Interciencia
ISSN: 0378-1844
[email protected]
Asociación Interciencia
Venezuela
Espínola, Luis A.; Ferreira Júlio, Horácio
Espécies invasoras: conceitos, modelos e atributos
Interciencia, vol. 32, núm. 9, septiembre, 2007, pp. 580-585
Asociación Interciencia
Caracas, Venezuela
Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=33932902
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Espécies invasoras:
conceitos, modelos e atributos
Luis A. Espínola
e Horácio Ferreira Júlio Junior
RESUMO
A distribuição natural das espécies nos ecossistemas é influenciada por diversos fatores bióticos e abióticos, e as barreiras físicas operam como filtro para a dispersão. Os antigos processos de
colonização e migração humana e a recente tendência de globalização são os principais responsáveis pela transposição das barreiras geográficas e introdução de espécies em regiões fora de sua
distribuição original. Na designação das espécies introduzidas, a
terminologia adotada eventualmente pode levar uma falta de operacionalidade das definições confundindo a interpretação dos
paradigmas relacionados ao processo de invasão. De acordo com
a literatura, os seguintes critérios, i) biogeográfico, ii) crescimento
distribuição natural das
espécies nos ecossistemas
é influenciada por diversos fatores tais como i) mecanismos de
dispersão, ii) distância do local de origem,
iii) barreiras geográficas e, inclusive, iv) o
acaso. Em geral a maioria das espécies nos
continentes confina-se a tipos particulares de
ecossistemas, estas são conhecidas como espécies endêmicas (McNeely, 2001).
As barreiras geográficas
durante muito tempo limitaram o movimento das espécies nativas ou indígenas, ou seja,
aquelas encontradas historicamente em uma
região ou ecossistema. Por exemplo, filtros
biogeográficos tais como glaciações e barreiras geográficas evitam que algumas espécies
colonizem certos corpos de água ou regiões
elevadas. As espécies que passam por estes
filtros são capazes de tolerar as condições
da população e iii) dispersão na nova área, deveriam ser tomados em conta para evitar interpretações subjetivas. A maioria dos
modelos apresentados se encontram incertos nos mesmos paradigmas para explicar os estados do processo de invasão (chegada, estabelecimento e invasão) embora cada modelo tenha seus próprios
conceitos. Muitos autores consideram tanto as características das
espécies invasoras, como as características dos ambientes invadidos para explicar o sucesso das espécies e o estabelecimento. O
uso de claros, bem estabelecidos uso de conceitos e não subjetivos
de espécie introduzida e invasora bem como de seus derivados, é
crucial para unificar os paradigmas do processo de invasão.
abióticas (filtro fisiológico), passando a interagir com as espécies presentes (filtro biótico) (Figura 1a). Desta forma, ao contrário do
esperado se todos os continentes fossem somente um, as barreiras proporcionaram uma
riqueza muito maior para o planeta (Vermeij,
1996; Rahel, 2000). Com o surgimento do
istmo do Panamá, aproximadamente três milhões de anos, acelerou-se um massivo evento de invasões biológicas entre a América do
Norte e do Sul, conhecido como o grande
intercâmbio biótico Americano (GIBA; Vermeij, 1991). Neste intercâmbio, nem todos
os táxons foram igualmente bem sucedidos,
nem as faunas de ambos continentes foram
igualmente afetadas (Rodríguez, 2001).
Os primeiros processos
de colonização e migração humana para os
diferentes continentes, há mais de 100 mil
anos (McNeely, 2001), foram os principais
responsáveis pela transposição das barreiras geográficas e introdução de espécies
em regiões fora de sua distribuição original
(Elton, 1958). O recente processo de globalização acelerou ainda mais a dispersão
das espécies. Com as exportações agrícolas, o comércio de animais, o controle biológico, a manipulação de ecossistemas, a
recreação e mesmo introduções acidentais
incrementaram progressivamente o movimento de espécies que alcançou no século
passado, níveis sem precedentes (Moyle e
Ellsworth, 2004).
Dessa forma, a introdução de espécies constitui um grande problema para a ecologia dos ecossistemas,
afetando os principais tipos de interações
interespecíficas como: predação, competição, herbívora, parasitismo e mutualismo
(Fuller et al., 1999).
PALAVRAS CHAVE / Espécies Não Indígenas / Introdução / Processo de Invasão /
Recebido: 23/01/2007. Modificado: 25/07/2007. Aceito: 27/07/2007.
