WHITE-PAPER SOBRE INOVAÇÃO BIOFARMACÊUTICA Abril 2013 Índice Sumário Executivo...................................................................................................................... 3 1. Valor da Inovação Biofarmacêutica ......................................................................................... 5 1.1. Valor clínico da inovação biofarmacêutica ........................................................................ 6 1.2. Valor económico da inovação biofarmacêutica ................................................................. 7 1.3. Processo de Investigação & Desenvolvimento (I&D) na área biofarmacêutica ................... 9 1.4. Colaboração entre a Indústria Biofarmacêutica e as Instituições Académicas Empresas Start-up .................................................................................................................................. 9 1.5. Terapêutica personalizada ............................................................................................. 10 2. Produtos biofarmacêuticos originais e produtos biossimilares .............................................. 11 2.1. Medicamentos biológicos ou biofármacos ...................................................................... 11 2.2. Medicamentos biossimilares .......................................................................................... 12 2.3. Aspetos de segurança dos medicamentos biológicos/biossimilares ................................ 12 2.4. Substituição automática ................................................................................................ 13 2.5. Nomenclatura ................................................................................................................ 14 2.6. Extrapolação de indicações terapêuticas ........................................................................ 15 2.7. Necessidade de enquadramento regulamentar .............................................................. 16 3. Inovação Biofarmacêutica e a Sustentabilidade do SNS ......................................................... 16 3.1. Os medicamentos biológicos e o controlo do investimento público ................................ 17 3.2. Necessidade de um ambiente regulamentar estável ....................................................... 17 3.3. Acesso equitativo e atempado dos doentes aos Medicamentos Inovadores .................... 18 3.4. Utilização racional dos medicamentos biológicos ........................................................... 19 4. Referências .......................................................................................................................... 20 2 Sumário Executivo A Indústria Biofarmacêutica investe constantemente na inovação lançando novos produtos todos os anos. Em 2011 foram aprovados a nível global 16 novos medicamentos. O setor biofarmacêutico tem tradicionalmente desempenhado um papel fundamental na pesquisa e na triagem de moléculas com eficácia e segurança, bem como na otimização dos processos e procedimentos de produção. A excelência da investigação realizada em Portugal é reconhecida internacionalmente. No entanto, a falta de enquadramento legislativo e regulamentar da inovação no processo de I&D tem contribuído para a diminuição da sua competitividade nesta área e limitado a participação em programas europeus de financiamento à investigação. Neste âmbito é fundamental promover a interação entre os setores da indústria e da academia para melhorar a produtividade da I&D. Novos modelos de colaboração constituem oportunidades para novos modelos de negócio e financiamento das empresas start-up nacionais e das instituições académicas. O valor da inovação biofarmacêutica resulta do seu contributo para a sociedade, nomeadamente pela redução na mortalidade e pelo consequente aumento da esperança e da qualidade de vida, levando ainda à redução de futuros custos com a doença, de taxas de absentismo e ao aumento de produtividade. Sendo o medicamento a tecnologia de saúde mais custo-efetiva para a sociedade, a avaliação económica dos medicamentos biológicos deve ter em conta o seu valor acrescentado, incluindo o seu valor social e contribuição para a gestão eficientes da doença e dos cuidados de saúde, e não constituir-se em si própria como uma medida de contenção de custo ou como forma de atrasar o acesso aos novos tratamentos. 