tempo, talvez, de se instalar uma escola de verdade em um campo adequado. Não é difícil encontrá-lo no Brasil. Nós possuímos para isso excelentes regiões, planas e extensas, favorecidas por ótimas condições atmosféricas (...). (...) os alunos precisam dormir próximo à escola, ainda que, para isso, seja necessário fazer instalações adequadas (…) (...) margeando a linha da Central do Brasil, especialmente nas imediações de Mogi das Cruzes, avistam-se campos que me parecem bons (...).” Com essas palavras Santos Dumont sugeria, em 1918, a criação de uma escola de aviação no Brasil, e citava uma região que fica próxima de onde hoje se encontra o Comando-Geral de Tecnologia Aeroespacial (CTA) e o Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), que foram implantados em 1950 em São José dos Campos, SP. No Brasil, Santos Dumont é considerado o “Pai da Aviação” e o ITA conferiu a ele o título de Doutor Honoris Causa, em 1956. DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 33 Os foguetes de sondagem brasileiros As atividades espaciais no Brasil se iniciaram em 1961, ainda no início da corrida espacial entre russos e americanos. Na década de 60, foram criados o Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE) e o Centro de Lançamento da Barreira do Inferno (CLBI). Foram lançados foguetes estrangeiros e iniciou-se o desenvolvimento dos foguetes de sondagem da família Sonda, que continuou durante os anos 70 e 80. Na década de 80, foi iniciada a Missão Espacial Completa Brasileira (MECB) e implantado o Centro de Lançamento de Alcântara (CLA). O IAE, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), o CLA e o CLBI eram os pilares da realização dos objetivos da MECB. Dentro desse programa, coube ao IAE o desenvolvimento do Veículo Lançador de Satélites (VLS); ao INPE, o desenvolvimento dos satélites e as estações de solo correspondentes; ao CLA, o encargo de realizar as atividades referentes à operação de lançamento do VLS e, ao CLBI, operar como estação no acompanhamento do lançamento, com seus radares e meios de telemetria. Dentro do programa de desenvolvimento de veículos espaciais, diversos foguetes de sondagem e para vôos suborbitais foram projetados, qualificados e lançados (Fig. 5). Destacam-se a família de foguetes Sonda (II, III e IV) e os veículos para experimento de microgravidade da série VS (VS-30, VSB-30 e VS-40). Desde então, centenas de foguetes brasileiros foram lançados e o Brasil hoje se orgulha de vender seus veículos espaciais aos inventores dos foguetes modernos: os alemães. Diversas tecnologias desenvolvidas para os foguetes da família Sonda tiveram aplicação no projeto do Veículo Lançador de Satélites (VLS-1). Podemos ressaltar os sistemas de separação de estágios, sistemas de controle de atitude e do vetor empuxo, materiais metálicos e compostos de alto desempenho, entre outros. Figura 5: Foguetes de sondagem desenvolvidos no CTA-IAE. DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 34 O Veiculo Lançador de Satélites (VLS-1) O desenvolvimento do VLS-1 teve, efetivamente, o seu início em 1984, após o primeiro lançamento do foguete Sonda IV. O projeto do VLS-1 baseou-se numa premissa de que o sistema deveria fazer o máximo uso das tecnologias, dos desenvolvimentos e das implantações já disponíveis no País. O embargo sofrido pelo País, no que se refere ao fornecimento de componentes com aplicação espacial, fez com que fossem adotadas alternativas para a substituição de componentes inicialmente especificados para o projeto VLS-1, então disponíveis para a venda no mercado internacional. Isto acarretou a necessidade de novos desenvolvimentos e/ou a procura de novos fornecedores, acarretando atrasos sucessivos no programa de desenvolvimento do projeto. Ademais, as décadas de 80 e 90 foram marcadas por sucessivas crises econômicas, o que limitou os recursos disponíveis ao Programa Espacial. O VLS-1 conta com motores a propelente sólido divididos em quatro estágios. Acionados um após a queima do outro, oferecem, nas diferentes fases da trajetória do lançador, o impulso necessário à colocação do satélite no espaço. O VLS-1 é um lançador de satélites convencional lançado a partir de plataforma terrestre. Na decolagem, o comprimento do veículo é de 19 m, a massa é de 50 toneladas e o empuxo de 1.000 kN (aproximadamente 100 toneladas). A propulsão principal é fornecida por propulsores a propelente sólido em todos os estágios, com massa total de 41 toneladas de propelente, ou seja, mais de 80% da massa total. O desempenho nominal do VLS-1 permite a colocação de satélites com massa de 100 a 350 kg em órbitas circulares de 250 a 1.000 km. O primeiro estágio é composto por quatro motores. Eles são fixados lateralmente em relação ao corpo central composto pelos segundo, terceiro e quarto estágios e pela carga útil (Fig. 6). Após o vôo do primeiro estágio, seus propulsores são ejetados do corpo central. O vôo continua com o acionamento sucessivo dos propulsores do segundo, terceiro e quarto estágios, com as respectivas separações desses estágios logo que o propelente seja consumido (Fig. 7). O corpo central é composto pelos propulsores empilhados um acima do outro, numa configuração chamada de DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 35 “tandem”. O VLS-1, atualmente, encontra-se na fase de qualificação em vôo. Até o presente, foram construídos três protótipos e efetuados dois lançamentos a partir do Centro de Lançamento de Alcântara (CLA). Nos lançamentos dos protótipos V01 e V02, realizados em 1997 e 1999, respectivamente, problemas técnicos impediram o cumprimento da missão, mas permitiu a qualificação em vôo de diversos componentes do veículo. O protótipo V03, cujo lançamento deveria ter ocorrido em 2003, resultou em acidente, em 22 de agosto daquele ano, antes da tentativa de lançamento. O futuro do programa de lançadores no Brasil O desenvolvimento do VLS-1 continua, com a revisão de diversos sistemas. É previsto o lançamento do quarto protótipo e, posteriormente, o desenvolvimento de novos lançadores, dando continuidade ao Programa Nacional de Atividades Espaciais (PNAE). Em 24 de outubro de 2005, a AEB e o CTA anunciaram um novo Programa de Lançadores. Ele é denominado Programa Cruzeiro do Sul (em referência às cinco estrelas da constelação Cruzeiro do Sul). A nova família de lançadores é composta pelos veículos Alfa, Beta, Gama, Delta e Épsilon (Fig. 8), e atenderá tanto às missões espaciais propostas no PNAE, como às missões de clientes internacionais. O programa, que prevê uma evolução gradativa dos seus veículos para alcance de maiores capacidades de transporte de carga útil, terá como um de seus maiores desafios o desenvolvimento e fabricação de motores à propulsão líquida de médio e grande porte. O primeiro veículo do programa, o VLS Alfa é um lançador de três estágios e é baseado no VLS-1. Ele utiliza o DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 36 1º e o 2º estágios do VLS-1 e incorpora um novo propulsor a propelente líquido em substituição aos 3º e 4º estágios do VLS-1. O programa tem previsão de lançamento do veículo de maior porte (VLS Epsilon) em 2022, ano do Bicentenário da Independência. O programa possibilitará ao Brasil a independência no transporte espacial de satélites de pequeno a grande porte. Figura 8: Lançadores Cruzeiro do Sul. Bibliografia consultada: VILLAS BOAS, D.J.F. O Veículo Lançador de Satélites – VLS-1. 1ª Jornada Espacial. Brasília: AEB, 2005. 1 CD-ROM (várias outras referências são mencionadas neste texto). PESSOA FILHO, J.B. O Contexto histórico da corrida espacial. 1ª Jornada Espacial. Brasília: AEB, 2005. 1 CD-ROM (várias outras referências são mencionadas neste texto). Centro Técnico Aeroespacial – CTA. CD-ROM distribuído durante a 1a Jornada do Espaço (2005). Contém vídeos institucionais da AEB e do IAE. Folha conta a conquista do espaço. Produção de Max Filmes. São Paulo: Videoteca Folha, 1995. 1 videocassete (35 minutos), VHS, son., color. Jornal Folha de São Paulo. A Conquista do Espaço. Videoteca Folha. Nota: 1- Tecnologista Sênior do Instituto de Aeronáutica e Espaço (CTA-IAE), em São José dos Campos (SP). PROGRAMA 3 DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 37 Satélites e Plataformas Espaciais: tecnologia e aplicações Petrônio Noronha de Souza 1 Raimundo Nonato Fialho Mussi 2 1. Satélites e plataformas espaciais Este capítulo se inicia discutindo, de forma geral, a tecnologia de satélites. Nele são abordados aspectos variados associados aos satélites, suas órbitas e aplicações. É apresentada uma descrição geral de suas partes principais e da função de cada uma delas. Em seguida, são apresentadas as plataformas (estações) espaciais, com uma discussão histórica e uma breve apresentação da Estação Espacial Internacional. Como funcionam os satélites – o movimento orbital e a atitude Satélites artificiais normalmente giram ao redor da Terra, também podendo ser colocados em órbita da Lua, do Sol ou de outros planetas. A trajetória do satélite em torno da Terra define a sua órbita. O movimento orbital do satélite pode ser entendido como o movimento de um ponto de massa ao redor da Terra. Este ponto representa toda a massa do satélite. As órbitas podem ser baixas ou altas. Por exemplo, uma altitude de 700 km define uma órbita baixa, enquanto que uma órbita de 36.000 km define uma órbita alta. Os satélites mantêm-se em órbita devido à aceleração da gravidade e à sua velocidade. Dessa maneira, eles permanecem em constante queda livre em torno da Terra, comportando-se como se estivessem “presos” em sua órbita. A Fig. 1 apresenta uma ilustração que foi originalmente elaborada por Isaac Newton, quando apresentou a Lei da Gravitação Universal. Nela, ele sugere que de um canhão suficientemente potente colocado no alto de uma montanha, seria possível lançar um projétil que permaneceria em órbita da Terra. Guardadas as devidas proporções, essa