MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ FEDERAL DA 7ª VARA CÍVEL DA SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO. Autos nº 2009.61.00.008915-5 (DISTRIBUIÇÃO COM URGÊNCIA) O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, pelo Procurador da República infra-assinado e o CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO, autarquia federal com personalidade jurídica de direito público instituída pela Lei Federal 3.268/57 e regulamentada pelo Decreto 44.045/58, inscrita no CNPJ/MF sob o número 63.106.843/0001-97, sediada nesta capital e subseção judiciária, na Rua da Consolação, nº 753 - Centro, vêm respeitosamente à presença de Vossa Excelência propor a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA em face de UNIVERSIDADE DE SANTO AMARO – UNISA, instituição de ensino superior integrante do sistema federal de educação, mantida pela OBRAS SOCIAIS E EDUCACIONAIS DE LUZ – OSEL, associação civil inscrita no CNPJ sob o número 18.301.267/0001-84, sediada nesta capital e subseção judiciária, na Rua Professor Enéas de Siqueira Neto, 340 – Grajaú, representada em juízo por sua Diretora Presidente DARCI GOMES DO NASCIMENTO, pelas seguintes razões de fato e de direito: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP DOS FATOS A Universidade de Santo Amaro – UNISA é instituição de ensino superior criada e mantida pela iniciativa privada, com sede nesta capital e subseção judiciária1. Integra o sistema federal de ensino por força do disposto no art. 16, inciso II, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394/96)2, e está submetida ao cumprimento das normas gerais da educação nacional e à avaliação da qualidade dos cursos que oferece, nos termos do art. 7º do mesmo diploma legal3. Em 19 de maio de 2008 a Secretaria de Educação Superior do Ministério da Educação aprovou a transferência da gestão da Universidade, anteriormente mantida pela ORGANIZAÇÃO SANTAMARENSE DE EDUCAÇÃO E CULTURA – OSEC, para a associação OBRAS SOCIAIS E EDUCACIONAIS DE LUZ – OSEL, dirigida por DARCI GOMES DO NASCIMENTO4. Tão logo assumiu a gestão da Universidade, a nova mantenedora, a pretexto de promover o que chamou de “reestruturação do seu curso de medicina”5, passou a ordenar ao então diretor da faculdade, PAULO KASSAB, a diminuição da carga horária e a demissão de docentes, como meio de sanear financeiramente a instituição gerida. As consequências da “reestruturação” promovida pela Ré não poderiam ter sido mais nefastas. Elas extrapolam, em muito, a autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeirapatrimonial conferida às Universidades pela Constituição da República, pois repercutem diretamente na qualidade do serviço prestado à coletividade dos alunos matriculados no curso e, em última instância, na própria qualidade dos profissionais de saúde formados no Estado de São Paulo. Daí a necessidade de pronta intervenção do Estado-Jurisdição no sentido de garantir, pelo menos, o cumprimento das normas gerais fixadas pelo Doc. 01. Art. 16. O sistema federal de ensino compreende: I - as instituições de ensino mantidas pela União; II - as instituições de educação superior criadas e mantidas pela iniciativa privada (…). 3 Art. 7º O ensino é livre à iniciativa privada, atendidas as seguintes condições: I cumprimento das normas gerais da educação nacional e do respectivo sistema de ensino; II - autorização de funcionamento e avaliação de qualidade pelo Poder Público; III - capacidade de autofinanciamento, ressalvado o previsto no art. 213 da Constituição Federal. 4 Doc. 02. 5 Doc. 03. 1 2 MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP Ministério da Educação e a observância de padrões mínimos de qualidade do serviço prestado pela Ré. Os gravíssimos vícios de qualidade adiante enumerados foram constatados à exaustão não apenas pelos próprios consumidores do serviço6 – a coletividade de alunos da Faculdade de Medicina da Universidade de Santo Amaro – como também pelos docentes da Universidade7, pelos dirigentes do hospital de ensino conveniado, pela Comissão Estadual de Residência Médica de São Paulo - CEREMSP, pelo Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo – CREMESP, pelos meios de comunicação8, e, finalmente, pela Coordenação-Geral de Supervisão da Educação Superior do Ministério da Educação, órgão avaliador das instituições privadas de educação superior em âmbito nacional. Todas as instituições citadas foram UNÂNIMES em apontar que a Ré, a partir da mudança da associação mantenedora, não vem cumprindo sequer minimamente as obrigações contratuais e legais inerentes à prestação do serviço de educação superior. Transcrevemos abaixo, em ordem cronológica, trechos dos principais documentos produzidos por essas instituições que comprovam o inadimplemento das obrigações a que a Ré estava vinculada: 1. Notificação encaminhada pelo Centro Acadêmico Rubens Monteiro Arruda à Reitora da Universidade, em 17 de novembro de 20089: “Tendo em vista que a Universidade de Santo Amaro – UNISA vem descumprindo a obrigação de prestar ensino de boa qualidade, sobretudo na área de ciências médicas e biológicas, como pode se constatar dos seguintes fatos: (a) O corpo docente da Universidade foi reduzido drasticamente e mais de 25 professores de alta qualificação foram demitidos; (b) Na contratação dos novos professores, além do número ser insuficiente, não houve uma substituição com a mesma qualificação dos anteriores; 6 7 8 9 As manifestações dos alunos do curso de medicina compõe o doc. 04. As manifestações produzidas pelos professores do curso estão reunidas no doc. 05. Doc. 06. Doc. 07. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP (c) Em razão da escassez do quadro de funcionários, estão sendo aproveitados professores de outros cursos/especialidades da Universidade para ministrar as aulas de medicina, sem os devidos conhecimentos peculiares necessários para tal; (d) O número de aulas, por conseqüência das demissões, reduziu de forma bastante significativa, sendo que os alunos eram dispensados por falta de professores para ministrá-las; (...) (e) O cargo de diretoria era preenchido pelo prof. Paulo Kassab até o início de Novembro, quando este pediu demissão. A ausência de um diretor da área médica, com a devida autonomia, prejudica o bom andamento do curso; (...) (g) O Hospital Escola Wladimir Arruda (HEWA), que na época de sua criação foi lançado como um embrião de um hospital escola, foi sendo sucateado ao longo dos últimos anos e hoje é apenas um Ambulatório de Especialidades; (h) A UNISA, no fim do ano de 2007, deixou de ser a administradora do Hospital Geral do Grajaú e passou a se utilizar das instalações mediante a um convênio, com a perda óbvia do valor da relação; (i) As atividades acadêmicas no Hospital do Grajaú foram prejudicadas ao longo de todo o ano de 2008, em função da demora para a assinatura do termo de cooperação com a nova entidade administradora do Hospital; (...) (m) No site da Universidade há informações sobre infra-estrutura, convênios de Hospitais e etc., que não condizem com a realidade; (n) No último exame do CREMESP, de 37 alunos da UNISA que prestaram, somente 9 passaram da primeira fase; etc. Nestas condições, serve a presente para NOTIFICÁ-LA a restabelecer, de imediato, o prometido padrão de qualidade de ensino e sanar todas as irregularidades acima apontadas, assim como, no prazo de 48 horas, comunicar formalmente ao Centro Acadêmico MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP Rubens Monteiro de Arruda as medidas tomadas, sob pena de responder pelas medidas administrativas e judiciais cabíveis, inclusive reparar todos os prejuízos causados aos notificantes, na forma da lei. Vale realçar que qualquer ação a partir desta data que implique em prejuízo da qualidade de ensino, tais como novas demissões de professores, não nomeação do Diretor do curso e abertura de novas vagas será considerada como um agravamento do quadro exposto nesta notificação.” 2. Ofício da Associação Amigos da Faculdade de Medicina de Santo Amaro encaminhado ao Conselho Regional de Medicina em 25 de novembro de 200810. “Alunos e professores têm enfrentado progressivamente, ao longo dos anos, e principalmente no último ano, uma administração de caráter empresarial que cerceia o debate acadêmico e promove demissões de docentes de alta qualificação em função de uma visão economicista sem embasamento pedagógico, comprometendo a quantidade e a qualidade das aulas ministradas aos alunos e as atividades assistenciais didáticas. Durante este período, a comunidade acadêmica, liderada pelo seu diretor eleito, o Prof. Paulo Kassab, tentou promover um diálogo produtivo, buscando uma reestruturação que mantivesse a qualidade do ensino e as atividades assistenciais. Entretanto, todos os esforços do corpo docente foram infrutíferos ante a postura intransigente da atual administração, que prefere promover alterações de estrutura e funcionamento do curso sem levar em consideração as opiniões da comunidade acadêmica. O Prof. Paulo Kassab afastou-se da direção ao final de outubro de 2008. A Faculdade de Medicina está sem diretor, as chefias das disciplinas foram abolidas e as decisões são tomadas de maneira autoritária por pessoas 10 Doc. 08. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP sem experiência na condução de um curso médico. (…) Devido aos fatos relatados, nós docentes da Faculdade de Medicina de Santo Amaro vimos manifestar repúdio pela forma como a instituição tem sido administrada e a nossa preocupação com a qualidade da formação médica dos nossos alunos.” 