3 Resulta, ainda, do conhecimento científico actual que os biossimilares não são cópias exatas do medicamento inovador, pelo que não são iguais, nem na função nem na segurança. Pequenas diferenças no processo de produção e/ou na estrutura dos biofármacos podem contribuir para um perfil diferenciado em termos de segurança e eficácia. Por essa razão a substituição automática de medicamentos biológicos (inovador – biossimilar ou vice-versa) não é recomendada devido aos riscos de segurança associados. Cabe ao Estado a responsabilidade de garantir o acesso e a segurança dos doentes em relação aos medicamentos biológicos. É importante e urgente que as autoridades de saúde se pronunciem sobre os actuais procedimentos de acesso ao mercado dos medicamentos inovadores e que possam, igualmente, emitir recomendações para a prescrição, dispensa e utilização dos medicamentos biológicos em Portugal. 4 1. Valor da Inovação Biofarmacêutica A Biotecnologia criou novas gerações de produtos terapêuticos e fornece atualmente ferramentas importantes para a descoberta de novos medicamentos e novas formas de diagnóstico in-vitro. Os produtos biofarmacêuticos são substâncias biológicas, ou seus derivados, que se assemelham às substâncias naturais encontradas no corpo humano. Estes biofármacos são moléculas maiores do que as moléculas químicas dos medicamentos tradicionais. São também mais complexos de produzir e de administrar. Os biofármacos são produzidos por meio de processos biotecnológicos, em vez de isolados a partir de materiais biológicos ou criados através de técnicas de síntese química. Os biofármacos que se encontram hoje em dia no mercado incluem proteínas terapêuticas recombinantes, tais como a insulina humana, hormona de crescimento humano, os anticorpos monoclonais, interferões, enzimas terapêuticas, receptores solúveis, ou citocinas. Os produtos de terapias avançadas, tais como as terapias baseadas em células, são também derivados da biotecnologia e estão agora a chegar ao mercado, existindo atualmente dois destes produtos, um na Europa e outro nos EUA. O processo de I&D biofarmacêutico é complexo, dispendioso, longo e de elevado atrito. Para que todos, e especialmente os doentes, possam beneficiar de novos medicamentos inovadores, a Europa tem que continuar a promover a inovação biofarmacêutica e definir estratégias a nível europeu e nos Estados-Membros para recompensar devidamente o valor destes medicamentos. O tratamento do cancro ou de distúrbios metabólicos e imunológicos são alguns exemplos de áreas terapêuticas para as quais foram desenvolvidos produtos biofarmacêuticos. Atualmente, os medicamentos de biotecnologia aprovados já permitem tratar ou ajudar a prevenir ataques cardíacos, acidentes vasculares cerebrais, anemia, diabetes, hemofilia, esclerose múltipla, 5 cancro da mama ou nos rins, artrite reumatoide, doença de Crohn, psoríase, leucemia, fibrose cística, osteoporose e linfoma, entre outras doenças. 1.1. Valor clínico da inovação biofarmacêutica O valor clínico da inovação biofarmacêutica é sentido por dezenas de milhões de doentes na Europa. De acordo com o reportado pela EuropaBio (20111), existem atualmente 418 novos medicamentos e vacinas biotecnológicas em desenvolvimento para utilização em mais de 100 doenças. Destes, 210 são para o tratamento do cancro, 50 para o tratamento de doenças infeciosas e 44 para o tratamento de doenças autoimunes. Neste momento, os medicamentos biotecnológicos já representam cerca de 20% de todos os medicamentos comercializados e 50% de todos os medicamentos em desenvolvimento. A Indústria Biofarmacêutica investe constantemente na inovação lançando novos produtos todos os anos. Em 2011 foram aprovados a nível global 16 novos medicamentos. Pela primeira vez na história da saúde humana, a biotecnologia está a permitir o desenvolvimento e/ou produção de tratamentos para um conjunto importante de doenças raras de origem genética. Embora individualmente raras, coletivamente estas doenças afetam cerca de 20 a 30 milhões de europeus e suas famílias. Os novos medicamentos biofarmacêuticos conjugados com uma melhoria na prevenção e no diagnóstico de doenças contribuem significativamente para a redução da mortalidade e incapacidade causadas por muitas doenças. Exemplo 1: Diabetes Nos últimos anos foram desenvolvidas oito novas classes de medicamentos para diabetes, permitindo novas abordagens para o tratamento da doença. Como resultado destas inovações, as pessoas recentemente diagnosticadas com diabetes