Nota Técnica No 16
Justiça Social com a Extinção do
Fator Previdenciário
Elaboração: Departamento de Estudos
Técnicos do Sindifisco Nacional
Brasília-DF, Maio de 2010.
Diretoria Executiva Nacional
Presidente
Pedro Delarue Tolentino Filho
1º Vice-Presidente
Lupercio Machado Montenegro
2º Vice-Presidente
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Secretário-Geral
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Diretor-Secretário
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Diretor de Finanças
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Diretor-Adjunto de Finanças
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Diretora de Administração
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Diretor-Adjunto de Administração
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Diretor de Assuntos Jurídicos
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1º Diretor-Adjunto de Assuntos Jurídicos
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2º Diretor-Adjunto de Assuntos Jurídicos
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Diretor de Defesa Profissional
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1ª Diretora-Adjunta de Defesa Profissional
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2º Diretor-Adjunto de Defesa Profissional
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Diretor de Estudos Técnicos
Luiz Antonio Benedito
Diretora-Adjunta de Estudos Técnicos
Elizabeth de Jesus Maria
Diretor de Comunicação Social
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1ª Diretora-Adjunta de Comunicação Social
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2º Diretor-Adjunto de Comunicação Social
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Diretora de Assuntos de Aposentadoria,
Proventos e Pensões
Clotilde Guimarães
Diretora-Adjunta de Assuntos de
Aposentadoria, Proventos e Pensões
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Diretor do Plano de Saúde
Carlos Antonio Lucena
Diretor-Adjunto do Plano de Saúde
Jesus Luiz Brandão
Diretor de Assuntos Parlamentares
João Da Silva Dos Santos
Diretor-Adjunto de Assuntos Parlamentares
Geraldo Marcio Secundino
Diretor de Relações Intersindicais
Carlos Eduardo Barcellos Dieguez
Diretor-Adjunto de Relações Intersindicais
Luiz Gonçalves Bomtempo
Diretor de Relações Internacionais
João Cunha da Silva
Diretora de Defesa da Justiça Fiscal e da
Seguridade Social
Maria Amália Polotto Alves
Diretor-Adjunto de Defesa da Justiça Fiscal e
da Seguridade Social
Rogério Said Calil
Diretoria de Políticas Sociais e Assuntos
Especiais
Jose Devanir De Oliveira
Diretores-Suplentes
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Kleber Cabral
Conselho Fiscal
Membros Titulares
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Jose Benedito de Meira
Maria Antonieta Figueiredo Rodrigues
Membros Suplentes
Iran Carlos Toneli Lima
Norberto Antunes Sampaio
José Yassuo Hashimoto
DIRETORIA DE ESTUDOS TÉCNICOS
Luiz Antonio Benedito
Diretor de Estudos Técnicos
Elizabeth de Jesus Maria
Diretora-adjunta de Estudos Técnicos
Equipe Técnica que elaborou este estudo:
Alvaro Luchiezi Jr. – Economista, Gerente de
Estudos Técnicos
Alexandra Isabel Trentini – Advogada, Assessora
de Diretoria II.
Colaboração:
Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da
Receita Federal do Brasil
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Brasília/DF - CEP 70392-900
Fone (61) 3218 5200 - Fax (61) 3218 5201
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1-
Introdução
Atualmente o Brasil conta com dois sistemas previdenciários distintos, o Regime
Geral da Previdência Social (RGPS), aplicado aos trabalhadores da iniciativa privada e o
regime especial, aplicável aos servidores públicos.
O RGPS está disciplinado no artigo 201 da Constituição Federal que dispõe ser
este de caráter contributivo e de filiação obrigatória, preservando o equilíbrio financeiro e
atuarial.
A previdência social garante:
•
•
•
•
•
•
cobertura de eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada;
proteção à maternidade;
proteção ao trabalhador por desemprego involuntário;
salário família
auxilio reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda;
pensão por morte.
A Constituição Federal veda a adoção de requisitos e critérios diferenciados para
concessão de aposentadoria aos beneficiários do regime geral, ressalvados os casos de
atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade
física, como por exemplo, os controladores de voo, os técnicos de radiologia, operadores
de raio X. Tais condições são definidas por meio de lei complementar.
