PREFEITURA MUNICIPAL DE GUANAMBI
SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO
DEPARTAMENTO DE ENSINO
PLANEJAMENTO PEDAGÓGICO / 5º ANO – MARÇO /2015
" Estamos em busca de mentes capazes e não de corpos perfeitos.
Em busca de um ser mais entendedor da saúde,
e isso só a Educação Física é capaz de propiciar ".
Paulo Freire
PONTO DE VISTA
O que não é educação física
Prof. Ms. Conrado Augusto Gandara Federici
Colaboração: Profa. Dra. Eliana Ayoub e Prof. Laércio Claro
O objetivo deste texto é o de instigar a reflexão e desafiar cada leitor a confrontar as
próprias idéias e conceitos relativos à esta área de conhecimento chamada Educação Física
com algumas permanências e “insistências” históricas. Por exemplo: e se ainda confundimos
esporte com educação física? E se não sabemos exatamente quais são as funções da aula de
educação física? ou se pensamos já saber tudo à respeito desta área que nos é tão comum,
concreta e visível em todo lugar?
A aula de educação física sofre deste mal: por estar quase sempre exposta, ao ar livre, como
em uma vitrine, dá a liberdade para sua ampla interpretação e “achismo” – aos moldes da
anedota, que nos diz que existem tantos técnicos da seleção brasileira de futebol, quanto são
os brasileiros! Enfim, mais do que em outras áreas do conhecimento, o senso comum é forte
influência na formação de opiniões, as mais diversas, no nosso meio.
Pensemos rapidamente sobre o percurso histórico das aulas de educação física na escola: sua
origem passou pelos exercícios físicos de caráter militar. Depois, seguiram-se os métodos de
ginástica, (inglês, alemão, sueco e francês, que chegou até a ser oficializado por Rui Barbosa,
como o método a ser adotado em nossas escolas em 1921). Logo após, o grande movimento
esportivo, que perpetua modelos de igualdade para todos até hoje. A psicomotricidade e as
condutas motoras ganharam fama nos anos 70. Finalmente, à partir da década de 80 até
nossos dias, o conceito de Cultura Corporal foi desenvolvido (norteia as bases do
conhecimento específico da área de educação física com os conteúdos: jogos, ginástica,
esportes, lutas, dança e outros pertinentes à região geográfica ou social). Pois bem, com base
nestas premissas, no amplo conhecimento histórico já estudado e na prática cotidiana do
professor, podemos sugerir esclarecimentos sobre a aula de educação física escolar, pela
negativa de alguns preconceitos formados ao longo do tempo e da tradição (baseado em
Depiere, 2001):
Movimento & Percepção, Espírito Santo de Pinhal, SP, v.4, n.4/5, jan./dez. 2004 – ISSN 1679-8678
• Arquitetonicamente, nosso espaço pedagógico, quadras e pátios - espaços estes que não
necessariamente dão conta das necessidades dos conteúdos -, quase sempre sofre pela falta
de planejamento adequado. Por isso, outras práticas acontecem nos mesmos lugares, ou até,
absurdamente, ao mesmo tempo, como o recreio ou o tempo livre de outras classes. Tal fato
gera uma confusão óbvia e compreensível entre as crianças, as quais confundem o momento
de aula, estruturado e organizado, com o momento de recreação. Educação física não é
recreação.
• Também por uma questão de tradição, ainda hoje encontramos metodologias de ensino
baseadas exclusivamente em sala fechada. A aula de educação física seria, por isso, a
compensação da rotina da classe e o momento (as vezes, único) de liberdade na escola. Pelo
contrário, a aula de educação física, apesar de constituir-se também em meio à liberdade
espacial, não significa descompromisso com o processo de ensino–aprendizagem próprio da
escola. Educação física não é compensação da rotina.
• Se os alunos se comportam bem, “ganham”, por merecimento, as aulas de educação física.
Caso contrário, perdem-na, como moeda de uma hipócrita barganha educacional. Educação
física não é prêmio ou castigo.
• Pelos adventos e pesquisas científicas, já nos foi mostrado que o treinamento físico, mais
próximo dos esportes de alto rendimento, geram efeitos quando praticados com grande
freqüência e especialização. Resultados estéticos, apregoados pela mídia, não serão atingidos
nas aulas de educação física. Educação física não é fábrica de corpos.
