PROCESSO DIGITAI
iO PETIÇÃO
INCIDENTAL
MINISTÉRIQ PUBLICO FEDERAL
Procuradoria Regional da República na 1' Região
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RELATOR
COLENDA TURMA.
,
EGRÉGIO TRIBUNAL
REGION*UFEDERAL
DA 1« REGIÃO
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N° 276/2011 - MA
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AGRAVANTE: HAROLDO FERRAZ DA SILVA E OUTROS
AGRAVADO: RAUL ARDITO LELÁRIO E OUTROS
RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO BATISTA MOREIRA
QUINTA TURMA
.^
AÇÃO
AGRAVO
„ DE
POSSESSORIA
INSTRUMENTO.
E
IMEDIATA
REINTEGRAÇÃO DOS AUTORES NA POSSE DA
"FAZENDA NOSSA SENHORA APARECIDA/ORION".
IMPOSSIBILIDADE.
OS
QUILOMBOLAS
AGRAVANTE^ SÃO OS LEGÍTIMOS POSSUIDORES
DA ÁREA EM QUESTÃO. Os efeitos da r. decisão ora
impugnada implicarão relevante perigo de lesão
grave e de difícil reparação à comunidade Brejo dos
Crioulos, uma vez que o seu cumprimento importará
na retirada dos Quilombolas da "Fazenda Nossa
Senhora
Aparecida/Orlon",
trabalham
á terra
colocando-os
em
onde
residem
e
em regime de subsistência,
uma
condição
de
penúria,
indignidade e sofrimento pela falta de habitação,
PAR AI2009 059387-7/MA-Desapropnaçáo
GAB-MA/smts e ccp
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quando, em verdade, ainda não se tem um juízo de
certeza acerca do cabimento ou não da Reintegração
dos Agravados nas terras em disputa, sendo,
inclusive, bastante possível que aquelas terras
sejam
desaprorpriadas,
para
cumprimento
do
disposto no art. 13, do Dexcreto n° 4.887/03 c/c art.
68, dos ADCT.
Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por
Haroldo Ferraz da Silva e Outros, com pedido de Efeito Suspensivo nos
termos dos artigos 522, 524, 527, inciso II e 558 da lei processual civil,
contra r. decisão proferidas pelo MM. Juiz Federal da 12^ Vara Federal da
Seção Judiciária de Minas Gerais que, nos autos da Ação de Reintegração
de Posse, ajuizada por Raul Ardito Lerário e Outros, em face da Associação
dos Moradores do Quilombo Brejo dos Crioulos e Outros, determinou a
imediata reintegração dos Autores na posse do imóvel descrito na petição
inicial, "ficando desde já autorizado o uso de reforço policial pelo oficial de
justiça, face às dificuldades que há de enfrentar".
Inicialmente
os
autos
principais
foram
processados perante o MM. Juízo de Direito da Vara Agrária estadual, pelo
qual o referido Juízo, declinou da competência para o Juízo Federal, em
virtude do interesse do INCRA/MG na desapropriação da área objeto da
lide, a fim de regularizar e legitimar a posse de remanescentes de
QUILOMBOLAS.
Os Agravantes sustentaram que são legítimos
possuidores da a área de 17.302,6057 ha, situada no Município de São
João da Ponte, Varzelândia e Verdeíândia, onde situa-se a "Fazenda Nossa
Senhora Aparecida/Orion", a qual está inserida no perímetro do território
pleiteado pela Comunidade Quilombola de Brejo dos Crioulos, cuja
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regularização fundiária é objeto de processo administrativo expropriatórlo,
54170.002486/2008-53.
Afirmaram que a Ação Expropriatória proposta
pelo INCRA visa legitimar e regularizar a posse dos QUILOMBOLAS, na
medida em que a área em questão não teve o seu destaque legítimo do
patrimônio público para o particular, uma vez que a matéria foi regulada a
partir da Lei imperial n.° 601 de 1850, sendo que o imóvel objeto da lide,
apenas foi registrado no ano de 1952, encontrando um hiato temporal de
102 anos, ou seja, de 1850, marco da origem das terras privatizadas no
Brasil, até 1952, data do efetivo registro do imóvel em questão.