Também é vedado recebimento de valor inferior ao salário mínimo vigente, para
benefício que substitua o salário-de-contribuição ou o rendimento do segurado.
Até a promulgação da Emenda Constitucional nº 20/1998 (EC 20), a Constituição
Federal estabelecia de forma detalhada que o valor da aposentadoria devia ser calculado
sobre a média dos últimos 36 salários de contribuição, corrigidos monetariamente mês a
mês. A EC 20 consagrou como princípio basilar o equilíbrio financeiro atuarial e
desconstitucionalizou a regra de cálculo do valor das aposentadorias devidas no RGPS.
Com o fim da regra de cálculo, a questão passou a ser disciplinada por legislação
infraconstitucional, especificamente pela Lei nº. 9.876/99 que dispõe sobre a contribuição
previdenciária do contribuinte individual e o cálculo do benefício.
2-
O Fator Previdenciário na Reforma da Previdência de 1998
A Lei nº. 9.876/99 ampliou o período de cálculo do salário-de-benefício,
introduzindo o fator previdenciário na sua fórmula de cálculo com o objetivo de adequar a
norma infraconstitucional ao novo modelo de previdência delineado pela EC 20.
Até EC 20 o salário-de-benefício, que remunerava tanto a aposentadoria por idade
e como a aposentadoria por tempo de serviço1, era calculado pela média aritmética
1
A aposentadoria por tempo de serviço foi substituída, a partir de então, pelo tempo de contribuição. O fator
o
previdenciário foi formalmente introduzido pelo artigo 2º da Lei 9.876/99 que introduziu o § 7 ao art. 29 da
Lei 8.213/91, o qual diz: “o fator previdenciário será calculado considerando-se a idade, a expectativa de
sobrevida e o tempo de contribuição do segurado ao se aposentar, segundo a fórmula constante do Anexo
desta Lei”. Posteriormente, a Lei Complementar 123/06 acrescentou a alínea a) ao inciso I do art. 18 da Lei
3
simples dos últimos salários-de-contribuição dos meses anteriores ao pedido de
aposentadoria ou afastamento. Para o cálculo da média considerava-se o máximo de 36
salários em um período não superior a 48 meses2. Esta média ficou conhecida como
média curta.
A partir da Lei 9.876/99, a renda mensal inicial da aposentadoria por tempo de
contribuição, e opcionalmente por idade, passou a ser calculada pela média aritmética
simples de 80% dos maiores salários-de-contribuição de todo o período contributivo,
multiplicado pelo fator previdenciário. Esta regra passou a ser válida para os filiados do
RGPS a partir de 28 de novembro de 1999. Para os filiados anteriormente a esta data
conta-se o período contributivo a partir do mês de julho de 1994. Estes períodos
constituem o chamado Período Básico de Cálculo (PBC), definido como o intervalo de
tempo tomado como referência para apurar os salários-de-contribuição que serão
utilizados no cálculo do salário-de-benefício. A média calculada pelos períodos instituídos
pela Lei 9.876/99 é conhecida como média longa.
Para todos os segurados que tiverem unicamente o direito à aposentadoria por
tempo de contribuição, aplica-se o fator previdenciário. Quem se aposentar por idade
poderá optar por não utilizar o fator previdenciário. Podem se aposentar por idade os
trabalhadores homens com 65 anos de idade e as mulheres trabalhadoras com 60 anos,
desde que cumprido um período de carência3. Os trabalhadores rurais aposentam-se por
idade aos 60 anos e as trabalhadoras aos 55.
Sendo um multiplicador da média dos salários-de-contribuição, o fator
previdenciário poderá ampliá-la, se for superior a 1; reduzi-la, se for inferior a 1 ou mantêla se for igual a 1. Ele é definido pela seguinte expressão:
Fp =
Tc x a  ( Id + Tc x a) 
x 1 +

Es
100

Onde: Fp = fator previdenciário
Tc = tempo de contribuição até o momento da aposentadoria;
Es = expectativa de sobrevida no momento da aposentadoria;
Id = idade no momento da aposentadoria;
a = alíquota de contribuição correspondente a 0,31.
