Título: A HERÁLDICA
Sub-título: O BRASÃO DO CONCELHO DO BARREIRO
Dirigida a: crianças do 1º ciclo, 2º ciclo e 3º ciclo.
Duração: 50 minutos.
Relevância /interesse do estudo:
O estudo da heráldica municipal é da maior importância para os mais
jovens em primeiro lugar, como introdução à história do concelho ou
freguesia representado, como também, para o conhecimento do meio.
A heráldica municipal permite conhecer e descobrir um determinado
local através da estilização em símbolos das suas mais importantes
características: um barco, para a pesca; um carril, para os caminhos de
ferro; uma espiga ou cacho de uvas, para a agricultura, entre outros.
As armas municipais do Barreiro.
A cidade do Barreiro, localiza-se na margem esquerda do rio Tejo,
defronte de Lisboa.
Ascendeu à categoria de concelho por carta de vila datada de 16 de Janeiro
de 1521, durante o reinado de D. Manuel I.
Segundo a primeira monografia do Barreiro datada de 1886, o seu
autor, José Augusto Pimenta referia a memória de um brasão do Barreiro
(Fig.1) existente no arquivo dos frades de Palmela: consistia em duas
barreiras de areia unidas por uma rede – um processo de pesca tradicional
no Barreiro, que chegou ao século XX.
Fig. 1 – Hipótese para o brasão descrito por J. A. Pimenta.
Em sessão camarária de 26 de Novembro de 1929, a Câmara
Municipal do Barreiro reconhecendo que a «grande maioria dos
municípios do país possui brasão próprio, bandeira ou estandarte pelos
quais são reconhecidos e autenticados os seus documentos e se fazem
reconhecer e representar em actos e solenidades oficiais. Os brasões de
armas de cada concelho representam e lembram a todos os seus munícipes
a História e a Tradição dos respectivos concelhos, que muito convém
divulgar para conhecimento perfeito das nossas terras, o passado, as
tradições, a sua evolução, o seu desenvolvimento e riqueza. Ultimamente
um grande número de Concelhos tem solicitado a aprovação de brasões de
armas para puderem oficialmente usá-los no timbre dos seus documentos e
nos respectivos selos brancos. Atendendo a que este Concelho do Barreiro
necessita de um estandarte que possa representá-lo nas solenidades
oficiais, mas que para a sua criação se torna necessário saber quais as
cores que lhe são devidas, o que demanda um grande estudo, que só
pessoas de reconhecida competência podem fazer», propunha-se a
Associação de Arqueólogos Portugueses, entidade competente no entender
da Câmara, para efectuar os estudos necessários para a indicação das cores,
que deveriam ter o novo estandarte, bandeira e desenho do brasão, que
deveria servir o município.
Na mesma reunião discutiu-se a existência de um brasão à muito
desaparecido (Fig. 2). Estas armas municipais
assemelhavam-se
às
descritas por J. A. Pimenta, tendo como novidade a representação de uma
muleta.
Fig. 2 – Hipótese para brasão discutido em sessão camarária.
Uma das figuras chave na heráldica portuguesa, responsável por mais
de duzentas armas de cidades e estandartes, incluindo as armas de todas as
colónias ultramarinas, foi sem dúvida Afonso de Dornelas.
- Afonso de Dornelas
Afonso de Dornelas Cisneiros, nasceu em Lisboa a 29 de Fevereiro
de 1880 e faleceu a 9 de Fevereiro de 1944.
Arqueólogo, geneólogo e heraldista.
Ingressou em 1897 no exército, tendo
tomado parte na expedição a Moçambique em
1899. Dedicou-se depois à Cruz Vermelha
(1909), cuja organização e serviços ajudou a
estruturar, e onde foi equiparado pelo Governo ao
posto de Coronel. Fundou o Instituto Português
de Heráldica, foi sócio fundador e 1º secretáriogeral da Academia Portuguesa de História, cujos
estatutos preparou, e prestou à Associação de
Arqueólogos Portugueses assinalados serviços.
Os caminhos entre Afonso de Dornelas e a Câmara Municipal do
Barreiro, cruzaram-se a 14 de Agosto de 19301.
Na pesquisa então efectuada, apontava que segundo várias opiniões
«tinha o Barreiro sido fundado por pescadores algarvios que se ocupavam
da pesca na barra de Lisboa, pelo que ficaram conhecidos pelos barreiros
(...). Existe um barco de pesca que é considerado pelos estudiosos como
característico dessa região. Pertenceu essa vila à Ordem de Sant’iago (...).
