Tribunal de Contas do Estado do Pará A C Ó R D Ã O Nº. 43.435 (Processo nº. 2007/54082-9) Requerente: Instituto de Gestão Previdenciária do Estado do Pará Relator: Conselheiro IVAN BARBOSA DA CUNHA EMENTA: Pensão Civil. Correção do ato. Registro deferido. Relatório do Exmº. Sr. Conselheiro IVAN BARBOSA DA CUNHA: Processo nº. 2007/54082-9 Cuida o processo do registro da pensão civil decorrente do falecimento do ex-segurado Geraldo Gomes Ferreira, ocorrido em 10 de outubro de 2005 (ex vi doc. às fls. 05), tendo como beneficiárias as senhoras Raimunda Nazaré Madalena Ferreira e Laura Gomes Teixeira, viúva e companheira, respectivamente. De acordo com os documentos de fls. 13 (certidão de casamento) e de fls. 47 (declaração de convivência), resta provado os vínculos da Sra. Nazaré Madalena Ferreira e Sra. Laura Gomes Teixeira com o ex-segurado. Foi encaminhada pelo IGEPREV, a este TCE, para fins de registro a Portaria PS n°. 523, de 05 de dezembro de 2005, às fls. 29, com provento no valor de R$-435,00 (quatrocentos e trinta e cinco reais), em favor da Sra. Raimunda Nazaré Madalena Ferreira, viúva do exsegurado. Após parecer técnico do serviço social, aquele Instituto, às fls. 33, entende por cancelar a portaria referida, pela ausência de constância do casamento entre a viúva e o ex-segurado. Conforme doc. de fls. 38, a Sra. Laura Gomes Teixeira, companheira do ex-segurado, deu entrada junto ao IGEPREV, apensado ao processo principal, do requerimento de solicitação para sua inclusão como beneficiária da pensão. Diante da existência de duas possíveis beneficiárias, o IGEPREV, às fls. 49, solicita a visita do serviço social, in loco, vale dizer, nas residências das senhoras com o objetivo de apurar com quem realmente o ex-segurado convivia maritalmente. Em parecer técnico, às fls. 50/51, o Serviço Social conclui que "o Sr. Geraldo Gomes Ferreira estava separado de fato da esposa, vivendo maritalmente com a Sra. Laura Gomes Teixeira". Foram juntadas aos autos declarações, às fls. 52/53, que, também, comprovam a união estável do ex-segurado com sua companheira. Em parecer de fls. 54/55, o IGEPREV, entende, com base no art. 6°, I, da lei Complementar nº. 39/2002, que não havendo constância 1 Tribunal de Contas do Estado do Pará do casamento e não sendo, a viúva, dependente economicamente do exsegurado, não pode a Sra. Raimunda Nazaré Madalena Ferreira, ser considerada como beneficiária do ex-segurado, mesmo ainda sendo casada. Após o que, encaminha, para fins de registro, a este TCE, a Portaria PS nº. 588, de 27 de março de 2006, com provento no valor de R$-435,00 (quatrocentos e trinta e cinco reais), às fls. 62, em favor da companheira Sra. Laura Gomes Teixeira, cancelando a já citada Portaria PS nº. 523. A 1ª CCE, em sua manifestação, às fls. 65/66, opina pela concessão da pensão em favor das duas senhoras, fixando o valor de R$-311,25 (trezentos e onze reais e vinte e cinco centavos) correspondente a 50% do valor total de R$-622,50 (seiscentos e vinte dois reais e cinqüenta centavos) já atualizados conforme a lei nº. 7.083/2008 e MP nº. 421/2008, como quota-parte de cada uma. O Ministério Público, em parecer às fls. 68, acompanha a informação da seção técnica deste TCE. É o relatório. VOTO: O presente processo, ora em julgamento, apresenta a possibilidade de existirem duas beneficiárias à pensão por morte do exsegurado Sr. Geraldo Gomes Ferreira, uma na qualidade de esposa, legalmente constituída, e outra na qualidade de companheira, em convívio marital exclusivo. Segundo estabelece nosso ordenamento jurídico temos a expor: 1) Benefício de pensão por morte: é garantia constitucional; está previsto no art. 201, V, da CF/1988 e no art. 217 e incisos da lei nº. 8112/1990. No âmbito estadual, o benefício é garantido pela Constituição Estadual, em seu art. 33, § 7°, bem como pela lei Complementar nº. 039/2002. A Lei Complementar nº. 039/2002, em seu art. 6°, I, dispõe que será beneficiário o cônjuge ou companheiro na constância do casamento ou união estável e; no art. 29, § 2°, estabelece que o cônjuge separado só terá direito à pensão se à época do óbito percebesse pensão alimentícia, ou seja, fosse dependente, economicamente, do ex-segurado. 