PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS ESPECIALIZAÇÃO EM NEUROPSICOLOGIA RAQUEL BORGES DE PÁDUA E SOUSA MAGALHÃES COMPETÊNCIA DE LEITURA E ESCRITA EM CRIANÇAS COM TDAH E DISLEXIA GOIÂNIA 2011 RAQUEL BORGES DE PÁDUA E SOUSA MAGALHÃES COMPETÊNCIA DE LEITURA E ESCRITA EM CRIANÇAS COM TDAH E DISLEXIA Artigo apresentado ao curso Especialização em Neuropsicologia da Pontifícia Universidade Católica de Goiás, como requisito parcial à obtenção do título de Especialista. Orientador: Weber Martins, Ph.D. GOIÂNIA 2011 RAQUEL BORGES DE PÁDUA E SOUSA MAGALHÃES COMPETÊNCIA DE LEITURA E ESCRITA EM CRIANÇAS COM TDAH E DISLEXIA Artigo de conclusão de curso apresentado ao curso de Especialização em Neuropsicologia da Pontifícia Universidade Católica de Goiás, como requisito parcial à obtenção do título de Especialista. COMISSÃO EXAMINADORA ______________________________________________________ Prof. Weber Martins, Ph.D. Pontifícia Universidade Católica de Goiás ______________________________________________________ Prof.ª Sandra Barboza, Ms. Pontifícia Universidade Católica de Goiás Goiânia, _____ de dezembro de 2011 4 COMPETÊNCIA DE LEITURA E ESCRITA EM CRIANÇAS COM TDAH E DISLEXIA1 Competence of reading and Writing in Children With DDA and Dyslexia Raquel Borges de Pádua e Sousa Magalhães2 RESUMO Este estudo objetiva verificar se existe diferença na competência de leitura e escrita entre crianças com apenas TDAH e apenas Dislexia quando comparadas a outras crianças sem queixas escolares (grupo controle). Participaram 317 estudantes de ambos os gêneros de oito a doze anos de idade, de escolas públicas e privadas. Os participantes foram divididos em três grupos, sendo: grupo controle (271); grupo TDAH (30) e grupo de Dislexia (16). Os escolares foram submetidos à aplicação dos subtestes de escrita e leitura e tempo de leitura do Teste de Desempenho Escolar. Os resultados apontaram que os escolares do grupo controle, sem queixa escolar, apresentaram melhor desempenho nos subtestes de escrita, leitura e tempo de leitura (médias de 28,73, 64,62 e 122,9068 respectivamente) em relação ao desempenho dos escolares do grupo de TDAH (médias de 19,70, 51,27 e 234,6667 respectivamente) e do grupo de Dislexia (médias de 13,44, 30,63 e 357,3125 respectivamente), traduzindo-se em diferenças estatisticamente significativas apontadas pelo teste não paramétrico Mann-Whitney. Palavras-chave: Leitura. Escrita. TDAH. Dislexia. ABSTRACT This study aims to check if there is difference in the reading and in the writing competence between children with only DDA and Dyslexia when they are compared to others children without school complaint (the control group). Three hundred and seventeen students of both gender from eight to twelve years old, from public and private schools took part in this study. The participants were divided in three groups. The control group, (271 students); DDA group (30 students) and Dyslexia group (16 students). The students were submitted to an application of sub-tests of writing, of reading and time of reading of the school Test performance. The results have shown that the students of the control’s group, without school complaint, had better performance in the writing, reading and time of reading sub-tests (averages 28,73, 64,62, and 122,9068 respectively) and from the DDA group the averages were (19,70, 51,27 and 234,6667 respectively),and the Dyslexia group the averages were (13,44, 30,63 and 357,3125 respectively). Statistically this was computed as significant differences, shown by the parametric test of Mann-Whitney. Key-words: Reading. Writing. DDA. Dyslexia. 