Na agricultura salienta-se na região do Barreiro o vinho2». Tendo como
base estes elementos, Afonso de Dornelas propôs que as armas das vila do
Barreiro fossem da seguinte forma:
«- De prata com uma muleta de pesca de negro realçada de ouro
vestida de vermelho com mastros e cabos de negro, vogando num rio
ondulado de azul e prata.
Em chefe a Cruz de Sant’iago acompanhada de dois cachos de uvas
de púrpura folhados de verde. Coroa mural de prata de quatro torres.
Bandeira esquartelada de vermelho e de negro. Cordões e borlas das
mesmas cores. Fita branca com letras pretas. Haste e lança douradas.
A cor negra indicada para o barco significa heraldicamente
honestidade e firmeza e representa a terra. De facto, o Barreiro tem-se
feito com o esforço próprio.
É indicado o ouro para realçar o barco, porque este metal
representa a riqueza e significa constância e poder.
O vermelho indicado para as velas do barco significa vitórias. Os
fundadores do Barreiro, lutando pela vida com os seus esforços próprios,
conseguiram formar uma vila que já tem muito tempo de existência tendo
portanto alcançado uma vitória com muito trabalho.
1
As armas, bandeira e selo, tinham sido aprovadas a 23 de Julho de 1930, em sessão da Comissão de
Heráldica da Associação de Arqueólogos Portugueses.
2
Arquivo Municipal do Barreiro. Cota SSC B/A /08/ Cx. 01
O rio, está estabelecido heraldicamente que seja de azul e de prata.
A cruz de Sant’iago é indicada de púrpura por ser o esmalte mais
nobre e porque assim se representa a Ordem que tantos serviços prestou a
Portugal durante muitos séculos. O Barreiro, pelo seu valor natural, foi
uma das Comendas de tão notável Ordem.
Os cachos de uvas representam aqui a parte agrícola, como
elemento representativo da riqueza da terra.
A coroa mural tem quatro torres, porque assim está estabelecido que
se representem as vilas.
Como a peça principal das Armas é o barco e como este é negro e
vermelho, as cores da bandeira devem ser estas e, como existe ouro na
composição das mesmas armas, devem a lança e a haste, ser este metal.»
Seriam estes os elementos que iriam figurar no futuro brasão da Vila
do Barreiro. Contudo, e apesar da iniciativa municipal, a edilidade
responderia apenas em 1937, com um pedido a Afonso de Dornelas de 3
exemplares zincogravados para que se iniciassem as diligências para a sua
aprovação no Ministério do Interior.
A Procuradoria Geral do Municípios, reconhecendo o trabalho
efectuado por Afonso de Dornelas, afirmaria em 1939 que «o trabalho
colossal, quer de investigação quer de organização, bem como todos os do
benquisto cidadão, foi sempre prestado gratuitamente. O invulgar
desinteresse material e a abnegação com que o insigne académico serve a
ciência, levou-o durante bastantes anos a cobrar do seu bolso particular as
próprias despesas de impressão, gravuras e desenhos enviados às câmaras
municipais 3».
3
Arquivo Municipal do Barreiro. Cota SSC B/A /08/ Cx. 01
No entanto, a Câmara Municipal do Barreiro nada fez em relação à
aprovação destas armas. Teriam de passar alguns anos, para que, um
acontecimento de grande projecção nacional originasse a necessidade de
uma bandeira. O ano era o de 1940 e o acontecimento a Exposição do
Mundo Português e a representação do Barreiro num cortejo.
Rapidamente, a Câmara Municipal do Barreiro solicita a Afonso de
Dornelas o reenvio da descrição das armas da vila do Barreiro. A resposta
chega a 26 de Fevereiro de 1940, sendo aprovadas em sessão de câmara, a
4 de Março do mesmo ano.
A urgência de uma nova bandeira era expressa pelo Presidente da
Câmara de então, Joaquim José Fernandes, que em missiva dirigida ao
Governador Civil de Setúbal, pedia rapidez na análise do processo, para
que a câmara, aquando das comemorações do Duplo Centenário de 1940,
pudesse estar representada por uma bandeira para actos oficiais.
