Direito Econômico
em Debate
Giovani Clark
Leonardo Alves Corrêa
Samuel Pontes do Nascimento
Organizadores
Direito Econômico
em Debate
EDITORA LTDA.
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CEP 01224-001
São Paulo, SP — Brasil
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Março, 2015
Esta obra foi aprovada pelo Conselho Editorial da LTr Editora
Produção Gráfica e Editoração Eletrônica: R. P. TIEZZI X
Projeto de Capa: FABIO GIGLIO
Impressão: PIMENTA GRÁFICA E EDITORA
Versão impressa: LTr 5110.8 — ISBN: 978-85-361-3214-3
Versão e-book: LTr 8630.7 — ISBN: 978-85-361-8325-1
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Direito econômico em debate / Giovani Clark, Leonardo Alves Corrêa, Samuel
Pontes do Nascimento organizadores. — São Paulo : LTr, 2015. Vários
autores.
Bibliografia
1. Direito econômico 2. Direito econômico — Brasil I. Clark, Giovani.
II. Corrêa, Leonardo Alves. III. Nascimento, Samuel Pontes do.
14-12095 CDU-34:336:33(81)
Índice para catálogo sistemático:
1. Brasil : Direito econômico
34:336:33(81)
Autores
Carla Maia dos Santos
Mestranda em Ciências Jurídico-Filosóficas pela Universidade de
Coimbra, advogada e Pesquisadora do Grupo de Estudos de Direito,
Economia e Filosofia da PUC-Minas e do Grupo de Extensão “Justiça e Quilombolas: demarcando direitos humanos” da Universidade
Federal de Juiz de Fora (UFJF).
Cláudio Ladeira de Oliveira
Professor adjunto da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília
e Doutor em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina.
Demétrius Barreto Teixeira
Pesquisador Junior e Acadêmico de Direito da Universidade Federal
do Rio Grande do Sul.
Érica Soares Viana
Advogada e Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica
de Minas Gerais — PUC-Minas.
Flávio Freire de Oliveira
Advogado, Mestre em Direito Público pela Pontifícia Universidade
Católica de Minas Gerais — PUC-Minas e Diretor Jurídico da Câmara
Municipal de Ribeirão das Neves/MG.
5
Gilberto Bercovici
Professor Titular de Direito Econômico e Economia Política da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.
Giovani Clark
Professor do Programa de Pós-Graduação da Pontifícia Universidade
Católica de Minas Gerais — PUC-Minas, Docente da Faculdade de
Direito da UFMG e Coordenador do Grupo de Estudo da Fundação
Brasileira de Direito Econômico (FBDE).
Gustavo Vidigal Costa
Mestre em Direito Público Pontifícia Universidade Católica de Minas
Gerais — PUC-Minas e Diretor de Controle Externo dos Municípios do
Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais. Também foi Professor
substituto de Direito Econômico na PUC Minas.
Juliana Martins de Sá Müller
Graduada em Direito pela da Universidade Federal de Juiz de Fora e
Bolsista de Apoio Técnico II da FAPEMIG.
Leonardo Alves Corrêa
Professor de Direito Econômico da Universidade Federal de Juiz de
Fora e Doutorando em Direito Público pela Pontifícia Universidade
Católica de Minas Gerais — PUC-Minas.
Marcos Vinício Chein Feres
Mestre e Doutor em Direito Econômico pela UFMG, Professor Associado e Diretor da Faculdade de Direito da Universidade Federal de
Juiz de Fora e Bolsista de Produtividade PQ 2 do CNPq.
Ricardo Antônio Lucas Camargo
Professor Adjunto da Faculdade de Direito Universidade Federal do
Rio Grande do Sul, Doutor em Direito pela Universidade Federal de
Minas Gerais e Membro do Instituto Brasileiro de Advocacia Pública.
6
Rodrigo de Castro Lucas
Advogado, Mestre em Direito Público pela Pontifícia Universidade
Católica de Minas Gerais — PUC-Minas e Professor da Universidade
de Itaúna.
Samuel Pontes do Nascimento
Mestre e Doutorando em Direito Público pela Pontifícia Universidade
Católica de Minas Gerais — PUC-Minas e Professor da Universidade
Federal do Piauí.