1 Este estudo é parte da pesquisa Avaliação Neuropsicológica de crianças e Adolescentes com Transtorno de Déficit de Atenção e Dislexia conduzida pelo prof. Weber Martins, Ph.D e pela Profª Sandra Barboza, Ms. 2 Psicóloga, Esp. Psicologia Escolar e Educacional, Pós-graduanda em Neuropsicologia na Pontifícia Universidade Católica de Goiás. E-mail:[email protected] 5 1 INTRODUÇÃO O assunto deste trabalho é desempenho de leitura e escrita em crianças. O problema específico tratado lida com o desempenho de crianças com TDAH e Dislexia. Com base nos estudos teóricos, avalia-se a hipótese de que crianças com apenas TDAH ou apenas Dislexia apresentam desempenho inferior quando comparadas a crianças sem queixas nesses aspectos. O Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDAH) é um transtorno neuropsiquiátrico da infância que acomete cerca de 3 a 7%, ou seja, mais de dois milhões de crianças em idade escolar (BARKLEY, 2002, p.36). Entre as crianças, a proporção de gênero é de cerca de 3:1, com os meninos com uma maior probabilidade de portar o transtorno que as meninas. A síndrome é caracterizada por déficits na inibição do comportamento, atenção sustentada, resistência à distração e comportamento hiperativo e impulsivo. A Associação Americana de Psiquiatria – APA – através do Manual Estatístico de Transtornos Mentais DSM-IV (2002), explicita que para satisfazer aos critérios diagnósticos seis ou mais sintomas de desatenção/hiperatividade devem estar presentes por pelo menos seis meses, causar prejuízo no funcionamento social, ocupacional ou acadêmico, alguns sintomas de hiperatividade / impulsividade ou desatenção estarem presentes antes dos sete anos de idade, devem estar e estar presentes em duas ou mais situações e os sintomas não devem ocorrer durante o curso de um transtorno global do desenvolvimento, esquizofrenia ou outro transtorno psicótico. Embora os sintomas de atenção melhorem com a idade em portadores de TDAH, a maioria continua apresentando e sofrendo com os sintomas na idade adulta. Dependendo das combinações de sintomas, é possível classificar os portadores de TDAH em três subtipos: a) predominantemente hiperativo-impulsivo, b) predominantemente desatento e c) portadores de TDAH do tipo combinado (com ambos comportamentos). Segundo Biederman, Mick e Faraone (2000 apud FUENTES; MALLOY-DINIZ; CAMARGO; COSENZA & Cols, 2008, p. 248), “os déficits de atenção, além de definirem um subtipo do transtorno, são os mais persistentes em indivíduos com TDAH ao longo do ciclo vital”. 6 De acordo com Cohen, Salloway e Zawachi (2006, p.417) “o trabalho de atenção é essencial para a existência cotidiana e é parte de nosso vocabulário comum”. Para esses autores a atenção depende da interação de quatro processos componentes: 1) capacidade e foco de atenção, 2) atenção seletiva, 3) seleção de respostas e controle executivo, 4) atenção constante. A intensidade e o tempo do foco atencional não é limitada e não é constante, com o passar do tempo, ela flutua em função de processos extrínsecos e intrínsecos. Os processos extrínsecos são o valor percebido dos estímulos e as demandas de respostas predominantes. Os processos intrínsecos são os fatores energéticos e estruturais. “A focalização da atenção depende fortemente da capacidade de atenção. O foco requer a alocação continua de recursos de processamento disponíveis para uma tarefa ou um objeto em questão” (COHEN; SALLOWAY; ZAWACHI, 2006, p.417). Isso está relacionado também com a dificuldade da tarefa envolvida e a quantidade de operações que devem ser realizadas ao mesmo tempo. O ato de prestar atenção está associado a uma ação planejada. Selecionamos os estímulos mais importantes a partir das respostas disponíveis, isto envolve um processo cognitivo mais complexo com intenção, planejamento e tomada de decisão. (COHEN; SALLOWAY; ZAWACHI , 2006, p. 420). Segundo Fuster e Luria (1989, 1966, apud COHEN; SALLOWAY; ZAWACHI, 2006, p.420) “os processos de atenção envolvido na seleção e no controle da resposta estão relacionados a uma classe mais ampla de processos cognitivos, comumente denominada de funções executivas”. A atenção constante ou atenção sustentada ou ainda vigilância, é a capacidade de manter o foco atencional a determinadas tarefas com uma certa persistência por longos períodos. Ou seja, é a atenção constante dirigida a alvos específicos. Considerando os subtipos de TDAH, Barkley argumenta que haveria uma diferenciação entre os comprometimentos de atenção. O tipo desatento teria mais dificuldades na atenção focaliza e seletiva, enquanto os subtipos combinado e hiperativo teriam