O medo nas Crianças: Análise Qualitativa de Dados
Fears in Children: Qualitative data analysis
Ana Filipa Pinheiro nº 38826; Bruna Magalhães nº 38834; Joana Carvalho nº 38847;
Soraia Oliveira nº 38863
Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Vila Real
Resumo
Considerando a importância da desmistificação dos medos mais comuns entre as
crianças, realizou-se o presente estudo com o objetivo de determinar a frequência e
intensidade dos medos em crianças portuguesas. Participaram como sujeitos 14 rapazes
e 20 raparigas provenientes das regiões de Amarante e Vila Real, às quais foi aplicada
uma versão adaptada do Inventário Revisto de Medos para Crianças (Ollendick, 1983).
Os resultados mostraram que existem diferenças significativas relativas à
intensidade dos medos, em função do sexo masculino ou feminino de crianças como
idades compreendidas entre os 9 e os 11 anos.
Palavras-chave: Medos nas Crianças, Medos mais frequentes, Emoção Primária,
Emoção Secundária, Medo.
Abstract
Considering the importance of demystifying the most common fears among
children, the present study was produced as an attempt to determine the frequency and
intensity of fears among Portuguese population. As participants there were 14 boys and
20 girls from the regions of Amarante and Vila Real, which was applied an adapted
version of the Revised Fears Schedule Survey for Children (Ollendick, 1983).
The results showed that there are significant differences in intensity of fears,
depending on male or female, of child aged between 9 and 11 years.
Key-words: Fears in Children, Most Common Fears, Primary Emotion,
Secondary Emotion, Fear.
Introdução
De acordo com Ferreira, Borges e Seixas (2010, pág. 29), não é possível nem
correto abordar os temas do medo sem nos referirmos primeiramente às emoções como
sendo uma parte integrante do nosso desenvolvimento enquanto seres Humanos. Assim,
a emoção é uma resposta imediata que padece de significado sem que a tenhamos
solicitado (Ades, 1993 cit. por Ferreira, Borges & Seixas, 2010, pág. 29). Várias áreas
de estudo se debruçam sobre a questão das emoções, mas é a Psicologia que possui a
abordagem mais importante para o nosso estudo. Segundo Ferreira, Borges e Seixas
(2010, pág. 29), a Psicologia identifica as emoções como sendo o despoletar do
desenvolvimento e da adaptação humana. Assim, existem emoções que nos são inatas e
que são chamadas primárias (ou básicas) – teoria psicoevolucionista. Então, assume-se
que estas emoções primárias estão presentes em qualquer cultura, religião, etnia ou
espécie (Batista, Carvalho & Lory, s/d, pág. 3) e existentes desde o nascimento.
Segundo Belzung (2007, pág. 42), certos estudos demonstram que os recém-nascidos
exteriorizam emoções correspondentes ao prazer gustativo ou da repulsa à dor. Por
outro lado, e segundo a mesma fonte, os fetos ao sorrirem mostram a presença de
emoções adjacentes. Estes factos sustentam o cariz inato das emoções. Uma definição
defendida por Belzung (2007, pág. 16) decompõe as emoções em três componentes
fulcrais: a componente comportamental, a componente fisiológica e a componente
cognitiva/subjetiva. A componente comportamental diz respeito à predisposição para
agir que as emoções nos garantem (Batista, Carvalho & Lory, s/d, pág. 4), ou nos
aproximamos dos estímulos apetecíveis (sistema apetitivo) ou fugimos dos hostis
(sistema defensivo) (Belzung, 2007, pág. 16). A componente fisiológica refere-se às
diversas ativações fisiológicas que estão associadas aos estados emocionais e que estão
relacionadas com as modificações ao nível do sistema nervoso autónomo, como por
exemplo o batimento cardíaco, as secreções e/ou alterações hormonais, ativação de
músculos faciais, entre outros. A componente cognitiva/subjetiva das emoções associa
elementos como a história do indivíduo, os seus valores, a sua cultura e o seu estado de
fundo. As emoções primárias que temos vindo a abordar são, como defende Izard
(1977) (cit. por Belzung, 2007, pág. 20), a alegria, a surpresa, a cólera, a tristeza, o
desprezo, a angústia, o interesse, a culpabilidade, a vergonha e o amor. Já segundo
Ekman (1992) (cit. por Belzung, 2007, pág. 20), estas emoções primárias correspondem
à alegria, ao medo, à cólera, à tristeza, à surpresa e ao desgosto (suporte biológico).
Estas, por serem primárias, são também, como já se referiu, universais. Os estudos
efetuados por Darwin (1872) e Ekman (1972) (cit. por Belzung, 2007, pág. 23)
sustentam esta universalidade das emoções primárias. Assim, segundo estes autores, a
expressão facial de uma emoção primária é e deverá ser reconhecida em qualquer parte
do mundo, mesmo por indivíduos de culturas distintas. Por outro lado, as emoções
secundárias são as que resultam da combinação entre as primárias e outros fatores,
como por exemplo, a euforia, a ansiedade, a inveja, entre outros (suporte cultural). O
modelo que diferencia e distingue emoções primárias das secundárias denomina-se
Teoria dos dois fatores. Neste artigo científico daremos especial ênfase a uma emoção
primária em particular: o medo. Neste artigo científico daremos especial ênfase a uma
emoção primária/básica em particular: o medo.