7
Sumário
Prefácio.....................................................................................................11
Capítulo I — A “Questão Siderúrgica” e o Papel do Estado na
Industrialização Brasileira............................................................15
Gilberto Bercovici
Capítulo II — Legitimação para Exploração dos Serviços de
Radiofusão Educativa e Comercial, no Contexto da Lei n.
4.117, de 1962, e do Decreto-Lei n. 236, de 1967...........................59
Ricardo Antônio Lucas Camargo; Demétrius Barreto Teixeira
Capítulo III — O Desplanejamento Estatal: o Exemplo da Copa
do Mundo de 2014 no Brasil..............................................................96
Giovani Clark; Gustavo Vidigal Costa
Capítulo IV — Direito, Economia Política e Atores Sociais:
o Banco Central e o Discurso de Independência......................129
Cláudio Ladeira de Oliveira; Leonardo Alves Corrêa;
Carla Maia dos Santos
Capítulo V — Aspectos Jurídicos e Econômicos da Revisão
Geral Anual da Remuneração dos Servidores Públicos e
Subsídio dos Agentes Políticos.....................................................162
Giovani Clark; Flávio Freire de Oliveira
9
Capítulo VI — A Proibição do Retrocesso Social e o Programa Universidade para Todos: uma Defesa das Conquistas
Sociais na Educação Superior Brasileira...................................189
Samuel Pontes do Nascimento; Érica Soares Viana
Capítulo VII — Da Destinação dos Royalties da Atividade
Minerária..........................................................................................219
Rodrigo de Castro Lucas
Capitulo VIII — Contratos de Cooperação Tecnológica: uma
Análise Íntegra com Vistas às Determinações Legais do
Estado de Minas Gerais..................................................................242
Marcos Vinício Chein Feres; Juliana Martins de Sá Müller
 10 
Prefácio
Esta obra de Direito Econômico é fruto de estudos e
reflexões de alunos e professores do Programa de Pós-Graduação da PUC-Minas em Direito Público, na linha de pesquisa
de “Estado, constituição e sociedade no paradigma do Estado
Democrático de Direito” juntamente com as significativas
contribuições do Grupo de Estudo da Fundação Brasileira de
Direito Econômico (FBDE), onde todos interagem, inclusive
docentes e discentes de outras Universidades (USP, UFJF,
UFGRS, UFPI). Aliás, é por esse motivo que o livro é organizado por 3 professores de Direito Econômico de Instituições
Superiores distintas e possuí oito capítulos.
Dessa forma, o Grupo de Estudo da Fundação Brasileira de Direito Econômico, originário da entidade de mesmo
nome e criada pelo saudoso Prof. Washington Peluso Albino
de Souza, em 1972, cumpre um dos seus papéis, ou seja,
de produção científica.
A obra tem como foco central debater as políticas econômicas e sociais em diversos setores, iniciando-se com o Prof.
Gilberto Bercovici que versa sobre a siderurgia nacional e o
papel do Estado brasileiro na nossa industrialização. Já no
segundo capítulo o Prof. Ricardo Antônio Lucas Camargo e
o pesquisador Demétrius Barreto Teixeira discorrem sobre a
exploração dos serviços de Radiofusão Educativa e Comercial,
 11 
dando ênfase ao papel regulatório estatal e à exploração das
telecomunicações no país.
Logo em seguida, no capítulo terceiro, os Professores
Giovani Clark e Gustavo Vidigal, estabelecem um paralelo
entre a Copa de 2014 no Brasil e a ausência de planejamento estatal em face do “circo” do futebol mundial (evento),
dissecando as nuances do Instituto do Planejamento na
implementação dos comandos da Constituição de 1988.
O tema Banco Central e a sua “independência” é tratado
pelos pesquisadores Cláudio Ladeira de Oliveira, Leonardo
Alves Corrêa e Carla Maia dos Santos, no capítulo quatro, que
investigam a forma pela qual as relações entre alguns atores
sociais são efetivamente constituídas na esfera institucional-político-econômica e, em especial, como se desenvolve a real
movimentação dos sujeitos sociais no processo de deliberação
das políticas monetárias no Brasil.
Já no capítulo quinto, optando pela via não habitual de
análise, o Prof. Giovani Clark e o advogado Flávio Freire de
Oliveira analisam os aspectos jurídicos e econômicos da
revisão geral anual da remuneração dos servidores públicos
e dos subsídios dos agentes políticos sob a ótica do Direito
Econômico.