Luis A. Espínola. Licenciatura em Biodiversidad, Universidad Nacional del Litoral, Argentina.
Mestre e Doutorando em Ecologia de Ambientes Aquáticos Continentais, Universidade Estadual de Maringá (UEM), Brasil. Endereço: Av. Colombo, 5790. 87020-900, Maringá, Paraná, Brasil. e-mail: [email protected]
Horácio Ferreira Júlio Junior. Licenciatura em História Natural, UNESP-IBILCE, Brasil. Doutor em Biologia, Universidade de São Paulo, Brasil. Coordenador Geral do Núcleo de Pesquisas em Limnologia, Ictiologia e Aqüicultura/PEA, UEM, Brasil.
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SEP 2007, VOL. 32 Nº 9
Terminologia Associada
aos Organismos
Introduzidos
empregou o termo invasor referindo-se ao intercâmbio de fauna
no Pleistoceno, desenvolvendo
duas correntes no conceito de inAs introduções, tanto
vasão: uma relacionada às características das espécies invasoras
in­tencionais como acidentais
e outra sobre as características
implicam na movimentação
do habitat invadido. De acordo
de espécies (potencialmente
com Vermeij (1996), a biologia
invasoras) efetuada pelo hoda invasão atualmente tem recemem para outro ecossistema
bido contribuições de diferentes
ou região onde estas não são
disciplinas, tais como a ecologia,
historicamente encontradas
a biogeografia e a biologia evo(Figura 1b).
lutiva, atraindo a atenção de ecóPara designar espécies
logos em todo o mundo. Neste
in­troduzidas são utilizados
sentido, autores tais como Brown
termos tais como i) espécies não indígenas (ENI), ii) Figura 1. a: Espécies presentes em uma escala local são o resultado de vários (1989), Pimm (1989) e Lodge
alienígenas, iii) não nativas, filtros. No passado, espécies como A, B, e C passaram através dos três filtros (1993), forneceram modelos coniv) estrangeiras, v) exóticas, (biogeográfico, fisiológico e biótico) até alcançar a assembléia local. B: Os seres ceituais centrados tanto em cavi) transplantadas, e vii) humanos atuam de forma a evitar os filtros biogeográficos introduzindo espé- racterísticas biológicas e ecológialóctones. Entretanto, depen- cies em áreas que não poderiam colonizar por seus próprios meios. As espécies cas das espécies invasoras, como
dendo da zona geográfica de introduzidas tais como H e I, que passam através dos filtros fisiológicos e bióti- também na vulnerabilidade dos
ecossistemas às invasões.
origem da espécie, dois tipos cos, integram a assembléia local. Modificado de Rahel (2000).
Os termos rede termos são reconhecidos:
exótico, para designar os organismos prove- signar qualquer classificação de espécie in- lacionados com a ecologia da invasão, assim
nientes de outro país, e transplantado (Fuller troduzida.
como alguns da ecologia (Peters, 1991; Poet al., 1999) ou alóctone (Agostinho e Júlio
O que deve ser levado em wer et al., 1996), são criticados pela sua naJr, 1996), que se refere aos organismos des- conta é que toda espécie introduzida é po- tureza ambígua. Segundo Davis e Thompson
locados de sua zona geográfica nativa, den- tencialmente invasora, mas nem toda espé- (2000), a maioria dos termos empregados
tro do mesmo país (Shafland e Lewis, 1984; cie introduzida é invasora. Por esse motivo na ecologia da invasão não estão definidas,
Fuller et al., 1999; Richardson et al., 2000). é importante saber a diferença entre uma e se estão, nem sempre são definições conGido et al. (2004) classifi- espécie introduzida (espécie não indígena sistentes. Devido à ampla gama de termos,
caram as espécies de peixes introduzidos na - ENI) e uma invasora. A possibilidade de os problemas com a terminologia da invasão
América do Norte como: exóticas, as espé- que uma ENI se torne invasora depende de refletem um dilema mais geral na ecologia:
cies provenientes de outros países (ex. Cypri- suas características fisiológicas e ecológicas a falta de operacionalidade, com o abuso de
nus carpio); espécies regionais não nativas, para aclimatar-se ao novo ambiente.
termos inconsistentes e imprecisos (Peters,
aquelas de distribuições nativas na América
1991).