• O conteúdo a ser ensinado nas aulas de educação física é o jogo, a ginástica, a dança, o
esporte, a luta e outros pertinentes à cultura corporal da região. Ou seja, o conhecimento da
disciplina é específico e ela não é, ou serve de ajudante às demais matérias escolares, tão
legítimas e importantes quanto ela mesma, como criadora e inventora de jogos e brinquedos
pedagógicos. (Atenção: não confundir com um planejamento interdisciplinar, que é altamente
adequado na escola.) Educação física não é auxiliar de outras disciplinas.
• Festa junina, gincana, feira cultural, manhãs de recreação, dia dos pais, feira do livro, páscoa,
olimpíada cultural, dia das mães... Quando organizar? Quando fazer? Quem vai ensaiar?
Quando montar? Por serem situações não específicas a uma determinada área, as respostas a
estes exemplos de perguntas devem ser definidos também de forma interdisciplinar, pois
Educação física não é promotora de eventos.
• “-Queremos participar do campeonato interescolar! -Ótimo!!! Então teremos que encontrar um
horário extra para os treinos!” A aula de educação física é momento de oportunidade para todos
os alunos tomarem contato com o conhecimento, e não para a melhoria e aprimoramento das
habilidades de apenas alguns poucos eleitos “do time”. Educação física não é treino das
equipes.
• As aulas de educação física são quase sempre expostas e, por isso, são passíveis de
Movimento & Percepção, Espírito Santo de Pinhal, SP, v.4, n.4/5, jan./dez. 2004 – ISSN 1679-8678
avaliações leigas e generalizadas. Possuem também vastos recursos pedagógicos,
sistematizações, periodizações, avaliações, cronogramas e planejamentos. Não acontecem por
um mero acaso ou vontade momentânea do professor e dos alunos. Educação física não é
improviso.
• Na falta de professores, comumente se constata o direcionamento dos alunos à educação
física, como se este ato não prejudicasse a própria classe, além de outras aulas de educação
física que, por ventura, estejam ocorrendo no mesmo tempo e espaço. Educação física não é
tapa-buraco.
• “-Professor, estou dispensado da aula. Tenho o atestado médico. Virou as costas e ligou o
walkman...” A lei atual isenta, infelizmente, o aluno da presença na aula mediante o atestado.
Este fato ocorre pela confusão entre aula e atividade física. Os problemas de doença e/ou
físicos somente o serão em caso de práticas físicas, fato este que, apesar de constituírem
grande parte de nossas aulas, não esgotam e nem encerram a metodologia da disciplina em
apenas praticar e melhorar o desempenho individual. A aula, muito além disso, é o contato com
o novo conhecimento, independente de sua natureza: prática corporal ou conceitual. Educação
física não é somente atividade física.
• A educação tradicional sempre foi baseada na ordem, assepsia e silêncio hospitalar dos
ambientes. A educação física atinge mais freqüentemente aspectos sociais e emocionais dos
alunos, intervindo pedagogicamente em um esquema de organização diferente da maioria, com
sua ordem e características peculiares. Educação Física não é transtorno para a escola.
Sustentar nossas aulas na contemporaneidade do conhecimento da área é responsabilidade
de cada um de nós. Em qualquer âmbito da nossa vida, esbarrar em preconceitos e “tradições
irrefletidas” seria ignorar-se sujeito atuante do e no presente. Entendermo-nos, futuros
professores, como integrantes, e não espectadores, do processo histórico que vivemos, faz-nos
transformadores do hoje. A educação física vive um momento de transição, definição e
abandono de antigos conceitos, que não mais coincidem com as necessidades políticas,
econômicas e sociais da atualidade. Atentarmos para estas mudanças e participarmos
conscientemente delas faz-nos cidadãos, abrindo-nos a possibilidade de difusão deste
conhecimento.
Referências bibliográficas
COLETIVO, de Autores. Metodologia do Ensino de Educação Física. São Paulo: Cortez, 1992.
DEPIERI, Adriane dos Santos. A importância da Educação Física Escolar. Monografia de graduação –
FEF Unicamp, 2001.
SOARES, Carmem Lúcia. Educação Física Escolar: Conhecimento e Especificidade. Revista Paulista de
Educação Física, São Paulo, 1996.
Movimento & Percepção, Espírito Santo de Pinhal, SP, v.4, n.4/5, jan./dez. 2004 – ISSN 1679-8678
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