Redação - Rua Raul Pompéia, 101 - 12.º andar, São
Pedro - CEP 30330-080
Belo Horizonte - MG - Brasil
Telefone: +55 (31) 3280-2105
Fax: +55 (31) 3227-3864
E-mail: [email protected]
Site: http://revista.fapemig.br
Blog: http://fapemig.wordpress.com/
Facebook: http://www.facebook.com/FAPEMIG
Twitter: @fapemig
GOVERNO DO ESTADO
DE MINAS GERAIS
Governador: Antonio Augusto Junho Anastasia
SECRETARIA DE ESTADO DE CIÊNCIA, TECNOLOGIA
E ENSINO SUPERIOR
Secretário: Narcio Rodrigues
Fundação de Amparo à Pesquisa
do Estado de Minas Gerais
Presidente: Mario Neto Borges
Diretor de Ciência, Tecnologia e Inovação: José
Policarpo G. de Abreu
Diretor de Planejamento, Gestão e Finanças: Paulo
Kleber Duarte Pereira
Conselho Curador
Presidente: João Francisco de Abreu
Membros: Antônio Carlos de Barros Martins, Dijon
Moraes Júnior, Evaldo Ferreira Vilela, Giana Marcellini,
José Luiz Resende Pereira, Magno, Antônio Patto
Ramalho, Paulo César Gonçalves de Almeida, Paulo
Sérgio Lacerda Beirão, Rodrigo Corrêa de Oliveira
Sem
Fronteiras
Estar conectado com o mundo é uma necessidade da civilização contemporânea. Os pilares Ciência, Tecnologia e Inovação, de maneira especial, precisam interagir nas diversas nacionalidades, a fim de garantir e, mesmo, acelerar o progresso
científico da humanidade.
Atenta às movimentações globais, a Fundação de Amparo à Ciência do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG) promove a internacionalização da ciência mineira, estabelecendo o intercâmbio de pesquisadores e a pesquisa conjunta. Assim,
potencializa as ações similares desenvolvidas em diferentes países e aproxima a
ciência brasileira dos padrões científicos internacionais.
Na FAPEMIG, as parcerias internacionais cresceram ao longo dos anos e
foram institucionalizadas em 2011, com a criação da Assessoria Científica Internacional, voltada especialmente para gerir as relações internacionais da Instituição.
Esta edição especial procura colocar em primeiro plano os acordos já firmados e aqueles em processo de efetivação, num total de oito países, como no
exemplo a seguir: em 29 de setembro de 2009, por meio da Deliberação nº 43, foi
regulamentada, pelo Conselho Curador da FAPEMIG, a bolsa de iniciação científica internacional, que beneficiou, desde então, estudantes interessados em fazer
intercâmbio científico na Alemanha, por meio da parceria com o Serviço Alemão de
Intercâmbio Científico (Daad). Outra parceira nesse país é a Fundação Alemã de
Pesquisa Científica (DFG).
Na França, os diálogos tiveram início em 2007 e foram oficializados em 2008,
com o Instituto Nacional Francês para Pesquisa em Ciência da Computação e Automação (Inria). Desde então, editais já foram lançados e projetos científicos e tecnológicos de cooperação binacional estão sendo desenvolvidos por meio da parceria.
As aproximações com a Itália se deram com a região de Piemonte, com o
Politecnico di Torino (PoliTO), em que professores da Universidade do Estado de
Minas Gerais (Uemg) têm a oportunidade de fazer Doutorado, e graduandos podem
obter a Dupla Titulação.
No Reino Unido, um acordo de cooperação científica foi firmado com o
Centro de Inovações Csem Brasil e o Imperial College London, um dos principais
centros de referência internacional no estudo e no desenvolvimento da eletrônica
orgânica e impressa.
Outros acordos, não menos importantes, se dão com a Austrália (Universidade de Queensland), o Canadá (Universidade Alberta) e Estados Unidos (Purdue). Ao
mesmo tempo, uma comissão criada pela FAPEMIG tem feito contatos com Israel.
Convidamos o leitor a ler as reportagens e conhecer um pouco mais desses diálogos.
AO LEI TO R
EX P ED I EN T E
MINAS FAZ CIÊNCIA
Assessora de Comunicação Social e Editora Geral:
Ariadne Lima (MG09211/JP)
Editor Executivo: Fabrício Marques
Assessora Editorial: Vanessa Fagundes
Redação: Ariadne Lima, Fabrício Marques, Vanessa
Fagundes, Juliana Saragá, Maurício Guilherme Silva Jr.,
Ana Flávia de Oliveira, Marcus Vinicius dos Santos,
Hely Costa Jr., Kátia Brito (Bolsista de Iniciação Científica).
Diagramação: Beto Paixão
Revisão: Glísia Rejane
Projeto gráfico: Hely Costa Jr.
Editoração: Fazenda Comunicação & Marketing
Montagem e impressão: Lastro Editora
Tiragem: 20.000 exemplares
Capa: Hely Costa Jr.
08
44 A vida dos
Assessoria
internacional
bolsistas lá
Í N D I CE
Em busca de cooperação e
entendimento entre instituições
internacionais e o Estado,
assessoria científica internacional
da FAPEMIG desenvolve estratégias
de aproximação entre países
Histórias de estudantes e
pesquisadores brasileiros
no exterior revelam rotinas
atribuladas, mas, ao mesmo
tempo, coroadas por
conhecimento, amizade e cultura
10
Entrevista
28
Canadá
14
Itália
31
Inglaterra
20
França
34
Israel
38
Alemanha
42
EUA
25
Abrindo as portas para o
mundo: o reitor da UFMG,
Clélio Campolina, aponta as
perspectivas da Ciência brasileira
no campo internacional
Referência mundial, design
praticado na região de Piemonte
liga a riqueza da terra de Dante à
Estrada Real mineira
Projetos de cooperação com
Nord-Pas de Calais estimulam
desenvolvimento em diversas
áreas, como Tecnologia da
Informação, Mineração, Saúde e
Materiais
Austrália
Parceria promove a expansão
da indústria mineral sem causar
danos ao meio ambiente
Estudos são referência na
pesquisa da Mata Seca e
embasam até mesmo decisões
jurídicas
Do Reino Unido, o suporte
teórico para a ciência dos chips
orgânicos impressos feitos em
Belo Horizonte
Sistema de inovação israelense
acrescenta novas perspectivas
para promover a união entre
academia e empresas
Acordos com agências alemãs
proporcionam a pesquisadores
cooperarem em diversas áreas
Trazendo à memória antigos
vínculos de cooperação entre
Minas e Purdue, novo acordo
promete avanços científicos na
área de bioenergia
“A extensão dos conhecimentos científicos para o processamento industrial é o principal foco de
interesse, além do contato com a experiência dos ingleses, que são pioneiros na área de dispositivos
eletrônicos orgânicos”
Giovani Gozzi
Físico
Escola FAPEMIG/Csem Brasil/Imperial/College London (Eficc)
“Esse acordo de cooperação focou especificamente a área de mineração e mostra como pode ser
multiplicado para outras iniciativas. A Austrália também é um país com tradição em atividade mineradora. E Minas Gerais tem recebido um volume expressivo de investimentos do setor”
Virgínia Ciminelli
Coordenadora da parte mineira do acordo com a Universidade de Queensland
Departamento de Engenharia Metalúrgica e de Materiais (Demet-UFMG)
“Quando nos aliamos a instituições que são destaque na área de Ciência e Tecnologia ganhamos em
qualidade. Com isso, criamos oportunidades para os nossos pesquisadores trabalharem com o ‘top’
do mundo”.
Evaldo Ferreira Vilela
Subsecretário
Secretaria de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior de Minas Gerais (Sectes)
“A participação em um projeto internacional, com a Universidade de Alberta, no Canadá, enriquece a
formação dos alunos. Esse intercâmbio também se estende aos pesquisadores. Já recebemos vários
colegas que ministraram palestras ou minicursos para a nossa comunidade acadêmica”.
Mário Marcos do Espírito Santo
Pesquisador, membro da Rede Tropi-Dry
Departamento de Biologia Geral da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes)
“Seria excelente que os estudantes mineiros tivessem Israel como opção de intercâmbio e que, da
mesma forma, as universidades mineiras pudessem receber estudantes israelenses. Nada impede que
possamos fazer os contatos necessários para que as universidades mineiras assinem acordos com as
universidades israelenses”.
Cynthia Rocha
Assessora para Parcerias Nacionais e Internacionais
Sectes
“Com o acordo entre FAPEMIG e DFG, criamos uma base bem definida e segura pelos pesquisadores
que querem estabelecer projetos conjuntos entre Alemanha e Minas Gerais”
Detrich Halm
Diretor
Fundação Alemã de Pesquisa Científica (DFG)
Para receber gratuitamente a revista MINAS FAZ CIÊNCIA, preencha o cadastro no site http://revista.fapemig.br ou
envie seus dados (nome, profissão, instituição/empresa, endereço completo, telefone, fax e e-mail) para o e-mail:
[email protected] ou para o seguinte endereço: FAPEMIG / Revista MINAS FAZ CIÊNCIA - Rua Raul Pompéia, 101
- 12.º andar - Bairro São Pedro - Belo Horizonte/MG - Brasil - CEP 30330-080
MINAS FAZ CIÊNCIA tem por finalidade divulgar a produção científica e
tecnológica do Estado para a sociedade. A reprodução do seu conteúdo é
permitida, desde que citada a fonte.
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
5
FR ASES
“Estar junto ao Politecnico di Torino (PoliTO) é fundamental. O know how e as pesquisas desenvolvidas propiciam uma vivência aprofundada e dinâmica a respeito do meu tema de pesquisa, amplamente investigada e trabalhada por eles. Estar aqui é acima de tudo conhecer, aprender e experimentar”,
Paulo Miranda
Doutorando em Pesquisa em Sistema de Produção e Desenho Industrial
PoliTO
estratégia
De asas bem
abertas
Ações da Assessoria Científica Internacional da FAPEMIG buscam
aproximar instituições mineiras dos mais importantes centros de
pesquisa do planeta
Maurício Guilherme Silva Jr.
Ao pretender internacionalizar-se,
uma organização prepara-se, definitivamente, para se mostrar ao mundo. Com a
instauração de sua Assessoria Científica
Internacional, a Fundação de Amparo à
Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG) incrementa-se com o objetivo de
aproximar os pesquisadores mineiros de
alguns dos mais importantes centros de
produção do conhecimento, sediados nos
quatro cantos do planeta. Até o momento,
a Fundação estabeleceu dez acordos com
8
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
instituições estrangeiras (confira reportagens ao longo da revista).
“Além de facilitar o acesso a prestigiados centros de pesquisa e universidades, buscamos fazer com que a ciência
produzida em Minas Gerais seja conhecida
em diversos países”, ressalta Flávia Perdigão Cerqueira, assessora científica internacional da FAPEMIG. Como fruto de tal
iniciativa, abrem-se importantes canais de
comunicação, estimulados por instituições
idôneas e com tradição em intercâmbio
científico. “Some-se a isso o fato de haver um lado subjetivo no desenvolvimento de um acordo. Afinal, tais negociações
baseiam-se em confiança e compromisso
mútuos”, ressalta Cerqueira.
Em seu projeto de internacionalização,
a FAPEMIG tem buscado acordos com renomados centros de pesquisa e instituições de
ensino superior, a exemplo de Fundação de
Pesquisa Alemã (DFG) e Intercâmbio Acadêmico Brasil-Alemanha (DAAD); Instituto Nacional de Pesquisa em Informática e Automa-
ção (Inria), na França, e das universidades de
Purdue (EUA), Queensland (Austrália), Alberta (Canadá), e Imperial College (Inglaterra).
Namoro científico
Para que as metas de parcerias científicas e/ou de inovação sejam efetivadas entre
instituições de distintos países, é necessário,
por vezes, que se cumpram etapas. Trata-se,
em síntese, do período para identificação recíproca “de terreno”. Num primeiro momento, costuma-se elaborar cartas de intenção.
“Trata-se de documento mais simples. Ao
assiná-los, as instituições revelam que estão se conhecendo”, ressalta a assessora, ao
lembrar que a parceria da FAPEMIG com o
DFG, a Fundação Alemã de Pesquisa Científica, começou exatamente assim, em 2009.
A segunda etapa dos “relacionamentos” entre as organizações tem como caminho natural a assinatura de memorandos de
entendimento, documentos que, geralmente, pregam benefícios mútuos e têm duração
mais prolongada. Neste estágio, a confiança
entre os parceiros já se revela consolidada.
Por fim, como terceiro estágio do processo
de intercâmbio científico e/ou de inovação,
parte-se para a efetivação de um acordo
de cooperação. “Nestes casos, trabalha-se
sem quaisquer vestígios de desconfiança”,
destaca Flávia Cerqueira.
Linhas de ação
A filosofia do processo de internacionalização da FAPEMIG segue, em síntese,
três vertentes de ação, todas desenvolvidas
simultaneamente. Em primeiro lugar, está o
objetivo de desenvolvimento de projetos e
pesquisas conjuntas entre instituições mineiras e estrangeiras. Some-se a tal iniciativa o estímulo ao intercâmbio de estudantes, professores e PHDs e a organização de
eventos – principalmente, workshops –,
em parceria com entidades internacionais.
“As parcerias começam de diversos
modos. Por vezes, somos procurados
por representantes de instituições estrangeiras. Em outras ocasiões, a FAPEMIG
aproxima-se de universidades e centros de
pesquisa com quem o Governo de Minas
Gerais tem conversado”, explica Flávia Cerqueira, ao ressaltar que o importante, para o
início de um relacionamento institucional, é a
vontade dos parceiros e o compromisso que
surgirá a partir de tal proximidade: “Os processos de negociações, contudo, revelam-se
longos. Para que um acordo seja assinado,
são necessários muitos e-mails e encontros.
Afinal, os dois lados buscam iniciativas que
lhes garantam zonas de conforto”.
Daí a importância de a FAPEMIG investir, permanentemente, em editais muitíssimo
bem elaborados, que atraiam pesquisadores
aptos a preencher os requisitos de projetos
que envolvam parceiros internacionais.
A Assessoria
Desde que foi criada, em 2009, a
Assessoria Científica Internacional da FAPEMIG desenvolve uma série de iniciativas simultâneas. A área é responsável por
gerenciar os acordos – assim como por
manter seu histórico –, organizar missões
internacionais e promover o que se pode
chamar de “reconhecimento oficial do terreno”, no caso de parcerias em potencial.
“Precisamos estar sempre atentos. Lidamos, ao mesmo tempo, com prospecção de
oportunidades e realização de eventos. Além
disso, é preciso conhecer as necessidades
dos parceiros”, conta Flávia Cerqueira.
Setores com a responsabilidade de
buscar parcerias internacionais delineiam-se
de acordo com a dimensão e a natureza da
instituição que representam. “Além disso,
as relações internacionais dizem do direito
do outro. Daí a necessidade de pensar, de
modo particular, as principais diferenças
entre duas instituições”, explica Cerqueira, ao ressaltar o caráter generalista da
Assessoria Científica Internacional criada
pela FAPEMIG: “É preciso sempre mudar
de estratégias de acordo com as demandas
e as oportunidades”.
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
9
Entrevista
“Não podemos
fechar as portas
para o mundo”
Em entrevista à
Minas faz Ciência, o
reitor da UFMG, Clélio
Campolina, comenta
os primórdios e as
perspectivas da
produção científica
brasileira no cenário
internacional
Maurício Guilherme Silva Jr.
10
À frente de uma das mais importantes instituições de ensino superior do
País, o professor Clélio Campolina Diniz
conhece muito bem a importância, para
o desenvolvimento da ciência, do cultivo
de projetos e redes de contato nos quatro cantos do mundo. Pós-doutor pela
University of Rudgers, nos Estados Unidos, o atual Reitor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) discute,
nesta entrevista, as dificuldades, trunfos
e desafios rumo ao aprimoramento do
processo de internacionalização da pesquisa brasileira.
Durante os chamados “anos de chumbo”, muitos pesquisadores saíram do
Brasil rumo a universidades estrangeiras. Já nos anos 1980, tais “cérebros”
retornam e garantem novos contornos
à ciência e à educação no País. Esse
seria, realmente, o momento inicial do
processo de “internacionalização” de
nossa pesquisa?
O retorno de tais pesquisadores foi importante, mas não diria que tudo tenha começado apenas nos anos 1980. Já na década
de 1960, muitos pesquisadores começam
a voltar. Exemplo interessante aconteceu
na Universidade Estadual de Campinas, a
Unicamp, que começou a operar em 1966
e teve política muito objetiva no sentido
de atrair os pesquisadores brasileiros
que estavam no exterior. Isso ocorreu,
por exemplo, com os importantes físicos
César Lattes e Rogério Cerqueira Leite. A
rigor, os pesquisadores começam a retor-
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
nar quando aqui são criadas as condições
para o desenvolvimento da pesquisa. Isso
se dá, exatamente, com a montagem da
pós-graduação no País. O Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq) e a Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) foram criados em 1952.
Em sua fase inicial, contudo, investiam
mais na capacitação de professores. A
pós-graduação e a pesquisa brasileiras
são fundamentalmente desenvolvidas a
partir dos anos 1960.
Mas, na década de 1960, também houve a reforma universitária...
A reforma universitária foi autoritária,
mas, ao mesmo tempo, trouxe ares de
progresso. Como exemplo, cito o fim da
cátedra, ação que interpreto como um
grande avanço, já que o catedrático era
o “dono da matéria”, a ponto de nomear quem bem desejasse como assistente. Antes disso, aqui na própria UFMG,
recordo-me que, durante a gestão do
professor Aluísio Pimenta, houve significativo processo de modernização. Os
institutos centrais foram criados, à época, com o intuito de permitir maior complementaridade entre áreas do conhecimento, o que auxiliaria a pesquisa. Até
então, só se investia na formação profissional, em áreas como Direito, Medicina,
Engenharia, Farmácia e Odontologia. A
ciência era vista como mero subsídio a
tal formação. Ao contrário, nos institutos
centrais, buscava-se a pesquisa.