foi uma sugestão tecnicamente fundamentada de como seria possível colocar um artefato em órbita de nosso planeta. DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 38 Figura 1: Como um objeto poderia ser colocado em órbita da Terra. Os tiros de 1 a 5, embora cada vez mais potentes, não foram capazes de superar a aceleração da gravidade. O tiro 6 foi capaz e, por isso, a bala foi colocada em órbita. As órbitas sofrem alterações ao longo do tempo, pois outras forças atuam sobre o satélite. Dentre elas, destacam-se as atrações gravitacionais do Sol e da Lua, além dos efeitos da pressão de radiação solar e do arrasto atmosférico. São efeitos pequenos mas que somados ao longo do tempo causam alterações no movimento orbital. Por isto, os satélites precisam ser equipados com dispositivos para corrigir sua órbita, que têm a forma de pequenos motores foguete. A altitude baixa ou alta é definida em função da missão do satélite. Por exemplo, os satélites de comunicações, como os que são utilizados para transmissão de TV, precisam ser posicionados à grande altitude. É necessário notar que, quanto mais alto estiver, mais longa será a trajetória do satélite em torno da Terra. Quanto maior for a altitude, maior será também o tempo para dar uma volta ao redor da Terra. Existe uma altitude na qual o período orbital do satélite é de exatamente 24 horas. Esta órbita está a aproximadamente 36 mil km de altitude e é chamada de geoestacionária. Como nesta altitude as velocidades orbital e de rotação da Terra são as mesmas, o satélite estará sempre na mesma posição em relação à Terra. Estas órbitas são apropriadas para satélites de comunicação, pois podemos manter uma antena sempre apontada para uma mesma região da Terra. Órbitas mais baixas são apropriadas para satélites de exploração científica, de engenharia e de observação da Terra. As órbitas podem ainda ser do tipo equatorial, inclinadas entre o equador e os pólos, ou polares. De fato, as órbitas polares são órbitas inclinadas de aproximadamente 90 graus em relação ao equador. O tipo de órbita, não apenas a altitude mas também a inclinação, dependem da missão do satélite. A Fig. 2 apresenta os tipos de órbita mais utilizados. DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 39 Figura 2: As órbitas mais utilizadas pelos satélites atuais: equatorial baixa (Low Earth Orbit); polar (Polar Orbit) e; geoestacionária (Geostationary Orbit). Existe um outro tipo de movimento do satélite que se refere ao que ocorre em torno do seu centro de massa. Considere a Terra girando no espaço. O movimento de translação em torno do Sol é o seu movimento orbital. O movimento de rotação da Terra refere-se ao movimento em torno do seu centro de massa. O movimento do satélite em torno do seu centro de massa define seu movimento de atitude, ou seja, como o satélite se comporta no espaço em relação a este ponto. O movimento de atitude precisa ser controlado para que o satélite comporte-se de forma a satisfazer os requisitos da missão para a qual ele foi projetado. Por exemplo, se a missão requer uma antena apontada para a Terra, então sua atitude deve ser controlada de tal forma que a antena fique apontada para ela. Se uma face do satélite deve ficar apontada para o Sol para, por exemplo, captar energia solar, então, deve-se controlar o movimento de atitude do satélite de tal forma que aquele requisito seja satisfeito. A necessidade de controlar a atitude do satélite deu origem a uma área de estudo chamada Dinâmica e Controle de Atitude de Satélites. Existem vários procedimentos para se fazer o controle de atitude dos satélites. Por exemplo, pode-se estabilizar o satélite por rotação de tal forma a manter um eixo fixo no espaço. Trata-se de algo análogo ao que ocorre com o pião. Em alta rotação, mesmo na superfície da Terra, o pião “dorme” estável, em torno do seu eixo de rotação. O pião perde a estabilidade por causa dos atritos com o ar e, da sua ponta com o solo, sendo esta o suporte para seu movimento rotacional. No espaço, o atrito do ar é quase inexistente. Por outro lado, o satélite no espaço não precisa apoiar-se em uma superfície. Por isto, ele gira em torno do seu centro de massa da mesma forma que a Terra gira em torno de si mesma, suspensa no espaço. Esta solução foi DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 40 adotada pelos satélites brasileiros SCD-1 e SCD-2, que foram colocados em órbita girando como um pião. O SCD-1 foi estabilizado por rotação a 120 rpm. Após 10 anos no espaço, sua rotação caiu para aproximadamente 50 rpm, ainda dentro das especificações para o seu funcionamento. O SCD-2 foi estabilizado a 30 rpm. Muitas missões requerem controle da atitude do satélite em três eixos, ou seja, existem duas ou três direções que precisam ser controladas. Um exemplo disto seria o satélite apontar uma face para a Terra enquanto mantém a outra apontada na direção da velocidade. Nestes casos, o sistema para controlar o satélite pode requerer pequenos motores ou jatos de gás para gerar empuxos, bobinas magnéticas para produzir torques (algo semelhante ao motor de arranque dos carros) e rodas de reação. Estes equipamentos são todos chamados de “atuadores”. Por exemplo, as rodas de reação são pequenos volantes equipados com um motor elétrico. Quanto o motor acelera o volante em um dado sentido, o resto do satélite é acelerado em sentido contrário. A Fig. 3 mostra uma roda de reação, juntamente com uma descrição do fenômeno. É importante observar que todos os atuadores utilizam o princípio da ação e reação de Newton. Figura 3: Exemplo de Roda de Reação e de seu princípio de funcionamento. As flechas indicam os sentidos opostos em que giram a roda de reação e o satélite quando a roda é acelerada no sentido horário. Como funcionam os satélites – subsistemas e aplicações Uma missão utilizando satélites envolve várias partes. A mais evidente é a que é colocada no espaço. Cada uma delas é geralmente designada “segmento”. Dentre os vários segmentos existentes, os mais conhecidos são: • Segmento Espacial: é a parte que é colocada em órbita, também designada satélite. DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 41 • Segmento Lançador: é a parte utilizada para a colocação do satélite em órbita, também designada foguete. • Segmento Solo: é a parte encarregada da supervisão do funcionamento do satélite, seu controle e recepção dos dados de suas cargas úteis. O Segmento Espacial, ou satélite, é normalmente dividido em duas grandes partes. A primeira delas é designada Plataforma e contém todos os equipamentos necessários para o funcionamento do satélite. A segunda parte é denominada Carga Útil e é constituída pelos equipamentos requeridos para o cumprimento da missão dos satélites. A Fig. 4 apresenta um exemplo de satélite integrado ao último estágio de seu lançador. Na figura, é possível identificar a Plataforma e as Cargas Úteis do satélite. Os equipamentos que formam a Plataforma dos satélites são normalmente organizados em subsistemas. Assim é feito para sistematizar o trabalho de especificação, compras, projeto, revisão, montagem e testes, dividindo-o em áreas de competência. Os subsistemas usualmente encontrados nos satélites convencionais são os seguintes (Fig. 4): Figura 4: Exemplo dos Segmentos Lançador e Espacial de um satélite. • Controle de Atitude: tem por objetivo controlar o apontamento do satélite no espaço. • Suprimento de Energia: tem por objetivo fornecer a energia necessária para o funcionamento do satélite. • Telecomunicação de Serviço: tem por objetivo enviar e receber os dados que permitem o DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 42 acompanhamento do funcionamento e o comando do satélite. • Gestão de Bordo: tem por objetivo processar as informações recebidas da ou a serem enviadas para a Terra, assim como as informações internas ao satélite. • Estrutura e Mecanismos: tem por objetivo fornecer o apoio mecânico e de movimento para as partes do satélite e, também, oferecer proteção contra as vibrações de lançamento e contra a radiação em órbita. • Controle Térmico: tem por objetivo manter os equipamentos dentro de seus limites de temperatura. • Propulsão: tem por objetivo fornecer o empuxo necessário para o controle da atitude e da órbita do satélite. A Carga Útil dos satélites é constituída por um ou mais equipamentos, tais como sensores, transmissores, antenas. São eles que cumprem as missões para as quais os satélites são projetados. As missões mais comumente encontradas são: • Científicas: Astronomia e Astrofísica; Geofísica Espacial; Planetologia; Ciências da Terra, Atmosfera e Clima. • Operacionais: Observação da Terra; Coleta de Dados; Comunicações; Meteorologia; Navegação; Alarme, Busca e Localização; Militar. • Tecnológicas: Uso da Microgravidade; Validação de novos equipamentos e inovações tecnológicas. As plataformas (estações) espaciais As origens da idéia de uma Estação Espacial As origens datam de uma época na qual ciência, tecnologia e ficção (científica) se confundiam. Aparentemente, a primeira referência data de 1869, quando o romancista americano Edward Hale DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 43 imaginou um satélite que teria como missão auxiliar a navegação em alto mar (o que o sistema GPS faz hoje). Em 1903, o russo Konstantin Tsiolkovsky publicou um trabalho de ficção, com forte base científica, o qual previu a existência de estações espaciais em órbita, bem como missões interplanetárias. O termo “estação espacial” foi cunhado pelo romeno Hermann Oberth em 1923, que a concebeu com a forma popular de um toróide posto em lenta rotação, e já lhe atribuiu objetivo de entreposto para futuras missões para a Lua e Marte. Em 1928, o austríaco Herman Noordung apresentou os primeiros esquemas para uma possível estação, já considerando o lançamento por meio de foguetes e sua divisão em módulos com diferentes funções. Os passos seguintes foram