MORTALIDAE DE LAGARTAS DE Anticarsia gemmatalis (Lepidoptera: Noctuidae) ATRAVÉS
DE FUNGO ENTOMOPATOGÊNICO
OLIVEIRA, Fábio Rodrigo de1; DEQUECH, Sônia Thereza Bastos1; MACHADO, Daniele Franco
Martins; MORAES, Jonas1; SILVA, Antônio Carlos Ferreira da1; AGUIAR, Anderson Rossi1,
GONÇALVES, Carlos Eduardo Prates1, FORNARI, Rodrigo1
1
Programa de Pós-Graduação em Agrobiologia – Universidade Federal de Santa Maria
E-mail primeiro autor: [email protected]
RESUMO
A infestação de lagartas em cultivos agrícolas pode ocasionar perdas econômicas severas,
quando estas não são controladas de forma eficiente. A lagarta da soja, Anticarsia gemmatalis, é
considerada a principal praga dessa cultura, causando desfolhamento e podendo levar a destruição
completa da planta, o que refletirá em perdas significativas de produção. Para o seu controle,
geralmente são utilizados métodos químicos, com a utilização de inseticidas. Esses produtos, quando
utilizados de forma incorreta ou indiscriminada, podem causar danos ao meio ambiente (solos, águas
e ar), a outros organismos e a saúde do homem, além de resistência dos insetos-pragas. Nesse
sentido, há uma busca constante por métodos de controle menos danosos e mesmo assim eficientes.
O controle biológico através de fungos entomopatogênicos é uma alternativa consistente para o
controle de lagartas, desde que observadas algumas particularidades com relação a produção dos
microrganismos e utilização no campo. A primeira etapa do processo de utilização de fungos
entomopatogênicos é a identificação de gêneros que possam causar um bom nível de mortalidade na
praga que se procura controlar. Esse trabalho demonstrou a eficiência de determinado gênero de
fungos causadores de mortalidade em lagartas da soja, visando posteriormente a utilização desses
microrganismos em estratégias de controle biológico.
Palavras-chave: controle biológico, entomopatógeno, lagarta da soja
1. INTRODUÇÃO
A infestação de lagartas em cultivos agrícolas pode ocasionar perdas econômicas
severas, quando estas não são controladas de forma eficiente. Em culturas como a soja
(Glycine max) e o milho (Zea mays), que se destacam pelo grande potencial econômico no
Brasil, as lagartas podem reduzir significativamente a produção e a lucratividade da lavoura,
caso alcancem um alto nível de dano. Dentre as principais pragas que atacam a soja,
podem se destacar lagartas de Anticarsia gemmatalis Hübner, 1818 (Lepidoptera:
Noctuidae), conhecida como lagarta-da-soja e considerada uma praga principal da cultura, e
Pseudoplusia includens Walker, 1857 (Lepidoptera: Noctuidae), considerada praga
secundária. Já na cultura do milho Spodoptera frugiperda J.E. Smith, 1797 (Lepidoptera:
Noctuidae), conhecida por lagarta-do-cartucho, é uma praga principal e de difícil controle.
A lagarta-da-soja é considerada a principal praga desfolhadora da soja (Glycine max.
L). Mesmo em baixas densidades populacionais, esse inseto causa danos que vão desde o
desfolhamento até a destruição completa da planta. Esse desfolhamento compromete o
enchimento das vagens, com consequente redução na produção dos grãos (MENDONÇA,
2009).
Para o controle da lagarta-da-soja, o mais usual é a utilização de inseticidas
químicos. Porém, o uso intensivo de agrotóxicos para o controle de pragas na agricultura
tem, reconhecidamente, promovido diversos problemas de ordem ambiental, como as
contaminações dos lençóis freáticos, rios, solo, animais, alimentos, intoxicação de
agricultores, bem como promoverem o surgimento de raças de organismos resistentes.
Outro desequilíbrio que esses produtos podem causar é a eliminação de microorganismos
responsáveis pela degradação de matéria orgânica ou de organismos benéficos utilizados
em programas de controle biológico, causando diversos problemas no meio ambiente
(CANPANHOLA & BETTIOL, 2003). Além disso, o uso contínuo e exclusivo de defensivos
agrícolas, por exemplo, tem resultado na ocorrência de insetos e patógenos resistentes a
determinados produtos, que nem sempre são diagnosticados (GHINI & KIMATI, 2000).
Dentre as alternativas para a redução do uso de agrotóxicos, o controle biológico é
um dos mais discutidos, podendo tanto aproveitar o controle natural quanto realizar a
introdução de um agente de controle.
Nesse sentido, os fungos causadores de doenças em insetos são organismos com
grande potencial para o controle de insetos-praga devido à capacidade de supressão de
populações desses artrópodes, vasta gama de hospedeiros e possibilidade produção
industrial desses agentes (LEITE et. al., 2003).