Foto: Foca Lisboa
Investimento em pesquisa e internacionalização, portanto, precisam caminhar juntos?
Sem pesquisa não há internacionalização.
Além disso, não se pode dissociar pesquisa de ensino. Hoje, grande parte dos
estudos está vinculada aos programas de
pós-graduação. Um bom professor, para
avançar no conhecimento científico, não
pode apenas transmitir o conhecimento
disponível. Ele precisa ser capaz de gerar
conhecimento novo. Se, na dissertação,
reproduz-se um conhecimento já disponível; na tese, prevê-se que o trabalho apresente nova contribuição. A pós-graduação
– e, em especial, o doutorado – é o locus
da pesquisa, onde há a conjugação de um
professor e pesquisador experiente com
um aluno já na “fronteira”, capaz de desenvolver temas próprios e inéditos.
Como o senhor analisa, hoje, o processo de internacionalização das universidades brasileiras?
Estou muito à vontade para dizer que sempre batalhei, como integrante do Conselho Científico e Coordenador de Área da
Capes, para a manutenção das bolsas de
alunos brasileiros no exterior. Afinal, houve um momento em que o Brasil enxugou
tal processo. De 1950 a 1980, muitos estudantes foram fazer pós-graduação em
outros países. Já nos anos 1990, à medida em que nossa pós-graduação crescia,
houve a ideia, por parte dos órgãos brasileiros de fomento – principalmente, Capes
e CNPq –, de que era muito caro enviar
alunos para fora do País e, por isso, tal
processo deveria ser reduzido. A meu ver,
isso era um erro que sempre combati. O
País é muito grande, precisa desenvolver
pesquisas internamente, mas sem fechar
as portas ao mundo. Nenhuma nação desenvolvida se fecha. Vejo muitos pesquisadores americanos na Europa e vice-versa.
Quanto aos países asiáticos, nem se fala:
há muitos japoneses e coreanos pelo mundo. A partir dos anos 1990, o Brasil limitou
muito o envio de estudantes ao exterior, investindo, apenas, no doutorado sanduíche,
em que o pesquisador passa um período
fora. É vital, porém, que uma cota de estudantes faça pós-graduação integral no
12
exterior, não só pelo conhecimento gerado,
mas pela experiência de vida, pelo convívio com outras culturas. Assim como para
evitar a endogenia, quando se começa a
criar uma espécie de pensamento único,
por meio de grupos que se realimentam.
Nestes grupos, os padrões culturais e referenciais são os mesmos, o que percebo
como muito negativo.
E a validação de diplomas estrangeiros, no Brasil, seria um problema a ser
superado?
Há dois lados para este problema. O
mais grave é a grande quantidade de diplomas falsos, que não merecem ser reconhecidos. Quando estava no Conselho
Técnico-Científico da Capes, avaliávamos que existiam cerca de 17 mil diplomas de mestrado e doutorado, no Brasil,
que não podiam ser reconhecidos. Por
outro lado, precisamos facilitar o que é
correto, legítimo e não pode ficar parado
em função da longa burocracia. Esse é
um problema das universidades brasileiras. O Brasil precisa acelerar o processo
de reconhecimento dos diplomas legítimos, adequados e corretos. Ao mesmo
tempo, é vital, aumentar a fiscalização.
Aliás, há cerca de cinco anos, a possibilidade de transformar a educação em
serviço de livre comércio foi tema da Organização Mundial do Comércio (OMC).
Isso não pode acontecer. O País precisa
preservar o controle sobre a educação,
pois se trata dos fundamentos culturais
da nação. Não se pode abrir a educação
para o mercado.
Atualmente, o Brasil é mais respeitado pela comunidade científica internacional, em função do maior volume
de patentes, de artigos publicados em
renomados periódicos etc.?
Sim. O Brasil avançou muito e temos, hoje,
uma comunidade científica, nas diversas
áreas do conhecimento, com padrões
internacionais. E olha que, por muitos
motivos, ainda não temos as condições
de trabalho de muitas universidades estrangeiras. As instituições brasileiras são
relativamente novas e é preciso consolidar
e institucionalizar a pesquisa. Além disso,
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
ainda há variações no comportamento governamental. Nesse momento, contudo, vivemos um período favorável. A postura dos
governos federais e estaduais, em relação
às universidades, é muito positiva. Mas já
houve momentos em que não era assim.
Atualmente, nossa qualificada comunidade
científica atrai pesquisadores estrangeiros
para o Brasil e facilita nossa inserção na
comunidade internacional. Estou seguro
de que isto será ampliado.
Para tal ampliação, o que falta ao País?
Enfrentamos várias dificuldades. Em primeiro lugar, embora tenha melhorado nos
últimos anos, o recurso para pesquisa
sempre foi limitado. Além disso, os padrões
salariais para quem deseja dedicar-se à
pesquisa permanecem insuficientes. Isso
leva à cópia de algo complexo no mundo: a mercantilização da academia. Há,
hoje, autorizações formais para que você
desenvolva atividades remuneradas fora
da universidade, por exemplo. Acho importante tal flexibilidade, mas o ideal seria
que o professor não dependesse de rendas
externas. Digo isso para o padrão de vida
normal de um docente, que, no mundo inteiro, é modesto. O ideal é que o pesquisador não precisasse buscar subterfúgios
ou alternativas. Há, ainda, graves deficiências de infraestrutura, como recursos para
laboratórios, instalações físicas etc., que,
mais recentemente, estão sendo sanadas.
A maior de todas as dificuldades, porém,
é institucional. Trata-se das normas legais
que, nas universidades, são as mesmas
para todo o setor público. Há, por exemplo, a lei das licitações, nº 8.666, que diz
que tudo precisa ser licitado, pelo menor
preço. A pesquisa, contudo, precisaria
ter certa autonomia para eleger o que lhe
é prioritário. Seriam necessários critérios
científicos de avaliação, e não mercadológicos. Outro problema diz respeito à
transferência de tecnologia, que enfrenta
dificuldades formais. O Brasil produz muita
ciência, mas pouca tecnologia.
Por que isso ocorre?
Tal realidade relaciona-se ao fato de termos base produtiva internacional. Coreia,
Alemanha, Japão e Estados Unidos são
países que se industrializaram com base
em empresas nacionais. O Brasil, ao contrário, industrializou-se com forte presença
de empresas estrangeiras, que não necessariamente têm interesse em desenvolver
pesquisa no País. Esse é um desafio a
ser enfrentado, para que se consiga fazer
a ponte entre o conhecimento científico e
a sua aplicação prática, seja de mercado,
seja social ou pública. Hoje, os dois grandes desafios para o avanço e a aplicação da
ciência no Brasil resumem-se em melhorar
o aparato jurídico-institucional – que possui muitas proibições e pouca flexibilidade
– e convencer o capital estrangeiro de que
é preciso investir em pesquisa, transformando-a em tecnologia. Em setores nos
quais se pôde concentrar a pesquisa, de
modo a desenvolver iniciativas com base
em empresas nacionais, percebe-se sucesso absoluto.
A que setores, exatamente, o senhor se
refere?
A Petrobras é, hoje, um dos maiores sucessos mundiais na exploração de petróleo em
águas profundas. Tínhamos o monopólio
estatal do petróleo, o que fez com que se concentrasse pesquisa nessa área. A Embraer,
que também era estatal, é uma empresa extremamente bem sucedida do ponto de vista
tecnológico e comercial. Na área agrária, o
Brasil possui tecnologias que são fronteiras
em todo o mundo. Isso porque a especificidade da tecnologia agrícola está muito vinculada às condições climáticas do País. Em
resumo, setores ligados ao petróleo, à aviação e à produção agrícola desenvolveram-se
na ausência do capital estrangeiro. Não sou
xenófobo em relação a tais recursos, mas,
conforme comentei com o Ministro de Ciência e Tecnologia [Aloizio Mercadante], é
preciso criar condições para que o capital estrangeiro invista em pesquisa no Brasil. Nos
Estados Unidos, hoje, boa parte das empresas que pesquisam é estrangeira. Entre Nova
Iorque e Princeton há um corredor nas áreas
de biotecnologia e farmacêutica, com estudos
realizados por centros e escritórios ligados a
grandes corporações europeias.
Com relação à UFMG, hoje uma das
mais importantes universidades brasi-
leiras, quando se dá o início do processo de internacionalização?
Na UFMG, a pesquisa é relativamente recente e remonta, como já ressaltei, a criação dos institutos centrais, nos anos 1960
e 1970. O grande salto de nossa pesquisa,
contudo, dá-se dos anos 1990 para cá,
devido à consolidação da pós-graduação,
ao desenvolvimento de muitos grupos
de pesquisa e ao aumento do número de
alunos de mestrado e doutorado. Importante destacar, ainda, a disponibilidade
de recursos via instituições de pesquisa,
como CNPq, Capes e FAPEMIG. Não sou
filiado a nenhum partido político, mas
diria que o grande apoio ao ensino superior e à pesquisa no Brasil vai se dar no
governo Lula. Com relação à FAPEMIG,
que andou claudicante no final dos anos
1980, o apoio veio a partir do governo
Aécio Neves. Não resta dúvida de que
mudou a cara da Fundação.
Neste sentido, de que modo o senhor
avalia o atual investimento da FAPEMIG em iniciativas de internacionalização?
Acompanho a trajetória da FAPEMIG desde o início. Fui presidente da Câmara de
Ciências Sociais, no final da década de
1980, quando o Newton Cardoso queria
acabar com a Fundação e lhe fizemos
heroica resistência. Nos últimos anos, o
governo apoiou a entidade, que, hoje, tem
uma direção com fundamentação, visão e
bagagem acadêmicas. No que se refere à
internacionalização, percebo as ações
como extremamente louváveis. É
preciso, contudo, internacionalizar
com qualidade. Não adianta buscar o mundo sem cuidar do “andar
de baixo”: há que se tratar muito
bem da qualidade de nossos cursos, de nossa pós-graduação e
de nossa pesquisa. A UFMG, por
exemplo, acaba de oferecer um
curso de mestrado e doutorado em
Angola. Eis o nosso compromisso com
o hemisfério sul do planeta. Precisamos
manter nossa internacionalização “para
cima” e a FAPEMIG possui importante
papel a cumprir nesse sentido.
Segundo o senhor, em depoimento sobre o programa Ciência sem fronteiras,
“a UFMG receberá de 500 a mil bolsas de um total previsto de 25 mil por
ano”. Com números assim, não seria
possível falar em mudança paradigmática da ciência no Brasil?
É verdade que tais investimentos permitem outros modos de pesquisa no País.
Creio, porém, que a ideia de “mudança
paradigmática” seja muito pesada. Já
recebemos uma batelada de bolsas do
CNPq e tentaremos responder da melhor
forma possível. Mas não será simples. O
programa Ciência sem fronteiras está em
fase de implantação, precisa de ajustes,
e daremos toda a contribuição necessária
para tal. Importante lembrar que o programa exige ampla articulação com as instituições estrangeiras. Para distribuir 500
bolsas para intercâmbio, também preciso
selecionar 500 alunos, encontrar universidades que desejam recebê-los e saber
de suas contrapartidas. Em seguida, terei
que receber os alunos de volta e realizar a
adaptação curricular. Sabemos que não é
simples porque, na UFMG, já realizamos
intercâmbio há bastante tempo, por meio
de nossa Diretoria de Relações Internacionais. É preciso internacionalizar com
alta qualidade em todo o processo.
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
13
ITÁLIA
O
l
do ug
a
de r
sig
n
Re
de ferê
pe Tor ncia
sq ino na
uis re
ad ce área
or be , E
es
s
da estu cola
Ue dan Po
mg te lité
s e cn
Fa
brí
ica
cio
Ma
rqu
es
di
ico ão,
n
c
iç
lite
Po institu a Eso
9.
gi a
(Re um ontam 185 us
o
o
m
n
e
ori om Rem a e op e T 06 c gas. ndad s eur Poli ,
d
19 anti s, fu ico tuto ões
ico
écn o em ais heiro litécn l Insti direç peu,
t
i
l
m n
s
d
po ea
ro
Po
to funda s são Enge ndes , o R vária co eu
u
t
i
nst foi gen ara gra XX em tífi
O I ino) s ori ção p dos éculo ação o cien
Tor s sua plica odelo do s u sua und onal.
m
A
ma a de o o m anos plio m o naci
m
o
l
s
d
a
c
co uin eiro im nto ocal e
r
Seg prim e Tu es ta tria l
s
d
s
no nico relaçõ indú
a
c
o
té end om
tec nto c
qua
14
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
“Em um acordo de cooperação entre
instituições de dois países, como o que
acontece entre a Universidade do Estado
de Minas Gerais (Uemg) e o Politecnico
di Torino (PoliTO), todos ganham”, diz
o reitor da Uemg, Dijon Moraes Júnior,
sentado no sofá de sua sala, no oitavo andar do prédio Gerais, na Cidade Administrativa, sede do governo mineiro, na manhã do último dia de setembro. Dijon, que
também é membro do Conselho Curador
da FAPEMIG, prossegue: “Ganha o aluno,
ao adquirir experiência internacional;
ganha a Uemg, que amplia
e efetiva seu programa
de mobilidade estudantil; e ganham a
FAPEMIG e o governo estadual, que cumprem sua missão de promover o ensino e
a pesquisa em Minas Gerais”.
Dezesseis dias antes, em um
fim de tarde extremamente
quente, cinco alunos de
graduação da Escola
o
de Design, selecionados
c u m para
primento do
Acordo de Dupla
Titulação entre Brasil e
Itália, chegavam ao país de
Dante Alighieri e eram apresentados ao PoliTO, com cronograma de
atividades acadêmicas previsto para integralização em dois anos.
O acordo de Dupla Titulação foi assinado pela Uemg e pelo PoliTO em novembro de 2008, como parte do programa
de cooperação do Estado de Minas Gerais
com a Região de Piemonte, na Itália. Pelo
PoliTO, todos os títulos outorgados serão Laurea in Design (Design di Prodotto),
e pela Uemg dois alunos obterão título de
bacharel em Design de Produto e os outros
três receberão o título de bacharel em Design Gráfico.
Por que PoliTO e por que Design? A
ação é também um resultado de uma extensa parceria entre o Brasil e a Itália e baseia-se em acordos internacionais
assinados entre o
Estado
de Minas
Gerais e a região de Piemonte,
a partir de linhas gerais
de desenvolvimento entre os
países, especificamente formação
profissional e cooperação cultural. “A
escolha sobre o Design como área do conhecimento faz parte de estratégia maior
do Governo. Na época, o então governador
Aécio Neves firmou acordo com a Itália, e,
nesse contexto, Uemg e Torino puderam
realizar as parcerias”, observa o reitor.
Gabriela Cristina de Souza Silva, 22
anos, graduanda do 7º período de Design
Gráfico na Universidade do Estado de Minas Gerais, do 6º período de Comunicação
Social da UFMG e do primeiro período de
Ecodesign no Politecnico di Torino, é uma
das selecionadas que estão em Turim, ao
lado de Gabriel Figueiredo, Márcio Pinho,
Thayana Meneses e Ravi Bellard. Ela comenta o impacto da experiência: “Para
nós tem sido uma grande honra ser os
primeiros alunos da graduação da Escola
de Design da Uemg a participar de intercâmbios (algo que já é corriqueiro em
muitas universidades por todo o País e que
pudemos comprovar ao nos encontrarmos
com muitos brasileiros em Torino e universidades que possuem até 17
alunos em
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
15
POR DENTRO
DO PIEMONTE
O Piemonte é uma região situada no
norte da Itália, com 4,3 millhões de habitantes. É composto pelas seguintes
províncias: Alessandria, Asti, Biella,
Cuneo, Novara, Turim, Verbano Cusio
Ossola e Vercelli. Tem limites com a
França, o Valle d’Aosta, Suíça e Lombardia.
POR DENTRO
DE TURIM
Foto: Divulgação
Turim (Torino em italiano e Turin em
piemontês) é uma comuna italiana,
capital e maior cidade da região do
Piemonte, e a quarta maior cidade do
país, com uma população de 910.188
habitantes (2009), estando atrás apenas de Roma, Milão e Nápoles. Situada
na extremidade ocidental da planície
do rio Pó, Turim é um dos principais
centros de edição, artes, erudição e
moda da Itália. Seus principais edifícios datam principalmente dos séculos
XVII e XVIII. A cidade é sede da Fiat.
intercâmbio). E podemos dizer, em nome
dos coordenadores, que se tratou de um
processo longo e difícil, mas que nos renderá bons frutos”.
Ainda no Brasil, os estudantes participaram de um projeto de pesquisa denominado Design e Integração Competitiva no Território da Estrada Real, que durou
um pouco mais de um ano e cujo objetivo
principal era o de utilizar os conhecimentos relativos à interface entre Design e Território, requisitos ambientais, Ecodesign,
para discutir e desenvolver ações que contribuam para o Território da Estrada Real de
forma ampla. “A ideia é pensar em ações
de modo sistêmico que possam levar ao
desenvolvimento e à sustentabilidade social, cultural, ambiental e econômica dessa
região, que cada vez mais vem sendo visada em termos turísticos, mas que ainda
carece de fazê-lo de forma mais integrada
ao seu contexto, à sua comunidade, à sua
história”, diz Gabriela.
A estudante ressalta que a parceria
com a instituição italiana já se fazia presente nessa pesquisa. “Eles possuem um
grande knowhow nesse campo e várias
iniciativas semelhantes que contam com
a visão do designer, como os ecomuseus,
rotas do vinho e do queijo”.
Sobre esses projetos, o que os alunos
fizeram, primeiramente, foi um diagnóstico de
pontos críticos/problemáticos e os potenciais
locais. A partir daí propuseram uma série de
O reitor da Uemg, Dijon Moraes Júnior
16
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
projetos que possam contribuir para a região.
“A nossa vinda para o PoliTO tem como objetivo aprimorar nosso conhecimento no que
concerne a essa visão projetual de modo sistêmico e ao fim propor uma ação que possa
de fato ser aplicada à Estrada Real”.