possuem maior esperança média de vida do que as diagnosticadas há 10 ou 20 anos. 1 http://www.europabio.org/healthcare-biotech-facts-figures (acedido em 16 novembro 2012) 6 Exemplo 2: Cancro No caso das pessoas diagnosticadas com cancro entre 1975 e 1979, a taxa de sobrevivência a cinco anos era de 49%. Para os diagnosticados em 2003 (as mais recentes taxas de sobrevivência a cinco anos disponíveis), foi de 67%. Para as crianças, a taxa de sobrevivência a cinco anos subiu de 58%, para os diagnosticados entre 1975 e 1977, para mais de 80% nos dias de hoje (1). Exemplo 3: Artrite Reumatóide As novas opções terapêuticas biofarmacêuticas, em associação com os medicamentos tradicionais, retardam a progressão da doença de forma dramática, contribuindo para a melhoria na qualidade de vida das pessoas com esta doença incapacitante. Um estudo mostrou que os doentes submetidos a tratamento combinado têm uma probabilidade de 50% de remissão completa, em comparação com uma probabilidade de 28% nos que tomaram somente os medicamentos tradicionais (2) . Outro estudo demonstra uma redução de 26% em perda de produtividade laboral nos doentes com Artrite Reumatóide aderentes à terapêutica (3) . Os medicamentos biofarmacêuticos podem impedir a progressão da doença e as subsequentes complicações graves, permitindo aos doentes viver uma vida produtiva e ativa. 1.2. Valor económico da inovação biofarmacêutica Apesar dos constrangimentos de ordem económica que o País enfrenta, importa que os decisores políticos e a opinião pública não percam de vista o inestimável valor do medicamento biofarmacêutico e as conquistas proporcionadas pela constante inovação terapêutica. O valor económico dos medicamentos é normalmente confundido com o seu custo, o que conduz a uma imagem limitada e muitas vezes errónea do valor económico da inovação biofarmacêutica. Quando se discutem os custos em saúde, o custo dos cuidados médicos e os 7 gastos em medicamentos, estes são muitas vezes considerados de forma isolada, sem qualquer consideração sobre o impacto que o uso de medicação apropriada pode ter na redução dos custos globais, prevenindo ou retardando o curso da doença. Os custos para a Segurança Social, para o Serviço Nacional de Saúde e para a sociedade em geral com doenças tais como, as doenças oncológicas, as autoimunes, as infeciosas ou as musculo-esqueléticas são extraordinariamente elevados. Entre os mais importantes destacamse os custos associados aos internamentos, aos cuidados de saúde inerentes à patologia e aos elevados índices de redução de produtividade. Por sua vez, a despesa associada aos medicamentos biofarmacêuticos pode não chegar a atingir 10% da despesa total associada ao tratamento destas doenças (4) e contribui de forma significativa para o aumento da produtividade e o regresso à vida ativa dos doentes, diminuindo de forma expressiva os custos da Segurança Social originados por baixas e reformas antecipadas. Os efeitos positivos dos medicamentos biofarmacêuticos, enquanto armas de combate a estas doenças incapacitantes, estão reconhecidamente demonstrados em todo o Mundo. O medicamento é a tecnologia de saúde mais custo-efetiva para a sociedade, devido ao seu valor preventivo e terapêutico e ao consequente aumento da esperança e da qualidade de vida, levando à redução de futuros custos de doença, de taxas de absentismo e ao aumento de produtividade. Apesar da influência decisiva do medicamento no bem-estar social, económico, e no aumento da esperança média de vida (responsável por cerca de 40% do aumento de 30 anos na esperança de vida nos últimos 100 anos), políticas centradas unicamente na redução dos custos, como forma de aliviar a pressão dos orçamentos públicos, e na limitação do acesso à inovação produzirão impactos negativos no desenvolvimento social a médio prazo. Sem uma estratégia concertada, a carga da doença para a sociedade irá conduzir, de forma inevitável a aumentos da despesa em saúde a longo prazo, e resultará numa proporção cada vez maior da despesa dos Orçamentos da Saúde e da Segurança Social alocada a custos indiretos. 