do Norte, porém introduzidas em outros Es- Origens da Ecologia de Invasão e o
A ecologia da invasão
tados (ex. Morone americana); e espécies de Problema com a Terminologia
tem apresentado uma rápida proliferação de
outras bacias de drenagem, aquelas nativas
termos para definir os processos, sendo que
de algumas bacias dos estados do Kansas
O termo invasão foi uti- a maioria destes evocam freqüentemente
e Oklahoma, porém introduzidas em outras lizado pela primeira vez (Simberloff, 2003) conceitos antropocêntricos como agressão,
(ex. Cyprinodon rubrofluviatilis e Pimepha- em um contexto ecológico por Goeze em assalto, ataque, usurpação, incursão, transles vigilax). Com o objetivo de padronizar a seu livro Pflanzengeographie für Gärtner gressão, ataque severo e invasão (Richardson
nomenclatura, os termos espécies regionais und Freunde des Gartenbaues, em 1882, no et al., 2000). Por exemplo, se aceita geralnão nativas, e espécies de outras bacias de qual reportou a invasão da Mangifera indica mente que os adjetivos como nocivo e praga
drenagem podem ser substituídos por alócto- L. (mangueira) na Jamaica como exemplo de impliquem em efeitos prejudiciais aos seres
ne, ou seja, deslocadas dentro do país.
uma invasão benéfica. Dessa forma, o termo humanos. O uso destes termos pode não ser
Os termos alienígena, não foi utilizado sem nenhuma relação com os o mais indicado para descrever fenômenos
nativa, estrangeira e exótica são utilizados impactos negativos ou positivos do proces- ecológicos, tendo em vista a já mencionacomo sinônimos para definir qualquer tipo so. Palmer, em 1899, foi o primeiro a cha- da origem antropocêntrica assim como suas
de espécie introduzida, levando a uma con- mar a atenção sobre aspectos negativos das associações subconscientes com termos préfusão de terminologia. Segundo Mack et al. espécies invasoras, observando que porcos, concebidos, que estão abertos a interpreta(2000), toda espécie introduzida poderia ser cabras, coelhos e gatos haviam devastado a ções divergentes e subjetivas de cada autor
chamada de espécie não indígena (ENI), es- biota nativa nas Índias e ilhas do Pacífico. (Colautti e MacIsaac, 2004).
pecialmente quando a procedência desta é Howard, em 1898, escreveu sobre a ameaça
Termos como não indíge­
incerta. Além de claro e entendível e por su- de insetos introduzidos e Marlatt, em 1917, na (Crawley, 1986; Fuller et al., 1999; Mack
gerir que toda ENI é retirada de sua área de advertiu sobre o impacto potencial dos inse- et al., 2000; MacIsaac et al., 2001; Ross et
distribuição natural, esse termo é amplamen- tos introduzidos e seus patógenos em plantas al., 2001; Colautti e MacIsaac, 2004), exótite encontrado (Fuller et al., 1999; MacIsaac, do gênero Castanea (castanha) e Picea glau- ca (McNeely, 2001; Gido et al., 2004), alieet al., 2001; Ross et al., 2001; Rahel, 2000; ca (pinheiro branco). No entanto, a promo- nígena (Richardson et al., 2000; Richardson,
Colautti e MacIsaac, 2004) e não tem uma ção da ecologia da invasão como uma nova 2001; Pyšek et al., 2004), foram utilizados
conotação subjetiva e antropocêntrica como disciplina ocorreu apenas por Elton (1958), alternativamente para descrever o mesmo
os termos mencionados no começo deste com o lançamento de seu livro sobre inva- conceito. Pelo contrário, um mesmo termo
parágrafo. Neste sentido, preferimos usar o sões de plantas e animais. Apesar de não é utilizado, para descrever diferentes procestermo espécie não indígena (ENI) para de- definir os termos invasão ou invasores, Elton sos ecológicos, como por exemplo: invaso-
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ra (IUCN, 1999; Davis e Thompson, 2000;
McNeely, 2001), naturalizada (Richardson
et al., 2000; Richardson, 2001; Pyšek et
al., 2004), importada (Williamson e Fitter,
1996a). O termo invasor tem sido empregado por diferentes autores para identificar
uma determinada espécie em vez de descrever o fenômeno ecológico associado à esta
(Richardson et al., 2000; Daehler, 2001).
Este termo pode ter uma conotação ambígua, relacionando-se tanto aos impactos causados pela espécie como pela sua dispersão
e estabelecimento no novo ambiente. Esta
falta de consenso faz com que este termo
seja confuso e de difícil interpretação, da
mesma forma, que invasão.