Depois das primeiras aulas, Gabriela
percebeu que terá contato com um aprofundamento muito detalhado nesse tipo de
projetação. “Estamos em uma Laurea Magistrale em Ecodesign, é uma especialização. Uma experiência bem diferente do que
vemos em graduação. O mais interessante
é que, na prática, é como uma continuidade do projeto de pesquisa em que trabalhamos no Brasil, como se estivéssemos
subindo um degrau a mais”.
A base para o projeto final dos graduandos é a pesquisa da Estrada Real,
que concerne a diferentes aspectos do
território, seja no âmbito da tipografia, do
design de informação, de novas tecnologias, espaços museográficos. “Mas ainda
é cedo para especificar do que se tratará
especificamente, mesmo porque deve tratar do ambiente com um todo, de modo
sistêmico. Estamos aprendendo a pensar
os territórios de modo amplo”, avalia.
Para Gabriela, um detalhe significativo despertou seu interesse, pelo fato
de, além de ser aluna de Design Gráfico,
também estudar Comunicação Social,
como ela mesma explica: “o que mais me
chama atenção em meio a tudo que vimos,
diagnosticamos e projetamos é a importância de se comunicar o que se projeta.
Não basta ter um projeto elaborado, compatível com requisitos ambientais, sociais,
econômicos e culturais se aqueles que se
deparam com esse projeto não são capazes
de perceber isso. Perde-se a oportunidade
de educação e de perpetuação dessa ação”.
Esse é um ponto que ela espera poder trabalhar bastante, da importância de
comunicar do modo mais adequado, para
todos, as soluções propostas para um ambiente (tanto aqueles que governam, que
vivem, que trabalham ou que visitam esse
ambiente). “O que é algo bem amplo, já
que essa comunicação pode ser pelo tipo
de material utilizado, pela forma como é
escrita, pela iluminação, e inúmeras outras formas que devem ser trabalhadas de
modo coordenado”, ressalta.
Fotos: Arquivo pessoal / Paulo Miranda
Unidade Central do Politecnico di Torino
Em destaque, o Doutorado
Além do acordo de Dupla Titulação,
outro destaque do diálogo entre Minas e
Piemonte é o Doutorado de Pesquisa em Sistema de Produção e Desenho Industrial (Design), que, de acordo com o reitor da Uemg,
Dijon Morais Júnior, foi inovador em Minas:
“foi a primeira vez que a FAPEMIG concedeu
bolsa de doutorado para um programa no
exterior. Foram resolvidos também três dificuldades que os professores normalmente
enfrentavam: conseguir a bolsa, conseguir a
vaga na faculdade e continuar recebendo pela
universidade. Graças à nossa ação estratégica estes problemas foram resolvidos pois
nosso professor ganha vaga, bolsa e mantém
o seu salário integral”.
O primeiro professor contemplado
com o intercâmbio nesse programa foi Paulo
Miranda, que chegou a Torino em fevereiro
de 2009. Atualmente encontra-se na fase de
conclusão de sua tese. A provável data de
defesa será marcada pelo Senado Acadêmico/Escola de Doutorado e deve acontecer
entre os meses de fevereiro e abril de 2012.
A duração da bolsa segue a duração prevista
para o curso: três anos, prorrogáveis por no
máximo um ano, mediante justificativa do
bolsista e parecer do professor orientador e
dos professores coordenadores (da Uemg e
PoliTO) responsáveis pela parte acadêmica
do convênio entre as instituições.
Miranda trabalha com a pesquisa
“Exploração mineral, homem e ambiente:
relações sistêmicas do design – fatores humanos, sociais e estratégicos na produção
artesanal em pedra sabão” (nome provisório), sob a orientação dos professores Luigi
Bistagnino e Claudio Germak. “Estar junto
ao PoliTO é fundamental. O know how e
O pesquisador Paulo Miranda, em Turim
as pesquisas desenvolvidas pelo Departamento de Projetação Arquitetônica e Design
Industrial (Dipradi) propiciam uma vivência
aprofundada e dinâmica a respeito do meu
tema de pesquisa (Metodologia do Design
Sistêmico), amplamente investigada e trabalhada por eles. Estar aqui é acima de tudo
conhecer, aprender e experimentar”, afirma.
O objetivo do trabalho é reconhecer,
através da metodologia do design sistêmico, as relações da cadeia de exploração
mineral no contexto territorial e suas consequências na produção de artesanato, em
particular no polo produtor de pedra-sabão
das regiões de Ouro Preto, Mariana e Catas
Altas da Noruega, em Minas Gerais.
“A estrutura exploratória existente,
bem como as consequências atuais e principalmente futuras a propósito dos fatores
humanos, sociais, ambientais e econômicos, são os pontos particularmente tratados
nesse estudo. O objetivo específico tem o
foco na exploração do esteatito, conhecido
como pedra-sabão ou ainda pedra-talco,
bastante difundido na região mineira e
reconhecida como um bem cultural deste
território”, explica o pesquisador.
Design e Território
Outro professor que também participa do programa de Doutorado é Marcelo Amianti, em Torino desde março de
2010. Conforme o cronograma de trabalho, ele deve terminar o período letivo
em janeiro de 2013 e defender a tese até
três meses depois.
Seu projeto está em fase de desenvolvimento e sofreu muitas modificações
desde sua chegada. “Até a conclusão da
pesquisa e da fase de análise dos dados ob-
tidos o projeto passará por várias revisões,
mas o título provisório, Estudo da produção
científica dos cursos de Pós-graduação em
Design de Produto (Mestrado) das Universidades públicas na União Europeia e no
Mercosul, dá uma ideia da abrangência do
tema que está sendo investigado”.
Esta pesquisa tem como objetivo verificar a contribuição e a aplicação da produção científica desenvolvida nos Cursos
Mestrado em Design de Produto para a
região em que se situam, seja para a sociedade, a comunidade ou para a indústria, assim como para com a própria comunidade
acadêmica em questão, tomando como referência o conceito de “Design e Território”.
Além de Paulo Miranda e Marcelo
Amianti, também cursa doutorado em PoliTO
a professora Rosângela Miriam Mendonça,
que chegou à Itália em janeiro deste ano, e
a professora Ana Luiza Cirqueira Freitas,
recém-selecionada e que inicia seus estudos
em janeiro de 2012.
Viver em Piemonte
Estudar fora do País traz poucas dificuldades, porém, significativas, na avaliação do pesquisador Marcelo Amianti. A
primeira delas é a fluência em um idioma
estrangeiro. “Apesar do período que me
dediquei à língua italiana no Brasil, percebo
que o verdadeiro aprendizado somente se
dá sob uma imersão completa, no próprio
país de origem”. Amianti também cita a dificuldade de adaptação ao clima, bastante
diverso do nosso, onde o inverno é rigoroso
e o verão muito quente. Ambas as estações
com duração aproximada de quatro meses.
“Porém, existe uma dificuldade que
só se percebe com o passar dos dias e ten-
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
17
PERGUNTAS
! SAIBA MAIS
Em 2008 a UEMG e o Politecnico di
Torino, com o apoio da FAPEMIG, assinaram convênio de Dupla Titulação,
que faz parte do Programa de Cooperação do Estado de Minas Gerais com
a região de Piemonte. O acordo permite estudantes brasileiros de Design
ir para Itália e usarem por dois anos
a graduação com diploma válido no
Brasil e na Itália. Este ano foram para
PoliTO cinco alunos do curso de Design, que vão terminar a graduação na
escola em dois anos. A FAPEMIG fornece um suporte financeiro de R$ 425
mil reais divididos entre a mensalidade
da escola italiana, seguro saúde, auxílio instalação e passagem de ida e volta
para os cinco estudantes.
18
Informações gerais sobre o Convênio
com Termo de Cooperação Técnica:
Duplo Título e Doutorado. Começou em 2008.
a conclusão das atividades da primeira turma, a FAPEMIG deverá avaliar o sucesso do
programa e sua possível renovação.
Qual o objetivo da
Dupla Titulação?
Ampliar e aprimorar a pesquisa, assim
como também validar o currículo internacionalmente. O apoio prevê ainda um acordo
com as prefeituras das cidades participantes do Projeto Estrada Real, que permita o
aproveitamento dos profissionais formados
por pelo menos um ano, para continuidade
e implementação das atividades identificadas
durante o desenvolvimento do trabalho. Após
Quanto ao Doutorado,
qual a contrapartida que o
professor oferece
para a sociedade?
O professor assina o Termo de
Compromisso que, após o retorno do
curso, permanecerá na instituição por
pelo menos o dobro do tempo de duração do afastamento, em meses, no regime de trabalho semanal que for determinado pela instituição.
de a ficar mais intensa a cada dia que passa. É a falta que sinto do trabalho desenvolvido junto aos colegas de trabalho da
Uemg, da hospitalidade e do calor humano
do brasileiro e a saudade dos amigos e dos
familiares que deixei”, diz.
De positivo, Amianti destaca o seguinte aspecto: “Percebe-se na população
italiana um orgulho intenso pelas tradições,
pelas instituições e pela cultura alimentar.
Cada região, bastante peculiar e diversa
das outras, preserva e cultua sua própria
história. O produto ‘made in Italy’ é muito
valorizado pela sociedade, o que estimula o
seu melhoramento contínuo”.
Já Paulo Miranda também encontrou
as dificuldades comuns a qualquer estudante de doutorado: acertar os passos com a
língua italiana (“o que foi muito prazeroso”),
aprender a lidar com uma cultura diferente e
respeitar seus limites. “Talvez o mais significativo seja o fato de deixar um pedaço do
meu trabalho aí no Brasil. Temos que renunciar a várias coisas para estar aqui e fazer
um bom trabalho: ficar longe dos familiares,
deixar sua casa, seus bens, estar fora da
vida universitária da Uemg (instituição com
que tenho grandes laços), não acompanhar
meus alunos de perto (como um sentimento
de paternidade) no cotidiano da universidade. Enfim, saudades!”
Em síntese, Miranda afirma que essa
é uma experiência de muita responsabilidade, que impõe uma dedicação intensa
e muitas vezes solitária, pois depende somente de si mesmo a transformação des-
se conhecimento absorvido. É um grande
sacrifício e ao mesmo tempo um prazer.
“O ponto positivo de tudo isso é a experiência ímpar, única, de estar enxergando
através de um outro e ao mesmo tempo de
vários pontos de vista. Ver nosso país com
esse olhar, ‘de fora da caixa’, faz com que
acreditemos no nosso potencial, motiva,
faz com que percebamos mais claramente
nossas virtudes e nossas deficiências”.
“Além de realçar o conhecimento e
alargar a experiência, principalmente no campo internacional, a experiência vivenciada no
PoliTO motiva-me em novas linhas de pesquisa com o desejo de aplicar e difundir esses conhecimentos dentro da Uemg. Quando
voltar, pretendo direcionar a experiência adquirida em prática nas minhas atividades na
Escola de Design da Uemg. Dar continuidade
à minha linha de pesquisa, que acredito ser
muito relevante, e fazer a minha contribuição
social como pesquisador e professor, transferindo o conhecimento, praticando e experimentando os novos desafios e necessidades
no nosso território”.
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
Dia a dia intenso
Marcelo Amianti diz que seu cotidiano
não é muito diverso daquele que habitualmente vivenciava no Brasil. “Durante a semana mantenho um horário regular de trabalho
no Departamento onde desenvolvo meu
projeto. A diferença consiste na carga de trabalho e na quantidade de tarefas necessárias
ao objetivo do Curso de Doutorado, que são
grandes. As disciplinas são ministradas em
horários e locais diversos, espalhadas pelas
várias unidades do PoliTO em Torino”.
Com o pouco tempo que resta, procura conhecer bem a cidade onde vive.
Aos finais de semana, lembra Amianti,
Torino oferece uma quantidade considerável de locais para visitação, como museus, palácios, mostras e apresentações
de arte e cultura em geral. “A cidade tem
aproximadamente 900 mil habitantes e
um simples passeio pelas ruas e avenidas se torna um programa bastante rico,
em função de sua arquitetura particular. O
sistema de transporte público é bastante
eficiente e facilita o deslocamento e o
acesso por toda a cidade”.
A poucos meses de defender sua tese,
Miranda lembra que, no início, quando chegou, o cotidiano era bastante complexo no
que diz respeito à cultura. “Era uma espécie
de bombardeamento de informações, um
plano um tanto quanto caótico, pois era
necessário encarar uma realidade diferente,
tanto cultural quanto organizacionalmente.
Necessitei de algumas semanas para entender como tudo funcionava; a universidade,
o modo de lecionar e frequentar as disciplinas, comer etc”.
Além de cursar as disciplinas, ele
teve a oportunidade de participar academicamente, como convidado em duas disciplinas do curso de graduação em Design
Industrial do PoliTO, uma na área projetual
e outra na área de materiais, em que pôde
confrontar tanto a qualidade quanto a didática e o nível dos alunos. “Depois, já ao fim
do segundo ano, o trabalho se concentrou
no meu tema de pesquisa e ali fui fundamentando gradativamente os argumentos
principais. Atualmente concentro todo o
meu tempo na conclusão do meu trabalho,
e como de praxe, ‘os dias são longos e as
noites curtas’, é preciso muito empenho”.
Eu vou me adaptar
Recém-chegada, a estudante Gabriela Cristina Silva tenta se adaptar aos
costumes locais. “Por exemplo, aqui
não existe horário comercial comum a
todos os comerciantes no Brasil. Cada
estabelecimento tem seu próprio horário
e a maioria deles fecha para almoço ou
determinado dia simplesmente não abre.
Em termos de burocracia, muitos órgãos, dentro da própria universidade, só
funcionam pela manhã, durante horários
em que estamos em aula”.
De positivo, ela destaca, entre outros, o fato de que a universidade tem
grande experiência com estudantes estrangeiros e os auxilia em tudo o que se
refere a burocracias locais, regulamentos
e leis necessárias. “Oferece também cursos de língua gratuitos, já somos matriculados automaticamente no curso da língua
italiana, no qual mais do que aprender o
italiano conhecemos muito sobre cultura
geral, por convivermos e escutarmos pessoas de todas as partes do mundo”.
Sua rotina diária tem sido bem corrida.
“Aqui parece que o tempo passa mais rápido
do que devia e que temos menos do que 24h
para fazer as coisas”, afirma. Suas aulas, assim como de todos os cursos relativos ao
design, são na nova sede da universidade,
em Mirafiori, onde se encontra o centro de
design da cidade. “O prédio da universidade é, inclusive, dentro das fábricas da Fiat,
muito bonito, mas muito distante de tudo
e de todos. Aliás no primeiro dia de aula
fomos visitados pelo prefeito de Torino, o
reitor de PoliTO e um dos diretores da Fiat”.
SOBRE O PROJETO ESTRADA REAL
O Centro Minas Design (CMD) e a Uemg desenvolvem o projeto “Design e Integração Competitiva do Território”, com o objetivo de construir uma estratégia competitiva para a oferta de produtos e serviços das empresas da região. Para esse empreendimento, foram selecionadas seis cidades e um distrito, que fazem parte do trajeto
Estrada Real (Coronel Xavier Chaves, Entre Rios de Minas, Lagoa Dourada, Prados e
seu distrito Bichinho, Resende Costa e São Brás do Suaçuí).
Os resultados pretendidos são desenvolvimentos de protótipos virtuais, sinalização interna e externa, serviços e marcas para empresas de cada cidade voltada para
a melhora da competitividade local. O projeto abarca o acordo de Dupla Titulação,
assinado por Uemg e PoliTO, e conta com recursos da FAPEMIG.
Foto: Arquivo pessoal / Paulo Miranda
O majestoso Castello del Vallentino, construído na metade do século XVII
DOUTORADO POLITO
• Nome técnico: Doutorado de Pesquisa em Sistema de Produção e Desenho
Industrial (Design).
• O acordo inicial previa que PoliTO se comprometia a reservar para os anos de 2009,
2010 e 2011 nove vagas (três por ano), a fim de que professores da Uemg possam seguir o
percurso formativo para a obtenção do título de Doutor em Pesquisa (Ph.D) na Itália.
• Foi assinado um Termo Aditivo em 2010 com o objetivo de ampliar o convênio
para os anos de 2012, 2013 e 2014, garantindo também três vagas anualmente.
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
19
FRANÇA
Conhecimento
com sotaque
francês
Nord-Pas de Calais, uma das 26
regiões administrativas da França,
é composta pelos distritos “Norte”
e do “Estreito de Calé” (Pas de Calais). Sua capital é a cidade de Lille,
a maior da região, onde funciona a
prefeitura do distrito Norte. Na cidade de Arras fica a direção de Pas
de Calais. Na França, uma região é
administrativamente semelhante aos
nossos Estados. O norte da França é
composto também pelas regiões da
Normandia e da Picardia.
20
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
Projetos de cooperação
com Nord-Pas de
Calais estimulam
desenvolvimento
em diversas áreas,
como Tecnologia da
Informação, Mineração,
Saúde e Materiais
Marcus Vinicius dos Santos
Até pouco tempo atrás, a tradição que
marcava a região francesa de Nord-Pas
de Calais era o extrativismo mineral e as
fábricas, grande parte delas de siderurgia,
de mecânica pesada e têxtil. A partir de uma
série de investimentos, a opção do governo
da região foi valorizar uma outra tradição, a
pesquisa e o ensino. Na mesma região, por
exemplo, funciona o Instituto Louis Pasteur,
onde foi descoberta a vacina BCG, dentre
outros feitos. É lá também que fica a terceira
maior universidade daquele país, a Lille do
Norte. Ao lado do desenvolvimento tecnológico e científico, o turismo complementa as
bases do crescimento local.
A tradição e a expertise de Nord-Pas
de Calais na área da mineração sustentável
e recuperação de áreas degradadas foram
os pontos que inicialmente potencializaram os primeiros contatos com o Governo
estadual de Minas. Segundo Priscila Gomes, coordenadora de Parcerias Nacionais
e Internacionais da Secretaria de Estado
de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior
de Minas Gerais (Sectes), atualmente este
assunto é um dos principais na agenda de
sua pasta. “O desenvolvimento científico e
tecnológico é um dos motores do desenvolvimento econômico de um Estado, região ou País”, dimensiona.