maiores dificuldades relacionadas à atenção sustentada. (FUENTES et al, 2008, p.248). Segundo Oliveira et al (2011, p.345), escolares com TDAH apresentam alterações na função executiva, que abrange todos os processos responsáveis por planejar, focalizar, guiar, direcionar, e integrar as funções cognitivas, dentre elas o 7 estado de alerta as atenções sustentada e a seletiva. Consequentemente comprometimento na interação entre os processamentos visual, lingüístico, atencional e auditivo. Devido a tais alterações, esses escolares apresentam dificuldades metalingüísticas e relativas aos aspectos fonológicos, comprometendo aquisições, como da leitura e da escrita. O DSM-IV (2002) classifica a Dislexia como sendo um transtorno que gera um comprometimento específico no desenvolvimento das habilidades de leitura, o qual não é unicamente justificado por idade mental, problemas de acuidade visual ou escolaridade inadequada. Codifica em 315.00, caracterizando-a como transtorno de leitura que consiste em omissões, substituições, distorções ou adições de palavras ou parte de palavras; baixa velocidade de leitura; falsas partidas, hesitações longas ou “perda de lugar” no texto e fraseologia incorreta e inversões de palavras dentro de sentença ou de letras dentro de palavras. Descrições de Dislexia aconteceram primeiramente em 1896, quando foi descrita com “cegueira verbal”. Historicamente, várias nomenclaturas foram usadas para explicar esse transtorno e suas causas. Até as décadas de 1970 e 1980, acreditava-se que as causas do transtorno fossem os déficits sensoriais ou perceptivos no sistema visual. A partir de 1980 os estudos se focalizam em fatores cognitivos e linguísticos. “A teoria do processamento fonológico é sustentada até os dias de hoje, sendo responsável pela maior parte dos estudos dedicados à dislexia” (ALVES; SIQUEIRA; LODI e col 2011, p.29). Com relação à prevalência da Dislexia, importante salientar que tal transtorno pode variar de acordo com o sistema de escrita que é abordado por cada país. No entanto, Alves, Siqueira, Lodi e col. (2011, p.28) relatam que “há uma variação de 6 a 17% na prevalência da dislexia na população mundial em idade escolar, sendo que a predominância é do sexo masculino, com uma proporção de 1,5:1 nas estimativas atuais”. No Brasil estima-se que cerca de 5 a 10% da população brasileira tenha este transtorno. (CIASCA & MOURA-RIBEIRO, 2006). Sabe-se que a leitura e a escrita são competências de inestimável valor para os seres humanos. A leitura é uma atividade mental complexa e recente na humanidade, em contraste com a linguagem oral que é inata. O cérebro precisa aprender a 8 ler no mundo moderno e, para que isto aconteça, diversas são as etapas e os circuitos ativados. (AlLVES; SIQUEIRA; LODI e col, 2011, p.22). Estudos que envolvem o processamento da linguagem em indivíduos normais adultos apontam ativação de áreas temporais esquerda durante a execução de tarefas de linguagem. Regiões parietais inferiores esquerda, incluindo os giros supramarginal e angular, também estão implicados no processamento fonológico normal, na recuperação de palavras, na visualização de palavras e na leitura oral. Regiões corticais, como o giro frontal inferior, ou área de Broca, o giro dorsolateral pré-frontal e o giro orbital, todos no lobo frontal, áreas do lobo temporal, como o giro temporal superior e temporal médio e no lobo occipital, as áreas da região extraestriada, têm sido relacionadas com a leitura. (ROTTA; PEDROSO, 2006, p.156). Técnicas de neuroimagem funcional como a ressonância magnética funcional (RMNF), uma técnica moderna de mapeamento cerebral menos invasiva e aplicada em crianças disléxicas, comparativamente a leitores normais durante tarefas de processamento fonológico, mostra uma menor ativação do córtex cerebral nas áreas destinadas à compreensão da leitura, como a área de Wernicke e o giro angular, e compensatoriamente uma maior ativação de áreas anteriores, como a de Broca e o giro frontal inferior do hemisfério contralateral. (ROTTA; PEDROSO, 2006, p.157). Nos estudos da anatomia do cérebro, em autópsias de indivíduos