UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO DIREITO TRIBUTÁRIO: PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA SUELLEN CAROLINE COELHO Itajaí/SC, novembro de 2010 UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO DIREITO TRIBUTÁRIO: PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA SUELLEN CAROLINE COELHO Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientador: Prof. MSc. Alexandre Macedo Tavares Itajaí/SC, novembro de 2010. MEUS AGRADECIMENTOS Agradeço primeiramente a Deus que iluminou meu caminho até aqui, e que será o responsável por cada vitória alcançada em minha vida, aos meus pais Silvane e Carlos que me deram toda a assistência e sempre incentivaram os meus objetivos, também aos meus amigos que fazem parte da minha vida, especialmente Sara, Jaqueline, Ana e Cristiana, e, ao Rodrigo que muito colaborou para meu crescimento. ESTE TRABALHO DEDICO Dedico carinhosamente a finalização deste trabalho a minha família, pela confiança que depositaram em mim, Aos meus colegas de classe pelo tempo que passamos. Ao professor Alexandre Macedo Tavares pela valiosa atenção e orientação. TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo. Itajaí/SC, novembro de 2010 Suellen Caroline Coelho Graduanda PÁGINA DE APROVAÇÃO A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Suellen Caroline Coelho, sob o título Direito Tributário: Prescrição e Decadência, foi submetida em 22/11/2010 à banca examinadora composta pelos seguintes professores: [Nome dos Professores ] ([Função]), e aprovada com a nota [Nota] ([nota Extenso]). Itajaí/SC, novembro de 2010 Professor MSc. Alexandre Macedo Tavares Orientador e Presidente da Banca Professor MSc. Antônio Augusto Lapa Coordenação da Monografia SUMÁRIO RESUMO............................................................................................. 8 INTRODUÇÃO .................................................................................... 8 CAPÍTULO 1 ..................................................................................... 11 OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA ............................................................. 11 1.1 DIREITO TRIBUTÁRIO .................................................................................. 11 1.1.1 Direito positivo e Ciência do Direito. ....................................................... 11 1.1.2. Direito Tributário Positivo e Ciência do Direito Tributário ................... 11 1.1.3 Outros conceitos ....................................................................................... 12 1.1.4 Autonomia do direito tributário ................................................................ 12 1.1.5. Relação do direito tributário com outros ramos do direito .................. 14 1.1.6. Denominações da disciplina ................................................................... 15 1.2 ATIVIDADE FINANCEIRA DO ESTADO ....................................................... 15 1.3 RECEITA PÚBLICA E TRIBUTO .................................................................. 17 1.3.1 Receita Pública .......................................................................................... 17 1.3.2 Tributo ........................................................................................................ 18 1.4 ELEMENTOS CARACTERIZADORES DO TRIBUTO .................................. 19 1.5 NATUREZA JURÍDICA ESPECÍFICA DO TRIBUTO .................................... 20 1.6 OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA .......................................................................... 22 1.6.1 Espécies de obrigação tributária ............................................................. 23 1.6.1.1 Obrigação tributária principal ...........................................................................23 1.6.1.2 Obrigação acessória ..........................................................................................24 1.6.2 Nascimento da obrigação tributária e fato gerador................................ 25 1.6.1.3 Nascimento da obrigação tributária .................................................................25 1.6.1.4 Fato gerador .......................................................................................................26 1.6.3 Objeto da obrigação principal e acessória ............................................. 27 1.6.4 Sujeito ativo ............................................................................................... 28 1.6.5 Sujeito passivo .......................................................................................... 29 1.6.1.5 Sujeição passiva independe da capacidade civil ............................................30 1.6.1.6 Sujeição passiva e convenções particulares ...................................................31 CAPÍTULO 2 ..................................................................................... 32 CRÉDITO TRIBUTÁRIO ................................................................... 32 7 2.1 SIGNIFICADO DA EXPRESSÃO CRÉDITO TRIBUTÁRIO .......................... 32 2.2 CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO PELO LANÇAMENTO......... 34 2.3 LANÇAMENTO: CONCEITO E FUNÇÃO ..................................................... 35 2.4 NATUREZA JURÍDICA DO LANÇAMENTO ................................................. 38 2.5 MODALIDADES DE LANÇAMENTO ............................................................ 39 2.5.1. Lançamento de ofício............................................................................... 39 2.5.2 Lançamento por declaração ..................................................................... 40 2.5.3 Lançamento por homologação ................................................................ 41 2.6 CONSTITUIÇÃO DEFINITIVA DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO ....................... 433 2.7 INDISPONIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO ........................................ 3 2.8 O CRÉDITO TRIBUTÁRIO COMO UM DIREITO-REFLEXO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA ....................................................................................................... 44 2.9 GARANTIAS E PRIVILÉGIOS DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO ........................ 45 2.9.1 Disposições Gerais ................................................................................... 45 2.9.2 Preferências ............................................................................................... 48 CAPÍTULO 3 ..................................................................................... 49 PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA....................................................... 49 3.1 OS CHAMADOS “EXERCÍCIO DE DIREITO” E “DIREITO POTESTATIVO”49 3.2 CONCEITO DE DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO NO DIREITO TRIBUTÁRIO500 3.3 NOTAS ACERCA DA HIERARQUIA DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL53 3.4 RESERVA DE LEI COMPLEMNTAR EM MATÉRIA DE PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA ..................................................................................................... 55 3.5 INADIMISSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO DE PRAZOS DECADENCIAIS PRESCRITOS NO ART. 150, § 4º E NO ART. 173, I, DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL .......................................................................................................... 57 3.6 PRAZO DECADENCIAL NA HIPÓTESE DE DOLO, FRAUDE OU SIMULAÇÃO ............................................................................................................................. 60 3.7 A PRESCRIÇÃO DO DIREITO DA FAZENDA PÚBLICA ............................. 61 3.8 A PRESCRIÇÃO DO DIREITO DE AÇÃO DO CONTRIBUINTE PARA COMPENSAÇÃO/REPETIÇÃO DO INDÉBITO RELATIVO A TRIBUTOS SUJEITOS A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. AS ALTERAÇÕES TRAZIDAS PELA LC 118/05 ............................................................................... 66 3.9 O POSICIONAMENTO JURISDICIONAL DO STJ E A INVALIDADE DO ART. 4º DA LC Nº 118/05 ............................................................................................. 70 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................. 73 REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS ........................................... 75 8 RESUMO De um modo geral, temos a vida pautada pela noção de tempo, forma capaz de indicar, de medir o movimento. Assim, com noção de que a vida se subdivide em instantes, temos o tempo como seu demarcador. Deste modo, ficam exatamente dentro dessa conceituação os atos no direito: são pautados por limites temporais, que visam impedir a perpertuação de ações jurídicas sem prazo, o que certamente traria consigo a noção de insegurança. Esta monografia trata exatamente da questão do tempo no direito tributário, visto que a prescrição e decadência são limites temporais para exercer um determinado direito. Tratamos inicialmente de conceitos necessários ao leitor, para compreender tal tema, tais como tributo, obrigação tributária, crédito tributário, lançamento, dentro outros. A seguir trata especificamente da prescrição e decadência em algumas hipóteses, dentre elas, do prazo decadencial aplicável a Fazenda Pública ao constituir crédito tributário, de tributos sujeitos a lançamento de ofício, declaração e por homologação. Trata também do direito do contribuinte de reaver valores pagos à títulos de tributos já prescritos. Outrossim, será abordado a temática da LC 118/05 e seu art. 3º que buscou reduzir o prazo prescricional, para que o contribuinte pleiteie a restituição de tributos indevidamente pagos, em verdadeira afronta a interpretação até então vigente no âmbito do STJ. Ainda o art. 4º da LC 118/05 procurou estabelecer efeito ex tunc para o seu art. 3º, defendemos pela inconstitucionalidade deste, visto princípios constitucionais e entendimentos doutrinários e jurisprudenciais. 9 INTRODUÇÃO A presente Monografia visa propiciar ao leitor reflexões sobre os conceitos de prescrição e decadência no direito tributário, bem como algumas hipóteses de aplicação desse instituto na seara tributária. O seu objetivo é o de traçar algumas considerações a respeito das inovações dos institutos, a aplicação e reflexos nas relações tributárias, tanto ao contribuinte quanto ao Fisco. Para tanto, principia–se, no Capítulo 1, conceituando Direito Tributário e a atividade financeira do estado, definição e elementos caracterizadores do tributo, tratando das espécies de obrigações tributárias definindo o sujeito passivo e ativo; No Capítulo 2, tratando do crédito tributário, constituição do crédito pelo lançamento, as modalidades de lançamento, bem como garantias e privilégios do crédito tributário; No Capítulo 3, tratando de tecer alguns comentários da decadência do direito de lançar tributo pelo Fisco, prescrição do direito de restituir tributo pago indevido pelo contribuinte, a finalidade dos institutos, trazendo também alguns entendimentos jurisprudenciais e doutrinários sobre algumas das discussões tributárias. O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre a prescrição e decadência tributária. Para a presente monografia foram levantadas as seguintes hipóteses: 10 É adimissível cumular os prazos decadenciais prescritos no art. 150 §4 e no art. 173, I, do Código Tributário Nacional para o direito do Fisco de lançar? É possível a restituição da importância paga a título de tributo prescrito? A respeito da contagem do prazo prescricional para repetição do indébito relativo a tributos sujeitos a lançamento por homologação, utiliza-se o marco inicial para a prescrição trazido pelo Código Tributário Nacional ou o inovador marco trazido pela LC 118/05? O artigo 4º da LC 118/05 que pretende propiciar efeito ex tunc à norma trazida pelo art. 3º do mesmo diploma legal é constitucional? Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase de Investigação1 foi utilizado o Método Indutivo2, na Fase de Tratamento de Dados o Método Cartesiano3, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente Monografia é composto na base lógica Indutiva. Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as Técnicas do Referente4, da Categoria5, do Conceito Operacional6 e da Pesquisa Bibliográfica7 1 “[...] momento no qual o Pesquisador busca e recolhe os dados, sob a moldura do Referente estabelecido [...]. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. 11 ed. Florianópolis: Conceito Editorial; Millennium Editora, 2008. p. 83. 2 “[...] pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção ou conclusão geral [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 86. 3 Sobre as quatro regras do Método Cartesiano (evidência, dividir, ordenar e avaliar) veja LEITE, Eduardo de oliveira. A monografia jurídica. 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 2226. 4 “[...] explicitação prévia do(s) motivo(s), do(s) objetivo(s) e do produto desejado, delimitando o alcance temático e de abordagem para a atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa.” PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 54. 5 “[...] palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou à expressão de uma idéia.” PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 25. 6 “[...] uma definição para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que expomos [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 37. 7 “Técnica de investigação em livros, repertórios jurisprudenciais e coletâneas legais. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 209. CAPÍTULO 1 OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA 1.1 DIREITO TRIBUTÁRIO 1.1.1 Direito positivo e Ciência do Direito. A realidade do Direito Positivo e a da Ciência do Direito apresentam muitas diferenças, que levam a uma consideração própria e exclusiva de cada termo. O primeiro é o complexo de normas jurídicas válidas num dado país, enquanto que, o segundo, descreve esse enredo normativo, prestando-se a função de compreender, interpretar, descrever esse conjunto de normas, ordenando-o, declarando sua hierarquia, exibindo as formas lógicas do entrelaçamento das várias unidades do sistema, dispondo sobre seus significados. O Direito Positivo volta-se para a disciplina do comportamento humano, sendo que suas regras existem para organizar a conduta das pessoas, possuindo um plano de linguagem prescritivo, ou seja, prescrever comportamento. A Ciência do Direito, por sua vez, compõe-se de linguagem descritiva, ou seja, é o instrumento utilizado para investigar, interpretar e descrever o direito positivo. 1.1.2. Direito Tributário Positivo e Ciência do Direito Tributário O conceito adotado neste trabalho é o de Carvalho, que define: “O Direito Tributário é o ramo didaticamente autônomo do Direito, integrado pelo conjunto de proposições jurídico-normativas, que correspondam, direta ou indiretamente, à instituição, arrecadação e fiscalização de tributos.” 8 O direito tributário positivo é o ramo didaticamente autônomo do direito, integrado pelo conjunto das proposições jurídico-normativas que correspondam, direta ou indiretamente, à instituição, arrecadação e fiscalização de tributos. À Ciência do Direito Tributário compete descrever esse objeto, expedindo 8 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 17 ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 02. 12 proposições declarativas que permitam conhecer as articulações lógicas e o conteúdo orgânico desse núcleo fonte normativo, dentro de uma concepção unitária do sistema jurídico vigente. 1.1.3 Outros conceitos Delineado o objeto de investigação científica do Direito Tributário, Denari conceitua Direito Tributário como: “ramo do Direito Publico que regula as normas relativas à imposição, fiscalização e arrecadação dos tributos e disciplina a relação entre fisco e contribuinte” 9 Tem-se o conceito dado por Souza, para quem direito tributário é o “ramo do direito público que rege as relações jurídicas entre o Estado e os particulares, decorrentes da atividade financeira do Estado no que se refere à obtenção de receitas que correspondam ao conceito de tributos”. 10 Incontestável é a classificação do Direito Tributário com o ramo do direito público, haja vista a supremacia do interesse da coletividade quando se fala em Direito Tributário, assim também entende Amaro em sua obra Direito Tributário Brasileiro: “A classificação do direito tributário como ramo do direito público não se questiona. A preponderância do interesse coletivo no direito dos tributos é evidente, daí derivando o caráter cogente de suas normas, inderrogáveis pela vontade dos sujeitos da relação jurídico-tributária.” 11 1.1.4 Autonomia do direito tributário O Direito Tributário, antes incluído na disciplina do Direito Financeiro, acabou ganhando status de autonomia, em razão do seu extraordinário desenvolvimento. Quanto à sua autonomia, Amaro faz menção à divergência doutrinária existente: 9 DENARI, Zelmo.Curso de Direito Tributário. 6 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998 10 SOUZA, Rubens Gomes. Compêndio de Legislação Tributária. 2 ed. Rio de Janeiro: Edições Financeiras S.A.. 1954, p. 13 e 14. 11 AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 3º ed. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 05 13 (...) o debate é aceso na doutrina. Zelmo Denari reconhece a autonomia do direito tributário, negando-a em relação ao direito financeiro. Paulo de Barros Carvalho só aceita que se fale em autonomia didática do direito tributário, como sustentara Alfredo Augusto Becker, e afirma Hugo de Brito Machado, ao averbar que “o tema da autonomia tem-se prestado para intermináveis debates, em maiores conseqüências práticas”. Eduardo Marcial Ferreira Jardim dá curso a polemica, ao comparar o direito tributário: “ao sistema neurológico ou sistema ósseo do ser humano, que não são dotados de vida própria ou de autonomia absoluta fora do ser como um todo”, com o que procurou contestar a “autonomia cientifica” defendido por Alberto Xavier. 12 Becker afirma “que a autonomia do direito tributário é apenas didática, argumentando que não pode existir norma jurídica independente da totalidade do sistema jurídico.” 13 Assinala Jarach: “Não só o Direito Tributário é parte mais importante e desenvolvida do Direito Financeiro, como é a que efetivamente contem e trata de grande problemática entre fisco e contribuinte que dimana do fenômeno financeiro da receita tributária.” 14 E ainda: Embora certos autores afirmem que se deva falar do Direito Financeiro porque o Direito Tributário é só uma parte daquele, na pratica, quanto tratam do Direito Financeiro, após um exame preliminar da matéria, o que examinam e aprofundam, em definitivo, é o Direito Tributário. Esta é a prova positiva de que o Direito Financeiro, como matéria jurídica em geral, não é suscetível de ser estudado de forma unitária. 15 Por isso esse autor prefere situá-lo como ramo do Direito Público, para pontualizar a plenitude de sua autonômia no confronto com o Direito Financeiro. Amaro diz que: 12 AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro, p. 06 13 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 1972, p. 32 14 JARACH, Dino. Curso de Direito Tributário. 9º ed. São Paulo: Saraiva, 1975, p. 18-19 15 JARACH, Dino. Curso de Direito Tributário, p. 18-19 14 O direito tributário é apenas um setor do direito financeiro que, atingindo relativo grau de complexidade, passou a ser legislado em diplomas normativos específicos e a ser objeto de estudos sistemáticos, que abstraem os demais componentes do conjunto normativo regulador da atividade financeira do Estado, e se preocupam com o subconjunto ou capitulo referente à categoria especifica dos tributos (elastecido este conceito para abarcar também as contribuições parafiscais). 16 Conclui-se, portanto, que o direito tributário goza de autonomia legislativa (por ser objeto de conjuntos de normas dirigidas especificamente à disciplina dos tributos); que possui autonomia científica (por abrigar princípios e institutos não comuns a outros ramos do direito); que possui autonomia didática (por ser ensinado em cadeiras autônomas nos curso jurídicos), porém é preciso ressaltar que, em todos esses aspectos, a autonomia é sempre relativa, não se legisla, nem se teoriza, nem se ensina matéria tributária sem que se tenham presentes conceitos estruturados noutros ramos da ciência jurídica. 1.1.5. Relação do direito tributário com outros ramos do direito Ressalvado a relatividade da autonomia em qualquer ramo do Direito, entende-se que os vários setores do ordenamento jurídico prendem-se uns nos outros. Certamente, disso não difere o direito tributário que se vale de conceitos e informações de outras disciplinas para estabelecer a relação tributária. O direito tributário está visceralmente ligado a todo o universo das regras jurídicas em vigor, não podendo dispensar, nas suas construções, qualquer delas, por mais distante que possa parecer. É preciso frisar, porém, que há um predomínio manifesto de preceitos de direito constitucional e de direito administrativo na feição estrutural do direito tributário brasileiro. Ainda, as normas tributárias devem ser encontradas entre as mais diversas unidades do ordenamento posto, tais como Constituição de 1988, leis complementares, leis delegadas, leis ordinárias, medidas provisórias, decretos legislativos, resoluções e assim também em atos normativos de estatura infra legal, como os decretos do Executivo, instruções ministeriais, portarias, ordens de serviço, etc. Incluem-se, evidentemente, nesse quadro, os atos de cunho jurisdicional. 16 AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro, p. 08 15 Do exposto deflui que não haverão fronteiras que isolem o campo das normas jurídico-tributárias, pois não existe aquela que, imediata ou mediatamente, deixe de interessar ao estudo do Direito Tributário. 1.1.6. Denominações da disciplina No plano do direito positivo brasileiro, a expressão “direito tributário” firmou-se com a Emenda nº 18 de 1965, que estruturou o “Sistema Tributário Nacional”, seqüenciada, em 1966, pela Lei n. 5172, posteriormente denominada Código Tributário Nacional pelo Ato Complementar nº 36/67. Se a designação adotada, nos dias atuais, é “Direito Tributário”, há quem prefira “Direito Fiscal” ou, ainda, “Direito Financeiro”. Explica sobre o assunto, Carvalho: Direito Fiscal” quer, antes de tudo, enfatizar a disciplina da atuação do “Fisco”, aqui entendido côo a pessoa que exerce a pretensão tributária.” (...) “Por outro giro “Direito Financeiro”, hoje pouco usado, traz a nata de cobrir uma região maior do que a necessária. Quer descrever a regulamentação jurídica de toda a atividade financeira do Estado, na qual a tributária aparece com um simples tópico.17 Bem adequado parece o nome Direito Tributário, que reflete o objeto principal de que trata a disciplina, “o tributo”, sendo Direito Fiscal restrito, e Direito Financeiro, muito amplo. 1.2 ATIVIDADE FINANCEIRA DO ESTADO O país necessita de recursos para poder atingir seus objetivos fundamentais, elencados na Constituição de 1988, tais como construção de uma sociedade livre justa e solidária, desenvolvimento nacional, erradicação da pobreza e marginalização, redução das desigualdades sociais e promoção do bem estar da coletividade (art. 1º § 3º). Desta forma cabe ao próprio país executar inúmeras atividades por meio de seus Poderes Judiciário, Legislativo e Executivo. A execução dessas atividades implica a utilização de funcionários, aquisição de bens, realização de 17 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário, p. 18 16 investimento em estradas, hospitais e etc., demandando a imprescindível obtenção e manuseio de valores, atinentes a receitas e despesas. Dentre esses valores, estão os tributos, advindos da receita derivada do patrimônio das pessoas privadas. Segundo Harada a atividade financeira do Estado: “É a atuação estatal voltada para obter, gerir e aplicar os recursos financeiros necessários à consecução das finalidades do Estado que, em última análise, se resumem na realização do bem comum.” 18 Considerada uma representação do “poder ou da soberania do Estado”, segundo Bastos, a atividade financeira “consiste na distribuição da carga econômica do orçamento publico entre os cidadãos e esta atividade tem natureza essencialmente política, pois políticos são os critérios, os fins e os procedimentos que a conformam, ainda que não se possa negar que os meios empregados sejam econômicos.” 19 Atento a tais contornos, Balthazar formula que a atividade financeira tem “(...) o objetivo de identificar, obter, gerir e aplicar os recursos necessários à realização dos (...) fins do Estado (...), tendo, pois como objeto o dinheiro.” 20 A atividade financeira tem como características básicas: a presença de uma pessoa jurídica de direito público, atividade de conteúdo econômico, conteúdo monetário. A atividade financeira é um instrumento destinado a arrecadar os meios financeiros, e direcioná-los para a concretização dos referidos fins. Ela não visa diretamente à satisfação de uma necessidade coletiva, mas cumpre uma função instrumental de grande importância, sendo seu regular desenvolvimento condição indispensável para o desempenho de todas as demais atividades. 18 HARADA, Kiyoshi. Direito Financeiro e Tributário. 15 ed. São Paulo: Atlas S/A, 2006, p. 31 19 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Administrativo. 2º ed. São Paulo: Saraiva, 2002. 20 BALTHAZAR, Ubaldo Cesar. Manual de direito tributário. Florianópolis: Diploma Legal, 1999. 17 Desse modo, detém a atividade financeira caráter eminentemente instrumental, já que lhe compete propiciar ao Estado as condições para implementação e o desenvolvimento de todas as demais ações inerentes à satisfação das necessidades públicas. 1.3 RECEITA PÚBLICA E TRIBUTO 1.3.1 Receita Pública É a entrada definitiva nos cofres públicos de dinheiro e bens. É importante diferenciar receita pública de “entrada pública” ou ainda “ingresso público”. A primeira trata-se de entradas de recursos que se incorporam no patrimônio público, sendo irrestituíveis; já a segunda, trata-se de entradas que não se incorporam ao patrimônio público, são restituíveis, como fianças, cauções, empréstimos públicos, etc. As receitas públicas se subdividem em: receitas originárias e derivadas. Quanto ao assunto, Moraes preconiza, baseado no pensamento de escritores alemães, austríacos e italianos, que as receitas públicas podem ser classificadas em: originárias – quando advindas da exploração do patrimônio estatal ou do exercício direto de uma dada atividade econômica pelo Estado; ou 2) derivadas – quando exigidas do patrimônio ou das rendas particulares, mediante imposição coercitiva, como por exemplo, por meio de multas e tributos. 21 Entende-se então que receitas originárias são aquelas que provêm do próprio patrimônio do Estado, tais como renda de imóveis, aluguéis, venda de bens e serviços que decorrem de atividade de empresas estatais; e as receitas derivadas são as entradas públicas que decorrem do patrimônio de particulares e incorporam-se ao patrimônio do Estado. 21 MORAES, Guilherme Pena de. Direito Constitucional – Teoria do Estado. 2º ed. Rio de Janeiro: Lumem Júris Editora, 2006, p. 54 18 As receitas derivadas classificam-se em: tributárias (impostos, taxas, contribuições de melhoria, empréstimo compulsório, contribuições parafiscais) e outras receitas (reparações de guerra, indenizações, multa). 1.3.2 Tributo Segundo Lazarin: (...)a palavra “tributo” se originou do verbo latino tribuere, significando, primitivamente, repartir por tribos, e, posteriormente, entre os cidadãos ou os indivíduos que compõem o Estado, os custos com a realização de suas finalidades, concepção de caráter financeiro essa que não se alterou, em sua substância, com o passar dos tempos. 22 Assim o tributo, em senso comum, é a prestação em dinheiro que o Estado, no exercício do seu poder, exige dos cidadãos, com o objetivo de obter recursos para o cumprimento de seus fins, como por exemplo, saúde, educação Assinala Amaro: “Tributo é a prestação pecuniária não sancionatória de ato ilícito, instituído em lei e devida ao Estado ou a entidades não estatais de fins de interesse público.” 23 Continua: Juridicamente define-se tributo como obrigação jurídica pecuniária, ex lege, que se não constitui em sanção de ato ilícito, cujo sujeito ativo é uma pessoa publica (ou delegado por lei desta), e cujo sujeito passivo é alguém nessa situação posto pela vontade da lei, obedecidos os desígnios constitucionais (explícitos e implícitos).24 A Lei nº 5.172/66 (batizada de “Código Tributário Nacional” pelo Ato complementar n. 36/67), que com o advento da Constituição de 1967 assumiu a eficácia de lei complementar, define tributo nos seguintes termos: “tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa 22 LAZARIN, Antonio. Introdução ao Direito Tributário. 3 ed. São Paulo: Atlas, 1992, p. 74 23 AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro, p. 06 24 AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro, p. 06 19 exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada”. 1.4 ELEMENTOS CARACTERIZADORES DO TRIBUTO Da definição legal prevista no artigo 3º do Código Tributário Nacional, são extraídos todos os elementos caracterizadores do tributo: a) caráter compulsório da prestação: não há nenhuma manifestação de vontade por parte daquele que se reveste da condição de obrigado à prestação tributária. Uma vez verificada a ocorrência do fato gerador da obrigação tributária, independentemente da vontade do contribuinte e como mera conseqüência fática e direta de seus atos, surge automaticamente a obrigação de ele efetuar a prestação pecuniária. b) prestação pecuniária em moeda: a prestação deve ser efetuada mediante a entrega de dinheiro ao Fisco. Com isso, afasta-se a possibilidade de serem originalmente exigidas dos contribuintes prestações tributárias sob forma de entrega de bens ou mercadorias (prestações in natura) ou de trabalho ou serviços (prestação in labore). O fato de a obrigação tributária poder ser eventualmente extinta por meio do instituto jurídico da dação em pagamento não tem o condão de caracterizar a prestação tributária como in natura. Afinal, trata-se apenas de uma alternativa legal dada ao contribuinte para quitar ou extinguir sua obrigação, caso não consiga fazê-lo por meio de entrega de dinheiro ao Erário Público (inciso XI do artigo 156 do CTN, introduzido pela Lei Complementar nº 104, de 10/01/01). Não há lei tributária que institua, de início, uma obrigação cuja prestação seja a dação ou entrega de bens e mercadorias ao Fisco. c) a natureza não sancionatória de ilicitude: a obrigação tributária não se confunde com sanção ou penalidade, de maneira que as hipóteses legais que legitimam seu surgimento são apenas atos lícitos (ex: auferir renda, circular mercadorias, prestar serviços, realizar operações financeiras, pagar salários, etc.). 20 d) instituição em lei: a relação jurídico-tributária tem como única fonte a lei em sentido formal, ato normativo proveniente do Poder Legislativo (princípio da legalidade). É uma obrigação ditada por lei (ex lege). e) cobrança mediante atividade administrativa plenamente vinculada: ao agente público, representante do Fisco, não cabe nenhum julgamento de conveniência ou oportunidade no lançamento do tributo. Verificada por ele a ocorrência do fato gerador da obrigação tributária, o tributo deve ser necessariamente cobrado mediante atividade administrativa de lançamento, sob pena de responsabilidade funcional. A respeito da assertiva da prestação pecuniária ser compulsória, visível é que nada se diferencia das outras obrigações, já que o devedor da relação não tributária também tem obrigação de exercê-la pois o credor desta também tem o direito de cobrá-la coercitivamente. 1.5 NATUREZA JURÍDICA ESPECÍFICA DO TRIBUTO A natureza jurídica específica do tributo é determinada pelo fato gerador da obrigação, conforme preceitua o art. 4º do CTN: Art. 4º A natureza jurídica específica do tributo é determinada pelo fato gerador da respectiva obrigação, sendo irrelevantes para qualificá-la: I - a denominação e demais características formais adotadas pela lei; II - a destinação legal do produto da sua arrecadação Adverte Carvalho: (...) é preciso que examinemos, antes de mais nada, por imposição hierárquica, a base de cálculo, a fim de que a natureza particular do gravame se apresente na complexidade de seu esquematismo formal, pois tomada a regra do art. 4º caput do CTN, como bem chegou a concluir esse mesmo jurista “não encontraríamos método para diferençar impostos de impostos e desses as taxas, entregandonos, imbeles, aos desacertos assíduos do político.25 25 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário, p. 25 21 Pondera Tavares que: Sob o foco de uma interpretação conforme a constituição, força convir que o tipo tributário, no Brasil, é definido pelo binômio hipótese de incidência [fato gerador in abstracto] + base de cálculo. Em outros termos, é preciso que haja uma íntima relação de causalidade entre a hipótese de incidência e a base de calculo de um tributo, sob pena de desvirtuamento de sua própria hipótese de incidência, isto é, sob pena de se tornar incobrável, justamente devido a falta de coerência interna como a norma jurídica o que instituiu.” 26 Ainda o mesmo autor instrui quanto a dúplice função da base de cálculo: “(i) além de quantificar a prestação do sujeito passivo, (ii) viabiliza, juntamente com a hipótese de incidência, identificar a natureza jurídica do tributo” 27 Conclui-se que a identificação específica do tributo é dada pela associação da hipótese de incidência + base de cálculo. Os incisos I e II do art. 4º do CTN ainda identificam que não importa a denominação dada ao tributo, tão pouco sua destinação. Sobre o tema, Misabel Derzi, em nota à obra de Aliomar Baleeiro, declara: A constituição de 1988, pela primeira vez, cria tributos finalisticamente afetados, que são as contribuições e os empréstimos compulsórios, dando à destinação que lhes é própria relevância, não apenas do ponto de vista do Direito Financeiro ou Administrativo, mas, igualmente, do Direito Constitucional (Tributário).28 Portanto, é pertinente dizer que com relação às contribuições especiais e os empréstimos compulsórios a eficácia do art. 4º, inciso II, está comprometida, já que os tributos citados têm sua natureza jurídica vinculada à destinação de sua receita. 26 TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de Direito Tributário. 4º ed. São Paulo: Saraiva, 2009. 27 BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 11. ed. atualizada por Misabel Abreu Machado Derzi. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 885 28 BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 11. ed. atualizada por Misabel Abreu Machado Derzi. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 885 22 1.6 OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA Obrigação, como tantas outras expressões usadas no discurso jurídico, prescritivo ou descritivo, experimenta mais de uma acepção. Segundo Amaro, obrigação, no Direito das Obrigações é: “a relação jurídica, ou o liame entre credor e devedor, que tem por objeto uma prestação de dar, fazer ou não fazer.29 Conforme ensina Diniz, “obrigação corresponde ao vinculo que liga um sujeito ao cumprimento de dever imposto por normas morais, religiosas, sociais ou jurídicas.” 