Também o termo invasão, em algumas disciplinas biológicas
tem sido usualmente associado com algum
efeito no ambiente, sobrepondo-se freqüentemente com o termo invasor (Rejmánek et
al., 2002). Tentativas recentes em redefinir a
invasão e seus derivados somente têm reforçado a divisão entre ecologistas da invasão
(Davis e Thompson, 2000; Richardson et
al., 2000; Daehler, 2001; Rejmánek et al.,
2002).
Richardson et al. (2000)
destacam que o termo naturalizado é igualmente confuso, sendo empregado como sinônimo para os termos: alienígena, invasora e
estabelecida, ou especificamente para a ENI.
Este acúmulo de termos
conduz ao agrupamento de diversos fenômenos diferentes e à separação de termos
similares, o que torna difícil ou até mesmo
impossível às tentativas de padronização da
terminologia. Uma das causas dessa contradição é que os significados são baseados em
interpretações filosóficas e individuais, sendo inverossímil que um único critério seja
desenvolvido abrangendo todas as situações
(Colautti e MacIsaac, 2004). Estas interpretações divergentes tornam-se problemáticas e
confusas na hora da conceitualização e utilização para a descrição dos processos que
se referem à invasão biológica, produzindo
no público, considerável confusão e emprego inadequado da terminologia (Peters,
1991; Simberloff, 2003; Colautti e MacIsaac,
2004). Como resultado, a atual terminologia,
além de confusa e imprecisa, contribui pouco no desenvolvimento da compreensão mais
aprofundada da invasão biológica (Shafland
e Lewis, 1984; Richardson et al., 2000; Colautti e MacIsaac, 2004).
A falta de operacionalidade das definições é prejudicial para uma
correta interpretação, pois um consenso sobre as mesmas serviria para evitar generalizações e predições equivocadas. Tal consenso reduziria a confusão entre os pesquisadores e facilitaria a aproximação necessária
para encontrar generalizações, melhorando
a compreensão dos processos associados às
invasões biológicas.
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Para reduzir a confusão
destes termos, Richardson et al. (2000) entre
outros, propõem definições dos seguintes termos: invasora, estabelecida e naturalizada.
Conceitos para Descrever os Processos de
Invasão Biológica
a nova população pode se auto-sustentar.
Isto consiste em vencer a resistência ecológica, ou seja, a interação entre a resistência
ambiental biótica e demográfica. Esta definição é similar às de Williamson e Fitter
(1996a, b) e Pyšek et al. (2004) que igualmente empregam os termos naturalizado e
estabelecido como sinônimos, já que ambos
os termos referem-se aos organismos que
estabeleceram populações auto-sustentáveis.
Mas, e concordando com Falk-Petersen et
al. (2006), é preferível usar o termo estabelecido, pois o termo e naturalizada assim
como exótico tem uma conotação subjetiva e
antropocêntrica.
Segundo Rejmánek (1999)
a invasão ecológica ocorre quando em um
ambiente são introduzidas ENI (potencialmente invasoras) que conseguem vencer a
resistência ecológica, estabelecer-se, podendo proliferar e se dispersar mantendo uma
população viável ao longo do tempo. Uma
vez que a ENI está estabelecida, é chamada
de espécie invasora. A velocidade com que
uma espécie invasora se dispersa depende
dos atributos individuais e populacionais.
Segundo Richardson et al. (2000) o intervalo entre a expansão e o crescimento da
população, para uma planta invasora, segue
tipicamente o padrão mostrado na Figura 2,
isto é, existe freqüentemente uma fase lenta
entre a chegada do organismo no novo habitat e a invasão.
Recentemente, Davis e
Thompson (2000) propuseram critérios para
denominar uma espécie de invasora. Estes
autores concordam para que uma espécie seja
reconhecida como invasora, ela deve ser nova
na região (critério biogeográfico), e também
causar um grande impacto. Esta definição
apresenta uma conotação conservacionista e
tem conseguido renome em algumas organizações internacionais de conservação como
a IUCN (1999). Entretanto Vermeij (1996),
Rejmánek (1999), Richardson et al. (2000),
Richardson (2001), Kolar e Lodge (2001;
2002); Rejmánek et al. (2002) e Pyšek et
al. (2004), além do critério biogeográfico,
baseiam-se também no critério de crescimento da população e dispersão, sem considerar
explicitamente o critério de impacto para definir uma espécie invasora. Estas definições
capturam os processos ecológicos gerais que
podem ser confirmados com simples medições da população. Todos esses autores concordam em definir como espécie não indígena (ENI) toda espécie que se dispersa do seu
ponto de introdução, tornando-se abundante.