A subchefe da Assessoria de Relações
Internacionais da Secretaria-Geral da Governadoria, Chyara Sales Pereira, vai além.
“O processo de internacionalização é uma
importante estratégia de promoção da competitividade do território de Minas Gerais
na busca pela diversificação da economia e
pela inserção internacional”, destaca. Minas
trabalha com uma modalidade de relação
descentralizada, feita entre estados, cidades,
províncias ou regiões que apresentem visíveis semelhanças em suas características. “O
estabelecimento de uma parceria internacional é longo e precisa ser desta forma para ser
eficiente”, garante Priscila Gomes. Para ela,
só com o relacionamento é possível conquistar confiança mútua, identificar similaridades
e o que pode ser feito conjuntamente. “Desta
forma se encontram as condições para ampliar o escopo da cooperação”, diz.
A cooperação com a região francesa
é produto de metodologia conhecida como
“Rede de Articulação”. Ou seja, “uma ferra-
menta que cumpre o objetivo de coordenar
e assessorar as operações internacionais
realizadas pelas unidades da administração do Governo com vistas à atração de
investimentos em projetos que promovam
a internacionalização do território parceiro”, explica. Considerando as semelhanças com Minas Gerais, a cooperação com
a região se destaca dentre todos os países
europeus com os quais o Estado mantém
diálogo. Segundo Chyara Pereira, este
relacionamento é modelo: “O mais transversal e interdisciplinar. Por isso, envolve
maior número de unidades da administração direta e indireta, e tem maior diversidade de temas de ação”, avalia. Isso, sob o
lema de gerar recursos gastando o mínimo
possível. Recurso entendido não apenas
como valor pecuniário, mas “todo conhecimento ou oportunidade de conhecimento
que possa ser recebido ou transferido para
um parceiro de ambas as partes”.
Ela destaca que, além de um relacionamento mais próximo com o governo
francês, técnicos e especialistas envolvidos, o apoio prestado pela Embaixada
da França no Brasil, especialmente pelo
cônsul honorário da França em Minas
Gerais, Manoel Bernardes, e pelo adido de
cooperação e ação cultural da Embaixada,
Serge Borg, são imprescindíveis para que
a iniciativa francesa já caminhe para uma
segunda fase.
Acordos com a região
São dois os projetos de cooperação
internacional com a região de Nord-Pas de
Calais em andamento. O Inria e a FAPEMIG já começam a estruturar seu terceiro
edital, sendo que o segundo foi renovado
agora, em 2011, por mais três anos. Um
outro projeto, o Pres/Arcus, ainda está em
fase de implantação, mas bastante adiantado. Ele deverá ser assinado tão logo o
governo francês aprove o projeto que lhe
foi submetido pelo Pres - entidade que
representa as universidades francesas -, e
pelo governo de Minas, por meio da FAPEMIG. Em ambos os projetos cada uma das
partes se responsabiliza por uma parcela
do financiamento. Apesar de envolverem a
mesma região da França, os dois acordos
são completamente distintos.
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
21
O Inria
O diálogo entre a FAPEMIG e o Instituto Nacional de Pesquisas em Informática
e automação (Inria), teve início em 2007,
quando o diretor de Pesquisas do instituto,
Pierre Deransart, apresentou uma proposta
à diretoria da Fundação. A prospecção da
parceira foi ação da Rede de Articulação
Internacional da, então, Superintendência
de Relações Internacionais (atualmente
Assessoria de Relações Internacionais) da
Secretaria de Estado de Desenvolvimento
Econômico (Sede). Na ocasião foram organizadas reuniões pela Superintendência,
da qual participaram Sandra Fernandes, da
equipe do governo de Nord-Pas de Calais,
e também técnicos de vários órgãos - de
diferentes instâncias -, públicos e privados, ligados ao Desenvolvimento, Meio
Ambiente, Saúde e Cultura.
O primeiro passo foi a assinatura,
em 2008, de um Acordo de Irmandade
entre Minas e Nord-Pas de Calais. No
documento, Minas e região francesa reconhecem suas semelhanças e explicitam
sua intenção de cooperar mutuamente. O
passo seguinte foi dado já em março de
2009, quando foi assinado um Acordo de
Cooperação. Ele estabelecia como grande
objetivo “estimular o desenvolvimento de
novas tecnologias e o aperfeiçoamento
de pós-graduandos e docentes na área
de Tecnologia da Informação e Comunicação”, e determinava suas áreas de atuação: “Capacitação profissional”; “Polos
de Competitividade e Excelência”, onde se
enquadra a cooperação na área de mineração e recuperação de áreas degradadas;
“Agricultura e questões ligadas aos agrocarburantes” e “Desenvolvimento cultural e
social”. No mesmo ano foi realizado o “Fórum dos Atores”, marco do início das atividades práticas e que reuniu pesquisadores
das duas nacionalidades interessados.
Os dois editais publicados, em 2009
e em 2010, eram para propostas científicas
e tecnológicas nas áreas de Ciências e Tecnologias de Informação e Comunicação,
elaboradas em conjunto por pesquisadores
mineiros e franceses, apresentadas simultaneamente à FAPEMIG, pelo coordenador
de Minas e, ao Inria, pelo coordenador da
equipe francesa. O edital permite, excepcionalmente, o custeio de itens relacionados a missões de estudo ou trabalho.
Podem ser financiadas, por exemplo, bolsas de doutorado sanduíche, com duração
de três meses para estudantes brasileiros
integrantes da equipe técnica do projeto,
incluindo bolsa, auxílio instalação, paswww.geoparkquadrilatero.org
Em agosto de 2011 uma comitiva de auditores da Unesco visitou o Geopark mineiro para avaliar possibilidade de reconhecimento da área. O sítio arqueológico de Pedra Pintada, por exemplo, localizado
em área particular, preserva pinturas rupestres de mais de 6 mil anos
22
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
sagens aéreas e seguro saúde, além de
visitas técnicas de até 15 dias, incluindo
o financiamento de diárias, passagens aéreas e seguro-saúde. Cada projeto poderá
realizar até duas missões por ano e apenas
o coordenador da pesquisa poderá realizar
missões em anos consecutivos.
O programa Pres/Arcus
Um desses caminhos levou os dirigentes do Polo de Pesquisa e Ensino
Superior (Pres), que representa várias das
Universidades da região de Nord-Pas de
Calais, a procurar o Governo de Minas Gerais para viabilizar um acordo. Uma possibilidade para isso era o programa de mobilidade acadêmica e científica do Ministério
de Relações Exteriores da França, o Arcus,
“Ação entre Regiões para Cooperação Universitária e Científica”, responsável por
fomentar a cooperação entre regiões francesas e outras regiões do mundo com as
quais já tenha algum relacionamento. Se a
proposta feita for aprovada, o governo francês autoriza um financiamento especial.
Este ano, o governo da França lançou o nome de três países para que sejam
feitas propostas de iniciativas com o apoio
do Arcus, dentre eles o Brasil. Com base
nisso os governantes de Nord-Pas de
Calais assinaram Carta de Intenção, em
fevereiro de 2011, estabelecendo os termos de um futuro acordo. Em resumo, o
documento define quatro áreas de atuação:
Saúde, Materiais (engenharia, nanotecnologia, química, física etc.), Territórios e
Área Transversal (intercâmbio acadêmico,
língua, troca cultural), e estabelece o valor
de quase mil euros para o programa. Esse
valor seria financiado como contrapartida,
pelo Governo Francês (50%), pelo Conselho Regional (governo local) de Nord-Pas
de Calais (25%), e pelo Governo de Minas,
por meio da FAPEMIG (25%), que disponibilizaria cerca de 225 mil euros para a iniciativa. A verba mineira vem da alíquota de
1% da arrecadação de impostos do Estado.
Agora, toda a documentação apresentada ao Arcus está sendo avaliada pelo Ministério das Relações Exteriores da França,
que deve se pronunciar até o final de 2011.
Sendo aprovados os projetos em Minas,
após o processo necessário, a FAPEMIG
ficará autorizada a abrir editais convidando
os pesquisadores - das Universidades mineiras - a submeter seus projetos.
Crédito: Ilana Lansky / 1° lugar concurso Geopark Quadrilátero de Fotografia
O futuro
No Brasil, várias fundações de amparo à pesquisa e universidades firmaram
acordos de cooperação com a França. Com
o objetivo de estreitar laços e ir além nas
iniciativas de cooperação científica, com
apoio da Embaixada da França, o Conselho Nacional das Fundações Estaduais de
Amparo à Pesquisa (Confap) organizou no
último mês de outubro uma comitiva que
visitou, por uma semana, as principais
organizações francesas, e com as quais as
fundações de amparo à pesquisa brasileiras têm acordo de cooperação.
Mario Neto Borges, presidente da
FAPEMIG e da Confap, integrou o grupo.
Além do Inria, a programação incluía visitas ao Centro Nacional de Pesquisas Científicas (CNRS), Universidade Lille Norte da
França, Instituto de Pesquisa em Ciências
e Tecnologias para o Meio Ambiente (Cemagref) e ao Instituto Superior de Aeronáutica e Espaço (Ensica). Dá o “tom” da
visita um artigo publicado em junho deste
ano, do diretor científico da Fapesp, Carlos Henrique de Brito Cruz: “Um dos mais
importantes desafios para a ciência brasileira nesta segunda década do século XXI
é buscar maior impacto mundial para o
conhecimento criado no país”.
Atualmente já são realizadas cerca
de cinco missões técnicas e institucionais
francesas por ano, além das missões brasileiras que vão à França e da participação
em encontros de interação entre os agentes
técnicos e governamentais da cooperação.
“E essas relações já estão se estendendo
para além da França, alcançando também
seus parceiros”, relata Chyara Pereira, citando um relacionamento inicial com a Região de Matam, no Senegal, país africano
de língua francesa, e que se viabilizou por
intermédio de Nord-Pas de Calais.
De mineração de dados ao
monitoramento de minas
Os resultados de todo esse trabalho
de muitos já começa a aparecer. Para o
professor associado Wagner Meira Júnior,
Serra da Calçada, entre Nova Lima e Brumadinho - é preciso encontrar
o equilíbrio entre exploração mineral, imobiliária e meio ambiente
da Universidade Federal de Minas Gerais
(UFMG), que coordena o estudo “Mineração de Dados: Incorporando Modelos de
Conhecimentos a Algoritmos de Mineração de Dados Escaláveis”, selecionado
nos editais de Cooperação FAPEMIG/Inria
2009 e 2010, o apoio abriu portas. Ou melhor, nova frente de trabalho nas pesquisas.
“Em particular, nos familiarizamos
com modelos formais de representação
de conhecimento”, salienta, dizendo que
isso tornou os algoritmos de mineração de
dados desenvolvidos mais eficazes. “Mais
ainda, através da paralelização dessas técnicas, conseguimos lidar com modelos
maiores e de maior abrangência”, observa
Meira Júnior, destacando a parceria com o
laboratório Loria, localizado em Nancy, na
região de Nord-Pas de Calais.
Wagner Júnior, que é PhD em Ciência
da Computação pela University of Rochester e também coordenador da linha de pesquisa em “Descoberta do Conhecimento”,
do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para a Web, destaca como resultados
práticos já alcançados a publicação de trabalhos nas novas linhas iniciadas e a visita
que recebe em seu laboratório, por pelo
menos um ano, de um pós-doutor francês,
formado no Instituto Nacional de Pesquisas
em informática e Automação (Inria).
Pedro Homem
Ciminelli, do Polo de Excelência Mineral e
Metalúrgico, coleciona resultados positivos
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
23
Muito chão...
O engenheiro Renato Ciminelli,
gerente executivo do Polo de Excelência
Mineral e Metalúrgico da Sectes, é um
pioneiro na cooperação internacional. Ele
está envolvido desde o Fórum de Atores,
encontro realizado em 2009 para promover
a integração entre os interessados em cooperação internacional, e tornou-se um dos
seus principais apoiadores. Com experiência profissional em outros países, como
Austrália, Franca, Estados Unidos, Canadá,
Portugal e Chile, o engenheiro químico es-
pecialista em Gestão, Concepção e Fomento de programas científicos com ênfase em
parceria universidade-empresa, conta que
o Polo de Excelência que dirige foi concebido para alcançar os objetivos de desenvolvimento de competências e referências
científicas, tecnológicas, profissionais e
gerenciais de classe mundial.
“Era necessária a abertura de Avenidas Internacionais de Cooperação. Aproveitamos os acordos governamentais,
tanto na França, quanto com o estado de
Queensland, na Austrália, e Saarland, na
POR DENTRO DE NORD-PAS DE CALAIS
• 12 414 km2 ou 2,3% do território do país
• Mais de 4 milhões de habitantes, 64% no Departamento do Norte e 36% no Pas-de-Calais.
• 324 habitantes por km2, contra 109 no resto da França
• Uma das regiões mais jovens da França: 37% das pessoas têm menos de 25 anos
• 2 departamentos (distritos), 1547 comunas (espécie de municípios), 20 cidades com mais de
30 mil habitantes,
• 8 cidades com mais de 100 mil moradores, e uma cidade de mais de 1 milhão de habitantes.
• Mais de 160 mil estudantes em formação nas universidades e escolas da região. 4 mil pesquisadores, em cerca de 400 centros de pesquisa públicos e privados.
• Reúne centros de especialização de ponta em campos como Saúde (Polo Eurasanté), Novas
Tecnologias (Euratechnologies), Desenvolvimento Sustentável, Inovações Têxteis (UP-TEX) e
Economia Social e Solidária. Nord-Pas-de-Calais é a terceira região industrial e a quarta região
econômica francesa. Seu produto interno bruto é de 96,5 milhões de euros.
Curiosidade: Minas Gerais: Área = 586.528 km². França: Área = 543.965 km²
Fontes: www.nordpasdecalais.fr e www.minas-gerais.net
Contatos:
Pôle de Recherche et d’Enseignement Supérieur (Pres): www.pres-lpc.fr
Université Lille Nord de France: www.poleuniv-lille-npdc.fr
Programme de Coopération Inria-Brésil:
www.inria.fr/institut/relations-internationales/appels-a-projets/fap-bresil
24
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
Alemanha”, destaca, lembrando que a cooperação com a Franca no escopo da mineração está inserida nos temas sustentabilidade, reconversão tecnológica e urbana
de territórios mineradores, diversificação
econômica e industrial de territórios, planejamento urbano e territorial.
Como resultados efetivos alcançados pelo Polo de Excelência, Ciminelli
conta que em 2010 e 2011 foram realizadas diversas missões e eventos científicos
e técnicos, em Minas Gerais e na França,
além de ter sido assinada cooperação
com o francês CD2e, um centro de especialistas voltado para o desenvolvimento
e a transferência de inteligência e tecnologias direcionadas para atrair negócios
ambientais para regiões mineradoras de
Minas, como estratégia de diversificação
econômica destes territórios. A aplicação
piloto dos resultados deste acordo será
nos municípios que constituem o Consórcio Público de Desenvolvimento do
Alto do Paraopeba (Codap). Dentre as
possibilidades estão ações voltadas para
a recuperação de commodities metálicas,
metais preciosos, metais nobres e terras
raras de circuitos eletrônicos reciclados –
a chamada “Mina Urbana”.
Outro resultado envolve cooperação
entre o Geopark Quadrilátero Ferrífero,
lançado em Minas Gerais em 1º de setembro de 2011, e o Projeto Mission Bassin
Minier, de Nord-Pas de Calais, visando
desenvolver sistemas de gestão e governança, capacitação de lideranças, inteligência e tecnologias para a reconversão
tecnológica e diversificação econômica
e industrial de territórios mineradores. E
ele já empreende outros desdobramentos
desse relacionamento. Geopark precisa
dispor de vários locais de interesse geológico, chamados geosítios, e ter valor ecológico, arqueológico, histórico e cultural.
“A abordagem de cooperação científica e
educacional para planejamento urbano,
territorial, de reconversão e diversificação,
está sendo tratada no âmbito de um acordo
de cooperação entre UFMG e o Instituto de
Planejamento Urbano e Desenvolvimento
da Universidade de Lille”, adianta.
AUSTRÁLIA
Belezas
mineirais
Acordo com Universidade
de Queensland procura
compatibilizar grande expansão
da indústria mineral com
conservação de recursos
hídricos, biodiversidade e
patrimônio cultural
Ana Flávia de Oliveira
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
25
A Austrália está localizada na Oceania, o menor continente do mundo. Também conhecido como continente-ilha, o
País é banhado pelos oceanos Pacífico
e Índico, tem belas praias e recifes de
corais, florestas tropicais, montanhas,
grande área para pasto e desertos. Os
australianos convivem com uma fauna e
flora únicas, que não se encontram em
outras partes do mundo. Situado no hemisfério Sul, assim como o Brasil, o país
dos cangurus e coalas se assemelha a
nós em vários aspectos. Além das belezas
naturais, Austrália e Brasil, especialmente
o Estado de Minas Gerais, contam com
uma intensa atividade mineradora.
Todas essas semelhanças contribuíram decisivamente para que fosse criada
Queensland fica no Nordeste da Austrália, é o segundo maior Estado e o
terceiro mais populoso. Mais de um
terço dos habitantes vivem em Brisbane, a capital e a terceira maior cidade do País. Atividades se centralizam
em torno do Rio Brisbane com restaurantes na beira do rio, mercados,
parques e calçadões. O Estado tem
uma área de 1,8 milhão km2 e uma
população em torno de 3,9 milhões
de habitantes. Tem clima tropical
e florestas tropicais junto à costa.
Queensland é um destino bastante
apreciado por turistas. As atrações
principais são a Grande Barreira de
Coral e as ilhas costeiras.