As Comemorações do Duplo Centenário em 1940, lembravam as
datas de 1140 com a fundação de Portugal, e 1640 e a Restauração da
Independência de Portugal face ao domínio espanhol.
Seria na Exposição do Mundo Português, realizada em Lisboa, que
os festejos teriam a sua maior projecção, exaltando os princípios que
orientavam a política de então.
Em sessão de câmara de 25 de Março de 1940, sob proposta do
Presidente da Câmara Municipal era exarado em acta um voto de
agradecimento a Afonso de Dornelas, pela forma como havia tratado da
elaboração das armas e selo da Câmara e «pelo espirito de isenção que pôs
na mesma tarefa 4».
A 21 de Julho de 1940, integrada nas comemorações do Duplo
Centenário de Portugal, era hasteada pela primeira vez no edifício dos
4
Livro de Actas da Câmara Municipal do Barreiro, n.º 19, 3 de Julho de 1939 a 19 de Agosto de 1940.
Paços do Concelho a nova bandeira do município5. O brasão seria aprovado
oficialmente pela Portaria n.º 9496 de 2 de Abril de 1940.
Fig. 4 - Brasão da Vila do Barreiro.
As armas aprovadas eram as seguintes (Fig. 4):
- ARMAS – de prata, com uma muleta de pesca de negro realçada de
ouro, vestida de vermelho, mastreada e encordoada de negro,
vogando num rio de quatro faixas ondadas de azul e de três de prata.
Em chefe, uma cruz de Sant’iago de púrpura, acompanhada de dois
cachos de uvas do mesmo esmalte, folhados de verde. Coroa mural
de prata de quatro torres. Listel branco com os dizeres “Vila Nova do
Barreiro”.
- BANDEIRA – Esquartelada de vermelho e de negro. Cordões e
borlas dos mesmos esmaltes. Haste e lança douradas.
- SELO – Circular, tendo ao centro as peças das armas sem indicação
dos esmaltes. Em volta, dentro de círculos concêntricos, os dizeres
“Câmara Municipal de Vila Nova do Barreiro “.
5
PAIS, Armando da Silva, O Barreiro Contemporâneo. A grande e progressiva vila industrial. Vol. I,
C.M.B., 1966.
Afonso de Dornelas, na mesma missiva, notava que a Câmara Municipal do
Barreiro não utilizava os dizeres de “Vila Nova do Barreiro”, ao que
deixava livre à câmara a sua utilização, ou não.
- Barreiro Cidade. As modificações heráldicas.
A 4 de Janeiro de 1979,
a Câmara Municipal do Barreiro, em
reunião, decidia aprovar por unanimidade, uma proposta para que se
diligenciasse junto das entidades competentes no sentido da elevação da
Vila do Barreiro à categoria de cidade.
Teriam de passar cinco anos, para que no dia 16 de Maio de 1984, a
Assembleia da República decidisse elevar o Barreiro à categoria de cidade,
promulgado em Diário da República, na Lei 23/84 de 28 de Junho de 1984.
O dia 14 de Julho foi escolhido pela edilidade para festejar a
elevação a cidade. Nesse dia, foram hasteadas em cerimónia oficial as
bandeiras nos Paços do Concelho 6.
Por deliberação da Câmara de 11 de Julho de 1984, era aberto um
concurso público para artistas nacionais para a criação de um novo brasão.
As propostas deveriam obedecer às regras de heráldica e ter como base os
seguintes critérios:
- Manter os elementos existentes no brasão;
- Acrescentar novos elementos, de acordo com as características
actuais do Barreiro: Indústria, Transportes, Movimento Associativo,
etc.
Foram apresentados a concurso 56 trabalhos de 50 concorrentes ao
Concurso do novo Brasão da Cidade do Barreiro.
O júri constituído para o efeito incluía, o Presidente da Câmara
Municipal do Barreiro, um representante da Assembleia Municipal, do
6
A bandeira municipal hasteada era a de Vila.
Conselho Municipal, do Departamento de Informação e Relações Públicas,
do Departamento de Juventude, Educação e Cultura, do Instituto Português
de Heráldica e dois artistas convidados 7.
