Primeiro Setor - O Estado Por Nilza Lopes Durante o século XV e no início do século XVI, vencido o poderio dos senhores feudais, foram surgindo os Estados Modernos, através do fortalecimento da autoridade monárquica, da definição de fronteiras nacionais e da unidade linguística e cultural de cada povo. O Reino de Portugal foi o primeiro Estado Moderno da Europa, tendo fronteiras já delimitadas em 1383. O Renascimento (século XV-XVI) foi a retomada de uma vida econômica, social e cultural de larga intensidade, que se verificou inicialmente na Itália e depois em toda a Europa; foi também o período das grandes expedições marítimas, graças ao progresso da astronomia náutica e da cartografia, de instrumentos de navegação aperfeiçoados (bússola, astrolábio) e ao aparecimento da caravela. Os descobrimentos geográficos do século XV possibilitaram à Europa entrar em contato com terras longínquas reveladas com a descoberta de novas rotas marítimas e tiveram importantes consequências históricas. Portugal, após ter firmado sua independência e se estruturado como Estado Moderno, não tendo como expandir-se por terra, voltou-se para a navegação do Atlântico, cercando-se de astrônomos, pilotos, construtores de navios, coletando obras sobre viagens de navegação, Dom Henrique fundou em Sagres um grande centro de estudos e de pesquisas náuticas. Durante o reinado de D. João I iniciou-se a expansão portuguesa visando alcançar a Ásia contornando a África; atingiram gradativamente pontos geográficos que se transformaram em importantes escalas marítimas: 1415 - Ceuta 1420 - Ilha da Madeira 1434 - Cabo Bojador 1441 - Cabo Branco 1446 - Cabo Verde 1456 - Golfo Guiné No dia 09 de março de 1500, na capela do mosteiro de Belém, D. Manuel realiza uma pomposa cerimônia de partida para uma frota, cujo comando foi conferido a Pedro Álvares Cabral. No mesmo dia a frota toma o rumo do Sul; e até as ilhas Cabo Verde pouco se afasta da costa africana. Numa daquelas ilhas (São Nicolau), abriga-se por dois dias, a espera de uma das naus, que havia transviado. A 25 de março a frota continua viagem, tomando agora o rumo do ocidente e depois de alguns dias, o do sudoeste. Por cerca de uma quinzena, os doze navios navegam nessa direção. As calmarias da zona equatorial e as correntes oceânicas retardam muito a marcha das naus. Por meados de abril, no entanto, começam a aparecer sinais de terra próxima como aves, plantas marinhas, etc. No dia 21 de abril, os indícios ficam mais evidentes; e pela tarde do dia seguinte (uma quarta-feira) avista-se um monte (a que se deu o nome de Monte Pascal). Está a esquadra diante de uma terra desconhecida, cuja extensão, naquele momento, não era exata, a princípio parecia uma grande ilha; uma terra que se tornaria a mais lucrativa descoberta dos portugueses. Abrigada à esquadra na baía, que recebeu o nome de Porto Seguro, Cabral ergue na praia uma grande cruz de madeira e um altar, onde frei Henrique de Coimbra celebra missa em ação de graças. As novas terras descobertas não despertam o interesse dos portugueses, isto devido o comércio existente entre eles e o Oriente. Então, o que as novas terras poderiam oferecer a eles que pudessem chamar a atenção política e econômica da Europa? Como os portugueses estavam com todo o seu poder econômico voltado para o comércio com as Índias Orientais, por se tratar de um mercado com uma população em crescimento e um mercado consumidor efetivo, e cujas riquezas eram produtivas e bastante procuradas no ocidente, eles deixam as novas terras em segundo plano. Desde a descoberta das novas terras, Portugal reserva para si a exclusividade de sua exploração e passa a ter o controle sobre o pau-brasil, cuja ocorrência da extração abrange desde o sul de Angra dos Reis até o nordeste, inserindo-o no mesmo sistema em vigor no Oriente, isto é, o estanco: a coroa portuguesa poderia fazer concessões a particular mediante pagamento de direitos. O primeiro a receber concessão foi Fernão de Noronha em 1503. Como os portugueses visam ter bastante lucro com a exploração e o comércio do pau-brasil, utilizam os índios para fazerem o trabalho de corte e transporte do material em áreas fortificadas no litoral conhecidas como feitorias. Em troca de bugigangas os nativos derrubam, descascam, atoram e transportam os troncos de pau-brasil, Bueno descreve o esforço e desempenho dos indígenas usando as palavras de Jean Lery, publicadas em 1578: "Quanto ao meio de carregar essa mercadoria (o pau-brasil), direi que tanto por causa da dureza, e consequente dificuldade em derrubá-la, como por não existirem (...) animais para transportá-la, é ela arrastada por meio de muitos homens; e se os estrangeiros que por aí viajam não