Título: INTERNATO RURAL E INTERVENÇÃO PSICOSSOCIAL: PROJETO CAMPO
ALEGRE
Autores: Alysson Massote Carvalho, Ana Paula César Teixeira, Caroline Akemi Pinheiro
Imai, Denise Garófalo Fonseca, Nádia Martins Fagundes
E-mail: [email protected]
Instituição: Universidade Federal de Minas Gerais
Área Temática: Saúde
1- Introdução:
O presente trabalho aborda um projeto de intervenção na Instituição Campo Alegre,
uma fazenda situada no município de Morada Nova de Minas, fundada em 21/11/1950.
Abriga 40 meninos na faixa etária de 7 a 18 anos, cujas origens assemelham-se num
histórico de risco social, desestruturação e violência familiar, delitos infanto-juvenis,
abandono, condição financeira precária e irregularidade escolar, sendo que alguns casos são
encaminhados pelo Conselho Tutelar.
Os encaminhamentos ficam à disposição dos administradores que passam a se
responsabilizar também pela educação e criação dos meninos. O contato com a família
acontece nas férias, feriados ou nos finais de semana, em casos de parentes próximos. Nem
sempre os internos são recebidos com total satisfação dos familiares.
O processo de entrada e saída dos internos se refere primeiramente aos critérios já
estabelecidos. Apenas meninos, idade entre 7 e 18 anos, com saída após a conclusão do
Ensino Fundamental. O interno pode voltar ao lar antes disso, caso a família tenha
condições de retomar a criação, manifestando-se neste sentido, e com a aprovação do
Conselho Tutelar.
A instituição se caracteriza como de regime total, onde a vida dos internos está
voltada para sua rotina diária de manutenção da estrutura física. Essa compreende a sede
principal ( escritórios, dormitórios, refeitórios ),capela e outros locais específicos de uma
fazenda ( curral, horta, chiqueiro, etc). Além disso, os internos possuem estudo, hábitos
religiosos e momentos de lazer, sempre dentro dos limites da instituição
O contato com o Campo Alegre se deu a partir de uma demanda da própria
comunidade que sentia uma necessidade de atenção da Psicologia às crianças e
adolescentes e de um auxílio ao trabalho de assistência ofertado a eles.
A partir desta solicitação foi feito um contato preliminar com o objetivo de se
conhecer melhor a Instituição e as pessoas envolvidas com ela. Durante essa visita foi
realizado um primeiro encontro com os meninos através de brincadeiras e rodas de
conversa. Este contato preliminar teve seqüência em outros encontros semanais com os
meninos através de grupos, onde procurou – se esclarecer melhor a demanda a ser
trabalhada e a melhor forma de fazê – lo.
Os dados obtidos preliminarmente indicam que há inúmeras queixas tanto por parte
dos internos quanto dos administradores ( Padre e clérigos) que se referem à própria
conduta do trabalho realizado até então. Tais queixas se relacionam a questões de
agressividade, dificuldades relacionais, sexualidade, perspectiva de futuro, entre outras.
A possibilidade de atuação da Psicologia nessa instituição abriu, para o estágio
Internato Rural, realizado pelos alunos da UFMG, uma nova frente de atuação junto à saúde
pública, que vai de encontro às necessidades expressas pela população e pela instituição.
O objetivo geral do projeto é possibilitar a melhoria da qualidade de vida da
Instituição, através de práticas alternativas, visando gerar perspectivas positivas de futuro
aos internos após a sua saída. Dentre os objetivos específicos estão relacionados:
qualificação dos profissionais que lidam com os meninos diretamente através do trabalho
em grupo, fomentar a identificação do corpo administrativo e internos enquanto agentes de
mudanças institucionais, incentivar a coesão do grupo na construção de práticas alternativas
frente aos conflitos encontrados, implementar maior participação dos internos nos
processos de tomada de decisão e elaboração da rotina diária, incluir o contato familiar na
medida do possível no cotidiano dos internos. Sensibilizar as famílias sobre a importância
deste contato , sobretudo pelo fato de que a saída da instituição é inevitável, mobilizar a
comunidade e promover ações que permitam a reinclusão social dos menores nos ambientes
além da instituição e reflexão sobre as necessidades básicas de um desenvolvimento infantil
sadio, bem como sobre os danos do processo de institucionalização.