Um outro assunto relevante que sempre está em
voga nos meios acadêmicos e nas políticas públicas é
a educação, e estudos do Professor Samuel Pontes do
Nascimento e da advogada Érica Soares Viana, no capítulo
sexto, aduziram sobre a proibição do retrocesso social (enquanto princípio) e o Programa Universidade para Todos.
No sétimo capítulo, o Prof. Rodrigo de Castro Lucas
trata, na esteira do Direito Econômico, sobre a destinação dos
royalties da atividade minerária e a importância do adequado
tratamento jurídico e econômico dos recursos auferidos pelas
municipalidades a título de compensação financeira.
E finalmente, no último capítulo, o Prof. Marcos Vinício
Chein Feres e a pesquisadora Juliana Martins de Sá Müller
 12 
versam sobre um importante tema na atualidade, ou seja,
os contratos de cooperação tecnológica em face da legislação
do Estado de Minas Gerais.
Os textos inseridos no livro abordam os mais variados
temas, visitando os conceitos, princípios e institutos do
Direito Econômico, na toada dos ensinamentos do Mestre
Washington Peluso Albino de Souza, no propósito de ampliar
a escassa bibliografia em Direito Econômico pátrio sobre os
referidos temas.
Boa leitura
Os organizadores
Giovani Clark
Leonardo Alves Corrêa
Samuel Pontes do Nascimento
 13 
Capítulo I
A “Questão Siderúrgica” e o
Papel do Estado na Industrialização
Brasileira
Gilberto Bercovici
A metalurgia no Brasil foi introduzida nos tempos coloniais. Todas as ferramentas eram importadas, o que
demonstra a necessidade de haver fundições nas colônias
americanas. O primeiro engenho de fundir ferro erguido no
continente situava-se, por volta de 1550, próximo a Sorocaba, no morro do Araçoiaba, pertencendo a Afonso Sardinha.
Haveria um outro engenho de fundir ferro a duas léguas
da vila de São Paulo, em Santo Amaro do Ibirapuera, na
margem esquerda do rio Pinheiros, de propriedade de Diogo
de Quadros e de Francisco Lopes Pinto, que teria funcionado
 15 
de 1607 até 1629(1). O método utilizado era o da “forja catalã”(2). Em 1780, o Governador da Capitania de Minas Gerais,
Rodrigo José de Menezes, propõe a instalação de uma fábrica
de ferro em Minas Gerais às autoridades coloniais, iniciativa
que não teria como prosperar, especialmente após o Alvará
de 5 de janeiro de 1785, de D. Maria I, que proibia toda e
qualquer instalação de indústria ou manufatura nas colônias
portuguesas(3).
A política portuguesa muda com o Príncipe Regente D.
João e a administração de Dom Rodrigo de Sousa Coutinho
(futuro Conde de Linhares)(4). As minas passam a ser regidas pelo Regimento de 13 de maio de 1803, que teve sua
elaboração atribuída a José Bonifácio de Andrada e Silva e a
Manuel Ferreira da Câmara Bittencourt Aguiar e Sá (o Intendente Câmara). O Regimento de 1803 tentou modernizar a
exploração das minas brasileiras, com redução de impostos,
incentivos à constituição de companhias mineradoras, novos
limites de concessão e estímulos a novos descobrimentos,
além de uma preocupação inédita com a preservação das
florestas(5). Em 1808, no entanto, há um novo Regimento,
de 1º de julho, que revoga o de 1803, preocupado com as
fundições e a circulação de ouro. As sociedades de mineração foram reguladas pela Carta Régia de 12 de agosto de
1817, endereçada ao Capitão Geral de Minas Gerais. O art.
(1) ESCHWEGE, Wilhelm von. Pluto brasiliensis, v. 2, p. 201-202; HOLANDA, Sérgio Buarque
de. Caminhos e fronteiras, p. 157-167; BARBOSA, Francisco de Assis. Dom João VI e a siderurgia no
Brasil, p. 24-32; BAER, Werner. Siderurgia e desenvolvimento brasileiro, p. 71-73; e BARROS, Geraldo
Mendes. História da siderurgia no Brasil — século XIX, p. 35-38.
(2) GOMES, Francisco Magalhães. História da siderurgia no Brasil. Belo Horizonte: Itatiaia; São
Paulo: Edusp, 1983. p. 24-30.
