Estratégias de Valor, Capacidades e Competências em Mercados Organizacionais: Tendências e Desafios Autoria: Aurea Helena Puga Ribeiro, Cinthya Brito Carvalho, Plínio Rafael Reis Monteiro, Rodrigo Araujo Alves RESUMO O artigo apresenta os resultados de um painel de especialistas em mercados organizacionais (business markets) utilizando o método Delphi. O estudo teve como objetivo identificar os fatores que influenciarão a performance das empresas em mercados organizacionais nos próximos 10 anos. Foram avaliadas as estratégias de valor que predominarão; as variáveis do ambiente externo mediadoras da relação entre a estratégia escolhida e performance; as capacidades de marketing e competências individuais que darão suporte às estratégias. O painel foi composto por 30 executivos da alta gestão de empresas de médio e grande porte, de capital nacional e estrangeiro, líderes em seus respectivos setores de atuação; sendo que 23 deles são presidentes, vice-presidentes ou diretores de suas empresas. O estudo foi realizado em duas rodadas, por meio eletrônico. A análise dos dados possibilitou identificar as possíveis relações das capacidades organizacionais e das competências individuais com os diferentes tipos de estratégias de valor escolhidas pelas empresas; além das capacidades organizacionais e competências individuais que, na opinião dos especialistas, precisam ser desenvolvidas para suportar as estratégias. Segundo os especialistas, será forte a presença de estratégias relacionais coexistindo com estratégias transacionais. 1. INTRODUÇÃO O mercado organizacional traz desafios peculiares principalmente para os profissionais responsáveis pelos processos de marketing, vendas e suprimentos. Os volumes comercializados são maiores do que em mercados de consumo, há maior complexidade no processo de decisão de compra, impactando também o processo de negociação. Os pesquisadores pertencentes ao grupo IMP, no início da década de 80, identificaram que em mercados organizacionais, geralmente são estabelecidos relacionamentos dinâmicos de longo prazo entre compradores e vendedores, caracterizados pela dependência mútua (HARKER; EGAN, 2006; GUMMESSON, 1987; HAKANSSON, 1982). Devido à intensificação da agregação de serviços como forma de diferenciar as ofertas e do crescimento da literatura referente ao marketing relacional, acreditou-se por algum tempo, que haveria uma tendência da predominância do paradigma relacional sobre o transacional (HARKER; EGAN, 2006). Entretanto, Gronroos (1991), evoluindo na compreensão sobre o tema, sugeriu que as empresas, na verdade, não decidem entre um tipo de estratégia ou outra, mas elas se posicionam em um continuum de estratégias de marketing no qual, em um extremo, encontrase a estratégia de marketing transacional e no outro extremo, a estratégia de marketing relacional. O autor afirma ainda, que estas estratégias podem coexistir em uma empresa. “For some tipes of products and some situations or for some types of customers a one deal at a time approach may be a good strategy” (GRONROOS, 1991:11). Considerando a necessidade de geração de conhecimento sobre o mercado organizacional no contexto brasileiro, a presente pesquisa tem como objetivo identificar quais estratégias de valor, que refletem a intensidade do relacionamento com o cliente, serão praticadas pelas médias e grandes empresas de controle acionário nacional e estrangeiro. Fundamenta-se também em um continuum de estratégias de marketing. O estudo objetiva ainda verificar, quais variáveis do ambiente externo influenciarão a adoção das estratégias, quais capacidades de marketing e competências individuais se relacionam a cada uma delas, e quais capacidades e competências individuais precisam ser prioritariamente desenvolvidas nas organizações, com vistas apoiar as estratégias escolhidas. Portanto, definiu-se como objetivo geral da pesquisa: identificar as estratégias de valor que serão praticadas nos próximos 10 anos, bem como as variáveis do ambiente externo que 1 impactarão a performance das empresas; as capacidades organizacionais e as competências individuais necessárias para entregar e capturar o valor proposto. Para sustentar o objetivo geral, o estudo buscou responder às seguintes questões: (1) Quais estratégias de valor, que refletem a intensidade da relação com o cliente, serão praticadas com vistas à performance superior de mercado nos próximos anos? (2) Quais variáveis do ambiente externo mediarão as relações entre as estratégias de valor e a performance das empresas? (3) Quais capacidades de marketing serão mais relevantes nos próximos 10 anos são mais relevantes para conduzir à performance superior de mercado? (4) Quais capacidades de marketing se relacionam, com maior ou menor intensidade, às estratégias de valor escolhidas? (5) Quais competências individuais os gestores de marketing e vendas que atuam em mercados organizacionais devem adquirir, visando performance superior de mercado nos próximos anos? (6) Quais competências individuais dos gestores de marketing e vendas mais se relacionam às estratégias de valor que serão praticadas no mercado? 