Segundo Daehler (2001), a
definição de Richardson et al.
(2000) é preferível por não incluir critérios subjetivos, como
acontece com a definição de
Davis e Thompson (2000).
Segundo Heger e Trepl
(2003), as definições dependem do contexto da investigação. Para estes autores, as definições propostas por Richardson et al. (2000), são inadequadas para os estudos estri- Figura 2. Modelo de dispersão de uma planta ENI invasora no
tamente ecológicos centrados tempo. Modificado de Hobbs e Humphries (1995).
no organismo. Segundo estes,
uma definição deve ter justificativa ecológica
Algumas espécies não
para distinguir entre as invasões biológicas e se estabelecem, isto é, falham na invasão,
os fenômenos ecológicos similares tais como e sua população pode extinguir-se, ou não,
nomadismo ou a dispersão contínua de es- ou ainda permanecer latente (espécies não
pécies. Em se tratando de plantas invasoras, invasoras), até que ocorra alguma mudança
Heger e Trepl (2003) defendem a seguinte favorável no clima ou por repetidas introdudefinição: uma planta invasora é qualquer es- ções, tornando-se abundantes (a maioria das
pécie que ocorre em uma localidade fora de invasões bem sucedidas ocorre desta forma).
sua área de origem; a ocorrência da espécie Como resultado, a espécie invasora modifica
pode ter sido prevenida no passado por uma características na nova comunidade, geralbarreira, evitando sua dispersão, e não pelas mente associada à exclusão de espécies nacondições no novo habitat. A definição utili- tivas, tanto por competição como por predaza o termo qualquer espécie para acentuar ção. Este processo traz como conseqüência o
que não importa se no passado a barreira ge- fenômeno chamado homogeneização biótica,
ográfica pôde ou não ter sido transposta com que se refere ao incremento da similaridade
intervenção do homem.
entre as biotas causando a substituição de
A definição de Vermeij espécies nativas por não nativas (Mack et
(1996) para espécie estabelecida implica que al., 2000). A homogeneização biótica resulta
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em diminuição da diversidade das comunidades causada por fatores como ex­tirpação,
hibridação, tanto intra como interespecífica
(Rahel, 2000; Simberloff, 2003), modificação do habitat e de interações ecológicas que
não ocorreriam naturalmente com a mesma
velocidade (Rahel, 2000; Latini e Petrere,
2004). Exemplificando para peixes neotropicais, a introdução de piscívoros tais como
Cichla monoculus, Astronotus ocellatus e
Pygocentrus nattereri em lagos da bacia do
rio Doce, Brasil, reduziu a riqueza e diversidade da ictiofauna nativa (Latini e Petrere
Jr., 2004). Tanto este trabalho, assim como
o de Zaret e Paine (1973), mostram que a
introdução de Cichla cf. monoculus tem
conseqüências negativas sobre a estrutura da
comunidade, e causam homogeneização biótica. As espécies deste gênero são consideradas invasoras e atualmente ocupam quase
todas as bacias hidrográficas brasileiras.
Modelos
Colautti e MacIsaac (2004)
desenvolveram um modelo baseado em
Carlton (1985); Williamson e Fitter (1996 a);
Richardson et al. (2000) e Kolar e Lodge
(2001). Todos estes modelos baseiam-se no
conceito de pressão do propágulo, centrado
no número de propágulos invasores e na
freqüência com a qual os mesmos são introduzidos (Williamson e Fitter, 1996a, b).
Sob este paradigma, os invasores potenciais
passam através de uma série de filtros que
podem impossibilitar a transição das etapas
subseqüentes. Os propágulos invasores começam como residentes em uma região doadora (etapa 0), alguns dos quais são transportados como vetores (etapa I), geralmente
por seres humanos. Se estes propágulos sobrevivem ao transporte e chegam a introduzir-se (etapa II), então tem o potencial para
estabelecer-se (etapa III) no novo ambiente
(Colautti e MacIsaac, 2004). Neste modelo,
a separação da pressão do propágulo e de
outros fatores (interação da espécie, disponibilidade de recurso), implica em quatro categorias de espécies estabelecidas, baseadas
em dois filtros: dispersão local e conveniência do ambiente e da comunidade. A dispersão local ou regional dos indivíduos (isto é,
a pressão do propágulo) determina que as
espécies da etapa III alcancem a etapa IVa
(amplamente dispersa), e que espécies da
etapa IVb (dominante) alcancem a etapa V
(amplamente dispersa e dominante). Os fatores ambientais e das comunidades relacionadas implicam que as espécies da etapa III
alcancem a etapa IVb (dominante) ou que
espécies da etapa IVa alcancem a etapa V.