30 Ensina Tavares que (...) a palavra obrigação aparece como um elo entre duas ou mais pessoas. Fruto imediato de uma “relação jurídica” representa o vínculo abstrato, segundo qual, por força de uma imputação normativa, uma pessoa denominada sujeito ativo, passa a se investir do direito subjetivo de exigir de outra, denominada sujeito passivo, o cumprimento de determinada prestação.31 A obrigação é o poder jurídico pelo qual uma pessoa (sujeito ativo), com base na lei ou no contrato (causa), pode exigir de outra, ou de um grupo de pessoas (sujeito passivo), o cumprimento de uma prestação possível, lícita, determinável e possuindo expressão econômica (objeto). Partindo desse juízo, a obrigação do Direito Tributário não possui conceituação diferente da que lhe é conferida no direito obrigacional comum, apenas se particulariza por seu objeto ser sempre de natureza tributária (um dar, fazer ou não fazer de conteúdo pertinente a tributo). Para Machado, obrigação tributária é “a relação jurídica em virtude da qual o particular (sujeito passivo) tem o dever de prestar dinheiro ao Estado (sujeito ativo), ou de fazer, não fazer ou tolerar algo no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos, e o Estado tem o Direito de constituir contra particular um crédito.” 32 29 AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro, p. 15 30 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil. 2°Vol., 9ª ed. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 27. 31 TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de Direito Tributário. p. 93 32 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 9º ed. São Paulo: Malheiros, 1994, p. 88 23 Extrai-se desse conceito também os elementos integrantes da obrigação tributária que são em numero de três: sujeito ativo, sujeito passivo e objeto. É valido ressaltar ainda que a obrigação tributária emerge diretamente da lei; não surge, como as obrigações estudadas em Direito das Obrigações, diretamente da vontade das partes. Ainda a obrigação tributária é indisponível, já que surge da lei, revestindo-se de obrigatoriedade a exigência do cumprimento de sua prestação, quando configurados os pressupostos legais. Não cabe ao agente público dispensar ou “suavizar” seu cumprimento, pois é bem indisponível, pertencente ao Estado. Poderá haver disposição sobre seu objeto apenas se existir disposição de lei neste sentido. 1.6.1 Espécies de obrigação tributária A obrigação tributária é principal ou acessória, conforme previsto no art. 113 do Código Tributário Nacional. “A obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador, tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se juntamente com o credito dela decorrente (art. 113 § 1º). A obrigação acessória” decorre da legislação tributária e tem por objeto as prestações, positivas ou negativas, nela previstas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos” (§ 2º) “A obrigação acessória pelo simples fato da sua inobservância converte-se em obrigação principal relativamente à penalidade pecuniária.” (§ 3º) 1.6.1.1 Obrigação tributária principal A relação jurídica mais importante no Direito Tributário, sem dúvida, é a que tem por objeto o pagamento do tributo. Esse vínculo obrigacional surge com a ocorrência do fato gerador, tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se juntamente com o crédito ela decorrente. Ataliba explica “o vínculo obrigacional que corresponde ao conceito de tributo nasce, por força da lei, da ocorrência do fato imponível. Fato 24 imponível conforme o próprio jurista é “um fato concreto, acontecido no universo fenomênico, que configura a descrição hipotética da lei.” 33 Em síntese, obrigação tributária principal é aquela cuja criação depende sempre de lei, tendo como objeto o pagamento do tributo ou penalidade pecuniária. Quando se diz que a obrigação tributária surge com a ocorrência do fato gerador, não está negando a natureza legal da obrigação tributária porque somente a lei, em sentido estrito, pode definir da situação como hipótese de incidência do tributo (fato gerador) Também a obrigação tributária prevista abstratamente na lei e concretizada com a ocorrência do fato gerador tem a natureza de obrigação ilíquida, já que antes da ocorrência do fato gerador o objeto da prestação não está individualizado, sendo apenas indicado pelo gênero, prestação pecuniária, e esta não é determinada, mas determinável. Somente o lançamento formará a obrigação líquida. Finalmente, o art. 113 § 1º, do CTN prescreve que a obrigação principal extingue-se com o crédito dela decorrente. Vale observar que a obrigação tributária e o crédito tributário nascem em momentos distintos, fato gerador e lançamento. Se o contribuinte paga o tributo ou ocorre uma das causas referidas no art. 156 do CTN, o crédito tributário ficará extinto, provocando igualmente o fenecimento da obrigação tributária. Assim, não existe crédito tributário sem obrigação tributária procedente. Mas pode existir obrigação tributária sem crédito tributário, como no caso em que o fisco decaia do direito de constituir o crédito pelo lançamento (CTN, art. 173). 1.6.1.2 Obrigação acessória A obrigação acessória é aquela decorrente da legislação tributária, sem conteúdo pecuniário, que se traduz em prestações positivas ou negativas no interesse da fiscalização ou da arrecadação de tributos (art. 113, §2°, 33 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de Incidência Tributária. São Paulo: RT, 1991, p. 64-65 25 CTN). Também chamada de instrumental ou formal, é aquela obrigação do sujeito passivo fazer ou não fazer algo em prol do sujeito ativo. As obrigações acessórias objetivam dar meios à fiscalização tributária para que se investigue e controle o recolhimento de tributos. São exemplos, a emissão de notas fiscais, a declaração de imposto de renda, os livros fiscais etc. Enquanto a obrigação tributária principal só pode decorrer de lei, a obrigação tributária acessória pode ser estabelecida por qualquer das normas que integram a legislação tributária (CTN, art. 96), ou seja, inclui-se dentre elas, leis, os tratados e as convenções internacionais, os decretos e as normas complementares que versem sobre tributo. 1.6.2 Nascimento da obrigação tributária e fato gerador 1.6.1.3 Nascimento da obrigação tributária A obrigação tributária nasce, por força de lei, da ocorrência do fato imponível. Geraldo Ataliba explica que fato imponível “é aquele fato concreto do mundo fenomênico que é qualificado pelo direito como apto a determinar o nascimento da obrigação tributária – fato jurígeno, portanto.” 34 Ataliba conceitua hipótese de incidência como “a descrição hipotética e abstrata de um fato. É a parte da norma tributaria. É o meio pelo qual o legislador institui um tributo. Está criado um tributo, desde que a lei descreva sua hipótese de incidência, a ela associando o mandamento “pague”. 35 Sobre o assunto ensina Tavares: (...) tratando-se de uma obrigação ex lege, como induvidosamente o é, surge uma série de conseqüências ao ente tributante e ao contribuinte. Realmente, praticada a situação definida em lei como necessária e suficiente a sua ocorrência (CTN, art. 114), dá-se o nascimento automático da obrigação tributária, de modo que o sujeito passivo – seu espólio ou massa falida – responderá pelo pagamento do crédito tributário com a totalidade de seus bens e rendas, de qualquer origem ou natureza, inclusive os gravados por ônus real ou 34 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de Incidência Tributária. p. 66 35 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de Incidência Tributária. p. 67 26 clausula de inalienabilidade ou impenhorabilidade, ressalvados unicamente os bens e as rendas que a lei declare absolutamente impenhoráveis (art. 184 do CTN).36 Segundo Machado: (...) a expressão hipótese de incidência designa com maior propriedade a descrição contida na lei, da situação necessária e suficiente ao nascimento da obrigação tributária, enquanto a expressão fato gerador diz da ocorrência, no mundo dos fatos, daquilo que está descrito na lei. A hipótese é simples descrição, é simples previsão, enquanto o fato é concretização da hipótese, é o acontecimento do que fora previsto.” 37 Diante o exposto, conclui-se que o nascimento da obrigação tributária concretiza-se com o fato imponível, fato efetivamente ocorrido, na conformidade da previsão legal, o qual acarreta a incidência do mandamento que, ao determinar que alguém “pague x ao Estado”, cria um laço obrigacional ligando esse alguém ao mesmo. 1.6.1.4 Fato gerador Para que o Estado, através do Fisco, possa sujeitar alguém a pagar tributo é necessária a ocorrência de um fato jurígeno, rigorosamente estabelecido em lei. Como já visto a expressão fato gerador é comumente utilizada pela doutrina, jurisprudência e até mesmo pelo Código Tributário Nacional para fazer alusão à descrição abstrata de um comportamento passível de tributação. Como também visto anteriormente, o Código Tributário Nacional classifica a obrigação tributária em principal e acessória. Por isso esse código foi levado a identificar também duas espécies de fato gerador, consoante o tipo de obrigação de que se trate. Fato gerador da obrigação principal, como teoriza o art. 114 do CTN, é a “situação definida em lei como necessária e suficiente a sua ocorrência” 36 TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de Direito Tributário. p. 95 37 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário, p. 93 27 Já o fato gerador da obrigação acessória é qualquer situação que, na forma da legislação aplicável, impõe a pratica ou abstenção de ato que não configure obrigação principal, conforme dispõe o art. 115 do CTN. Em síntese, fato gerador da obrigação tributária é fato que gera o tributo, sendo que este mesmo fato deve conter todos os elementos descritos pela lei, enquadrando-se no tipo tributário. E, fato gerador da obrigação acessória é a situação prevista em lei que não diz respeito à obrigação de pagar tributo ou penalidade, como é o fato gerador da obrigação principal. 1.6.3 Objeto da obrigação principal e acessória Extrai-se dos ensinamentos de Tavares que: (...) o objeto de toda e qualquer norma jurídica, por excelência, é o comportamento humano. A finalidade última de uma norma jurídico tributária, via de regra, é a obtenção da respectiva receita, é a entrega de dinheiro aos cofres públicos, a título de tributo. Essa prestação, sabemos todos, dá-se mediante um comportamento humano.” 38 Diferente também não é o entendimento de Borges, que sustenta: “tributo é, portanto, para o CTN, um determinado e especifico comportamento humano consistente na prestação de moeda, ou de algo conversível em moeda”39. Ainda na mesma linha de raciocínio, Borges explicita: “Tributo é conduta humana. Esta conduta é conceituada por uma endorma que estabelece o dever de alguém dar ao Estado certa soma de dinheiro sempre que se verifique o fato descrito na endorma”. 40 Portanto compreende-se com os ensinamentos e a interpretação do artigo 113, §1º do C.T.N, que o objeto da obrigação tributária principal se traduz no comportamento do sujeito passivo de entregar pecúnia ao Fisco, a título de tributo ou penalidade pecuniária, exercendo uma obrigação de dar. Conforme Tavares: 38 TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de Direito Tributário. 39 BORGES, José Souto Maior. Lançamento Tributário. São Paulo: Malheiro, 2ª ed., 1999, p. 40. 40 BORGES, José Souto Maior. Lançamento Tributário. p. 40. 28 (...) por exclusão, nos termos do § 2º do art. 113 do CTN, temos que o objeto da obrigação tributária acessória é todo e qualquer comportamento humano, reclamado pela respectiva legislação tributária, despido de cunho patrimonial, isto é, não condizente com a entrega de dinheiro aos cofres públicos. Circunscreve-se, por conseguinte, a prestações positivas ou negativas de interesse da arrecadação ou fiscalização (obrigação de fazer, não fazer ou tolerar). 41 Por fim, percebe que são três os modos da conduta humana que podem constituir objeto da prestação: dar, fazer, ou não fazer.”. Obrigação de dar objeto da obrigação principal, e, obrigação de fazer ou não fazer, objeto da obrigação acessória. 1.6.4 Sujeito ativo Sujeito ativo da obrigação tributária é, pois, o ente político investido de competência e de capacidade tributária, isto é, qualificado para instituir os tributos discriminados na Constituição de 1988, bem como apto para cobrá-los dos respectivos sujeitos passivos. A interpretação deste dispositivo ocupa duas correntes doutrinárias divergentes. De um lado, alguns autores alegam que somente as pessoas jurídicas de direito público dotadas de poder legislativo podem ser sujeito ativo de uma obrigação tributária, como Machado, quando diz que: Não há de se confundir a condição de sujeito ativo com a de destinatário do produto da arrecadação ou fiscalização de tributos, ou da execução de leis, serviços, atos ou decisões administrativas em matéria tributária. Essas atribuições podem ser conferidas por uma pessoa jurídica de direito público a outra, mas isto não implica transferência de condição de sujeito ativo. (...) Às pessoas jurídicas de direito privado apenas podem ser atribuídas as funções ou encargos de arrecadar, o que não constitui delegação de competência (CTN, art. 7°).42 Caso fosse interpretado o disposto no artigo 119 do CTN conforme esse entendimento haveria uma restrição que levaria, por conseqüência, como ilegais as cobranças de qualquer contribuição fundamentada, por exemplo, no 41 TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de Direito Tributário. 42 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário, p. 93 29 artigo 149 da Constituição de 1988, ou seja, todas as contribuições de natureza parafiscal e também nos casos de sujeição ativa auxiliar. Do outro lado, outros autores alegam que para ser sujeito ativo da relação tributária, independe do sujeito titularizar o exercício da competência tributária ou não. É o que entende Jardim quando diz que o sujeito ativo “é a pessoa incumbida do direito subjetivo de promover a cobrança do tributo. Embora no mais das vezes o sujeito ativo seja a própria pessoa constitucional titular da competência tributária, nem sempre esta ocupa o pólo ativo da obrigação.” 43 Carvalho reforça dizendo que “O sujeito ativo é o titular do direito subjetivo de exigir a prestação pecuniária e, no direito brasileiro, pode ser uma pessoa jurídica, pública ou privada, se bem que não vejamos empecilho técnico de que seja uma pessoa física.” 44 O ingresso no sistema, de que é tratado, tem relação a mandamentos constitucionais que permitem a transferência da capacidade ativa, dos que detém a capacidade legislativa, para outro ente público ou privado, físico ou jurídico. A capacidade tributária ativa diferencia-se da competência tributária, pois esta, nas palavras de Carrazza: (...) é a possibilidade de criar, in abstracto, tributos, descrevendo, legislativamente, suas hipóteses de incidência, seus sujeitos ativos, seus sujeitos passivos, suas bases de cálculo e suas alíquotas”, enquanto aquela, é decorrente de prévia autorização legal disposta a outrem de exigir do sujeito passivo o cumprimento de um dever jurídico tributário principal ou acessório.” 45 1.6.5 Sujeito passivo Sujeito passivo da obrigação tributária é o devedor, convencionalmente chamado contribuinte. É a pessoa que fica na contingência legal 43 JARDIM, Eduardo Marcial Ferreira. Dicionário Jurídico Tributário. 03ª ed., São Paulo: Dialética, 2000, p. 188. 44 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário, p. 112 45 CARRAZZA, Roque Antônio, Curso de Direito Constitucional Tributário, 18ª ed., São Paulo: Malheiros, 2003, p. 329. 30 de ter o comportamento objeto da obrigação, em detrimento do próprio patrimônio e em favor do sujeito ativo. É a pessoa que terá diminuição patrimonial, com a arrecadação do tributo. Podem figurar no pólo passivo tanto o contribuinte “que tem relação pessoal e direta com a situação que constitua o fato gerador da obrigação tributária”, ou o responsável tributário, que são todos aqueles que, por disposição legal, são acrescidos à relação Fisco-contribuinte, em caráter solidário. O Código Tributário Nacional tratou de distinguir os sujeitos passivos da obrigação tributária principal e acessória, por intermédio dos seus art. 121 e 122. 1.6.1.5 Sujeição passiva independe da capacidade civil Como assinala Baleeiro: Pouco importa, para a sobrevivência da tributação sobre determinado ato jurídico, a circunstancia de ser ilegal, imoral ou contrario ao bons costumes, ou mesmo criminoso o seu objeto, como o jogo proibido, a prostituição, o lenocínio, a corrupção, a usura, o curandeirismo, o cambio negro etc. 46 O inciso I do art. 126 do CTN dispõe que a capacidade tributária passiva independe da capacidade civil das pessoas naturais. Nada obsta, portanto, que as pessoas que o CC considera absoluta ou relativamente incapzes (cf. arts. 5º e 6º) figurem como contribuintes do IPTU, ITR ou IPVA. Por sua vez, nos termos do inciso II, não importa que a pessoa natural esteja, em termos civilisticos, privada do exercício de suas atividades ou da administração de seus bens ou negócios, pois sujeitar-se-á à incidência do ISS ou do ICMS. Por último, nos termos do inciso II, não importa que a pessoa natural esteja, em termos civilisticos, privada do exercício de suas atividades ou da administração de seus bens ou negócios, pois sujeitar-se-á à incidência do ISS ou do ICMS. Por último, nos termos do inciso III, as pessoas jurídicas irregularmente constituídas (v. g., as sociedades de fato) estão investidas de capacidade tributária passiva, sujeitando-se, portanto, às regras de incidência tributária própria das respectivas atividades econômicas. 