com problemas de linguagem e de leitura, foram encontradas simetrias inesperadas no plano temporal. Muitos são os autores que apontam o déficit fonológico com a causa da Dislexia, e apontam várias dificuldades relacionadas com o processamento fonológico. Na Dislexia além do baixo desempenho em provas de leitura e escrita pode haver defasagem entre desempenho oral e produção escrita; fraco desempenho em provas de nomeação de acordo com Fawcett & Nicolson (1994); Faust, Dimitrovsky & Shacht, (2003); Ferreira & Nalini (2008) e finalmente, prejuízo em provas de consciência fonológica observáveis em provas informais de rima. Até 1920 as teorias para a causa da Dislexia sustentavam que déficits no sistema visual eram responsáveis pelas inversões de letras e palavras. No entanto, pesquisas subseqüentes demonstraram que o déficit responsável pelo distúrbio está no sistema lingüístico. A Dislexia assim, reflete um defeito específico da linguagem: o módulo fonológico. “O módulo fonológico é como se fosse a fábrica da linguagem, 9 a fábrica funcional do cérebro onde os sons são reconhecidos e montados sequencialmente para formar palavras e onde as palavras são segmentadas em sons elementares” (SHAYWITZ, 2006, p.43). Segundo Rotta e Pedroso (2006, p.155), Boder classificam a dislexia em disfonética, diseidética e mista. Na dislexia disfonética observa-se dificuldade para realizar a análise e a síntese das palavras. Na dislexia diseidética ocorre dificuldade para perceber tanto letras como palavras como gestaltes visuais, o que faz com que também seja chamada de disguestáltica. Na dislexia mista observa-se uma combinação de ambas as formas, constituindo um situação mais grave. Conforme Rotta e Pedroso (2006, p.161), a produção textual da criança disléxica normalmente apresenta vários erros como: leitura e escrita incompreensíveis; confusões de letras com diferente orientação espacial (p\q;b\d); inversões silábicas ou palavras (par\pra; lata\alta); substituições de palavras com estrutura semelhante (contribuiu ; construiu); supressão ou adição de letras ou de sílabas (caalo\cavalo; berla\bela); repetição de sílabas ou palavras (eu jogo bola; bolo de chocolate); fragmentação incorreta (querojo garbola\ quero jogar bola); dificuldade para entender o texto lido. Na dislexia disfonética a criança apresenta dificuldade para ler palavras desconhecidas, comete erros na leitura e na escrita, do tipo inversões, omissões, ou agregação de fonemas ou de sílabas. Na dislexia diseidética a criança lê de forma muito lenta, dividindo a palavra em partes não conseguindo ler totalmente. Os erros mais freqüentes na escrita são as inversões e as falhas na acentuação. Na dislexia mista, considerada a forma mais grave, ocorrem alterações das duas formas. Embora os indivíduos com Dislexia tenham seus déficits primários na habilidade de leitura, também apresentam dificuldade em outras áreas como: dificuldade em expressar suas idéias coerentemente, aprender o alfabeto, expandir seus vocabulários, identificar os sons que correspondem as letras, entender questões e seguir instruções (ouvidas ou lidas), memorizar convenções de tempo, dizer as horas, entender e reter detalhes de uma estória, desatenção e distração, aprender rimas e seguir músicas. Desorganização e incoordenação motora, distinguir direita de esquerda e letras de números, leitura lenta e compreensão reduzida do material lido (ASHA, citado por AlLVES; LODI e ARAÚJO, 2011, p.30). De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2009, 14,1 milhões de brasileiros com mais de 10 anos de idade eram analfabetos. 