8 1.3. Processo de Investigação & Desenvolvimento (I&D) na área biofarmacêutica As novas tecnologias, e a biotecnologia em particular, podem melhorar significativamente a produtividade e a eficiência dos processos de I&D. Permitem, não só, uma análise e validação mais acessível dos medicamentos em investigação, mas também novos conhecimentos científicos que conduzem ao desenvolvimento de novas opções terapêuticas. No âmbito da melhoria dos processos de investigação do medicamento, a indústria biofarmacêutica tem realizado grandes investimentos na compreensão da fisiopatologia das doenças, e na melhoria dos sistemas de monitorização dos doentes. Nos últimos anos, a FDA (Agência Americana do Medicamento) e a EMA (Agência Europeia do Medicamento) têm colocado maior ênfase na vigilância pós-comercialização, com novas avaliações de risco e requisitos de mitigação de risco. Os estudos PASS (Post-comercialization safety studies), de natureza observacional, são um exemplo desta metodologia. Porém, como o nome indica, estes estudos são implementados após a comercialização do medicamento, pelo que atrasos no processo de definição de preço e comparticipação impossibilitam Portugal de participar em estudos inovadores e que trazem retorno financeiro, formação e treino para as unidades de saúde. A falta de enquadramento legislativo e regulamentar da inovação no processo de I&D diminui a competitividade de Portugal e limita a sua participação em programas europeus de financiamento à investigação. Em Portugal o setor da biotecnologia é recente, emprega principalmente doutorados e apresenta uma forte ligação às instituições académicas. Existem vários exemplos de protocolos estabelecidos entre empresas nacionais e a indústria farmacêutica internacional. 1.4. Colaboração entre a Indústria Biofarmacêutica e as Instituições Académicas Empresas Start-up O setor biofarmacêutico tem tradicionalmente desempenhado um papel fundamental na pesquisa e na triagem de moléculas com eficácia e segurança, bem como na otimização dos 9 processos e procedimentos de produção. Porém, face aos avanços tecnológicos e da ciência, é difícil o sector biofarmacêutico agregar este conhecimento, pelo que este se encontra disperso pelas instituições de investigação académicas. Por exemplo, estudos de investigação básica desenvolvidos pelo setor académico têm identificado muitos alvos biológicos. Num contexto de inovação, a proximidade e a interação entre estes dois setores assume, assim, uma grande preponderância no campo da descoberta de novos medicamentos. Consequentemente, verifica-se um aumento de capital e investimento em instituições académicas em áreas-chave de inovação biotecnológica, como a identificação e validação de alvos biológicos, triagem de moléculas e transferência de tecnologia. Paralelamente, o sector biofarmacêutico tem vindo a investir em empresas start-up que são empresas inovadoras, geralmente spin-offs das instituições académicas. Estas empresas constituem oportunidades de inovação, quer numa estratégia de pipeline por colaboração no desenvolvimento de produto inovador, quer numa estratégia de serviços de apoio à I&D biofarmacêutica. A excelência da investigação realizada em Portugal é reconhecida internacionalmente. Neste âmbito é fundamental promover a interação entre os setores da indústria e da academia para melhorar a produtividade da I&D. Novos modelos de colaboração constituem oportunidades para novos modelos de negócio e financiamento das empresas start-up nacionais e das instituições académicas. 1.5. Terapêutica personalizada Hoje é sabido que as variações genéticas entre doentes podem resultar em respostas diferentes para o mesmo medicamento. O estudo de como os genes afetam a forma como uma pessoa reage aos medicamentos é chamado farmacogenética. Até ao momento foram já identificadas mais de 3 milhões de variações genéticas. Esta informação permite prever se um dado medicamento pode ser eficaz, ineficaz ou tóxico em certos indivíduos. 10 Existem, inclusivamente, vários testes genéticos que permitem definir o melhor tratamento para doentes com leucemia infantil, doenças cardíacas ou cancro da mama. Por exemplo, para este último, 30% dos casos são caracterizados pela sobre-expressão da proteína HER2, pelo que esta informação se torna relevante para a decisão terapêutica. Encontram-se em desenvolvimento testes genéticos para outras doenças, tais como a asma e a depressão. O desenvolvimento de opções terapêuticas que dependem da utilização de um teste de diagnóstico tem vindo a tornar-se cada vez mais comum. Estes testes permitem individualizar, ou personalizar o tratamento, identificando os doentes que são mais propensos a responder, ou que estão em risco de sofrer um determinado efeito adverso. A incorporação da terapêutica personalizada nos sistemas de saúde pode ajudar a resolver muitas ineficiências, como a dosagem por tentativa e erro, internamentos por reações adversas a medicamentos, diagnósticos tardios e tratamentos paliativos. 