Sob estes critérios, uma espécie ENI pode
ser localizada e numericamente rara (etapa
III), dispersa, mas rara (etapa IVa), localizada mas dominante (etapa IVb) ou amplamente dispersa e dominante (etapa V).
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Atributos de Invasores Bem Sucedidos
Invasões de espécies oferecem aos ecólogos e evolucionistas um
paradoxo interessante. Como podem estes
organismos adaptar-se ao novo ambiente,
estabelecer-se e, às vezes, deslocar espécies
nativas? Ao se deparar com esses questionamentos, muitos autores consideram tanto
as características das espécies invasoras que
as tornam bem sucedidas, como as características dos ambientes invadidos, suscetíveis
ao estabelecimento. Atualmente, o principal
objetivo no estudo das invasões biológicas
tem sido entender porque alguns organismos
tornam-se invasores notórios, em detrimento
de outros (Rejmánek e Richardson, 1996;
Rejmánek, 1999; Kolar e Lodge, 2001).
Para Moyle e Ellssworth
(2004), qualquer espécie pode ser introduzida e, portanto, todo ecossistema pode ser
invadido com sucesso. Segundo Rejmánek
(1999), para descobrir quais características
ou combinações são responsáveis pela invasibilidade, primeiramente é necessária a distinção entre as espécies nativas e as invasoras.
Porém, é sumamente importante que fiquem
claros os conceitos empregados nesta área de
estudo. Geralmente, é mais fácil obter uma
lista das espécies invasoras do que daquelas
que não o são. Isto se deve ao fato de se conhecer mais acerca de espécies que tiveram
êxito na invasão, além de, ser muitas vezes
difícil a distinção entre uma ENI e uma espécie nativa.
Para ajudar a entender
quais habilidades são importantes para que
as ENI tornem-se invasoras, alguns estudos
têm focalizado as características da história
de vida da espécie como, por exemplo, a
predisposição a um rápido crescimento populacional, fecundidade (Wootton, 1998) e
sua integração com a comunidade (Kolar e
Lodge, 2000). Outros têm investigado como
as características genéticas podem promover
grande plasticidade fenotípica ou potencial
para uma rápida alteração evolutiva (Sakai et
al., 2001). Características como r-estrategista
(uso pioneiro do habitat, curto tempo de geração, altas taxas de crescimento e corpo pequeno), a capacidade de alternância entre as
estratégias r e K, e flexibilidade ecológica,
são importantes determinantes para o êxito
da invasão. Em novas situações, os indivíduos podem ajustar-se fisiológica ou morfologicamente, mesmo durante a fase do estabelecimento, determinando assim seu êxito como
invasor (Baker, 1965; Vermeij, 1996; Rosecchi et al., 2001). O estudo de BØhn et al.
(2004) ilustra que durante uma invasão, uma
população pioneira em um novo ambiente
impulsiona o desenvolvimento para um novo
padrão de história de vida, proporcionado
pelas condições e o potencial de mudanças
evolutivas. Então, as espécies que apresentassem várias destas características teriam
maior probabilidade de serem altamente invasoras em relação àquelas que apresentavam apenas algumas delas. Entretanto, suas
suposições ainda carecem de comprovação,
pois existem poucos dados empíricos para
refutar ou sustentar essas hipóteses (Kolar e
Lodge, 2001).
Segundo Ehrlich (1989), a
maioria dos vertebrados invasores bem sucedidos apresenta associação estreita com os
seres humanos. Exemplos de espécies bem
sucedidas na invasão biológica é Rattus norvegicus, a qual é uma competidora superior
com elevada abundância em sua área nativa,
pequeno tamanho, amplo nicho trófico e curto tempo de geração, em relação às espécies
nativas (Moyle e Ellssworth, 2004). Adicionalmente, organismos bem sucedidos apresentam grande variabilidade genética, hábito
gregário, capacidade de alternância entre as
estratégias r e K (peixes), vagilidade, capacidade das fêmeas de armazenar esperma
e habilidade de sobreviver em um amplo
espectro de condições físicas e ecológicas
(Blatz e Moyle, 1993; Crawley, 1986; Moyle e Light, 1996; Rejmánek e Richardson,
1996; Kolar e Lodge, 2002). Espécies com
estratégias reprodutivas múltiplas (reprodução vegetativa, por sementes e autofecundação), comuns em plantas, são consideradas
colonizadoras bem sucedidas (Baker, 1965).