10 O mesmo estudo aponta que 20,3% das pessoas com mais de 10 anos de idade apresentavam o analfabetismo funcional. Embora esteja havendo redução nas taxas de analfabetismo e analfabetismo funcional, as crianças continuam apresentando dificuldades para desenvolver as competências necessárias para aquisição da leitura e da escrita. O diagnóstico da Dislexia é feito por uma equipe multiprofissional, envolvendo médicos, fonoaudiólogos, psicólogos e psicopedagogos. A avaliação neuropsicológica tem enorme contribuição para levantar um perfil neuropsicológico nos dois transtornos, tanto no TDAH como na Dislexia, ou ainda nas co-morbidades. Crianças com Dislexia apresentam déficits específicos nas funções neuropsicológicas, como no processamento visual e auditivo, sistema fonológico da linguagem, atenção e funções executivas. Segundo Lima, Salgado e Ciasca (2008, p.227), indivíduos com Dislexia apresentam problemas com o recrutamento de recursos cognitivos necessários para o desempenho de tarefas complexas de tempo de reação e fluência de leitura. Falhas na atenção, na memória episódica, na memória operacional e na resistência à distração podem apontar marcadores importantes para a presença da Dislexia. Padrões de erros disfonéticos, diseidéticos e mistos na execução dos testes que compõe a bateria podem consolidar as hipóteses (FERREIRA, 2011). No TDAH, os principais erros esperados são de intrusão e omissão na produção gráfica, não são esperados erros característicos da Dislexia como lentidão na fluência de leitura e dificuldade de nomeação. É valido ressaltar que para o diagnóstico de TDAH ou de Dislexia a inteligência medida deve estar dentro do esperado para faixa etária. Com base no exposto, o objetivo do presente estudo é saber se existe diferença na competência de leitura e escrita entre crianças com apenas TDAH e apenas Dislexia comparadas a outras crianças sem queixas escolares (controle). 4 MÉTODO 4.1 PARTICIPANTES 11 Participaram desta pesquisa 317 escolares, todos procedentes de escolas públicas, particulares e conveniadas dos estados de Goiás e de Mato Grosso, divididos em 03 grupos: 1. Grupo controle (escolares sem queixa clínica): participaram 271 crianças, com idade entre oito e doze anos; 2. Grupo clínico TDAH (escolares diagnosticados com TDAH): participaram 30 crianças com idade entre oito e doze anos; 3. Grupo clínico Dislexia (escolares diagnosticados com Dislexia): participaram dezesseis crianças com idade entre oito e doze anos. A amostra obedeceu a critérios de proporcionalidade preconizados no Manual Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-IV), segundo o qual, a prevalência é de 69% para o Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade e de 3-5% para o Transtorno Específico da Leitura (Dislexia) entre as crianças em idade escolar (DSM IV, 4ª edição revisada, 2002). 4.1.1 Critérios de inclusão grupo de controle (sem queixa escolar) Os critérios utilizados foram: possuir de oito a doze anos de idade; estar regularmente matriculado na rede pública, particular ou conveniada de ensino sem histórico de repetência ou queixas escolares; aceitar participar da pesquisa com Termo de Consentimento Livre e esclarecido – TCLE assinado pelo responsável. 4.1.2 Critérios de exclusão grupo de controle (sem queixa escolar) possuir idade inferior a oito anos de idade ou superior a doze anos de idade. Possuir histórico de repetência ou queixas escolares. Apresentar no momento da coleta de dados queixa de natureza somática ou desconforto psicológico. 12 4.1.3 Critérios de inclusão grupo clínico (com queixa escolar) possuir idade entre oito e doze anos de idade; possuir diagnóstico de TDAH ou Dislexia formalizado em Laudo médico ou psicológico, aceitar participar da pesquisa e ter TCLE assinado pelo responsável. 4.1.4 Critérios de exclusão grupo clínico possuir idade inferior a oito anos de idade ou superior a doze anos; não ter o diagnóstico formalizado e laudo médico ou psicológico; apresentar no momento da coleta de dados queixas de natureza somática ou desconforto psicológico. 4.2 INSTRUMENTOS Foram utilizados os seguintes instrumentos: Folha de registro contendo entrevista exploratória sociodemográfica, questões relativas à escolaridade, ocupação, uso de medicamentos, considerações gerais de saúde e lateralidade; Termo de consentimento Livre e esclarecido, contendo dados de identificação do sujeito, bem como explicação dos objetivos da pesquisa ; Protocolo (manual + crivo + folha de registro) do teste de desempenho escolar (STEIN, 1994). Foram utilizados apenas o subteste de escrita (composto de 34 palavras que são ditadas em ordem crescente de dificuldade) e de leitura (composto de 70 palavras, que são lidas pelo participante). Registrou-se, ainda, o tempo de leitura. 