Banda larga expõe diversos Brasis
Por Moacir Drska | De São Paulo | Fonte: Valor Econômico
Rogério Takayanagi, da TIM Fiber: na média, internet é cara e lenta e, em muitos casos, a oferta do serviço só fica na teoria
A disponibilidade do acesso à internet em banda larga expõe as contradições das comunicações no
Brasil. O país encerrou o ano com menos de 56 milhões de conexões de banda larga para uma
população em torno de 190 milhões de habitantes. Estão inclusas as conexões fixas, móveis,
residenciais e empresariais. Na telefonia fixa, a densidade também é baixa, com menos de 43 milhões
de acessos. Com cenário bem diferente, os serviços móveis contam com 242,2 milhões de celulares, o
equivalente a 127,5 aparelhos por 100 habitantes. Mas se a telefonia fixa tem sido gradativamente
substituída pela celular, o que garante algum tipo de comunicação em regiões desprovidas de
infraestrutura de redes de cabos, para internet veloz o caso é diferente. Até agora, o Plano Nacional de
Banda Larga (PNBL) do governo não deslanchou e o que se pode ver são vários Brasis diferentes, com
amplas regiões sem internet e desequilíbrio onde há oferta do serviço. Pode-se encontrar 1 megabit por
segundo de velocidade no Sudeste por R$ 29,80 ou até 30 vezes mais caro no Norte.
Em relação à velocidade das transmissões, 40% dos acessos contratados no país são de até 1 Mbps,
sendo que 21% dessas conexões estão na faixa de até 256 kilobits por segundo (Kbps), de acordo com o
Comitê Gestor da Internet (CGI.br).
O mercado é altamente concentrado. Pesquisa do CGI.br aponta que 78% dos 17 milhões de acessos
fixos no país são fornecidos por seis grandes provedores, donos de grande parte da infraestrutura de
rede existente. Dos 1.934 provedores, 43% operam na região Sudeste, 23% estão no Sul, 22% no
Nordeste, 11% no Centro-Oeste e apenas 6% no Norte. "É um mercado altamente concentrado e o
poder acaba ficando nas mãos de quem tem esses recursos, o que dificulta o compartilhamento de rede
com os pequenos provedores", diz Alexandre Barbosa, do CGI.br.
Dos 17 milhões de acessos fixos à web no país, 78% são fornecidos por seis grandes
provedores
Para completar o cenário, a densidade populacional, a renda per capita, a proximidade ou distância dos
grandes centros, a tecnologia e a competição entre os provedores compõem a equação que determina
disponibilidade do serviço, preço e qualidade do acesso em alta (ou não muito lenta) velocidade.
Falta conexão não apenas à população, mas também aos diversos elos que formam a cadeia de valor da
internet brasileira, da política pública à iniciativa privada.
Nos centros onde há alta densidade e maior renda, a concorrência é acirrada, a qualidade do serviço é
diferenciada e os preços mais acessíveis. Em segundo plano, há locais de potencial de consumo inferior
que, embora dotados de infraestrutura, contam com poucos ou apenas um provedor. Assim,
praticamente sem competição, não há pressão para a melhoria dos preços e serviços. Por último, estão
as regiões de menor densidade e baixo poder aquisitivo, onde os provedores veem pouca atratividade
para oferta de serviços.
O alto custo na aquisição de links no atacado para a última milha - trecho que liga a central da
operadora ao domicílio do usuário - acaba se refletindo no preço e na qualidade do serviço no varejo,
diz Rogério Takayanagi, presidente da TIM Fiber, unidade da TIM resultante da aquisição recente da
AES Atimus. "A realidade é que, na média, a banda larga continua cara e lenta no país. Em muitos
casos, a oferta desse serviço fica só na teoria", afirma.
Os grandes provedores alegam que os gargalos na oferta devem-se a fatores que vão de questões
regulatórias até desafios que não são exclusivos do Brasil. É o caso da explosão do tráfego gerado por
redes sociais e conteúdos como vídeo e música. "Quando pensamos ter atingido a necessidade do
cliente, o consumo de banda aumenta. Muitas vezes, ficamos com o ônus do serviço precário, quando,
na verdade, respondemos só por um pedaço do problema", diz Leila Loria, diretora-executiva de
relações institucionais e regulamentação da Telefônica.
Os valores praticados no país ficam mais caros quando se constata que, mesmo nos grandes eixos, os
provedores geralmente entregam o mínimo exigido de 10% da velocidade contratada. Isso vale também
para os serviços relacionados ao PNBL, afirma Flávia Lefèvre, advogada do Pro Teste, entidade de
defesa do consumidor.
Na avaliação da advogada, o avanço da banda larga está condicionado à classificação do serviço como
regime público e à definição de metas de universalização e continuidade. Só a partir dessa abordagem
será possível estimular os investimentos em locais com pouca ou nenhuma oferta. "O modelo atual
propicia uma prestação discriminatória do serviço. Alguns estudos mostram que na região Norte, por
exemplo, há cobrança de R$ 780 por 1 Mbps", diz Flávia.
Sob esse cenário desigual, a necessidade da oferta de subsídios do governo com o uso de recursos dos
fundos setoriais de telecomunicações é apontada como uma das saídas. Desde 1998, o segmento
recolheu R$ 48,6 bilhões em taxas, segundo a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). Desse
Total, R$ 2,6 bilhões foram aplicados efetivamente em projetos do setor. "É muito difícil para a
iniciativa privada viabilizar um modelo de negócio que atenda a poucos clientes. Sem política pública,
não vai acontecer, não compensa", diz Márcio Carvalho, diretor de produtos e serviços da Net.
As dificuldades técnicas e burocráticas também formam barreiras que limitam até mesmo os
investimentos em infraestrutura de banda larga móvel, considerada mais adequada para a aceleração
da cobertura. Eduardo Levy, diretor do SindiTelebrasil - que reúne as grandes operadoras -, destaca a
dificuldade de instalar estações radiobase até próximo de grandes centros: "Em Campinas, qualquer
estação precisa ter aprovação de 60% dos donos dos imóveis em um raio de 200 metros em torno do
equipamento."
Para Flávia, da Proteste, o mercado não pode continuar a ser guiado pela autorregulamentação.
Segundo ela, apesar de benefícios como a baixa exigência de entrega de velocidade, as operadoras
oferecem poucas contrapartidas de qualidade aos consumidores: "A banda larga é estratégica. Todo o
sistema financeiro nacional e diversos serviços públicos estão apoiados nessa questão. Não podemos
ficar reféns de investimentos privados realizados sem qualquer direcionamento."
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