A experiência de Blatz e Moyle (1993) e
Moyle e Light (1996) nos rios da Califórnia, sugerem que, se os fatores abióticos são
apropriados para as ENI provavelmente à
invasão terá êxito, sem importar a composição da biota local. Geralmente, as falhas são
atribuídas mais à inabilidade de aclimatação
às condições abióticas do que a resistência
biótica da comunidade receptora.
Além das características acima mencionadas, a literatura tem
reportado um aumento no crescimento e
condição dos indivíduos após a introdução
(Baker, 1965; Blossey, 1993). Este padrão
é atribuído à ausência de inimigos naturais
(competidores, predadores e patógenos) presentes na nova área (Crawley, 1986; Wolfe,
2002). A hipótese do escape do inimigo
natural postula que a regulação da redução
por inimigos naturais resulta no incremento da abundância e distribuição seguida da
introdução. Esta hipótese avalia o papel das
interações específicas. O estudo de Wolfe
(2002) fornece fortes argumentos em favor
desta hipótese. Sem dúvida, é possível que
outros fatores tenham um papel mais dominante em uma invasão bem sucedida (Sakai
et al., 2001).
Características dos Ambientes Invadidos
Quando os ecólogos se
perguntam se uma região é mais suscetível à
invasão que outra, está claro que temos que
perguntar se a região é intrinsecamente mais
583
suscetível à invasão e não somente se existem mais espécies não indígenas (ENI) na
região. A invasibilidade de uma região consiste em saber quais de suas propriedades
intrínsecas podem afetar ou não o estabelecimento e principalmente a sobrevivência da
ENI (Lonsdale, 1999).
Como os sistemas ecológicos são muito complexos, é extremamente
difícil predizer onde as espécies introduzidas
serão bem sucedidas. Geralmente as principais características dos ambientes invadidos
incluem: isolamento geográfico e histórico,
baixa diversidade de espécies nativas, altos
níveis de distúrbio por atividades antrópicas,
ausência de inimigos co-adaptados, incluindo competidores, predadores, parasitas e
doenças (Elton, 1958; Blatz e Moyle, 1993;
Wolfe, 2002; BØhn et al., 2004).
Charles Elton em seu livro
Invasões de plantas e animais (1958), concluiu que os invasores são mais prováveis de
se estabelecer nas áreas que foram alteradas
por seres humanos e nas áreas com comunidades relativamente simples, como ilhas
(Moyle e Ellssworth, 2004). Atualmente,
está bem documentado que os habitats antropicamente alterados são mais rapidamente
invadidos em relação aos íntegros, principalmente em função da alteração ambiental
para as espécies nativas (Elton, 1958; Lodge,
1993; BØhn et al., 2004). Este fator explica
provavelmente os números mais altos de espécies introduzidas nas áreas densamente povoadas (Moyle e Light, 1996). Por exemplo,
os peixes introduzidos na Califórnia podem
rapidamente estabelecer-se nos reservatórios
novos que se formam depois que as represas
são construídas, mas freqüentemente demoram a invadir os rios acima dos reservatórios, enquanto os rios permanecem dominados pelos peixes nativos, incapazes de sobreviver no reservatório (Moyle e Light, 1996;
Moyle, 1999). Tais rios apresentam uma elevada resistência ambiental à invasão.
As comunidades simples
são invadidas facilmente porque existem
poucas espécies nestas áreas (ilhas e dunas
do deserto) que evoluíram na ausência de
outras espécies, não possuindo as adaptações
necessárias para escapar da competição ou
predação das espécies invasoras (Moyle e
Ellssworth, 2004).
Considerações Finais
Embora a sociedade acredite que as introduções da maioria das ENI
sejam benéficas, estas ações são coletivamente prejudiciais para toda a sociedade, tanto
econômica como ecologicamente. O uso de
um conceito entendível de espécie introduzida e de espécie invasora assim como de
seus derivados é crucial quando se trata de
unir os paradigmas do processo da invasão.