2) União Estável: a CF/88, no art. 226, § 3°, ampara a figura da (o) companheira (o) através do princípio da igualdade entre cônjuge e companheiro. Garantia esta confirmada pela lei nº. 8.971/94, que regulamenta a união estável. O Código Civil de 2002 também, garante proteção à união estável segundo dispõe os art. 1.723 e ss. De acordo com decisões judiciais em tribunais distintos, passamos a explanar: 1) A 3ª Câmara Cível do TJ de Goiás, em decisão prolatada no 2 Tribunal de Contas do Estado do Pará processo nº. 87.523-6/188, estabelece que, com base nas leis nº. 8.971/1994 e nº. 9.278/1996 e súmula nº. 382 do STF, "quando não existe separação judicial, somente de fato, a 3ª pessoa da relação não é amante e sim companheira, protegida pelo novo Código Civil", decidindo que "a companheira é quem tem direito à pensão previdenciária"; 2) A 2ª Câmara Civil do TJ do Rio Grande do Sul, em acórdão, decide que "a relação duradoura não garante que a amante receba pensão depois da morte do companheiro, se o homem vivia maritalmente com sua mulher quando do seu falecimento", neste caso, a companheira não deverá receber o benefício previdenciário. O entendimento desta Corte de Contas, assim dispõe: 1) Processo nº. 1999/50.946-0: duas interessadas, a companheira e a viúva; apesar do entendimento do IPASEP em não conceder a pensão para a esposa, separada de fato e não dependente economicamente, esta Corte de Contas, através Resolução nº. 16.256/2000 e Acórdão nº. 30.873/2001 diverge de tal entendimento e concede, também, à esposa o benefício. 2) Processo nº. 1999/52.381-4: interessadas, a companheira e filhos e a viúva e filha menor; o IPASEP com base no que dispõe o art. 31, § 1° da Lei nº. 5.011/81, com nova redação dada pela Lei nº. 6.074/97, verbis: "o direito do cônjuge separado de fato, dependente econômico do segurado, não excluirá o direito à pensão da companheira que o mesmo vivia há mais de 5 anos e se encontrava devidamente habilitada perante o IPASEP." (grifo nosso), entende que a viúva não tem direito ao benefício de pensão, por não ser economicamente dependente do ex-segurado. Por outro lado, este TCE, mesmo nestas condições, pela Resolução nº. 16.395/2000 e Acórdão nº. 31.457/2001 entende por conceder o benefício também à viúva, por ser separada apenas de fato do ex-segurado. 3) Processo nº. 1999/51.955-5: pensão em favor da viúva, separada judicialmente, e filho, e companheira; Neste caso não há divergência de entendimentos entre o IPASEP e este TCE, porque mesmo havendo separação judicial, consta nos autos decisão judicial de arbitramento de pensão em favor do filho e ex-esposa do ex-segurado, o que comprova a dependência econômica desta. O benefício deverá ser dividido entre a ex-esposa, seu filho e companheira do ex-segurado. 4) Processo nº. 1999/51.677-2: pensão em favor da companheira e da ex-esposa, divorciada. Caso análogo ao processo anterior, após divórcio, ficou arbitrada pensão alimentícia em favor da exesposa, portanto dependia economicamente do ex-segurado. 5) Processo nº. 2007/51.069-0: este processo, a princípio, teria como beneficiárias da pensão, a ex-esposa, separada judicialmente e dependente economicamente através arbitramento de pensão alimentícia, uma companheira, em constância de união estável à época do óbito do exsegurado, e uma ex-companheira. Entretanto, o IGEPREV entende por 3 Tribunal de Contas do Estado do Pará conceder pensão apenas à ex-esposa, por já perceber alimentos, e à companheira à época do óbito, e não conceder à terceira, porque esta não comprovou dependência econômica, sendo vetado pelo nosso ordenamento pátrio a união estável garantida de um homem com duas mulheres simultaneamente. Pelo que se vê dos processos