XIII JORNADA DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO – JEPEX 2013 – UFRPE: Recife, 09 a 13 de dezembro. Avaliação dos danos às vias visuais em pacientes portadores de glaucoma primário ou secundário por meio do Potencial Visual Evocado por flashes de luz Souza, E. H. L. S.1, Silva, J. K. A.2, Ferreira, N. V. C.3, Costa, E. V. L.4, Silva, V. L 5, Sá, F. B.6 INTRODUÇÃO O glaucoma é uma das causas mais comuns de cegueira, sendo a segunda maior causa de cegueira nos países desenvolvidos (RESNIKOFF et al., 2004). É uma síndrome que tem como sinais marcantes o aumento da pressão intraocular (PIO), com perda da visão como resultado dos danos ao disco óptico, com lesão neuronal mecânica. Algumas teorias apontam vias vasculares, citotóxicas e neurais como mais significativas para o desencadeamento da síndrome (WHITEMAN et al., 2002). O dano causado ao nervo óptico é irreversível e o disco óptico pode tornar-se escavado. Frequentemente o glaucoma está associado ao aumento da PIO, sendo este um fator de risco para o desenvolvimento da neuropatia óptica glaucomatosa, e não o agente desencadeador da síndrome (BROOKS et al., 1997; GELATT & BROOKS, 1999; WHITEMAN et al., 2002). A lesão do disco óptico pode decorrer da compressão mecânica da lâmina cribrosa, devido ao aumento da PIO. Ocorre a interrupção no fluxo axoplasmático nos axônios das celulares ganglionares da retina, causando isquemia, degeneração e atrofia (VIDAL-SANZ et al 2011). Não sendo a PIO o fator desencadeador desta síndrome, temos o glaucoma de pressão normal, onde não é evidenciado um aumento da pressão intraocular além dos limites de normalidade. Porém os danos na retina e no nervo óptico são os mesmos já descritos (TAVARES & MELLO; 2005). Essa patogenia pode ser classificada como primária, secundária e, segundo alguns autores, congênita (GELATT & BROOKS, 1999). Um dos sinais mais comuns do aumento da PIO é a presença de vasos episclerais ingurgitados, hiperemia conjuntival e dor (SLATTER, 2005). Em casos avançados de glaucoma, a oftalmoscopia pode revelar o escavamento do disco óptico e a atrofia da retina, clinicamente diagnosticada através da hiperreflexia da área tapetal, atenuação dos vasos retinianos e atrofia do epitélio pigmentar da área não tapetal (SLATTER, 2005). A privação de fatores de crescimento neurotróficos, de fatores neurotróficos derivados do cérebro e a toxicidade pelo aumento dos níveis de glutamato intra-vítreo estão listados entre as causas que contribuem para a neurodegeneração no glaucoma ( VIDAL-SANZ et al., 2001). As técnicas eletrofisiológicas são ferramentas valiosas na oftalmologia veterinária utilizadas para acessar a integridade funcional da retina, nervo óptico e das vias visuais centrais pelo registro das diferenças de potencial de membrana das células. Um dos testes que podemos utilizar na Medicina Veterinária é o potencial visual evocado (PVE) por flashes, onde serão avaliadas as funções dos nervos ópticos e demais vias visuais, como trato óptico, corpo geniculado lateral e córtex visual (KOMÁROMY et al., 2002). O trabalho teve como objetivo geral a avaliação dos danos às vias visuais em pacientes portadores de glaucoma primário ou secundário por meio do Potencial Visual Evocado por flashes de luz. Os objetivos específicos são correlacionar os valores referentes à latência e da amplitude obtidas no PVE-F com as alterações clínicas oftálmicas observadas no exame oftalmológico. Explorar o PVE na avaliação dos danos causados nas vias visuais superiores pelo glaucoma. Material e métodos Os exames clínicos foram realizados no Hospital Veterinário da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), setor de oftalmologia. O PVE-F foi realizado de acordo com as normas do ISCEV 2006 no laboratório de Oftalmologia