46 BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 716 31 No tocante a capacidade civil do sujeito passivo (pessoa física ou jurídica) de uma relação tributária, Diniz de Santi diz que: A sujeição passiva independe da capacidade civil ou da formal constituição do sujeito passivo no direito comercial. Para o pólo passivo, conforme prescreve o Código Tributário Nacional em seu art. 126, requer-se apenas a personalidade jurídica para ocupar ‘o topos’ de sujeito passivo. É desta disposição do Código Tributário Nacional que decorre a necessidade da técnica da responsabilidade tributária como sistematizada pela Lei 5.172/66, para consecução das medidas judiciais conferidas ao fisco.”47 1.6.1.6 Sujeição passiva e convenções particulares É válido ressaltar que a sujeição passiva tributária não pode ser modificada por um simples contrato, pois, conforme dispõe o art. 123 do CTN: Art. 123 Salvo disposições de lei em contrário, as convenções particulares, relativas à responsabilidade pelo pagamento de tributos, não podem ser opostas à Fazenda Pública, para modificar a definição legal do sujeito passivo das obrigações tributárias correspondentes. Sendo assim, conclui-se que mero contrato de compra e venda não altera o sujeito passivo do tributo, conforme o art. 123 em questão, visto o texto auto explicativo do mesmo. 47 SANTI, Eurico Marcos Diniz de. Lançamento Tributário, 2ª ed., São Paulo: Max Limonad, 2001, p. 170. CAPÍTULO 2 CRÉDITO TRIBUTÁRIO 2.1 SIGNIFICADO DA EXPRESSÃO CRÉDITO TRIBUTÁRIO Sabe-se que para configurar a obrigação tributária, é necessário que a pessoa (física ou jurídica) realize a hipótese de incidência tributária, tratada pelo CTN, como fato gerador. Com a hipótese de incidência configurada dá-se a existência da obrigação tributária, porém o tributo ainda não pode ser exigido ou cobrado, pois o que torna o tributo líquido e exigível é a concretização do lançamento, que transforma de obrigação tributária para crédito tributário. Sobre o assunto esclarece Machado: “Em primeiro lugar a lei descreve a hipótese em que o tributo é devido. É a hipótese de incidência. Concretizada essa hipótese pela ocorrência do fato gerador, surge a obrigação tributária...48 Em face da obrigação tributária o Estado ainda não pode exigir o pagamento do tributo. Também em face das chamadas obrigações acessórias não pode o Estado exigir o comportamento a que está obrigado o particular. Pode sim, tanto diante de uma obrigação tributária principal como diante de uma obrigação acessória descumprida, valer-se do lançamento, para constituir um crédito tributário a seu favor. Só então poderá exigir o objeto da prestação obrigacional, isto é, o pagamento. O Código Tributário Nacional, no artigo 139, diz que: Art. 139 O crédito tributário decorre da obrigação principal e tem a mesma natureza desta. Isto significa que somente pode existir crédito a partir de uma obrigação tributária principal que o anteceda e o justifique. 48 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 27 ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 189 33 O crédito tributário é representado pelo objeto da obrigação tributária principal (CTN art 113 § 1º), ou pelo descumprimento (inadimplemento) da obrigação tributária acessória (CTN art 113 § 3º), que se converterá em obrigação principal. O crédito tributário é exatamente a obrigação principal após formalmente conhecida e registrada pelo sujeito ativo, tornando-a líquida e exigível, estabelecendo mecanismos para a cobrança. A obrigação tributária principal consiste no pagamento de tributo ou de pena pecuniária. Segundo Harada: “O crédito tributário nada mais é do que a conversão dessa obrigação ilíquida em líquida e certa, exigível no prazo estatuído na legislação tributária.” 49 Este mesmo autor explica sobre a relação entre obrigação tributária e crédito tributário: Surgida a obrigação, deve a Fazenda declarar sua existência, através do lançamento, apurando o quantum e identificando o sujeito passivo, quando então, aquela obrigação passará a existir sob a denominação de credito tributário. disso resulta que pode existir obrigação tributária sem o credito tributário, mas o contrário não poderá ocorrer. 50 Há de se consignar o que prescreve o art. 140 do CTN: “as circunstâncias que modificam o credito tributário, sua extensão ou seus efeitos, ou as garantias ou os privilégios a ele atribuídos, ou que excluem sua exigibilidade não afetam a obrigação tributária que lhe deu origem.” Tavares expõe que: Firma o art. 140 do CTN a inequívoca idéia da autonomia da obrigação tributária, relativamente às circunstâncias modificadoras do crédito tributário nele referidas. Exemplo: caso um lançamento venha a ser declarado nulo por vício formal, anulando-se consequentemente o crédito tributário por ele constituído, a autoridade administrativa poderá refazê-lo, desde que observado o prazo decadencial (CTN, art 173, II) já que a obrigação tributária que lhe serve de fundamento não é afetada.51 49 HARADA, Kiyoshi. Direito Financeiro e Tributário.15 ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 500 50 HARADA, Kiyoshi. Direito Financeiro e Tributário, p. 500 51 TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de Direito Tributário. 4º ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 139 34 Assim, todos os procedimentos adotados para o registro da obrigação não podem, contudo, alterá-la ou desfigurá-la, vez que o direito criado , quando acontece o fato gerador, não se modifica pela ocorrência de créditos, que é, essencialmente, um registro, uma declaração, daquele direito. Conclui-se que “crédito tributário” nada mais é que a quantia devida a título de tributo instituída pelo Estado (sujeito ativo); ou o valor real de imposto que o contribuinte (sujeito passivo) terá que pagar pela incidência do fato gerador (obrigação tributária). 2.2 CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO PELO LANÇAMENTO Embora o crédito tributário se constitua juntamente com a obrigação pela ocorrência do fato gerador, recebe ele graus diversos de transparência e concretude na medida em que seja objeto de lançamento, de decisão administrativa definitiva ou de inscrição nos livros da dívida ativa. Segundo Torres: O crédito tributário passa por diferentes momentos de eficácia: crédito simplesmente constituído (pela ocorrência do fato gerador) torna-se credito exigível (pelo lançamento notificado ou pela decisão administrativa definitiva) e finalmente crédito exeqüível (pela inscrição nos livros da divida ativa) dotado de liquidez e certeza.52 O crédito tributário, enquanto é obrigação tributária, surge ilíquido, não podendo ser voluntariamente pago pelo contribuinte e nem exigido pela Fazenda Pública, dependendo, portanto, de uma liquidação (seja certo quanto à existência e determinado quanto ao objeto). Tal liquidação é feita pelo lançamento. Com o lançamento a obrigação jurídica tributária que já existia, mas era ilíquida e incerta, passa a ser líquida e certa, exigível em data e prazo predeterminado Sobre o assunto leciona Tavares: “A exigência de um tributo demanda a necessária observância de um ato administrativo formalizador desse crédito, denominado lançamento. Em arremate: um tributo somente se torna 52 TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 13 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 273 35 juridicamente exigível quando devidamente lançado pela autoridade administrativa competente.”53 Dispõe o art. 142 do CTN: Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o credito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo o caso, propor a aplicação da penalidade cabível. Seguindo o art. 142 do CTN é claro que a concreção do crédito tributário se dá pelo lançamento. 2.3 LANÇAMENTO: CONCEITO E FUNÇÃO A definição de lançamento está explícita no art. 142 do CTN. Segundo Harada, lançamento é: (...) um procedimento administrativo no sentido de que um agente capaz procede a averiguação da subsunção do fato-concreto à hipótese legal (ocorrência do fato gerador), a valoração dos elementos que integram o fato concreto (base de calculo), a aplicação da alíquota prevista na lei para a apuração do montante do tributo devido, a identificação do sujeito passivo e, sendo o caso, a propositura de penalidade cabível.54 O lançamento é o ato administrativo que torna líquido o crédito tributário. É o ato que consubstância o crédito tributário, declarando formal e solenemente quem é o contribuinte e quanto ele deve à Fazenda Pública. Com base na inteligência do art. 142 do CTN Tavares esclarece: (...) didaticamente podemos defini-lo como um ato jurídico plenamente vinculado e obrigatório, constitutivo do crédito tributário, que compete privativamente à autoridade administrativa realizar, tendente a verificar a ocorrência da hipótese de incidência da obrigação tributaria correspondente, determinar a matéria tributável, calcular ou por outra forma definir o quantum do tributo devido, 53 54 TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de Direito Tributário, p. 138 HARADA, Kiyoshi. Direito Financeiro e Tributário, p. 501 36 identificar o sujeito passivo e, se for o caso, propor a aplicação da 55 penalidade cabível. Já Becker pontifica: O lançamento (“accertamento”) tributário consiste na série de atos psicológicos e materiais e ou jurídicos praticados pelo sujeito passivo (contribuinte), ou pelo sujeito ativo (Estado) da relação jurídica tributária, ou por ambos ou por um terceiro, com a finalidade de, investigando e analisando fatos pretéritos: Constatar a realização da hipótese de incidência e a incidência infalível (automática) da regra jurídica tributária que ocorreu no momento em que aquela sua hipótese de incidência realizou; Captar o fato que realizou o núcleo (base de calculo) daquela hipótese de incidência que já estava predeterminado pela regra jurídica ao indicar a base de calculo do tributo; Proceder a transfiguração daquele núcleo (base de cálculo) em uma cifra aritmética, mediante a aplicação do método de conversão (peso, medida ou valor) já preestabelecido pela regra jurídica; Calcular a quantidade aritmética do tributo, mediante a aplicação da alíquota (que fora prefixado pela regra jurídica) sobre o núcleo da hipótese de incidência (base de calculo) agora já transfigurado numa cifra aritmética” 56 É importante frisar que, inobstante o artigo 142 do CTN referirse que o lançamento trata-se de procedimento administrativo, a corrente doutrinária majoritária trata o lançamento como ato administrativo. É esse o entendimento de Oliveira: “não há dúvida, do ponto de vista jurisprudencial e sobretudo doutrinário, de que lançamento é ato administrativo, e não procedimento.”57 Nessa mesma linha de raciocínio, ensina Carvalho: 55 TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de Direito Tributário, p. 140 56 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário. 3º ed. São Paulo: Lejus, 1998, p. 359 57 OLIVEIRA, Vicente Kleber de Melo. Direito Tributário – Sistema Tributário Nacional – Teoria Prática, Belo Horizonte: Del Rey, p. 354 37 Lançamento é ato jurídico administrativo e não procedimento, como expressamente consigna o art. 142 do Código Tributário Nacional. Consiste, muitas vezes, no resultado de um procedimento, mas com ele se não confunde. O procedimento não é da essência do lançamento, que pode consubstanciar ato isolado, independente de qualquer outro. Diz, quando muito, com o estagio de formação do ato, jamais com seus pressupostos estruturais que estão contidos no próprio ato.58 O Código Tributário Nacional ainda estipula em seu art. 142, parágrafo único, que “o lançamento é uma atividade administrativa vinculada e obrigatória”. Para Tavares: “graças ao seu caráter vinculado e obrigatório, inexiste qualquer margem de discricionariedade administrativa, no que se refere à realização ou não do lançamento. É este pois ato obrigatório de “administração vinculada” ou “administração regrada”. 59 O mesmo autor continua destacando que: Dizer que se trata de um “ato vinculado e obrigatório” implica concebê-lo como um ato necessariamente presidido pelo principio da legalidade e a ser o lançamento se trata de um ato “vinculado e obrigatório” diz-se que este é um ato necessariamente presidido pelo principio da legalidade e a ser praticado nos moldes, forma, conteúdo e critérios fixados pela lei, não cabendo por conseguinte, qualquer margem de discricionariedade à ação da autoridade administrativa para escolher o que lançar ou não lançar, sua forma ou critérios. 60 Quanto à função do lançamento, aponta Tavares: “é ele que opera a efetiva constituição do crédito tributário, tornando-o liquido e certo, logo, juridicamente exigível. Noutro giro verbal, é através do lançamento que se opera a valoração qualitativa e quantitativa do fato jurídico tributário.” 61 Para o lançamento produzir seus efeitos junto ao contribuinte, este necessita ser notificado. Essa notificação do lançamento é o ato administrativo que confere eficácia ao lançamento e deve operar-se na pessoa do contribuinte, admitindo-se que seja feita por carta com aviso de recebimento. 58 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário, p.168 59 TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de Direito Tributário, p. 141 60 TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de Direito Tributário, p. 141 61 TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de Direito Tributário, p. 142 38 É válido anotar ainda que o lançamento só pode ser alterado por impugnação do sujeito passivo (art.145 I do CTN), recurso de ofício (art. 145 II do CTN) ou iniciativa de ofício da autoridade administrativa, nos casos previstos no art. 149 (art. 145 III do CTN). 2.4 NATUREZA JURÍDICA DO LANÇAMENTO A natureza jurídica do lançamento tributário já foi objeto de grandes divergências doutrinárias. Hoje, porém, é praticamente pacífico o entendimento segundo qual o lançamento não cria direito, guardando efeito meramente declaratório. Dispõe Machado: O lançamento, portanto, é constitutivo do crédito tributário, e apenas declaratório da obrigação correspondente. Por isto, salvo disposição em lei em contrário, quando o valor tributável esteja expresso em moeda estrangeira, no lançamento sua conversão em moeda nacional se faz ao cambio da data da ocorrência do fato gerador (CTN art. 143). Também por isto a legislação que a autoridade administrativa tem de aplicar ao fazer o lançamento é aquela que estava em vigor na data da ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, ainda que posteriormente modificada ou revogada (CTN art. 144). 62 No mesmo sentido entende Seixas Filho: o lançamento tributário como um documento representativo de uma realidade é um ato de declaração de verdade, um ato jurídico causal, porquanto está vinculado a declarar a verdade do fato gerador ocorrido. Além de declarar uma verdade, o lançamento tributário produz inovação no mundo jurídico, como é liquidação do valor do tributo com a utilização de critérios jurídicos próprios. (...) Enfim, o lançamento visa a dar certeza jurídica e liquidez ao valor do tributo demarcando a data do seu vencimento e/ou da sua exigibilidade.63 Importante ressaltar, ainda, que o lançamento produz efeitos “ex tunc”, isto é, seus efeitos retroagem à data da ocorrência do fato imponível e rege-se pela lei vigente na época do fato imponível, mesmo que a lei tenha sido modificada, revogada ou que a nova seja mais benéfica (art. 144 do CTN). 62 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário, p. 192 63 SEIXAS FILHO, Aurélio Pitanga. Princípios fundamentais do direito administrativo tributário – a função fiscal. 2º ed. 4tir. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 131 39 2.5 MODALIDADES DE LANÇAMENTO Existem três modalidades de lançamento: de ofício, por declaração e por homologação. Tal classificação leva em conta o grau de participação do fisco e do contribuinte para sua efetivação. 2.5.1. Lançamento de ofício O lançamento de ofício, também denominado lançamento direto, é aquele realizado pela autoridade administrativa sem a participação do contribuinte, e está previsto no art. 149 do CTN, o qual elenca todas as hipóteses em que o Fisco, sem nenhuma participação do sujeito passivo, pode realizá-lo. Art. 149. O lançamento é efetuado e revisto de ofício pela autoridade administrativa nos seguintes casos: I - quando a lei assim o determine; II - quando a declaração não seja prestada, por quem de direito, no prazo e na forma da legislação tributária; III - quando a pessoa legalmente obrigada, embora tenha prestado declaração nos termos do inciso anterior, deixe de atender, no prazo e na forma da legislação tributária, a pedido de esclarecimento formulado pela autoridade administrativa, recuse-se a prestá-lo ou não o preste satisfatoriamente, a juízo daquela autoridade; IV - quando se comprove falsidade, erro ou omissão quanto a qualquer elemento definido na legislação tributária como sendo de declaração obrigatória; V - quando se comprove omissão ou inexatidão, por parte da pessoa legalmente obrigada, no exercício da atividade a que se refere o artigo seguinte; VI - quando se comprove ação ou omissão do sujeito passivo, ou de terceiro legalmente obrigado, que dê lugar à aplicação de penalidade pecuniária; VII - quando se comprove que o sujeito passivo, ou terceiro em benefício daquele, agiu com dolo, fraude ou simulação; VIII - quando deva ser apreciado fato não conhecido ou não provado por ocasião do lançamento anterior; 40 IX - quando se comprove que, no lançamento anterior, ocorreu fraude ou falta funcional da autoridade que o efetuou, ou omissão, pela mesma autoridade, de ato ou formalidade especial. Parágrafo único. A revisão do lançamento só pode ser iniciada enquanto não extinto o direito da Fazenda Pública. Nessa modalidade o Fisco procede o lançamento unilateralmente, como ensina Harada: “Nessa modalidade de lançamento, o fisco age por conta própria, diretamente, verificando a ocorrência do fato gerador, determinando a matéria tributável, calculando o montante do imposto devido, identificando o sujeito passivo e promovendo sua notificação.” 