26
uma parceria entre os dois países para a
realização de pesquisas científicas. Em
abril deste ano, a FAPEMIG assinou um
instrumento de cooperação com a Universidade de Queensland. O Memorando de
Entendimento (MOU) celebra a intenção
de cooperação em várias áreas do conhecimento. A professora Virgínia Ciminelli,
do Departamento de Engenharia Metalúrgica e de Materiais, da Universidade
Federal de Minas Gerais (Demet-UFMG),
coordenadora da parte mineira do programa, ressalta a importância da compreensão do universo de oportunidades
que este instrumento abre com a parceria
entre governos, o que tem trazido mais
frutos para Minas Gerais. “Este acordo
de cooperação focou especificamente a
área de mineração e mostra como pode
ser multiplicado para outras iniciativas. A
Austrália também é um país com tradição
em atividade mineradora. Minas Gerais
tem recebido um volume expressivo de
investimentos do setor. E isso coloca uma
questão central de como compatibilizar
a grande expansão da indústria mineral
com a conservação dos recursos hídricos,
da biodiversidade e do patrimônio cultural. Mais ainda, como tirar proveito dos
ganhos desse ciclo de grande exploração
das riquezas, não renováveis de Minas
Gerais para o planejamento e a construção de um futuro que contemple o desenvolvimento sustentável e o benefício das
futuras gerações”, destaca.
O acordo congrega várias instituições (PUC-Minas, Universidade Federal
de Viçosa, a UFV, e o Centro de Desenvolvimento em Tecnologia Nuclear, o
CDTN, da UFMG). O objetivo é promover
pesquisa e desenvolvimento nos campos de geoquímica, impacto ambiental e
qualidade da água em áreas afetadas pela
indústria mineradora. A parceria também
visa estimular o desenvolvimento de novas tecnologias e o aperfeiçoamento de
pós-graduandos e docentes por meio
da cooperação científica entre equipes
do Brasil e da Austrália. Oito projetos
foram enviados e em junho deste ano
saiu o resultado do julgamento de edital.
Três deles foram aprovados para receber
apoio da FAPEMIG e da Universidade de
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
Queensland. Em cada um dos trabalhos,
um professor de cada uma das instituições brasileiras aprovadas irão trabalhar em parceria com um professor da
universidade australiana. As propostas
aprovadas para a cooperação binacional
de intercâmbio científico superam os R$
700 mil. O projeto do CDTN, coordenado
pelo professor Rubens Martins Moreira,
trata de estudos hidrogeológicos e hidrogeoquímicos visando soluções para
um problema grave de drenagem ácida
de mina em uma pilha de rejeitos de
mineração de urânio. Outro projeto, da
PUC-Minas, está sob a coordenação do
professor Robert John Young e estuda os efeitos do ruído proveniente de atividade
mineradora sobre a fauna.
O terceiro projeto aborda a utilização de hidróxidos de ferro e alumínio –
recursos naturais abundantes no Estado
– para a redução da drenagem ácida, e é
orientado pelo professor da Universidade
Federal de Viçosa, Jaime Wilson Vargas
de Mello. Ele enfatiza a importância dos
benefícios para os países com o trabalho
conjunto. “Podemos contar com a parceria de um país desenvolvido, que apresenta vários aspectos em comum com o
Brasil. A Austrália e o Estado de Queensland, em particular, têm vocação e grande
experiência em mineração, que é uma
atividade importante para nós, mineiros.
Ambos os países convivem com diversidade climática, mas em que predominam
condições tropicais. Isso faz com que
certas tecnologias sejam mais adequadas
às nossas condições, favorecendo o intercâmbio de tecnologia e experiências entre
os países”, comenta.
O acordo envolve o desenvolvimento de pesquisas em temas de interesse
comum, estágios de pesquisadores e
estudantes, com aporte de recursos dos
dois países. O grande diferencial do Edital
da FAPEMIG, de acordo com Ciminelli, é
que, ao contrário dos outros programas,
a Fundação inovou, ao colocar recursos
para o desenvolvimento do projeto de
pesquisa e não apenas para intercâmbio
de alunos e de pesquisadores. “Isso torna
a parceria muito mais efetiva e com resultados mais concretos”, afirma.
Para a professora, a experiência da
Austrália em modelos de investimento em
Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), com
participação efetiva do setor industrial, é
exemplar e original. O investimento em
pesquisa mineral teve muito sucesso no
desdobramento em tecnologias e serviços
para fornecimento ao setor mineral mundial. O país é uma referência em termos
de patamar de desenvolvimento em Ciência e Tecnologia na área. “Portanto, essa
parceria visa o aumento da competência
no Estado em áreas que a Austrália se destaca, e vice-versa; a troca de experiências
em termos de modelos de P&D e, principalmente, a construção compartilhada de
conhecimento e a formação de pessoal em
áreas de interesse comum. A Austrália traz
uma competência complementar de como
agregar valor a negócios vinculados a mineração”, enfatiza.
Para Ciminelli, a construção de uma
parceria envolve investimentos de médio e
longo prazo, além de persistência. “Desde a visita do então vice-governador do
Estado, em 2008, e hoje governador, Antonio Anastasia à Austrália, houve uma
série de iniciativas lideradas pelo Polo de
Excelência Mineral e Metalúrgico, da Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia
e Ensino Superior (Sectes), com o apoio
da FAPEMIG, visando identificar lideranças, colaboradores e competências em
torno de temas de interesse. Esse trabalho culminou em projetos de cooperação,
inclusive, com aportes do setor privado
superiores aos recursos totais alocados
pelos dois países no edital em questão.
Isso é certamente um indicador de sucesso da ação de fomento da FAPEMIG”,
ressalta. Segundo Virgínia Ciminelli, o
edital deve ser visto como uma iniciativa piloto cujo aprendizado apoiará novos
editais a serem lançados. “A instalação de
um escritório de negócios do Governo de
Queensland em Belo Horizonte planejada
para novembro de 2011 vai potencializar
o Memorando de Entendimento entre a
FAPEMIG e a Universidade de Queensland em várias áreas do conhecimento e
negócios entre os dois Estados”, explica.
Além do acordo com a Universidade
de Queensland, também está sendo dis-
Foto: Ângelo Paulino
Brasil e Austrália têm vocação mineradora; o acordo inova ao fechar o convênio internacional que
financia as viagens e também libera recursos para pesquisas
cutida a cooperação entre o instituto de
pesquisa da Austrália – Commonwealth
Scientific and Industrial Research Organization (Csiro) e a FAPEMIG. Em outubro de 2010, durante a sexta Feira de
Inovação e Negócios (Inovatec), representantes do Instituto se reuniram com
o presidente da FAPEMIG para acordar
a assinatura de um Memorando de Entendimento, com o apoio da Sectes nas
áreas de desenvolvimento sustentável,
mineração e processamento mineral e
inovação e transferência tecnológica.
O Csiro é um dos principais membros do programa do governo australiano
para o Centro de Pesquisa Cooperativa
(CRC). A instituição fomenta o alinhamento entre a pesquisa e a indústria na
Austrália, contribuindo pra o desenvolvimento naquele país. Uma parceria entre a
FAPEMIG e a Csiro ampliaria a atuação de
ambas as instituições, além de promover a
possibilidade de transferência de tecnologia, pesquisas conjuntas e intercâmbio de
pesquisadores.
Minas tem experiência em mineração, o que reforça os laços com o Estado de Queensland; e também estreitas
relações com o Csiro, por meio do Polo
de Excelência Mineral e Metalúrgico. Ainda não há uma previsão de assinatura do
convênio, mas, de acordo com a Sectes, a
parceria é um passo a mais para o fomento
da cooperação científica e tecnológica entre os dois países.
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
27
CANADÁ
Uma rede para
as Matas Secas
Estudos são referência na pesquisa
desse bioma e embasam decisões jurídicas
Elas são pouco conhecidas, mas não por isso menos importantes. As florestas estacionais deciduais, popularmente conhecidas como Matas Secas, ocupam cerca de 6% do território nacional. Encontradas principalmente nas regiões Central e Nordeste
do Brasil, elas são típicas de ambientes áridos e se caracterizam
por árvores de grande porte que perdem todas as suas folhas em
determinados períodos do ano. Historicamente, esse bioma vem
sofrendo com o desmatamento e as queimadas para instalação de
pastagens e obtenção de carvão. Sua preservação passa pelo maior
conhecimento de suas características, que é o objetivo da Rede
Colaborativa de Pesquisas Tropi-dry (abreviação de Tropical Dry
Forests ou Florestas Tropicais Secas).
A Rede Tropi-dry surgiu como iniciativa da Universidade de
Alberta, no Canadá. A princípio, isso pode soar estranho: estudo
sobre florestas tropicais em um país onde as temperaturas são
próximas do negativo na maior parte do ano? O envolvimento da
Universidade de Alberta deve-se ao pesquisador costarriquenho
Arturo Sanchez, coordenador geral da Rede. Ele já desenvolvia
pesquisas sobre o tema em seu país e, ao mudar-se para o Canadá,
deu continuidade aos seus estudos, criando, em 2004, esse grupo
internacional para estudos sobre as matas estacionais deciduais.
O Brasil é um dos oito países que compõem a Rede, ao lado
do Canadá, Estados Unidos, México, Costa Rica, Cuba, Venezuela e
Panamá. Mário Marcos do Espírito Santo, do departamento de Biologia Geral da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes), é
um dos pesquisadores brasileiros que participa do grupo. Ele conta
que o envolvimento do país teve início em 2005, a partir de um contato feito durante congresso da Association for Tropical Biology and
Conservation (ATBC). “Em uma palestra, o professor Arturo Sanchez
falou sobre o projeto de uma rede de pesquisas internacional para
estudo do tema. Alguns países já compunham o grupo: Canadá, México, Costa Rica, Venezuela... mas não o Brasil. Após a apresentação,
eu e os professores Frederico Neves e Geraldo Wilson Fernandes,
da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), este último atual
coordenador geral da equipe brasileira, procuramos o Sanchez para
propor um site de estudos da rede no Brasil”
Assim nasceu a parceria entre os dois países, que já resultou
em intercâmbio de pesquisadores, dissertações e teses, aumento
28
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
Vanessa Fagundes
da produção científica e conhecimento maior da flora e da fauna
deste bioma brasileiro. Todas as pesquisas do grupo são desenvolvidas obedecendo aos mesmos protocolos de coleta de dados,
a fim de diagnosticar semelhanças e diferenças nos países estudados. Isso também permite estabelecer padrões de conservação,
recuperação e uso do solo nessas regiões.
No Brasil, os estudos são realizados na Paraíba e em Minas
Gerais, onde reúne pesquisadores da Unimontes e das universidades federais de Minas Gerais, Ouro Preto e Viçosa. O financiamento inicial veio do Inter-American Institute for Global Change
Research (IAI), entidade internacional de fomento à pesquisa. Em
Minas Gerais, a FAPEMIG tornou-se parceira do projeto a partir
de 2007, destinando recursos para os trabalhos. Em 2010, a Fundação assinou um memorando de entendimento com a Universidade de Alberta que expandia as possibilidades de cooperação. O
acordo permite, por exemplo, o financiamento de pesquisas em
outras áreas de interesse comum; o intercâmbio de pesquisadores
e estudantes em projetos comuns de pesquisa; a realização de seminários e workshops em conjunto; entre outras atividades.
Projeto amplo
@
Para saber mais sobre a Rede Tropi-dry e os
trabalhos desenvolvidos pela equipe brasileira visite
http://tropi-dry.eas.ualberta.ca/
Na Unimontes, o trabalho com as Matas Secas envolve três
grandes vertentes: socioeconômica, de sensoriamento remoto e ecológica. Na primeira, os pesquisadores buscaram avaliar a ocupação
humana na região do Parque Estadual das Matas Secas, localizado
em Manga, município do Norte de Minas, levando em conta aspectos sociais, econômicos e culturais. Como explica Mário do Espírito
Santo, o componente humano é muito importante. “Essa é uma região rica no sentido cultural, mas muito pobre no sentido econômico, o que a torna bastante interessante para estudos sociológicos”.
Foram estudados especialmente os conflitos decorrentes da
instalação de unidades de conservação na região, como aqueles relacionados ao Projeto Jaíba. “A região possui muitos quilombolas e
outras comunidades tradicionais que tiveram a rotina alterada com a
demarcação dessas unidades”, explica Mário do Espírito Santo. O grupo realizou um extenso trabalho de conhecimento dessas comunidades, que envolveu o levantamento censitário e a coleta de informações
sobre renda, trabalho e forma de utilização das Matas Secas. O sensoriamento remoto consiste na análise de imagens colhidas via satélite. O monitoramento é feito à distância, por pesquisadores da Universidade de Alberta. Uma vez por ano, a equipe canadense comparece ao Brasil para coleta de dados. Informações básicas,
como coordenadas geográficas e estrutura de formações vegetais
específicas, são enviadas ao Canadá pela equipe da Unimontes. A
comparação entre imagens de satélite da cobertura vegetal do Norte
de Minas nos anos de 1986, 1996 e 2006 também apontou dados
importantes com relação aos índices de desmatamento. Ao longo
dessas duas décadas, a área de Matas Secas diminuiu cerca de 11%,
o que equivale a uma perda de 2.040 quilômetros quadrados.
Dentro da dimensão ecológica, foram realizados estudos detalhados sobre a composição da flora e a estrutura da floresta. As coletas intensas e sistemáticas ao longo de cinco anos resultaram em
um levantamento riquíssimo sobre o bioma, com listas de espécies de
grupos pouco estudados como as micorrizas arbóreas, fungos que se
associam às raízes das árvores. “O grande mérito do trabalho foi cobrir
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
29
recuperação, além de reunir experiências de
conservação que deram certo em um país
e que possam ser reproduzidas”, explica o
pesquisador. Além disso, o trabalho serve
como aliado nas atividades de fiscalização
e monitoramento: de acordo com a lei que
regula o uso dessa vegetação, apenas áreas
em estágio inicial podem ser convertidas
para uso econômico. As informações coletadas resultam em um aprimoramento da
diferenciação dos estágios, tanto em campo
como via sensoriamento remoto, apontando
onde os fiscais devem atuar.
Legislação revisada
Professor Mário do Espírito Santo, coordenador
das pesquisas na Unimontes. O trabalho incluiu
coleta de material biológico, que permitiu conhecer melhor as espécies do bioma
lacunas de conhecimento, especialmente sobre a região Norte do Estado”, destaca Mário.
Os pesquisadores também buscaram
entender como a floresta se regenera. Para
isso, eles acompanharam parcelas de amostragem de diferentes estágios de recuperação.
O estágio inicial refere-se à vegetação que foi
cortada há cerca de cinco anos; o intermediário, às plantas que estão em processo de
recuperação no período entre 15 e 20 anos; e,
no estágio tardio de recuperação, as florestas
recuperam-se há mais de 50 anos (desde o
último registro de corte). Há ainda o estágio
primário, em que a floresta não foi tocada.
“Nosso objetivo era verificar se o que
acontece aqui é parecido ou diferente do que
acontece nas Matas Secas em outros países
e, com isso, tentar delinear um padrão de
30
Para Mário do Espírito Santo, uma das
grandes contribuições do grupo foi a participação decisiva na invalidação da Lei Estadual
19.096/2010, que alterava o uso do solo, a
conservação e a proteção das áreas de Matas Secas na região Norte de Minas. Essa lei
permitia o desmatamento de até 70% dessas
áreas. A partir dos dados coletados ao longo
de cinco anos de estudos sobre o bioma, os
pesquisadores elaboraram uma nota técnica
que foi enviada para o Ministério Público e
ajudou a embasar uma ação direta de inconstitucionalidade. Em janeiro deste ano, a corte
superior de Minas Gerais considerou a lei inconstitucional. “Isso mostra como os dados
científicos podem embasar decisões jurídicas
e orientar políticas públicas”.
Sobre os próximos passos, o pesquisador conta que o grupo acaba de ter
um projeto aprovado dentro do edital Programa Sisbiota, ou Sistema Nacional de
Pesquisa em Biodiversidade do Conselho
Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq). Isso garantirá a continuidade dos trabalhos por mais três anos,
consolidando ainda mais a Rede no Brasil.
Com esses recursos, a equipe irá estudar,
por exemplo, novos grupos biológicos,
como as bactérias de solo, sobre as quais
existem poucas informações disponíveis.
Além disso, as pesquisas irão se expandir para a margem direita do São Francisco, já que nos primeiros cinco anos de
trabalho os espaços estudados estavam
localizados na margem oposta do rio. Entre
os novos locais estão parques próximos ao
projeto Jaíba, como o Parque Estadual Lagoa
do Cajueiro e as Reservas Biológicas Jaíba
e Serra Azul. Serão utilizados os mesmos
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
protocolos para coleta e análise dos dados, o
que fornecerá um panorama completo deste
bioma na região Norte do Estado.
Intercâmbio
A participação em um projeto internacional trouxe ganhos para a universidade,
seus professores e seus alunos, na opinião
do professor Mário. Através da interação
proporcionada pela Rede Tropi-dry, por
exemplo, abriram-se oportunidades para que
graduandos e pós-graduandos da Unimontes
fizessem estágios no Canadá. Da mesma forma, a universidade mineira passou a receber
estudantes dos países que compõem a Rede.
“Isso enriquece a formação dos alunos. Esse
intercâmbio também se estende aos pesquisadores. Já recebemos vários colegas que
ministraram palestras ou minicursos para a
nossa comunidade acadêmica”.
O professor Arturo Sanchez, da Universidade de Alberta, passou a orientar
projetos de mestrado em conjunto com
pesquisadores da Unimontes. Isso aumentou também a produção científica do
departamento de Biologia Geral. Segundo
Mário do Espírito Santo, essa colaboração
em artigos e livros foi elogiada pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de
Nível Superior (Capes) em sua última avaliação do programa de pós-graduação. Ele
também destaca a formação de novos pesquisadores para estudar o tema: o grupo
brasileiro já produziu, até agora, seis teses,
18 dissertações e mais de 30 monografias
de conclusão de curso.”Nosso grupo, hoje,
é referência no estudo das Matas Secas”.
Em breve, novidades
Além da Universidade de Alberta, a Ecogene-21, instituição de pesquisa biogenética, também se tornou parceira da FAPEMIG. Em março deste ano, foi assinado
um memorando de entendimento que
prevê, entre outros, o desenvolvimento de
um centro da América do Sul para terapias
de base de células para doenças de retina,
dermatológicas e degeneração neural. O
projeto ainda está em fase inicial, mas em
breve começará a ser desenvolvido.