Portanto, é necessário padronizar estes con-
584
ceitos de forma a diminuir as interpretações
divergentes para os fenômenos associados às
invasões biológicas. O modelo apresentado
por Colautti e MacIsaac (2004) é um claro
exemplo de que é preciso utilizar os mesmos conceitos de forma a diminuir a falta
de operacionalidade e assim compreender
melhor a dinâmica das espécies invasoras.
Evidentemente, além de sa­
ber quais são as ENI potencialmente invasoras e sua biologia, o estudo do processo da
invasão ainda exige uma compreensão mais
cuidadosa dos fatores que regulam este processo, ou seja: a chegada, o estabelecimento e a dispersão. Concordando com (Puth e
Post, 2005), a disparidade conhecida entre os
ecólogos demonstra que existe a necessidade
de ampliar esforços e incluir maiores investigações sobre o processo de chegada, pois o
transporte de potenciais invasores é passível
de controle pelos órgãos fiscalizadores. A
necessidade de elaborar legislações que forneçam conceitos claros e de aplicação direta
são extremamente desejáveis para evitar, ou
pelo menos minimizar a introdução e posterior invasão biológica. A Portaria do Instituto
Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renováveis (IBAMA) Nº 145-N, de
29 de outubro de 1998, apresenta diversos
termos para denominar espécies introduzidas,
o que levou à confusões técnicas na elaboração de seus artigos. Para esclarecer e melhorar esta portaria recomendamos a utilização
do termo espécie não indígena, não importando se a espécie é proveniente de outro ou
do próprio país.
Agradecimentos
Os autores agradecem a
Lenadro Fulone, Martin Blettler, Luciano
Neves dos Santos e Ana Petry por suas
valiosas sugestões, ao Nupélia, por toda
à infra-estrutura e a CAPES pelo suporte
financeiro.
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Invader Species: concepts, models and attributes
Luis A. Espínola and Horácio Ferreira Júlio Junior
SUMMARY
The distribution of species in ecosystems is influenced by several biotic and abiotic factors, and physical barriers operate as
filters to dispersion. The ancient processes of human migration
and settlement, and the recent globalization trends are the main
responsible factors for the transposition of geographic barriers
by organisms and species introduction in regions outside their
original distribution range. In order to designate introduced species, the adopted terminology may eventually lead to a lack of
operational definitions, misleading the interpretation of paradigms concerning the invasion process. According to the literature, the criteria i) biogeographic, ii) population growth, and iii)
spreading in the invaded region, should be taken into account as
a manner to avoid subjective interpretations. Most of the presented models are inserted in the same paradigms to explain the
status of the invasion process (arrival, establishment and invasion), although each model has its own concepts. Many authors
consider both characteristics of the invader species and of the
invaded environments to explain species success and establishment. The use of clear concepts, well established and non subjective concepts of introduced and invading species as well as
its derivatives is crucial to unify the paradigms of the invasion
process.
Especies invasoras: conceptos, modelos y atributos
Luis A. Espínola y Horácio Ferreira Júlio Junior
RESUMEN
La distribución de las especies en los ecosistemas es influenciada por diversos factores bióticos y abióticos, y las barreras
físicas operan como filtros para la dispersión. Los antiguos
procesos de colonización y migración humana y con la reciente tendencia de globalización son los principales responsables
por la transposición de las barreras geográficas e introducción
de especies en regiones fuera de su distribución original. En la
designación de las especies introducidas, la terminología adoptada puede eventualmente llevar a una falta de operacionalidad
de las definiciones confundiendo la interpretación de los paradigmas relacionados al proceso de invasión. De acuerdo con la
literatura los siguientes criterios: i) biogeográfico, ii) crecimien-
SEP 2007, VOL. 32 Nº 9
to de la población, y iii) dispersión en la nueva área, deberían
ser tomados en cuenta para evitar interpretaciones subjetivas.
La mayoría de los modelos presentados se encuentran insertos
en los mismos paradigmas para explicar los estados del proceso
de invasión (llegada, establecimiento e invasión); sin embargo,
cada modelo tiene sus propios conceptos. Muchos autores consideran tanto las características de las especies invasoras como
las características de los ambientes invadidos para explicar el
éxito de las especies y el establecimiento. El uso de conceptos
claros, bien establecidos y no subjetivos de especie introducida
e invasora, así como sus derivados, es crucial para unificar los
paradigmas del proceso de invasión.
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