64 Em poucas palavras lançamento de ofício é aquele feito exclusivamente pelo Fisco, sendo o contribuinte apenas notificado do crédito tributário a saldar. Um exemplo prático dessa modalidade é o IPTU. Torres adverte: A autoridade administrativa efetua o lançamento de oficio ou procede à revisão do lançamento, também de oficio, quando assim o determinar a lei ou quando ocorrer uma das hipóteses previstas no art. 149 do CTN. O lançamento e a revisão ex officio em geral se fazem através da lavratura do auto de infração. A iniciativa da autoridade administrativa constitui uma exceção ao princípio da irrevisibilidade do lançamento e apenas se justifica quando o contribuinte age com má fé, dolo ou simulação.” 65 O princípio da irrevisibilidade impõe que o lançamento notificado ao contribuinte torna-se insuscetível de revisão pela administração, exceto se ocorrer: I impugnação do sujeito passivo; II recurso de ofício; III iniciativa de ofício da autoridade administrativa, nos casos previstos no art. 149. (art. 149 do CTN) 2.5.2 Lançamento por declaração Diz-se lançamento misto ou por declaração quando realizado pelo Fisco em concurso com o contribuinte, encontrando-se previsto no art. 147 do CTN, o qual prevê: “Será ele misto ou por declaração quando efetuado com base na declaração do sujeito passivo ou de terceiro, isto é, quando um ou outro, na forma da legislação tributária, presta à autoridade administrativa informações sobre matéria de fato indispensável a sua efetivação”. 64 HARADA, Kiyoshi. Direito Financeiro e Tributário, p. 502 65 TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário, p. 281 41 Torres esclarece: O exemplo típico do lançamento por declaração era o imposto de renda, em que o contribuinte declarava os rendimentos obtidos no ano-base e procedia aos cálculos das deduções e abatimentos, para que o Fisco efetuasse posteriormente a notificação do lançamento. Hoje a sistemática está alterada, por influencia do direito americano, e o contribuinte, no mesmo ato em que presta as declarações, considera-se notificado de que deverá recolher o tributo, com o que o sistema do lançamento por declaração se mescla, em parte, com o do autolançamento.66 É importante salientar também o disposto no art. 147, §§ 1º e 2º, do CTN o qual prevê: § 1º A retificação da declaração por iniciativa do próprio declarante, quando vise a reduzir ou a excluir tributo, só é admissível mediante comprovação do erro em que se funde, e antes de notificado o lançamento. § 2º Os erros contidos na declaração e apuráveis pelo seu exame serão retificados de ofício pela autoridade administrativa a que competir a revisão daquela. 2.5.3 Lançamento por homologação Sobre este tipo de lançamento, dispõe o art. 150 do CTN: Art. 150 O lançamento por homologação, que ocorre quanto aos tributos cuja legislação atribui ao sujeito passivo, o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa, operando-se pelo ato em que a referida autoridade tomando conhecimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologa. Tavares explica o dispositivo: Em outros termos, no lançamento por homologação, a que doutrina e jurisprudência convencionaram chamar de autolançamento, o sujeito passivo, após simples operação intelectual de conformação de sua conduta à respectiva hipótese de incidência tributária, apura o quantum debeatur, e efetua o prévio pagamento do tributo, cabendo à autoridade administrativa, a posteriori, proceder à verificação da regularidade dessa operação mental implementada, quer para homologá-la, se reputar que está correta, quer para lançar de ofício eventuais diferenças apuradas.” 67 66 TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário, cit., 280 67 TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de Direito Tributário, p. 145 42 Quanto à denominação autolançamento, Harada dispõe contrário à jurisprudência e doutrina majoritária: “Alguns autores referem-se a autolançamento, expressão que convém ser evitada, porque o lançamento, por definição legal, é um procedimento administrativo (art. 142 CTN). Incompatível, portanto, com a idéia de que um particular possa ultimar o lançamento.” 68. Sinteticamente, no lançamento por homologação o sujeito passivo antecipa o pagamento do tributo sem o prévio exame do Fisco. Harada também dispõe quanto à praticidade de se efetuar o lançamento por homologação: Em razão da redução do custo de arrecadação, existe uma tendência de utilização maior dessa modalidade de lançamento, pelas três esferas impositivas. Razões de ordem prática, como nos casos de impostos indiretos e instantâneos em que o lançamento direto a cada concreção do fato típico se torna inviável ou impraticável, também, levaram à adoção da modalidade de lançamento por homologação. São exemplos desse lançamento o IPI, o ICMS, o ISS, o IPVA, as taxas de fiscalização de localização, instalação e funcionamento, as contribuições sociais, etc. 69 Ainda em se tratando de lançamento por homologação, é considerável destacar que o pagamento antecipado pelo sujeito passivo apenas extingue o crédito sob condição resolutória da ulterior homologação do lançamento (art. 150 §1º). Tavares preleciona quanto ao tema: Muito embora seja verdade que o lançamento consista num ato jurídico privativo da autoridade administrativa (CTN, art. 142), não menos verdadeiro é que, no lançamento por homologação, fica a cargo do contribuinte a realização de todos os atos materiais de apuração e determinação do quantum do tributo a ser pago, limitando-se a autoridade administrativa, apenas, à verificação da regularidade desse procedimento e ao final homologá-lo, sendo que tal homologação, na prática, normalmente se dá de forma tácita, conforme facultado no § 4º do art. 150 do CTN.70 O autor comenta que, na prática, é mais comum a ocorrência da homologação tácita (§4º), do que, a homologação expressa por parte do Fisco, 68 HARADA, Kiyoshi. Direito Financeiro e Tributário, p. 503 69 HARADA, Kiyoshi. Direito Financeiro e Tributário, p. 502 70 TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de Direito Tributário, p. 110 43 lembrando que a homologação tácita é aquela em que o Fisco fica inerte, passando o prazo decadencial que é de 05 anos. 2.6 CONSTITUIÇÃO DEFINITIVA DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO A constituição da obrigação tributária se dá com a incidência do fato gerador, ao passo que a constituição do crédito tributário se dá com o lançamento. Quanto à constituição definitiva do crédito tributário, ensina Tavares: Diz-se definitivamente constituído, à luz do art. 174 do CTN, o crédito tributário que, objeto de prévia e regular notificação ao sujeito passivo, não foi impugnado; ou, alvo de competente impugnação, já teve concluído o processo administrativo de controle de sua legalidade.71 Conclui-se assim que, após a notificação do sujeito passivo quanto ao teor do lançamento, e, decorrido o prazo para interposição de recurso, o crédito tributário torna-se definitivamente constituído. 2.7 INDISPONIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO Dispõe o art. 141 do CTN: Art. 141 O crédito tributário regularmente constituído somente se modifica ou extingue, ou tem sua exigibilidade suspensa ou excluída, nos casos previstos nesta Lei, fora dos quais não podem ser dispensadas, sob pena de responsabilidade funcional na forma da lei, a sua efetivação ou as respectivas garantias. Sobre essa questão, pondera Oliveira: Vale dizer, vindo a ocorrer o fato gerador da obrigação tributária principal, tem ela – autoridade administrativa – o dever de praticar os atos necessários à efetivação do lançamento, porquanto sendo uma atividade vinculada e obrigatória não lhe é dada a alternativa de praticá-lo ou não, pela simples vontade subjetiva.72 71 TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de Direito Tributário, p. 165 72 OLIVEIRA, Vicente Kleber de Melo. Direito Tributário – Sistema Tributário Nacional – Teoria Prática, Belo Horizonte: Del Rey, p. 354 44 Nas palavras de Mello: “a indisponibilidade do interesse público significa que sendo interesses qualificados como próprios da coletividade – internos ao setor público – não se encontram à livre disposição de quem quer que seja, por inapropriáveis.” 73 Desse princípio, sobreleva notar que o administrador não pode dispor livremente do crédito tributário, pois não representa seus próprios interesses quando atua, devendo assim agir segundo os estritos limites impostos pela lei, para o bem da coletividade. 2.8 O CRÉDITO TRIBUTÁRIO COMO UM DIREITO-REFLEXO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA Dispõe o artigo 139 do CTN: “O crédito tributário decorre da obrigação principal e tem a mesma natureza desta.” É sábido que o CTN diz do surgimento da obrigação com a ocorrência do fato gerador (art. 113 §1º) e da constituição do crédito através do lançamento (art. 142). Isso porque se refere ao crédito formalizado, certo e líquido, oponível ao sujeito passivo. Neste sentido colhe-se a manifestação de Machado: O CTN distinguiu a obrigação (art. 113) do crédito (art. 139). A obrigação é um primeiro momento na relação tributária. Seu conteúdo ainda não é determinado e o seu sujeito passivo ainda não está formalmente identificado. Por isto mesmo a prestação respectiva ainda não é exigível. Já o crédito tributário é um segundo momento na relação de tributação. No dizer do CTN ele decorre da obrigação principal e tem a mesma natureza desta (art. 139). Surge com o lançamento, que confere à relação tributária liquidez e certeza.74 Cumpre advertir que as circunstâncias que modificam o crédito tributário, sua extensão ou seus efeitos, ou as garantias ou os privilégios a ele atribuídos, ou que excluem sua exigibilidade não afetam a obrigação tributária que lhe deu origem (art. 140 CTN) 73 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito administrativo. 14. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2002, p. 256 74 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário, p. 158 45 Tavares explica: O que está veiculado nas entrevozes desse preceito é que a obrigação tributária corresponde à sua substancia, razão pela qual, enquanto realidade formal, uma circunstância modificadora do crédito não tem o condão de prejudicar a obrigação tributária que lhe dera origem. Firma o art. 140 do CTN, a inequívoca idéia da autonomia da obrigação tributária, relativamente às circunstâncias modificadoras do crédito tributário nele referidas. Exemplo: caso um lançamento venha a ser declarado nulo por vício formal, anulando-se consequentemente o crédito tributário por ele constituído, a autoridade administrativa pode refazê-lo, desde que observado o prazo decadencial (CTN art, 173 III), já que a obrigação tributária que lhe serve de fundamento não é afetada.75 2.9 GARANTIAS E PRIVILÉGIOS DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO 2.9.1 Disposições Gerais Garantia é o direito assegurado ao credor, por lei ou contrato, sobre crédito a receber do devedor. Privilégio significa a preferência dos créditos tributários com relação aos demais créditos. O rol de garantias e privilégios previstas no art. 183 do CTN tem caráter exemplificativo, ou seja, a legislação ordinária poderá criar outras que visem a assegurar o crédito tributário. O Código Tributário Nacional, em seu artigo 184, preceitua uma garantia de suma importância, qual seja, com exceção dos bens declarados impenhoráveis por lei ou bens que gozam dessa característica, todos os outros, inclusive gravados com ônus real ou cláusula de inalienabilidade e impenhorabilidade, respondem pelo pagamento do crédito tributário. Prescreve o art. 184 do CTN: Sem prejuízo dos privilégios especiais sobre determinados bens, que sejam previstos em lei, responde pelo pagamento do crédito tributário a totalidade dos bens e das rendas, de qualquer origem ou natureza, do sujeito passivo, seu espólio ou sua massa falida, inclusive os gravados por ônus real ou cláusula de inalienabilidade ou impenhorabilidade, seja qual for a data da constituição do ônus ou da cláusula, excetuados unicamente os bens e rendas que a lei declare absolutamente impenhoráveis. 75 TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de Direito Tributário, p. 110 46 O art. 649 do CPC traz os bens absolutamente impenhoráveis: a) os bens inalienáveis e os declarados, por ato voluntário, não sujeitos à execução; b) as provisões de alimentos e combustíveis necessários à manutenção do devedor e de sua família durante um mês; c) o anel nupcial e os retratos de família; d) os vencimentos dos magistrados, dos professores e dos funcionários públicos, o soldo e os salários, salvo para pagamento de pensão alimentícia; e) os equipamentos militares; f) os livros, as máquinas, os utensílios e os instrumentos, necessários ou úteis para o exercício de qualquer profissão; g) as pensões, as tenças, ou os montepios, percebidos dos cofres públicos, ou de institutos de previdência, bem como os provenientes de liberdade de terceiros, quando destinados ao sustento do devedor ou da sua família; h) os materiais necessários para obras em andamento, salvo se estas forem penhoradas; i) o seguro de vida. Também é impenhorável o bem de família (Lei 8009/90). Tal garantia, além de mais forte que uma garantia real, é destinada somente ao crédito tributário, não se transmitindo aos demais créditos. A outra garantia prevista no Código Tributário Nacional está elencada no artigo 185 e refere-se à ocorrência de fraude na alienação de bens do devedor. Será considerada fraude quando ocorrer a alienação de bens pelo devedor, após sua convocação para compor o pólo passivo de ação proposta pelo Fisco. Estipula o art. 185 do CTN: “Presume-se fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública, por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa.” A presunção de que trata esse artigo não é absoluta, cedendo espaço e uso o contribuinte-devedor reservar bens ou valores suficientes para o pagamento do crédito tributário, como está expresso em seu parágrafo único: “O disposto neste artigo não se aplica na hipótese de terem sido reservados, pelo devedor, bens ou rendas suficientes ao total pagamento da dívida inscrita.” 47 Outrossim, o art. 2º da LC 118/05 incluiu o art. 185-A no CTN, o qual prevê: Na hipótese de o devedor tributário, devidamente citado, não pagar nem apresentar bens à penhora no prazo legal e não forem encontrados bens penhoráveis, o juiz determinara a indisponibilidade de seis bens e direitos, comunicando a decisão, preferencialmente por meio eletrônico, aos órgãos e entidades que promovem o registros de transferências de bens, especialmente ao registro público de imóveis e às autoridades supervisoras do mercado bancário e do mercado de capitais, a fim de que, no âmbito de suas atribuições façam cumprir a ordem judicial. Trata-se da denominada possibilidade de feitura da penhora on-line. Segundo HARADA, a LC 118/05: (...) acrescentou o art. 185A ao CTN instituindo a figura da indisponibilidade universal dos bens do executado que, devidamente citado, não pagar nem apresentar bens à penhora no prazo legal, nem sendo encontrados bens penhoráveis. Nessa hipótese, a norma sob comento determina que o juiz decrete a indisponibilidade de todos os bens e direitos do devedor, comunicando sua decisão, preferencialmente por meios eletrônicos aos órgãos competentes (Registro de imóveis, supervisores do mercado bancário e do mercado de capitais etc.”76 Tavares intensifica: Em outros termos, à luz do art. 185-A do CTN, com redação dada pela LC 118/05, afigura-se possível o bloqueio de numerário existente em conta corrente do contribuinte executado. Todavia, e as notas peculiares do válido expediente da penhora on-line encontramse plasmadas no art. 185-A do CTN de modo indefectível, a constrição é medida excepcional e deve ser implementada tão somente na hipótese de o devedor, devidamente citado, não pagar nem apresentar bens a penhora e/ou na hipótese de não serem encontrados bens moveis e/ou imóveis penhoráveis. Não bastasse isso, constitui indeclinável nos de índole processual do exeqüente a comprovação do esgotamento, sem sucesso, de todos os meios ordinários a sua disposição para a localização dos bens do devedor suscetíveis de constrição judicial.77 76 HARADA, Kiyoshi. Direito Financeiro e Tributário, p. 452 77 TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de Direito Tributário, p. 186 48 2.9.2 Preferências Segundo Machado: O crédito tributário prefere a qualquer outro, seja qual for a natureza ou o tempo da constituição deste. Somente os créditos decorrentes da legislação do trabalho ou do acidente do trabalho situam-se em melhor posição na escala de preferências (CTN, art. 186). O privilégio do crédito tributário é quase absoluto.78 O crédito tributário, ainda como privilégio, em processo de falência, recuperação judicial, concordata, inventário ou arrolamento, não está sujeito à habilitação de crédito ou concurso de credores, conforme previsto no artigo 187 