3. Relatório do Departamento de Fiscalização do Conselho Regional de Medicina- CREMESP, sobre as condições de ensino no Hospital Escola Wladimir Arruda, conveniado à UNISA11: “Conforme as informações obtidas junto aos médicos presentes no local, ocorreu grande número de demissões de preceptores da residência e do internato em novembro último e no corrente mês de dezembro. Em razão disso, há DÉFICIT DE PRECEPTORES EM TODAS AS CLÍNICAS, COM EVIDENTES PREJUÍZOS À FORMAÇÃO DE INTERNOS E RESIDENTES. De acordo com essa avaliação, A SITUAÇÃO SÓ NÃO É INSUSTENTÁVEL PORQUE MUITOS MÉDICOS CONTRATADOS DO HOSPITAL PARA O DESEMPENHO EXCLUSIVO DE ATIVIDADES ASSISTENCIAIS SÃO FORMADOS PELA UNISA E ASSUMEM, ESPONTÂNEA, INFORMALMENTE E SEM NENHUMA REMUNERAÇÃO ADICIONAL, PARTE DO PAPEL DE PRECEPTORES, COM A FINALIDADE DE EVITAR PREJUÍZO MAIOR À FORMAÇÃO DOS NOVATOS. Mesmo assim, porém, AS ATIVIDADES DIDÁTICAS FICAM SERIAMENTE COMPROMETIDAS (…). Após nossa vistoria às instalações do Hospital Escola Wladimir Arruda e as informações colhidas no local, pudemos concluir que: 1. O hospital não possui diretor técnico ou clínico, o que contraria as determinações do Decreto 20.931/92 e da Resolução CFM 1.342/91. (…) 2. As demissões de médicos que desenvolviam formalmente atividades 11 Doc. 09. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP didáticas junto ao internato e à residência médica trouxeram PREJUÍZOS A ESSES PROGRAMAS, E, PORTANTO, À FORMAÇÃO DE GRADUANDOS E PÓS-GRADUANDOS. (…) 6. Em suma, entendemos que o Hospital Escola Wladimir Arruda, pelos problemas enfrentados com a demissão de parte de seu corpo clínico, vem funcionando em condições insatisfatórias, as quais COMPROMETEM O EXERCÍCIO MÉDICO PROFISSIONAL, O ENSINO MÉDICO E A QUALIDADE DA ASSISTÊNCIA DESENVOLVIDA.” 4. Relatório do Departamento de Fiscalização do Conselho Regional de Medicina- CREMESP, sobre as condições de ensino no Hospital Geral do Grajaú, conveniado à UNISA12: “Segundo informações, o Hospital Geral do Grajaú desenvolve atividades de ensino médico, na graduação (internato) e na residência médica, para a UNISA – Universidade de Santo Amaro. Quanto à residência médica o hospital recebe os residentes das seguintes áreas para realizarem seus programas:urologia, cirurgia plástica, neurologia, ortopedia, otorrinolaringologia, mastologia, clínica médica, pediatria, cirurgia, tocoginecologia e cirurgia videolaparoscópica. (…) Desde 16/12 p.p., com o início da greve dos médicos residentes, consequente à demissão de preceptores por parte da mantenedora da UNISA, o programa de residência médica ficou prejudicado. Com a ausência de preceptores e a instituição dispondo apenas de médicos assistencialistas, o programa de residência médica, praticamente, foi interrompido. A instituição [Hospital Geral do Grajaú] foi obrigada a contratar outros profissionais para que os serviços dependentes desses residentes e preceptores não fossem paralisados e os pacientes prejudicados. 12 Doc. 09. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP Segundo apuramos, as demissões dos preceptores ocorreram bruscamente, sem prévio aviso à diretoria do hospital. A rigor, não houve qualquer comunicado formal da UNISA ao hospital, nem mesmo posteriormente à consumação das demissões; estas eram informadas às chefias clínicas pelos próprios residentes, que se viram, de um momento para outro, órfãos da obrigatória supervisão técnica fornecida pela preceptoria. Nessas condições, os responsáveis pelo hospital decidiram pela impossibilidade de manutenção das atividades específicas dos residentes na ausência de preceptores, o que, avaliam, sem dúvida acarretou dificuldades passageiras à administração do hospital e à população à qual presta seus serviços. Convém salientar que o Hospital Geral do Grajaú cede suas instalações, equipamentos, materiais e insumos em geral para que os programas de residência médica sejam desenvolvidos, cabendo à UNISA, exclusivamente, a manutenção do corpo de preceptores no hospital. De todas as áreas onde há residentes, apenas a neurologia e a ortopedia mantinham seus atendimentos de rotina. (…) Após nossa diligência junto ao Hospital Geral do Grajaú e as informações colhidas no local, podemos concluir que: (…) 5. O hospital disponibiliza sua infra-estrutura, equipamentos e insumos em geral para que a UNISA desenvolva seus programas de internato e residência médica. Para a manutenção do primeiro, há contrato formal entre as partes, o que ainda não acontece com o último. Com a demissão de alguns docentes e preceptores houve a interrupção desses programas no HGG. (…) 10. Em suma, entendemos que o Hospital Geral do Grajaú oferece condições adequadas para o exercício médico-profissional e qualidade na assistência desenvolvida. No entanto, é nebuloso MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP o futuro próximo dos programas de internato e residência médica, ante a ausência de um corpo adequado de preceptores.” 5. Ofício encaminhado pelo Hospital Geral do Grajaú em 06 de janeiro de 2009, comunicando o descumprimento, pela Ré, das obrigações ajustadas em convênio13: “A Associação Congregação de Santa Catarina, na qualidade de gestora do Hospital Geral do Grajaú, com fundamento no parágrafo único da Cláusula Quarta do Termo de Cooperação firmado com essa instituição de ensino, comunica o DESCUMPRIMENTO DAS SEGUINTES OBRIGAÇÕES, para providências e regularização no prazo máximo de 10 (dez) dias úteis, a contar do recebimento da presente: (…) Inciso VI – Assegurar a Supervisão dos Estagiários em campo, conforme cronograma estabelecido através da orientação técnica, pedagógica e avaliação do desempenho das atividades exercidas; Inciso VII – Garantir a presença do supervisor da Instituição de Ensino durante todo o período em que os estagiários se encontrarem nas dependências do hospital.” 6. Ofício de 07 de janeiro de 2009, encaminhado pelos alunos do 6º ano do curso de medicina à Secretaria de Educação Superior do Ministério da Educação14: “Considerando ser responsabilidade dessa Secretaria de Ensino Superior do Ministério da Educação a supervisão das Instituições Privadas de Educação Superior, conforme estabelecido na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), nós, alunos do Sexto ano da Faculdade de Medicina da Universidade de Santo Amaro (UNISA), vimos trazer a Vosso conhecimento as dificuldades enfrentadas para as atividades letivas 13 14 Doc. 10. Doc. 11. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP de 2009, quando deveríamos, de acordo com o calendário oficial da Universidade, estar, desde o dia 05 de janeiro, retomando atividades clínicas. Essas dificuldades resultam de um extenso processo de reorientação administrativa pelo qual a UNISA tem passado, com vistas ao saneamento financeiro proposto pela entidade Mantenedora. Para tal, mais de 40 docentes da faculdade de Medicina já foram demitidos (ANEXO I) a maior parte deles no segundo semestre de 2008. No entanto, o número de contratados para reposição dos demitidos foi mínimo (16, segundo a própria Reitora, em reunião realizada no dia 16 de dezembro de 2008 no Conselho Regional de Medicina), sendo que em 05 de janeiro de 2009, NO INÍCIO DO ANO LETIVO, AINDA HAVIA BLOCOS SEM DOCENTES CONTRATADOS E OUTROS EM QUE DOCENTES ESTAVAM DE FÉRIAS E NÃO HAVIA PROFISSIONAIS PARA REPOSIÇÃO. Ressalta-se a grave situação dos alunos que estão passando pelos blocos de “Medicina IntensivaAdulto”, “Urgência e Emergência III”, “Medicina Intensiva Pediátrica e Pronto Socorro Infantil”, “Clínica Cirúrgica II” e “Ambulatório de Especialidades Cirúrgicas”, que NÃO TIVERAM ATIVIDADES ACADÊMICAS POR FALTA DE PROFESSORES PARA MINISTRÁ-LAS. Alunos dos blocos de “ Urgência e Emergência III” e de “Clínica Cirúrgica II” foram proibidos pela Associação Congregação de Santa Catarina, administradora do Hospital do Grajaú, de exercerem qualquer tipo de atividade devido a ausência de preceptores da UNISA. Os profissionais que receberam os alunos nos blocos de “Medicina Intensiva Pediátrica e Pronto Socorro Infantil”, “Gestação de Alto Risco e Mastologia”, “Ambulatório de Especialidades de Clínica Médica - Adulto” e “Clínica Cirúrgica II” não souberam esclarecer se haverá professores da UNISA para supervisionar atividades em todos os dias da semana. A falta de supervisores vai contra as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Superior que diz em seu Art. 7º que MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP “A formação do médico incluirá, como etapa integrante da graduação, estágio curricular obrigatório de treinamento em serviço, em regime de internato, em serviços próprios ou conveniados, e sob supervisão direta dos docentes da própria Escola/Faculdade” . 7. Ofício de 14 de janeiro de 2009, encaminhado pelos alunos do 5º ano do curso de medicina à Secretaria de Educação Superior do Ministério da Educação15: “(...) No dia 12 de janeiro, foi iniciado o internato do 5º ano. Já no primeiro dia de atividades, os discentes puderam constatar a gravidade da situação, no que se refere ao corpo docente, à organização do curso e à indiferença da Universidade frente às dificuldades encontradas pelos alunos. Dentre os principais problemas ocorridos, citamos: (i) Proibição da entrada de alunos no hospital por ausência de preceptores contratados pela UNISA; (ii) Ausência de professores para receber os alunos em disciplinas e horários diversos; (iii) Comunicação da inexistência de aulas e atividades relacionadas em determinados períodos; (iv) Ausência de informação quanto aos nomes dos docentes responsáveis pelas disciplinas do internato; (v) Ausência de plantões previstos na grade curricular em determinadas disciplinas; Diminuição do número de professores por grupo de alunos; (vi) Preceptores que eram responsáveis por uma única disciplina, agora são responsáveis por mais de uma; (vii) Ausência de um profissional da área médica no cargo da diretoria da Faculdade da Medicina, fato verificado desde o início de novembro de 2008.” 