experimental, no Departamento de Morfologia e Fisiologia Animal - DMFA, sem o uso de midriáticos e sedativos. Animais Os animais foram examinados seguindo a marcha de exame oftálmico, que consiste em oftalmoscopia direta e indireta, teste lacrimal de Schirmer e reflexos pupilares diretos e consensuais. Posteriormente 1 Primeiro Autor é graduando em Medicina Veterinária da Universidade Federal Rural de Pernambuco. Rua Dom Manoel de Medeiros, s/n, CEP: 52171-900 - Recife/PE. E-mail: [email protected] Segunda Autora é graduanda em Medicina Veterinária da Universidade Federal Rural de Pernambuco. Rua Dom Manoel de Medeiros, s/n, CEP: 52171-900 - Recife/PE. 3 Terceira Autora é Mestranda do programa Ciência Veterinária da Universidade Federal Rural de Pernambuco. Rua Dom Manoel de Medeiros, s/n, CEP: 52171-900 - Recife/PE. 4 Quarto Autor é Doutorando no programa Biociência Animal da Universidade Federal Rural de Pernambuco. Rua Dom Manoel de Medeiros, s/n, CEP: 52171-900 - Recife/PE. 5 Quinto Autor é Professor Adjunto do Departamento Fisiologia, da Universidade Federal de Pernambuco, Av. Jorn. Aníbal Fernandes, Cidade Universitária, Recife, 50740-560. 6 Sexto Autor é Professor Adjunto do Departamento Fisiologia e Morfologia Animal, da Universidade Federal Rural de Pernambuco, Rua Dom Manoel de Medeiros, s/n, CEP: 52171-900 - Recife/PE. 2 XIII JORNADA DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO – JEPEX 2013 – UFRPE: Recife, 09 a 13 de dezembro. selecionados para realização do PVE. Os animais utilizados foram sete cães de diferentes raças, com sexo e idade variadas com ou sem alterações oftálmicas retinianas e outros sinais do glaucoma, que não se enquadraram nos critérios de exclusão. A pressão intraocular de todos os animais estava sendo controlada com o uso tópico de cloridrato de dorzolamida a 2%. Como controle e padronização do método utilizou-se sete cães, jovens e adultos, de ambos os sexos e de diferentes raças que não tenham sido relatados como portadores glaucoma, aparentemente sadios que não apresentem sinais clínicos de doença oftálmica. Equipamento e Estímulo O Sistema utilizado foi o da Nihon Kohdem, Neuropack 2 MEB-7102A/k, com estimulo realizado com uma luz de Light-emitting diode (LED) com intensidade de 3.000 milicandelas, de cor branca e uma angulação de 20°, com uma frequência de 1Hz totalizando 60 estímulos por minutos. Procedimento Os PVE-F registrados a partir de uma colocações bipolares de eletrodos ativos, O1 ou O2, posicionados 2-3 cm à esquerda ou à direita, de um eletrodo de referência comum (Cz), colocado na linha mediana do crânio, na altura das orelhas. O eletrodo terra (Fpz) é colocado 2-3 cm acima do eletrodo de referência ( MORENOCARMONA et al., 2006). Avaliação Os resultados foram gerados pelo aparelho e impressos pelo mesmo, avaliados em seguida, considerando as amplitudes em microvolts (µV) e latências em milissegundos (ms). As terminologias consideradas foram a do aparelho, que denomina L1 e L3 (p100) como os picos positivos e, L2 e L4, como negativos. O tipo de estudo utilizado foi o observacional transversal, com a demonstração do PVE-F sob o estímulo luminoso. Para a confecção dos dados obtidos foram analisados 300 ms e consideradas as seguintes convenções: Amplitude dos intervalos de ondas “L1-L2”, “L2-L3” e “L3-L4” que consiste nos intervalos entre picos. Latência das ondas “L1”, “L2”, “L3” e “L4” que consiste no intervalo entre o estimulo e o aparecimento das ondas “L1”, “L2”, “L3” e “L4”. Estatística Para a avaliação dos dados obtidos pelo PVE-F, calculou-se a média e o desvio padrão. A fim de testar a normalidade, foi realizado o teste de Shapiro-Wilk, em todos os parâmetros (L1, L2, L3, L4, L1-L2, L2-L3 e L3-L4) dos dois grupos. Para os parâmetros que apresentaram uma