2. REFERENCIAL TEÓRICO 2.1 As estratégias de valor nas perspectivas transacional e relacional Criar valor superior no mercado é fundamental para a sobrevivência e sucesso das empresas no longo prazo (SLATER; OLSON, 1997; WOODRUFF, 1997). Fundamentandose na teoria econômica baseada em recursos - Resource Based View -, pesquisadores sugerem que os recursos e capacidades de uma organização são ativos que geram valor, uma vez que permitem a redução de custos ou ampliação de receitas, se comparados à ausência desses recursos (BARNEY, 1991; MOLLER E TORRONEN, 2003; GOLFETTO; GIBBERT, 2006). Devido à heterogeneidade de recursos, as empresas interagem visando o acesso aos recursos de outras empresas (EIRIZ; WILSON, 2006; FORSSTROM, 2005). Entretanto, a teoria relacional, desenvolvida principalmente por pesquisadores do IMP, amplia a compreensão sobre o processo de geração de valor. Diferente da Teoria dos Recursos (RBV), na perspectiva relacional, os recursos são disponibilizados para o cliente, entretanto, para que o valor seja gerado, ainda se faz necessário, no contexto do cliente, transformar estes recursos em valor, por isso a relevância dos processos de relacionamento. Nessa perspectiva, as competências das duas partes são geralmente necessárias para transformar os recursos disponibilizados em valor, tanto para o cliente quanto para o fornecedor. Sendo assim, considerando os recursos e as interações necessárias para transformá-los em valor, a literatura apresenta diferentes formas para geração de valor: valor de troca, valor agregado, valor relacional e co-geração de valor (MÖLLER, 2006; HENNEBERG; PARDO; MOUZAS; NAUDÉ, 2005; PRAHALAD; RAMASWAMY, 2004; ANDERSON; NARUS, 2006). O valor de troca baseia-se na perspectiva econômica do conceito de valor que tem como precursores Adam Smith, David Ricardo e Karl Marx. Nesta perspectiva, valor é intrínseco a uma commodity (MCKNIGHT, 1994) e pode ser medido e representado por uma constante. Portanto, unidades de medida podem ser reconhecidas e é estabelecido um valor de troca arbitrário para cada unidade. O termo “valor de troca”, portanto, representa a idéia de que valor é contabilizado e pode ser definido considerando-se custo e escassez. Assim, valor é o que pode ser “obtido” de um item (WOODALL, 2003). No contexto de geração de valor de troca, o fornecedor, por meio de suas próprias atividades, desenvolve uma oferta que é consumida pelo comprador. O comprador, por sua vez, identifica os benefícios imbuídos na oferta, também utilizando seus recursos internos e competências, compondo o sacrifício necessário para alcançar e consumir o benefício. O trade off percebido entre benefício e sacrifício define o valor na perspectiva do cliente e é 2 relativo, uma vez que o comprador faz comparações com a oferta dos concorrentes (ANDERSON E NARUS, 2006; MÖLLER E TÖRRÖNEN, 2003). Considerando-se que o potencial de valor não é livre do cliente, o fornecedor pode tentar aumentar o valor percebido da oferta reduzindo o uso dos recursos do cliente por meio da agregação de serviços à oferta inicial e básica, tais como serviços de entrega, treinamento de uso, educação e manutenção. Dessa forma, cria uma nova proposta de valor (proposta de valor agregado), ofertando serviço, com o objetivo de se manter competitivo (HENNEBERG; PARDO; MOUZAS; NAUDÉ, 2005). Entretanto, a criação desses serviços estendidos da oferta, presume competências adicionais comparadas às competências básicas de produção e distribuição (MÖLLER, 2006). Valor relacional ou valor de performance, também chamado de valor em uso (ANDERSON; WEITZ, 1992; REUTER,1986), refere-se ao valor que é criado nas atividades interrelacionadas do fornecedor e comprador; em outras palavras, o valor é gerado na relação. Essa perspectiva enfatiza que o valor criado é mútuo e pressupõe compartilhamento tanto de recursos quanto de benefícios (FORSSTRÖM, 2005). O desenvolvimento conjunto de produtos com clientes ou fornecedores, ou a melhoria de processos de negócio atuais, tais como logística, sistema de informações e cuidados com clientes, são exemplos de práticas relacionadas a esta estratégia (MÖLLER, 2006; ULAGA; EGGERT, 2006). A co-geração de valor é um conceito recente, parte do paradigma relacional. Prahalad e Ramaswamy (2004) desenvolveram o conceito apresentando-o como solução para as empresas permanecerem competitivas em um ambiente que se caracteriza por intensa incerteza e mudança. Nesses contextos novas competências precisam ser desenvolvidas tanto nas relações entre fornecedor e clientes, quanto em relacionamentos de rede. 2.2. Valor e a intensidade do relacionamento Considerando-se as diferentes formas de gerar valor, alguns autores, ampliando o conceito apresentado por Gronroos (1991), desenvolveram outros contínuos para situar as estratégias das empresas. Geralmente, em um extremo, representam a baixa intensidade da relação, e no extremo oposto, representam o paradigma relacional, até a formação de redes (MÖLLER, RAJALA; SVAHN, 2005; MÖLLER; SVAHN, 2003; MÖLLER; TÖRRÖNNEN, 2003; COVIELLO; et. al., 2002). Coviello, Brodie e Munro (1997), por exemplo, propuseram uma estrutura para classificar as práticas contemporâneas de marketing. Segundo a taxonomia proposta pelos autores, as práticas de marketing que refletem a orientação da empresa quanto à forma de se relacionar no mercado, caracterizam quatro perspectivas: 1) marketing transacional, em que as empresas focam no gerenciamento eficaz do seu mix de marketing; 2) database marketing, em que as empresas usam de ferramentas e tecnologia com o objetivo de reter seus clientes; 3) marketing interativo, em que desenvolvem relacionamentos interpessoais com seus clientes com a intenção de gerar cooperação mútua; 4) networking marketing, em que as empresas compartilham atividades e processos com seus clientes, visando obter a troca de recursos e resultados. Enquanto o primeiro conjunto de práticas volta-se para a concepção transacional do marketing, as três últimas remetem a esforços conjuntos de aproximação e cooperação mútua entre comprador e vendedor, ou seja, práticas de relacionamento. Möller e outros co-autores (MÖLLER; RAJALA; SVAHN, 2005; MÖLLER; SVAHN, 2003; MÖLLER;TÖRRÖNNEN, 2003), também propõem um continuum que expressa relações mais transacionais ou relacionais. Entretanto, eles se referem à intensidade da relação como complexidade da relação e acrescentam à estrutura do continuum, o horizonte de tempo da relação. Sendo assim, ele se inicia em uma situação de baixa complexidade relacional e orientação de tempo atual e culmina em alta complexidade relacional e orientação futura, conforme ilustrado abaixo. 