3-
A influência da expectativa de sobrevida no cálculo do fator previdenciário
A expectativa de sobrevida utilizada no cálculo do fator previdenciário é obtida a
partir da Tábua Completa de Mortalidade para ambos os sexos calculada pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Na fórmula do fator previdenciário a expectativa de sobrevida aparece no
denominador do primeiro termo e, por esta razão, amplia ou reduz o fator previdenciário.
8.213/91, sacramentando a aposentadoria pelo tempo de contribuição como um dos benefícios prestados
pelo RGPS.
2
Conforme o art. 29 da Lei 8.213/91, posteriormente revogado.
3
Número mínimo de contribuições mensais para que o segurado faça jus ao benefício. Para os filiados a
partir de 27 julho de 1991 este período é de 180 meses. Para os filiados antes desta data há uma tabela
progressiva de carência.
4
Quanto maior for a expectativa de sobrevida, menor será o fator previdenciário.
Contrariamente, quanto menor a expectativa, maior o fator.
A menos que haja uma improvável e constante redução na expectativa de
sobrevida para a população, esta fórmula induz o trabalhador a retardar a sua
aposentadoria. Por exemplo, um trabalhador que entrasse no RGPS com 25 anos e
contribuísse ininterruptamente por 35 anos chegaria a 2010 com 60 anos de idade.
Segundo a Tabela do Fator Previdenciário de 2010, seu fator previdenciário seria de
0,874. Se o trabalhador se aposenta neste ano, ele perde 12,6% do seu salário-debenefício. Se continuar trabalhando, retardaria sua aposentadoria em mais alguns anos4.
A expectativa de sobrevida tem melhorado sensivelmente nos últimos anos. Uma
pessoa nascida em 1991 tinha uma expectativa de sobrevida de 67 anos. Em 2000,
primeiro ano em que o fator previdenciário passou a ser efetivamente calculado, era de
70,5 anos. Em 2007, a expectativa de sobrevida média do brasileiro era de 72,7 anos. A
última tabela divulgada é do ano de 2008 e seus resultados são atualmente utilizados na
fórmula. A pessoa nascida neste ano tinha expectativa de sobrevida de 69,1 anos se
fosse homem e de 76,7 anos se fosse mulher. A média para ambos os sexos é de 72,9
anos. A melhoria deste indicador está clara: entre 2000 e 2008 houve um crescimento de
3,4%, ou seja, 2,4 anos de vida a mais, em média.
Em outras palavras, se são inegáveis os benefícios do aumento da expectativa de
sobrevida, estes anos a mais serão enfrentados com muito maior dificuldade financeira
por aquela parcela da população que depende do salário-de-benefício e cuja opção por
prolongar seus anos de trabalho é inviável. Para estes casos, os ganhos em anos de vida
a mais serão "cobrados" com uma redução na aposentadoria.
A melhoria na expectativa de sobrevida da população brasileira também foi
impulsionada por fatores de ordem metodológica no seu cálculo. A Tábua Completa de
Mortalidade de 2002 trouxe uma variação notável em relação ao ano anterior bastante
superior à média que vinha então se observando. A expectativa média de vida para o
brasileiro nascido em 2001 era de 68,1 anos e pulou para 71 anos em 20025. Um
acréscimo de 3,9 anos ou crescimento de 4,25% num único ano. Entre os censos de 1991
e 2000 o crescimento da expectativa de sobrevida foi de 3,6 anos6. Uma das justificativas
apresentadas pelo IBGE para a mudança da metodologia foi o “subregistro dos eventos
vitais”7, ou seja, o registro tardio de nascimentos e o não registro de nascimentos e óbitos.
O IBGE, pois, adotou novos procedimentos de cálculo que contemplem estes eventos
demográficos.