Para isso, utilizou-se o modelo de intervenção nos moldes do grupo operativo,
levando em conta as próprias normas, valoras e dinâmica da instituição, e de forma que
todas as pessoas envolvidas (internos e administradores) ocupassem espaço não só de
objetos de investigação, mas também de sujeitos co-responsáveis pelo processo de
mudança. O processo de mudança envolve então o desejo e o compromisso desses
membros e depende da interação entre eles. Com isso , enfatizamos a importância da
participação dos gestores e responsáveis junto ao trabalho a ser realizado. O projeto tem
como sujeitos a seguinte população:
•
Responsável pela Instituição – 1
•
Administradores – 2
•
Internos – 40
Foi efetuado o trabalho em oficinas, com o uso de atividades que promoveram a
interação, comunicação e re-elaboração de atitudes e relações que ali vigoravam. Para
fundamentar nossa escolha pelo trabalho em Oficina, estamos utilizando as contribuições
de Lúcia Afonso que a conceitua como “ um trabalho estruturado com grupos
,independente do número de encontros, sendo focalizado em torno de uma questão central
que o grupo se propõe a elaborar, em um contexto social.”
(Afonso- 00).
O planejamento do trabalho foi feito de modo flexível, com um encontro semanal
com cada grupo, divididos pela escolaridade:
Grupo Aa – 5ª e 6ª séries
Grupo AA – 7ª e 8ª séries
Grupo Bb – 1ª e 2ª séries
Grupo BB – 3ª e 4ª séries
Também há um grupo com os administradores. O trabalho realizado junto aos grupos
compreende atividades que mobilizem os sujeitos através de suas experiências, conflitos e
possibilidades. Cada ação caminha num sentido operativo para a realização da tarefa do
grupo de produzir materiais que serão expostos em um evento ( Semana Campo Alegre).
Durante esse processo são trabalhados os laços de identificação interpessoais e intrapessoais. Acreditamos ser esta a etapa primordial para a construção de práticas alternativas
para a melhoria da Instituição e, num sentido pessoal, do bem estar psíquico.
A Semana Campo Alegre ocorrerá nos dias 21 a 27 de outubro e será um evento
aberto à comunidade do município e redondezas, visando um maior conhecimento dos
internos e administradores e, principalmente, da relevância social da Instituição para se
obter uma integração entre esses segmentos. O planejamento tem um lado flexível quanto
aos encontros e outro global quanto a estrutura do projeto.
Os encontros duram aproximadamente uma hora e ocorrem em diversos locais da
instituição ( salas, refeitório, área externa, sinuca).
2- Análise da demanda:
Após o levantamento dos dados realizado pela primeira dupla de estagiárias, na
análise preliminar da demanda, e fundamentadas na literatura sobre os danos causados pelo
desgaste/rompimento dos laços afetivos familiares, vemos como premente uma intervenção
que atenda simultaneamente o coletivo ( instituição Campo Alegre) e o individual ( cada
pessoa em sua subjetividade), visando a melhoria de vida desses sujeitos.
3- Foco
O tema central, ou foco, desta intervenção é a construção de práticas alternativas para
o trabalho realizado na Instituição, através da identificação do interno com os outros
meninos, dos internos com o corpo administrativo e desses com aqueles e que atuam
enquanto agentes de transformação, acolhendo–os ao mesmo tempo frente as suas
dificuldades subjetivas.