INGLATERRA
Tecnologia
pioneira
Acordo de cooperação científica coloca Minas em
contato com centro de referência internacional no
estudo de eletrônica orgânica e impressa
Fabrício Marques
A eletrônica orgânica e impressa é
uma tecnologia recente no mundo que
conjuga novos materiais orgânicos com
técnicas de impressão para produção de
eletrônica de baixo custo. Dispositivos
eletrônicos leves, flexíveis e baratos estão ocupando novos espaços de mercado.
Entre as diversas aplicações da tecnologia, destacam-se dispositivos inteligentes
(como sensores e teclados flexíveis), células fotovoltaicas (para geração de energia
limpa), displays e painéis de iluminação.
“Essa tecnologia é pioneira e estratégica
para o Brasil nos próximos anos”, afirma
Danielle Moraes, gerente de P&D e Projetos e coordenadora do Projeto de Eletrônica Orgânica e Impressa do Centro de
Inovações Csem-Brasil.
No Reino Unido, um acordo de
cooperação científica foi firmado entre
a FAPEMIG, o Csem Brasil e o Imperial College London, um dos principais
centros de referência internacional no
estudo e no desenvolvimento de eletrônica orgânica e impressa. A parceria inclui a oferta de cursos para estudantes
de mestrado, doutorado e pós-doutorado de Minas Gerais com experiência na
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
31
Foto: Arquivo pessoal
Pesquisadores do Brasil e do Imperial College, em Londres
área, o desenvolvimento de projetos de
pesquisa, além da implantação de um
centro de excelência em eletrônica orgânica no Estado.
De acordo com Danielle, que é
também a organizadora da primeira Escola
FAPEMIG–Imperial College–Csem Brasil
(Eficc), o acordo entre as três instituições
é um memorando de intenções que visa
priorizar suporte cientifico em projetos de
pesquisa, com foco na área de eletrônica
orgânica e impressa. Esta é a primeira escola organizada pelo Csem Brasil. Mas em
termos de parcerias internacionais, além
da aproximação com o Imperial College
London, o Centro também possui parceria
com o Csem e a École Polytechnique de
Lausanne (EPFL), ambos na Suíça, e com
o Fraunhofer, na Alemanha.
Com o termo de cooperação, o Csem
Brasil e o Estado de Minas passam a ter
acesso ao Centro de Eletrônica Orgânica e
Impressa (CPE) do Imperial College London. O CPE conta com dezenas de pesquisadores e tem como diretor o professor
Donal Bradley, um dos físicos mais citados
32
no mundo e um dos pesquisadores mais
renomados nesta tecnologia. “Esse termo
é de suma importância para alavancar a
capacidade do Csem Brasil e na formação
de pessoal. Ele possibilitará a capacitação
de mão de obra especializada em eletrônica orgânica, trazendo conhecimento para o
estado de Minas Gerais”, afirma Danielle.
O objetivo do programa é contribuir
para a formação de estudantes na fabricação de dispositivos de eletrônica orgânica
e impressa, e com isso gerar mão de obra
qualificada para alavancar o desenvolvimento dessa indústria no Brasil. O primeiro
processo de seleção já foi concluído. Foram
selecionados seis alunos: os doutorandos
Giovana Ribeiro Ferreira, Marcos Flávio de
O. Silva, Mariana de Melo Silva e Mirela de
Castro Santos e os pós-doutorandos Weber
Hanry M. e Feu e Giovani Gozzi. Giovana,
Mariana e Mirela são da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop); Marcos Flávio
e Weber são da Universidade Federal de
Minas Gerais (UFMG); e Giovani é contratado pelo Csem Brasil para ocupar uma vaga
pós-doc neste projeto.
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
Os pesquisadores participaram de
um curso de 78 horas realizado entre os
dias 3 e 14 de outubro, em Londres, Inglaterra, com aulas teóricas e experimentos
práticos. Também foi convidado a participar das atividades do curso o professor
Rodrigo Fernando Bianchi, coordenador
do Laboratório de Polímeros e de Propriedades Eletrônicas de Materiais (Lappem)
da Ufop e um dos gestores do Instituto Nacional de Eletrônica Orgânica do Conselho
Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq). Eles viajaram dois
dias antes do início das atividades acadêmicas. As aulas aconteceram todos os dias,
de 9h às 17h. Foram aulas práticas em laboratórios de Química, Física e Simulação
Computacional. As atividades de Simulação Computacional foram conduzidas pela
doutora Jenny Nelson - incluída entre os
50 maiores pesquisadores em Ciência dos
Materiais da última década. Em seguida, a
doutora Pabitra Shakya Tuladhar apresentou o curso de fabricação de dispositivos
em sala limpa, seguido de uma semana de
experimentos práticos nos laboratórios do
Imperial College.
Durante as aulas, os alunos tiveram
acesso ao estado da arte na produção, síntese e processos relacionados à eletrônica
orgânica e impressa, como técnicas de
fabricação de dispositivos orgânicos, impressão em substrato flexível, preparação
de substrato, síntese de material e propriedades elétricas. Além disso, foram estudadas técnicas de impressão como gravura,
offset, screen printing e inkjet.
De volta ao País, os estudantes devem
enviar um relatório com o resumo dos trabalhos desenvolvidos na escola. Eles deverão
empregar os conhecimentos adquiridos em
suas pesquisas, bem como iniciar possíveis
colaborações no âmbito de projeto de interesse com o Csem Brasil na criação de uma
plataforma de eletrônica orgânica e impressa em Minas Gerais.
No período em que estavam no curso, MINAS FAZ CIÊNCIA conversou por
e-mail com os pesquisadores Giovana Ribeiro e Giovani Gozzi. Giovana, atualmente vinculada ao Laboratório de Polímeros
e Propriedades Eletrônicas de Materiais
(Lappem), do Instituto de Ciências Exatas
e Biológicas (Iceb) da Ufop, formou-se
em Química Industrial na mesma universidade. Nos primeiros anos da graduação,
seu desejo era se formar e trabalhar como
Química Industrial em empresas fora do
meio acadêmico. Ao fazer estágio em uma
grande empresa percebeu que aquilo não
era o que pensava, e que talvez o meio acadêmico fosse uma alternativa interessante.
“Apaixonei-me pela área, e acabei me dedicando a ela em minha iniciação científica, meu mestrado e atualmente curso doutorado. Atualmente, curso doutorado em
Engenharia de Materiais estudando a degradação de polímeros luminescentes para
aplicação em sensores de radiação em um
dos únicos laboratórios do Brasil com foco
em projeto e fabricação de dispositivos
eletrônicos orgânicos, o Lappem/Ufop”. Giovana comenta que no Imperial
College acompanhou o desenvolvimento
de dispositivos como OLEDs e células
fotovoltaicas. “Também fabricamos esses dispositivos. Como meu estudo visa
a melhoria da performance de materiais
para serem utilizados nesses dispositivos, poder fabricá-los ajuda a focar o meu
trabalho nas áreas específicas que neces-
sitam de melhorias”. Nesta experiência,
frisa Giovana, são muito importantes a
visão de como são os grupos de pesquisa
no exterior, e da fabricação de dispositivos eletrônicos.
Por sua vez, Giovani Gozzi está no
momento de transição do nível de doutoramento para pós-doutoramento, que
executará junto à Csem Brasil. “De fato,
já iniciamos algumas atividades, que
incluem o curso em colaboração com o
Imperial College”.
Giovani é graduado em Física pela
Universidade Estadual Paulista (Unesp),
onde executou atividades de iniciação
científica na área de Eletrônica Orgânica.
Como membro do Instituto Multidisciplinar de Materiais Poliméricos (Immp), que
deu origem ao Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Eletrônica Orgânica
(Ineo), seu então orientador o inseriu neste
contexto de pesquisa em 2002.
Atualmente está em fase de depósito
de tese e de transição para atuar na área
de Eletrônica Orgânica. “Minha perspectiva de atuação é industrial, já que poderei
aplicar meus conhecimentos em temas que
pesquisei do ponto de vista científico de
forma mais direcionada aos interesses da
sociedade”, avalia.
Devido à experiência de quase dez
anos em pesquisa e desenvolvimento de
dispositivos eletrônicos orgânicos para
conversão de energia elétrica em luz, Giovani foi admitido para desenvolvimento
de dispositivo de mesma natureza com
aplicação também na conversão de energia luminosa em elétrica, que é o principal
foco da colaboração Csem Brasil/Imperial
College-London.
O que a estada no Imperial College
pode ajudar no avanço de suas pesquisas?
Giovani responde: “O processamento industrial de dispositivos eletrônicos orgânicos envolve o processamento contínuo de
dispositivos por técnica de impressão gráfica. Assim, a extensão dos conhecimentos
científicos para o processamento industrial
é o principal foco de interesse, além do
contato com a experiência dos ingleses,
que são pioneiros na área de dispositivos
eletrônicos orgânicos”.
Sobre o Csem Brasil
COMO FOI O PROCESSO SELETIVO
Poderiam participar do processo estudantes de mestrado, doutorado e
pós-doc vinculados a uma instituição de Minas Gerais. Não houve submissão
de projetos na seleção de alunos. As regras de seleção foram as seguintes: para
concorrer, bastaria apresentar currículo e carta de referência. Os candidatos foram
avaliados por uma comissão formada com representantes do Csem Brasil e da
FAPEMIG, de acordo com os seguintes critérios:
Critérios de análise e julgamento
Peso
Aluno de pós-graduação no Estado de Minas
5
Experiência na área de eletrônica orgânica e impressa (familiaridade com
procedimentos de laboratório e processos industriais)
4
Fluência em inglês
5
Potencial de sinergia com os atuais projetos de pesquisa do candidato
3
Qualidade e número de artigos e trabalhos nesta área
1
Com sede em Belo Horizonte,
o Csem Brasil é um centro privado
brasileiro de pesquisa aplicada e
desenvolvimento, criado em 2006,
especializado em micro e nanotecnologias, engenharia de sistemas,
microeletrônica e tecnologias de
comunicação.
Fundado pelo Csem S.A.
(Centre Suisse d’Electronique et
Microtechnique) da Suíça e FIR Capital, com o apoio do Governo de
Minas Gerais e FAPEMIG e, mais
recentemente, do BNDES, o Csem
Brasil tem como objetivo transformar nano e microtecnologias
avançadas em produtos, processos
e empresas inovadoras, operando
como ponte entre a ciência e a indústria, e entre o Brasil e centros
mundiais de excelência em tecnologia aplicada.
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
33
ISRAEL
Diálogos e
possibilidades
Sistema de inovação israelense
acrescenta novas perspectivas para
promover a união entre academia e
empresas no desenvolvimento da
inovação de Minas Gerais
Kátia Brito
34
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
Em junho deste ano, comitiva composta por representantes da FAPEMIG,
Secretaria de Ciência, Tecnologia e Ensino
Superior de Minas Gerais (Sectes), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e
Serviço Nacional de Aprendizagem (Senai), participou da conferência presidencial israelense Global Business Network,
organizada pelo presidente de Israel, Shimon Peres. O evento tinha o objetivo de
proporcionar aos participantes reflexões
que pudessem ser convertidas em ações
de cunho global. Dentre os temas abordados estavam: a busca por novas fontes de
energia; o futuro da exploração do espaço;
a medicina do amanhã: inovações e dilemas morais; e as vantagens comparativas
da economia de Israel.
O encontro possibilitou o primeiro
contato do grupo de Minas com institutos de Ciência e Tecnologia, universidades e agências de fomento israelenses.
A finalidade das reuniões era conhecer
como funciona o sistema de inovação do
Estado de Israel, que ocupa o primeiro
lugar no número de star-up (empresas
que começam pequenas, mas apresentam rápido crescimento econômico, por
causa de suas ideias inovadoras e de
base tecnológica que atraem investimentos, inclusive externos).
“Nosso objetivo foi entender como a
relação empresa-universidade produz tanta
inovação e tantas empresas bem-sucedidas e como podemos alavancar a relação
entre nossas empresas e a academia”, explica a assessora para Parcerias Nacionais
e Internacionais da Sectes, Cynthia Rocha.
Além dela, viajaram a Israel o diretor de
Ciência, Tecnologia e Inovação da FAPEMIG, José Policarpo de Abreu, o diretor
regional do Senai-MG, Lúcio Sampaio, e
os professores da UFMG Virgínia Ciminelli
(Departamento de Engenharia Metalúrgica)
e Marcos Pinotti (Engenharia Mecânica).
O grupo de Minas pôde conhecer
iniciativas como a da incubadora Yissum
que, desde 1964, é responsável pelas relações entre empresas e pesquisadores,
organização responsável pela transferência tecnológica da universidade para
o mercado. Considerada como uma das
melhores em transferência de tecnologia
no mundo, a companhia já registrou mais
de 6.100 patentes, licenciou mais de 480
tecnologias e gerou 65 novas empresas.
José Policarpo observa que entrar em contato com a experiência da Yissum chamou
sua atenção. “A forma como eles ajudam
o pesquisador a estabelecer um relacionamento com as empresas, com o apoio
de analistas de mercado, especialistas
em propriedade intelectual e proteção dos
documentos das patentes por meio de importantes escritórios de advocacias é muito
interessante”, afirma. A Yissum tem como
vice-presidente de propriedade intelectual
Renne Ben-Israel, que em 2012 visitará
Minas Gerais para apresentar o modelo de
inovação da Yissum.
Ponte entre academia
e indústria
Outro modelo que também despertou o interesse da comitiva é o do Instituto
Weizmann, centro de excelência multidisciplinar em pesquisa. Com forte atuação
nas áreas de Exatas, Computação, Bioquímica e Biologia, é conhecido por estimular a transformação dos conhecimentos
construídos na academia em produtos
com caráter industrial. Para conduzir a
produção científica, para além dos muros
do centro, foi criada a agência Yeda (que
significa “conhecimento” em hebraico)
que tem por responsabilidade proteger e
transferir a propriedade intelectual científica. O Instituto tem papel fundamental
Foto: Arquivo Pessoal
Comitiva de Minas Gerais em Israel
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
35
na relação entre pesquisador e empresa,
pois identifica as empresas que podem
investir nas pesquisas tirando da responsabilidade dos cientistas a preparação da
documentação que protege as tecnologias
de interesse comercial.
Para compreensão de como a Weismann coloca em contato academia e empresas, em novembro o diretor científico
de Iniciativa de Pesquisa em Alternativa
Sustentável de Energia da instituição, David Cahen, vem ao Brasil a fim de mostrar
como é importante para o sistema de inovação de um país que a Ciência dialogue
com as empresas. “Muitas vezes os pesquisadores ficam muito tempo no universo
acadêmico e com certa dificuldade de se
aproximar do mercado. A filosofia de um
Instituto como o Weizmann é muito interessante para a nossa realidade”, explica
José Policarpo de Abreu.
Um recurso natural que gerou e gera,
em Israel, um grande desenvolvimento
científico e tecnológico é a água. A necessidade de abastecimento aquífero do
país fez com que os cientistas criassem
mecanismos de extração e dessalinização
das fontes de abastecimento da população.
Para se ter uma ideia, o mar que fornece
36
água para os israelenses é o da Galileia,
conhecido por alto teor de sal em suas
águas. A empresa, que se destaca na realização desse processo de extração e dessalinização é a Mekorot, responsável por
80% do abastecimento de água potável
em Israel e por reaproveitar 75% do que
é fornecido. A corporação possui laços
de cooperação com diversas nações. Um
projeto que merece destaque é o de “Gerenciamento Sustentável dos Recursos
Disponíveis de Água com Tecnologias Inovadoras”, consórcio composto por Alemanha, Jordânia, Palestina e Israel. O grupo
busca desenvolver tecnologias para solucionar, de modo sustentável, o problema
de escassez de recursos hídricos do Vale
da Baixa Jordânia.
De acordo com José Policarpo, houve uma demonstração de interesse por
parte da empresa israelita de iniciar uma
parceria com a Companhia de Saneamento
de Minas Gerais (Copasa). A Mekorot já
estabeleceu laços de convênio no Brasil,
porém no Estado de São Paulo, com a
empresa de abastecimento de água, a Sabesp. Assim que chegou de Israel, o diretor
José Policarpo agendou uma reunião com
representantes da empresa de abasteci-
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
mento mineira e apresentou como funciona a Mekorot e a possibilidade de acordo
entre as empresas. “Passei os contatos da
Mekorot para a Copasa e mostrei que a
FAPEMIG pode ajudar com o lançamento
de uma chamada de trabalhos, que possam
contribuir com as duas empresas, mas se
eles quiserem podem estabelecer acordos
de transferência tecnológica sem o envolvimento da Fundação”.
Outra possível associação é do
Departamento de Engenharia Elétrica da
UFMG e do Instituto Israelense de Tecnologia (Technion). O professor Marcos
Pinotti, em reunião com o professor do
departamento de Engenharia Mecânica,
Izhak Etsion, identificou áreas de pesquisas em comum entre as duas instituições:
a tribologia, que utiliza a técnica LST (sigla em inglês de texturização de superfície por laser) e a biomimética, tecnologia
inspirada na natureza. Desde esse primeiro contato, as instituições de ensino estão
em negociação para a assinatura de termo
de cooperação. A assessora da Sectes
Cynthia Rocha avalia que o fato de Israel
disponibilizar para o mercado um grande número de engenheiros por renda per
capita aponta um caminho interessante
de intercâmbio para a engenharia do Estado. “Seria excelente que os estudantes
mineiros tivessem Israel como opção de
intercâmbio e que, da mesma forma, as
universidades mineiras pudessem receber estudantes israelenses. Nada impede
que possamos fazer os contatos necessários para que as universidades mineiras
assinem acordos com as universidades
israelenses”.