A conseqüência para o fator previdenciário foi extremamente negativa. Assim, por
exemplo, para um trabalhador do sexo masculino com 60 anos de idade e com 35 anos
de contribuição, o fator previdenciário era superior a um até 2001 (1,0414 em 2000 e
1,0356 em 2001) mas passou a ser inferior a um (0,9043) em 20028. Ou seja, a mudança
nos critérios fez com que, subitamente, o fator previdenciário deixasse de ser um fator
multiplicador dos benefícios para ser um fator redutor.
4
Se a Tabela do Fator Previdenciário de 2010 se mantivesse inalterada este trabalhador deveria esperar
mais dois anos para alcançar um fator previdenciário igual a 1,010. Como a expectativa de sobrevida
melhora a cada ano e a tabela, por conseguinte, se altera, este trabalhador deverá continuar contribuindo
por tempo maior.
5
IBGE, Tábua de Mortalidade Completa 2001 e 2002.
6
OLIVEIRA, J.C. e ALBUQUERQUE, F.R.P.C., Projeção da População do Brasil – Parte 1, 2002.
7
IBGE, ídem, p. 5
8
DEUD, Cláudia A. F., 2004, p. 9
5
A variação média anual no fator previdenciário de 1998 a 2001 foi de cerca de
0,5%. Mantido este ritmo sem as alterações metodológicas, o fator previdenciário
chegaria a 1 somente em cinco anos. Se um trabalhador tivesse chegado ao ano de 2002
em condições de se aposentar com 35 anos de contribuição e optasse por permanecer
mais um ano trabalhando para, aumentando seu tempo de contribuição, também
aumentar seu benefício teria, de fato, o benefício reduzido!
A alteração metodológica na tabela da expectativa de sobrevida pode, inclusive,
ter levado a alguns trabalhadores a entrarem com ações na Justiça para preservar o
direito adquirido9.
Conforme atesta estudo do IPEA10 a mudança metodológica no cálculo do fator
“ocasionou quedas entre 9,61% e 17,44% nos valores do fator. (...) Conseqüentemente,
para aposentar-se sem mudança no valor do fator e com as mesmas idades, tornou-se
necessário contribuir por períodos entre 10% e 21% maiores”. Mas a ameaça de novas e
súbitas mudanças metodológicas não pode ser descartada, como esclarece o próprio
estudo.
“No entanto, de acordo com o próprio IBGE, as projeções de população por sexo e
grupos de idade devem ser revistas sempre que novas informações surjam, quer
de censos demográficos, pesquisas domiciliares, entre outras, um vez que fazem
parte de um processo contínuo de atualização. Dessa forma, novas mudanças
bruscas nas tábuas de mortalidade não devem ser descartadas. O que aumenta a
11
incerteza dos segurados sobre seus futuros benefícios de aposentadoria” .
De fato, o próprio IBGE anuncia para breve uma revisão das tábuas de
mortalidade, o que poderá implicar em novas alterações abruptas no fator previdenciário
com prejuízos no valor do benefício:
Nos estudos e análises demográficas, a revisão de uma projeção – visando
aprimorar a precisão do dado prospectivo (...) é um procedimento necessário e
recomendado. (...). Cabe ao IBGE a missão de retratar o mais fielmente possível
este quadro evolutivo.
O IBGE deverá construir outra tábua de mortalidade a partir dos resultados do
próximo Censo Demográfico, em 2010, e irá comparar a tábua resultante com a
12
projeção atual .
4-
Fator Previdenciário e Limite de Idade Mínima para a Aposentadoria
Uma alternativa às aposentadorias ditas precoces, com idades relativamente pouco
avançadas, seria a definição de uma idade mínima para a aposentadoria. Por este critério
o trabalhador não poderia se aposentar até atingir uma idade mínima, mesmo que ele
9
DEUD, Cláudia A. F., 2004, p. 5
DELGADO e outros, 2006, p. 24
11
Idem, p. 24.
12
IBGE, Em 2003, expectativa de vida do brasileiro subiu para 71,3 anos. Disponível em:
<http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/noticia_visualiza.php?id_noticia=266>. Acesso em: 10
abr. 2010.
10
6
viesse a cumprir o período de contribuição. Durante a discussão da EC 20 a Câmara dos
Deputados rejeitou esta idéia. O fator previdenciário foi uma forma velada de implantá-la.