dados pelo alemão Wernher von Braun, que em 1946 apresentou aos militares americanos planos para uma estação espacial. Após aperfeiçoamentos, ele os publicou em 1952 na forma de artigos e documentários com planos preliminares que incluíam dimensões e órbita. Neles, a estação mantinha a arquitetura toroidal em rotação, como forma de garantir um ambiente de gravidade artificial. A ela, ele atribui as funções de observação da Terra, laboratório, observatório astronômico e entreposto para missões destinadas à Lua e a Marte, basicamente as mesmas funções atribuídas à Estação Espacial Internacional dos dias atuais. Como se não bastasse, ele também indicou que ela seria abastecida por uma nave reutilizável dotada de asas, antevendo o desenvolvimento do Ônibus Espacial americano. Quando e como tudo começou e suas motivações Com o lançamento do satélite Sputnik 1 pelos soviéticos em 1957, a competição da Guerra Fria se estendeu ao espaço. Os americanos responderam com a criação da NASA em 1958 e iniciaram o Projeto Mercury em 1959, já visando à colocação de um homem no espaço. Nesta época, os dois lados acreditavam que uma estação espacial seria o passo seguinte após o domínio da tecnologia que permitiria alcançar a órbita da Terra com uma nave tripulada. Os soviéticos foram novamente pioneiros ao colocar o primeiro homem em órbita em 1961, e já no ano seguinte tinham planos para uma estação espacial semelhante ao que seria a MIR. Foram igualados pelos americanos poucos meses depois e estes decidiram lançar um desafio ainda maior que o da colocação de uma estação tripulada em órbita, que foi o de uma missão tripulada para a Lua. Nascia o programa Apollo e o desafio lançado redirecionaria as atividades das duas nações, adiando os planos das estações espaciais. No entanto, já em 1964 a NASA planejava a era pós-Apollo, na forma de sua primeira DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 44 estação, o laboratório Skylab, que seria lançado em 1973. Pouco tempo depois (em 1968), também concluíram que precisavam de uma nave reutilizável para alcançar a órbita da Terra, que deu origem ao programa do Ônibus Espacial, que adiaria os planos de uma estação espacial americana permanente uma vez mais. Também em 1964 os soviéticos iniciaram o desenvolvimento daquela que seria a primeira estação espacial da história, a Salyut 1, lançada em 1971, resultado do redirecionamento de seus esforços, assim que ficou claro que não conseguiriam bater os americanos na corrida pela Lua. Até aquela época, a competição entre as duas nações era a tônica de seus programas espaciais tripulados. As realizações da União Soviética/Rússia Entre 1971 e 2001, a União Soviética, depois a Rússia apenas, desenvolveu, lançou e operou três gerações de estações espaciais. A primeira geração incluiu as naves Salyut 1 a 5 e durou de 1971 até 1977. A segunda incluiu as Salyut 6 e 7 de 1977 a 1991. A terceira geração, a primeira de estações permanentes, foi a nave MIR, que teve sua montagem iniciada em 1986 e que foi operada até 2001, ano de sua retirada de órbita. Com a sua entrada no programa da ISS, os esforços para o desenvolvimento de uma estação sucessora da MIR foram redirecionados para o desenvolvimento da parte russa da ISS, derivada dos planos originais daquela que seria a MIR 2, o que acabou não se realizando. As realizações dos Estados Unidos Com o lançamento da nave Skylab, em 1973, teve início um ciclo de dois anos no qual os americanos, pela primeira vez, operaram uma estação espacial. Encerrada a operação da Skylab, os esforços americanos voltaram-se para o desenvolvimento do Ônibus Espacial, que voou pela primeira vez em 1981, quando então os planos para uma nova estação espacial foram retomados. Em 1982, foi proposto um programa a ser desenvolvido em colaboração internacional, objetivo confirmado em 1984 pelo então presidente americano, Ronald Reagan, que autorizou a NASA a buscar parceiros entre os aliados americanos. Em 1985, o Japão, a ESA (Agência Espacial Européia) e o Canadá já estavam engajados no programa. O período até 1993 viu uma série de revisões do projeto, a mais importante devido à entrada da Rússia em 1992. Entre 1993 e 1998, o programa entrou em uma fase mais estável sob o ponto de vista técnico, que culminou com o DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 45 lançamento da primeira parte (um módulo russo de nome Zarya), em 1998. A estabilidade do projeto durou até 2001, quando, em virtude dos altos custos estimados, a NASA foi obrigada a cancelar ou suspender o desenvolvimento de alguns módulos essenciais para a ampliação da tripulação para 6 ou 7 membros. Com isso, a ISS foi reconfigurada com vistas a manter apenas três tripulantes, mas com planos para futura ampliação. Mais recentemente, o acidente com a nave americana Columbia, em fevereiro de 2003, levou a uma suspensão das atividades de montagem da ISS, que deverá perdurar até, no mínimo, meados de 2006, atrasando ainda mais o seu já dilatado cronograma de montagem. Características e objetivos da Estação Espacial Internacional (ISS) A ISS permanece em órbita da Terra a uma altitude média de 407 km e inclinação de 51,6 graus em relação ao equador, da qual é capaz de observar 85% da superfície do planeta. Nesta órbita, o período necessário para dar uma volta na Terra é em torno de 90 minutos. Sua massa final será de aproximadamente 450 toneladas, e suas medidas alcançarão aproximadamente 108 m de envergadura por 74 m de comprimento. Seus painéis solares permitirão a geração de aproximadamente 110 kW de potência. A atmosfera interna da ISS é igual à da Terra e ela foi projetada para abrigar até sete astronautas, quando completa. Quando integralmente montada, ela deverá ter um laboratório americano, um europeu, um japonês e um russo, além de vários outros módulos necessários para a operação da nave e acomodação dos astronautas. Os experimentos colocados dentro destes módulos permanecerão em ambiente pressurizado, ao abrigo do espaço exterior. A ISS também possuirá pontos para montagem de equipamentos fora dos módulos pressurizados, permitindo assim a exposição de experimentos ao ambiente espacial. Ilustrações detalhadas das variadas partes da ISS podem ser encontradas no seguinte endereço da NASA na Internet: www.nasa.gov/mission_pages/station/main/index.html. Aspectos fundamentais da organização do Programa Estação Espacial Internacional O Programa Estação Espacial Internacional é uma iniciativa dos governos de 16 países por meio de suas respectivas agências espaciais. A participação internacional engloba dois tipos de representação: os chamados Parceiros e os Participantes. Os Parceiros desfrutam do mesmo status DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 46 da NASA, embora atuem sob sua liderança. Além de fornecer equipamentos, os parceiros dividem com a NASA os custos correntes para a operação da ISS e operam os segmentos (conjuntos de equipamentos) por eles fornecidos para a ISS e sobre os quais eles ainda mantêm jurisdição. As agências espaciais que representam os Parceiros são a Agência Espacial Americana (NASA), a Russa (Roscosmos), a Japonesa (JAXA), a Canadense (CSA) e a Européia (ESA, que inclui a Itália, Bélgica, Holanda, Dinamarca, Noruega, França, Espanha, Alemanha, Suécia, Suíça, Reino Unido). Os Participantes são países que passaram a integrar o programa ao compartilhar os direitos e obrigações de um dos Parceiros. Eles não contribuem para os custos de operação da ISS e não operam os equipamentos por eles fornecidos, cuja jurisdição é transferida para os Parceiros. Os Participantes que hoje integram o programa estão ligados apenas à NASA, embora os outros Parceiros também possam trazer seus próprios Participantes. Os que hoje integram o programa nessa condição são a Agência Italiana (ASI) e a Brasileira (AEB). Objetivos da Estação Espacial Internacional Devido às inusitadas dimensões físicas, à magnitude dos custos e aos longos prazos envolvidos para o seu desenvolvimento e utilização, assim como ao número de organizações e países envolvidos nessas atividades, o Programa Estação Espacial Internacional não pode ser caracterizado por um único objetivo, como é normalmente o caso dos programas para o desenvolvimento de satélites. No caso da ISS, uma multiplicidade de objetivos lhe são atribuídos, indo desde aqueles diretamente ligados ao uso de sua infra-estrutura, até aos ligados a aspectos geopolíticos e de liderança. De forma resumida, eles são os seguintes: • Exploração do Espaço: Com o propósito de adquirir conhecimento e experiência para conquista do sistema solar, a ISS deverá: realizar pesquisas que permitam que o homem permaneça por longo tempo no espaço; testar tecnologias e sistemas necessários para exploração do mesmo e adquirir conhecimentos sociais e culturais que permitam os vôos de longa duração. • Pesquisa: Por meio do uso do ambiente de microgravidade, a ISS deverá contribuir para entender os efeitos desse ambiente nos diversos campos da medicina, física, química e biologia. • Comércio: A ISS deverá estimular investimentos privados para o desenvolvimento de aplicações espaciais em diversos campos, destacando-se o desenvolvimento de novos produtos e materiais, DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 47 novas drogas e produtos químicos, novos materiais biológicos, etc. • Tecnologia: A ISS deverá contribuir para o desenvolvimento de tecnologias capazes de viabilizar os vôos espaciais, tendo como subprodutos melhorias em diversos campos de aplicação na Terra, bem como o aumento da produtividade e da qualidade de produtos já existentes. • Liderança e Educação: A ISS deverá contribuir para a aquisição de capacidade organizacional e liderança para coordenar um empreendimento pacífico de grande vulto e com enorme diversidade de países e culturas. Deverá também estimular a capacidade intelectual dos jovens e crianças através das atividades