fossem ajudados pelos selvagens, não poderiam sequer em um ano carregar um navio de tamanho médio" (Bueno, 1998, p.76). Os nativos que não colaboram são escravizados e os estrangeiros introduzem escravos vindos da África em solo brasileiro. A base da economia portuguesa era essencialmente agrícola. De início a extração da madeira pau-brasil; em seguida o plantio intensivo de cana-de-açúcar. Desenvolvem o cultivo de plantas nativas (milho, mandioca, tabaco, algodão, cacau, baunilha, canela); introduzem o arroz e o linho. Desenvolvem também a partir do século XVI, a criação de gado bovino e cavalar em várias regiões da nova colônia; iniciam o comércio de couros. No século XVII descobrem e exploram jazidas de ouro (no atual Estado de Minas Gerais) e de diamantes (nos atuais Estados de Goiás e Mato Grosso). Desde 1504, foram registradas varias incursões francesas na costa brasileira para o contrabando de pau-brasil. Para os portugueses se tratava de contrabando, isto devido ao regulamento baixado pela Coroa Portuguesa. Surgia ai também um novo problema para a metrópole, que era a ameaça a soberania sobre as terras descobertas, pois os contatos entre os franceses e os índios se deu de forma amigável. Depois do descobrimento, bastam poucos anos para que os indígenas percebam o que os europeus queriam no Brasil, fossem eles portugueses ou franceses. As alianças entre estrangeiros e indígenas só começam a se formar depois, que os nativos tiveram a oportunidade de distinguir entre os portugueses de pele e cabelos morenos e os louros franceses. Os portugueses deduzem que o processo de colonização do Brasil é inevitável e necessário, não só para a defesa do território, mas sim para transformar a colônia num empreendimento lucrativo para Portugal. Em 1530, Dom João III enviou ao Brasil a expedição de Martim Afonso de Sousa, cujos principais objetivos eram verificar a existência de metais preciosos, exportar e patrulhar o litoral e estabelecer os fundamentos da colonização do Brasil. Em 1532 Martim Afonso de Sousa fundava a vila de São Vicente, o primeiro núcleo de colonização no Brasil. Um ano mais tarde, erguia-se aí o engenho São Jorge dos Erasmos. Começava assim a colonização efetiva do Brasil, apoiada na produção de açúcar para o mercado externo. Foram nomeados os primeiros administradores, criando-se órgãos judiciários e fiscais; distribuíram-se sesmarias (lotes de terra) aos colonos e montou-se uma fortaleza, visando a proteção geral. Segundo Gilberto Freyre (1997), a corajosa iniciativa particular foi a responsável pelo sucesso das grandes plantações no Brasil e não o Estado colonizador; foi ela que se desfazendo de todos os seus bens em sua terra natal e concorrendo com às sesmarias povoaram e defenderam militarmente as muitas léguas de terras, como era exigência real. Os passos iniciais da colonização estavam dados. No entanto, a Coroa, em precárias condições econômicas, não conseguiu fazer avançar esse processo. A saída encontrada foi transferir para particulares os compromissos com a colonização. Surgem então, as capitanias hereditárias. As capitanias eram imensos lotes de terra que se estendiam, na direção dos paralelos, do litoral até o limite estabelecido pelo Tratado de Tordesilhas. Essas extensões de terras foram doadas a titulares que possuíam grandes poderes: podiam dispor das terras bem como distribuílas entre os colonos, nomear autoridades administrativas e judiciárias, receber taxas e impostos, escravizar e vender índios, fundar vilas, cobrar tributos pela navegação nos rios, etc. Na verdade os donatários tinham de explorar com seus próprios recursos as capitanias recebidas. Juridicamente, a ocupação das terras era assegurada pela Carta de Doação e pelo Foral. A Carta de Doação, assinada pelo Rei, cedia ao donatário as terras, bem como o poder administrativo e jurídico delas. O Foral determinava os direitos e deveres do donatário, que recebia as terras não como proprietário, mas como administrador. A maior parte dos donatários não dispunha de recursos próprios para uma empresa de tamanha envergadura. Receberam empréstimos e contribuições de banqueiros e negociantes judeus, de Portugal e da Holanda. Mas muito deles nem se quer vieram ao Brasil. Dos que vieram, quase todos fracassaram: perderam todas as posses e, em alguns casos, a própria vida, sem nada conseguirem realizar. Apenas dois tiveram sucesso, em parte porque foram muito auxiliados pelo Rei de Portugal e por banqueiros flamengos: Martim Afonso de Sousa, em São Vicente, e Duarte Coelho, em Pernambuco. A divisão do Brasil em Capitanias Hereditárias não alcançou os resultados que o governo português esperava. Diante do fracasso do sistema de Capitanias, a metrópole