Uma das principais alterações introduzidas pela Reforma da Previdência, por
intermédio da EC 20, foi a substituição do conceito do tempo de serviço pelo tempo de
contribuição. No art. 201 da Constituição Federal, o parágrafo 1º veda critérios e
requisitos diferenciados na concessão de aposentadoria e os incisos I e II do parágrafo
7º, estabelecem algumas condições de idade para se alcançar a aposentadoria:
§ 1º É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão
de aposentadoria aos beneficiários do regime geral de previdência social,
ressalvados os casos de atividades exercidas sob condições especiais que
prejudiquem a saúde ou a integridade física e quando se tratar de segurados
portadores de deficiência, nos termos definidos em lei complementar.
(...)
§ 7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos
termos da lei, obedecidas as seguintes condições:
I - trinta e cinco anos de contribuição, se homem, e trinta anos de contribuição, se
mulher;
II - sessenta e cinco anos de idade, se homem, e sessenta anos de idade, se
mulher, reduzido em cinco anos o limite para os trabalhadores rurais de ambos os
sexos e para os que exerçam suas atividades em regime de economia familiar,
nestes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal.
Com o fator previdenciário, a aposentadoria, que deveria ocorrer ao término do
tempo de contribuição, passa a ser, de maneira oblíqua, por idade. Veja-se, a este
exemplo, o voto do Min. Marco Aurélio a seguir citado.
“(...) fator previdenciário ou fato idade são a mesma coisa, porque, em última
análise, tomou-se o elemento idade para nortear-se os proventos de
aposentadoria (...). A idade norteia a época e os proventos da inatividade. (...) a
idade repercute no cálculo do benefício e, daí, entre as siglas da equação para
chegar-se ao valor do benefício, tem-se a idade no momento da aposentadoria. Ao
lado dessa idade, parte-se para o que se denominou “expectativa de sobrevida” no
momento da aposentadoria”. Então, não há a menor dúvida de que (...) o rótulo
fator previdenciário, que pode ser entendido às claras, com uma transparência
13
maior, como fator idade.”
E, mais adiante,
“O critério diferenciado, aqui, [art. 201, § 1º ] é o critério concernente à idade, à
expectativa de vida a partir da idade, para a concessão de aposentadoria aos
14
beneficiários do regime geral da previdência social” .
Sendo definido como aposentadoria por idade, o fator previdenciário também trata
de forma discriminada os beneficiários do RGPS. Trata-se de um instrumento não
isonômico que não observa o Principio da Igualdade previsto no caput do art. 5º da
Constituição Federal:
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes: (...)”
13
14
o
STF, ADI n 2.111-7-DF. 16 mar 2000. Voto do Min. Marco Aurélio, p. 761-62.
Idem, p. 767
7
5-
Fator Previdenciário e Justiça Social
Ao contrário do argumento apresentado pelos defensores do fator previdenciário,
não há “injustiça” no fato de que trabalhadores com idades diferentes aposentem-se ao
mesmo tempo e com o mesmo salário-de-benefício.
Esta diferenciação entre indivíduos iguais não é causada pelo sistema
previdenciário. Razões diversas, relacionadas ao mercado de trabalho ou de ordem
individual, dentre outras tantas, determinam o momento da entrada e os períodos de
permanência no RGPS. Não cabem, nestes casos, comparações entre situações
intrinsecamente diferentes.
À guisa de ilustração, ponhamos o caso de dois jovens de idades iguais que, no
passado, tiveram que tomar a decisão de entrar no mercado de trabalho ou adiá-la.
Razões particulares e próprias à situação de cada um (disponibilidade ou não de renda;
acesso ao ensino; perspectivas profissionais; etc.) determinaram que um deles adiasse a
entrada no mercado de trabalho, e o outro entrasse. Suponhamos também que a partir do
momento em que o primeiro se torne contribuinte do RGPS, seus salários-de-contribuição
sejam semelhantes. Tudo o mais mantido constante, este segundo indivíduo atingirá seu
tempo de contribuição mais cedo do que o primeiro. No limite, o primeiro pode ter adiado
suficientemente sua entrada no mercado de trabalho de forma que, quando cumprir seu
tempo de contribuição, estará muito mais próximo de atingir a idade mínima de
aposentadoria. Ora, não é justo que o trabalhador que optou por entrar mais cedo no
mercado de trabalho seja impelido a continuar contribuindo e nele permanecer por mais
tempo do que outro que contribui menos e permanece menos tempo no mercado de
trabalho. Ambos têm o direito de se aposentar ao cabo do tempo de contribuição,
principalmente se essa foi a regra definida no momento de sua adesão ao RGPS.