A inovação, lá e aqui
As diferenças entre Brasil e Israel
no que tange o investimento em inovação estão atreladas às suas realidades
econômicas e geográficas. As necessidades econômica e social geraram os
desenvolvimentos tecnológico, científico e inovador dos israelenses, colocando-os no topo da lista das nações
inovadoras. Já no Brasil o processo
está caminhando lentamente. De acordo
com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
(CNPq), a inovação nacional ocupa no
mundo a 47ª posição, enquanto a tecnologia alcançou o 8º lugar, podendo,
até o ano de 2012, alcançar a quinta
posição mundial.
Nesse quadro nacional, na opinião
de José Policarpo, Minas se apresenta
“bem posicionada no quesito inovação”.
O diretor entende que Minas, por meio da
FAPEMIG, em ação conjunta com a Sectes e a Federação das Indústrias do Estado
de Minas Gerais (Fiemg), tem conseguido
transformar em realidade a inovação do
Estado. “A partir da criação da assessoria
adjunta de inovação da Fundação, com os
departamentos de Relações Empresariais,
Inovação, Propriedade Intelectual e Ciência
e Tecnologia conseguimos uma estrutura
que oferece o suporte necessário para a relação empresa e pesquisador. Além disso,
estamos induzindo a inovação no Estado
pregando a aplicação da tripla hélice: governo, academia e empresa. A academia
gera conhecimento e a empresa, inovação.
E nós temos o papel de aproximá-las”. explica. Outro ponto que pode transformar a
inovação tanto nacional quanto mineira é
a aprovação do novo Código da Ciência,
proposta de lei encaminhada ao Congresso
Nacional, que visa à criação de uma legislação própria para as atividades de CT&I
no Brasil, reduzindo gargalos e burocracias da legislação atual.
Estreitando
relações
A fim de aproximar o diálogo
entre Minas e Israel para a realidade
da inovação do Estado a FAPEMIG
realizou no dia dez de novembro,
às 14h, no auditório da Fundação,
a palestra The energy Challengebiofuels put in perspective com o
professor David Cahen, do departamento de Materiais e Interfaces do
Instituto de Ciências Weizman. O
evento tem como público-alvo pesquisadores e estudantes que desenvolvem estudos nas áreas de energia
sustentável e empresas.
Já no primeiro semestre de
2012 a FAPEMIG recebe a vice-presidente de propriedade intelectual da
incubadora Yissum, ligada à Universidade Hebraica de Jerusalém Renee
Ben- Israel. O tema da palestra é o
relato de como a empresa protege e
comercializa a propriedade intelectual da Universidade.
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
37
ALEMANHA
Diálogos que
ampliam horizontes
38
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
Acordos com DFG e
DAAD proporcionam
a pesquisadores de
Alemanha e Minas
Gerais cooperarem em
diversas áreas
Fabrício Marques
Foto: Divulgação
Ato de assinatura do Memorando de Entendimento entre os presidentes da FAPEMIG, Mario Neto Borges, e
da DFG, Matthias Kleiner, na Embaixada Alemã em Brasília, no dia 18 de agosto de 2011
Entre 1990 e 1992, Ciomara Ferreira Campos, da Universidade Federal de Ouro Preto
(Ufop), avançou nos estudos para ampliação de
um glossário de Engenharia Mineral. No ano de
2000, Cristina Helena Ribeiro Rocha Augustin, da
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), fez
estágio na Universidade de Leipzig para apresentar
pesquisas desenvolvidas pelo Núcleo de Estudos
Ambientais e Recursos Hídricos (Negeo), estabelecendo convênio de Cooperação Científica entre as
instituições mineira e alemã. Finalmente, em 2007,
Rita Amélia Teixeira Vilela, da Sociedade Mineira
de Cultura (SMC), esteve às voltas com a Metodologia Hermenêutica Objetiva para Análise da Escola
Contemporânea. Aparentemente sem ligação, as
três pesquisadoras têm em comum o fato de terem
seus estudos beneficiados, entre diversos
outros pesquisadores, pelo acordo firmado
entre a FAPEMIG e o Serviço Alemão de Intercâmbio Acadêmico (Daad).
O acordo com o Daad tem três objetivos: permitir projetos de pesquisa em
conjunto, conduzidos por cientistas e grupos de pesquisa tanto no Brasil quanto na
Alemanha; intercâmbio de estudantes, professores e pesquisadores; criação de uma
“Amizade Internacional” para apoiar as
atividades de cooperação. Além do Daad,
outra instituição com a qual a FAPEMIG
firmou laços é a Fundação Alemã de Pesquisa Científica (DFG). Conheça, a partir
de agora, um pouco desses dois acordos.
Foto: Divulgação
Leibniz-Institute of Freshwater Ecology and Inland Fisheries, em Berlim
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
39
Foto: Arquivo
Rita Meyer, do Daad
POR DENTRO
DO DAAD
O escritório do Daad no Rio de
Janeiro, fundado em 1972, coordena atualmente mais de 30
programas de intercâmbio para
estudantes e pesquisadores brasileiros e atua em parceria com as
agências brasileiras de fomento.
40
Fundação Alemã
de Pesquisa Científica (DFG)
A cooperação entre a Fundação
Alemã de Pesquisa Científica (DFG) e a
FAPEMIG desenvolveu-se em duas etapas, iniciando-se em outubro de 2009,
com base em uma carta de entendimento. Neste acordo, as duas fundações
começaram a cooperação em fomentar
um grande workshop na área de Biologia
de Sistemas, entre muitas universidades
alemãs e mineiras. E um projeto individual na área de Agricultura/Hidrologia
entre o Leibniz-Institute of Freshwater Ecology and Inland Fisheries, em Berlim, e o Departamento de Engenharia de Biossistemas,
da Universidade Federal de São João del Rei.
Em 18 de agosto de 2011, em Brasília,
foi assinado um acordo entre os presidentes
da FAPEMIG, Mario Neto Borges, e Matthias
Kleiner. Este Memorando substitui a carta de
entendimento de 2009. “É uma boa e segura
base para criar cooperações em várias áreas
de pesquisa científica entre a Alemanha e o
Estado de Minas Gerais”, afirma o diretor da
DFG, Dietrich Halm.
O acordo tem um prazo de cinco anos
(até 2016) e vai ser prolongado automaticamente num modo bianual. “Com isso,
criamos uma base bem definida e segura
pelos pesquisadores que querem estabelecer projetos conjuntos entre Alemanha e
Minas Gerais”, observa Halm.
A partir do memorando deste ano,
abriu-se espaço para pesquisas na área de
Água e Mineração. No momento, são identificados grupos de pesquisadores na Alemanha e em Minas, dentro dessa área de
conhecimento. Esses pesquisadores, que
devem apresentar grande experiência nesse campo, vão definir os temas mais emergentes para projetos de pesquisa durante
um workshop temático que é planejado
para o próximo ano. Depois as propostas
podem ser submetidas para a DFG e para a
FAPEMIG, simultaneamente.
“Atualmente, recebemos propostas
em ambas as agências para um projeto
teuto-mineiro na área de Águas Superficiais, especificamente sobre fluxos em
relação à mudança do uso da terra. Esperamos mais e mais propostas conjuntas no
futuro”, diz o diretor da DFG.
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
Segundo Dietrich Halm, o acordo
permite que os pesquisadores da Alemanha e do Estado de Minas Gerais possam
cooperar em qualquer área de pesquisa.
Mas algumas áreas já foram identificadas
como aquelas que têm recebido um maior
interesse das comunidades científicas de
ambas as fundações: Águas e Atividades
Minerais, Agricultura, Nanotecnologia, Engenharia e Medicina.
“Outra importância do acordo FAPEMIG/DFG é que podem ser incluídos
jovens pesquisadores de doutorado ou
mestrado com estadas de intercâmbio em
qualquer projeto”, explica.
De modo geral, comenta Halm, a cooperação científica entre a Alemanha e o
Brasil está crescendo mais e mais. Pesquisadores dos dois países querem pesquisar e publicar conjuntamente. “A mesma
tendência é válida para a cooperação com
Minas, que é um Estado com uma paisagem científica bem diversa e interessante.
O Estado de Minas tem 17 universidades
federais, estaduais e instituições não-universitárias de pesquisa básica e aplicada.
Com isso, Minas Gerais torna-se também
um lugar científico muito atrativo em nível
internacional”.
E quais são os benefícios dessa
parceria? Halm responde que tanto a FAPEMIG quanto o DFG fomentam projetos
de pesquisa científica por critérios de excelência e de caráter inovador. “Isto é uma
base que garante uma cooperação num
nível alto e que promove pesquisadores de
excelência”, avalia.
Para Halm, um dos maiores benefícios nesta parceira é de complementar-se
e de aprender um lado com o outro. Isto
vale não só entre pesquisadores em projetos conjuntos, mas também entre a DFG e
a FAPEMIG.
Serviço Alemão
de Intercâmbio Acadêmico
Desde o final dos anos de 1980,
o Serviço Alemão de Intercâmbio Acadêmico (Daad) mantém um convênio
com a FAPEMIG. O último acordo foi
assinado em março de 2010, por um
período de cinco anos. Ao longo destes
anos foram beneficiados aproximada-
mente 20 professores brasileiros e 20
alemães. Trata-se de um programa de
intercâmbio de curta duração, denominado Intercâmbio de Cientistas, para
professores/pesquisadores doutores
com vínculo em uma instituição de
ensino superior ou em um instituto de
pesquisa. As missões têm a duração de
um mês, no mínimo, a três meses, no
máximo. O acordo finda em 2014, mas
poderá ser renovado.
“O objetivo do programa é apoiar a
mobilidade de professores/cientistas brasileiros e alemães para fortalecer a pesquisa
e a internacionalização das instituições de
ensino superior e de pesquisa, sem restrições de áreas de conhecimento”, afirma a
coordenadora de programas de intercâmbio de pesquisadores e de programas para
ex-bolsistas do Daad, Rita Meyer.
De acordo com a coordenadora, em
um mundo cada vez mais globalizado, a
internacionalização desempenha um papel
importante para o desenvolvimento e progresso da ciência. “Este é o benefício para
instituições superiores de ensino alemãs e
brasileiras”, completa.
Acordos como esses, entre Alemanha
e Minas, na opinião de Rita Meyer, fomentam
a internacionalização das universidades alemãs e brasileiras, através de projetos entre as
instituições e contribuindo para o desenvolvimento da Ciência.
! SAIBA MAIS
POR DENTRO DA DFG
Universitäten (U) /
Technische Universitäten (TU):
São as universidades tradicionais ou técnicas com cursos voltados
para teoria e pesquisa, com a titulação
de Bachelor (para todas as áreas, exceto Direito e Medicina) ou Staatsexamen (para as áreas de Direito e Medicina) e possibilidade de doutorado.
Fachhochschulen (FH):
São as universidades de Ciências Aplicadas que oferecem um
Bachelor de três anos, podendo ser
exigido um estágio durante o curso.
Após o Bachelor existe a possibilidade
de cursar um Master também em uma
universidade de Ciências Aplicadas.
Não oferecem cursos de doutorado.
O ano acadêmico é dividido em
dois semestres: o semestre de verão
vai de abril a setembro, e o semestre de inverno de outubro a março.
O período não-letivo é muitas vezes
preenchido com trabalhos científicos
e preparações para apresentações para
o próximo semestre. Alguns professores costumam agendar provas durante
as férias. Muitos estudantes alemães
aproveitam as longas férias para adquirir experiência profissional através
de estágios.
FONTE: DAAD/DFG
Do ponto de vista organizacional, a DFG é uma associação de direito privado.
Seus integrantes são universidades alemãs, institutos de pesquisa sediados fora das
universidades, associações científicas e as academias de ciências. Para realizar suas
atividades, a entidade dispõe anualmente de mais de 2 bilhões de euros, verba recebida principalmente do governo federal da Alemanha (65%) e de governos estaduais
do país (34%), bem como da UE ou de doadores particulares.
Em janeiro de 2011, abriu-se um novo escritório em São Paulo cujo diretor,
Dietrich Halm é quem coordena o trabalho da DFG no Brasil. Intercâmbio de Cientistas (Daad)
Inscrições: fluxo contínuo, com quatro meses de antecedência
Auxílio para cientistas brasileiros que queiram realizar uma estadia de pesquisa em universidades ou institutos de pesquisa alemães
durante período de um a três meses. Uma agência brasileira deve
aprovar o pedido e custear a passagem aérea.
Em contrapartida, o Daad financia a viagem de pesquisadores
alemães convidados para uma pesquisa em universidades ou institutos de pesquisa no Brasil, cabendo à agência brasileira custear os
gastos da estadia.
Requisitos
Benefícios
Doutorado e publicações em
nível internacional
Passagem aérea (paga pela agência
brasileira)
Convite do pesquisador anfitrião
Ajuda de custo mensal no valor de
1.990 euros
Plano de trabalho
FONTE: DAAD
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
41
EUA
Reatando
laços
Trazendo à memória antigos vínculos
de cooperação entre Minas e Purdue,
novo acordo promete avanços
científicos na área de bioenergia
Kátia Brito
Em um breve retorno à história das aproximações entre Minas Gerais e Estados Unidos, encontramos um acordo firmado há quatro décadas
entre a Universidade Federal de Viçosa e a Universidade de Purdue, localizada no estado de Indiana. Nos anos de 1960, as duas instituições de
ensino superior tinham uma parceria que, nas palavras do subsecretário
de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior de Minas Gerais, Evaldo Ferreira Vilela, era “boa demais”. Durante três anos, as Fundações Rockfeller e
Ford financiaram a vinda de pesquisadores norte-americanos para Viçosa.
Eles trouxeram em suas bagagens conhecimentos científicos agrícolas que
42
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
proporcionaram o desenvolvimento dessa
área em Minas e no Brasil. “Foi graças a
isso que se iniciou, em 1961, no Brasil, o
primeiro mestrado stricto sensu nos moldes que conhecemos hoje”, conta Vilela.
Por 15 anos, os doutores de Purdue compartilharam com os estudantes
mineiros de então conhecimentos que
proporcionaram a elaboração do sistema
agrícola de Minas. Agora, uma nova etapa
dessa cooperação está para ser iniciada.
Por meio de uma parceria que envolve,
além das duas universidades, a FAPEMIG,
surgem novas perspectivas para o desenvolvimento da área de bioenergia. “Naquela época, Purdue ajudou Viçosa e o Brasil a
inventar a agricultura que temos hoje. Hoje
essa área precisa ser modificada, pois o
clima, os recursos naturais e o meio ambiente estão em constante transformação.
Portanto, essa cooperação internacional
tem uma importância muito grande”, avalia
Evaldo Vilela.
O novo convênio foi assinado em
maio de 2011, durante o simpósio internacional Frontiers in Bioenergy: United States-Brazil Symposium on Sustainable Bioenergy (Fronteiras em Bioenergia: Estados
Unidos-Brasil Simpósio em Bioenergia
Sustentável), em Purdue. Diferentemente
do que fora firmado no passado com Viçosa, ele prevê o intercâmbio técnico-científico e de pesquisadores. O interesse dos
cientistas estadunidenses está no etanol
brasileiro, principalmente no desenvolvimento de variedades de cana-de-açúcar
melhoradas, no processo de fermentação
e na distribuição do plantio. O Brasil, por
sua vez, quer conhecer o processo desenvolvido por Purdue de fermentação da cana
para transformação em combustível. “Eles
têm uma técnica interessante, na qual utilizam as folhagens que sobram do corte
da cana para fazer o álcool. Essa técnica é
chamada hidrólise enzimática da celulose.
E essa tecnologia nós não temos”, explica o subsecretário. Tal procedimento, se
aplicado na fermentação brasileira, pode
tornar o processo de obtenção do álcool
mais eficiente.
A viabilização da troca de conhecimentos e intercâmbio de cientistas entre
Minas e Indiana, Estados Unidos, vai acontecer por meio do Instituto de Pesquisa em
Energias Renováveis (Bioerg). O instituto é
um escritório gestor que pertence à Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia e
Ensino Superior e objetiva promover e executar pesquisas para o desenvolvimento e
inovação no setor da bioenergia. Segundo
Vilela, as pesquisas passarão pelo Bioerg
a fim de articular trabalhos que se complementem e pesquisadores para atuarem de
forma concentrada na progressão de uma
determinada área da bioenergia. “Existem
pessoas no Bioerg que estudam o tema
e sabem qual é a necessidade científica
para a área no momento. Isso vai ajudar o
Estado a competir naquilo em que somos
bons” explica.
Depois das pesquisas passarem por
especialistas do Bioerg, elas serão submetidas à avaliação da FAPEMIG, que por
sua vez irá selecionar os beneficiados. O
que ainda não ficou decidido é como será
a divisão de investimentos entre as duas
instituições, que estão em fase final de
negociação. De acordo com Vilela, a participação em projetos internacionais abre
muitas portas. “Quando nos aliamos a
instituições que são destaque na área de
Ciência e Tecnologia ganhamos em qualidade. Com isso, criamos oportunidades
para os nossos pesquisadores trabalharem
com o ‘top’ do mundo”.
Parceiro à vista
Outra negociação que ainda está em
fase de diálogo é com o Instituto de Tecnologia de Massachussetts (MIT), um dos
maiores centros de desenvolvimento científico e tecnológico do mundo. O acordo deve
acontecer no mesmo molde de Purdue: fundo conjunto para patrocínio de intercâmbio
de pesquisadores. Entretanto, ainda não
existe nenhum documento formalizando a
cooperação entre FAPEMIG e MIT.
Foto: SXC.HU
Desenvolvimento de variedades de cana-de-açúcar é um dos Interesses dos
cientistas norte-americanos, em relação ao etanol brasileiro
A Purdue University fica situada na cidade de West Lafayette, no Estado de Indiana, localizado na região centro-oeste do país norte americano. Dentro do ranking
das indústrias agropecuárias, o Estado ocupa o primeiro lugar, sendo um dos principais produtores de trigo e milho dos Estados Unidos. Por se localizar na região
central do país Indiana foi importante na expansão norte-americana, rumo ao oeste, no século XIX. Por causa dessa significativa participação Indiana adotou o lema
Crossroads of America (As estradas da América).