15 Doc. 12. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP 8. Relatório da vistoria realizada em 20 de janeiro de 2009, pela Comissão Estadual de Residência Médica do Estado de São Paulo – CEREM/SP16: “Durante a primeira etapa da vistoria propriamente dita, na qual tivemos a oportunidade de conversar com os preceptores dos diversos serviços de residência médica lá existentes, houve uma reclamação em uníssono por parte dos mesmos em relação às demissões recentemente levadas a termo pela reitora da instituição. A maior parte dos presentes também fez referências às PRECÁRIAS CONDIÇÕES DE ENSINO E PESQUISA ADVINDAS DESTE FATO. Fizeram relatos ainda quanto à total falta de perspectivas de manter e levar adiante diversos programas de residência médica (PRM) com destaque para os de Urologia, Clínica Médica, Pediatria, Ginecologia-Obstetrícia, Cirurgia Geral, Cardiologia e Otorrinolaringologia. (…) A etapa seguinte, inicialmente prevista para ser realizada com a reitora, terminou sendo efetuada com os médicos residentes daquele instituição, visto que a primeira se atrasara e não desejava receber os avaliadores naquele momento. Os residentes, nitidamente amedrontados, fizeram referência ao recebimento de diversos telegramas, endereçados mormente aos líderes do movimento de paralisação, exigindo retratações públicas, além de impor condições para que esses mesmos residentes não fossem acionados juridicamente. (…) Ainda nesta etapa da avaliação tivemos condições de observar a total desestruturação dos programas de residência médica, tendo em vista que o relato dos residentes, além da ratificação daquilo que já fora expresso pelos preceptores, demonstrou o evidente assédio moral sofrido pelos integrantes do movimento de paralisação. Naquela que terminou sendo a terceira e última etapa da vistoria, fomos recebidos pela reitora da UNISA, com a qual conversamos longamente. 16 Doc. 13. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP Dentre as várias respostas que recebemos da reitora em relação às reivindicações dos residentes e preceptores, algumas merecem destaque (...). São elas: (…) 4. Foram contratados cerca de 20 profissionais médicos novos, para substituir os preceptores demitidos. O questionamento a respeito do fato deste NÚMERO SER INFERIOR À METADE DO TOTAL DE PROFISSIONAIS DEMITIDOS (cerca de 60) e não ser capaz de suprir a demanda gerada teve como resposta a promessa de mais contratações nos próximos dias (o número de profissionais e as datas não foram especificados). (…) PARECER Existe uma CLARA E INEQUÍVOCA CARÊNCIA NUMÉRICA DE PROFISSIONAIS MINIMAMENTE QUALIFICADOS para levar adiante os Programas de Residência Médica de Clínica Médica, Cirurgia Geral, Pediatria, Ginecologia-Obstetrícia, Cardiologia, Urologia e Otorrinolaringologia. A manutenção dos programas da forma como estão coloca em risco não apenas a formação desses profissionais (residentes), mas sobretudo a saúde e a vida da população que por eles está sendo atendida.” 9. Ofício da Sociedade Brasileira de Urologia à UNISA, de 21 de janeiro de 200917: “A Sociedade Brasileira de Urologia, através da Comissão de Ensino e Treinamento, vem manifestar profunda preocupação com a situação dos residentes do Programa de Residência de Urologia desta prestigiosa instituição de ensino da Universidade de Santo Amaro (UNISA). Tal situação foi motivada pela demissão de vários professores de elevada qualificação, prejudicando sobremaneira os objetivos 17 Doc. 14. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP básicos de ensino e treinamento na assistência médica. A situação atual acarreta prejuízo na formação dos residentes, sobretudo em função da dificuldade dos residentes atenderem seus pacientes no ambulatório, centro cirúrgico, sala de endoscopia e enfermarias, sem a devida supervisão por parte dos preceptores médicos”. Como se vê, Excelência, É PATENTE QUE A RÉ VEM DESCUMPRINDO A OBRIGAÇÃO DE PRESTAR SERVIÇO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR EM CONFORMIDADE COM AS NORMAS COGENTES DE REGÊNCIA DO SERVIÇO. Desde o segundo semestre letivo de 2008 não há, no curso de medicina, docentes em número suficiente nem mesmo para ministrar as disciplinas regulares da grade curricular e supervisionar os alunos dos programas de graduação e residência médica nos hospitais conveniados. Em 02 de fevereiro último, a Conselheira Gyselle Saddi Tannous, do Conselho Nacional de Saúde, e dois alunos do Centro Acadêmico da Faculdade de Medicina da UNISA compareceram à sede da Procuradoria da República em São Paulo e requereram a atuação do Ministério Público Federal, com vistas à tutela do direito coletivo violado. Desde então, vem o Ministério Público buscando18, sem sucesso, fazer com que a Ré adéque sua conduta às normas constitucionais e legais a que está obrigada a cumprir. Nesse sentido, convocou, nos autos do procedimento administrativo n.º 1.34.001.001024/2009-89, audiência pública19 realizada no próprio campus da Universidade, no último dia 19 de fevereiro. Estavam presentes na ocasião, além da comunidade acadêmica e dos dirigentes da própria universidade, também representantes do Ministério da Educação, Conselho Nacional de Saúde, Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo, Sindicato dos Médicos, Comissão Estadual de Residência Médica e Hospital Geral do Grajaú. As principais peças do procedimento administrativo 1.34.001.001024/2009-89 estão anexadas a esta ação. Os ofícios, recomendações, atas e demais documentos públicos do procedimento estão reunidos no doc. 15. 19 A ata da audiência, convites e os e-mails trocados nos dias que se seguiram estão reunidos no doc. 16. 18 MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP Acordou-se, na audiência, um conjunto de medidas20 que tinham por escopo pôr fim à crise instaurada na Universidade. Todos os presentes – à exceção, ao que parece, da representante da Ré – estavam sinceramente devotados em encontrar soluções que possibilitassem o retorno à normalidade da vida acadêmica, evitando que os prejuízos causados aos alunos e à toda sociedade se prolongassem ainda mais. Dentre as providências a que a Ré voluntariamente se obrigou havia: a) a contratação de docentes em número suficiente para ministrar todas as disciplinas ofertadas; b) a contratação de preceptores e a regularização das condições de estágio e residência nos hospitais-escola conveniados; c) a publicação, no site da Universidade, do nome e horário de trabalho de todos os professores responsáveis pela supervisão de alunos, estagiários e residentes em atividades clínicas, inclusive em sistema de plantão; d) a publicação, no site da Universidade, da lista atualizada e completa dos docentes, carga horária e grade das disciplinas; c) a garantia da autonomia necessária do curso em relação à reitoria; e) o início efetivo do ano letivo, após reunião com os representantes discentes; e f) a apresentação, até o último dia 27 de fevereiro, de proposta de retorno às atividades acadêmicas que previsse a reposição das aulas e o início efetivo do ano letivo. OCORRE, EXCELÊNCIA, QUE A RÉ NÃO CUMPRIU NEM MESMO O ACORDO COM O QUAL VOLUNTARIAMENTE AQUIESCEU. E MAIS: DOLOSAMENTE MENTIU AO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (ASSIM COMO HAVIA FEITO COM AS DEMAIS INSTITUIÇÕES ENVOLVIDAS), AFIRMANDO QUE AS ATIVIDADES ACADÊMICAS DO CURSO DE MEDICINA JÁ ESTAVAM 21 NORMALIZADAS , QUANDO, NA VERDADE, NÃO ESTÃO. Parece incrível, mas TRANSCORRIDOS QUATRO MESES DO INÍCIO DO ANO LETIVO, A UNIVERSIDADE RÉ NÃO PROVIDENCIOU SEQUER OS DOCENTES DAS DISCIPLINAS REGULARES DO CURRÍCULO DE GRADUAÇÃO. Na disciplina de Pediatria, por exemplo, alunos do 4º, 5º e 6º anos assistem às aulas em conjunto, pois não há professores nessa especialidade para os três anos. O mesmo acontece com os alunos de 5º e 6º ano, na disciplina de Obstetrícia. Na disciplina de Propedêutica, cujo conteúdo é eminentemente prático22, os alunos do 3º ano não tiveram, até hoje, nenhuma aula nos hospitais-escola Doc. 17. No doc. 18, afirmou a representante da Ré em e-mail encaminhado ao Ministério Público Federal: “1. a UNISA está cumprindo todas as obrigações pactuadas na audiência pública. 2. todas as providências necessárias estão sendo tomadas dentro das programações.” 22 Pois se trata de aprender como examinar um paciente, a partir dos sinais e sintomas que este apresente. 