procurou recorrer à centralização do poder. Criou-se o governo-geral, não para acabar com as capitanias, mas para centralizar sua administração, pois a autonomia dos donatários chocava-se com os interesses do Estado português. O governo português entendeu que faltava às capitanias uma autoridade que, vivendo no Brasil, organizasse seu povoamento e efetivasse sua colonização. Em 1548, foi elaborado o Regimento que estabelecia as funções do primeiro governador-geral e de seus auxiliares, e determinava as diretrizes do novo sistema de governo instalado no Brasil. Os governadores seriam auxiliados por outras autoridades nomeadas pelo governo português: - um ouvidor-mor, encarregado dos negócios da justiça; - um provedor-mor, responsável pela administração das finanças; - um capitão-mor, que tinha por obrigação cuidar da defesa da costa. Governo de Tomé de Sousa (1549-1553), escolhido por D. João III para ser o primeiro governador-geral do Brasil, chegou em 29 de março de 1549, acompanhado por mais de novecentas pessoas, entre soldados, colonos, seis jesuítas chefiados pelo Padre Manuel da Nóbrega e degredados. Tomé de Sousa trazia ainda material para iniciar a construção da primeira cidade, além de algumas cabeças de gado. Sua sede foi estabelecida na Bahia. As realizações mais importantes do período foram a fundação da primeira cidade brasileira (Salvador), a criação do primeiro bispado, com D. Pero Fernandes Sardinha, e o estabelecimento do primeiro Colégio do Brasil. Nesse período houve também um grande incentivo à agricultura e a pecuária. Governo de Duarte da Costa (1553-1558), o segundo governador-geral, Duarte da Costa, chegou ao Brasil em 1553, acompanhado de jesuítas, entre os quais José de Anchieta, e mais 250 pessoas. Juntamente com o Padre Manuel da Nóbrega, Anchieta fundou o Colégio São Paulo em 25 de Janeiro de 1554. No governo de Duarte da Costa ocorreu, em 1555, a invasão do Rio de Janeiro pelos franceses, que fundaram a França Antártica. Governo de Mem de Sá (1558-1572) foi no governo de Mem de Sá que os franceses foram expulsos do Rio de Janeiro. Os 14 anos de governo foram marcados por fatos importantes, como a dissolução da Confederação dos Tamoios (união de tribos inimigas dos portugueses) por interferência direta de Nóbrega e Anchieta e a fundação da segunda cidade brasileira, São Sebastião do Rio de Janeiro, em 1565. Estácio de Sá, fundador da cidade e sobrinho do governador, liderou a expulsão dos franceses do Rio de Janeiro. Formaram-se, também nessa época, as primeiras missões jesuíticas. Mem de Sá governou até 1572, ano de sua morte. Dom Luís de Vasconcelos, que havia sido enviado em 1570 para ser o quarto governador, morreu durante a viagem para o Brasil, quando seu navio foi atacado por piratas franceses. Em l698, com a descoberta do ouro e, trinta anos depois, a dos diamantes alteram o destino do Brasil. Ouro Preto foi a primeira, entre as cidades do ouro, a partir de 1720 tornou-se capital de Minas Gerais. A indústria Mineira produziu nova riqueza para o Brasil e o aumento na exportação de escravos, a presença de empresários individuais e uma imigração da metrópole. No final do século XVIII, o Brasil chega a marca de 3 milhões de habitantes, graças ao fluxo de imigrantes. (Donghi, s/d, p.55). As cidades da colônia serviam apenas como um ponto de apoio comercial e administrativo para as atividades do campo, pois o interesse português concentrava-se unicamente em favorecer a exploração agrária. A própria colônia funcionava como retaguarda rural e as cidades serviam somente para a ação de controle do governo de Portugal. Na verdade, para uma cidade se desenvolver é preciso que tenha produção de bens e serviços e troca deles, e isto nunca existiu no Brasil colonial, onde as cidades eram simplesmente extensões ou prolongamentos das propriedades rurais. A população das cidades era composta de funcionários públicos, religiosos, alguns artesãos, prestadores de serviços e pequenos comerciantes e muitos escravos. Os escravos realizavam todos os serviços que faziam a cidade funcionar: o transporte, o abastecimento alimentar, a construção civil, militar ou religiosa, a limpeza das casas. Por isso não foi possível à formação de uma classe trabalhadora assalariada, nem de um mercado interno urbano. As cidades dependiam de Portugal e do próprio campo para sobreviver. Podemos dizer que as cidades nascem como espaços administrativos da ocupação de novas terras, da extração de novas riquezas, da exploração da força de trabalho nas fazendas, engenhos e minas. O Estado é o criador de classes sociais, pois nesses espaços urbanos, surgem os serviços, o comércio e, posteriormente as indústrias e com essas atividades