2. Produtos biofarmacêuticos originais e produtos biossimilares 2.1. Medicamentos biológicos ou biofármacos Os medicamentos biológicos são substâncias fabricadas por células vivas geralmente geneticamente modificadas. Pequenas variações nas células, nos seus nutrientes ou no ambiente e condições de crescimento, podem causar diferenças significativas no produto final e suas propriedades. A caracterização exata de um medicamento biológico não é possível hoje em dia, considerando os atuais métodos analíticos disponíveis. A correspondência da ‘impressão digital’ é, em grande parte, alcançada mediante esforços rigorosos para controlar as condições de produção, de variação nos nutrientes e do ambiente das células. 11 2.2. Medicamentos biossimilares Os medicamentos biossimilares são definidos pela Organização Mundial da Saúde como medicamentos biológicos que são similares em termos de qualidade, segurança e eficácia a medicamentos biológicos de referência já aprovados.(5) Como referido acima, os medicamentos biológicos são difíceis de produzir e de replicar pois pequenas diferenças no processo de produção podem originar produtos completamente diferentes. Logo, é praticamente impossível ter cópias exatas dos medicamentos biológicos e por isso os biossimilares não são “cópias” dos medicamentos de referência, apresentando apenas similaridade. Biossimilares não são genéricos. Os biossimilares não são cópias exatas do medicamento inovador, pelo que não são iguais, nem na função nem na segurança. Dada a estrutura complexa dos produtos biológicos, os estudos analíticos não bastam para demonstrar similaridade (não “igualdade”). Em muitos casos são necessários ensaios clínicos e experiência clínica para resolver algumas incertezas quanto à “estrutura-função” dos medicamentos e para demonstrar a equivalência em termos de segurança e de eficácia. 2.3. Aspetos de segurança dos medicamentos biológicos/biossimilares A segurança do doente é a prioridade. Grande parte dos medicamentos biológicos são habitualmente injetados ou perfundidos nos doentes em meio hospitalar e podem potencialmente causar uma reação imunitária. Esta pode não ter consequências clínicas, mas nalguns casos pode originar uma eficácia sub-terapêutica ou reações adversas graves. Pequenas diferenças no processo de produção ou na estrutura de um biológico podem contribuir para uma mudança na eficácia ou para uma reação adversa nos doentes. Por esta razão, os biossimilares podem dar origem a respostas imunitárias diferentes. 12 O fabrico de um medicamento biológico seguro e eficaz requer inúmeras etapas cuidadosamente executadas para assegurar que a complexa estrutura do produto biológico é replicada com precisão, sempre que é produzido um novo lote. As diferenças nas características estruturais do biossimilar em relação ao medicamento inovador podem afetar a sua atividade clínica e o perfil de segurança, 2.4. Substituição automática A substituição consiste na possibilidade de troca de um medicamento biológico por outro, habitualmente de um inovador por um biossimilar. A substituição automática significa que a troca de medicamentos ocorre sem a autorização por parte do médico. O conhecimento científico atual não sustenta a substituição de um medicamento biológico original por outro, nem de um medicamento biológico original por um medicamento biossimilar. Existem diferenças entre os medicamentos biológicos originais e os biossimilares, pelo que alternar diferentes medicamentos biológicos não-idênticos num mesmo doente constitui um risco potencial de segurança (incluindo imunogenicidade, perda de eficácia ou resposta exacerbada). A substituição automática de medicamentos biológicos não é recomendada devido aos riscos de segurança associados. Os planos de farmacovigilância pós-comercialização devem permitir avaliar estes casos, monitorizando e avaliando os riscos de segurança. Qualquer sistema de substituição que não esteja assente na precaução e na rastreabilidade pode criar riscos desnecessários para a segurança do doente. A Agência Europeia do Medicamento declarou que “uma vez que os biossimilares e os medicamentos biológicos de referência não são idênticos, a decisão de tratar um doente com 13 um medicamento de referência, ou