20 21 MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP conveniados. Não houve aulas também de anestesiologia, em razão da indefinição sobre o docente responsável pela disciplina. O próprio coordenador do curso de medicina da Universidade Ré, WALDEMIR REZENDE, afirmou, em correspondência eletrônica23 datada de 07 de março último (três meses após o início do ano letivo), que “ainda temos alguns problemas em decorrência das mudanças da grade” e que estava “empenhado na conquista de outros docentes qualificados” nas áreas de mastologia, obstetrícia, gastroclínica e endocrinologia. O mesmo coordenador subscreveu, em conjunto com os representantes dos alunos, duas atas24 de reuniões ocorridas em 16 e 23 de março de 2009, na qual estão sistematizadas todas as deficiências do curso. A grade curricular contendo o nome dos professores responsáveis pelas disciplinas – providência acordada em audiência pública necessária ao controle público do número de docentes em atividade – foi maliciosamente publicada incompleta25, de forma a ocultar a falta de docentes na instituição. Indagada sobre a situação de flagrante descontrole do curso de medicina, a representante da Ré dolosamente MENTIU e OMITIU informações, sustentando, perante o Ministério Público e demais instituições públicas envolvidas, que as atividades de ensino da faculdade estavam e estão ocorrendo na mais absoluta normalidade. No dia 05 de janeiro de 2009, por exemplo, a reitora da Universidade Ré encaminhou ofício26 à Secretaria de Educação Superior do Ministério da Educação, afirmando, textualmente, que “a UNISA está funcionando dentro da mais plena normalidade, gozando, assim, da mais perfeita condição de funcionamento”. A assertiva da Ré, contudo, discrepa de todos os documentos amealhados, a começar pela notificação expedida no dia seguinte pelo Hospital Geral do Grajaú, comunicando o descumprimento da obrigação de fornecer professores-supervisores para todos os programas de residência médica e estágio mantidos pela Ré27. Doc. 19. Doc. 20. 25 Especificamente, ainda não foram publicadas as grades horárias do 4º ano do curso e do bloco de clínica cirúrgica do 6º ano. 26 Doc. 21. 27 Doc. 10. 23 24 MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP Em 03 de fevereiro de 2009, informou a representante da Ré à Comissão Nacional de Residência Médica que “o que vem sendo alardeado como uma 'demissão em massa' não passou de um ajuste que refletiu em uma redução de cinco professores no quadro de docentes do curso de medicina”, e que “os alunos estão faltando às atividades acadêmicas, sem qualquer justificativa”28. Sobre a disciplina de pediatria, a representante legal da Ré afirmou em ofício endereçado ao Ministério Público Federal, datado de 04 de março de 2009: “O quadro de docentes da pediatria já está completo, não havendo falta de professores”29. Em outro ofício, datado de 27 de fevereiro, a mesma representante afirma: “informarmos que a UNISA conta com um quadro de docentes suficiente para ministração de todas as disciplinas do curso de Medicina”30. As assertivas da representante da Universidade foram desmentidas não apenas pelos próprios alunos do curso, mas também pela COMISSÃO DE VERIFICAÇÃO designada pela Coordenação-Geral de Supervisão da Educação Superior, órgão federal competente para fiscalizar a qualidade do serviço prestado pelas Instituições Privadas de Educação Superior do país. Referida Comissão, constituída nos autos do processo administrativo de supervisão n.º 23000.001824/2009-4931, esteve nos dias 09 e 10 de março de 2009 no campus da Universidade e pôde constatar in loco, o inadimplemento das obrigações legais e contratuais a que a Ré está vinculada. Pedimos vênia para transcrever os principais trechos do relatório32, pois ele atesta, de forma inequívoca, a TOTAL INCAPACIDADE DA RÉ DE PRESTAR O SERVIÇO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR NO CURSO DE MEDICINA, EM CONDIÇÕES MINIMAMENTE ACEITÁVEIS. “Da análise da documentação apresentada, das visitas aos cenários de prática e das entrevistas realizadas, a comissão constatou o que segue. 1. Quanto à continuidade das aulas do curso de graduação. Doc. 22. Doc. 23. 30 Doc. 24. As demais manifestações da Ré estão reunidas no doc. 25. 31 Os principais documentos do processo administrativo de supervisão citado estão reunidos no doc. 26. 32 Doc. 26. 28 29 MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP As aulas teóricas estão funcionando normalmente, porém o mesmo não ocorre com as práticas. Após entrevistas com coordenadores de núcleos, estudantes e residentes, conclui-se que: Pediatria – persiste contração do corpo docente o que tem resultado em aulas e atividades conjuntas para 4º, 5º, 6º e médicos residentes, com amplo prejuízo de aproveitamento por todos. O coordenador do núcleo se mostra empenhado em sanar os problemas. Clínica Médica – é a área com maior número de falta de professores. As atividades acadêmicas estão comprometidas. Não há coordenador de núcleo o que agrava a situação. O coordenador do curso busca soluções. Cirurgia Geral – dois coordenadores de núcleo aparentemente. Há prejuízo na formação da equipe que permanece incompleta, resultando em suspensão de atividades didáticas, com óbvia repercussão sobre a graduação. Ginecologia e Obstetrícia – há 3 meses as mudanças curriculares implicaram em demissões e novas contratações. As disciplinas de ginecologia, obstetrícia e mastologia fundiram-se numa única – Tocoginecologia. Há ainda déficit de docentes com prejuízos nas atividades didáticas. A coordenadora do núcleo esforça-se para corrigir os déficits. Há negociação para estabelecimento de convênio interinstitucional a fim permitir a existência dos estágios de mastologia, cancerologia e medicina fetal para os residentes de terceiro ano na área. Saúde Mental – o coordenador relata saneamento da área. Não há queixas dos estudantes. Da análise curricular deduz-se pela oferta reduzida dessa área aos graduandos. Saúde Pública (Atenção Primária) - em que pese as explicações e empenho da coordenadora do núcleo, observa-se que a UNISA não atende ao MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP disposto nas Diretrizes Curriculares Nacionais, ou ao recomendado pela Comissão de visita que em 2004, apontou a inadequação da carga horária dos graduandos, em campo de prática. As unidades básicas de saúde tiveram sua gestão alterada (organização social) o que agrava o já preocupante cenário. Não há prejuízo de formação do corpo docente que embora pequeno é suficiente para a insuficiente exposição dos alunos na prática em saúde. As especialidades Gastroenterologia equacionadas. médicas, com exceção da encontram-se devidamente (...) 2. Quanto à disponibilidade de docentes em número e qualificação adequadas ao ensino médico. Em 2004, o curso de Medicina da UNISA foi avaliado para fins de renovação de reconhecimento, oportunidade em que a comissão fez as seguintes recomendações quanto ao corpo docente: - Necessidade de capacitação docente vital para a transformação do ensino. - Baixo percentual de docentes em regime de 40h (4%). - Relação aluno/docente (necessidade de maior número de professores). Nesta visita, a IES apresentou a relação de docentes que atuam no curso de Medicina em que constam 165 professores. Quanto à titulação, estão assim distribuídos: (...) Dos 165 professores que atuam no curso de Medicina, há 05 professores em tempo integral, 03 em regime parcial (30 horas com carga horária destinada a outras atividades no curso de Medicina) e o restante é horista. Tais números demonstram que a IES piorou a proporção de professores em tempo integral em relação à avaliação de 2004, que já era insatisfatória. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP Pelas entrevistas, constatou-se que para algumas áreas, ainda há carência de professores, especialmente para atuação nas práticas. (...) 4. Quanto à situação da residência médica e sua integração com o curso de graduação. Há 15 programas de residência médica (PRM) em curso, todos sob diligência de 180 dias, a contar de fevereiro de 2009. As bolsas aparentemente foram pagas e os certificados de conclusão dos PRM estão sendo devidamente concedidos. A redução docente trouxe prejuízos atuais para os PRM de Clínica Médica, Cirurgia Geral, Pediatria, Ginecologia e Obstetrícia. A autonomia para evolução clínica e prescrição ainda não se restabeleceu totalmente em todos os setores, a despeito de se tratar de médicos devidamente registrados no Conselho de profissão. A paralisação dos médicos residentes, de dezembro 2008 a fevereiro 2009, acirrou os ânimos, no que se refere aos médicos contratados do HGG para assistência, que em função dessa paralisação tiveram que ser rapidamente contratados pela direção do hospital. Os médicos residentes denunciam que residentes de Cirurgia Geral de Pedreira (outra instituição sob responsabilidade da mesma organização social) operarão no HGG, a fim de cumprir as metas em atraso do Hospital de Pedreira. A comissão visitadora orientou a direção do HGG, que confirmou a eventual ocorrência desses fatos, quanto às eventuais impropriedades e prejuízos desse ato, aos residentes e PRMs em curso. 