4.3 PROCEDIMENTO 13 Esta pesquisa foi realizada após aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Pontifícia Universidade Católica de Goiás, Folha de Rosto n° 449892. Neste estudo, foram realizados os seguintes procedimentos: O grupo controle foi abordado em escolas particulares, estaduais e conveniadas do Estado de Goiás e de Mato Grosso. Após a assinatura dos pais e/ou responsáveis no termo de consentimento, os escolares foram submetidos à avaliação, que se consistiu de três passos: 1º passo: Aplicação do questionário sociodemográfico onde foram colhidos dados como: nome, idade, escolaridade, renda familiar, medicação e outros; 2º passo: Teste de Desempenho Escolar – Escrita (STEIN, 1994) – Este teste é constituído pelo ditado de 34 palavras em português, obedecendo a uma ordem crescente de dificuldade ortográfica. O sujeito ainda é orientado a escrever o seu nome no mesmo teste, o que totaliza 35 pontos para esta tarefa; 3ºpasso: Teste de Desempenho Escolar – Leitura (STEIN, 1994) – Este teste é constituído da leitura de 70 palavras levando em consideração os critérios de: gradação dos fonemas segundo as relações fonológico-ortográficas (agrupamento dos fonemas, conforme a complexidade da língua oral e escrita); número de sílabas; grau de familiaridade do vocabulário e padrões silábicos (fonemas). Os dados coletados foram analisados com auxílio do programa computacional (software) SPSS (Statistical Package for Social Science) versão 18.0. 5 RESULTADOS A Figura 1 abaixo ilustra a distribuição da amostra por categoria nosológica. Observa-se que o grupo clínico de TDAH atendeu a proporcionalidade da amostra de acordo com as estimativas do DSM-IV, segundo o qual, a prevalência do Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade é de 6-9% entre as crianças em idade escolar. O grupo de Dislexia representou 5% da amostra, portanto dentro da estimativa preconizada no Manual Classificatório. 14 Quantidade de sujeitos 300 271 250 200 150 100 50 30 16 0 Controle TDAH Dislexia Grupos estudados Figura 1 - Distribuição da amostra por grupos nosológicos. A distribuição da amostra por faixa etária pode ser vista na Figura 2. Quantidade de sujeitos 80 68 70 60 57 58 53 50 Controle 40 TDAH 35 30 Dislexia 20 10 5 8 1 0 8 7 3 9 6 4 10 5 11 4 3 12 Idades Figura 2- Distribuição da amostra por faixa etária No grupo controle, observou-se maior concentração na faixa de 10 anos de idade, enquanto, no grupo de TDAH, a maior concentração ocorreu na faixa etária de 8 e 10 anos de idade. Finalmente, no grupo de Dislexia, a maioria dos participantes esteve na faixa etária de 10 e 11 anos de idade. A Figura 3 abaixo ilustra a distribuição da amostra por categoria tipos de escola. Observa-se que no grupo controle a maioria dos sujeitos avaliados vieram de escolas privadas. No grupo de TDAH e Dislexia a prevalência é de escola pública. 15 Quantidade de sujeitos 300 271 250 200 150 Publica Privada Total 145 126 100 50 19 11 30 10 6 16 TDAH Dislexia 0 Controle Grupos estudados Figura 3- Distribuição da amostra por tipo de escola Em consideração à ausência de normalidade das variáveis estudadas, demonstrada pelo uso do Teste de Kolmogorov-Smirnov (p < 0.001), utilizou-se testes não paramétricos. Assim, o Teste de Mann-Whitney foi escolhido para avaliar as hipóteses levantadas em relação ao desempenho de escrita e leitura dos grupos experimentais (de TDAH e Dislexia) quando comparados ao grupo controle. O teste demonstrou (p < 0.001) que as diferenças são estatisticamente significativas, corroborando as hipóteses levantadas, ou seja, desempenho inferior em leitura e escrita dos grupos experimentais em relação ao grupo controle. A Tabela 1 ilustra os resultados no subteste de escrita dos grupos estudados: média, desvio padrão, nível de significância, mínimo, máximo e intervalo de confiança. Tabela 1 - Desempenho no Subteste de escrita dos escolares dos grupos controle, TDAH e Dislexia. Grupo controle Média 28,73 IC 95% - Limite Inferior 28,16 IC 