do Código Tributário Nacional. Assim, o trâmite da ação de execução do crédito tributário não será interrompido pela existência de outros credores que postulem seus direitos do mesmo devedor. Referente ao concurso de preferência, o art. 187, parágrafo único, prevê um concurso somente entre as entidades políticas de direito público, devendo ser respeitada a ordem de preferência estipulada. Com advento da Lei Complementar 118/05, operou-se a devida adaptação das regras do CTN à nova Lei de Falências, de modo que, segundo Tavares: O crédito tributário, no processo falimentar, continua a ter primazia em detrimento dos demais, exceto, diante (i) dos créditos decorrentes da legislação do trabalho ou do acidente do trabalho, (ii) dos créditos extraconcursais, (iii) das importâncias passiveis de restituição, nos termos da lei falimentar, e, (iv) dos créditos com garantia real, no limite do valor do bem gravado, ex vi do parágrafo único, I, do art. 186 do CTN.79 O inciso II do parágrafo único do art. 186 prevê que “a lei poderá estabelecer limites e condições para a preferência dos créditos decorrentes da legislação do trabalho”. A limitação foi dada pela Lei 11.101/05 Lei de Falências, no valor de 150 salários mínimos por trabalhador. Para Bastos: (...) além dos privilégios supradescritos, também compõe seu rol o previsto nos artigos 191, 192 e 193 do Código Tributário 78 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário, p. 252 79 TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de Direito Tributário, p. 187 49 Nacional, o qual preceitua que para se conceder uma Concordata ou para se declarem extintas as obrigações do falido, é necessário a prova de quitação dos débitos tributários, valendo o mesmo raciocínio para os casos de julgamento de partilha ou adjudicação. Por outro lado, veda a celebração de contratos da Administração Pública com particulares ou participação em concorrência pública, se não houver pagamento de tributos.80 Após verificar os conceitos básicos no direito tributário, adentra-se ao tema do presente trabalho. CAPÍTULO 3 PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA 3.1 OS CHAMADOS “EXERCÍCIO DE DIREITO” E “DIREITO POTESTATIVO” Denomina-se “exercício de direito” a exigência, pelo legitimado, da conduta devida pelo obrigado81. O exercício do direito, como um ato cultural, só pode dar-se através da linguagem, seja pela edição da norma individual e concreta que constitui o dever previsto na norma primária, referente ao chamado “direito material”; seja pela edição da norma individual e concreta que constitui o dever previsto na norma secundária, referente a chamada pretensão de direito material. Exemplificando a norma primária limita-se a um protocolo, individual e concreto, como o lançamento, já a norma secundária prevê o direito de invocar o Estado-juiz, como uma petição inicial para que o Judiciário aplique uma sanção coercitiva à aquele que descumpriu a norma primária. O “direito potestativo” por sua vez, restringe-se a faculdade da pessoa de adquirir ou exigir um direito, ou seja, como o Fisco é titular do “direito potestativo” de lançar o tributo; o credor é titular do “direito potestativo” de entrar com uma ação de cobrança, e assim por diante. 80 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Administrativo. 2º ed. São Paulo: Saraiva, 2002. 81 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. 3 ed. São Paulo: Martins Fontes, 1991, p. 140 50 Ao contrário das demais espécies de direitos subjetivos, nos denominados “potestativos”, o obrigado ao invés de prestar, satisfazendo a obrigação, apenas submete-se à vontade do titular do direito. 3.2 CONCEITO DE DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO NO DIREITO TRIBUTÁRIO O decurso do tempo tem influência na aquisição e na extinção dos direitos. Decadência e prescrição são formas concretas que o direito encontrou para conviver com o tempo. Tanto a decadência quanto a prescrição, originam-se do princípio de que “o direito não socorre aos que dormem”. Como leciona De Santi: i) decadência do direito do fisco: a perda da competência administrativa do fisco para constituir o credito tributário, em decorrência do decurso de certo período de tempo sem que o tenha exercitado. ii) prescrição do direito do fisco: a perda do direito do fisco de ingressar com o processo executivo fiscal, em decorrência do decurso de certo período de tempo sem que o tenha exercitado; iii) decadência do direito do contribuinte: a perda da legitimidade do contribuinte de repetir o indébito na esfera administrativa, em decorrência do decurso de certo período de tempo sem que o tenha exercitado; e iv) prescrição do direito do contribuinte: a perda do direito do contribuinte de pleitear o seu débito tributário, indébito na esfera judicial, em decorrência do decurso de certo período de tempo sem que o tenha exercitado.82 Assim, deve-se analisar o instituto da prescrição sob os dois sujeitos da relação: a prescrição do direito do Fisco é a perda de seu direito de propor ação executiva fiscal; para o contribuinte, é a perda do direito de ação para pleitear a repetição do indébito tributário. Leal arrola quatro elementos integrantes do conceito da prescrição: 82 CARVALHO, Aurora Tomazini de. Decadência e prescrição em direito tributário. 2 ed. São Paulo: MP Editora, 2010, p.42 51 1º existência de uma ação exercitável; 2º inércia do titular da ação pelo seu não exercício; 3º continuidade dessa inércia durante um certo lapso de tempo; 4º ausência de algum fato ou ato, a que a lei atribua eficácia impeditiva, suspensiva ou interruptiva do curso prescricional. Tem-se de diferenciar prescrição extintiva e prescrição intercorrente: A prescrição extintiva, segundo Clóvis Beviláqua, “é a perda da ação atribuída a um direito, e de toda a sua capacidade defensiva, em conseqüência do não-uso dela, durante determinado espaço de tempo.” 83 O art. 174 do CTN dispõe que a ação de cobrança do crédito tributário (para o Fisco) prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva. Já quanto a prescrição intercorrente, salienta-se que a legislação pátria já reconhece a existência da referida prescrição intercorrente, no curso da execução fiscal, que pode inclusive ser decretada de ofício pelo magistrado. A Lei 11.051/04 acrescentou o § 4º ao art. 40 da Lei de Execuções Fiscais - Lei nº 6.630/80, o qual prescreve: Art. 40 O Juiz suspenderá o curso da execução, enquanto não for localizado o devedor ou encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora, e, nesses casos, não correrá o prazo de prescrição. § 1º - Suspenso o curso da execução, será aberta vista dos autos ao representante judicial da Fazenda Pública. § 2º - Decorrido o prazo máximo de 1 (um) ano, sem que seja localizado o devedor ou encontrados bens penhoráveis, o Juiz ordenará o arquivamento dos autos. 83 RODRIGUES, S. Direito Civil. 34 ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 324 52 § 3º - Encontrados que sejam, a qualquer tempo, o devedor ou os bens, serão desarquivados os autos para prosseguimento da execução. § 4o Se da decisão que ordenar o arquivamento tiver decorrido o prazo prescricional, o juiz, depois de ouvida a Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato. Logo a prescrição intercorrente ocorre quando já proposto o processo judicial, por inércia ou descaso da parte. A decadência, por sua vez, consubstancia-se na perda de um direito pela falta de seu exercício, num prazo fatal preassinalado pela lei; é irrenunciável e deve ser pronunciada de ofício. A decadência encontra previsão no art. 173 do CTN, que dispõe: Art. 173 O direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após 5 (cinco) anos, contados: I – do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado; II – da data em que se tornar definitiva a decisão que houver anulado, por vício formal, o lançamento anteriormente efetuado. Como se vê, a decadência extingue o direito de lançar, isto é, de constituir o crédito tributário, e não constituído o crédito tributário, as autoridades administrativas estarão impossibilitadas de cobrar o tributo. A decadência, ao contrário da prescrição, faz perecer o próprio direito. É uma extinção derivada de lei ou do contrato que é de interesse público, não se podendo deixar de reconhecê-la. Tavares esclarece: Em outros termos, a decadência fulmina diretamente o direito subjetivo e, consequentemente, a ação que o protege; a prescrição extingue diretamente a ação protetiva do direito subjetivo, isto é, consiste num prazo legal predeterminado para 53 que o titular de um direito subjetivo faça uso de todos os meios necessários à sua defesa. 84 É mister ressaltar também que o prazo de prescrição pode ser interrompido ou suspenso, diferentemente da decadência, que em regra não se interrompe ou suspende. 3.3 NOTAS ACERCA DA HIERARQUIA DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL O Código Tributário Nacional foi instituído pela Lei 5172/66, e foi recepcionado expressamente pelo art. 34 § 5º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição de 1988, que assegurou a aplicabilidade de seus dispositivos, os quais foram mantidos por serem materialmente compatíveis com a nova ordem constitucional. A Constituição de 1988 reservou eficácia ora de lei complementar ora de lei ordinária, para normas tributárias, dependendo das matérias versadas. Seguindo essa linha de raciocínio, ensina Sehn: “Note-se que nem todos os dispositivos do CTN foram recepcionados com eficácia de lei complementar, sendo equivocadas as concepções generalizantes, ainda lamentavelmente presentes em parte da doutrina e jurisprudência.” 85 Partindo dessa premissa, entende-se que os dispositivos recepcionados com eficácia de lei complementar demandam de espécie legislativa hierarquicamente superior. O tema em questão, da hierarquia da lei complementar, como se sabe, é muito controverso, devido à lacuna do constituinte quanto seu regime jurídico. O assunto conta com importantes construções doutrinárias, com destaque para os estudos de Miguel Reale, Pontes de Miranda, Geraldo Ataliba, José Souto Maior, Paulo de Barros Carvalho, Hugo de Brito Machado e, mais recentemente, Maria do Rosário Esteves, Fábio Canazaro, Jeferson Moreira de Carvalho e outros.86 84 TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de Direito Tributário, p. 148 85 SEHN, Solon. Decadência e prescrição em direito tributário. 2 ed. São Paulo: MP Editora, 2010, p. 57 86 SEHN, Solon. Decadência e prescrição em direito tributário. p. 58 54 A análise dos estudos existentes permite a identificação de pelo menos três correntes. A primeira corrente estabelece que existe hierarquia entre lei complementar e lei ordinária, visto que o quórum da lei complementar disposto no art. 69 da CF, é superior, demandando maioria absoluta, enquanto lei ordinária tem o quórum de maioria relativa. Ainda dispõe que o art. 59 da CRFB/88 expõe uma gradação com relação à lei complementar já que esta está logo abaixo da emenda constitucional. Art. 59 O processo legislativo compreende a elaboração de: I – emenda à Constituição; II – leis complementares; III – leis ordinárias; IV – leis delegadas; V – medidas provisórias; VI – decretos legislativos; VII – resoluções. Já a segunda corrente estabelece que não há o que se falar em hierarquia entre as leis complementares e leis ordinárias, visto que ambas retiram seu fundamento do texto constitucional, dispondo ainda que eventuais conflitos seriam apenas aparentes, podendo ser resolvidos a partir do princípios da competência e da reserva legal. Borges, por sua vez, propõe originariamente a terceira corrente: (...) entende que o regime jurídico da lei complementar não comporta tratamento unitário. Ao contrário do sustentado pela maioria da doutrina, uma análise jurídica mais detida revela a existência de dois grupos básicos de leis complementares: o das leis complementares que fundamentam a validade de atos normativos (leis ordinárias, 55 decretos legislativos e convênios) e o das leis complementares que não fundamentam a validade de outros atos normativos. 87 A terceira corrente vislumbra, resumidamente, que existem duas categorias de lei complementar, uma em que é reservado pela Constituição matéria a ser tratada por lei complementar, e, outra, que ainda tratada por lei complementar, versa sobre matérias que não são previstas na Constituição. No primeiro caso, segundo a corrente, há a hierarquia; no segundo não, visto que no primeiro a lei estabelece maior estabilidade a certas matérias, reputadas relevantes pelo constituinte. 3.4 RESERVA DE LEI COMPLEMNTAR EM MATÉRIA DE PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA A Constituição de 1988 reservou à lei complementar, em seu art. 146, III, b, a competência para estabelecer normas gerais em matéria de prescrição e decadência. Art. 146 Cabe à lei complementar: (...) III – estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária especialmente sobre: b) obrigação, tributários; lançamento, crédito, prescrição e decadência A expressão “normas gerais” impossibilita a delimitação do tema, visto o grau de indeterminação semântica da expressão apresentada. Porém alguns autores arriscam o conceito de “normas gerais”. Pontes de Miranda conceitua “seriam normas fundamentais, não exaurientes, limitadas ao estabelecimento de diretrizes e regras gerais.88 Já Ferreira Filho entende que “seriam princípios, bases, diretrizes que hão de presidir todo um subsistema jurídico.” 89 8787 BORGES, José Souto Maior. Lei complementar tributária. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1975, p. 84 88 PONTES DE MIRANDA. Comentários a Constituição de 1967. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1967, p. 166 8989 FERREIRA FILHO. Comentários à Constituição Brasileira de 1988. v. 2, São Paulo: Saraiva, 1992, p. 192 e ss. 56 Para Figuereido: “as normas gerais dirigem-se aos legisladores e intérpretes como normas de sobredireito. Normas que condicionam, no assunto em que a competência existe, a legislação ordinária da pessoa política, tambem competente para legislar sobre a matéria”. 90 Diante os conceitos apresentados, Moreira Neto91, em estudo sobre o tema, sintetizou as principais características das normas gerais: a) estabelecem princípios, diretrizes, linhas mestras e regras jurídicas gerais. b) não podem entrar em pormenores ou detalhes nem, muito menos esgotar o assunto legislado. c) devem ser regras nacionais, uniformemente aplicáveis a todos os entes públicos. d) devem ser regras uniformes para todas as situações homogêneas. e) só cabem quando preencham lacunas constitucionais ou disponham sobre áreas de conflito. f) devem referir-se a questões fundamentais g) são limitadas, no sentido de não poderem violar a autonomia dos Estados h) não são normas de aplicação direta. Para Carrazza: (...) a lei complementar em exame só poderá veicular normas gerais em matéria de legislação tributária, as quais ou disporão sobre conflitos de competência, em matéria tributária, ou regularão as limitações constitucionais ao poder de tributar. (...) Tal conclusão, posto não deflua naturalmente da mera leitura do invocado art. 146, é a única possível se levarmos em conta, em sua exegese, dentro outros, os precitados princípios federativos, da autonomia municipal e da autonomia distrital 92 90 FIGUEIREDO, Lucia Valle. Competências administrativas dos Estados e Municípios. Revista de Direito Administrativo, n. 207, p. 7 91 MOREIRA NETO, Diego Figueiredo. Competência concorrente limitada. Revista de Informação Legislativa do Senado Federal, n. 100, p.150 92 SEHN, Solon. Decadência e prescrição em direito tributário. p. 71 57 Conclui-se então, que pode o legislador, invocando o artigo 146 III do CTN, definir um tributo e suas espécies, alterar o fato gerador, a base de cálculo e os contribuintes de determinado imposto e, ainda dispor sobre obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributária, desde que seja na condição de satisfazer conflitos de competência ou limitações constitucionais ao poder de tributar. 3.5 INADIMISSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO DE PRAZOS DECADENCIAIS PRESCRITOS NO ART. 150, § 4º E NO ART. 173, I, DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL Uma das grandes controvérsias atuais na seara do direito tributário é o que diz respeito ao prazo decadencial nos denominados tributos de lançamentos por homologação (ato do particular). A discussão reside na aplicação do § 4º do artigo 150, de forma isolada ou cumulada com o inciso I, do artigo 173, todos do C.T.N (Lei 5.172/66). Firma-se a seguinte premissa basilar: No lançamento por homologação aplica-se o disposto no art. 150, §4, do CTN, isoladamente? Dispõe o artigo 150, §4º, do CTN: Art. 150. O lançamento por homologação, que ocorre quanto aos tributos cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa, opera-se pelo ato em que a referida autoridade, tomando conhecimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologa. § 4º Se a lei não fixar prazo a homologação, será ele de cinco anos, a contar da ocorrência do fato gerador; expirado esse prazo sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação. Já o art. 173, I, do CTN, preconiza que: Art. 173. O direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após 5 (cinco) anos, contados: I - do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado; Este dispositivo trata do prazo decadencial aplicável aos tributos cujo lançamento se dá por ofício, isto é, aqueles que são integralmente 58 trabalhados pela Administração, não ocorrendo a participação do sujeito passivo na fase de lançamento. Parece suficientemente claro que o prazo disposto no § 4º do artigo 150 CTN, tem como fim precípuo conferir e contemplar a segurança jurídica às relações tributárias. Dessa forma, verificado concretamente no mundo fenomênico o “fato gerador”, segue-se que o Fisco terá, a partir de tal evento, o prazo de cinco anos para exercitar toda a atividade consistente na apuração do ato praticado pelo particular: homologar – expressa ou tacitamente, ou impor lançamento de ofício. É, portanto, dentro desse prazo legal para homologação que deve o Fisco praticar os atos tendentes à fiscalização, análise e eventual lançamento de ofício, caso encontre irregularidade no ato do particular (lançamento por homologação). Porém, tem quem afirme e já foi decidido pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) a dilação exagerada de prazo resultante da aplicação do inciso I do artigo 173 do CTN, cumulativamente com o seu art. 150 § 4º, prazo em que se fixava a decadência em 10 anos Contudo, as recentes decisões do Superior Tribunal de Justiça demonstram a mudança de entendimento dessa Corte, passando a inadmitir a cumulação dos prazos. “TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. INCIDENTES SOBRE VALORES RECEBIDOS PELOS EMPREGADOS A TITULO DE PARTICIPAÇÃO NOS LUCROSDA EMPRESA. ACORDAO FUNDADO EM ANALISE DE MATERIA DE NATUREZA CONSTITUCIONAL. IMPROBIDADE DA VIA ELEITA, TRIBUTO SUJEITA A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. NÃO OCORRENCIA DO PAGAMENTO ANTECIPADO. DECADENCIA. PRAZO QUINQUENAL. TERMO INICIAL. ART. 173, I, CTN. PRIMEIRO DIA DO EXERCICIO FINANCEIRO SEGUINTE A OCORRRENCIA DO FATO GERADOR. (...) 