Expostos na BARRIND/84 os trabalhos suscitaram grande
curiosidade e interesse, devido à variedade de projectos e ideias para o
brasão. De todos os projectos foram escolhidos pelo júri, como havia sido
deliberado no concurso público, três concorrentes: o terceiro prémio foi
entregue a António José Moita Galvão, da Amadora; o segundo, a Joaquim
Gaspar de Oliveira, do Barreiro; por último, o primeiro lugar foi atribuído a
José Bérnard Guedes, de Lisboa, autor do actual brasão da Cidade do
Barreiro
Os prémios foram entregues em cerimónia pública realizada nos
Paços do Concelho, no dia 11 de Janeiro de 1985, tendo estado presentes o
presidente do município, Sr. Helder Madeira e os srs. vereadores Alfredo
Matos, Manuel Pina, Eduardo Guerreirinho, Costa e Júlio Freire, os
presidentes da Assembleia e Conselho Municipais, respectivamente Álvaro
Monteiro e Armando Marinho, e ainda representantes das Juntas de
Freguesia e de órgãos de comunicação social. Os trabalhos participantes e
vencedores, estiveram expostos nesse fim de semana no átrio dos Paços do
Concelho.
À proposta vencedora, decidiu o júri efectuar duas alterações. No
listel, onde se lia “Barreiro”, deveria ler-se “Cidade do Barreiro” e a cruz
de Sant’iago e uvas, deveriam ficar em cor púrpura.
7
Os artistas convidados foram o fotógrafo Augusto Cabrita e o arquitecto Cabeça Padrão, tendo apenas
participado o primeiro.
Fig. 5 – Brasão classificado em primeiro lugar da autoria de José Bérnard
Guedes e novo brasão da Cidade do Barreiro.
- ESCUDO – De prata, nó aberto de corda, de verde, posto em faixa e
movente dos flancos. Em chefe uma cruz de Sant’iago, de púrpura,
acompanhada a dextra de uma roda de indústria, de verde, e a
sinistra de um cacho de uvas de púrpura folhado, de verde; Uma
ponta, duas faixetas ondadas de azul, onde navega uma muleta
(barco regional) de negro, realçada de ouro, vestida de vermelho
mastreada e encoroada de negro; Coroa mural, de cinco torres de
prata; Listel branco, com a legenda a negro «Cidade do Barreiro».
- BANDEIRA – Girondada de vermelho e preto. Conservaram-se as
peças antigas do brasão, suprimindo-se um dos cachos de uva; Cruz
de Sant’iago, de púrpura como está em uso.
- Simbologia dos novos elementos – Nó aberto:
1 – O associativismo, a união;
2 – A rede viária – marítima e terrestre.
Por onde corre todo um trânsito de pessoas e bens entre o Norte e Sul
do País, a margem costeira e o interior;
Roda de indústria – colocada em ponto de destaque, o cantão dentro
do escudo;
O verde de ambas as peças – a esperança, promessa de futuro,
liberdade (livre trânsito).
Em cerimónia oficial, era hasteada pela primeira vez a bandeira do
Barreiro como cidade, a 28 de Junho de 1985, data que desde o ano anterior
tinha sido consagrada como novo feriado municipal8, lembrando o dia
oficial de elevação a cidade, publicado em Diário da República.
O novo brasão e respectiva bandeira do concelho do Barreiro, seriam
publicados em Diário da República de 16 de Maio de 1986.
8
Livro de Actas da Câmara Municipal do Barreiro. Sessão de 17 de Outubro de 1984.
BIBLIOGRAFIA
- Arquivo Municipal do Barreiro.
- ARMORIAL LUSITANO – Genealogia e Heráldica, dir. pelo Doutor
Afonso Eduardo Martins Zúquete, Editorial Enciclopédia, Lisboa, 1961.
- BRAAMCAMP FREIRE, Anselmo, Armaria Portuguesa, Lisboa, c. 1917
(I volume incompleto)(reedição facsimilada, Ed. Cota d’Armas, Lisboa,
1989).
- LIVRO DO ARMEIRO-MOR, de Jean du Cros, c. 1509 –publicação em
fac-simile da Academia Portuguesa de História com um estudo introdutório
de António machado de Faria de Pina Cabral, Lisboa, 1956.
- MARQUÊS DE ABRANTES, Introdução ao estudo da Heráldica,
Biblioteca Breve n.º 127, Instituto de Cultura e Língua Portuguesa, Lisboa,
1992.
- PINA CABRAL, António Machado de Faria de, Cartas de Brasão,
Lisboa, 1923.
- SANTOS FERREIRA, Gabriel-Luís, Armorial Portuguez, Lisboa, 192023.
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