Asseveraram que "O registro levado a efeito em
1952, não atendeu a legislação vigente", sendo que no ano da proclamação
da República, tais terras foram transmitidas para os Estados Federados,
nunca tendo sido transmitidas do domínio do Estado de Minas Gerais para o
particular, sendo a matrícula do imóvel nula de pleno direito.
Argumentaram
que,
por tratar-se
de
terras
devolutas do Estado de Minas Gerais, descabe o pagamento de verbas
públicas em caso de desapropriação pela UNIÃO a fim de atender áos
interesses de titularizar ou regularizar as comunidades de remanescentes
de quilombos.
i
Referiram que, "Por outro lado, tratando-se, |na
hipótese de bem público, retira a legitimidade do autor ora agravado em
requerer a proteção possessória conforme precedentes julgados no STJ".
Aduziram que a concessão de liminar se dará
exclusivamente, na hipótese do pericuium in mora e do fumus boni iures.
critérios que não se encontram no caso em apreço, sendo que "A decisão
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combatida fere preceitos processuais caros, formulados pelo principio da
legalidade, cujo poder judiciário, é o seu maior guardião".
Ponderaram que "a região em que se localiza a
área objeto da lide, está no perímetro geográfico conhecido como semi árido
norte mineiro (antiga área da SUDENE), cujo bioma é característico de
caatinga em transição com o cerrado. É muito natural e comum na região,
nessa época do ano, haver o período conhecido pela longa estiagem, fator
pelo qual, os animais de grande porte e de rebanho, sofrem com a seca,
quando morrem de sede e fome, pela falta d'agua e pastagem", pelo que
não há como imputar aos ora Agravantes a perda de animais do seu plantei.
Por fim, alegaram que a o sumiço e mortandade
das 460 cabeças de gado não procede, tampouco pode ser atribuída aos
ora Agravantes, mormente porquanto não restou comprovada sua culpa por
qualquer dilapidação, depredação ou mortandade de animais.
Os autos foram distribuídos para a egrégia Quinta
Turma do Tribunal Regional Federal da 1^ Região, sob a Relatoria do
eminente Desembargador Federal João Batista Moreira, conforme Termo de
Recebimento, Autuação e Distribuição juntado aos autos.
Vieram os autos ao Ministério Público Federal.
É o Relatório
MÉRITO
Versa a presente questão, em síntese, acerca da
possibilidade ou não de reforma da r. decisão proferida pelo MM. Juízo da
da 12^ Vara Federal da Seção Judiciária de Belo Horizonte/MG que
determinou a imediata reintegração dos Autores na posse do imóvel descrito
PAR-AI 2009.059387-7/MA-Desapropriação.
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na petição inicial, "ficando desde já autorizado o uso de reforço policial pelo
oficial de justiça, face às dificuldades que há de enfrentar".
Consta dos autos que Raul Ardito Lerário, Ana
Rosa Marcondes Lerário e Vito Ardito Lerário, propuseram Ação de
Reintegração de Posse, em face dos membros da Associação dos
Moradores do Quilombo "Brejo dos Crioulos", Haroldo Ferraz da Silva, José
Carlos de Oliveira Neto e Maria da Glória dos Santos Silva, autos n° 675708.2011.4.01.3800/MG.
O feito foi proposto inicialmente perante o Juízo
de Direito da Vara Agrária estadual, sendo que o referido juízo declinou de
sua competência para o Juízo Federal, em virtude do interesse do
INCRA/MG em regularizar e legitimar a posse dos remanescentes de
Quilombolas na área objeto da lide, qual seja, a "Fazenda Nossa Senhora
Aparecida/Orion".
É que a Autarquia Agrária instaurou Processo
Administrativo
Expropriatórlo,
por
interesse
social,
autos
n*^
54170.002486/2008-53, em face da mesma estar inserida no perímetro do
território pleiteado pela Comunidade Quilombola de "Brejo dos Crioulos", j
Sustentam os Agravantes, que a área em questão
não teve o seu destaque legítimo do patrimônio público para o particular,
uma vez que a matéria foi regulada a partir da Lei imperial n.° 601 de 1850,
sendo que o imóvel objeto da lide, apenas foi registrado no ano de 19Ô2,
encontrando um hiato temporal de 102 anos, ou seja, de 1850, marco da
origem das terras privatizadas no Brasil, até 1952, data do efetivo registro jdo
imóvel em questão.