2. Em se tratando de tributo sujeito a lançamento por homologação,no caso em que não ocorre o pagamento antecipado pelo contribuinte, o poder-dever do Fisco de efetuar o lançamento de ofício substitutivo deve obedecer ao prazo decadencial estipulado pelo artigo 173, I, do CTN, segundo o qual o direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após 5 (cinco) anos 59 contados do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado. 3. Deveras, é assente na doutrina: "a aplicação concorrente dos artigos 150, § 4º e 173, o que conduz a adicionar o prazo do artigo 173 - cinco anos a contar do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido praticado - com o prazo do artigo 150, § 4º - que define o prazo em que o lançamento poderia ter sido praticado como de cinco anos contados da data da ocorrência do fato gerador. Desta adição resulta que o dies a quo do prazo do artigo 173 é, nesta interpretação, o primeiro dia do exercício seguinte ao do dies ad quem do prazo do artigo 150, § 4º. A solução é deplorável do ponto de vista dos direitos do cidadão porque mais que duplica o prazo decadencial de cinco anos, arraigado na tradição jurídica brasileira como o limite tolerável da insegurança jurídica. Ela é também juridicamente insustentável, pois as normas dos artigos 150, § 4º e 173 não são de aplicação cumulativa ou concorrente, antes são reciprocamente excludentes, tendo em vista a diversidade dos pressupostos da respectiva aplicação:o art. 150, § 4º aplica-se exclusivamente aos tributos 'cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa'; o art. 173, ao revés, aplica-se aos tributos em que o lançamento, em princípio, antecede o pagamento. (...) A ilogicidade da tese jurisprudencial no sentido da aplicação concorrente dos artigos 150, § 4º e 173 resulta ainda evidente da circunstância de o § 4º do art. 150 determinar que considera-se 'definitivamente extinto o crédito' no término do prazo de cinco anos contados da ocorrência do fato gerador. Qual seria pois o sentido de acrescer a este prazo um novo prazo de decadência do direito de lançar quando o lançamento já não poderá ser efetuado em razão de já se encontrar 'definitivamente extinto o crédito'? Verificada a morte do crédito no final do primeiro quinquênio, só por milagre poderia ocorrer sua ressurreição no segundo." (Alberto Xavier, Do Lançamento. Teoria Geral do Ato, do Procedimento e do Processo Tributário, Ed. Forense, Rio de Janeiro, 1998, 2ª Edição, págs. 92 a 94). 4. Desta sorte, como o lançamento direto (artigo 149, do CTN) poderia ter sido efetivado desde a ocorrência do fato gerador, é do primeiro dia do exercício financeiro seguinte ao nascimento da obrigação tributária que se conta o prazo decadencial para a constituição do crédito tributário, na hipótese, entre outras, da não ocorrência do pagamento antecipado de tributo sujeito a lançamento por homologação, independentemente da data extintiva do direito potestativo do o Estado rever e homologar o ato de formalização do crédito tributário efetuado pelo contribuinte. 5. In casu, a NFLD foi lavrada em 23.04.1999, referente a fatos geradores ocorridos no período de 1991 a 1994. Desta forma, revelase inequívoca a impertinência de reforma do aresto que reconhecera a decadência quanto aos fatos geradores ocorridos entre 1991 e 1993. 60 6. Recurso Especial parcialmente conhecido, e, nesta parte, desprovido.” 93 Assim, tratando-se de tributo sujeito a lançamento por homologação, o prazo decadencial é de cinco anos contados do acontecimento tributário (art. 150, § 4º); sendo o caso de tributo sujeito a lançamento de oficio, temse igualmente, prazo qüinqüenal, iniciando-se porém, no primeiro dia do exercício seguinte ao que o lançamento poderia ter sido efetuado (art. 173, I). 3.6 PRAZO DECADENCIAL NA HIPÓTESE DE DOLO, FRAUDE OU SIMULAÇÃO Diante de muitas situações de falta de recolhimento de tributos submetidos ao regime de lançamento por homologação que abrigam dolo, fraude ou simulação, o disposto no art. 150 § 4º não se aplica em tais casos, visto a ressalva veiculada na parte final do dispositivo em tela: “salvo, comprovada a ocorrência de dolo fraude ou simulação”. Diante disso, pergunta-se, se o prazo decadencial de cinco anos contados da data da ocorrência do fato gerador (art. 150 §4) não aplica-se ao disposto, qual o prazo devido para tal caso? Carvalho estabelece seu entendimento “Para nós, diante da lacuna causada pela omissão do legislador ordinário em disciplinar esse prazo, entendemos que a regra a ser aplicada é a do art. 173,I, CTN, isto é, havendo dolo, fraude ou simulação, adequadamente comprovados pelo fisco, o tempo de que dispõe para efetuar o lançamento de ofício é de cinco anos a contar do primeiro dia do exercício seguinte aquele em que poderia ter praticado o lançamento.” 94 Com isso, é evidente que a circunstância que desencadeou o não pagamento do tributo devido é relevante para fins de determinar os prazos de decadência de cada situação. 93 REsp 639376/RS, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 04.05.2006, DJ 18.05.2006. p.182 94 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 13 ed. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 149 e ss. 61 Assim, conclui-se mais uma vez que, havendo falta de recolhimento de tributo sem dolo, fraude ou simulação, o prazo decadencial continua sendo de cinco anos contados da ocorrência do fato gerador, previsto no art. 150 § 4. Já se a falta de recolhimento originou-se de dolo, fraude ou simulação, o prazo decadencial será de cinco anos contados do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ser sido feito, como prescreve o art. 173, I do CTN. Sendo assim, as modalidades de lançamento são decisivas para fins de determinação e contagem do prazo decadencial. Lançar de ofício ou declaração são modos enunciativos de norma individual e concreta tributária próprios do poder público, seguindo a regra decadencial estabelecida no art. 173, I, já o art. 150, §4, aplica-se aos tributos sujeitos a lançamento por homologação, desde que não ocorrendo dolo, fraude ou simulação devidamente comprovados no recolhimento do tributo, caso em que é aplicável o art. 173, I, do CTN. 3.7 A PRESCRIÇÃO DO DIREITO DA FAZENDA PÚBLICA O art. 174 do CTN prevê a prescrição da ação de cobrança do crédito tributário, a qual, se não exercitada tempestivamente, leva à sua extinção. Art. 174 A ação para cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva. Parágrafo único. A prescrição se interrompe: I – pelo despacho do juiz que ordenar a citação em execução fiscal; II – pelo protesto judicial; III – por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor; IV – por qualquer ato inequívoco ainda que extrajudicial, que importe em reconhecimento do débito pelo devedor. A questão inicial reside em saber o que é constituição definitiva do crédito tributário. Deve-se entender a data da constituição definitiva do crédito tributário, como aquela em que o lançamento tornou-se definitivo, isto é, insuscetível de modificação pelos órgãos incubidos de fazê-lo. 62 Um lançamento será definitivo quando for efetivado e não mais puder ser objeto de recurso por parte do sujeito passivo ou de revisão por parte da Administração. A quem diga que o crédito é constituído com a sua inscrição, em dívida ativa, teoria esta, insubsistente, uma vez que a data de início da contagem da prescrição do crédito tributário não pode ficar à mercê da Administração, pois esta poderia intencionalmente, postergar a inscrição, delongando, assim, a fixação do dies a quo do prazo prescricional. Coêlho95, assim, entende “Imagine-se ainda que, esta postergue a sua inscrição, delongando, assim, a fixação do dies a quo do prazo prescricional. A inscrição em dívida ativa poderia ser utilizada maleficamente.” A tese a adotar é simples. Não pode ficar ao arbítrio da Administração decidir o dies a quo do prazo prescricional que a prejudica. Desta forma, entende-se como a data da constituição definitiva do crédito aquela do lançamento, desde que já insuscetível de recurso ou revisão. O mesmo autor continua explicando: “o ato de inscrição do crédito tributário decorrente do lançamento insere-se em outra dimensão, o da formalização do título executivo extrajudicial da Fazenda Pública, sem o qual não é possível manejar a ação de execução fiscal.” 96 Quanto à desconstituição do crédito, pode ser: administrativa (no momento do autocontrole), à hora da formalização do título executivo ou, judicial (em decorrência do controle jurisdicional, mediante a apreciação dos juízes). Diferentemente da decadência, a prescrição pode ser interrompida e suspensa, podendo inclusive ocorrer a chamada prescrição intercorrente, a qual ocorre quando já iniciado o processo judicial, por inércia ou descaso da parte (perda do direito de ação já posta em juízo). 95 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Decadência e prescrição em direito tributário. p. 229 96 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Decadência e prescrição em direito tributário. p. 229 63 Quanto as causas de interrupção do CTN é válido se efetuar uma breve consideração: O inciso I, do art. 174, foi alterado pela LC 118/05: antes, era a citação pessoal do devedor que interrompia a prescrição tributária, porém, com o advento da LC 118/05 basta o despacho do juiz que ordena a citação na execução fiscal para o prazo ser interrompido. Coelho explica: “O Código, nesse ponto, se pôs de acordo com a LEF, que já possuía disposição nesse sentido, mas que não era aplicável, uma vez que a prescrição e decadência em matéria tributária são matérias reservadas a lei complementar.” 97 Avançando na análise do art. 174, o inciso IV enseja consideração, pois quando os contribuintes confessam a dívida fiscal para requerem moratórias/parcelamentos, estão interrompendo a prescrição? Diante da questão afirma Coelho: Comumente se diz: a obrigação legal torna-se moral. Se o devedor paga, não pode demandar a restituição do que pagou, embora prescrita a ação. Esta era para obrigá-lo a pagar, dobrando a sua vontade se recalcitrante, substituindo-a pela do juiz, a determinar o pagamento ou a entrega da coisa. A decadência elimina o direito material. Nesse caso pode-se repetir o indébito, diferentemente a prescrição, que só extingue a ação, sem afetar o direito material. São lugares comuns e, em direito privado até admissíveis. Ocorre que no direito tributário pátrio, a teor do CTN, tanto a decadência quanto a prescrição extinguem o crédito tributário.98 Quem paga dívida fiscal em relação a qual já estava a ação prescrita tem direito à restituição. O STJ assim já decidiu: “PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. IPTU. PRESCRIÇÃO. EXTINÇÃO DO DIREITO DE AÇÃO E DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. ART. 970 DO CÓDIGO CIVIL – LEI 3.071, 97 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Decadência e prescrição em direito tributário. p. 230 98 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Decadência e prescrição em direito tributário. p. 232 64 DE 1º DE JANEIRO DE 1916. INAPLICABILIDADE. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. 1. De acordo com o disposto no art. 156, V, do Código Tributário Nacional, a prescrição extingue o próprio crédito tributário, e não apenas o direito de ação. 2. "Quem paga dívida fiscal em relação à qual já estava a ação prescrita tem direito à restituição, sem mais nem menos." (COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. "Curso de Direito Tributário Brasileiro", 9ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 837) 3. A questão relativa à violação dos arts. 108, 109 e 110, do Código Tributário Nacional, não foi abordada pelo acórdão recorrido, tampouco foram opostos embargos de declaração para suprir tal omissão. Ausente, assim, o requisito indispensável do prequestionamento, a teor das Súmulas 282/STF e 356/STF. 4. Recurso especial desprovido.” 99 PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. IPTU. ARTIGOS 156, INCISO V, E 165, INCISO I, DO CTN. INTERPRETAÇÃO CONJUNTA. PAGAMENTO DE DÉBITO PRESCRITO. RESTITUIÇÃO DEVIDA. 1. A partir de uma interpretação conjunta dos artigos 156, inciso V, (que considera a prescrição como uma das formas de extinção do crédito tributário) e 165, inciso I, (que trata a respeito da restituição de tributo) do CTN, há o direito do contribuinte à repetição do indébito, uma vez que o montante pago foi em razão de um crédito tributário prescrito, ou seja, inexistente. Precedentes: (REsp 1004747/RJ, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 18/06/2008; REsp 636.495/RS, Rel. Min. Denise Arruda, DJ 02/08/2007) 2. Recurso especial provido.” 100 PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. IPTU. PRESCRIÇÃO DOS CRÉDITOS TRIBUTÁRIOS ANTERIORMENTE AO AJUIZAMENTO DA AÇÃO FISCAL. DECRETAÇÃO DE OFÍCIO DA PRESCRIÇÃO. LEGALIDADE. INEXIGIBILIDADE DA CDA. POSSIBILIDADE DE INDEFERIMENTO DA INICIAL. [...] 2. Há que se atentar para o fato de que a prescrição, na seara tributária, estampa certa singularidade, qual seja, a de que dá azo não apenas à extinção da ação, mas do próprio crédito tributário, nos 99 REsp 636.495/RS, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 26.06.2007, DJ 02.08.2007 p. 334 100 REsp 1004747/RJ, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 18/06/2008; REsp 636.495/RS, Rel. Min. Denise Arruda, DJ 02/08/2007 65 moldes do preconizado pelo art. 156, V, do CTN. Tanto é assim que, partindo-se de uma interpretação conjunta dos arts. 156, V, do CTN, que situa a prescrição como causa de extinção do crédito tributário, e 165, I, do mesmo diploma legal, ressoa inequívoco o direito do contribuinte à repetição do indébito, o qual consubstancia-se no montante pago a título de crédito fiscal inexistente, posto fulminado pela prescrição.” 101 Além das causas interruptivas da prescrição, tem-se as causas suspensivas previstas no art. 151 do CTN: a) Moratória: é a prorrogação do prazo inicial para pagamento do tributo – art. 151,I, exige lei ordinária. b) Depósito integral do montante tributado: para que seja causa suspensiva deve ser depositado o valor integral cobrado pela Fazenda Pública. Se o contribuinte perder, nada será cobrado, já que a conta judicial faz atualização e se ganhar o dinheiro será devolvido com correção monetária. O depósito é uma faculdade para o contribuinte não um dever. c) Interposição de recurso administrativo: só será causa suspensiva se o recurso tiver efeito suspensivo, sendo assim, a Fazenda Pública não poderá ajuizar a Execução Fiscal, enquanto não decidido o recurso. O contribuinte não precisa esgotar as vias administrativas para ir ao Judiciário (é uma faculdade). d) Concessão de liminar: a tutela antecipada pode ser considerada como uma liminar - é também uma antecipação de tutela. A concessão de uma medida liminar, não vincula o juiz, pois este pode caçá-la a qualquer momento e, por fim, denegar a segurança. 101 REsp 1004747/RJ, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 18/06/2008 66 A liminar pode ser restabelecida pelo tribunal ad quem; pelo relator se distribuída a ação ou pelo Presidente do Tribunal antes da distribuição. 