O objetivo do trabalho foi, portanto, isolar fungos entomopatogênicos a partir de lagartas
presentes em culturas de soja e de milho na região central do Estado do Rio Grande do Sul
e utilizá-los como possíveis agentes de controle microbiano de A. gemmatalis. Com isso,
buscou-se encontrar uma gênero que causasse significativa mortalidade à lagarta-da-soja e
que estivesse adaptada às condições climáticas da região, podendo ser, no futuro, utilizada
como uma importante ferramenta no controle desse inseto-praga e na redução no uso de
agroquímicos.
2. METODOLOGIA
2.1.
Isolamento dos microrganismos
No Laboratório de Interação Microrganismos Ambiente do Programa de Pós- Graduação
em Agrobiologia da Universidade Federal de Santa Maria foram isolados diversos fungos a
partir de lagartas contaminadas de A. gemmatalis e de Pseudoplusia includens retiradas de
lavouras de soja, e de Spodoptera frugiperda em milho. As lagartas foram coletadas
aleatoriamente, conforme verificação de contaminação no campo, em lavouras situadas nos
municípios de Santa Maria, Restinga Seca, Formigueiro e São Pedro do Sul, localizados na
Região Central do Estado do Rio Grande do Sul.
Para o isolamento dos microrganismos utilizou-se o meio de cultura BDA (200 g/L de
batata, 20 g/L de dextrose e 20 g/L de ágar), raspando-se a superfície das lagartas
contaminadas com uma pinça esterilizada e adicionando-se o micélio do fungo no meio de
cultura. As placas originadas foram incubadas em câmara climatizada tipo BOD, com
temperatura de 25°C e fotoperíodo de 12 horas, e mantidas nessas condições até serem
utilizadas no experimento.
2.2.
Criação de Anticarsia gemmatalis
Lagartas de A. gemmatalis, adquiridas da criação oriunda da Escola Superior de
Agricultura Luiz de Queirós (ESALQ/USP), foram criadas em laboratório utilizando-se dieta
artificial. Os adultos, que emergiram a partir dessas lagartas, foram colocados em gaiolas de
criação (Figura 1A). A alimentação dos adultos constou de uma suspensão de mel a 10 %. A
oviposição foi realizada em papel filtro, fixado nas paredes das gaiolas. As posturas foram
transferidas para recipientes (bandejas) plásticos onde permaneceram até a eclosão das
larvas. Após eclodirem, as lagartas foram transferidas individualmente para recipientes
plásticos de 100 mL contendo dieta que servia como base alimentar até a fase de pupa
(Figuras 1). Na Tabela 1 está apresentada a composição da dieta alimentar utilizada para a
criação das lagartas.
B
A
Figura 1 - A. Gaiola com adultos de Anticarsia gemmatalis. B. Potes com dieta alimentar, onde eram
mantidas as lagartas.
Tabela 1 - Composição da dieta alimentar utilizada para a criação de lagartas de Anticarsia
gemmatalis.
Ingrediente
Água
Feijão
Proteína de soja
Levedo de cerveja
Gérmen de trigo
Caseína
Complexo vitamínico
Ácido sórbico
Ácido ascórbico
Formol
Nipagin
Ágar
2.3.
Quantidade
3.400 mL
250 g
100 g
125 g
200 g
75 g
20 g
6g
12 g
12 mL
10 mL
46
Montagem do experimento
Em recipientes plásticos de 1 L, previamente lavados com hipoclorito 1% e álcool 70%,
foram acondicionadas oito lagartas. Nessas lagartas, foram testados dez fungos isolados
das lagartas previamente mencionadas (três de A. gemmatalis, quatro de P. includens e três
de S. frugiperda). Além disso, um dos tratamentos consistiu de apenas água destilada e
esterilizada, para servir como testemunha, totalizando-se assim, onze tratamentos (Tabela
2). O fundo dos recipientes foi coberto com areia esterilizada, para evitar o excesso de
líquido, que pudesse influenciar nos resultados. Foram realizadas cinco repetições,
totalizando 40 lagartas por tratamento
Foi preparada uma suspensão de esporos dos fungos isolados, em câmara de fluxo
laminar (ambiente asséptico), utilizando-se 5 mL de água destilada e esterilizada,
adicionados na placa de Petri contendo o fungo. Os esporos dos fungos foram desprendidos
do meio utilizando-se alça de Dringalsky. As suspensões foram ajustadas para a
concentração de 1x108UFC.mL-1. Foram espalhados 0,5 mL de cada suspensão de esporos,
em cada uma das lagartas de A. gemmatalis, todas de quarto instar. Posteriormente, foi
adicionado um disco de dieta alimentar, em cada recipiente, para a alimentação das
lagartas. Os recipientes foram mantidos em temperatura de 25 °C, umidade de 60% e
fotoperíodo de 12 horas.
Tabela 2 - Descrição dos tratamentos, com a descriminação das espécies das lagartas das quais o
fungo foi originário, sendo que Anticarsia gemmatalis e Pseudoplusia includens foram
coletadas em cultivos de soja e Spodoptera frugiperda em milho.