(3) MENDONÇA, Marcos Carneiro de. O intendente câmara, p. 71-73; BARBOSA, Francisco de
Assis. Dom João VI e a siderurgia no Brasil, p. 32-35; BARROS, Geraldo Mendes. História da siderurgia
no Brasil — século XIX, p. 38-43.
(4) MENDONÇA, Marcos Carneiro de. O intendente câmara, p. 38-70; e BARBOSA, Francisco de
Assis. Dom João VI e a siderurgia no Brasil, p. 35-51.
(5) CALÓGERAS, João Pandiá. As minas do Brasil e sua legislação, v. I, p. 154-160; MENDONÇA,
Marcos Carneiro de. O intendente câmara, p. 118-138; e COMPANHIA VALE DO RIO DOCE.
A mineração no Brasil e a Companhia Vale do Rio Doce, p. 88-90. Eschwege critica o Regimento de
1803, entendendo-o como um texto europeu que não estaria adaptado ao Brasil. Vide ESCHWEGE,
Wilhelm von. Pluto brasiliensis, v. 2, p. 271-277. Sobre a decadência da mineração, vide, ainda,
PRADO JÚNIOR, Caio. Formação do Brasil contemporâneo — colônia, p. 169-174.
 16 
8º desta Carta Régia concedia o direito de lavrar em terras
particulares. Haveria preferência do proprietário do solo
durante um determinado prazo. Esgotado este prazo, a sociedade de mineração poderia explorar as jazidas ou minas
existentes, pagando uma compensação. Não se alterou o
direito real sobre as minas e jazidas, que continuaram de
propriedade da Coroa. A concessão sempre era da exploração, não da propriedade da mina. Apenas excepcionalmente
poderia ocorrer a transmissão de propriedade, nos casos de
doação explícita da Coroa(6).
A implantação de uma indústria siderúrgica foi permeada
de equívocos e obstáculos. Foram promovidas três fábricas
de ferro, isoladas e sem comunicações: a Fábrica Patriótica, em Congonhas do Campo (MG), sob direção do Barão
Wilhelm von Eschwege, alemão que já prestara serviços à
Coroa portuguesa; a Fábrica Real do Morro de Gaspar Soares
(MG), também conhecida como Morro do Pilar, sob direção do
Intendente Câmara, e a Real Fábrica de São João do Ipanema,
em Sorocaba (SP), cujo grande administrador foi o também
alemão Coronel Frederico Luís Guilherme de Varnhagen(7).
A primeira fundição de ferro ocorreu na Fábrica Patriótica de Congonhas do Campo, em dezembro de 1812,
que utilizava o método tradicional da forja catalã, e não o
alto-forno, como as demais. Os seus métodos e a sua produção não foram suficientes e a fábrica fechou em 1822(8).
(6) CALÓGERAS, João Pandiá. As minas do Brasil e sua legislação, v. I, p. 160-163; v. III, p. 8-10 e
COMPANHIA VALE DO RIO DOCE. A mineração no Brasil e a Companhia Vale do Rio Doce, p. 98-101.
A necessidade da doação ser expressa estava prevista nas Ordenações Filipinas, Livro 2º, Título
XXVIII: “Por quanto em muitas doações feitas per Nós, e per os Reys nossos antecessores, são
postas clausulas muito geraes e exuberantes, declaramos, que por taes doações, e clausulas nellas
cônteùdas, nunca se entende serem dadas as dizimas novas dos pescados, nem os veeiros e Minas,
de qualquer sorte que sejam, salvo se expressamente forem nomeados, e dados na dita doação. E
para prescrição das ditas cousas não se poderá allegar posse alguma, posto que seja immemorial”.
(7) BARBOSA, Francisco de Assis. Dom João VI e a siderurgia no Brasil, p. 50-52; e BARROS, Geraldo
Mendes. História da siderurgia no Brasil — século XIX, p. 43-47.
(8) ESCHWEGE, Wilhelm von. Pluto brasiliensis, v. 2, p. 204-205 e 247-253; BASTOS, Humberto.