3 Oferta básica Relacionamento orientado para transação Oferta de valor agregado Valor relacional Baixa Complexidade relacional Orientação de tempo atual Valor orientado para futuro Relacionamento de parceria Alta Complexidade relacional Orientação Futura F FIGURA 1: Fontes de criação de valor Fonte: MÖLLER K. e TORRONEN, P. (2003) Möller e Törrönen (2003) pressupõem que a natureza da geração de valor caracteriza o desempenho de certas atividades geradoras daquele valor, que se baseiam nas competências ou capacidades da organização. No presente trabalho, sugeriu-se também a estruturação de um continuum que se desenvolve em quatro fases, as quais representam as estratégias de valor e as capacidades da empresa necessárias para suportá-las. O modelo foi adaptado de Möller e Törrönen (2003) e Coviello; et. al. (1997), acrescentou ainda, os conceitos de Eggert, Ulagga e Shultz (2006) e Prahalad e Ramaswamy (2004). O continuum proposto inicia-se com a oferta básica ou de commodity, passando à oferta de valor agregado ou excelência, acrescentando valor de performance e culminando em co-geração ou co-criação de valor, mas com forte orientação para futuro, ilustrado no quadro 1. O modelo apresenta também, as dimensões da gestão e as capacidades de marketing associadas a cada estratégia de geração de valor. 2.4. As capacidades de marketing As capacidades organizacionais remetem ao conjunto de habilidades e conhecimentos perpetuados pela organização e que permitem a coordenação de atividades, uso de ativos e aprendizado contínuo com vistas a um cenário esperado no futuro. No contexto dos processos de marketing, definem-se como processos integrativos concebidos para aplicar os conhecimentos, recursos e habilidades coletivas da empresa para as necessidades de mercado do negócio, possibilitando agregar valor aos bens e serviços e suprindo as demandas competitivas (MOLLER; ANTILLA, 1987; GRANT, 1991; DAY, 1994, TUOMINEN; et.al. 1997, VORHIES e HARKER, 2000, p.148). Considerando a relevância das capacidades para a realização do valor proposto, Möller e Törrönnen (2003) sugerem aquelas que são mais presentes em cada uma das possibilidades de geração de valor. Segundo os autores, as capacidades também seguem um contínuo que se inicia em capacidade de produção, distribuição, melhoria de processos, inovação incremental, capacidade relacional, capacidade de formação de rede, capacidade de inovação e culmina em domínio do negócio do cliente, conforme sugerido no quadro 1. Autores que se dedicaram a estudar as capacidades de marketing acrescentaram várias outras. Day (1994) categoriza as capacidades de marketing em três grupos: inside-out capabilities, outside-in capabilities e spanning capabilities. A categoria “Inside-Out Capabilities”, compreende um conjunto de habilidades, recursos e processos que permitem compreender o ambiente interno com vistas a enfatizar a produção e disseminação de informações da própria organização. Os processos relacionados ao conhecimento do ambiente externo, denominados “Outside-In”, visam posicionar a empresa em um dado mercado competitivo, antecipando as mudanças no contexto, obtendo vantagem competitiva diante dos 4 concorrentes, criando relacionamentos com clientes e membros do canal. Por fim, o grupo de competências, denominado “Spanning Capabilities”, consiste do conjunto de competências, cujo objetivo final é difundir internamente e propiciar o uso efetivo das informações advindas de outras fontes. QUADRO 1 - Modelo Proposto - Intensidade da relação nas empresas e Modelo de Gestão INTENSIDADE DA RELAÇÃO OFERTA BÁSICA DRIVERS PARA GERAÇÃO DE VALOR VALOR AGREGADO • Serviços de suporte • Interações pessoais • Qualidade de produtos e serviços • Qualidade do produto • Performance da entrega • Preço de mercado PERFORMANCE • Know how do outro • Time to market • Performance de ambas (custos, receitas, produtividade) Retenção de clientes (implícito: satisfação, lealdade, lucro, redução de riscos, etc.) Contínua, mas contratações discretas Interações para estabelecer, desenvolver e facilitar o relacionamento cooperativo e benefício mútuo Contínua e contratos de longo prazo Adaptações de processos Adaptações de processos INTENÇÃO GERENCIAL Atrair e satisfazer DURAÇÃO Discreta ADAPTAÇÃO Pouca ou nenhuma adaptação DIVULGAÇÃO “Temos produtos bons e preços competitivos” “Temos excelência” “Nós customizamos, fazemos especialmente para o cliente” ESTRUTURA Hieráquica funcional: mkt., vendas. P&D, etc. Processos e funções do tipo: gerente de serviço ao cliente. Gerente de CRM Gestores de clientes e mercados / perpassam funções e níveis CO-GERAÇÃO DE VALOR • Inovação conjunta e radical • Alavancagem de novas competências Coordenação de relações entre empresas em rede em busca de novos recursos e novas redes de valor Contínua, contratos de cooperação mútua Adaptações e criação de negócios “Os clientes, fornecedores e outros parceiros nos trouxeram até aqui e vão nos conduzir para onde for necessário para gerar valor” Gestores de negócios Produção Delivery CAPACIDADES Promoção – Comunicação Incremento em processos Relacionamento Domínio e integração no modelo de negócio do cliente Inovação radical Formação de redes Fonte: Adaptado de ULAGA, W.; EGGERT, A., 2006; MÖLLER; RAJALA; SVAHN, 2005; PRAHALAD; RAMASWAMY, 2004; COVIELLO et. al. , 2002. 