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
43
COMPORTAMENTO
Os muitos
sabores do
reino de lá
Histórias de estudantes e
pesquisadores brasileiros
no exterior revelam rotinas
atribuladas, mas, ao
mesmo tempo, coroadas
por conhecimento,
amizade e cultura
Maurício Guilherme Silva Jr.
A maioria dos estudantes e pesquisadores brasileiros desfaz as
malas nos Estados Unidos, na França, em Portugal, na Espanha e na Alemanha. Nos últimos cinco anos, aumentou 23% o
número de estudantes agraciados com bolsa da Coordenação
de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), do
Ministério da Educação. No último ano, 4.900 brasileiros partiram em busca de cursos de graduação, mestrado, doutorado,
pós-doutorado ou estágio no exterior (com bolsas de US$ 870
a US$ 2.300, além de auxílio-instalação e seguro-saúde). A
divulgação, em julho de 2011, de que a Capes e o Conselho
Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq)
concederão 75 mil bolsas de estudo no exterior deve aumentar
ainda mais a presença de brasileiros em centros de excelência
em pesquisa e ensino do mundo.
44
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
Dos múltiplos condimentos recendia o aroma da diversidade. Na animada cozinha comunitária da Internacional
University of Japan, instituição com sede em Niigata, estudantes indianos, mongois, costarriquenhos, quirguistaneses,
japoneses, norte-americanos – e de outras tantas nacionalidades – preparavam juntos suas tradicionais maravilhas gastronômicas. Como nas melhores reuniões ao redor do fogão,
o ápice da “festa” revelava-se ao final: prontas as delícias
multiculturais, todos acabavam por provar um pouquinho de
tudo. Assídua frequentadora de tais “saraus culinários”, a então mestranda Flávia Cerqueira, única brasileira matriculada
na instituição nipônica em 2008, descobriria ali, em meio a
inusitados ingredientes, técnicas e receitas, alguns dos mais
intensos sabores já experimentados em sua permanente busca pelo conhecimento.
Tal prosaica lembrança das refeições coletivas – uma
espécie de “metáfora real” da múltipla e fascinante experiência de um estudante em solo estrangeiro – jamais abandonaria a mente da (hoje mestre) Flávia, atual assessora científica
internacional da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado
de Minas Gerais (FAPEMIG): “Na universidade japonesa,
cada estudante possuía um dormitório individual, mas, na
hora das refeições e das festas, todos se encontravam”, ressalta. Pois do início ao fim do desenvolvimento de sua dissertação, muitos seriam os pratos e folias – assim como os
aprendizados, histórias, valores e sonhos – vivenciados em
terras orientais. “Ao estudar em outro país, convive-se o tempo inteiro com a riqueza de diversas culturas”, ressalta, ao
comentar, de modo bem-humorado, o “choque” diário diante
das inúmeras novidades: “Em algum momento da viagem,
você se dá conta de que, a seu lado, há um colega nascido
no Sri Lanka”.
A “aventura nipônica” de Flávia Cerqueira – que, aliás,
aprendeu o complexo idioma japonês – soma-se à vivência
de milhares de estudantes e pesquisadores brasileiros que,
ano a ano, buscam conhecimento científico em outras nações. Dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (Ocde) revelam que, ao longo de apenas
12 meses, cresceu 14% o número de alunos de nível
superior a estudar ou desenvolver projetos fora do Brasil.
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
45
Segundo o relatório Education at a glance,
de 2010, eles eram 27.571 em 2008, contra 24.157 em 2007. Menos de uma década
antes, no ano 2000, havia apenas 11 mil
em terras estrangeiras.
Rotinas cosmopolitas
Visita técnica a Usina Nuclear em
Niigata – parte de uma disciplina. Flávia
Cerqueira (em pé, a quarta da esquerda
para a direita) e alguns dos amigos que
conheceu no Japão
A ideia de uma experiência no exterior sempre esteve nos planos do médico Marcelo Mamede, que, em 1998, ao
desenvolver trabalho no Distrito Federal,
soube de um edital da embaixada japonesa para estudantes brasileiros: “Naquela
época, interessava-me estudar a tecnologia Tomografia por Emissão de Pósitron
(PET) em pacientes oncológicos, exame
diagnóstico ainda não disponível em nosso país, mas há anos dominado pelos japoneses”. Dito e feito: selecionado para o
projeto, Mamede muda-se para a cidade
histórica de Kyoto, “com seus mais de 2
mil templos budistas”, em março de 1999.
O médico permaneceria no Japão
para um treinamento de dois anos, mas,
aprovado em pós-graduação da Universidade de Kyoto, tem a bolsa estendida
para conclusão do doutorado. Ao iniciar
os trabalhos no Departamento de Medicina Nuclear e Diagnóstico por Imagem do
hospital universitário, acaba por se envolver numa série de projetos de pesquisa, a
exemplo do desenvolvimento de moléculas
para avaliação de neurorreceptores em fumantes. “Durante o doutorado, a rotina de
trabalho era bastante pesada. Tive apenas
Foto: Arquivo pessoal
46
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
dois meses de férias e aproveitei para visitar meus familiares. Apesar disso, tudo era
extremamente proveitoso”, afirma.
De volta ao Brasil em 2004, o médico
descansaria por apenas três meses, para,
em seguida, partir em busca de mais conhecimento. Dessa vez, porém, em território ocidental: Mamede é aceito em curso
de pós-doutorado nos Estados Unidos e
se muda para Bethesda, cidade próxima ao
National Institutes of Health (NIH): “A primeira impressão foi extasiante, pois o NIH
é praticamente uma cidade, com seus mais
de 60 prédios dedicados à pesquisa. Ali,
continuei meus trabalhos de PET em oncologia, mas focados em estudos clínicos”.
Em território norte-americano, a rotina revelara-se um pouco mais leve. Afinal,
na condição de pós-doutor, os projetos
não lhe causavam o estresse da correria
no Japão: “Visitei meus familiares em duas
ocasiões e ainda pude conhecer outros
laboratórios nos Estados Unidos”. Apesar disso, nada de parar por aí: em 2005,
após nova seleção, o pesquisador muda-se
para Boston. “Terminada a primeira fase de
trabalhos, busquei novo pós-doutorado
em um dos hospitais da Universidade de
Harvard, fruto de variações dos temas desenvolvidos no NIH”, explica.
Na visão do viajado médico e pesquisador, a convivência cultural e científica
em outro país está diretamente ligada à
natureza do trabalho desenvolvido. Para
ele, ter dedicação exclusiva aos estudos
e experimentos é a base para melhoria
da formação científica. “Infelizmente, não
temos algo similar nas universidades brasileiras. No Japão, vivenciar o modelo de
trabalho dos médicos pesquisadores foi o
que influenciou minha postura atual”, comenta. Com relação aos Estados Unidos,
Mamede diz ter aprendido muito com os
estudos clínicos e as informações amplamente disponíveis. “Tudo foi extremamente
positivo e construtivo. A meu ver, todos os
pesquisadores deveriam ter experiência no
exterior para comparar e separar o que temos daquilo que é preciso melhorar”, conclui, ao ressaltar que é preciso “valorizar
aquilo que não valorizamos e desmistificar
o que achamos que sabemos, ou pelo menos pensamos que sabemos”.
Fotos: Arquivo pessoal
Paisagens deslumbrantes fizeram parte da rotina de Martha Linhares (de calça preta)
Também cosmopolita, o atual reitor
da Universidade Federal de Minas Gerais
(UFMG), Clélio Campolina Diniz, destaca
que as experiências no exterior são importantíssimas por ampliar a rede de contatos
do pesquisador. No início de sua carreira,
como funcionário do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG), trabalhava como datilógrafo, no setor de Estudos
de Planejamento, ao lado de importantes
professores da UFMG, a exemplo de Fernando Antonio Roquette Reis, Élcio Costa
Couto e Álvaro Santiago.
No mesmo período, ao longo da
década de 1960, Campolina forma-se
em Engenharia e o BDMG realiza acordo
com o Instituto Latinoamericano de Planificação Econômica (Ilpes), com sede em
Santiago, no Chile. “Por lá, liguei-me a
um grupo de importantes pesquisadores
brasileiros e fui convidado, por Carlos
Matos, ex-presidente do Banco Central, a
fazer um curso de longa duração”, conta.
Tal oportunidade permitiu que ele se encantasse pelos estudos econômicos. “De
volta ao Brasil, fiz mestrado na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e,
logo depois, veio a ‘opção pela pobreza’:
larguei o trabalho no BDMG e comecei
minha carreira na UFMG”, diz.
Na Universidade, Clélio Campolina
assume o Departamento de Economia da
Faculdade de Ciências Econômicas (Face)
e começa a trazer visitantes estrangeiros a
Belo Horizonte. A ideia de internacionalização revelava-se cada mais próxima de sua
realidade: “Após o doutorado, também na
Unicamp, passei um ano em Oxford. De lá,
fui para a Itália e, então, para a University
Of Rudgers, nos Estados Unidos, onde me
liguei à professora Ann Markusen, com
quem trabalho até hoje, 20 anos depois”.
Por meio das pesquisas ao lado
de Markusen, o atual reitor da UFMG
realizou dezenas de contatos em todo o
mundo, a ponto de trabalhar com pesquisadores de países como Coreia do Sul,
Japão e Estados Unidos, além de participar de comissões científicas internacionais. “Permaneço, contudo, um ‘capiau
cosmopolita’. Saí lá da barranca do rio e
a coisa mais difícil, para mim, foi mudar
30 quilômetros, quando eu tinha 12 anos.
À época, fui morar com minha avó, que
depois morreu, e eu nunca mais morei na
casa dos meus pais”, afirma.
Para o físico Felipe de Oliveira Alves,
doutor em astrofísica pela Universidade de
Barcelona, a rotina de trabalho de um pesquisador no exterior não se distingue muito de suas atividades na terra natal. “Minha
rotina profissional na Espanha e, agora, em
Bonn, na Alemanha, onde tenho contrato
de pós-doutorado, não é tão diferente da
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
47
que eu tinha no Brasil. Diariamente, sigo
ao instituto e desenvolvo minha pesquisa,
sempre com uma paradinha para o café”,
conta, ao ressaltar que a grande diferença,
em relação à realidade brasileira, está a
seu redor: “O nível de internacionalizacão
num instituto de pesquisa europeu é incrivelmente alto, tanto que o idioma padrão, por aqui, é o inglês”. Além disso, há
grande facilidade para desenvolver contatos profissionais, posto que, diariamente,
encontra-se com astrônomos visitantes, a
ministrar palestras ou cooperar com pesquisadores locais. “Isso é certamente uma
das maiores aportações profissionais que
ganhei por trabalhar no exterior: o dinamismo cooperativo”, conclui.
A gente não
quer só pesquisa
“O nível de
internacionalizacão num
instituto de pesquisa
europeu é incrivelmente alto,
tanto que o idioma padrão,
por aqui, é o inglês”.
Felipe de Oliveira Alves
Físico
48
Nem só de estudos e desafios, porém, sobrevivem os pesquisadores. A vida
em outro país também se revela a oportunidade para que se aprimorem em línguas
e descubram as belezas de outras culturas,
tradições e... amizades. Professora da Universidade Federal do Triângulo Mineiro
(UFTM), Martha Maria Prata Linhares não
sentiu dificuldades em se adaptar ao Canadá – onde realizou doutorado sanduíche
na Queen’s University – por conta, justamente, da gentileza das pessoas: “Apesar
do frio intenso, adaptei-me com facilidade.
Os canadenses são muito gentis e me cercaram de atenções e cuidados. Lá, não me
senti estrangeira no Canadá, pois minha
cultura foi muito bem aceita”.
Na instituição onde estudou, a pesquisadora convivia com diversos outros
estudantes e professores estrangeiros. Além
disso, a cidade de Kingston, sede da universidade, conta com excelente infraestrutura
e grande oferta de casas e quartos para
alugar. Some-se a tais vantagens a ininterrupta movimentação artística do lugar.
“A programação cultural da cidade nos
finais de semana era de ótima qualidade,
com muitas apresentações musicais. Isso
me fez sentir adaptada logo nos primeiros
dias”, destaca.
Pois diversão é o que realmente não
faltou à rotina de Martha. Todos os dias,
ela acordava cedo para as aulas na univer-
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
sidade e, apesar do frio intenso, seguia a
pé, “pois gostava da caminhada e sempre encontrava esquilos pelo caminho”,
afirma, ao descrever, ainda, suas variadas
atividades, digamos, extracurriculares: “As
terças-feiras pela manhã eram especiais,
pois ia à Stone House, a casa de pedra, fazer arte. Trata-se da sede do programa Arts
Matter e um dos espaços disponíveis para
que os professores da faculdade de Educação possam criar”. Além disso, a professora visitava escolas integrantes do projeto
Learning Through the Arts e participava de
pesquisas especiais. “Fomos ao campo algumas vezes e, em determinado momento,
fizemos observações em uma escola. Esta
pesquisa introduziu-me às questões relativas ao ‘ritmo’ na aprendizagem, tema novo
para mim à época, que depois acabei agregando à minha tese”.
Os instantes de entretenimento também incluíam passeios, pequenas refeições e lanches nas casas dos professores
da universidade, além de “cafezinhos no
Second Cup e leituras na Livraria Índigo”.
Para não falar do saboroso hot apple cider,
o suco de maçã quente, das caminhadas
pela Princess street – a principal rua do
centro de Kingston –, a apreciar os brechós e as pequenas galerias de arte. “Também gostava muito de caminhar na beirada
do lago e tirar fotografias”, recorda-se, ao
dizer, emocionada, que os laços de amizade que construiu, na ocasião, permanecem
firmes: “Voltei ao Canadá para participar
de evento científico e visitar meus amigos.
Uma delas, a Katharine, também já veio ao
Brasil e passou alguns dias comigo”.
Em suas experiências no exterior, o
médico Marcelo Mamede passava os momentos de lazer com os amigos que cultivou durante a jornada estrangeira: “Em
território japonês, o período foi de intensa
imersão em várias culturas, mas, principalmente, na local. Nos Estados Unidos, todos
diziam que ‘quem morou no Japão, mora
em qualquer outro lugar!’. Fingia compreender a piada, mas somente aqueles que
vivenciaram a cultura entenderiam o valor
da experiência”. O pesquisador confessa,
contudo, que a vida nos EUA foi realmente mais tranquila, em função dos poucos
choques culturais. O que não quer dizer
Foto: Arquivo pessoal
que os olhares enviesados tenham se dissipado completamente: “Ser americano do sul era motivo de preconceito, como se
eu fosse imigrante ilegal. Tudo se desfazia quando mencionava
que era pesquisador do NIH ou de Harvard”.
Atualmente em Bonn, na Alemanha, o físico Felipe Alves
diz contar com diversos momentos e opções de lazer. Além disso, tudo em sua rotina é motivo de surpresa: “Afinal, minha
vida diária é toda cercada por uma cultura distinta e por comportamentos diferentes daqueles a que estamos acostumados
no Brasil. Eu me divirto indo ao curso de idiomas ou ao comprar comida num supermercado onde não existem, por exemplo, salgadinhos!”. O pesquisador chama a atenção, ainda, para
uma interessante característica dos europeus, que “valorizam
muito seu tempo livre e não são workaholics como os americanos. Isso se encaixa muito bem com nossa cultura brasileira.
Nós, cientistas não somos todos ‘nerds’ como se imagina”, ressalta, de modo bem-humorado.
Por fim, quanto à fascinante oportunidade de morar no
exterior, o depoimento de Felipe parece resumir os sentimentos
de outros milhares de pesquisadores que, ano a ano, buscam
conhecimento em longínquos horizontes: “Morar no exterior
foi de longe a experiência mais interessante da minha vida. Eu
me integrei muito à cultura catalã e tento fazer o mesmo na
Alemanha. Acho que essa oportunidade é única: saber que há
um mundo que pode ser totalmente diferente do que vivenciamos até hoje e absorver o máximo disso. O medo de deixar o
Brasil, há cinco anos, foi totalmente substituído por tudo que
conquistei aqui. Afinal, sempre deve haver espaço para o novo
em nossas vidas. Recomendo!”
Foto: Arquivo pessoal
Martha Linhares em frente à Queen’s University, no Canadá,
onde realizou doutorado sanduíche
Na tradição do Halloween, no Canadá, o que não faltam são amigos inusitados
São seus olhos...
MINAS FAZ CIÊNCIA quis saber dos pesquisadores
entrevistados pela reportagem o que seus pares, no exterior, acham dos cientistas brasileiros. Confiram:
“Os estrangeiros veem os pesquisadores brasileiros
conforme nossa postura ética e construtiva. Há profissionais extremamente qualificados no Brasil, mas faltam recursos para projetos inovadores. Ainda estamos presos a
conceitos que não fazem sentido na atualidade. Precisamos de gerentes de processos administrativos com visão
multidisciplinar, mais interessados no desenvolvimento de
várias áreas (menos beneficiadas), para geração de pesquisadores que saiam, mas retornem.”
Marcelo Mamede, médico
“Os pesquisadores brasileiros são muito respeitados.
Na astrofísica e, acredito, na física, somos vistos como
trabalhadores competentes. Como exemplo, ressalto que o
Brasil, com apenas 2% de tempo de observação nos telescópios Gemini, possui uma das melhores frações – número
de publicações/tempo de observação – dentre os parceiros
neste consórcio. Outro exemplo é que, como novo membro
do ESO, conseguimos ter uma dentre as poucas propostas
de observação aceitas no novo interferômetro de antenas
instalado no Chile: ALMA. A concorrência, para pedir tempo nesse instrumento, foi muito alta e, por isso, poucos
projetos foram galardeados. Cada vez mais, enfim, o mundo científico se interessa pelos pesquisadores brasileiros.”
Felipe Alves, físico
“A partir dos contatos que realizamos, nossas redes
vão sendo criadas e pesquisadores vêm até nossas universidades, participam conosco de nossas pesquisas e eventos. Além disso, somos convidados a participar de eventos
e a nos integrarmos em projetos e pesquisas com grupos
de outros países. A aprendizagem é de todos”
Martha Maria Prata Linhares
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
49
Hely Costa Jr.
VARAL
50
MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011
Download

Edição em PDF