A conquista siderúrgica no Brasil, p. 44-45; BAER, Werner. Siderurgia e desenvolvimento brasileiro,
p. 76-77; GOMES, Francisco Magalhães. História da siderurgia no Brasil, p. 79-85; LIBBY, Douglas
Cole. Transformação e trabalho em uma economia escravista, p. 137-139; e COMPANHIA VALE DO
RIO DOCE. A mineração no Brasil e a Companhia Vale do Rio Doce, p. 95-98.
 17 
A Fábrica do Morro do Pilar funcionou de 1815 a 1831,
sempre com muitas dificuldades, como a escassez de água e
o constante abandono de emprego por parte dos empregados
assalariados(9). Já a Fábrica de Ipanema só terminou de ser
construída e começou a funcionar quando a administração foi
assumida por Varnhagen, entre 1814 e 1821, substituindo o
sueco Carl Gustav Hedberg, cuja má-gestão contribuiu para
os seus percalços. A primeira fundição ocorreu em 1818,
mas as atividades declinaram até seu fechamento em 1832.
Ao contrário das outras fábricas, no entanto, a Fábrica de
Ipanema foi reaberta e fechada algumas vezes, funcionando
entre 1836 e 1842 e novamente a partir de 1864, em virtude
das necessidades da Guerra do Paraguai. As suas atividades
continuaram de forma irregular, encerradas e reiniciadas de
modo intermitente, até que a sua gestão foi transferida, por
meio do Decreto-Lei n. 69, de 15 de dezembro de 1937, do
Ministério da Guerra para o Ministério da Agricultura, com o
objetivo de exploração para o fornecimento de matéria-prima
para a produção de fertilizantes fosfatados(10).
Além das experiências pioneiras de Eschwege, Câmara e
Varnhagen, outra iniciativa relevante no campo da siderurgia
foi a do engenheiro francês Jean Antoine de Monlevade, que
chegou em 1817 ao Brasil. Monlevade trabalhou com Eschwege e resolveu construir um altoforno na cidade de Caeté,
interior de Minas Gerais, iniciativa que não prosperou. Logo
depois, em 1825, na localidade de São Miguel de Piracicaba,
Monlevade construiu uma fábrica com forjas catalãs e mão
de obra escrava. A fábrica durou até sua morte, em 1872,
(9) MENDONÇA, Marcos Carneiro de. O intendente câmara, p. 160-170 e, especialmente, p. 180218; BASTOS, Humberto. A conquista siderúrgica no Brasil, p. 42-44; BAER, Werner. Siderurgia e
desenvolvimento brasileiro, p. 74-75; GOMES, Francisco Magalhães. História da siderurgia no Brasil,
p. 71-79 e; COMPANHIA VALE DO RIO DOCE. A mineração no Brasil e a Companhia Vale do Rio
Doce, p. 93-94. Para a análise crítica do contemporâneo Eschwege, vide ESCHWEGE, Wilhelm von.
Pluto brasiliensis, v. 2, p. 207-213.
(10) BASTOS, Humberto. A conquista siderúrgica no Brasil, p. 40-42; BAER, Werner. Siderurgia e
desenvolvimento brasileiro, p. 73-76; GOMES, Francisco Magalhães. História da siderurgia no Brasil,
p. 47-70 e 131-140; e COMPANHIA VALE DO RIO DOCE. A mineração no Brasil e a Companhia Vale
do Rio Doce, p. 94-95 e 125-126. Para a crítica de Eschwege, que elogia, no entanto, o conterrâneo
Varnhagen, vide ESCHWEGE, Wilhelm von. Pluto brasiliensis, v. 2, p. 215-244.
 18 
atuando de modo intermitente, com subsídios do Governo
Provincial mineiro, até sua falência em 1897(11).
O problema da implantação da siderurgia no início do
século XIX no Brasil para observadores contemporâneos,
como Eschwege e José Bonifácio de Andrada e Silva, era a
falta de trabalhadores livres. A criação de pequenas fábricas
deveria estimular o trabalho livre e expandir o mercado interno, criando a riqueza nacional, cujos grandes obstáculos
eram a escravidão e o latifúndio voltado para a exportação.
Eschwege reafirma inúmeras vezes a inconveniência das
grandes fábricas de ferro no Brasil, pois não haveria mercado para a sua produção. A escravidão, inclusive, era um
obstáculo que afetava a própria disposição ao trabalho dos
homens livres(12).