5 Adicionalmente, focando na natureza das atividades, Vorhies e Harker (2000) apontam seis capacidades desenvolvidas por organizações voltadas para o mercado: pesquisa de marketing, precificação, desenvolvimento de produtos, gerenciamento de canais de distribuição, promoção e gerenciamento do esforço de marketing. O último estudo desenvolvido pelo ISBM (Institute for the Study of Business Markets), que busca o monitoramento de tendências e desafios para as empresas que atuam nos Estados Unidos (Oliva, 2005), listou sete capacidades de marketing relevantes para o sucesso das organizações nos próximos anos. São elas: capacidade de compreender os clientes, suas necessidades e os drivers de valor para eles; diferenciação de produtos frente à globalização; desenvolvimento de ferramentas e habilidades analíticas avançadas; inovação; modelos de organização de marketing; cálculo do ROMI (Return On Marketing Investment) e demonstrar e documentar o valor gerado / entregue aos clientes. Com base nessa literatura, propõe-se como objetivo da presente pesquisa, identificar, junto a especialistas de mercado, quais estratégias de valor serão praticadas nos próximos 10 anos e quais capacidades são relevantes para dar suporte a cada tipo de estratégia escolhida. 2.5. As Variáveis Ambientais e o impacto na performance das organizações Alguns autores sugerem que as condições ambientais influenciam as estratégias adotadas (SLATER;NARVER,1994) e o desempenho das empresas. Aaker (1988) afirma que estratégias bem sucedidas são aquelas que oferecem diferenciais competitivos que permitam às organizações sobrepujar os ganhos obtidos pelos demais concorrentes. Tão logo, características do ambiente competitivo e mercado podem ser determinantes do desempenho obtido pela empresa em uma dada configuração estratégica. Dessa forma, em determinadas condições ambientais e competitivas, algumas estratégias de mercado, podem ter maior impacto na performance do que outras. Slater e Narver (1994) avaliaram em seu estudo algumas variáveis que, por hipótese, seriam determinantes para uma organização definir uma orientação mais para concorrentes ou mais para clientes: globalização, crescimento de mercado; turbulência de mercado; turbulência tecnológica; hostilidade competitiva; concentração da concorrência; turbulência governamental. Utilizando as mesmas variáveis sugeridas por Slater e Narver (1994), o presente estudo pretende também identificar quais variáveis do ambiente externo impactarão as empresas, considerando as estratégias escolhidas. 2.6. As competências individuais Competências do indivíduo são um conjunto de características ou requisitos - saberes, conhecimentos, aptidões, habilidades – indicados como condição capaz de produzir efeitos de resultados e/ou soluções de problemas (SPENCER;SPENCER, 1993; BOYATZIS, 1982; MCCLELLAND;DAILEY, 1972). Resultam da combinação de múltiplos saberes – saber fazer, saber agir, saber ser – capaz de propiciar respostas efetivas aos desafios advindos do contexto dos negócios (SANTANNA; et. al., 2005). Alguns autores sugerem que existe conformidade entre as competências e as demandas advindas de processos de mudança, reestruturações e modernização produtiva (HIRATA, 1994; SHIROMA; CAMPOS, 1997, STRROOBANTS, 1997). Considerando as relações sugeridas na literatura entre as demandas referentes ao perfil dos profissionais e os desafios do negócio, buscou-se também identificar nessa pesquisa as competências individuais que se relacionam às estratégias de valor praticadas no mercado. Propõe-se que empresas que possuem uma abordagem mais transacional, exigem de seus profissionais competências distintas daquelas empresas que se relacionam no mercado com uma abordagem mais relacional. 6 3. METODOLOGIA O estudo foi caracterizado como exploratório, implementado por meio de um painel de especialistas, conceituado como o método Delphi. A técnica foi escolhida por ser considerada uma das metodologias qualitativas mais apropriadas para problemas complexos e para traçar cenários futuros (FERES SOBRINHO, 1977). No contexto desse estudo, o objetivo era estruturar as opiniões de especialistas acerca das tendências e desafios do mercado organizacional. O método envolve a aplicação sucessiva de questionários a um grupo de especialistas ao longo de várias rodadas, estruturando um processo de comunicação grupal. A cada rodada os dados são submetidos a tratamento estatístico e, na rodada seguinte, são devolvidos para apreciação dos participantes. Com as informações recebidas, os especialistas podem reavaliar suas respostas comparando-as aos argumentos dos demais membros do painel e novas questões podem ser acrescentadas (VERGARA, 2005). Este procedimento pode se repetir até que sejam alcançados o consenso do grupo, ou uma boa compreensão dos diferentes cenários, como sugerem Linstone e Turoff (apud KAYO; SECURATO, 1997). Neste estudo foram empreendidas duas etapas sucessivas. Em cada rodada os participantes receberam feedback, constando o sumário da etapa precedente, bem como uma visão geral das respostas do participante. Após o tratamento inicial, questões foram incluídas ou modificadas na etapa seguinte, de acordo com o grau de consenso a respeito das variáveis analisadas. É importante destacar que o anonimato desses especialistas foi preservado para evitar vieses. O método exige muita reflexão e conhecimento do mercado. Portanto, fora empregada uma amostra intencional (CHURCHILL; IACOBUCCI, 2003). Os participantes, considerados especialistas, foram escolhidos por terem experiência expressiva, capacidade de análise e raciocínio elaborado, além de conhecerem bem o mercado e serem responsáveis por práticas de marketing/ comercial relevantes. Ainda, procurou-se representar empresas de setores e portes variados. Os participantes do estudo (30) ocupam cargos de destaque na gestão das 100 maiores empresas do Brasil, segundo a classificação da revista Exame 2006. Dentre estes, 7% exercem a função de presidência ou CEO da companhia; 11% são vice presidentes; 53% são diretores e 29% são gerentes seniores. Quanto ao perfil das empresas representadas pelos especialistas, 72% comercializam prioritariamente produtos e 