Asseveraram, ainda, que o registro levado a efeito
PAR-AI2009.059387-7/MA-DesaproprÍaçáo.
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em 1952, não atendeu a legislação vigente, sendo que a matrícula aberta,
leva à conclusão de que foi por meio de artificiosos arranjos jurídicos e
cartorários que a referida terra passou do domínio do Estado para o
particular, o que torna nula, de pleno direito, a matrícula do imóvel, não
havendo falar, dessarte em possibilidade de reintegração de posse do bem
aos ora Agravados.
Merece reforma a r. Decisão que determinou a
imediata reintegração dos Autores na posse do imóvel descrito na petição
inicial, pois os Quilombolas Agravantes são os legítimos possuidores da área
em questão, senão vejamos:
Numa breve retrospectiva sobre o tema, tem-se
que, no presente caso, encontra-se em discussão a Expropriaçâo da
"Fazenda Nossa Senhora Aparecida/Orion", inserida na área relativa à
Comunidade de Brejo dos Crioulos, remanescentes de Quilombolas.
Primeiro, observa-se que a Comunidade de Brejo
dos Crioulos, desde o ano de 2000, pleiteava junto à Fundação Cultural
Palmares o reconhecimento desta condição, sendo que no ano de 2005, foi
expedida certidão de auto-reconhecímento da referida Comunidade,
registrada no Livro de Cadastro Geral n** 001, Registro n° 008, fls. 09,
publicada no DOU n^43, de 04 de março de 2004..
Reconhecida a Comunidade, o INCRA, com
fundamento no Decreto Federal n° 4887/03, iniciou seu trabalho no
sentido de promover a regularização fundiária do território Quilombola,
a fim de titularizar as terras em nome desta Comunidade. No curso,
deparou-se com áreas rurais particulares, que se encontravam inseridas na
área delimitada como dos Quilombolas, passando, portanto, a fazer a
devida vistoria para fins de desapropriação.
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Assim, não se trata de Desapropriação para fins
de Reforma Agrária, mas sim e tão somente de regularização da titulação
de terras Quilombolas.
Com efeito, estudos apontam que a origem da
Comunidade "Brejo dos Crioulos", patrimônio histórico e cultural brasileiro,
localizada na região da bacia do rio Verde Grande, remete ao período em
que as terras do Vale do rio Verde Grande eram ainda consideradas
impróprias para a presença humana. Sua mata, além de dificultar o acesso,
favorecia a existência de insetos causadores de várias doenças tropicais,
como a malária. Em função disso, a região ficou conhecida como Mata da
Jaíba - o termo jaíba teria origem tupi e significaria águas ruins ou fruta ruim.
Considerada
insalubre, ela não foi alvo
da
ambição colonizadora durante os séculos XVIII e XIX. Nesse sentido, tornouse a principal área de fuga dos negros escravos da região. Em sua
determinação por liberdade, eles enfrentaram as dificuldades e se instalaram
gradativamente naquelas matas. E se, inicialmente, o aspecto geográfico já
era considerado um empecilho para sua ocupação pelos setores dominantes
da sociedade mineira, a presença negra consolidou a visão do lugar como
inadequado e impróprio.
Desvalorizadas por causa da insalubridade e da
presença de negros fugidos ou forros, as matas do Jaíba permaneceram
livres de grandes disputas nos séculos XVIII e XIX - fato que permitiu aos
negros se instalarem naquele território e ali criarem raízes e uma vida de
liberdade.
Foi somente no século XX que a região da Jaíba
se tornou atrativa para a sociedade em geral, por causa da construção de
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uma estrada de ferro nas proximidades da Serra do Espinhaço. A estrada de
ferro resultou na valorização das terras e nas conseqüentes disputas
fundiárias na região. O território negro tornou-se então alvo de grande
interesse econômico.