um medicamento biossimilar, deve ser tomada segundo a opinião de um profissional de saúde qualificado”. A substituição automática do medicamento utilizado (inovador – biossimilar ou vice-versa) deve ser considerada uma alteração ao tratamento do doente e não deve ser uma prática, sem o consentimento do médico prescritor. (6,7) Num doente bem controlado com um determinado medicamento biológico não deve ocorrer a substituição do seu tratamento por razões exclusivamente económicas (7) . Neste sentido, alguns países Europeus ,como a França, proibiram a substituição automática de biológicos. Cabe ao Estado a responsabilidade de garantir a segurança dos doentes. É importante e urgente que as autoridades se pronunciem sobre este assunto. 2.5. Nomenclatura O médico prescritor deve poder distinguir entre o medicamento biológico original e o medicamento biossimilar. Deve igualmente distinguir diferentes medicamentos biossimilares. Uma nomenclatura distinta para todos os medicamentos biológicos, incluindo biossimilares, permite assegurar que os doentes recebem o que é prescrito pelo médico e inequivocamente rastrear potenciais efeitos adversos. A melhor forma para assegurar que os prescritores, doentes e outros profissionais de saúde conseguem distinguir o medicamento prescrito e dispensado é através de uma denominação comum internacional distinta (p.ex. incluindo um sufixo como –BS1, -BS2, etc) e da inclusão de uma denominação comercial, por marca ou indicação do nome do titular da autorização de introdução no mercado entre os elementos identificadores dos medicamentos biológicos, incluindo nas prescrições feitas no contexto dos cuidados de saúde transfronteiriços. Em caso de acontecimento adverso, é necessário rastrear e identificar corretamente qual o medicamento biológico que originou este efeito. 14 É fundamental garantir a consistência com a Diretiva Europeia da Farmacovigilância (Directiva 2010/84/UE do Parlamento Europeu e do Conselho de 15 de Dezembro de 2010), que requer que todos os Estados Membros “assegurem que (...) são tomadas todas as medidas apropriadas para identificar todos os medicamentos biológicos receitados, distribuídos ou vendidos no seu território (...)” 2.6. Extrapolação de indicações terapêuticas Segundo as orientações da EMA, nos casos em que o medicamento original tem mais do que uma indicação, a eficácia e a segurança do biossimilar necessita de ser justificada ou, se necessário, demonstrada separadamente para cada uma das indicações. Assim, nos casos em que o medicamento biológico inovador tem mais do que uma indicação, o Resumo de Características do Medicamento (RCM) do medicamento biossimilar deve incluir informação relativa às indicações para as quais foi demonstrada segurança e eficácia em ensaios clínicos controlados, bem como às indicações para as quais não foram realizados estudos clínicos (i.e., em caso de extrapolação sem demonstração independente de segurança e eficácia). A extrapolação de uma indicação para outra, por exemplo no caso dos anticorpos monoclonais, não é geralmente adequada devido à complexidade das patologias para as quais os medicamentos biológicos têm indicação, bem como devido às características dos doentes, regime de tratamento e medicação concomitante. Os biossimilares não devem ser automaticamente aprovados para as mesmas indicações dos medicamentos inovadores; apenas devem ser aprovados nas indicações em que demonstraram segurança e eficácia. A extrapolação entre indicações exige avaliações bem fundamentadas. Os estudos mínimos para efeitos de comparabilidade devem ser estudos de farmacocinética, farmacodinâmica e de eficácia clínica. (8) 15 2.7. Necessidade de enquadramento regulamentar Considerando a natureza complexa dos medicamentos biológicos, para os quais o perfil benefício/risco deve ser cuidadosamente monitorizado torna-se importante que as Autoridades de Saúde emitam recomendações para a prescrição, dispensa e utilização de medicamentos biológicos em Portugal, à semelhança do que já aconteceu noutros Estados Membros, como é o caso do Reino Unido(9), França(10), Espanha(10), Itália(10) e Holanda(11). Tal medida revela-se de caráter urgente uma vez que atualmente a prescrição, dispensa e utilização dos medicamentos biológicos em Portugal ainda não se encontra abrangida por normas específicas, tendo em conta as especificidades destes medicamentos. Alternar diferentes fármacos biológicos num mesmo doente constitui