O resultado desta primeira tentativa de implantação da
siderurgia, ainda que em pequena escala no Brasil, foi o
abandono dos vários projetos(13). A pequena siderurgia que
se manteve durante o século XIX, especialmente em Minas
Gerais, foi fruto de contribuições africanas com algumas inovações europeias, instituindo uma estrutura manufatureira
bem rudimentar e dependente da mão de obra escrava. A
abundância do minério de ferro e do carvão vegetal, o nível
tecnológico baixo e a escala reduzida de produção mantiveram a pequena siderurgia em Minas Gerais produzindo
essencialmente equipamentos agrícolas de ferro, expandindo-se apenas extensivamente. No entanto, como dependia
da mão de obra escrava, esse setor praticamente desaparece com o fim da escravidão(14). A indústria siderúrgica no
Brasil durante o século XIX e o início do século XX limitava-se,
(11) BASTOS, Humberto. A conquista siderúrgica no Brasil, p. 46-49; BAER, Werner. Siderurgia e
desenvolvimento brasileiro, p. 77-78; GOMES, Francisco Magalhães. História da siderurgia no Brasil,
p. 109-113; e BARROS, Geraldo Mendes. História da siderurgia no Brasil — século XIX, p. 117-169.
(12) Nas palavras do próprio Eschwege: “É quase impossível, pois, no Brasil, fazer prosperar uma
indústria, quando se depende do concurso dos homens livres”. ESCHWEGE, Wilhelm von. Pluto
brasiliensis, v. 2, p. 249.
(13) BARBOSA, Francisco de Assis. Dom João VI e a siderurgia no Brasil, p. 52-73.
(14) LIBBY, Douglas Cole. Transformação e trabalho em uma economia escravista, p. 134-137, 139-152
e 160-178.
 19 
assim, a pequenas oficinas e fundições, com poucas unidades
de maior porte, incapazes de suprir a demanda interna(15).
No contexto do processo de Independência, a Lei de 20
de outubro de 1823 mantém em vigor no Brasil toda a legislação portuguesa anterior a 25 de abril de 1821, até que fosse
especialmente revogada. A legislação colonial em relação às
minas e jazidas foi, portanto, mantida pelo Estado brasileiro.
A Carta Imperial de 1824, inclusive, garantia expressamente
o direito de propriedade, em seu art. 179, XXII, mas nada
menciona sobre a propriedade das minas e jazidas. No entanto, ao instituir como regime político brasileiro a monarquia
representativa (arts. 3º, 11 e 12 da Carta de 1824), os bens
da Coroa portuguesa no Brasil foram transferidos para a nova
Nação brasileira. A manutenção da legislação portuguesa e
do domínio real (agora nacional) sobre as minas e jazidas foi
confirmada com a expedição do Decreto de 17 de setembro
de 1824, que concedia a exploração de lavras no Rio Grande
do Sul e no Espírito Santo, sob as mesmas regras vigentes
no período colonial(16).
A implantação da siderurgia no Brasil e a exploração
adequada dos seus recursos minerais foram temas que ganharam destaque com a criação da Escola de Minas, em Ouro
Preto (MG), em 1875. Embora, a instalação de uma escola
de engenharia de minas e de mineralogia estivesse presente
desde os debates da Independência, inclusive na Assembleia
Constituinte de 1823, a sua instituição foi determinada, ainda
durante a Regência, pelo Decreto de 3 de outubro de 1832.
No entanto, a Escola de Minas só foi efetivamente criada,
após o convite formulado ao francês Henry Gorceix para
que se tornasse seu diretor, em 6 de novembro de 1875. A
participação da Escola de Minas de Ouro Preto, por meio de
(15) BASTOS, Humberto. A conquista siderúrgica no Brasil, p. 60-62; BAER, Werner. Siderurgia e
desenvolvimento brasileiro, p. 78-82; GOMES, Francisco Magalhães. História da siderurgia no Brasil, p.
87-109 e 141-148; SUZIGAN, Wilson. Indústria brasileira: origem e desenvolvimento, p. 272-274; e
COMPANHIA VALE DO RIO DOCE. A mineração no Brasil e a Companhia Vale do Rio Doce, p. 122-125.
(16) CALÓGERAS, João Pandiá. As minas do Brasil e sua legislação, v. III, p. 16-26; e VIVACQUA,
Attilio. A nova política do subsolo e o regime legal das minas, p. 510-511.
 20 
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