ENTREVISTA NA MÍDIA, O CIRCO NÃO ESTÁ PARA BRINCADEIRAS “Investir no circo é um bom negócio”, afirma empresária que defende o espetáculo circense como uma alternativa de mídia para veiculação de produtos E , com o respeitável público, Marlene Querubim Jardim, a única mulher a dirigir um circo no Brasil. No centro do picadeiro, ela tem muito a contar sobre a atividade que desenvolve há mais de 20 anos, quando deixou o emprego na área de planejamento da Prefeitura de Cascavel, Paraná, e deu início à criação do Circo Spacial – atualmente um dos maiores do país. Mas, hoje, ela pede atenção para um ponto que considera crucial na sobrevivência, manutenção e expansão do espetáculo: o circo como mídia alternativa, ferramenta promocional de alta eficiência e confiabilidade. Encerrado o rufo dos tambores, deixemos que Marlene apresente o seu número: “Anunciantes e profissionais de marketing, de modo geral, ainda não descobriram as vantagens da publicidade no espaço circular mais democrático que existe, o circo, que dispõe de áreas e recursos para lançamento de produtos, exposição de out-doors, logotipos e marcas, merchandising, degustação e outras promoções. São muitos os cenários: na lona, nas cortinas, cadeiras e camarotes, mastros, na praça de alimentação, nos ingressos.” Já temos, portanto, o roteiro que ela vai seguir. Agora, é apreciar o espetáculo, que se desdobra em diversos quadros. MARKETING CULTURAL ONLINE – A sua proposta é que o circo seja considerado um veículo de comunicação e integre a mídia das agências de publicidade em igualdade com jornais, revistas, tevês e rádios? O que a leva a estabelecer essa paridade? MARLENE QUERUBIM JARDIM – Sim, porque o público que participa diariamente dos espetáculos circenses em todo o Brasil, pelo seu volume e Marlene Querubim Jardim, única mulher a dirigir um circo no Brasil. 2 MARKETING CULTURAL -SETEMBRO 2002 Circo, um espetáculo para toda a família – e consumidores. encomendada pelo Centro Cultural Banco do Brasil mostra que entre 65% e 80% do público freqüentador de eventos culturais, como o circo, é capaz de identificar o nome da empresa que patrocinou ou apoiou o projeto. Isto prova que investir em cultura, investir no circo, é um bom negócio. A população hoje tem simpatia pelas empresas que investem em cultura. características socioeconômicas, justifica investimentos em publicidade por parte de empresas, nacionais e multinacionais, de todos os segmentos da economia. Já provamos, através de ações com muitos clientes, que merecemos ser uma alternativa de mídia, e lutamos hoje para ter esse reconhecimento. O que falta é tornar isso conhecido das agências de publicidade, para que, ao fazerem um plano de mídia, uma ação promocional, um lançamento, o circo seja uma opção para os seus clientes. MCO – No caso do Circo Spacial, qual é o volume do público? MQJ – Nós temos capacidade para 3000 espectadores por espetáculo e fazemos 13 espetáculos por semana, 50 por mês. A freqüência é alta, em média 50% da lotação. E é um contato direto com o público. marca anunciada e oferece ao empresário excelente relação custo-beneficio. A publicidade desenvolvida a partir do circo cria um canal de comunicação com o público-alvo do produto anunciado, pois estabelece um forte vínculo com a família – exatamente a principal consumidora desse tipo de entretenimento e que ali vive um momento especial de descontração, de fruição de lazer e prazer, encontrandose, portanto, receptiva à mensagem. MCO – A sra. pode detalhar as pesquisas? MQJ – Por exemplo, uma pesquisa MCO – Então, o que falta para o circo deslanchar como veiculador de publicidade? MQJ – Quando se escreve e publica algo sobre marketing cultural, o circo não é mencionando como opção e, quando o é, fica relegado a plano secundário. Em que pese o caráter popular do circo, ao receberem qualquer oferta de patrocínio ou apoio, os profissionais de marketing – e mesmo os anunciantes – ainda não sabem o que esperar com relação à exposição de seus logotipos e marcas nesse espaço. Quando iniciamos o trabalho com marketing circense, enfrentamos dificuldades junto ao empresariado para "vender" a idéia do circo como mídia alternativa eficiente e confiável. Com MCO – E quais são os resultados para o anunciante? MQJ – Pesquisas realizadas revelam um expressivo aumento das vendas dos produtos anunciados no circo, durante a temporada e depois. Nossa experiência nos últimos 16 anos comprova que o circo confere visibilidade à O Circo Spacial faz 600 espetáculos por ano, com média de 3000 espectadores por sessão. MARKETING CULTURAL - SETEMBRO 2002 3 Lona, mastros, cadeiras, são muitos os espaços para publicidade em um circo. o correr do tempo, estabelecemos diversas parcerias publicitárias de sucesso. Mas ainda não foi desenvolvida a contento uma estratégia de marketing para o circo. MCO – Apesar de afirmar que a mídia circense não tem maior peso nas agências de publicidade, a sra. mencionou parcerias de sucesso feitas diretamente pelo Circo Spacial. Como isso ocorreu? MQJ – Esta é uma questão