28% serviços. Finalmente, 52% dessas empresas são grandes de capital estrangeiro (pertencem à lista das 500 maiores empresas do Brasil em vendas); 29% são grandes empresas de capital nacional e 19% são empresas de médio porte e capital nacional. Na análise dos resultados empregou-se uma mescla de técnicas qualitativas e quantitativas que visavam descrever os resultados obtidos no estudo. Em questões fechadas que empregavam escalas likert, empregaram-se medidas de estatística descritiva, como média e desvios padrão, além da mediana e intervalo interquartil para traçar tanto a tendência de avaliação dos gestores, quanto o grau de concordância em cada um dos temas. A correlação de Kendall fora empregada para avaliar o grau de associação entre variáveis quantitativas (PESTANA; GAGEIRO, 2003), tais como o percentual de receitas da empresa que será proveniente das estratégias de valor com as variáveis ambientais considerada pelo especialista, como impactantes em seu negócio. Com estas relações, foram definidas oito proposições que foram avaliadas pelos especialistas na segunda rodada do estudo. Quanto às técnicas qualitativas, empregou-se, entre outras, a análise de categorização que permitiu agrupar respostas dos gestores e criar categorias das capacidades de marketing e competências individuais que precisam ser desenvolvidas para suportar as estratégias escolhidas. 7 4. ANÁLISE DE DADOS 4.1 Estratégias de Valor Predominantes nos próximos 10 Anos Um dos objetivos do estudo foi identificar a tendência, nos próximos 10 anos, em relação às estratégias de geração de valor que predominar em seu no mercado. Para isso, definiram-se quatro tipos de estratégias que refletem a intensidade do relacionamento entre as empresas (commodity, valor agregado, valor performance e co-criação de valor). Foi solicitado aos especialistas que indicassem, em seu negócio, o percentual de receitas brutas que serão proveniente de cada uma dessas estratégias. Na primeira rodada do estudo, os especialistas foram questionados sobre o percentual de receitas esperadas de cada uma das estratégias, nos próximos 10 anos. Na segunda rodada, eles puderam reavaliar suas respostas ao compará-las com as respostas dos outros especialistas. O gráfico 1 mostra as respostas na primeira e segunda rodada, da média percentual da receita bruta proveniente de cada uma das estratégias nos próximos 10 anos. 1.ª rodada 40 35 35 2.ª rodada 32 27 30 25 25 24 28 20 13 15 14 10 5 0 Commodity Produto serviço de valor agregado Valor de perfomance Co-Criação de valor GRÃFICO 1 - Média das receitas das estratégias na primeira e segunda rodada. Fonte: Dados da pesquisa. No gráfico 1, percebe-se que, na opinião dos especialistas, haverá ainda grande parte da receita proveniente da estratégia de commodity. Entretanto, verificou-se que, apesar de 72% da amostra comercializar mercadorias caracterizadas como produtos, estima-se que grande parte da receita venha de estratégias do paradigma relacional – valor de performance e co-criação de valor, somando, após a revisão na segunda rodada, 42% da receita bruta total. Considerando o grau de dispersão da segunda etapa da pesquisa, pode-se dizer que os resultados apresentaram um bom grau de concordância entre os participantes. 4.2 Estratégias de valor predominantes por empresa participante da pesquisa Os dados da pesquisa permitiram fazer inferências sobre o perfil das empresas e as estratégias de valor adotadas. Conclui-se que, provavelmente, as empresas de grande porte apresentam uma tendência decrescente em relação ao continuum que vai de estratégias mais transacionais às mais relacionais. Elas estão, em sua maioria, praticando estratégias de commodity, seguidas pela estratégia de valor agregado, valor de performance e por último, cocriação de valor. Outra observação refere-se à estratégia de valor de performance que predomina entre as empresas de grande porte e controle acionário nacional. Entretanto, as empresas de médio porte e controle acionário nacional predominantemente praticam estratégia de commodity, seguida pela estratégia de valor de performance. Este resultado é 8 preocupante caso as médias empresas brasileiras tenham como competidoras, em seus mercados, empresas de grande porte, nacionais ou estrangeiras. A estratégia de valor agregado parece ser mais praticada entre empresas de grande porte, sejam elas de controle acionário nacional ou estrangeiro. 40 35 30 25 20 15 10 5 0 Commodity Produto serviço de valor agregado Grande - Multinacional Valor de perfomance Grande - Nacional Co-Criação de valor Médio - Nacional GRÁFICO 2 -: Estratégia de valor por perfil da empresa Fonte: dados da pesquisa 4.3 Variáveis ambientais que moderam a relação entre as estratégias de valor e Pperformance Outro objetivo do estudo era identificar quais variáveis ambientais mediarão as relações entre a intensidade da relação e a performance das empresas; e avaliar a intensidade desse impacto. Considerando que na metodologia Delphi analisa-se o consenso no grupo, foram observados o intervalo interquartil e desvio padrão encontrados nos dados, e conclui-se que existe consenso entre os especialistas que as variáveis globalização, crescimento de mercado e hostilidade competitiva impactarão fortemente a performance das empresas. Entretanto, para a variável concentração da concorrência existe consenso sobre o impacto na performance, mas existe pouco consenso quanto à intensidade do impacto. Explorou-se também a possibilidade de as empresas que atuarão sob diferentes estratégias de geração de valor, receberem o efeito de determinadas variáveis ambientais com maior impacto ou intensidade nos próximos 10 anos. Para verificar esta possibilidade, calculou-se a correlação não paramétrica de Kendall associando o percentual de receitas que se espera obter das diferentes estratégias de geração de valor às variáveis ambientais analisadas. Tal resultado permitiu extrair oito proposições descritas na tabela 1. Estas proposições foram apresentados aos gestores na segunda etapa, para que indicassem seu grau de concordância em uma escala likert de 5 pontos (1 discordo totalmente e 5 concordo totalmente). Observando a mediana das proposições levantadas, nota-se que as proposições P1, P4, P5 e P7 aparentam maior concordância entre os especialistas consultados. 