Mas a história não acaba neste ponto. É preciso considerar também o que
acontecerá com estes dois indivíduos após a aposentadoria. Dependendo do tipo de
trabalho que exerça, aquele que entrou no mercado de trabalho mais cedo estará mais
sujeito a maiores problemas de saúde durante sua vida laboral e na aposentadoria, e
também a menor longevidade. Ou seja, em decorrência de sua opção e de condições que
lhe são próprias, talvez necessite de renda maior para cuidar de sua saúde (mas os
salários-de-benefício serão semelhantes) e usufrua por menos tempo da aposentadoria.
A Tabela 1 ilustra esta situação simulando diferentes idades de entrada no
mercado de trabalho levando em conta a Tabela do Fator Previdenciário para 2010.
Quanto mais cedo o trabalhador começa a contribuir para o RGPS, maior será o tempo
que ele deverá permanecer trabalhando para alcançar o salário-de-benefício integral. De
acordo com a tabela, o trabalhador que iniciou sua contribuição ao RGPS aos 15 anos, se
quisesse se aposentar com 35 anos de contribuição teria seu salário-de-benefício
reduzido em 39,6% e teria que permanecer 14 anos a mais no mercado de trabalho para
alcançar a integralidade do seu salário-de-benefício. A trabalhadora ficaria mais 19 anos!
Por outro lado, o trabalhador que iniciou sua contribuição aos 30 anos aposenta-se com
salário-de-benefício integral aos 64 anos, um ano antes de completar 35 anos de
contribuição.
8
Casos como este existem em profusão em nosso sistema previdenciário e, do
ponto de vista social, são igualmente injustos. E com um agravante: trabalhadores nestas
condições praticam de forma perversa a “solidariedade” do sistema previdenciário.
Contribuirão mais para o sistema (diga-se, para a aposentadoria de outros trabalhadores
mais afortunados, em função da escolha que fizeram) do que dele receberão.
Cabe ao próprio sistema previdenciário dar uma resposta adequada a estes casos.
O fator previdenciário certamente não significa uma proteção, pelo contrário. Pune
duplamente o indivíduo que inicia sua atividade profissional mais cedo, ao prolongar seu
tempo de contribuição e reduzir o tempo de aposentadoria.
6-
O Fator Previdenciário e o “Déficit da Previdência”
O impacto do envelhecimento da população sobre o sistema previdenciário deve
ser enfrentado, a longo prazo, por meio de políticas distributivas, educacionais e de
saúde combinadas.
Assim, políticas distributivas que, por vias do aumento paulatino da renda per
capita e familiar, ofereçam o devido suporte financeiro ao estudo e treinamentos dos mais
jovens; políticas educacionais que privilegiem a permanência do estudante na escola em
tempo integral e aumentem a escolaridade média do brasileiro; e políticas de
planejamento familiar que reduzam o número de indivíduos com pouca idade e baixa
qualificação competindo por vagas no mercado de trabalho futuro, são instrumentos de
grande relevância para a questão previdenciária e devem ser colocadas em prática pelos
sucessivos governos. Elas atuam como estímulo natural à maior permanência dos
trabalhadores no mercado de trabalho, amenizando diversos tipos de disparidades
existentes no sistema previdenciário.
A curto prazo é preciso rever a idéia de que a previdência social é deficitária. Ela é
parte da Seguridade Social e tem fontes de financiamento diversificadas. O que se
conveniou chamar, inapropriadamente, de déficit previdenciário é a diferença entre o que
pagam os empregadores e os empregados (receitas) e o que é pago em benefícios
(despesas). A conta do lado das receitas é bem mais ampla, segundo reza a Constituição
Federal no art. 195.