votados nesta Corte de Contas, o que se leva em consideração é o fato da viúva ainda ser casada legalmente, com o ex-segurado, mesmo que não haja mais constância marital por anos, e não o fator de dependência econômica. Critério extremamente injusto, pois se há como a viúva se manter economicamente, não se pode falar em quota parte para a mesma. Data venia dos entendimentos da seção técnica e do Órgão Ministerial, considerando que a Sra. Raimunda Nazaré Madalena Ferreira, mesmo ainda legalmente casada, não vivia, maritalmente, com o exsegurado há mais de 20 anos; considerando a declaração de união estável, feita pelo próprio interessado, com sua companheira por aproximadamente, o mesmo período; considerando que, a possibilidade de conceder pensão às duas senhoras nos leva a uma interpretação analógica do artigo 235 do Código Penal, que tipifica a situação como bigamia, pois é a interpretação que dá vida à lei, caso contrário, seria letra morta; CONCEDO a pensão objeto do presente processo, exclusivamente, à Sra. Laura Gomes Teixeira, companheira, devendo a Portaria PS nº. 588, de 27 de março de 2006, às fls. 62, ser registrada com a devida atualização estabelecida pela Lei nº. 7.083/2008 e a MP nº. 421/2008. Voto do Exmº. Sr. Conselheiro NELSON LUIZ TEIXEIRA CHAVES: De acordo com o relator. Voto do Exmº. Sr. Conselheiro CIPRIANO SABINO DE OLIVEIRA JÚNIOR: De acordo. Voto do Exmº. Sr. Conselheiro ANTONIO ERLINDO BRAGA: Eu divirjo do eminente conselheiro relator, pois entendo que o vínculo jurídico não foi desconstituído, e houve tempo bastante para fazê-lo, ou seja, vinte anos, e o direito não socorre os que dormem. Se o de cujus queria deixar a pensão exclusivamente para a companheira deveria ter tomado as providências legais no sentido de dissolver o vínculo jurídico de acordo com o Código Civil. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal não tem o condão de desconstituir a lei, neste caso. Portanto, eu fico com a jurisprudência do Tribunal de Contas, concedendo a pensão no percentual de 50% para a companheira e 50% para a viúva. Voto do Exmº. Sr. Auditor Convocado EDILSON OLIVEIRA E SILVA (Art. 13, caput, do Ato Regimental): Eu voto com o relator e quero louvar o 4 Tribunal de Contas do Estado do Pará brilhantismo e a percuciência do seu voto, porque realmente traz à baila uma matéria que reclama a audácia dos juízes para que possam interpretar e buscar na lei os seus objetivos sociais. Recordo, inclusive, que Savigny, falando do Direito, citava a expressão Volksgeist, ou seja, o Direito é o produto da consciência social e essa consciência é que leva o juiz a maturar e, evidentemente, a olhar na lei o Direito, porque a lei é apenas uma das expressões do Direito; este é muito mais, cercado e embasado de princípios e valores. E cabe ao julgador interpretá-lo, exatamente como fez Sua Excelência, o relator, brilhantemente, no processo ora relatado, cujo voto eu acompanho integralmente. Voto do Exmº. Sr. Conselheiro (Presidente): De acordo com o relator. FERNANDO COUTINHO JORGE ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado do Pará, contra o voto do Exmº. Senhor Conselheiro ANTONIO ERLINDO BRAGA, nos termos do voto do Exmº. Sr. Conselheiro Relator, com fundamento no art. 25, inciso III, da Lei Complementar nº. 12, de 09 de fevereiro de 1993, registrar a Portaria PS nº. 0588, de 27.03.2006, que trata da pensão civil em favor de LAURA GOMES TEIXEIRA, dependente do ex-segurado GERALDO GOMES FERREIRA, devendo o IGEPREV atualizar os proventos nos termos do que dispõe a Lei nº. 7.083/2008 e MP nº. 421/2008, respectivamente. Plenário “Conselheiro Emílio Martins”, em 26 de junho de 2008. FERNANDO COUTINHO JORGE Presidente IVAN BARBOSA DA CUNHA Relator NELSON LUIZ TEIXEIRA CHAVES CIPRIANO SABINO DE OLIVEIRA JÚNIOR ANTONIO ERLINDO BRAGA EDILSON OLIVEIRA E SILVA Auditor Convocado Presente à sessão a Procuradora-Geral do Ministério Público de Contas Dra. Maria Helena Loureiro. RC/0100455/ 5