um risco de segurança acrescido para o doente, devido ao potencial imunogénico destes fármacos. Como tal, as orientações aos profissionais de saúde a emitir pelas Autoridades de Saúde devem recomendar que qualquer alteração ao tratamento com medicamentos biológicos deve apenas ser realizada pelo médico prescritor e que os doentes têm o direito de ser informados sempre que for alterado o medicamento que estão a receber. A substituição automática de medicamentos biológicos sem o consentimento prévio do prescritor não deve ser uma prática aceitável. Para uma monitorização adequada da segurança dos medicamentos biológicos é essencial identificar e rastrear os medicamentos na prática clínica. Assim, as Autoridades de Saúde deverão promover a adoção de medidas para melhorar a correta rastreabilidade dos medicamentos biológicos administrados aos doentes. A prática de prescrição por DCI não deverá aplicar-se aos medicamentos biológicos, mesmo a nível hospitalar, dado que promove indiretamente a substituição automática devendo ser implementados mecanismos que permitam identificar o medicamento biológico exato e o respectivo número de lote utilizado em cada doente. 3. Inovação Biofarmacêutica e a Sustentabilidade do SNS 16 3.1. Os medicamentos biológicos e o controlo do investimento público As doenças crónicas estão entre as mais prevalentes e onerosas dos sistemas de saúde, sendo no entanto frequentemente as mais simples de prevenir. Uma abordagem integrada, que inclua programas de prevenção, rastreio precoce, diagnóstico e tratamento atempado, pode conduzir a uma utilização mais eficiente dos recursos dos serviços de saúde, gerando poupanças significativas. Tais políticas, apesar do investimento inicial, conduzirão também a uma utilização mais eficiente dos medicamentos inovadores, permitindo-lhes libertar recursos a montante para outros pontos do sistema, tal como evidenciado pelo valor económico dos medicamentos biofarmacêuticos. A avaliação da despesa com medicamentos, quando feita de forma isolada, não permite uma visão real da contribuição relativa dos vários componentes dos sistemas de saúde. Uma análise mais cuidadosa permitirá observar que os medicamentos biológicos são uma alternativa aos cuidados de saúde mais onerosos. A sua utilização constitui uma das despesas de saúde mais eficientes sendo, no entanto, sujeita um controlo muito rigoroso em comparação com outras despesas do orçamento da saúde. 3.2. Necessidade de um ambiente regulamentar estável Desde 2005 que a Indústria Farmacêutica tem vindo a absorver as descidas de preços dos medicamentos sujeitos a receita médica com o objetivo de controlo da despesa pública. Esta contribuição não tem sido, contudo, considerada suficiente para o Estado, e toda a cadeia de valor do medicamento se encontra ameaçada em termos da sua própria sustentabilidade com repercussões que já se fazem sentir ao nível de emprego, investimento e dos contributos fiscais do setor para a economia portuguesa. 17 A reforçar o impacto negativo das reduções de preço surgem os atrasos no acesso dos novos medicamentos ao nível do sistema de saúde, mediante um processo de avaliação que, embora tenha feito um caminho importante, não observa a sua consolidação nos aspetos que necessitam de ser alterados. Metodologias de preço e comparticipação estáticas devem evoluir para abordagens mais flexíveis, alinhadas com uma visão diferenciada do valor acrescentado do medicamento biológico, incluindo o seu valor social e contribuição para a gestão eficiente da doença e dos cuidados de saúde. Reduções constantes no preço dos medicamentos e limitações no acesso dos doentes aos medicamentos biológicos não são a solução para controlar os gastos do Serviço Nacional de Saúde, uma vez que trazem apenas benefícios de curto prazo, com consequências muito negativas para os doentes, para a atividade da Indústria Farmacêutica, e impõem severas restrições no acesso à inovação. 3.3. Acesso equitativo e atempado dos doentes aos Medicamentos Inovadores As empresas de biotecnologia reconhecem a necessidade de se caminhar no sentido de uma avaliação global, em relação às intervenções em saúde e, nesse contexto, poderem ser feitas escolhas fundamentadas no valor que a tecnologia representa sob o ponto de vista clínico, social e económico. As empresas de biotecnologia reconhecem na Avaliação de Tecnologias de Saúde (ATS) um modelo de quantificação e qualificação do valor da inovação. Sendo baseado no valor, existem aspetos de temporalidade, ajustamento das condições de avaliação, aplicação de princípios de transparência e de flexibilidade que são determinantes. Os atuais procedimentos de acesso ao mercado dos medicamentos inovadores podem atrasar, significativamente, o acesso dos doentes a novos tratamentos. É essencial garantir o cumprimento dos prazos legais no acesso efetivo a medicamentos inovadores. 