5. Quanto à adequação geral Diretrizes Curriculares Nacionais. do curso às No relatório da comissão que avaliou o curso em 2004, foram apontadas algumas fragilidades em relação à Organização Pedagógica: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP - A extinção dos departamentos não mudou a estrutura disciplinar do curso, resultando-se inócua quanto ao efeito de fazer avançar o Curso Médico para as proposições das Diretrizes Curriculares. - Carga horária da Saúde Coletiva no Internato precisa ser implementada de forma clara, tendo suas atividades e espaços bem definidos. - Necessidade de adequação do Currículo e de seus objetivos às DCN, destacando-se a necessidade de integração entre o ensino básico e o profissional, a incorporação de uma concepção de ensino centrada no aluno, o ensino de conteúdos baseados na prática profissional do médico, a já referida diversificação dos cenários de práticas, corrigindo o atual caráter biologicista do currículo, para permitir a realização de maior carga horária de treinamento em atenção primária, fundamental para a formação proposta nas diretrizes. - Inexistência optativas. de módulos (disciplinas) - Atividades de pesquisa e pós-graduação incipientes. - Inexistência de auto-avaliação do curso. Por ocasião desta visita, verificou-se que O CURSO DE MEDICINA DA UNISA AINDA NÃO ESTÁ ADEQUADO ÀS DCN. As mesmas deficiências ocorrem ou se agravaram. Pelas entrevistas com docentes e alunos, pode-se constatar que ainda há DESINFORMAÇÃO QUANTO À MATRIZ CURRICULAR VIGENTE. ALGUNS ALUNOS INFORMARAM QUE A MATRIZ DISPONÍVEL NO SÍTIO ELETRÔNICO INSTITUCIONAL NÃO É A QUE ESTÁ SENDO CUMPRIDA. A IES alega que as divergências de informações estão ocorrendo, pois tiveram de retornar a oferta de cinco blocos no 4º ano, por recomendação do Ministério Público Federal, a pedido dos alunos. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP O atual terceiro ano possui mais de 90 alunos em curso. Como não havia sido apontada na Nota Técnica a existência de problemas em relação às instalações físicas de um modo geral e no relatório da comissão de avaliação, de 2004, os itens relacionados a Instalações receberam avaliação muito boa, esta comissão não visitou laboratórios e biblioteca. Entretanto, merece destaque a fala de alunos do segundo ano, que apontou para a necessidade de ampliação dos laboratórios ou diminuição das turmas (em geral de 80 alunos), bem como do aumento de equipamentos para atender adequadamente a esse números de alunos. Foi apontada também necessidade de ampliação do acervo básico, em especial, quantidade de exemplares das edições atualizadas. CONCLUSÕES: Diante das constatações apontadas ao longo deste relatório, a comissão estabelece as seguintes recomendações: 1. instalação urgente do Conselho de Curso, com representação de toda a comunidade acadêmica, de forma clara e de acordo com o estabelecido pelas regras locais, para que se proceda à adequação do projeto pedagógico às DCN, cujas mudanças deverão ser discutidas e aprovadas pelos colegiados competentes; 2. efetivação do processo de auto-avaliação institucional e do curso, com a devida representação discente, valorizando a discussão acadêmica, o que certamente ajudará a minimizar o clima de tensão aparente entre representação estudantil e dirigentes; 3. ampliação do número de professores em tempo integral e alocação de docentes com urgência para as áreas de práticas que estão descobertas; 4. organização e publicidade das normas e regulamentos do curso. 5. designação de comissão paritária composta por docentes, estudantes, um representante de cada cenário de ensino, MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP livremente indicado por seus pares, que sob a coordenação de um moderador, também designado e alheio à comunidade acadêmica, acompanhe a evolução das implantações necessárias.” Independentemente das medidas a serem tomadas no âmbito administrativo, destinadas a sanar as ilegalidades cometidas e a aplicar as sanções cabíveis contra a instituição Ré, faz-se imprescindível a tutela jurisdicional do Estado, com vistas a obrigar a Ré a restabelecer, sem demora, a normalidade dos cursos de graduação e residência em medicina. É importante mencionar que, nos termos da Lei Federal 6.932/81 e do Decreto Presidencial 80.281/77, a residência em medicina constitui modalidade do ensino de pós-graduação, e portanto também está sujeita aos processos de regulação e supervisão, pelo Ministério da Educação. No caso dos autos, está demonstrado que a Ré vem também deliberadamente promovendo o desmantelamento dos programas de residência médica oferecidos pela UNISA, em convênio com o Hospital Geral do Grajaú, Hospital Escola Wladimir Arruda e Ambulatório de Interlagos. Não por outro motivo, a Comissão Nacional de Residência Médica ordenou33, em 18 de fevereiro último, o DESCREDENCIAMENTO DOS PROGRAMAS de mastologia, cardiologia, ecocardiografia e urologia, oferecidos pela Ré, bem como diligências em todos os demais programas por ela mantidos, com vistas à “readequação da relação preceptores/residentes e ao alinhamento das atividades cirúrgicas com o Hospital Geral do Grajaú”. Até que a instituição Ré cumpra INTEGRALMENTE as obrigações legais e contratuais a que está vinculada, devem os alunos ser exonerados do pagamento da contraprestação do serviço contratado. Senão vejamos. 33 Doc. 13. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP DO DIREITO Como é sabido, a Constituição brasileira assegurou à iniciativa privada a faculdade de prestar o serviço de educação. Porém, por tratar-se de atividade inequivocamente voltada ao atendimento de necessidades coletivas fundamentais34, o serviço prestado por instituições particulares de ensino depende de prévia autorização e está sujeito à regulamentação e fiscalização por parte do Poder Público. É o que estabelecem expressamente os arts. 209 da Constituição e 7º da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei 9.394/96). In verbis: Art. 7º O ensino é livre à iniciativa privada, atendidas as seguintes condições: I - cumprimento das normas gerais da educação nacional e do respectivo sistema de ensino; II - autorização de funcionamento e avaliação de qualidade pelo Poder Público; III - capacidade de autofinanciamento, ressalvado o previsto no art. 213 da Constituição Federal. As normais gerais35 da educação nacional estão contidas na Lei 9.394/96. Este diploma estabelece, dentre outras, as seguintes obrigações dirigidas às instituições de ensino superior autorizadas: a) submissão a processo regular de avaliação pelo órgão federal competente e saneamento das deficiências identificadas, sob pena, inclusive, de descredenciamento (art. 46); b) frequência obrigatória de alunos e professores, salvo nos programas de educação à distância (art. 47, § 3º); c) publicação, antes do início do período letivo, dos programas dos cursos e demais componentes curriculares, sua duração, requisitos, qualificação dos professores, recursos disponíveis e critérios de avaliação, obrigando-se a cumprir as respectivas condições (art. 47, § 1º); d) contratação de 1/3 do corpo docente em regime de tempo integral (art. 52, inciso III). Em relação ao curso de medicina, as obrigações impostas a Ré estão deduzidas na Lei 6.932/81, Decreto Presidencial 80.281/77 e Resolução CNRM 02/2006 (que tratam dos 34 Quais sejam, o pleno desenvolvimento da pessoa, o seu preparo para o exercício da cidadania e a qualificação profissional do educando (art. 205 da Constituição). 35 A legislação de incidência está compilada no doc. 27. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP programas de residência médica), Resolução CNE/CES 04/2001 (que institui as diretrizes curriculares nacionais do curso de graduação em medicina), Portaria MEC 147/2007 (que dispõe sobre a complementação da instrução dos pedidos de autorização de cursos de graduação em medicina) e Portaria Interministerial 2.400/2007 (estabelece os requisitos para certificação de unidades hospitalares como hospitais de ensino). Incidem, também, no caso, as normas cogentes contidas no Código de Defesa do Consumidor, pois a relação entre a coletividade dos alunos do curso e a instituição de ensino fornecedora do serviço configura-se como autêntica relação de consumo, a teor do disposto nos arts. 2º e 3º da Lei 8.078/90. Invoca-se especificamente neste ação a incidência do art. 20 do Código de Defesa do Consumidor, que estabelece: Art. 20. O fornecedor de serviços responde pelos vícios de qualidade que os tornem impróprios ao consumo ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade com as indicações constantes da oferta ou mensagem publicitária, podendo o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha: I - a reexecução dos serviços, sem custo adicional e quando cabível; II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos; III - o abatimento proporcional do preço. § 1° A reexecução dos serviços poderá ser confiada a terceiros devidamente capacitados, por conta e risco do fornecedor. § 2° São impróprios os serviços que se mostrem inadequados para os fins que razoavelmente deles se esperam, bem como aqueles que não atendam as normas regulamentares de prestabilidade. No caso dos autos, está demonstrado que o serviço de educação superior prestado pela Ré aos alunos do curso de medicina é reconhecidamente impróprio ao consumo, pois revela-se INADEQUADO POR COMPLETO AOS FINS QUE DELE SE ESPERA. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP Por se tratar de serviço regulado, voltado ao atendimento de necessidades coletivas fundamentais (a saúde de toda a população, no caso dos cursos de medicina), os fins que dele razoavelmente se espera estão prefixados em normas de natureza cogente: o art. 43 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (notadamente a “formação de diplomados aptos para a inserção em setores profissionais e para a participação no desenvolvimento da sociedade brasileira”) e a citada Resolução CNE/CES 4, de 07 de novembro de 200136. Os termos da Resolução são compreensíveis até para nós, leigos pacientes de médicos formados no Estado de São Paulo. O art. 7º da Resolução, por exemplo, estabelece que “a formação do médico incluirá, como etapa integrante da graduação, estágio curricular obrigatório de treinamento em serviço, em regime de internato, em serviços próprios ou conveniados, e sob supervisão direta dos docentes da própria Escola/Faculdade”. No presente caso, a Comissão Nacional de Residência Médica, o Conselho Regional de Medicina de São Paulo, os alunos do curso e o próprio hospital conveniado atestaram, por escrito, que não havia docentes para supervisionar as atividades dos alunos que cumprem estágio curricular obrigatório no Hospital Geral do Grajaú, instituição que atende toda a população pobre do extremo sul da capital. Em ofício datado de 06 de janeiro de 2009, assim se manifestou a organização gestora do hospital: “A Associação Congregação de Santa Catarina, na qualidade de gestora do Hospital Geral do Grajaú, com fundamento no parágrafo único da Cláusula Quarta do Termo de Cooperação firmado com essa instituição de ensino, comunica o DESCUMPRIMENTO DAS SEGUINTES OBRIGAÇÕES, para providências e regularização no prazo máximo de 10 (dez) dias úteis, a contar do recebimento da presente: (…) Inciso VI – Assegurar a Supervisão dos Estagiários em campo, conforme cronograma estabelecido através da orientação técnica, pedagógica e avaliação do desempenho das atividades exercidas; 36 Doc. 27. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP Inciso VII – Garantir a presença do supervisor da Instituição de Ensino durante todo o período em que os estagiários se encontrarem nas dependências do hospital.”37 Nas dependências do campus da Universidade, a situação é ainda pior. Como está dito no relatório da COMISSÃO DE VERIFICAÇÃO designada pelo órgão fiscalizador, “AS ATIVIDADES ACADÊMICAS ESTÃO COMPROMETIDAS” EM RAZÃO DO NÚMERO INSUFICIENTE DE PROFESSORES CONTRATADOS, “RESULTANDO EM SUSPENSÃO DE ATIVIDADES DIDÁTICAS, COM ÓBVIA 38 REPERCUSSÃO SOBRE A GRADUAÇÃO” . E mais: “a UNISA NÃO ATENDE AO DISPOSTO NAS DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS, ou ao recomendado pela Comissão de visita que em 2004, apontou a inadequação da carga horária dos graduandos, em campo de prática.”39 Ainda: “dos 165 professores que atuam no curso de Medicina, há 05 professores em tempo integral, 03 em regime parcial (30 horas com carga horária destinada a outras atividades no curso de Medicina) e o restante é horista. Tais números demonstram que a IES piorou a proporção de professores em tempo integral em relação à avaliação de 2004, que já era insatisfatória.”40 Por fim: “a redução docente trouxe prejuízos atuais para os Programas de Residência Médica de Clínica Médica, Cirurgia Geral, Pediatria, Ginecologia e Obstetrícia”.41 Está claro, portanto, que o serviço prestado pela Ré é impróprio ao consumo. E mais: os danos causados pela ganância da instituição mantenedora – ou do grupo econômico ao qual ela está vinculada – repercutem não apenas na coletividade dos alunos do curso de medicina, mas sobre toda a população consumidora dos serviços de saúde do Estado, pois a formação deficiente do profissional de saúde importa em DANOS DIFUSOS À TODA COMUNIDADE DE USUÁRIOS DO SISTEMA. 37 38 39 40 41 Doc. 10. Doc. 26. Doc. 26. Doc. 26. Doc. 26. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP No caso específico, os danos já aconteceram, pois a Comissão Nacional de Residência Médica ordenou42 o DESCREDENCIAMENTO DOS PROGRAMAS de mastologia, cardiologia, ecocardiografia e urologia que eram oferecidos pela Ré em convênio com o Hospital Geral do Grajaú. O relatório produzido pela Comissão Estadual de Residência Médica não poderia ser mais explícito a respeito dos danos difusos causados: “Em virtude da insatisfação dos professores, vários foram demitidos o que determinou a falta de supervisão aos médicos residentes em várias unidades desse hospital, incluindo as enfermarias e pronto-socorro, e também uma diminuição dos procedimentos cirúrgicos”43. No hospital-escola Wladimir Arruda, também conveniado à Ré, atestaram os fiscais do Conselho Regional de Medicina que “a retirada repentina dos preceptores resultou também na redução do movimento ambulatorial do hospital, uma vez que os médicos residentes, que respondem por parte importante da carga assistencial, ficaram eticamente impedidos de prosseguir sua atividade, apartados da supervisão didática necessária e obrigatória”. Concluíram, assim, que “o Hospital-Escola Wladimir Arruda, pelos problemas enfrentados com a demissão de parte de seu corpo clínico, vem funcionando em condições insatisfatórias, as quais comprometem o exercício médicoprofissional, o ensino médico e a qualidade da assistência desenvolvida”44. É, portanto, a população do bairro do Grajaú quem está sofrendo os efeitos perversos da recusa da Ré em cumprir suas obrigações legais e contratuais. Vale registrar que o art. 17 do Código de Defesa do Consumidor estendeu expressamente a proteção contra danos causados por defeitos relativos à prestação do serviço a todas as vítimas do evento. Claro está, desse modo, que a Ré deverá, sem prejuízo do cumprimento forçado do contrato de adesão celebrado com a coletividade dos alunos do curso de medicina, ser condenada também a indenizar os DANOS DIFUSOS CAUSADOS À TODA POPULAÇÃO USUÁRIA DO SERVIÇO DE SAÚDE POR ELA (PESSIMAMENTE) PRESTADO no bairro do Grajaú, periferia de São 42 43 44 Doc. 13. Doc. 13. Doc. 09. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP Paulo, nos termos do disposto no art. 14 do Código de Defesa do Consumidor45. IMPRESCINDIBILIDADE DA TUTELA ANTECIPATÓRIA PARA A DEFESA DO DIREITO COLETIVO Para a coletividade dos alunos-consumidores do curso de medicina da Universidade Ré, a tutela jurisdicional buscada volta-se ao cumprimento forçado de obrigação de fazer, consistente no saneamento das deficiências apontadas pelo órgão de supervisão do ensino superior. Em âmbito federal, o procedimento administrativo de supervisão encontra-se regulado no art. 46 da Lei 9.394/9646 e arts. 45 a 57 do Decreto 5.773/200647. Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. § 1° O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais: I - o modo de seu fornecimento; II - o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam; III - a época em que foi fornecido. § 2º O serviço não é considerado defeituoso pela adoção de novas técnicas. § 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. 46 Art. 46. A autorização e o reconhecimento de cursos, bem como o credenciamento de instituições de educação superior, terão prazos limitados, sendo renovados, periodicamente, após processo regular de avaliação. § 1º Após um prazo para saneamento de deficiências eventualmente identificadas pela avaliação a que se refere este artigo, haverá reavaliação, que poderá resultar, conforme o caso, em desativação de cursos e habilitações, em intervenção na instituição, em suspensão temporária de prerrogativas da autonomia, ou em descredenciamento. § 2º No caso de instituição pública, o Poder Executivo responsável por sua manutenção acompanhará o processo de saneamento e fornecerá recursos adicionais, se necessários, para a superação das deficiências. 47 Art. 45. A Secretaria de Educação Superior, a Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica e a Secretaria de Educação a Distância exercerão as atividades de supervisão relativas, respectivamente, aos cursos de graduação e seqüenciais, aos cursos superiores de tecnologia e aos cursos na modalidade de educação a distância. § 1o A Secretaria ou órgão de supervisão competente poderá, no exercício de sua atividade de supervisão, nos limites da lei, determinar a apresentação de documentos complementares ou a realização de auditoria. § 2o Os atos de supervisão do Poder Público buscarão resguardar os interesses dos envolvidos, bem como preservar as atividades em andamento. Art. 46. Os alunos, professores e o pessoal técnico-administrativo, por meio dos respectivos órgãos representativos, poderão representar aos órgãos de supervisão, de modo circunstanciado, quando verificarem irregularidades no funcionamento de instituição ou curso 45 MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP Nos termos dos arts. 47 e 48 do regulamento, após a apresentação da defesa administrativa pela instituição supervisionada, compete ao Secretário de Educação Superior do Ministério da Educação ordenar a instauração de processo administrativo sancionador ou conceder prazo para saneamento das deficiências especificadas, fixando, em ato motivado, as providências para sua correção efetiva. Embora essencial à integridade do sistema federal de educação, a atuação administrativa do órgão fiscalizador superior. § 1o A representação deverá conter a qualificação do representante, a descrição clara e precisa dos fatos a serem apurados e a documentação pertinente, bem como os demais elementos relevantes para o esclarecimento do seu objeto. § 2o A representação será recebida, numerada e autuada pela Secretaria competente e em seguida submetida à apreciação do Secretário. § 3o O processo administrativo poderá ser instaurado de ofício, quando a Secretaria competente tiver ciência de irregularidade que lhe caiba sanar e punir. Art. 47. A Secretaria dará ciência da representação à instituição, que poderá, em dez dias, manifestar-se previamente pela insubsistência da representação ou requerer a concessão de prazo para saneamento de deficiências, nos termos do art. 46, § 1o, da Lei no 9.394, de 1996, sem prejuízo da defesa de que trata o art. 51. § 1o Em vista da manifestação da instituição, o Secretário decidirá pela admissibilidade da representação, instaurando