advêm classes e grupos sociais anteriormente inexistentes. Grande parte das classes e grupos sociais conforma-se sobre a influência do poder estatal, que assegura as condições propícias à sua produção. A estrutura social do Brasil considerando todos os fatores históricos assume traços particulares e distintos da sociedade europeia, onde o Estado poderia ser a forma de "expressão dos interesses gerais", ou ser assim concebido. Aqui a cidadania preexiste ao Estado capitalista, a sociedade não se entende como um grande grupo de indivíduos providos de direitos, mas sim como um grupo de indivíduos desprovidos de quaisquer direitos. Henrique de Heidtmann Neto em seu texto O que é o Terceiro Setor? Afirma que o Estado no Brasil sempre foi centralizador e patrimonialista, buscando sempre o apoio e o controle dos grupos e instituições de força econômica nacional e internacional, através do corporativismo, no sentido de atender os interesses da elite. Sendo um fator negativo para a formação do Estado e do mercado nacional. A partir de 1930, sobre a esteira dos fenômenos cidade/indústria, o Estado inicia um processo centralizado de intervenção econômica e social, a fim de promover o crescimento econômico através da substituição de importação e posteriormente com implantação do parque industrial nacional, concentrado na região Sudeste; ocorrem à expansão na prestação direta de serviços públicos em áreas como saúde, educação, previdência social e outros setores. O Estado desloca-se, gradativamente para o espaço da expressão relacional, de uma propriedade para uma relação de forças entre atores sociais. Não em sua totalidade, não de forma abrupta, mas como tendência, como fato portador de futuro, que se irá configurar plenamente, em toda sua força e vigor. Agora, Estado e nação começam a conhecer uma implicação antes desconhecida. A sociedade ganha configurações antes ilegíveis. Desponta a possibilidade de uma democracia de massas, porque as massas tornam-se classes sociais, sujeitos, no plural, que se posicionam diferentemente, que se exprime que constroem suas próprias identidades. O espaço público começa a perder seu caráter privado. O Estado utiliza a política social, como uma estratégia voltada para o chamado desenvolvimento econômico e, consequentemente, para atuar na correlação de forças sociais, seguindo as determinações daquele desenvolvimento. No Brasil, não se pode falar de política social sem se voltar à questão do desenvolvimento econômico. Dentro do capitalismo, ele representa transformação qualitativa e quantitativa das relações econômicas, decorrente de processo de acumulação particular de capital. A iniciativa privada e atuação do governo é que criam uma situação favorável a este desenvolvimento. A participação do Estado é fundamental no processo de desenvolvimento econômico, notamos isso nas várias políticas adotadas por ele, especialmente a nível econômico e social. As Constituições organizam o Estado e instituíram os chamados três poderes (Legislativo Executivo e Judiciário). A própria evolução histórica levou ao primeiro plano o Executivo, particularmente depois de 1930, ano em que o governo exerceu seu forte domínio na política econômica e social, aumentando seus recursos para atuar nessas áreas. Diferentes políticas sociais foram adotadas pelos governos do Brasil e essas políticas de certa forma, sempre representaram as relações entre o Estado e a economia. Assim como a política econômica, também a política social revela, em seu nível lógico e em seu nível histórico, as transformações ocorridas nas relações de apropriação econômica e no exercício de dominação política, presentes na sociedade brasileira. (Vieira, 1995, p.10). As diferentes políticas sociais adotadas pelos governos no Brasil ficaram longe de solucionar os problemas sociais e propiciar o tão esperado "bem-estar" social para a população. Algumas representaram um conjunto de direitos da população, perante o Estado, outras em encargos, a ser pagos por quem já recolhia tributos. O Estado centralizador não conseguiu (e até hoje não consegue) dar conta das demandas sociais e garantir um mínimo de educação, saúde, trabalho e lazer para todos. Bibliografia ASKOVA, McKINSEY & COMPANY, INC. Empreendimentos sociais sustentáveis: como elaborar planos de negócios para organizações sociais. São Paulo, Peirópolis, 2001. AYALA, V. R. Voluntariado Social, Incorporación Social y Solidaridad: Independencia, Interdependencia y Ambigüedades, Documentación Social. Revista de Estudios Sociales y de Sociología Aplicada, 1994. BUENO, Eduardo. Náufragos, traficantes e degredados: as primeiras expedições ao Brasil, 15001531. 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