9 TABELA 1 - Estatísticas descritivas das variáveis ambientais PROPOSIÇÕES Empresas cuja demanda virá predominantemente pela prática de estratégia de commodity serão menos impactadas pela turbulência P1 tecnológica. Empresas cuja demanda virá predominantemente pela prática de valor agregado serão mais impactadas pela turbulência P2 governamental. Empresas cuja demanda virá predominantemente pela prática de valor agregado serão menos impactadas pelo crescimento do P3 mercado. Empresas cuja demanda virá predominantemente pela prática de valor de performance serão mais impactadas pela turbulência P4 tecnológica. Empresas que cuja demanda virá predominantemente pela prática de valor de performance serão menos impactadas pelo P5 crescimento do mercado. Empresas que cuja demanda virá predominantemente pela prática de co-criação de valor serão mais impactadas pela turbulência P6 tecnológica. Empresas cuja demanda virá predominantemente pela prática de P7 co-criação de valor serão menos impactadas pela globalização. Empresas cuja demanda virá predominantemente pela prática de co-criação de valor serão menos impactadas pela turbulência P8 governamental. Fonte: dados da pesquisa. Obs: MED é a mediana das variáveis, INT. é media aritmética simples e S é o desvio padrão. MED INT MÉDIA S 2,00 1,00 2,43 1,16 2,00 2,00 2,65 1,27 3,00 2,00 3,00 1,24 5,00 1,00 4,39 0,89 2,00 2,00 2,67 1,11 3,00 2,00 2,95 1,05 4,00 3,00 3,50 1,26 3,00 2,00 3,10 1,41 o intervalo interquartil, MEDIA é a A proposição P4 apresenta o maior consenso no grupo de especialistas. As demais proposições apontadas apresentaram baixo grau de concordância, indicando que provavelmente elas não devem ser vistas como tendências do ponto de vistas dos especialistas. Na segunda rodada essas proposições foram submetidas à avaliação qualitativa dos especialistas. E alguns consensos obtidos entre eles merecem atenção. • De acordo com os especialistas, empresas com estratégia de commodity não serão muito afetadas pela turbulência tecnológica. Entretanto, alguns participantes da pesquisa ressaltaram que mesmo essas empresas devem estar atentas às tecnologias que afetam custos de produção e distribuição para que possam manter os preços competitivos. Além disso, devem preocupar-se com as inovações em produtos e serviços e potenciais produtos substitutivo. • A turbulência tecnológica, na opinião dos especialistas, relaciona-se fortemente à estratégia de valor de performance. • As empresas que optam por essa estratégia buscam se diferenciar investindo em tecnologias que representem, ao mesmo tempo, inovação e fonte de redução de custos ou aumento de produtividade. Na percepção dos especialistas, a turbulência tecnológica é um dos mais importantes motivadores dessa estratégia. • A globalização parece ser, na opinião dos especialistas, um forte motivador da estratégia de co-criação de valor. A explicação mais comum entre os especialistas é que a co-criação de valor reflete a descentralização das decisões e é um mecanismo para adaptação aos mercados locais. 4.4 As capacidades organizacionais relevantes para a performance das empresas O terceiro objetivo da pesquisa refere-se à identificação das capacidades de marketing mais relevantes para as empresas visando obter performance superior no mercado. Na 10 primeira fase da pesquisa (primeira rodada) os especialistas apresentaram livremente suas práticas de marketing e apontaram o estágio atual e desejado dessa prática em sua organização. As respostas foram submetidas a uma progressiva análise de categorização conforme metodologia sugerida por Bardin (1971), originando 19 categorias. Estas categorias, compreendidas como processos integrativos, recursos e habilidades coletivas da empresa visando agregar valor, são consideradas as capacidades de marketing que, na opinião dos especialistas, conduzem as organizações à performance superior. Na segunda fase da pesquisa (segunda rodada) os especialistas foram solicitados escolher entre essas 19 categorias, as 5 principais capacidades que conduzirão a empresa à performance superior de mercado nos próximos 10 anos. Os respondentes deveriam ordenálas de 1 a 5, sendo 1 a prática mais importante e 5 a prática menos relevante. Os dados foram ponderados pela freqüência de citação e a ordem atribuída. Os resultados mostraram que as 5 capacidades de marketing mais relevantes para gerar performance superior são: metodologias para identificar e monitorar valor; inteligência de mercado; valor de performance, marca e imagem e alinhamento organizacional. Ainda na primeira etapa analisou-se o gap entre o estágio atual e desejado dessas práticas. Esta análise apontou que marca e imagem e alinhamento organizacional possuem o desempenho atual mais baixo, sendo que este último apresenta também, um dos maiores gaps entre o estágio atual e o desejado. Além disto, as práticas relacionadas à sustentabilidade foram consideradas as mais desejadas e com níveis mais altos de desempenho entre aqueles que as praticam. Mas na segunda rodada, as práticas relacionadas à sustentabilidade caíram para um dos últimos do ranking. Parece que, para as empresas que empregam práticas relacionadas à sustentabilidade, elas são desejadas e reconhecidas como geradoras de performance, mas para as empresas que não as empregam, são consideradas de baixo impacto na performance. 