A partir da década de 1940, a região tornou-se
alvo de disputas com fazendeiros que se utilizaram da violência para
expulsar famílias inteiras de suas terras, sendo obrigadas muitas vezes a se
esconderem nas matas que circundavam suas casas, vê-las sendo
queimadas e seu gado roubado. Para não serem mortos, tiveram que fugir
para outros lugares, depois de venderem seus bens a tronco de pinga,
lenços e quase nada em dinheiro para aqueles que cobiçaram suas terras.
Desde essa época, fugindo ao horror da violência fazendeira apoiada pelo
poder municipal, parte de seus parentes espalharam-se pelo país inteiro,
fugindo, como seus ancestrais, para outros lugares para manterem-se vivos.
Assim, a vida em comunidade foi drasticamente
afetada e o território negro dividido.
O
artigo
68
da
Ato
das
Disposições
Constitucionais Transitórias é claro ao afirmar, verbis:
"Aos Remansescentes das
comunidades dos quilombos que estejam ocupando
suas terras é reconhecida a propriedade definitiva,
devendo
o
estado
Emitir-lhes
os
títulos
respecitivos."
Conforme já referido, no ano de 2005, foi
expedida
certidão
de
auto-reconhecimento
da
Comunidade
de
Remanescentes Quilombolas de "Brejo dos Crioulos", registrada no Livro de
Cadastro Geral rP 001, Registro n° 008, fls. 09, publicada no DOU n*^43, de
PAR-At2009.059387-7/MA-Desapropriação.
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04 de março de 2004 (fls. 65), sendo reconhecida a Comunidade, e que o
INCRA. com fundamento no Decreto Federal n° 4887/03. iniciou seu
trabalho no sentido de promover a regularização fundiária do território
Quilombola. para titularizá-lo em nome desta Comunidade.
No curso, deparou-se com possíveis áreas rurais
particulares encravadas no seio da Comunidade, ou seja, que se
encontravam
passando,
inseridas
portanto,
na área delimitada como
a
fazer
a
devida
dos
vistoria
Quilombolas,
para
fins
de
desapropriação a qual deve pagar somente a justa indenização para
posseiros de boa-fé, visto que por força da Constituição da República,
as terras ocupadas por Quilombolas a eles lhes pertence, não existindo
direito adquirido contra a Constituição originária.
Dessa feita, para dar continuidade à demarcação
* da área, teve o INCRA que promover as Ações Expropriatórias, nos termos
estabelecidos pelo Decreto Federal n° 4887/2003, o que gerou a resistência
dos eventuais titulares de imóveis encravados nas localidades Quilombolas,
consubstanciada em Ações de Reintegração de Posse, como a presente.
Ocorre que a liminar deferida, foi irregularmente
concedida, haja vista que o art. 804 do Código de Processo Civil somente
admite sua concessão sem a oitíva da parte contrária nas hipóteses em que
o Réu, sendo citado, puder torná-la ineficaz, o que não é o caso dos autos.
Exsurge evidente que os efeitos da r. decisão
ora impugnada implicarão relevante perigo de lesão grave e de difícil
reparação à comunidade Brejo dos Crioulos, ensejando a suspensão
pretendida, uma vez que o seu cumprimento importará na retirada dos
Quilombolas da "Fazenda Nossa Senhora Aparecida/Orion", onde
residem e trabalham a terra em regime de subsistência, colocando-os
em uma condição de penúria, indignidade e sofrimento pela falta de
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habitação, quando, em verdade, ainda não se tem um juízo de certeza
acerca do cabimento ou não da Reintegração dos Agravados nas terras
em disputa, sendo, inclusive, bastante possível que aquelas terras
sejam desaprorpriadas, para cumprimento do disposto no art. 13, do
Dexcreto n° 4.887/03 c/c art. 68, dos ADCT.
Ex positís, o Ministério Público Federal é pelo
provimento do Agravo de Instrumento, reformando-se a r. decisão.
Brasília, 02 de junho de 2011
MARCELO ANTÔNIO CEARÁ SERRA AZUL
Procurador Regional da República
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Parecer em agravo de instrumento contra decisão que proferiu