Tratamento
Sigla
Especificação
T1
SA1
A. gemmatalis
T2
SA2
A. gemmatalis
T3
SA3
A. gemmatalis
T4
SP1
P. includens
T5
SP2
P. includens
T6
SP3
P. includens
T7
SP4
P. includens
T8
MS1
S. frugiperda
T9
MS2
S. frugiperda
T10
MS3
S. frugiperda
T11
T
Testemunha: água destilada e esterilizada
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
As lagartas tratadas com os diferentes isolados fúngicos foram avaliadas após 72 horas,
observando-se o surgimento do estágio de mumificação, indicativo da morte dos insetos .
Verificou-se que, 95% das lagartas do tratamento T2 (SA2), apresentaram-se em estágio
de mumificação. Em função desse ter sido considerado o melhor tratamento, por ter sido o
único isolado a causar mortalidade às lagartas de A. gemmatalis em um bom nível, foi
realizada a identificação do fungo, até nível de gênero, em microscópio óptico, com aumento
de 10 e 40 vezes. Utilizando imagens de livros e de sites especializados, constatou-se que
se trata do fungo Aspergillus sp. (Figura 5). Aspergillus ochraceus foi citado para o controle
de Atta bisphaerica Forel (Hymenoptera: Formicidae) conhecidas como formigas cortadeiras
(RIBEIRO, 2012) e Aspergillus flavus controlando Musca domestica L. (Diptera: Muscidae),
conhecida como mosca doméstica (SENNA-NUNES, 2002).
Os demais tratamentos não causaram mortalidade significativa às lagartas, pelo menos
até 120 horas de avaliação quando, em alguns casos, as lagartas entraram em estágio de
pupa. O tratamento T11 (testemunha), também não resultou em mumificação e morte das
lagartas, o que demonstra que a mortalidade em T2 foi efetivamente ocasionada pelo fungo
entomopatogênico.
Tabela 3 - Resultados obtidos com a inoculação dos fungos isolados em lagartas de A.
gemmatalis, observando-se estágio de mumificação.
Tratamento
% Lagartas mumificadas (72 h)
% Lagartas mumificadas (120 h)
T1
15
15
T2
95
95
T3
10
10
T4
12,5
12,5
T5
12,5
15
T6
0
0
T7
0
0
T8
15
17,5
T9
10
10
T10
0
0
T11
0
0
B
A
C
Figura 3 - A. B e C. Lagartas de Anticarsia gemmatalis mumificadas, contaminadas por
Aspergillus sp.
A
C
B
D
Figura 5 - A. Esporos de Aspergillus sp.; B. C e D. Estruturas fúngicas (hifas, conidióforos e conídios)
de Aspergillus sp.
1. CONCLUSÃO
Um isolado fúngico do gênero Aspergillus, obtido na Região Central do Estado do Rio
Grande do Sul, ocasionou alto nível de mortalidade em lagartas de A. gemmatalis, em
laboratório, e pode ser explorado para estratégias de controle biológico dessa praga da soja
no campo.
2. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICAS
MENDONÇA, E. G.; OLIVEIRA, M. G. A.; VISÔTTO, L. E.; GUEDES, R. N. C.; RIBEIRO, F.
R.; OLIVEIRA, J. A. O. Determinação da atividade enzimática e do número de bactérias
associadas ao intestino médio da lagarta da soja, Anticarsia gemmatalis, criada em
diferentes dietas. Revista Ceres. N 56. p 018-024. 2009.
CAMPANHOLA,
C.;
BETTIOL,
W.
Métodos
alternativos
de
controle
de
fiotopatógenos. Jaguariuna: Embrapa Meio Ambiente, 2003. 165p.
GHINI, R. ; KIMATI, H. Resistência de fungos a fungicidas. Jaguariúna: Embrapa
Meio Ambiente, 2000. 78p.
MELO, I.S. DE. Agentes microbianos de controle de fungos fitopatogêncos. In:
Controle biológico. Vol. I. MELO, I.S. DE e AZEVEDO, J.L. DE. (Eds.) Jaguariúna,
SP, Embrapa-CNPMA.1998. 264p.
LEITE, L. G.; FILHO, A. B.; ALMEIDA, J. E. M.; ALVES, S. B. Produção de fungos
entomopatogênicos. 92 p. Ed. Alexandre de Sene Pinto. Ribeirão Preto, 2003.
NUNES M. S.; COSTA, G.; BITTENCOURT, V. R. E. P.; SOUZA, E. J. Avaliação in vitro dos
fungos Aspergillus flavus e Penicillium corylophilum em adultos de Musca domestica
(Diptera: Muscidae) Parasitol Latinoam. N 57. p. 9 - 14, 2002.
RIBEIRO, M. M. R.; AMARAL, K. D.; SEIDE, V. E. S.; SOUZA, B. M. R.; DELLA LUCIA, T.
M. C.; KASUYA, M. C. M; SOUZA, D. J. Diversity of Fungi Associated with Atta bisphaerica
(Hymenoptera: Formicidae): The Activity of Aspergillus ochraceus and Beauveria bassiana.
Hindawi Publishing Corporation Psyche. V 2012, 6 p. 2012.
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