18 Enquanto que alguns dos novos medicamentos representam desenvolvimentos terapêuticos revolucionários, outros permitirão obter benefícios incrementais em relação a tratamentos existentes, oferecendo um perfil melhorado da sua eficácia, tolerabilidade ou modo de administração. Estes benefícios incrementais são importantes, traduzindo-se em diferenças verdadeiras na vida de cada doente. A Avaliação Económica de Medicamentos deve consistir na avaliação dos benefícios diretos e indiretos de novas opções terapêuticas, e não como medida de contenção de custo ou como forma de atrasar o acesso aos novos tratamentos. 3.4. Utilização racional dos medicamentos biológicos A promoção de práticas efetivas de utilização racional de medicamentos deve ter como principal objetivo a qualidade dos cuidados de saúde e do tratamento dos doentes, com vista à obtenção de melhores resultados clínicos. A utilização racional não deverá ser interpretada como racionalização, mas como tratamento efetivo. Portanto são necessárias verdadeiras medidas de monitorização, indicadores, métricas e metas que traduzam este objetivo. A segurança do doente e a qualidade na utilização do medicamento devem constituir uma preocupação e ser o foco da Política de Saúde e do Medicamento, devendo ser promovidas ações que visem a correta utilização por parte do doente. É necessário garantir a boa utilização do medicamento, através de programas de adesão à terapêutica que visem melhorar a informação e sensibilização dos doentes e profissionais de saúde. A Indústria Farmacêutica tem tido e continuará a ter uma postura de responsabilidade, mostrando-se totalmente disponível para encontrar soluções com o Governo para que sejam criadas condições no nosso País que permitam o acesso de doentes a terapêuticas inovadoras, de acordo com os padrões Europeus e as mais recentes recomendações clínicas. A correção de ineficiências do sistema e a melhoria da qualidade da gestão do mesmo, aliada 19 ao entendimento da Indústria Farmacêutica como um parceiro com conhecimento técnico relevante na busca de soluções efetivas para a saúde em Portugal farão com que os portugueses deixem de ser considerados no espaço europeu, como atualmente acontece, doentes de segunda categoria, sem acesso à inovação na área dos medicamentos biológicos. 4. Referências (1) A. Jemal, et al., “Cancer Statistics, 2010,” CA: A Cancer Journal for Clinicians 60, 5 (2010): 277–300 (2) J.M. Kremer, “COMET’s Path, and the New Biologicals in Rheumatoid Arthritis,” The Lancet 372, 9636 (2008): 347–348 (3) Integrated Benefits Institute, A Broader Reach for Pharmacy Plan Design, San Francisco: IBI, May 2007 (4) MHRA newsletter, volume 1, Issue 7, February 2008, www.mhra.gov.uk/Publications/Safetyguidance/DrugSafetyUpdate/CON2033917 (5) OMS. Guidelines on evaluation of similar Biotherapeutic products (sbps). Biotherapeutics, available at http://www.who.int/biologicals/areas/biological_therapeutics/BIOTHERAPEUTICS_FOR_WEB_22APRIL2010.pdf (6) Mellstedt H, Nierderwieser D, Ludwig H. The challenge of biosimilars. Annals of Oncology. 2008. 19: 411-419. (7) Barosi, G., Bosi, A., Abbrachio, M., et al. Key concepts and critical issues on epoetin and filgrastim biosimilars. A position paper from the Italian Society of Hematology, Italian Society of Experimental Hematology, and Italian Group for Bone Marrow Transplantation. Haematologica 2011; 96(7):937-942. (8) EMEA Committee on Medicinal Products for Human Use (CHMP) Guideline on Similar Biological Medicinal Products, CHMP/437/04, 30 Oct. (9) MHRA newsletter, volume 1, Issue 7, February 2008, www.mhra.gov.uk/Publications/Safetyguidance/DrugSafetyUpdate/CON2033917 (10) The impact of biosimilars’ entry in the EU market, http://ec.europa.eu/enterprise/sectors/healthcare/files/docs/biosimilars_market_012011_en.pdf 20 (11) Are biosimilar medicinal products interchangeable?, http://www.cbg-meb.nl/CBG/en/human-medicines/medicinal+products/biosimilars/Are-biosimilar-medicinalproducts-interchangeable/default.htm 21