9
Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta
e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes
contribuições sociais:
I - do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei,
incidentes sobre:
a) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou
creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo
sem vínculo empregatício;
b) a receita ou o faturamento;
c) o lucro;
II - do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, não incidindo
contribuição sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral de
previdência social de que trata o art. 201;
III - sobre a receita de concursos de prognósticos.
IV - do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei a ele
equiparar.
O financiamento da Seguridade Social advém de contribuições sociais: dos
trabalhadores (inciso II), das receitas de concursos de prognósticos (inciso III) e dos
importadores (inciso IV) e daquelas incidentes sobre a folha de salários, sobre a receita
ou faturamento, e sobre o lucro das empresas. As contribuições a que se referem o inciso
I, além das incidentes sobre a folha de salários e rendimentos do trabalho, acima citadas,
são as seguintes: a) sobre o faturamento – Contribuição para o Financiamento da
Seguridade Social (COFINS), PIS/PASEP; b) sobre o lucro – Contribuição Social Sobre o
Lucro Líquido (CSLL).
Se a elas forem somadas as ações que garantem renda ao trabalhador
desempregado e de baixa renda, a Seguridade Social contaria com as receitas do segurodesemprego e o abono salarial. A este grupo deveriam também ser somadas as receitas
próprias de órgãos e entidades da Seguridade Social, como os Ministérios da Previdência
Social, do Desenvolvimento Social e da Saúde.
As receitas dos tributos acima, que deveriam ser destinadas à Seguridade Social,
são, de fato, canalizadas para pagamento dos compromissos da União com as dívidas
interna e externa e com os juros pagos pela arrecadação feita pelo Tesouro Nacional, na
rubrica dos chamados Encargos Financeiros da União (EFU).
O DIEESE15 apontou que as receitas da Seguridade Social, no ano de 2006,
seriam 15,8% superiores às despesas se fossem assim contabilizadas e a elas fossem
adicionadas às receitas próprias dos ministérios da Saúde, da Previdência e do
Desenvolvimento Social, e contrapartidas do Tesouro para benefícios de legislações
especiais. Mesmo considerando a Desvinculação das Receitas da União (DRU), as
receitas excederiam as despesas em 4,5%.
O argumento dos sucessivos governos para rebaixar os benefícios, inclusive e
principalmente os salários-de-benefício, por meio do fator previdenciário, é o propalado e
falacioso déficit do sistema previdenciário. Ele, no entanto, não existiria se o mandado
constitucional fosse observado e o Orçamento da Seguridade Social (OSS) fosse
implementado, tal como determina o § 5º, incisos I a III do art. 165 da Constituição
Federal. Para os três níveis de governo, a Lei Orçamentária Anual (LOA) deve ser
composta pelo Orçamento Fiscal, Orçamento de Investimentos das Empresas Estatais e
15
o
DIEESE. A Previdência Social Brasileira Tem Déficit? DIEESE: São Paulo, out. 2007. Nota Técnica n
52, 11 p.
10
pelo Orçamento da Seguridade Social. Não há, no âmbito constitucional, qualquer
referência a um orçamento específico para a Previdência Social.
A DRU permite que a União gaste 20% dos recursos destinados às contribuições
sociais, que deveriam ser canalizadas para a Seguridade Social, em outras despesas que
não as próprias da seguridade. A DRU foi criada por meio do Fundo de Estabilização
Fiscal (FEF), que vigorou nos exercícios financeiros de 1994 e 1995, e permitiu a
desvinculação de 20% da arrecadação de impostos e contribuições sociais até o fim de
2003. Ela foi prorrogada, no âmbito da EC no 42 até 2007, quando a EC no 56 a prorrogou
até o ano de 2011. Ao todo terão sido 17 anos em que o orçamento fiscal absorve
recursos da Seguridade Social.