4.5 Relacionamento entre as capacidades de marketing e as estratégias de valor O quarto objetivo da pesquisa era verificar o relacionamento entre as capacidades de marketing e as estratégias de geração de valor. Para isto calculou-se a correlação de Kendall entre a freqüência da capacidade de marketing e a estratégia de valor predominante da empresa que a citou, definida pelo percentual de receita proveniente de cada estratégia de valor. Com base na correlação, foi possível inferir o quanto essa estratégia está relacionada à estratégia de valor. Os resultados apontaram que as empresas, cuja receita virá predominantemente da estratégia de commodity, consideram relevantes as seguintes capacidades: metodologias para identificar e monitorar valor; portfólio de produtos; inovação, ética e gestão responsável. Percebe-se a preocupação dessas empresas de serem orientadas para mercado, apesar de commodities. Elas buscam reconhecer as diferentes oportunidades de entrega de valor, ter produtos diferenciados para cada segmento de mercado, além de praticarem uma gestão responsável. As empresas em que predominará a estratégia de valor agregado, aparentemente, se preocupam com a distribuição e trade marketing. Como segunda prioridade, surgem outras capacidades, tais como as metodologias para identificar e monitorar valor; marca e imagem; inovação; ética e gestão responsável. Observa-se que as capacidades que fazem essas organizações apresentarem produtos de valor agregado ao mercado parecem estar dominadas pelas empresas - seriam aquelas capacidades relacionadas à proposta de valor, marca / imagem e inovação. Nesse caso parece, então, mais relevante adquirir competências relativas à distribuição e relacionamento no canal (trade marketing), garantindo o nível de serviço de excelência, “entregando” a promessa feita aos clientes. 11 As capacidades mais associadas ao valor de performance parecem ser: inteligência de mercado; marca / imagem; alinhamento organizacional; força de vendas; precificação; redes e parcerias; gerência de portfólio de clientes e avaliação das atividades de relacionamentos cooperativos. Em segundo lugar, destacam-se, pós-venda e tecnologia de informação. Estas capacidades são, de fato, associadas à geração de valor de performance uma vez que permitem à empresa fornecedora identificar oportunidades de criar e entregar valor no contexto do negócio do cliente, bem como capturar valor por meio de precificação e alinhamento organizacional. Este processo requer força de vendas capacitada, processos e habilidades de pós-vendas que favoreçam negócios futuros e apoio da tecnologia de informação que permita conectividade entre as partes. As capacidades associadas à co-criação de valor são: valor de performance; pósvendas e alinhamento ao negócio. Estas capacidades são, de fato, relevantes para o processo de co-criação de valor, uma vez que desenvolver propostas de valor baseadas no conhecimento dos clientes e seus processos tem como prerrogativa o alinhamento das estratégias de marketing à estratégia corporativa, gerando valor ao negócio. Da mesma forma, são relevantes os recursos, habilidades e processos de pós-venda que visem alavancar oportunidades de mercado em decorrência dos relacionamentos estabelecidos. 4.6 As competências individuais relevantes e o relacionamento com as estratégias de valor Foi objetivo também desse estudo identificar as competências mais relevantes para os gestores das áreas de marketing e vendas que atuam em mercados organizacionais, bem como relacionar estas competências às estratégias de valor (tabela 2). TABELA 2 – Relações entre as competências individuais e as estratégias de valor ESTRATÉGIAS COMMODITY VALOR VALOR DE CO-CRIAÇÃO DE AGREGADO PERFORMANCE VALOR Competências individuais que se relacionam à estratégia em primeiro lugar Competências individuais que se relacionam à estratégia em segundo lugar Foco em resultados Pensamento estratégico Liderança Negociação Empreendedorismo Trabalho em equipe Competência técnica Orientação para processos Ética Criatividade Comunicação Competência técnica Disposição para aprender com erros Empreendedorismo Foco no cliente Trabalho em equipe Ética Flexibilidade Pensamento estratégico cultural Rede e parcerias Foco no cliente Rede e parcerias Orientação para processos Foco em resultados Liderança Negociação Criatividade Negociação Fonte: dados da pesquisa Para cumprir esse objetivo na primeira rodada do painel Delphi, foi solicitado aos especialistas citarem livremente as competências individuais que mais contribuirão para a performance de mercado nos próximos 10 anos. Estas competências foram classificadas em 15 categorias. Na segunda rodada do painel, os especialistas foram solicitados a identificar cinco competências mais relevantes em seu mercado, considerando, portanto, o ambiente e a estratégia de valor predominante em sua organização. A partir do número de citações e a ordem de importância que lhes foi atribuída, obteve-se a média ponderada de cada competência, obtendo-se uma ordenação. Percebeu-se na análise desses dados, que de forma geral, o profissional de marketing e vendas deve orientar-se para o cliente, focar em resultados e preocupar-se com a 12 competitividade do negócio, além de adotar postura ética construindo relações de parceiras e redes. Observando-se estas competências nota-se que há maior exigência de orientação para cliente e orientação mais relacional desses profissionais. Para cumprir o objetivo de associar as competências individuais às estratégias de valor realizou-se a correlação de Kendall entre as competências citadas e a estimativa do percentual de receita proveniente das estratégias de geração de valor. Os resultados permitiram identificar quais competências seriam requeridas para cada estratégia de valor predominante. 