3.8 A PRESCRIÇÃO DO DIREITO DE AÇÃO DO CONTRIBUINTE PARA COMPENSAÇÃO/REPETIÇÃO DO INDÉBITO RELATIVO A TRIBUTOS SUJEITOS A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. AS ALTERAÇÕES TRAZIDAS PELA LC 118/05 O art. 165 do CTN prevê que o sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial de tributo indevidamente pago, seja qual for a modalidade de seu pagamento. O prazo prescricional de se ingressar com pedido de restituição de tributo indevidamente pago extingue-se em cinco anos, começando a correr da data em que se extingue definitivamente o crédito tributário. (art. 168, do CTN) O art. 156 do Código Tributário Nacional dispõe: Art. 156 Extinguem o crédito tributário: I - o pagamento; (...) VII - o pagamento antecipado e a homologação do lançamento nos termos do disposto no artigo 150 e seus §§ 1º e 4º; Desta forma, quanto a tributos lançados de ofício, não há o que se discutir, visto que o art. 156, I, do CTN dispõe que o pagamento extinguirá o crédito tributário, e a partir do mesmo que começa a correr o prazo para a propositura da ação de repetição de indébito. Porém o que se pretende analisar é, em se tratando de tributo lançado por homologação qual o momento que se extingue definitivamente o crédito tributário? Dispõe o art. 3º da LC 118/05 Art. 3º Para efeito de interpretação do inciso I do art. 168 da Lei nº 5.172 de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional, a extinção do crédito tributário ocorre, no caso de tributo sujeito a lançamento por homologação, no momento do pagamento antecipado de que trata o § 1º do art. 150 da referida lei. 67 Para entender o disposto, faz-se de extrema importância conhecer outros dispositivos citados no bojo do artigo, quais sejam: Art. 168 - O direito de pleitear a restituição extingue-se com o decurso do prazo de 5 (cinco) anos, contados: I - nas hipóteses dos incisos I e II do artigo 165, da data da extinção do crédito tributário; Art. 165 - O sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo, seja qual for a modalidade do seu pagamento, ressalvado o disposto no § 4 do artigo 162, nos seguintes casos: I - cobrança ou pagamento espontâneo de tributo indevido ou maior que o devido em face da legislação tributária aplicável, ou da natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador efetivamente ocorrido; II - erro na edificação do sujeito passivo, na determinação da alíquota aplicável, no cálculo do montante do débito ou na elaboração ou conferência de qualquer documento relativo ao pagamento. O que dispõe o art. 3º da Lei 118/05 é que no caso do lançamento por homologação, conta-se, para fins de prescrição, a data em que o contribuinte realizou o pagamento antecipado do tributo. Porém, esse não era o entendimento da doutrina e da jurisprudência, uma vez que sustentam o que segue: “Nos tributos sujeitos ao lançamento por homologação (98% dos tributos hoje em dia), a extinção do crédito tributário dar-se-á com o pagamento antecipado e a homologação, nos termos do art. 156 VII do CTN”.102 Seguindo a mesma linha de raciocínio que o prazo prescricional inicia-se com a extinção do crédito tributário, nos casos de tributos sujeitos a lançamento por homologação, não se pode dizer que o pagamento extingue o crédito em tela, uma vez que o artigo 156, VII, do CTN, expressamente prevê que o pagamento antecipado + a homologação do lançamento pelo Fisco extingue o crédito tributário. Desta forma, o prazo prescricional para o contribuinte requerer a repetição de indébito começava a contar da data em que o Fisco homologava o pagamento do contribuinte. 102 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Decadência e prescrição em direito tributário. p. 241 68 Há de se lembrar que o Fisco pode homologar o pagamento do contribuinte, tácita ou expressamente, prazo de cinco anos, contado da ocorrência do fato gerador. Se assim, entendermos, o prazo prescricional para reaver o valor pago a maior pelo contribuinte, pode ser de até 10 anos, visto que depende da homologação do Fisco. Já decidiu o STJ: “TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. COMPENSAÇÃO. PIS. PRESCRIÇÃO/DECADÊNCIA. INÍCIO DO PRAZO. PRECEDENTES. 1. Está uniforme na 1ª Seção do STJ que, no caso de lançamento tributário por homologação e havendo silêncio do Fisco, o prazo decadencial só se inicia após decorridos 5 (cinco) anos da ocorrência do fato gerador, acrescidos de mais um qüinqüênio, a partir da homologação tácita do lançamento. Estando o tributo em tela sujeito a lançamento por homologação, aplicam-se a decadência e a prescrição nos moldes acima delineados. 2. Não há que se falar em prazo prescricional a contar da declaração de inconstitucionalidade pelo STF ou da Resolução do Senado. A pretensão foi formulada no prazo concebido pela jurisprudência desta Casa Julgadora como admissível, visto que a ação não está alcançada pela prescrição, nem o direito pela decadência. Aplica-se, assim, o prazo prescricional nos moldes em que pacificado pelo STJ, id est, a corrente dos cinco mais cinco. 3. A ação foi ajuizada em 28/02/2002. Valores recolhidos, a título de PIS, no período de 01/89 a 01/95. Não transcorreu, entre o prazo do recolhimento (contado a partir de 02/1992) e o do ingresso da ação em juízo, o prazo de 10 (dez) anos. Inexiste prescrição sem que tenha havido homologação expressa da Fazenda, atinente ao prazo de 10 (dez) anos (5 + 5), a partir de cada fato gerador da exação tributária, contados para trás, a partir do ajuizamento da ação. 4. Precedentes desta Corte Superior. 5. Embargos de divergência parcialmente acolhidos para, com base na jurisprudência predominante da Corte, declarar a prescrição, apenas, das parcelas anteriores a 02/1992, concedendo as demais, nos termos do voto.” 103 103 EREsp 529484/PR, Rel. Ministro José Delgado, Primeira Seção, julgado em 10.11.2004, DJ 17.12.2004 p. 401 69 Segue a mesma linha de raciocínio: “EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. RESTITUIÇÃO/COMPENSAÇÃO. TRIBUTO DECLARADO INCONSTITUCIONAL PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. PRESCRIÇÃO. CINCO ANOS DO FATO GERADOR MAIS CINCO ANOS DA HOMOLOGAÇÃO TÁCITA. ENTENDIMENTO DA COLENDA PRIMEIRA SEÇÃO. No entender deste Relator, nas hipóteses de restituição ou compensação de tributos declarados inconstitucionais pelo Excelso Supremo Tribunal Federal, o termo a quo do prazo prescricional é a data do trânsito em julgado da declaração de inconstitucionalidade, em controle concentrado de constitucionalidade, ou a publicação da Resolução do Senado Federal, caso a declaração de inconstitucionalidade tenha-se dado em controle difuso de constitucionalidade (veja-se, a esse respeito, o REsp 534.986/SC, Relator p/acórdão este Magistrado, DJ 15.03.2004, entre outros). A egrégia Primeira Seção deste colendo Superior Tribunal de Justiça, porém, na assentada de 24 de março de 2004, houve por bem afastar, por maioria, a tese acima esposada, para adotar o entendimento segundo o qual, para as hipóteses de devolução de tributos sujeitos à homologação declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, a prescrição do direito de pleitear a restituição se dá após expirado o prazo de cinco anos, contados do fato gerador, acrescido de mais cinco anos, a partir da homologação tácita.104 Contudo, com o advento da LC 118/05, resta incontroversa que nos tributos sujeitos a lançamento por homologação, considera-se o início da contagem do prazo prescricional não mais o prazo da extinção do crédito, qual seja, pagamento + homologação, e sim, a data do pagamento antecipado do tributo. Continua o mesmo autor na argumentação da sua afirmativa: Portanto, face à reserva jurisdicional ditada pela Carta Magna, a interpretação dada pelo art. 3º da LC nº 118 ao art. 168, I, do CTN, deve, necessariamente, ser submetida ao crivo do Poder Judiciário. Contudo, este mesmo Judiciário já decidiu a matéria, após anos e anos de discussões acalonadas, significando que a interpretação dada pela LC nº 118/05 não é acolhida pela ultima instancia capaz de dar o real alcance dos dispositivos de leis federal: STJ.105 Conclui-se que a LC 118/05, mesmo diante de quase 40 anos de vigência do CTN e entendimento consolidado no Poder Judiciário, trouxe uma 104 EREsp 435.835/SC, Rel. p/acórdão Min. José Delgado - cf. Informativo de Jurisprudência do STJ n. 203, de 22 a 26 de março de 2004 105 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Decadência e prescrição em direito tributário. p. 216 70 série de alterações, dentre elas, a inovação da prescrição do direito de ação do contribuinte para repetição do indébito relativo a tributos sujeitos a lançamento por homologação, a qual já é pacífico o entendimento de que o prazo prescricional para esta ação é de cinco anos, contados da data do pagamento antecipado do tributo. 3.9 O POSICIONAMENTO JURISDICIONAL DO STJ E A INVALIDADE DO ART. 4º DA LC Nº 118/05 Não suficiente, a Lei Complementar 118/05 em seu art. 4º segunda parte, determinou a aplicação retroativa do seu artigo 3º, norma que fixou o prazo prescricional para a propositura da ação de repetição do indébito (restituição) nos tributos sujeitos a lançamento por homologação, em cinco anos, contados do pagamento antecipado do referido tributo, como já visto no item anterior. Art. 4o Esta Lei entra em vigor 120 (cento e vinte) dias após sua publicação, observado, quanto ao art. 3o, o disposto no art. 106, inciso I, da Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional. Diante disto, a jurisprudência ficou com sua credibilidade abalada uma vez que se retroagisse a regra, todas as decisões do Poder Judiciário seriam revistas, colocando assim em perigo o princípio da segurança jurídica e o princípio da separação dos poderes. Assim entende a doutrina: O fato de a lei se declarar interpretativa, numa clara intenção de desprezar a pacificação do Poder Judiciário quanto à matéria, não significa que tenha tal natureza ou que deva prevalecer sobre o entendimento do Poder Judiciário, sob pena de ferimento da separação dos poderes. Portanto ainda que o art. 3º da Lei 118/05 tenha conteúdo de lei interpretativa, não pode retroagir sobre uma situação já consolidada, onde o Tribunal responsável pela interpretação de legislação federal já deu seu posicionamento final.106 Isto posto seja pelo princípio da irretroatividade (para os casos de coisa julgada), seja pelos valores fundantes da convivência harmoniosa e independente dos poderes, não há como dar aplicação retroativa ao art. 3º da LC 106 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Decadência e prescrição em direito tributário. p. 243 71 118/05, conforme deseja o art. 4º do mesmo diploma legal, sob pena de enterrar a função jurisdicional e pacificadora do STJ. Neste sentido concluiu Côelho: Portanto, por fim, conclui-se que, neste sentido não vale de forma retroativa a regra do art. 3º, sendo inconstitucional o art. 4º, ambos da LC nº 118/05, pois clara seria a tentativa de usurpar a jurisdição do Poder Judiciário, que já havia decidido o alcance do art. 168, I, do CTN; nem vale para os casos em andamento ou futuros, o mesmo art. 3º, pois não inova a ordem jurídica ou modifica o que o Judiciário já colocou uma “pá de cal”. Se o referido art. 3º é vazio de normatividade e a interpretação que dita não tem prevalência no Judiciário, não pode valor quanto ao passado, presente e futuro.107 Porém, ressalta-se, que não obstante o supra entendido, o STJ já se manifestou expressamente acerca da validade do art. 3º da LC 118/05, por acórdão prolatado pela 1º Seção daquele Sodalício nos autos dos Embargos de Divergência no RESP 327.043/DF. No bojo da decisão, o STJ declarou que é sim aplicável o disposto no art. 3º da LC 118/05, portanto, julgou ilegítima a retroatividade que o art. 4º pretendeu conferir ao referido diploma legal, sendo assim, aplica-se o disposto no artigo 3º da LC 118/05 às ações de repetição/compensação de indébito, ajuizadas após o início da vigência da LC 118/05. Vejamos a decisão: PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO. TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. PIS. COMPENSAÇÃO COM QUAISQUER TRIBUTOS ADMINISTRADOS PELA RECEITA FEDERAL. 1. A Primeira Seção reconsolidou a jurisprudência desta Corte acerca da cognominada tese dos cinco mais cinco para a definição do termo a quo do prazo prescricional das ações de repetição/compensação de valores indevidamente recolhidos a título de tributo sujeito a lançamento por homologação, desde que ajuizadas até 09 de junho de 2005 (EREsp n.º 327.043/DF, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 27/04/2005). 2. Deveras, naquela ocasião restou assente que: "... a Lei Complementar 118, de 09 de fevereiro de 2005, aplica-se, tão 107 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Decadência e prescrição em direito tributário. p. 246 72 somente, aos fatos geradores pretéritos ainda não submetidos ao crivo judicial, pelo que o novo regramento não é retroativo mercê de interpretativo. É que toda lei interpretativa, como toda lei, não pode retroagir. Outrossim, as lições de outrora coadunam-se com as novas conquistas constitucionais, notadamente a segurança jurídica da qual é corolário a vedação à denominada 'surpresa fiscal'. Na lúcida percepção dos doutrinadores, 'em todas essas normas, a Constituição Federal dá uma nota de previsibilidade e de proteção de expectativas legitimamente constituídas e que, por isso mesmo, não podem ser frustradas pelo exercício da atividade estatal.' (Humberto Ávila in Sistema Constitucional Tributário, 2004, pág. 295 a 300)". (Voto-vista proferido por este relator nos autos dos EREsp n.º 327.043/DF) 3. Consequentemente, o prazo prescricional para a repetição ou compensação dos tributos sujeitos a lançamento por homologação, nas demandas ajuizadas até 09 de junho de 2005, começa a fluir decorridos 05 (cinco) anos, contados a partir da ocorrência do fato gerador, acrescidos de mais um qüinqüênio computado desde o termo final do prazo atribuído ao Fisco para verificar o quantum devido a título de tributo. Por fim, conclui-se pela constitucionalidade do art. 3º da LC 118/05, nos termos acima, e pela inconstitucionalidade do artigo 4º da LC 118/05, com fundamentos nos princípios da autonomia, da independência dos poderes, da garantia do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada. Assim, para as ações intentadas anteriormente à citada inovação legislativa, privilegiou-se a interpretação dada pela 1ª Seção sobre a matéria, no sentido de que o prazo para a propositura da ação de repetição de tributos sujeitos a lançamento por homologação é de cinco anos a contar da homologação e para, ações intentadas depois de 09 de julho de 2005, o prazo prescricional é de cinco anos contados do pagamento antecipado do tributo que se deseja restituir. CONSIDERAÇÕES FINAIS A presente Monografia teve como objeto a discussão sobre a prescrição e decadência tributária. O seu objetivo foi o de traçar algumas considerações sobre a aplicabilidade do instituto no direito tributário. Os pontos a serem destacados inicialmente, diz respeito as inovações legais e jurisprudenciais acerca do tema, dentre eles, o prazo decadencial que o Fisco dispõe para lançar o tributo por homologação, questionando-se se é aplicável o marco inicial disposto no art. 150 § 4 do CTN ou o art. 173, I, do CTN, ou a cumulação destes. Concluiu-se ao final que aplica-se ao tributo sujeito a homologação o artigo 150 §4º, iniciando a contagem do prazo a partir do acontecimento do fato gerador, em se tratando do disposto no artigo 173, I, do CTN, aplica-se aos tributos sujeitos a lançamento de ofício, concluindo-se pela não aplicação cumulada dos artigos. Outro ponto também polêmico na seara tributária tratado, foi em relação ao direito do contribuinte de ter restituído valor pago a tributo prescrito, o que, conclui-se no presente trabalho que é possível. Também a LC 118/05 trouxe com o seu advento, mudanças consideráveis à matéria estudada, sendo que em seu art. 3º tratou do prazo prescricional do contribuinte que deseja restituir tributo sujeito a lançamento por homologação, alterando o marco inicial da contagem do prazo, o qual, já é pacífico o entendimento de que o prazo prescricional para esta ação é de cinco anos, contados da data do pagamento antecipado do tributo. Ainda há grande questionamento quanto a validade do artigo 4º da LC 118/05, artigo este que pretendeu propiciar efeito ex tunc ao seu art. 3º, já explanado, para que todas as ações pretéritas fossem adequadas ao disposto da presente lei, porém este artigo foi tido, neste trabalho, como inconstitucional, uma vez que ofende a coisa julgada, autonomia do Judiciário, dentre outros princípios constitucionais e infra constitucionais. Assim, aplica-se o disposto no art. 3º apenas para as ações futuras, não sendo concedido efeito ex tunc a norma, como pretendia a lei. 74 As hipóteses formuladas para a presente pesquisa fundamentam-se nos argumentos supra expostos. Tratando a primeira hipótese sobre a inadimissibilidade da cumulação dos prazos dispostos nos artigos 150 §4º e 173, I, do CTN para o Fisco lançar tributos sujeitos a lançamento por homologação, a qual foi constatada que não é admitido a cumulação. A segunda hipótese, trata da possibilidade do contribuinte restituir valor pago a título de tributo prescrito, o qual concluiu-se pela possibilidade. A terceira hipótese, relacionada ao artigo 3º da LC 118/05 que alterou o marco inicial da contagem do prazo prescricional do contribuinte para este restituir valores pagos indevidamente a título de tributos por homologação, prazo este já pacificado pela jurisprudência, cinco anos contados do pagamento antecipado do tributo. A quarta hipótese, dispõe sobre a inconstitucionalidade do artigo 4º da LC 118/05, o qual foi constatado a sua inconstitucionalidade, entendimento este, já pacificado na doutrina e jurisprudência, porém aguardando julgamento pelo Superior Tribunal Federal. Finalizando, vale destacar que o presente trabalho não tem por pretensão esgotar as pesquisas sobre o tema, pois além de muito amplo, a cada dia vem sendo mais discutido pelos doutrinadores e magistrados. . 75 REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 3º ed. São Paulo: Saraiva, 1999, BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 11. ed. atualizada por Misabel Abreu Machado Derzi. Rio de Janeiro: Forense, 2007 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Administrativo. 2º ed. São Paulo: Saraiva, 2002 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 1972 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário. 3 ed. 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