espaciais. O engajamento brasileiro no Programa Estação Espacial Internacional Ao final de 1996, o Brasil recebeu convite da NASA para participar do Programa Estação Espacial Internacional na categoria de Participante, em troca de direitos para sua utilização. Seguiram-se negociações envolvendo do lado brasileiro a AEB, o INPE e o Ministério das Relações Exteriores e, do lado americano, a NASA e o Departamento de Estado Americano. As negociações culminaram com a assinatura no Brasil, em 14 de outubro de 1997, do Ajuste Complementar entre os governos do Brasil e dos Estados Unidos sobre a cooperação nos usos pacíficos do espaço exterior. Este Ajuste transferiu para o Brasil a responsabilidade pelo fornecimento de alguns equipamentos necessários para a ISS, juntamente com a prestação de serviços de engenharia requeridos para a sua operação. De forma resumida, os objetivos brasileiros para sua entrada no Programa ISS e fornecimento de equipamentos para a NASA eram: (a) abrir oportunidades de utilização do ambiente em microgravidade da ISS para a comunidade brasileira pública e privada de ciência e tecnologia; (b) abrir outras oportunidades de envolvimento científico, tecnológico e industrial brasileiro em missões espaciais tripuladas, entre as quais a realização de vôo de um astronauta brasileiro, e; (c) contribuir para a capacitação de empresas nacionais na fabricação de equipamentos espaciais segundo os padrões de qualidade e segurança requeridos por missões tripuladas. 2. A Missão Centenário Todos nós, quando em nosso planeta, estamos sujeitos à força da gravidade, que atrai todos os objetos para o centro da Terra. Tão constante é sua presença, que somente damos conta de sua existência quando caímos, ao tropeçar. Mas, sem sua existência seria impossível a vida como DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 48 conhecemos. Conseqüentemente, todos os experimentos científicos são realizados sob sua influência. Muitas vezes, os cientistas se indagaram se seriam diferentes os resultados desses experimentos caso não sofressem a influência da gravidade. Podemos mesmo sentir no nosso corpo os efeitos de uma muito pequena redução da força da gravidade em uma montanha russa. Muitas tentativas foram realizadas para executar experimentos sem os efeitos da força de gravidade. Porém, somente com o advento da exploração do espaço, a bordo de satélites e de plataformas espaciais, foram obtidas condições satisfatórias para realização de experimentos em ambientes que foram denominados de ambientes em microgravidade. Deve-se observar que, diferentemente de uma primeira impressão, a redução dos efeitos da força da gravidade não é porque seja menor no espaço. Nas distâncias em que voam os satélites e a ISS, seu valor é praticamente igual ao encontrado no solo. Uma forma de interpretar a redução dos efeitos da força da gravidade sob o ponto de vista de quem está dentro da ISS, é a de considerar a existência de uma força centrífuga que mantém os corpos em órbita e se opõe à força peso. A Fig. 5 apresenta o balanço de forças acima descrito de um corpo em órbita da Terra. Esta abordagem é prática para que se possa determinar a velocidade do corpo em órbita, tendo em vista a possibilidade de igualar matematicamente a força centrífuga à força peso. Sob o ponto de vista de quem está na Terra, a interpretação correta é a de que o corpo em órbita está em constante queda livre em torno da Terra, mas a uma distância tal que ele nunca cai de volta na sua superfície. Este é o conceito que foi apresentado por Newton e que está retratado na Fig. 1. Pesquisadores brasileiros também vêm desenvolvendo experimentos para serem realizados em microgravidade. A AEB, por meio do Programa Microgravidade, vem oferecendo oportunidades para a realização desses experimentos em vôos suborbitais, utilizando foguetes de sondagem feitos no Brasil. Entretanto, esses vôos somente oferecem a possibilidade de uns poucos minutos em microgravidade. DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 49 Para proporcionar condições para realizar experimentos em muito maior tempo sob microgravidade, o Brasil se associou ao Programa da Estação Espacial Internacional. A Estação Espacial Internacional é a maior estrutura construída pelo homem para voar no espaço. Para também dominarmos os procedimentos de execução de experimentos no espaço, foi selecionado o primeiro brasileiro a se tornar astronauta, o Tenente Coronel Aviador Marcos Pontes, que iniciou seu treinamento no Johnson Space Center da NASA, em Houston, em 1998. Em decorrência do trágico acidente com a nave Columbia no início de 2003, os vôos desta astronave deverão permanecer suspensos até meados de 2006, o que vem causando substanciais atrasos na montagem da ISS. Isto, composto com um prolongado processo de renegociação dos termos da participação brasileira no Programa ISS, levou-nos a uma situação na qual não tínhamos previsão de quando nossos experimentos poderiam ser realizados, ou quando voaria o astronauta brasileiro, que já havia terminado seu curso básico de treinamento em Houston. Em abril de 2005, a Agência Espacial da Federação Russa – Roscomos informou à AEB a possibilidade de o Tenente Coronel Pontes realizar em março de 2006 um vôo à Estação Espacial Internacional em nave Soyuz daquela Agência. Assim, em outubro de 2005 foi assinado um contrato entre a AEB e a Roscosmos, incluindo o Tenente Coronel Pontes na Missão 13 à ISS, para lançamento em março de 2006, com uma permanência a bordo da ISS por oito dias para executar experimentos desenvolvidos por instituições brasileiras, cuja massa total não poderia exceder quinze quilogramas. O desafio era grande, pois tínhamos apenas poucos meses para preparar os experimentos para o vôo e efetuar o treinamento do Tenente Coronel Pontes na nave Soyuz, quando missões semelhantes tomaram mais de um ano para serem preparadas. Mas o desafio foi enfrentado, e foram iniciados os preparativos para o vôo, que recebeu a denominação de Missão Centenário, pela coincidência dos cem anos do histórico vôo de Santos Dumont no 14 bis. Nos primeiros dias de outubro, o Tenente Coronel Pontes iniciou seu treinamento no Centro de Treinamento de Astronautas Yuri Gagarin, nas cercanias de Moscou. No dia 14 de março de 2006, em reunião solene da Comissão Estatal do Espaço, Pontes foi considerado, com louvor, oficialmente designado para integrar a tripulação da Soyuz, com lançamento previsto para o dia 30 DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 50 de março, no horário russo. Quanto aos experimentos, entre os que estavam sendo desenvolvidos para vôos suborbitais, foram selecionados sete que melhor se adaptariam a uma maior exposição à microgravidade. Um desses exigia, para sua execução, um forno de alta temperatura, que posteriormente foi verificado ainda não estar disponível a bordo da Estação Espacial Internacional. Ainda que pese o hercúleo esforço da equipe que o desenvolvia, na tentativa de construir um substituto para esse forno, não foi possível atender a todos os requisitos de segurança exigidos para a ISS. Foram também incluídos, entre os experimentos a serem executados na ISS, dois desenvolvidos por escolares de São José dos Campos. Dessa forma, um total de 8 experimentos seguiram para a ISS com o nosso astronauta. Maiores informações sobre eles estão disponíveis no endereço: www.aeb.gov.br/missaocentenario/MissaoExperimentos.php. Assim, graças à competência e dedicação dos pesquisadores que desenvolveram os experimentos e dos técnicos do INPE, os experimentos passaram nos duros testes a que foram submetidos e foram aprovados para embarque. No dia 24 de março foi iniciada a campanha de lançamento. Cerca das 23h30min do dia 29 de março, hora de Brasília, a partir da Base Espacial de Baikonur, no Cazaquistão, teve início o vôo da nave Soyuz, em direção à Estação Espacial Internacional, na qual acoplou no dia 1º de abril. Durante oito dias, sob intensa atividade, o Ten. Cel. Pontes realizou os oito experimentos programados, bem como participou de tele-entrevistas, entre as quais se destacou aquela em que respondeu às perguntas de estudantes de escolas do SENAI. Na noite do dia 8 de abril, no horário brasileiro, retornou à Terra, tendo a nave Soyuz realizado excelente pouso também no Cazaquistão. A Missão Centenário não só será um marco nas atividades espaciais brasileiras, como também consolidará o interesse popular nessas atividades, de grande importância para o desenvolvimento nacional. DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 51 Bibliografia consultada SOUZA, P.N. Curso Introdutório em Tecnologia de Satélites (CITS). São José dos Campos: INPE, abr. 2003. (INPE-9605-PUD/126). SOUZA, P.N. Satélites e plataformas espaciais: programa AEB escola – formação continuada de professores. São José dos Campos: INPE, 2005. (INPE-12345-PUD/167). SOUZA, P.N. Programas espaciais e a tecnologia de satélites. 1ª Jornada Espacial. Brasília: AEB, 2005. 1 CD-ROM (várias outras referências são mencionadas neste texto). Notas: 1- Doutor em Engenharia, Tecnologista do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e Presidente da Associação Aeroespacial Brasileira (AAB). Consultor desta série. 2- Mestre em Engenharia. Ocupa na Agência Espacial Brasileira (AEB) os cargos de Gerente do Programa Microgravidade e da Missão Centenário. DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 52 PROGRAMA 4 Satélites e o Meio Ambiente Gilvan Sampaio de Oliveira 1 Teresa Gallotti Florenzano 2 1. A Meteorologia e as Ciências Ambientais “A fotografia de satélite mostra uma frente fria ...”