delicada. Ao dirigir-se ao cliente, em busca de patrocínio ou apoio, os empresários de circo em geral costumam indispor-se com as agências, que consideram essa prática uma violação de suas prerrogativas profissionais. Mas várias empresas, nacionais e multinacionais, recorreram ao Circo.Spacial como mídia, com absoluto sucesso. MCO – Como seria uma estratégia de marketing para o circo? MQJ – É essencial criar um patrimônio de mídia. MCO – E o que é um patrimônio de mídia? MQJ – É o conjunto de elementos que podem ser oferecidos para exploração publicitária. Todos os circos deveriam definir um repertório comum de ofertas de espaço ou de um mesmo tipo de recurso para exploração publicitária. Por exemplo, se as lonas fossem utilizadas para reprodução de logotipos, ficaria definido um espaço estável e específico de mídia. Da mesma forma em relação aos trailers, encosto das cadeiras da platéia, piso do picadeiro, box das praças de alimentação, mastros, etc. São exemplos de um patrimônio de mídia. 4 MCO – E por que isso não é feito? MQJ – A oferta de um patrimônio comum de mídia é a única alternativa viável, a curto prazo, para que o circo se transforme numa opção atraente de divulgação e veiculação de produtos, mas isso só se efetivará com a articulação de todos os empresários ligados ao circo, ou pelo menos de uma fatia expressiva deles, para discutir e definir quais elementos serão oferecidos como espaço publicitário. É uma tarefa que exige a cooperação da Associação dos Circos. A maior parte dos frequentadores identifica o nome da empresa que apóia projetos culturais. MCO – Quais são essas empresas? MQJ – Nós estabelecemos parcerias com muitas empresas, entre elas a Nestlé, Shell, Bauducco,Tintas Coral, Grupo Pão de Açúcar, Carrefour, McDonald´s, Credicard, Coca-Cola e Melitta. Tintas Coral é nossa parceira MARKETING CULTURAL - SETEMBRO 2002 McDonald´s e Nestlé são duas das empresas que fazem parceria com o Circo Spacial. há dez anos. Atualmente, estamos tentando nos organizar para ampliar as parcerias fixas, fazer mais parceiros anuais. Buscamos quatro parceiros para o ano que vem e estamos abertos para negociar. MCO – Quanto uma empresa tem de investir para fazer uma parceria com o circo? MQJ – Depende. Os valores são em cima das mídias. Se o circo está em São Paulo, o custo é um, no interior é outro. Depende se vai envolver embalagem, promoção direta, out-doors, envelopamento do circo. Cada parceria é tratada muito pessoalmente, jus- O CIRCO ESTÁ ARMADO Marlene Querubim Jardim não é de família de circo. Fazia universidade e trabalhava na prefeitura de Cascavel, Paraná, quando se encantou com o mundo do circo. Em 1985, criou o Circo Spacial, que hoje, entre artistas, técnicos e funcionários, reúne permanentemente cerca de 100 pessoas – número que cresce e chega a dobrar com o pessoal contratado temporariamente em cada cidade onde a lona é armada. Até 12 de outubro, o Circo Spacial apresenta seu espetáculo em um terreno na Marginal do Rio Tietê, em São Paulo. A segunda parte da temporada será em outro terreno, na mesma cidade. “Nós ficamos 10 anos sem vir a São Paulo. Voltamos no ano passado e repetimos agora. Depois vamos sair para uma temporada no interior do Estado.” Onde? A definir. O roteiro do circo é flutuante, depende dos parceiros. “Se o patrocinador tem interesse no Nordeste, vamos para o Nordeste. Se não tem patrocinador, vamos para onde temos mais vontade de ir. Fazemos um estudo das cidades. Vemos qual está mais descansada, clima, situação econômica, e aí escolhemos”. Em julho, concorrendo com todos os grandes circos do Brasil, o Circo Spacial recebeu nove prêmios da Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo, entre eles os de melhor espetáculo, melhor malabarista, melhor locutor, melhor equilibrista, melhor trapezista e melhor contorcionista. Foi o circo mais premiado. MARKETING CULTURAL -SETEMBRO 2002 tamente para a empresa anunciante ser bem atendida. MCO – As empresas podem entrar usando as leis de incentivo? MQJ – Podem. Mas, com relação a incentivo, agora vou me queixar. Durante três anos tivemos a aprovação da Lei Rouanet, uma verba de R$ 1.400.000,00. Saímos ao mercado para captar e não conseguimos, justamente porque o circo não é conhecido como mídia. Também revistas, jornais, livros e outras publicações que citam os veículos de comunicação, citam as mídias, não incluem o circo. Eles não conhecem a força potencial do circo como ferramenta de publicidade, não sabem que é uma mídia que pode ser aferida de espetáculo para espetáculo. No circo, de praça para praça, de espetáculo para espetáculo, você sente o público na hora. Tem como medir, dá para saber direitinho o quanto vem de benefício. Por isso a Coral está há dez anos com o Circo Spacial, por isso muitos patrocinadores voltaram a investir. O circo faz o marketing dele, e faz o marketing dos outros. Ele é um veículo, por que não? ◆ Serviço: Serviço: Circo Spacial – Marginal do Tietê (viaduto da rodovia Bandeirantes), São Paulo (até 12 de outubro) Tel. (11) 3644.3300 5