distribuição normal nos dois grupos, foram submetidos ao teste t de Student, os demais foram submetidos ao teste de Mann-Whitney, considerando a diferença estatisticamente significante quando p≤0,05. Resultados e Discussão A ausência de anestesia melhora a qualidade do registro e o torna clinicamente viável. Resultados encontrados por EKESTEN (2007) indicam que a sedação afeta a consciência do animal interferindo no resultado, tendo um aumento na latência. Como resultado foram obtidos valores de latência para os picos positivos L1 e L3; como também para os picos negativos L2 e L4. Igualmente foram registrados valores de intervalos da amplitude (L1-L2; L2-L3; L3-L4). Dos valores obteve-se a média e o desvio padrão, representados na tabela 1. O mesmo foi feito para os animais com sinais de glaucoma, representados na tabela 2. Apesar do tratamento com cloridrato de dorzolamida a 2%, para controle da pressão intraocular, as lesões já estabelecidas são irreversíveis e consequentemente os danos causados a visão também. Os proprietários, na sua grande maioria, só notam os danos da síndrome glaucomatosa ao olho, quando afetam grande parte da visão ou alteram a morfologia do globo ocular. Os altos valores de desvio padrão encontrados na latência, tanto nos animais sadios, quanto nos animais com sinais de glaucoma, são oriundos da alta discrepância entre os valores mínimos e máximos dos picos encontrados em cada animal. Essa grande variação tem como principal fator a idade, e era esperada, já que foram utilizados animais de diferentes idades. KIMOTSUKI et. al. (2006), esclareceram e correlacionaram esse aumento progressivo da latência em relação direta com a idade. Porém nós animais com sinais de glaucoma o desvio padrão foi ainda maior, isso ocorreu provavelmente pelo aumento do intervalo estimulo-resposta, devido à neurodegenerações causadas pelo glaucoma (VIDAL-SANZ et al., 2001). Esse aumento na latência dos animais com sinais de glaucoma ficam mais evidente quando avaliamos as médias de L1 e L2, onde os valores médios aproximados já citados por ODOM et. al. (2004) são: L1 50ms, L2 75ms, L3 100ms L4 135ms; podendo assim observar que é evidente nos animais sadios uma aproximação na média desses valores (L1 53ms eL2 66ms). Já nos animais com sinais de glaucoma obtiveram médias maiores (L1 88ms e L2 101ms), essa diferença foi estatisticamente significante (p= 0,037 e p= 0,045 respectivamente), entre os animais sadios e com sinais de glaucoma, demonstrando um afastamento dos valores aproximados já citados. Esse aumento da latência indica um retardo no início da onda em relação ao estímulo reforçando o caráter neurodegenerativo da síndrome glaucomatosa (VIDAL-SANZ et al., 2001). XIII JORNADA DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO – JEPEX 2013 – UFRPE: Recife, 09 a 13 de dezembro. Avaliando os intervalos de amplitudes (L1-L2; L2-L3; L3-L4), observa-se uma diminuição total dos valores referentes aos animais com sinais de glaucoma em relação com os animais sadios. Porém essa diferença só foi significativa nos valores das amplitudes L1-L2 e L2-L3 (com p = 0,012 e p = 0,004 respectivamente) Essa diminuição provavelmente é decorrente do glaucoma. Pois essa síndrome causa a escavação do disco óptico e a morte das células ganglionares da retina (SLATTER, 2005), ou seja, uma grande morte das células retinianas, assim resulta em uma redução no potencial gerado pelas mesmas e é caracterizado quantitativamente no exame de PVE-F por uma redução, expressa em microvolts, nos intervalos de amplitudes. Nos intervalos L2-L3, além de ter a maior diferença entre as médias, obteve diferença significante (p = 0,004), quando comparamos os animais com sinais de glaucoma com os sadios. Essa diferença no intervalo L2-L3 dos animais com sinais