. Esta frase, bem conhecida de todos os brasileiros, normalmente é ouvida quando é apresentada a previsão de tempo nas emissoras de TV e rádio. A Meteorologia, ciência que estuda os fenômenos atmosféricos, vem cada vez mais fazendo parte do dia-a-dia das pessoas. Defesa civil, agricultura, transportes, turismo, recursos hídricos, meio ambiente e muitos outros setores dependem cada vez mais da previsão meteorológica, isto é, previsão de tempo e clima. Por este motivo, a Meteorologia tem grande importância, inclusive estratégica, para a humanidade. Tempo e Clima O tempo é o conjunto de condições atmosféricas e fenômenos meteorológicos que afetam a superfície terrestre em um dado momento e em um dado local. A temperatura, chuva, vento, umidade, nevoeiro, nebulosidade, etc. formam o conjunto de parâmetros do tempo vigentes em um dado momento. O clima é o estado médio da atmosfera e o comportamento estatístico da variação dos parâmetros do tempo sobre um período maior que um mês em um dado local. Dessa forma, quando falamos em previsão do tempo, estamos tratando da previsão de condições meteorológicas de curto prazo – horas ou dias em determinado local. Quando tratamos de previsão do clima, estamos nos referindo às condições meteorológicas médias ao longo de um mês ou a vários meses, em determinado local. Satélites Meteorológicos na Previsão do Tempo As previsões de tempo começaram a ter grande importância na II Guerra Mundial, pois se descobriu que esse tipo de informação era indispensável no planejamento dos ataques, principalmente os DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 53 aéreos. Após o final da guerra, começaram a ser desenvolvidos modelos matemáticos para se fazer previsões meteorológicas. As primeiras previsões que aplicaram modelos matemáticos com o uso de um supercomputador (ENIAC) foram realizadas em 1948-1949 na Universidade de Princeton (EUA). Na época, os computadores disponíveis eram ainda muito lentos. As previsões numéricas de tempo se tornaram operacionais a partir da década de 1950, e eram realizadas pelo antigo NMC (National Meteorological Center) dos Estados Unidos, hoje denominado NCEP (National Center for Environmental Prediction). Um grande salto ocorreu durante a década de 1960 quando começaram a serem utilizados dados de satélites meteorológicos para auxiliar na previsão do tempo. O primeiro satélite meteorológico polar do mundo, o TIROS-1 (Television and Infrared Observation Satellite), foi lançado pelos Estados Unidos em 1 de abril de 1960. A partir de então, foi possível receber imagens da cobertura de nuvens sobre a Terra e observar fenômenos meteorológicos, tais como, frentes frias, furacões, ciclones, etc. O uso de satélites para meteorologia, navegação e telecomunicação tornou-se cada vez mais importante e, em 1967 e 1968, começou o planejamento do primeiro satélite especificamente dedicado à observação de recursos terrestres. O primeiro satélite de recursos terrestres foi o ERTS1, mais tarde denominado LANDSAT. Seu lançamento ocorreu em 23 de julho de 1972. A partir de então, os meteorologistas começaram a acompanhar os sistemas meteorológicos com maior exatidão, de forma seqüencial, do mesmo local, e em uma base repetitiva ao longo de meses e anos. Finalmente estávamos aptos a ver as feições do nosso ambiente mudando. Quanto ao padrão orbital em relação à Terra, os satélites podem ser de duas grandes categorias: os de órbita baixa e os de órbita alta. Estes últimos são os geoestacionários e têm sua maior aplicação no campo da Meteorologia. Os de órbita baixa englobam a maioria dos satélites de observação da Terra. Os satélites de órbita alta estão a uma altitude de cerca de 36.000 km. São chamados geoestacionários porque sua órbita acompanha o movimento de rotação da Terra. Possuem uma velocidade de translação em relação à Terra que equivale ao próprio movimento de rotação da Terra, de modo que, em relação a ela, eles estão imóveis. Como ficam dispostos ao longo do equador terrestre, e por causa da grande altitude, podem ter uma visão de todo o disco terrestre compreendido pelo seu campo de visada. Além disso, como estão “fixos” em relação à Terra, DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 54 permanecem voltados para o mesmo ponto da superfície e, assim, podem fazer um imageamento (observação) muito rápido daquela porção terrestre sob seu campo de visada. É por essa grande abrangência de superfície terrestre coberta em um curto intervalo de tempo que eles são muito úteis para estudos e monitoramento de fenômenos meteorológicos, os quais são bastante dinâmicos. Estes satélites não cobrem as regiões polares. Os principais Satélites Meteorológicos Geoestacionários são operados pela organização EUMETSAT (Meteosat) e pelo governo norte-americano (GOES). Outros satélites são administrados pelo Japão (GMS), China (FY-2B), Rússia (GOMS) e Índia (INSAT). Durante a década de 80, com a evolução dos computadores, vários Centros Meteorológicos puderam gerar as chamadas previsões numéricas de tempo, que consistem em modelos matemáticos que contêm as leis da dinâmica dos fluidos aplicadas à atmosfera, os chamados modelos numéricos de previsão. Um enorme salto foi dado. Estes modelos consideram que o estado da atmosfera é o resultado de complexas interações com todos os outros sistemas terrestres que são, por exemplo, os oceanos, rios e lagos, o relevo e a cobertura de gelo e de vegetação, a emissão de gases de forma natural ou antropogênica (gerada pelo homem), etc. Estes modelos são “alimentados” com informações meteorológicas (vento, temperatura, pressão, umidade, etc.), vindas de toda a Terra, provenientes de estações meteorológicas, navios, bóias oceânicas, aviões, balões atmosféricos e dados obtidos por sensores a bordo de satélites. Informações do sistema terrestre captadas por satélites ajudam na construção e aperfeiçoamento destes modelos numéricos. A partir desse período, foi possível fazer previsões com alguns dias de antecedência. Na década de 1990, os computadores foram aperfeiçoados ainda mais, juntamente com os modelos numéricos e os sensores a bordo de satélites. Atualmente as informações obtidas de satélites meteorológicos permitem a geração de produtos, tais como: monitoramento de chuvas, temperatura do ar, temperatura da superfície do mar, radiações solar e terrestre, queimadas, ventos, classificação de nuvens, índice de vegetação, monitoramento de sistemas convectivos e tempestades, etc. Todos estes produtos podem trazer benefícios significativos para a sociedade e, é importante ressaltar, em muitos casos tais informações estão disponíveis sem custos ou burocracia através da Internet. DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 55 Previsão de Tempo no Brasil O Brasil ainda não tem um satélite meteorológico geoestacionário. Para a previsão de tempo são utilizados principalmente os dados do satélite americano GOES e do europeu METEOSAT. Existem planos para o lançamento de um ainda nesta década. Os satélites brasileiros desenvolvidos pelo INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) são de observação da Terra e coleta de dados ambientais, portanto são de órbita baixa. Um Centro moderno e avançado para previsão numérica de tempo, clima e monitoramento ambiental foi planejado desde o fim da década de 80 e implementado pelo INPE em 1994. Até então, a previsão de tempo no Brasil era feita subjetivamente e tinha utilidade de até no máximo 36 horas. O Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC), do INPE, situado em Cachoeira Paulista (SP), operacionalizou modelos matemáticos de grande complexidade para a previsão de tempo (até 15 dias) e previsões climáticas (1 a 6 meses). Os progressos alcançados pelo CPTEC nas áreas de previsão numérica de tempo e de clima e monitoramento ambiental de várias naturezas aproximaram o Brasil dos países desenvolvidos. Os dados ambientais e prognósticos numéricos rotineiramente gerados no CPTEC tornaram-se indispensáveis para diversos setores socioeconômicos, tais como: agricultura, defesa civil, geração e distribuição de energia elétrica, transportes, meio ambiente, turismo, lazer, entre outros, e também para milhões de habitantes que os recebem através da mídia. Além de operacionalmente disponibilizar previsões de tempo, clima e ambientais, o CPTEC recebe e processa dados meteorológicos e ambientais do Brasil e do mundo para monitorar a situação climática e ambiental. O Brasil é um país com dimensões continentais e com vastas regiões esparsamente habitadas ou cobertas por florestas, o que torna grande o desafio de monitoramento ambiental, bem como a instalação e a manutenção de redes observacionais de coleta de dados. Esta é uma tarefa fundamental, pois a coleta de dados é de suma importância para a caracterização meteorológica, climática, ambiental e hidrológica de determinada região. Ela contribui para o melhor conhecimento de fenômenos meteorológicos atuantes, além de os dados coletados servirem de parâmetros de entrada em modelos numéricos de previsão de tempo, clima e ambientais, entre outras aplicações. Nesse contexto, foram implantadas, em várias regiões do território nacional, estações DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 56 meteorológicas automáticas que são denominadas de Plataformas de Coleta de Dados (PCD). Estas plataformas são equipamentos eletrônicos de alto nível de automação, que têm a capacidade de armazenar e transmitir para satélites ou sistema de computadores parâmetros ambientais, hidrológicos, meteorológicos ou agrometeorológicos, captados por sensores específicos para este fim, que estão conectados às plataformas. Um exemplo de satélite de coleta de dados é o SCD-2, desenvolvido pelo INPE. Mudanças Climáticas A utilização de satélites e de redes de monitoramento meteorológicas e ambientais é também importante para a detecção de mudanças no clima e, conseqüentemente, no meio ambiente. Sabe-se que mudanças climáticas naturais sempre ocorreram na Terra. Os principais fatores que induzem as mudanças climáticas naturais são: a deriva dos continentes, as variações da quantidade de radiação solar que chega à Terra, as variações dos parâmetros orbitais da Terra, a quantidade de aerossóis