95% - Limite Superior 29,30 Desvio Padrão 4,803 Mínimo 14,00 Máximo 35,00 Significância (p bicaudal) Fonte: Raquel Borges de Pádua e Sousa Magalhães Grupo TDAH Grupo Dislexia 19,70 28,16 22,78 8,259 3,00 35,00 < 0.001 13,44 8,33 18,54 9,584 1,00 27,00 < 0.001 Observou-se que a amostra apresenta evidência positiva da hipótese experimental, pois a média do grupo controle foi maior que as médias dos grupos clínicos, TDAH e Dislexia. Segundo Teste de Mann-Whitney, as diferenças 16 analisadas são altamente significativas (p < 0.001), justificando-se a inferência para toda a população. A Tabela 2 ilustra os resultados no subteste de leitura dos grupos estudados: média, desvio padrão, nível de significância, mínimo, máximo e intervalo de confiança. Tabela 2 – Desempenho no Subteste de Leitura dos escolares dos grupos controle, TDAH e Dislexia. Grupo controle Média (pontos) 64,62 IC 95%- Limite Inferior 63,78 IC 95%- Limite Superior 65,46 Desvio Padrão 7,02 Mínimo 25,00 Máximo 70,00 Significância (p bicaudal) Fonte: Raquel Borges de Pádua e Sousa Magalhães Grupo TDAH Grupo Dislexia 51,27 44,79 57,75 17,35 1,00 70,00 < 0.001 30,63 19,56 41,69 20,77 3,00 56,00 < 0.001 Observou-se que a amostra apresenta evidência positiva da hipótese experimental, pois a média do grupo controle foi maior que as médias dos grupos clínicos, TDAH e Dislexia. Segundo Teste de Mann-Whitney, as diferenças analisadas são altamente significativas (p < 0.001), justificando-se a inferência para toda a população. A tabela 3 ilustra os resultados no subteste de leitura (tempo em segundos) dos grupos estudados: média, desvio padrão, nível de significância, mínimo, máximo e intervalo de confiança. Tabela 3 – Desempenho no Subteste de Leitura (tempo em segundos) dos escolares dos grupos controle, TDAH e Dislexia. Grupo controle Média – tempo (s) 122,91 IC 95%- Limite Inferior 116,92 IC 95%- Limite Superior 128,90 Desvio Padrão 50,09 Mínimo 54,00 Máximo 342,00 Significância (p bicaudal) Fonte: Raquel Borges de Pádua e Sousa Magalhães Grupo TDAH Grupo Dislexia 234,67 176,71 292,62 155,20 83,00 575,00 <0.001 357,31 255,23 459,40 191,58 87,00 584,00 <0.001 Observou-se que a amostra apresenta evidência positiva da hipótese experimental, pois a média do grupo controle foi maior que as médias dos grupos clínicos, TDAH e Dislexia. Segundo Teste de Mann-Whitney, as diferenças 17 analisadas são altamente significativas (p < 0.001), justificando-se a inferência para toda a população. 6 DISCUSSÃO O objetivo do presente estudo foi investigar o desempenho de escrita e leitura de crianças com TDAH e Dislexia em relação a crianças sem queixa escolar. Os resultados apontaram que os escolares do grupo controle, sem queixa escolar, apresentaram melhor desempenho nos subtestes de escrita, leitura e tempo de leitura em relação ao desempenho dos escolares do grupo de TDAH e do grupo de Dislexia traduzindo-se em diferenças estatisticamente significativas. Acolhendo a hipótese inicial de que haveria melhor rendimento no grupo controle comparativamente aos grupos TDAH e Dislexia. Alterações nas habilidades escolares não são incomuns no TDAH e na Dislexia (DSM-IV, 2002). Verificou-se que as diferenças no desempenho de escrita não foram somente entre grupo controle e grupo clínico, mas entre grupo TDAH e Dislexia, sendo este último o grupo com pior desempenho. Os resultados corroboram os achados de Fawcett & Nicolson (1994) que afirmam que na Dislexia é esperado baixo desempenho em provas de leitura e escrita. No TDAH, os principais erros esperados são de intrusão e omissão na produção gráfica (FERREIRA, 2011). Quanto ao desempenho de leitura e tempo de leitura foi possível observar que tanto o grupo de TDAH como o grupo de Dislexia obtiveram desempenho inferior em relação ao grupo controle. Houve ainda diferença de desempenho entre os grupos clínicos, tendo o grupo de Dislexia o pior desempenho. Esse dado pode ser justificado pelo déficit no processamento fonológico, ou seja, na capacidade de decodificar sons da fala e relacioná-los a sua forma ortográfica, que é uma característica da Dislexia conforme Shaywitz (2006). Segundo Oliveira et al (2011, p. 345), no TDAH, essas alterações podem ser justificadas por prejuízo na função executiva, no comprometimento da interação entre os processamentos visual, lingüístico, atencional e auditivo e consequentemente a dificuldades no aspecto fonológico, nos processos de leitura e 18 escrita. Na Dislexia, essas alterações são em decorrência de falha no processo de mediação fonológica, que depende da utilização do conhecimento das regras de conversão grafema-fonema para a construção da leitura da palavra. Essas alterações comprometem a realização da leitura e a compreensão do material lido. Na Dislexia, conforme Rotta e Pedroso (2006, p.161) a produção textual da criança normalmente apresenta vários erros como: leitura e escrita incompreensíveis; confusões de letras com diferente orientação espacial; inversões silábicas ou palavras; substituições de palavras com estrutura semelhante; supressão ou adição de letras ou de sílabas; repetição de sílabas ou palavras; fragmentação incorreta. Sendo assim, os achados desta pesquisa permitem concluir que os escolares de TDAH e de Dislexia apresentam desempenho inferior nos subtestes de escrita, leitura (tempo de leitura) quando comparadas a crianças sem queixas escolares. No entanto, são necessários novos estudos que investiguem melhor os padrões de erros encontrados nos grupos experimentais Embora no TDAH, dificuldade na fluência de leitura não seja um padrão de erro esperado, no presente estudo foi um dado estatisticamente significativo. Fato que pode ser justificado pela desatenção e impulsividade no momento da leitura, que faz com que o escolar cometa mais autocorreções. Entretanto, isso deve ser melhor investigado com estudos futuros. 19 REFERÊNCIAS ALVES, Luciana M.; SIQUEIRA, Claudia M; LODI, Débora F. e col. Introdução a Dislexia do Desenvolvimento. In: ALVES, Luciana M.; MOUSINHO, Renata; CAPELLINI, Simone A. (org). Dislexia Novos temas, novas perspectivas. Rio de Janeiro: Wak , 2011, p.21-40. AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais - DSM-IV-TR™. 4ª Ed. Porto Alegre: Artmed, 2002. BARKLEY, Russel A. Transtorno de Déficit de Atenção / Hiperatividade (TDAH):um guia completo para pais, professores e profissionais da saúde. Porto Alegre: Artmed, 2002. CIASCA, S. M. & Moura-Ribeiro, M. V. Avaliação e manejo neuropsicológico da dislexia. In: ROTTA, N. T.; OHLWEILER, L.; RIESGO, R. S. Transtornos da Aprendizagem Porto Alegre: Artmed, 2006. 181-193. COHEN, A. R, SALLLOWAY, S., ZAWACKI, T. Aspectos neuropsiquiátricos dos transtornos de atenção. In:YUDOFSKY, S. C.; & Hales, R. E. Neuropsiquiatria e neurociências na prática clínica. 4ª ed. Porto Alegre: Artmed, 2006. 417 e 444. FAWCETT A. J., & Nicolson R. I. (1994). Maning speed in children with dyslexia. J. Learn Disabil, Dec; 27(10):641-6. FERREIRA, S.F.B. & Nalini, LEG. Anomia em crianças submetidas à avaliação Neuropsicológica e diagnosticadas com dislexia. Anais do VI Congresso Brasileiro de Tecnologia e (Re)Habilitação Cognitiva. Dementia & Neuropsychologia. Vol. 2, Suppl 1, November 2008. FERREIRA, S.F.B., Nalini, L.E.G. & Pasquali, L. Teste de nomeação por confronto visual. Goiânia, 2011. Estudo não publicado. FUENTES, D.,Malloy-Diniz, L.F. Camargo, C.H.P. & Cosenza, R.M. (Orgs.), Neuropsicologia: teoria e prática .Porto Alegre: Artmed. 241-256. LIMA, Ricardo F.; SALGADO, Cintia A.; CIASCA, Sylvia M. Desempenho Neuropsicológico e Fonoaudiológico de Crianças com Dislexia no 20 Desenvolvimento. Avaliação Interdisciplinar e Dislexia. Revista Psicopedagogia 2008; 25 (78): 226 – 35. OLIVEIRA A.M et al. Desempenho de escolares com dislexia e transtorno do déficit de atenção e hiperatividade nos processos de leitura. Rev. Bras. Cresc. e Desenv. Humano 2011; 21(2): 344-355. ROTTA, N. T., Ohlweiller, L. e Riesgo, R. S. (2006). Em: Transtornos da Aprendizagem: Abordagem Neurológica e Multidisciplinar. Porto Alegre: Artmed. SHAYWITZ, S. Entendendo a dislexia. Porto Alegre: Artmed, 2006. STEIN, L. M.. Teste de desempenho escolar: manual para aplicação e interpretação. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1994.