4- Temas geradores
Alguns dos temas propostos para serem trabalhados nas oficinas, através de atividades
planejadas passo a passo junto ao grupo:
•
Relacionamento interpessoal
•
Amizade
•
Família e Afetividade
•
Institucionalização, Liberdade , Autonomia, Hierarquia, Identidade
•
Auto-estima
A cada encontro são produzidos relatórios que visam avaliar e sistematizar o
desenvolvimento do grupo.
Cronograma das atividades realizadas até dia 07 de outubro de 2002
Data
14/08/02
Objetivo
Dinâmica
Conhecer
Participantes
a
Administradores,
instituição
Supervisor e estagiárias
19/08/02 e 21/08/02 Apresentação
das
Cartões
novas simbolizando sentimentos
estagiárias
contato
coloridos Turmas AA, Aa, BB, Bb
e e conversas informais
inicial
com os internos
26/08/02 e 28/08/02 Identificar qual a Desenho ou redação sobre Turmas AA, Aa, BB, Bb
representação e o Campo Alegre
imagem que os
internos têm da
instituição
02/09/02 e 04/09/02 Analisar
04/09/02
as Entregar balas às pessoas Turmas AA, Aa, BB, Bb
relações
do grupo explicando o
interpessoais
motivo da escolha.
Apresentação do Cartões
coloridos Corpo administrativo
projeto Semana simbolizando sentimentos
Campo Alegre e e expectativas em relação
expectativas em ao
trabalho
com
as
relação
ao estagiárias
trabalho
e
conversas
informais
09/09/02 e 11/09/02 Estabelecer
Figura humana
laços
Turmas AA, Aa, BB, Bb
de
identificação
e
auto - imagem
11/09/02
Estreitar
laços Linha da vida
Corpo administrativo
de identificação
principalmente
em relação ao
trabalho
no
Campo Alegre
23/09/02 e 25/09/02
Fazer com que Questionário
os
internos informações
com Turmas AA, Aa, BB, Bb
detalhadas
exponham suas dos internos
histórias
opiniões
e
e
se
sintam aceitos
30/09/02
Buscar
pontos Análise dos questionários Turmas AA, Aa
em comum entre e confecção de cartaz com
as histórias de pontos em comum
vida
30/09/02
Estabelecer
laços
Figura humana
Corpo administrativo
de
identificação
e
auto - imagem
07/10/02
Buscar
pontos Análise dos questionários Turmas BB, Bb
em comum entre e confecção de cartaz com
as histórias de pontos em comum
vida
Os principais resultados visados foram: a) melhoria das inter-relações entre os
internos e os administradores; b) mudança significativa quanto à visão sobre a instituição;
c) auto-percepção do grupo de sua possibilidade como agente de mudanças institucionais;
d) maior conhecimento da instituição pelas pessoas da região; e) busca de novos potenciais
e talentos entre os internos.
Pensa-se que o abrigo deve ser um espaço democrático de aprendizado,
convivência, respeito, lazer, que possibilite tanto os internos quanto os administradores a
estarem atuando juntos em prol da melhoria da qualidade de vida.
Referências Bibliográficas:
AFONSO, L. Oficinas em dinâmica de grupo: um método de intervenção
psicossociológica. Belo Horizonte: Edições do Campo Social, 2000.
AFONSO, L. ; RODRIGUES, C. S. ; SOUZA, M. V. P. ; LOUREIRO. S. A. “Oficinas em
dinâmica de grupo: um método de intervenção psicossocial”. Belo Horizonte, 2001
(mimeo).
PINTO, M. C. V. Oficinas em dinâmica de grupo com adolescentes na escola: a construção
da identidade e autonomia mediada pela interação social. (Dissertação de mestrado
em Psicologia) Belo Horizonte: UFMG, 2001.
ENRIQUEZ, E. “O vínculo Grupal”. In: LÉVY, A. Et. al.Psicossociologia: análise social e
intervenção. Belo Horizonte: Autêntica, 2001.
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