naturais (proveniente de fontes minerais, incêndios florestais de origem natural e o sal marinho), as erupções vulcânicas e os fenômenos climáticos que podem modificar o clima localmente, tais como furacões, tempestades violentas e os fenômenos El Niño e La Niña. Todavia, são as influências do homem no equilíbrio natural do planeta que preocupam. As mudanças climáticas antropogênicas estão associadas às atividades humanas como, por exemplo, a produção industrial, o desmatamento e as queimadas que provocam o aumento da poluição, a formação de ilhas de calor, etc. A partir do final do século 19 e principalmente no século 20, houve um aumento significativo da produção industrial e um crescente aumento da quantidade de poluentes na atmosfera, sobretudo nos últimos 70 anos, com um aumento da quantidade de CO2 (dióxido de carbono) atmosférico e, portanto, um aumento do chamado efeito estufa. Com isso, há também um crescente aumento da temperatura média global, o que é chamado de aquecimento global. As mudanças climáticas antropogênicas estão induzindo ao aquecimento global, que está provocando o derretimento das calotas polares, o que, por sua vez, leva ao aumento do nível médio dos oceanos e à inundação de regiões mais baixas. A evaporação nas regiões equatoriais poderá aumentar e, com isto, os sistemas meteorológicos, como furacões e tempestades tropicais, poderão ficar mais ativos. Além disso, poderá haver um aumento da incidência de doenças tropicais, tais como malária, dengue e febre amarela. Os cenários projetados para este século indicam que a DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 57 temperatura média do planeta continuará subindo, no mínimo mais 1,4ºC e no máximo cerca de 5,8ºC. Material didático Com o objetivo de aprimorar o conhecimento científico na área ambiental e desenvolver uma conscientização da necessidade de se preservar o meio ambiente, em 1997 o CPTEC criou um projeto de desenvolvimento de material didático. Esta instituição visa, através da Internet e do uso de multimídia, motivar alunos de escolas públicas para a pesquisa e na busca de novos conhecimentos sobre o meio ambiente e as ciências atmosféricas. Professores de diversas escolas que tiveram acesso a esse material declararam que o material tem utilização nos cursos de Geografia, Física e Química, bem como pode ser usado de forma multidisciplinar, devido ao modo como os temas são abordados. Para alcançar esse objetivo, foram utilizados recursos audiovisuais de alta tecnologia, tais como: vídeo, animação em 3D, locução de fácil entendimento, experiências práticas e testes. Foram desenvolvidas várias aulas, dentre as quais destacamos: Balanço hídrico, Ciclo hidrológico, Clima urbano, Elementos climáticos, Interação vegetação-atmosfera, Medindo a precipitação, Movimentos atmosféricos, Previsão de tempo e clima, Radiação solar, Relação de doenças de plantas com o clima, Satélites e plataformas de coleta de dados e Solos e erosão. Mais informações sobre o projeto e como adquirir o material didático (Meio Ambiente e Ciências Atmosféricas, 2002, CD-ROM) encontram-se em: www3cptec.inpe.br/~ensinop/. Os CDs interativos estão sendo produzidos e disseminados também por meio do Programa AEB Escola (www.aeb.gov.br/conteudo.php?ida=24&idc=84). 2. A observação da Terra por satélites Os satélites de observação da Terra (também chamados de sensoriamento remoto) são equipados com sensores que captam imagens da superfície terrestre. Podemos definir, então, o sensoriamento remoto como a tecnologia de aquisição de dados da superfície terrestre à distância, isto é, a partir de satélites artificiais. Esses satélites ficam em órbitas distantes da Terra. Quanto mais distantes, mais extensa é a área da superfície coberta por uma imagem; quanto mais próximos, menor é a área coberta, mas maior é a riqueza de detalhes da imagem captada. Da mesma forma, quando os nossos olhos, que são sensores naturais, observam uma cidade de longe a bordo de um avião, por exemplo, DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 58 eles a enxergam como uma grande mancha uniforme. À medida que o avião desce e nos aproximamos dela, vemos uma área menor, mas distinguimos as ruas, avenidas, casas e edifícios que formam a cidade (Fig.1). Esta riqueza de detalhes vai depender também da resolução espacial do sensor, ou seja, da capacidade que ele tem de “enxergar” ou distinguir objetos da superfície terrestre. Figura 1: Imagens dos satélites americanos LANDSAT (esquerda), na qual se pode observar a mancha urbana do Rio de Janeiro (rosa escuro) e a região de entorno, e QuickBird (direita), que representa apenas um setor desta cidade, mas na qual é possível ver detalhes, como o estádio do Maracanã. Aplicação das imagens de satélite As imagens de satélite proporcionam uma visão sinóptica (de conjunto) e multitemporal (de dinâmica) de extensas áreas da superfície terrestre. Com diferentes resoluções, elas podem ser utilizadas no estudo e monitoramento dos mais variados fenômenos e feições da superfície terrestre. A partir da interpretação de diferentes tipos de imagens, é possível fazer a previsão do tempo, estudar fenômenos oceânicos, detectar e monitorar furacões, inundações (Fig. 2), queimadas e desflorestamentos, gerar mapas geológicos, de solos e de uso da terra, mapear os recursos hídricos, as áreas agrícolas e urbanas, e acompanhar sua transformação e expansão, entre outras aplicações. DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 59 Figura 2: Imagens do delta do rio Parnaíba, que divide os estados do Piauí e Maranhão, obtidas do satélite LANDSAT no período de vazante (a) e no período de cheia (b), a área que foi inundada nesta época é representada por tons de cinza escuro. Como interpretar as imagens de satélite No processo de interpretação de uma imagem, isto é, de identificação dos objetos nela representados, utilizamos as variações de cor, forma, tamanho, textura (impressão de rugosidade), padrão (arranjo espacial dos objetos), localização e contexto. Assim, por exemplo, na imagem colorida da Fig. 3, identificamos pela forma e localização a ilha de São Sebastião no litoral do Estado de São Paulo. Pelas cores diferenciamos: • a água limpa (preto), da água turva (azul/verde); • as áreas urbanas de Caraguatatuba e São Sebastião, bem como as praias pela cor cian; • as áreas de cobertura vegetal densa como as da Mata Atlântica estão representadas em vermelho neste tipo de composição colorida (denominada de falsa-cor); DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 60 • as nuvens (em branco) sobre a ilha, com as respectivas sombras (em preto), formam um padrão que ajuda a identificá-las; A textura e a sombra permitem destacar o relevo montanhoso da ilha e o da Serra do Mar, no continente. Ter conhecimento sobre a área representada em uma imagem facilita o processo de interpretação. Por isto, sugere-se começar explorando imagens da própria região. As imagens de satélite como recurso didático O noticiário diário da televisão, ao apresentar a previsão do tempo do dia seguinte, o faz com uma imagem de satélite na tela. Recentemente, imagens do ciclone Catarina e da guerra no Iraque eram publicadas diariamente nos jornais. A lista de exemplos das aplicações dessa ferramenta é infindável, o que justifica plenamente seu uso em sala de aula. Os novos Parâmetros Curriculares do Ensino Fundamental reforçam a importância do uso de diferentes fontes de informação e recursos tecnológicos, como o sensoriamento remoto, por exemplo. Embora o potencial das imagens de satélite seja maior para disciplinas como a Geografia e Ciências, mais diretamente vinculadas ao contexto ambiental, elas podem ser exploradas para múltiplas finalidades, além de facilitar a prática da interdisciplinaridade. À medida que essas imagens contribuem na análise e no monitoramento dos ambientes, destacando os impactos provocados tanto por fenômenos naturais quanto pelas atividades humanas, elas são um instrumento para a compreensão e conscientização dos problemas ambientais de professores, alunos e da comunidade. A crescente disponibilidade das imagens de satélite no formato digital, gratuitamente, em endereços como www.dgi.inpe.br, www.cdbrasil.cnpm.embrapa.br, glcf.umiacs.umd.edu/data e no Google earth.google.com/, entre outros, facilita seu acesso e promove a inclusão digital. No desenvolvimento de novos projetos pedagógicos, ou naqueles já em andamento, além dos recursos já tradicionalmente utilizados, pode-se explorar também o uso de imagens de satélite. DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 61 Exemplos de projetos escolares já desenvolvidos e que utilizaram esta tecnologia podem ser encontrados no endereço: www.dsr.inpe.br/vcsr/html/proj_old.htm. Livros e CD-ROM O livro didático “Imagens de satélite para estudos ambientais” fornece, em linguagem simples, informações básicas de sensoriamento remoto, ilustra como são obtidas as imagens de satélites, descreve os tipos de sensores e satélites existentes e destaca o programa espacial brasileiro. Aborda a relação entre imagem e mapa e o processo de interpretação de imagens obtidas por sensoriamento remoto. Ele mostra como as imagens de satélites podem contribuir para o estudo de fenômenos ambientais, de ambientes naturais e daqueles transformados pelo homem. Finalizando, ele destaca o uso do sensoriamento remoto como recurso didático multi e interdisciplinar, fornecendo sugestões de atividades. O CD-ROM "Atlas de Ecossistemas da América do Sul e Antártica" apresenta mais de 250 imagens de diversos satélites, fotos da superfície da Terra, globo 3D e vídeos. O Atlas permite visualizar as características físicas, econômicas, políticas e humanas de todos os países da América do Sul e 21 ecossistemas por meio de imagens de satélite e fotos de campo. Ele traz também informações sobre os fundamentos do sensoriamento remoto, programas espaciais e estações terrenas de recepção de dados de satélites. Crédito das imagens: • Imagens LANDSAT e CBERS: INPE • Imagem QuickBird: Digital Globe (cortesia Intersat) Bibliografia consultada EPIPHÂNIO, J.C.N. Satélites de sensoriamento remoto – IV curso de uso de sensoriamento remoto no estudo do meio ambiente. São José dos Campos : Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), 2003. Disponível em: www.ltid.inpe.br/vcsr/html/APOSTILA_PDF/CAP2_JCNEpiphanio.pdf. Acesso em: 22 mar. 2006. DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 62 Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC). Climate change 2001. WMO/UNEP. Cambridge: Cambridge University Press, 2001. Third Assessment Report. Disponível em: www.ipcc.ch/ . Acesso em: 22 mar. 2006. INSTITUTO NACIONAL DE PESQUISAS ESPACIAIS (INPE). Missão Espacial Completa Brasileira (MECB). São José dos Campos, 1999. Disponível em: www.inpe.br/programas/mecb/default.htm . Acesso em: 22 mar. 2006. INSTITUTO NACIONAL DE PESQUISAS ESPACIAIS. CENTRO DE PREVISÃO DO TEMPO E ESTUDOS CLIMÁTICOS (INPE.CPTEC). Meio ambiente e ciências atmosféricas. São José dos Campos, 2002. CD Multimídia sobre meio ambiente e ciências atmosféricas. Disponível em: www3.cptec.inpe.br/~ensinop/ Acesso em: 22 mar. 2006. SAUSEN, T.M. Atlas de ecossistemas da América do Sul e Antártica. São José dos Campos, SP, 2005. (INPE-12258-PUD/166). ISBN 85-17-00021-5. 