O que tradicionalmente se divulga como déficit é o resultado do financeiro do
RGPS (diferença entre arrecadação e pagamento de benefícios, conforme mencionado
acima). Ora, a Constituição Federal determina a criação de um orçamento com recursos
próprios e exclusivos para as políticas de Seguridade Social (Saúde, Previdência e
Assistência Social), distinto daqueles que financiam as demais políticas do governo. A
não implementação do OSS e a existência do mecanismo da DRU justificam
erroneamente que o sistema previdenciário brasileiro é deficitário e causador do déficit
público. Se o OSS fosse implementado e a DRU eliminada não existiria “déficit
previdenciário”, e as tentativas de “ajuste”, como a manutenção do fator previdenciário,
não teriam sentido de existir.
Interessante é contrastar os números oficiais apresentados para este suposto
déficit e para a “contribuição” do fator previdenciário. Entre 2000 e 2008, o fator
previdenciário teria proporcionado uma economia de cerca de R$ 10 bilhões nas contas
da Previdência16. Isto significa pouco mais de 1,1 bilhão anual, em média, em valores
correntes. Somente no ano de 2009 este déficit das contas da previdência teria sido de
R$ 43,6 bilhões17. Ora, à parte a veracidade do déficit, a suposta economia anual
propiciada pelo fator previdenciário não seria capaz de “custeá-lo” em muito mais do que
2,5%!
7-
Conclusão
O fator previdenciário traz evidente prejuízo ao trabalhador, desestimulando a
aposentadoria enquanto o próprio fator for inferior a 1. Ao se inscrever no RGPS ele tinha
a expectativa de se aposentar com benefícios integrais após 35 anos se for homem ou 30
anos se for mulher. A partir da entrada em vigor do fator previdenciário, cumprido este
período de contribuição e dada a crescente expectativa de sobrevida, ele não mais terá
seu benefício integralmente. Restará ao trabalhador a desagradável escolha entre um
benefício menor para se aposentar ou o retardo da sua aposentadoria para atingir o
benefício integral.
O trabalhador deve fazer uma escolha que não surgiu do seu livre arbítrio, mas sim
de uma imposição legal. Ele não é obrigado a continuar trabalhando tendo atingido o
tempo de contribuição. Mas se o seu salário-de-benefício for reduzido pelo fator
16
RAMOS, Murilo; ROCHA, Leonel. Nosso Dinheiro em Troca de Votos. Revista Época. Rio de Janeiro Ed.
626 07 mai 2010
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Martello, Alexandro. Déficit do INSS deve ter novo crescimento em 2010, diz governo. Portal G1.
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previdenciário, então esta redução acaba se impondo e ele “opta” por continuar
trabalhando. O trabalhador faz, assim, uma escolha forçada.
Este problema atinge todos os trabalhadores filiados ao RGPS e que se aposentam
por tempo de contribuição. Torna-se mais agudo para aqueles que, diante da baixa
empregabilidade ou de condições precárias de saúde, têm na aposentadoria a única
alternativa para o desemprego ou para o tratamento da saúde. A estes não resta muita
opção. Premidos por circunstâncias específicas, deverão aceitar a imposição de um
salário-de-benefício reduzido.
O trabalhador optante do RGPS, que dedica trinta e cinco anos de sua vida à
construção do desenvolvimento nacional recebe, ao cabo deste período, uma
aposentadoria que, no máximo, lhe retribuirá com pouco menos de R$ 3.500,00, o teto da
Previdência Social em 2010. Este teto não será alcançado por praticamente nenhum
trabalhador que se aposente por tempo de contribuição, pois o fator previdenciário, como
demonstrado, atuará como seu redutor.
O resgate da dignidade do aposentado passa, a curto prazo, pela extinção do fator
previdenciário. Como demonstrado ao longo desta nota, os benefícios de aposentadoria
por tempo de contribuição não podem ser responsabilizados por um artificial “déficit da
previdência”.
O Congresso Nacional aprovou recentemente a extinção do fator previdenciário por
meio do art. 5º do PLV 02/10, resultante da conversão da MPV 475/09. A promulgação
deste dispositivo e sua entrada em vigor a partir de 2011, será um ato de justiça para
quem se dedica diuturnamente à construção da nação.
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Este estudo analisa, sob o ponto de vista da justiça social, o fator