5. CONCLUSÕES O painel de especialistas demonstrou que o Brasil parece estar praticando estratégias de mercado que seguem a mesma tendência de países como Nova Zelândia, Estados Unidos e Argentina. Comparativamente ao estudo de Pels, Brodie e Johnston (2004), no Brasil também se esperam práticas mais intensas de estratégias relacionais, uma vez que 42% das receitas serão proveniente de estratégias de valor de performance e co-criação de valor. Entretanto, a prática de commodity no Brasil parece ser muito superior à Nova Zelândia, Estados Unidos e Argentina. Na opinião dos especialistas, no Brasil 32% da receita bruta das empresas virá de estratégias de commodity e 26% da receita bruta virá de estratégia de valor agregado. Embora nas outras pesquisas os dados não se refiram à receita, tem-se um baixo número de empresas com práticas predominantemente transacionais. Na Argentina, 18% da empresas e na Nova Zelândia e Estados Unidos, 25%. No estudo realizado na Argentina, os resultados apontam que as estratégias de relacionamento e rede predominam entre as empresas locais e de pequeno porte. Em nosso estudo encontramos que, no Brasil, as estratégias mais relacionais predominam entre as empresas de grande porte nacionais e médio porte e nacionais. Diferente também da Argentina, as empresas que mais tendem praticar estratégias de commodity no Brasil, são empresas de grande porte, principalmente, com controle acionário estrangeiro. E na Argentina, neste grupo, predominam as empresas locais e de pequeno porte. O painel apontou ainda que as três competências de marketing consideradas como mais relevantes para a performance das empresas nos próximos 10 anos, são: (1) identificação e monitoramento de valor; inteligência de mercado; relacionamento e valor de performance. Estas capacidades citadas, também foram identificadas como relevantes em um estudo realizado nos Estados pelo ISBM (Oliva, 2005). Nesse estudo, os participantes manifestaram que desenvolver a capacidade nas empresas de compreenderem os clientes, as suas necessidades e os direcionadores de valor, é muito importante, uma vez que as estratégias avançadas e as ferramentas bem elaboradas só terão sucesso caso se baseiem em conhecimento detalhado das operações dos clientes e de seu contexto econômico-financeiro. O estudo revela também a preocupação das empresas em desenvolver ferramentas e habilidades analíticas avançadas para apoiar o processo de conhecimento de mercado, bem como de análises econômico-financeiras da viabilidade das propostas de valor. Além disso, o estudo apresenta a relevância do desenvolvimento de metodologias para demonstrar e documentar o valor proposto e o impacto gerado nas operações dos clientes. Marca e imagem e alinhamento organizacional foram também capacidades da organização que se destacaram entre as cinco mais relevantes para a performance das empresas. Entretanto, foram classificadas entre as piores em desempenho. Sendo assim, merecem atenção especial em relação ao desenvolvimento de conhecimento e metodologias aplicadas. Marca e imagem diz respeito à comunicação com o mercado, visando fortalecer marca, imagem e reputação, aumentar o share of mind da empresa, além de promover o engajamento emocional do cliente; e alinhamento organizacional é a capacidade da organização de alinhar seu modelo de negócio de forma que a capacite a entregar e extrair valor na relação com o cliente. 13 Apesar de o painel de especialista ser um estudo qualitativo, obteve-se com os dados e as análises realizadas, importantes informações sobre as questões pertinentes às organizações que atendem aos mercados organizacionais. Com base nessas informações, alguns temas parecem ser prioritários para a geração de conhecimento e desenvolvimento de metodologias próprias para os mercados organizacionais. Em primeiro lugar, a inteligência de mercado e gestão alinhada às estratégias corporativas. Percebe-se que os processos de conhecer, analisar e escolher as oportunidades de mercado alinhados às estratégias das empresas estão desafiando os gestores. Em segundo lugar, a definição e gerenciamento de proposta de valor, que se refere à capacidade de identificar os atributos de valor, propor valor diferenciador e persuasivo, propor valor de performance convincente, além de documentar e precificar o valor gerado. Finalmente, parece ser determinante para as empresas que atuam em mercados organizacionais o alinhamento organizacional. Parece fundamental pensar novas arquiteturas organizacionais ou novos modelos de negócios que suportem estratégias mais relacionais. É interessante notar que em mercados organizacionais, o alinhamento organizacional que garante a entrega da proposta de valor, é também, uma das fontes mais relevantes para a construção de imagem e reputação de uma empresa. É intrigante, porém, perceber que inovação e métodos de cálculos para avaliar retorno sobre investimento em marketing não tenham surgido no estudo como aspectos relevantes para os próximos anos. Também é curioso que ética e gestão responsável tenham sido considerados os aspectos mais desejáveis da gestão, mas não foram escolhidos como capacidades que conduzirão as empresas à performance superior. Entretanto, esses três temas têm despertado grande atenção dos acadêmicos nos últimos anos, sendo considerados temas de fronteira. Talvez, não tenham sido ressaltados pelos especialistas, justamente por estarem ainda distantes do seu dia-a-dia. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Aaker, D. Strategic Market Management. 2. ed. New York: John Wiley & Sons, Inc, 1988. ANDERSON, James C.; NARUS, James A.; VAN ROSSUM, Wouter. Customer Value Propositions in Business Markets. Harvard Business Review, Boston, v. 84, n. 3, p. 90-99, mar., 2006. ANDERSON, E.; WEITZ, B. 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