1CD-ROM.DIAS, N.W.; BATISTA, G.; NOVO, E.M.M.; MAUSEL, P.W.; KRUG, T. Sensoriamento remoto: aplicações para a preservação, conservação e desenvolvimento sustentável da Amazônia. São José dos Campos: Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), 2003. 1 CD-ROM educacional. Disponível em: www.ltid.inpe.br/cdrom . Acesso em: 22 mar. 2006. FLORENZANO, T.G. A nave espacial Noé. São Paulo: Oficina de Textos, 2004. FLORENZANO, T.G. Imagens de satélite para estudos ambientais. São Paulo: Oficina de Textos, 2002. SANTOS, V.M.N. Escola, cidadania e novas tecnologias: o sensoriamento remoto no ensino. São Paulo: Paulinas, 2002. Notas: 1- Meteorologista do Grupo de Interação Biosfera-Atmosfera da Divisão de Clima e Meio Ambiente do Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC) do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). 2- Pesquisadora da Divisão de Sensoriamento Remoto (DSR) do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), São José dos Campos (SP). DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 63 PROGRAMA 5 As Mudanças Climáticas Angela Oliveira da Costa 1 Neilton Fidelis da Silva 2 Introdução Há bem pouco tempo as discussões relativas aos danos causados ao meio ambiente devido à ação humana sobre a natureza estiveram restritas a um reduzido número de pessoas denominadas amantes da natureza ou simplesmente ambientalistas. Na atualidade, verifica-se uma relevante mudança na forma de ver o meio ambiente. Em uma amplitude global se percebe uma tomada de consciência de que ele nos afeta porque está estritamente vinculado com todas as atividades do homem, sendo então vital para a nossa sobrevivência no planeta, ou seja, ele (o meio ambiente) influi em tudo que fazemos: interfere no nosso modo de viver, na nossa saúde, na segurança do planeta, na qualidade de vida de todos e na existência dos seres vivos. No curso das três ultimas décadas tem-se tornado evidente que as atividades humanas passaram a ameaçar, de forma considerável, o equilíbrio do nosso planeta. Os recursos naturais, como a água e o ar, encontram-se contaminados e as florestas, espécies vivas e até mesmo habitats inteiros são destruídos ou encontram-se em avançado processo de devastação, além do já diagnosticado processo de aquecimento global do planeta, fruto do aumento das concentrações dos Gases de Efeito Estufa (GEE). Dentre os problemas ambientais que a pós-revolução industrial tem enfrentado, o aquecimento global do planeta, segundo os especialistas, se converterá no mais grave problema ambiental que os habitantes do planeta terão de confrontar-se neste século. O Painel Intergovernamental de Mudança do Clima (Intergovernmental Panel on Climate Change – IPCC) mostra registros de uma considerável alteração no clima do planeta em escala global nos últimos 200 anos, fortemente relacionada ao aumento das atividades humanas emissoras de GEE. O efeito estufa é um fenômeno natural, a princípio benéfico aos seres vivos, que resulta no aquecimento da atmosfera junto à superfície do planeta. Devido a esse fenômeno, a temperatura DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 64 média do ar próximo à superfície é de 15º C. Na ausência deste, essa temperatura seria de 18º C abaixo de zero. Já o denominado “aquecimento global” é uma hipótese que credita a elevação média da temperatura da atmosfera ao aumento da emissão de gases de efeito estufa pelas atividades humanas. Apesar de o aquecimento global ser um fenômeno natural, o aumento das atividades do homem sobre a natureza (ações antropogênicas) após a Revolução Industrial tem contribuído para intensificá-lo. A crescente elevação das emissões dos GEE provenientes dessas atividades que decorrem da queima de combustíveis fósseis em usinas termelétricas, veículos e indústrias, do desmatamento, da mudança no uso da terra, dos aterros sanitários, da agricultura, entre outros fatores, tem alterado a temperatura atmosférica e oceânica, representando uma ameaça para o clima do planeta. Segundo o IPCC, o aumento atual da concentração dos gases de efeito estufa na atmosfera poderá ter, em cerca de 50 anos, conseqüências graves, como a elevação do nível dos mares e outras conseqüências severas, que incluem a intensificação de fenômenos meteorológicos danosos, a desertificação de algumas áreas do planeta e a redução da produção agrícola, entre outras. O tema da Mudança Climática Global apresenta múltiplas facetas, a exemplo do que ocorre no debate de quase todos os assuntos de que a humanidade trata, sejam eles científicos ou não. De uma forma ou de outra, resulta da estrutura organizacional da sociedade, que por sua vez é fruto das disputas político-sociais, que são aceitas como a força definidora da verdade. A compreensão dos atuais problemas ambientais obriga a se ter clareza de que a estruturação dos mesmos não é fruto de um processo natural de desenvolvimento, orientado à superação das barreiras técnicas advindas das forças produtivas determinantes. Historicamente, o homem, através dos tempos, buscou apropriar-se dos recursos naturais, enquanto valor de uso. Na sociedade do capital, estes recursos assumem a dimensão de valor de troca, um fator de produção do capital e, portanto, de mercadoria. O mesmo se dá com a tecnologia. Ela não é neutra. Assim, cabe registrar que a expansão sobre o uso dos recursos naturais segue refém do modelo de produção de bens e serviço em curso, uma vez que a energia, a água e o ar são vitais às atividades produtivas, o que repercute diretamente nas relações socioeconômicas. Dessa forma, é de DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 65 fundamental importância compreender como se dá o processo de produção, para então conferir suas reais implicações no funcionamento dos sistemas econômicos, bem como os efeitos de sua eventual ampliação no médio e longo prazos. O Efeito Estufa O efeito estufa é um fenômeno que resulta no aquecimento da atmosfera junto à superfície do planeta. Este é intensificado pela emissão de certos gases para a atmosfera, sendo o principal deles, pela quantidade acumulada, o dióxido de carbono (CO2), produzido na queima de combustíveis fósseis: carvão, petróleo e gás natural. Estes gases são transparentes à luz solar que aquece a Terra, mas não deixam passar parte das ondas de calor emitidas pela superfície terrestre para o espaço externo. Dessa forma, o equilíbrio entre a energia que chega do Sol e a que sai da Terra fica rompido, provocando o aumento da temperatura. Embora o processo físico não seja o mesmo, o efeito lembra o que ocorre em uma estufa de plantas coberta com vidro, daí a denominação adotada convencionalmente de efeito estufa. Originalmente, este efeito natural, que se iniciou à época do surgimento da vida e da formação da atmosfera atual, permitiu que a temperatura global não fosse muito menor do que é atualmente. Entretanto, desde a Revolução Industrial, a queima de combustíveis fósseis aumentou muito a concentração atmosférica de CO2, que é o principal responsável por este efeito. Mas há também outros gases do efeito estufa, como o metano (CH4) e o óxido nitroso. A intensificação do efeito estufa contribui para mudanças do clima com efeitos potencialmente danosos para o meio ambiente natural e para a vida humana em todo o planeta. A Terra recebe energia do Sol, basicamente sob a forma de energia luminosa. Ondas eletromagnéticas de certas freqüências atravessam a atmosfera e chegam à superfície da Terra com pouca perda. Delas, uma parte é refletida e outra é absorvida nas nuvens. Além da luz, a radiação infravermelha e a ultravioleta compõem a radiação solar que chega à Terra. Para manter o equilíbrio da temperatura terrestre em um dado nível, é preciso que essa energia que chega saia, para o calor não se acumular. DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 66 A Terra emite para o espaço exterior ondas eletromagnéticas de baixíssima freqüência, ou seja, radiação térmica. São as mesmas que esquentam a cozinha quando o fogão está ligado. Parte das ondas que a Terra emite é absorvida por gases existentes na atmosfera (GEEs) e depois emitida pelas moléculas desses gases, voltando para a Terra e criando um novo equilíbrio, numa temperatura mais elevada. Há muitos milhões de anos esse efeito foi positivo: foi quando surgiu a vida e a atmosfera se formou. Assim, esses gases contribuíram para elevar a temperatura da Terra, que seria muito fria não fosse o efeito estufa. No entanto, desde a Revolução Industrial a emissão de CO2 para a atmosfera (principalmente