de glaucoma em relação com os sadios é um fato que reforça os danos da síndrome glaucomatosa sobre as vias visuais e consequentemente sobre a visão. Pois é nesse intervalo que se pode avaliar as demências e as degenerações retinianas como já descrito por KIMOTSUKI et. al., (2006). Levando em consideração as lesões retinianas causadas pelo glaucoma e que são características de uma degeneração; temos: a pigmentação da área não tapetal, hiperreflexia da área tapetal, atenuação dos vasos retinianos e uma atrofia da retina (SLATTER, 2005). Assim a síndrome glaucomatosa causa, além dos outros danos no globo ocular, uma degeneração retiniana que é demonstrada quantitativamente no PVE como uma redução da amplitude do intervalo L2-L3. Com base nos resultados apresentados, podemos concluir que o aparelho mostrou-se eficiente na captação e no processamento dos dados. A metodologia utilizada se mostrou capaz e eficiente Na avaliação dos danos causados pela síndrome glaucomatosa, que vão além dos já visualizados nos exames clínicos. O PVE-F mostrou-se um grande aliado, como exame complementar, no diagnóstico e quantificação dos danos causados por glaucomas, tendo uma importância ainda maior nos casos de glaucoma de preção normal. Estes resultados abrem novos horizontes para a avaliação quantitativa e funcional da visão dos cães. Agradecimentos Agradeço ao apoio financeiro do CNPq e UFRPE pela disposição das instalações. Referências -BROOKS, D.E. et al. Vitreous body glutamate concentration in dogs with glaucoma. Am J Vet Res, v.58, p.864-867, 1997. -GELATT, K.N.; BROOKS, D.E. The canine glaucomas. In:______. Veterinary ophthalmology. 3.ed. Malvern: Lea & Febiger, 1999. Cap.21, p.701-754. -GIONFRIDDO, J.R. Recognizing and managing acute and chronic cases of glaucoma. Vet Med, v.90, p.265-275, 1995. -KIMOTSUKI, T; YASUDA, M; TAMAHARA, S; TOMIHARI, M; MATSUKI, N; ONO, K. Age-Associated Changes of Flash Visual Evoked Potentials in Dogs. Journal of Veterinary Medicine Science. 68(1): 79–82, 2006 -KOMÁROMY, A. M.; BROOKS, D. E.; DAWSON, W. W.; KÄLLBERG, M. E.; OLLIVIER, F. J.; OFRI, R. Technical issues in electrodiagnostic recording. Veterinary Ophthalmology, v. 5, n. 2, p. 85-91, 2002. -MORENO-CARMONA, F. M.; COSTA, M. F.; VENTURA, D. F.; SALOMÃO, S. R.; BARROS, P. S. M. Acuidade visual de resolução de grades pelo método dos potenciais visuais evocados de varredura: padronização da metodologia para uso em cães. Brazilian Journal of Veterinary Research and Animal Science, v. 43, p. 86-92, 2006. Supplement. -NASKAR, R.; DREYER, E. New horizons in neuroprotection. Surv Ophthalmol, v.5, supl.3, p.S250-S255, 2001. -ODOM, J. V.; BACH, M..; BARBER, C.; BRIGELL, M.; MARMOR, F. M.; TORMENE, A. P.; HOLDER, G. E.; Visual evoked potentials standard (2004). Documenta Ophthalmologica 108: 115–123, 2004. -RESNIKOFF, S., PASCOLINI, D., ETYA’ALE, D., KOCUR, I., PARARAJASEGARAM, R., POKHAREL, G.P., MARIOTTI, S.P., 2004. Global data on visual impairment in the year 2002. Bull. World Health Organ 82, 844e851. -SLATTER, D. Fundamentos de Oftalmologia Veterinária. 3. ed. São Paulo: ROCA, p. 283-338, 2005. -TAMBURRELLI, C. et al. Ultrasonographic evaluation of optic disc swelling: comparison with cslo in idiopathic intracranial hypertension. Invest Ophthalmol Vis Sci, v.41, p.2960–2966, 2000. -TAVARES, I. M.; MELLO, P.A.A. Glaucoma de pressão normal. Arquivo Brasileiro de Oftalmologia, v.68, p.56575, 2005. -VIDAL-SANZ, M. et al. Retinal ganglion cell death induced by retinal ischemia: neuroprotective effects of two alpha-2 agonists. Surv Ophthalmol, v.45, suppl.3, p.S261-267, 2001. -WHITEMAN, A.L. et al. Morphologic features of degeneration and cell death in the neurosensory retina in dogs with primary angle-closure glaucoma. Am J Vet Res, v.63, p.257-261, 2002.