processo administrativo ou concedendo prazo para saneamento de deficiências. § 2o Não admitida a representação, o Secretário arquivará o processo. Art. 48. Na hipótese da determinação de saneamento de deficiências, o Secretário exarará despacho, devidamente motivado, especificando as deficiências identificadas, bem como as providências para sua correção efetiva, em prazo fixado. § 1o A instituição poderá impugnar, em dez dias, as medidas determinadas ou o prazo fixado. § 2o O Secretário apreciará a impugnação e decidirá pela manutenção das providências de saneamento e do prazo ou pela adaptação das providências e do respectivo prazo, não cabendo novo recurso dessa decisão. § 3o O prazo para saneamento de deficiências não poderá ser superior a doze meses, contados do despacho referido no caput. § 4o Na vigência de prazo para saneamento de deficiências, poderá ser aplicada a medida prevista no art. 11, § 3o, motivadamente, desde que, no caso específico, a medida de cautela se revele necessária para evitar prejuízo aos alunos. Art. 49. Esgotado o prazo para saneamento de deficiências, a Secretaria competente poderá realizar verificação in loco, visando comprovar o efetivo saneamento das deficiências. Parágrafo único. O Secretário apreciará os elementos do processo e decidirá sobre o saneamento das deficiências. Art. 50. Não saneadas as deficiências ou admitida de imediato a representação, será instaurado processo administrativo para aplicação de penalidades, mediante portaria do Secretário, da qual constarão: I - identificação da instituição e de sua mantenedora; II - resumo dos fatos objeto das apurações, e, quando for o caso, das razões de representação; MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP é demorada e insuficiente para tutelar o direito coletivo dos alunos do curso de medicina da UNISA a um serviço próprio ao consumo. Daí a necessidade da atuação complementar do Poder Judiciário, no sentido de garantir o efetivo exercício do direito fundamental à educação pela coletividade dos consumidores do curso mantido pela Ré. Para estes, de nada serve a condenação ulterior pelos danos patrimoniais e morais causados em sua formação profissional pelo serviço deficiente prestado pela Ré. A única providência que, na III - informação sobre a concessão de prazo para saneamento de deficiências e as condições de seu descumprimento ou cumprimento insuficiente; IV - outras informações pertinentes; V - consignação da penalidade aplicável; e VI - determinação de notificação do representado. § 1o O processo será conduzido por autoridade especialmente designada, integrante da Secretaria competente para a supervisão, que realizará as diligências necessárias à instrução. § 2o Não será deferido novo prazo para saneamento de deficiências no curso do processo administrativo. Art. 51. O representado será notificado por ciência no processo, via postal com aviso de recebimento, por telegrama ou outro meio que assegure a certeza da ciência do interessado, para, no prazo de quinze dias, apresentar defesa, tratando das matérias de fato e de direito pertinentes. Art. 52. Recebida a defesa, o Secretário apreciará o conjunto dos elementos do processo e proferirá decisão, devidamente motivada, arquivando o processo ou aplicando uma das seguintes penalidades previstas no art. 46, § 1o, da Lei no 9.394, de 1996: I - desativação de cursos e habilitações; II - intervenção; III - suspensão temporária de prerrogativas da autonomia; ou IV - descredenciamento. Art. 53. Da decisão do Secretário caberá recurso ao CNE, em trinta dias. Parágrafo único. A decisão administrativa final será homologada em portaria do Ministro de Estado da Educação. Art. 54. A decisão de desativação de cursos e habilitações implicará a cessação imediata do funcionamento do curso ou habilitação, vedada a admissão de novos estudantes. § 1o Os estudantes que se transferirem para outra instituição de educação superior têm assegurado o aproveitamento dos estudos realizados. § 2o Na impossibilidade de transferência, ficam ressalvados os direitos dos estudantes matriculados à conclusão do curso, exclusivamente para fins de expedição de diploma. Art. 55. A decisão de intervenção será implementada por despacho do Secretário, que nomeará o interventor e estabelecerá a duração e as condições da intervenção. Art. 56. A decisão de suspensão temporária de prerrogativas da autonomia definirá o prazo de suspensão e as prerrogativas suspensas, dentre aquelas previstas nos incisos I a X do art. 53 da Lei no 9.394, de 1996, constando obrigatoriamente as dos incisos I e IV daquele artigo. Parágrafo único. O prazo de suspensão será, no mínimo, o dobro do prazo concedido para saneamento das deficiências. Art. 57. A decisão de descredenciamento da instituição implicará a cessação imediata do funcionamento da instituição, vedada a admissão de novos estudantes. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP perspectiva dos consumidores do serviço, se apresenta como adequada, efetiva e tempestiva é a CONCESSÃO DE TUTELA ANTECIPADA, PARA O FIM DE OBRIGAR A RÉ A CUMPRIR INTEGRALMENTE AS PROVIDÊNCIAS ESPECIFICADAS EM ATO DO ÓRGÃO FISCALIZADOR, OU, ALTERNATIVAMENTE, POR ESTE PRÓPRIO JUÍZO48. E mais: até que este juízo ou o órgão fiscalizador atestem que todas as providências especificadas tenham sido devidamente cumpridas pela Ré, DEVEM OS CONSUMIDORES SER EXONERADOS DA CONTRAPRESTAÇÃO DO SERVIÇO IMPROPRIAMENTE PRESTADO, ou seja, exonerados do pagamento das mensalidades vincendas. Trata-se, no caso, da aplicação do velhíssimo princípio exceptio non rite adimpleti contractus, expressamente positivado no art. 476 do Código Civil brasileiro: “Nos contratos bilaterais, nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua obrigação, pode exigir o implemento da do outro”. Sobre o instituto, diz Orlando Gomes: “Nos contratos bilaterais, nenhum dos contratantes pode, antes de cumprida sua obrigação, exigir a do outro. Nessa hipótese, tem direito a invocar a exceção de contrato não cumprido. O fundamento desse direito é intuitivo. Visto que a essência dos contratos bilaterais § 1o Os estudantes que se transferirem para outra instituição de educação superior têm assegurado o aproveitamento dos estudos realizados. § 2o Na impossibilidade de transferência, ficam ressalvados os direitos dos estudantes matriculados à conclusão do curso, exclusivamente para fins de expedição de diploma. 48 A tutela jurisdicional antecipatória é, na quase totalidade dos casos, indispensável à efetividade dos direitos fundamentais pois, como observa Marinoni, esses direitos dependem, primordialmente, “de obrigações continuativas de não-fazer, ou de obrigações de fazer infungíveis ou dificilmente passíveis de execução através das formas tradicionais da ‘execução forçada’”: “Os direitos de personalidade não podem ser garantidos adequadamente por uma espécie de tutela que atua apenas após a lesão ao direito. ADMITIR QUE TAIS DIREITOS SOMENTE PODEM SER TUTELADOS ATRAVÉS DA TÉCNICA RESSARCITÓRIA É O MESMO QUE DIZER QUE É POSSÍVEL A EXPROPRIAÇÃO DESTES DIREITOS, TRANSFORMANDO-SE O DIREITO AO BEM EM DIREITO À INDENIZAÇÃO. NÃO É PRECISO LEMBRAR QUE TAL ESPÉCIE DE EXPROPRIAÇÃO SERIA ABSURDA QUANDO EM JOGO DIREITOS INVIOLÁVEIS DO HOMEM”. Por esse motivo, o direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva corresponde, no caso dos direitos não-patrimoniais, “ao DIREITO A UMA TUTELA CAPAZ DE IMPEDIR A VIOLAÇÃO DO DIREITO. A ação inibitória, portanto, é absolutamente indispensável em um ordenamento que se funda na ‘dignidade da pessoa humana’ e que se empenha em realmente garantir – e não apenas em proclamar – a inviolabilidade dos direitos da personalidade” (A Antecipação da Tutela, São Paulo, Malheiros, 1999, p. 66). MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP é o sinalagma, isto é, a dependência recíproca das obrigações, nada mais consequente que cada qual das partes se recuse a executar o acordo, opondo a exceptio non adimpleti contractus. Se não cumpre a obrigação contraída, dado lhe não é exigir do outro contraente que cumpra a sua. (...) Admite-se, ao lado da exceptio non adimpleti contractus, a exceptio non rite adimpleti contractus. A primeira, para o caso de inadimplemento da obrigação. A outra para a hipótese do cumprimento incompleto, seja porque o devedor somente tenha satisfeito, em parte, a prestação, seja porque a cumpriu de modo defeituoso. Sempre que a obrigação não é cumprida pelo modo devido, a outra parte pode recusar-se a cumprir a sua, até que seja completada ou melhorada pertinentemente. A exceptio non rite adimpleti contractus é, no fundo, a mesma exceptio non adimpleti contratctus, dado que o cumprimento parcial, inexato ou defeituoso, equivale a 49 inadimplemento.” O fundamento jurídico do instituto está na própria vedação do enriquecimento sem causa. Com efeito, haveria evidente ofensa à equidade se fosse lícito ao fornecedor de serviço defeituoso e impróprio ao consumo exigir o pagamento da contraprestação devida. É, aliás, o que estabelece o art. 606 do Código Civil: “Se o serviço for prestado por quem não possua título de habilitação, ou não satisfaça requisitos outros estabelecidos em lei, não poderá quem os prestou cobrar a retribuição normalmente correspondente ao trabalho executado.” Segundo Maria Helena Diniz, as opções dadas pelo ordenamento jurídico ao contratante pontual nesse caso são: a) permanecer inativo, alegando a exceptio non adimpleti contractus; b) pedir a rescisão contratual com perdas e danos, se lesado pelo inadimplemento culposo do contrato; ou c) exigir o cumprimento contratual (RT, 399:233, 503:180, 521:265, 512:220 e 473:59).”50 Nessa última hipótese, tratando-se de contrato de execução continuada, as 49 50 Contratos, Rio de Janeiro, Forense, 1992, p. 100. Código Civil Anotado, São Paulo, Saraiva, 2006, p. 442. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP contraprestações vincendas serão devidas pelo consumidor após o saneamento dos vícios de qualidade que tornam o serviço impróprio ao consumo. O “abatimento proporcional do preço”, faculdade indicada no inciso III do art. 20 do Código de Defesa do Consumidor não é possível, in casu, porque a obrigação da Ré de prestar o serviço de ensino de graduação e pós-graduação em medicina é, por natureza, indivisível, já que o aluno do curso não obtém nenhuma utilidade no aprendizado de parte51 das habilidades médicas, fato intuitivo até mesmo para nós, leigos usuários de serviços de saúde no Brasil. Postulam, portanto, os Autores, a concessão de tutela jurisdicional antecipatória para os seguintes fins: a) a imposição à Ré de OBRIGAÇÃO DE FAZER consistente no CUMPRIMENTO INTEGRAL DAS PROVIDÊNCIAS ORDENADAS PELO ÓRGÃO ADMINISTRATIVO FEDERAL DE SUPERVISÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR, no exercício regular das competências que são conferidas pelo art. 46 da Lei 9.394/96 e arts. 45 a 57 do Decreto 5.773/2006; b) até integral cumprimento da obrigação de fazer, o RECONHECIMENTO JUDICIAL52 DO INADIMPLEMENTO DO Em outras palavras, não se concede à Ré a possibilidade de abatimento proporcional do preço da mensalidade do curso porque a formação do profissional de medicina é, necessariamente, integral. Do contrário, teríamos “meios-médicos”, aptos a atender pacientes somente nas disciplinas efetivamente oferecidas pela universidade inadimplente. A natureza indivisível da obrigação de prestar o serviço de graduação e pós-graduação decorre da própria idéia da integralidade da assistência à saúde, como se vê pela leitura do art. 3º da Resolução CNE/CES 04/2001: “o Curso de Graduação em Medicina tem como perfil do formando egresso/profissional o médico, com formação generalista, humanista, crítica e reflexiva, capacitado a atuar, pautado em princípios éticos, no processo de saúde-doença em seus diferentes níveis de atenção, com ações de promoção, prevenção, recuperação e reabilitação à saúde, na perspectiva da integralidade da assistência, com senso de responsabilidade social e compromisso com a cidadania, como promotor da saúde integral do ser humano. 52 Trata-se, tecnicamente, de antecipação dos efeitos exeucutivos de provimento declaratório. Vale notar que o art. 273 do Código de Processo Civil trata da antecipação dos EFEITOS da tutela pretendida, e não propriamente da tutela finalmente buscada. Por isso, não pode haver obstáculo à antecipação de um provimento declaratório com o fim específico de se garantir a efetividade dos efeitos dessa declaração, conferindo a eles a força executória necessária para tanto. Nesse sentido, já se pronunciou o Superior Tribunal de Justiça: “PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. TUTELA ANTECIPADA. AÇÃO DECLARATÓRIA. RECONHECIDA A PRESENÇA DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS À CONCESSÃO DA MEDIDA. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PERDA DE OBJETO. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO.1. Hipótese em que o Superior Tribunal de Justiça deu provimento a recurso especial anteriormente interposto contra acórdão que confirmara a atribuição de efeito suspensivo a agravo de instrumento, firmando o entendimento de ser possível a concessão de tutela antecipada em ação declaratória e de ter sido a medida 51 MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP SERVIÇO de educação superior prestado pela Ré à coletividade dos alunos dos cursos de graduação e pós-graduação em medicina, com vistas à SUSPENSÃO DA COBRANÇA DAS MENSALIDADES DO CURSO DE MEDICINA, nos termos do art. 476 do Código Civil c.c. o art. 20 do Código de Defesa do Consumidor. Desejam os Autores enfatizar que, para a coletividade de consumidores do serviço porcamente prestado pela Ré, apenas a concessão do provimento jurisdicional antecipado servirá para tutelar, de modo eficaz, os direitos de natureza nãopatrimonial de que são titulares. Com feito, já são transcorridos quatro meses do início do ano letivo e ainda persistem as graves deficiências apontadas em uníssono por todas as instituições que acompanham o caso. Demora maior poderá comprometer a própria graduação dos alunos, pois inevitavelmente aulas terão de ser repostas. DOS PEDIDOS Diante de todo o exposto, pedem os Autores desta ação: (a) a INTIMAÇÃO PESSOAL da Senhora Secretária de Educação Superior do Ministério da Educação PARA QUE APRESENTE A ESTE JUÍZO, no prazo de 05 dias, o despacho de que trata o art. 48 do Decreto Federal corretamente deferida, tendo em vista a presença dos requisitos previstos no art. 273 do CPC. 2. Nesse contexto, o Tribunal de origem, ao analisar, posteriormente, o mérito do agravo de instrumento, entendeu, de modo correto, pela perda de objeto do recurso, que discutia exatamente a possibilidade de concessão da tutela antecipada no caso, já reconhecida pelo STJ. 3. Recurso especial conhecido e improvido”. (STJ, REsp 915.938-MG, 5ª Turma, relator o Ministro Arnaldo Esteves Lima, j. 29/05/08, p. 04/08/08). “MEDIDA CAUTELAR. EFEITO SUSPENSIVO A RECURSO ESPECIAL. PROVIMENTO DO MESMO. MEDIDA PREJUDICADA. O recurso especial apensado ao presente feito e dele objeto foi provido, com a conseqüente reforma do aresto recorrido, sob o entendimento de ser perfeitamente cabível a concessão de tutela antecipada em ação declaratória, desde que constatados os requisitos do art. 273 do CPC. Medida cautelar prejudicada.” (STJ, MC 4.205, 5ª Turma, relator o Ministro José Arnaldo da Fonseca, j. 17/06/03, p. 25/08/03). “AÇÃO DE DESPEJO. TUTELA ANTECIPADA. POSSIBILIDADE. Cabível, nas ações de despejo, a antecipação de tutela, como o é em toda a ação de conhecimento, seja a ação declaratória, seja constitutiva (negativa ou positiva) condenatória, mandamental, se presentes os pressupostos legais. Recurso não conhecido.” (STJ, Resp 445.863, 5ª Turma, relator o Ministro José Arnaldo da Fonseca, j. 05/12/02, p. 19/12/02). MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP 5.773/2006, especificando AS DEFICIÊNCIAS IDENTIFICADAS NO CURSO DE MEDICINA PRESTADO PELA RÉ, BEM COMO AS PROVIDÊNCIAS PARA SUA CORREÇÃO EFETIVA EM PRAZO FIXADO; (b) a concessão de TUTELA JURISDICIONAL ANTECIPATÓRIA, inaudita altera parte, com fundamento no art. 84, § 3º, da Lei 8.078/90 e art. 461 do Código de Processo Civil, para os seguintes fins: (b1) imposição, à Ré, de OBRIGAÇÃO DE FAZER consistente no CUMPRIMENTO INTEGRAL DAS PROVIDÊNCIAS ORDENADAS PELO ÓRGÃO ADMINISTRATIVO FEDERAL DE SUPERVISÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR, no exercício regular das competências que são conferidas pelo art. 46 da Lei 9.394/96 e arts. 45 a 57 do Decreto 5.773/2006; (b2) até o integral cumprimento da obrigação de fazer acima indicada, o RECONHECIMENTO JUDICIAL DO INADIMPLEMENTO DO SERVIÇO de educação superior prestado pela Ré à coletividade dos alunos dos cursos de graduação e pós-graduação em medicina, para determinar à Ré a SUSPENSÃO DA COBRANÇA DAS MENSALIDADES DO CURSO DE MEDICINA, com fundamento no art. 476 do Código Civil c.c. o art. 20 do Código de Defesa do Consumidor; (b3) subsidiariamente, na hipótese de indeferimento do pedido anterior, ou cumulativamente, a fixação de MULTA COMINATÓRIA DIÁRIA, EM VALOR NÃO INFERIOR A R$ 50.000,00, com fundamento no art. 84, § 4º, da Lei 8.078/90 e art. 461, § 4º, do Código de Processo Civil; (c) a CONDENAÇÃO da Ré, ao final, A PAGAR AO FUNDO ESTADUAL DE SAÚDE – MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP FUNDES (instituído pela Lei Complementar Estadual 204/78 e ratificado pela Lei Estadual 7.001/90), A IMPORTÂNCIA DE R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais) e acréscimos legais, a título de indenização pelos danos difusos causados à população usuária do serviço de saúde por ela prestado no bairro do Grajaú, com fundamento nos arts. 14 e 17 do Código de Defesa do Consumidor; Requerem, ainda, os Autores: (a) a DISTRIBUIÇÃO URGENTE desta inicial; (b) a INTIMAÇÃO DA UNIÃO para, querendo, integrar a presente lide, na posição de litisconsorte ativa (art. 5º, § 2º, da Lei 7.347/95), tendo em vista o manifesto interesse do ente fiscalizador no cumprimento dos atos administrativos por ele emanados; (c) a CITAÇÃO da Ré para, querendo, contestar a presente ação; (d) a INTIMAÇÃO PESSOAL dos representantes do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, nos termos do que dispõe o art. 236, § 2º, do Código de Processo Civil. Protestam os Autores provar os fatos alegados por todos os meios admitidos no Direito, notadamente a juntada de documentos, a oitiva de testemunhas, e a realização de perícias e inspeções judiciais. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF/SP C0NSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CREMESP Dá-se à presente causa o valor de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais). Termos em que, P. Deferimento. São Paulo, 06 de abril de 2009. SERGIO GARDENGHI SUIAMA Procurador da República 5º Ofício Cível – Educação OSVALDO PIRES SIMONELLI OAB/SP 165.381 CREMESP/SP