devido à combustão do carvão, do petróleo e do gás natural) redundou em um incremento do aumento da temperatura terrestre que já é preocupante. Para explicar melhor o fenômeno, a Figura a seguir ilustra o balanço de energia global da Terra. O Aquecimento Global A hipótese da ocorrência do aquecimento global considera uma elevação da temperatura da atmosfera, resultado do aumento da emissão de GEEs pelas atividades humanas. O aumento da emissão destes gases aumenta a capacidade de a atmosfera aprisionar calor. Tal hipótese fundamenta-se em observações da temperatura global do ar nos últimos 150 anos, no aumento da concentração de CO2 e em simulações com modelos de circulação geral da atmosfera. Já se sabe que, nos últimos 150 anos, o conteúdo de gás carbônico aumentou em 25% e a temperatura média global aumentou na faixa de 0,3 a 0,6ºC. DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 67 É necessário considerar que essas observações se restringem aos últimos 150 anos, tempo muito curto para gerar conclusões definitivas, uma vez que esses fenômenos podem estar ocorrendo há milhões de anos e possuir ciclos desconhecidos. O problema do efeito estufa e sua pretensa influência no aquecimento global acelerado dos últimos 100 anos põe em confronto forças sociais poderosas que não permitem que se trate deste assunto tão somente do ponto de vista científico. As principais fontes advindas da ação humana (Antropogênicas) que contribuem para o aumento global da temperatura do clima A queima de combustíveis fósseis, alguns processos industriais e a mudança no uso do solo (representada pelas queimadas e atividades agropecuárias) configuram-se como as atividades antropogênicas que contribuem para o aquecimento global. Segundo o World Resources Institute, no ano de 2000 as contribuições por atividade estiveram assim percentualmente distribuídas: • Produção de energia (22%) • Desflorestamento associado a queimadas (as atividades agropecuárias em geral) (32%) • Atividades de transporte (13%) • A disposição de resíduos sólidos (4%) • Outros (processos industriais, construção e vazamentos) (29%) As principais fontes por tipo de gás emitido • Dióxido de Carbono (CO2) – extração, transformação, transporte e uso final de combustíveis fósseis. Desmatamentos associados a queimadas de áreas de floresta. • Ozônio (O3) – conseqüência de reações complexas na alta atmosfera. • Metano (CH4) – produzido através de processos de decomposição anaeróbica ou por combustão DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 68 incompleta nas mudanças no uso do solo (cultivo de arroz em áreas alagadas, queima de biomassa florestal e de resíduos agrícolas, inundação de áreas florestais em reservatórios) e de áreas naturais pantanosas; criação de animais ruminantes (dejetos e criação); utilização energética (produção, armazenamento, queima de carvão mineral, produção e transporte de gás natural). • Óxido Nitroso (N2O) – desnitrificação dos solos em condições anaeróbicas, combustão, queima da biomassa, utilização de fertilizantes. • Clorofluorcarbonos (CFCs) – Atividade industrial, gases refrigerantes (ar- condicionado, refrigeradores), aerossóis. As conseqüências das Mudanças Climáticas Segundo o IPCC, o aumento atual da concentração dos gases de efeito estufa na atmosfera poderá ter, em cerca de 50 anos, conseqüências graves, como a elevação do nível do mar. Outras conseqüências severas incluem: • Inundação de zonas costeiras e desaparecimento de ilhas; • Contaminação de lençóis freáticos com água salgada, comprometendo o abastecimento humano, a agricultura e a pesca; • Maior incidência de doenças tropicais, como a dengue e a malária; • Perda de produtividade agrícola; • Alterações nos ciclos hidrológicos, provocando eventos extremos como secas, inundações e aumento da freqüência e intensidade de ciclones e furacões; • Impactos negativos nos ecossistemas, com perdas da biodiversidade. A Convenção do Clima Em 1988, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e a Organização DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 69 Mundial de Meteorologia (OMM) constituíram o IPCC (Intergovernmental Panel on Climate Change/Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima), encarregado de apoiar, com trabalhos científicos, as negociações da Convenção. Por ocasião da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (RIO 92), 154 países assinaram a Convenção Quadro sobre Mudança do Clima, visando à estabilização da concentração de Gases de Efeito Estufa (GEE) na atmosfera, com o comprometimento voluntário dos países do Anexo I (Países industrializados membros da Organisation for Economic Cooperation and Development – OCDE –, exceto México e Coréia do Sul, além de países industrializados em processo de transição para uma economia de mercado) em reduzir suas emissões em 2000 para os níveis de 1990 (meta prorrogada nos acordos posteriores). Este primeiro momento representou uma formalização da preocupação internacional com os efeitos negativos acarretados pelo aumento das emissões de GEE. Em 1997, na Terceira Conferência das Partes (COP-3) da Convenção do Clima ocorrida em Quioto, foi aprovado o Protocolo de Quioto, o qual determina o estabelecimento de compromissos por parte dos países desenvolvidos (Anexo I) de atingir uma meta de redução média de 5,2% das emissões em relação ao ano de 1990, durante o período de 2008 – 2012. O Protocolo de Quioto, em vigor desde o início de 2005, estabeleceu três mecanismos de flexibilidade para atingir as metas de redução de emissão: Implementação Conjunta ou JI (Joint Implementation), Comércio de Emissões ou ET (Emissions Trading) e o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) ou CDM (Clean Development Mechanism). O MDL é o único destes mecanismos que envolve países em desenvolvimento como o Brasil e busca promover o desenvolvimento sustentável nestes países. O Mecanismo de Desenvolvimento Limpo – MDL O Artigo 12.2 do Protocolo de Quioto define a finalidade do MDL como sendo assistir às Partes que não constam do Anexo I, para que atinjam o desenvolvimento sustentável e contribuam para o objetivo final da Convenção, e assistir às Partes do Anexo I para que cumpram seus compromissos quantificados de limitação e redução de emissões. O Artigo 12.5 lista como condições para a certificação de reduções de emissões que os benefícios DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 70 relacionados com a mitigação da mudança do clima sejam reais, mensuráveis e de longo prazo e que as reduções de emissões sejam adicionais às que ocorreriam na ausência da atividade certificada de projeto. O setor energético apresenta elevada importância para o Brasil no âmbito do MDL. O Brasil tem vantagens comparativas importantes, graças à grande componente de energia renovável em sua matriz energética – a hidroeletricidade, o álcool, o carvão vegetal e o bagaço de cana, e aos programas do governo para fontes de energia alternativas, que evitam a emissão de gases do efeito estufa e devem ser creditados ao País. Devido à sua extensão territorial e clima propício, apresenta um alto potencial para a produção de biocombustíveis, a exemplo do etanol oriundo da cana-deaçúcar e do biodiesel proveniente de óleos vegetais virgens ou residuais e de gordura animal. Há estimativas de que o mercado de carbono no mundo possa vir a movimentar cerca de 30 bilhões de dólares por ano até 2012. A expectativa é que o Brasil possa participar em até 10% deste mercado. Neste cenário, o Brasil, juntamente com Índia e China, são os líderes na possibilidade de hospedagem de projetos MDL. O Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas – FBMC O FBMC foi criado pelo Decreto Presidencial nº 3.515 de 20 de junho de 2000, complementado pelos decretos de 28 de agosto de 2000 e de 14 de novembro de 2000, tendo como objetivo “conscientizar e mobilizar a sociedade para a discussão e tomada de decisão” sobre os problemas das emissões, por atividades humanas, de gases que intensificam o efeito estufa. De acordo com os decretos, o Fórum é presidido pelo Presidente da República, que convocará suas reuniões. São membros do Fórum: os Ministros de Estado da Ciência e Tecnologia; do Desenvolvimento, Indústria e Comércio; da Agricultura; do Meio Ambiente; das Relações Exteriores; de Minas e Energia; do Planejamento; da Saúde; dos Transportes; e do Chefe da Casa Civil. Ademais, poderão ser convidados os presidentes da Câmara e do Senado, governadores, prefeitos de capitais e personalidades e representantes da sociedade civil. O Fórum conta com um secretário executivo nomeado pelo Presidente da República com a atribuição de organizar a pauta e participar das reuniões, bem como de adotar medidas para a execução dos trabalhos e atividades. As funções dos membros do Fórum e do secretário executivo DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 71 não são remuneradas, sendo consideradas de relevante interesse público. Bibliografia consultada RIBEIRO, L.S. O impacto do gás natural nas emissões de gases de efeito estufa: o caso do município do Rio de Janeiro. Dissertação de Mestrado, PPE/COPPE/UFRJ, Rio de Janeiro, 2003. ROSA, L.P. A política internacional sobre mudança do clima: o uso do conhecimento científico e o choque de interesses entre países do Norte e do Sul. Rio de Janeiro: FBMC/IVIG/COPPE-UFRJ, 2005. Texto para discussão. WORLD RESOURCES INSTITUTE (WRI). Climate analysis indicators tool. Washington, 2000. Disponível em: cait.wri.org/ . Acesso em: 22 mar. 2006. (Report 2000). Notas: 1- Engenheira Química e Doutoranda do Programa de Planejamento Energético da COPPE/UFRJ. 2- Professor do CEFET-RN, Assessor da Secretaria Executiva do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas (FBMC) e Doutorando do Programa de Planejamento Energético da COPPE/UFRJ. DA TERRA AO ESPAÇO: TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE NA SALA DE AULA 72