Segundo Ainsworth (1981) (cit. por Ferreira, Borges & Seixas, 2010, pág. 30), a
definição de medo remete-nos para a tomada de consciência de uma determinada
ameaça real ou imaginária e que tem repercussões ao nível comportamental (fugir,
gritar, chorar), ao nível biológico interno (aceleração da pulsação e do batimento
cardíaco) e ao nível biológico externo (tremores, expressões faciais que sugerem susto).
Assim, e segundo a mesma fonte, as principais funções do medo são alertar-nos para
possíveis perigos e levar-nos a agir para nos libertarmos – caráter desenvolvimentalista
do medo (Sampaio, Martins & Oliveira, s/d, pág. 254). De facto, os medos alteram-se
consoante a idade, género, classe sócio-económica, cultura e sociedade vigentes
(Ferreira, Borges & Seixas, 2010, pág. 30). Assim, nos primeiros seis meses de vida os
medos mais comuns estão relacionados com a perda de apoio e os ruídos altos. Já no
segundo ano de vida, os medos mais visíveis dizem respeito à separação dos pais, ao
bacio, ferimentos e pessoas estranhas. A partir do quarto ano de vida, as crianças
geralmente temem as máscaras, a escuridão e certos animais. Aos seis anos, os seres
sobrenaturais (fantasmas, bruxas, monstros) são os que provocam mais medos. A partir
dos 12 anos até ao início da adolescência (sensivelmente) os jovens tendem a temer
aspetos mais realistas e autoavaliativos, como por exemplo, os testes e exames
escolares, os ferimentos corporais, a aparência física, trovões e raios e, principalmente,
assuntos relacionados com a morte (Papalia & Olds, 2009, pág. 321). Segundo a mesma
fonte, os pais conseguem aliviar de certo modo estes medos que as crianças possuem se
lhes incutirem confiança e cautela, sem serem demasiado protetores. Ainda em relação
aos medos infantis, estes desenvolvem-se em três vias distintas: condicionamento direto
(experiências individuais), modelagem (observação) e transmissão da informação
negativa (pela televisão, internet, ou pelos amigos) (Rachman, 1977-2004 cit. por
Sampaio, Martins & Oliveira, s/d, pág. 254). De acordo com a mesma fonte, esta última
causa parece constituir cerca de 90% dos medos das crianças. Estudos internacionais
sobre os medos desenvolvimentais têm destacado resultados em relação às diferenças
entre género e idade (Sampaio, Martins & Oliveira, s/d, pág. 254). Em relação ao
género, as raparigas tendem a ter medos semelhantes aos dos rapazes, porém numa
escala mais intensa e prevalente. Este facto poderá estar relacionado, segundo a fonte,
com a fragilidade e valiosidade em relação à perpetuação da espécie do sexo feminino.
Quanto ao fator idade, crianças e adolescentes tendem a demonstrar medos distintos: os
jovens atribuem um maior valor à componente social (o medo de errar perante os
outros, da crítica social), enquanto as crianças possuem medos mais físicos (cair,
queimar-se). Porém, a morte parece ser um medo comum a qualquer género e faixa
etária e constitui um dos dez medos mais comuns (Sampaio, Martins & Oliveira, s/d,
pág. 255).
Posto isto, o nosso estudo pretende replicar determinadas investigações utilizando
o FSSC-R como instrumento, com vista a colmatar ou refutar estes fatores diferenciais.
Metodologia
Participaram no presente estudo 34 crianças (14 rapazes e 20 raparigas) dos 9 aos
11 anos de idade, provenientes de duas turmas de catequese, naturais de Amarante e
Vila Real que frequentavam o 5º ano de educação religiosa católica, respetivamente.
A sua escolha foi feita de forma a representar duas zonas habitacionais diferentes,
sendo que as crianças selecionadas estavam distribuídas no que diz respeito à sua
localização em zonas urbanas ou rurais.
Utilizou-se neste estudo a versão portuguesa do Inventário Revisto de Medos,
originalmente formulado por Ollendick em 1983 e denominada como FSSC R.
As respostas possíveis para cada item são constituídas por Nenhum, Algum e Muito
às quais são atribuídas 0, 1 ou 2 pontos, respetivamente, e como tal o resultado bruto
desta escala pode variar entre 0 e 160 (o número total de itens era 80).
A aplicação foi feita a 10 crianças em Vila Real e a 24 em Amarante e de forma
coletiva, visto que se encontravam numa sala comum juntamente com a responsável
pela aplicação. Durante a mesma, foi bem explicitado que não havia tempo limite para o
preenchimento da escala e que não existem respostas certas e erradas, bem como que
em caso dificuldade, poderiam ser pedidos esclarecimentos em qualquer momento da
aplicação do teste às pessoas responsáveis pela mesma.
Tal como no estudo realizado por Fonseca (1993, pág. 87-89) as variáveis
constituintes do FSSC-R, que totalizam 80 itens, foram consideradas tanto
individualmente como organizadas por fator. Consideraram-se então 5 fatores que
englobam os seguintes medos:
Fator 1. Fator Geral de Medo
Item
Variáveis
% Algum
% Muito
Medo
Medo
4.
Lagartos
24
15
7.
Objetos Cortantes
30
12
9.
Morte ou Pessoas Mortas
15
47
10.
Perder-se num lugar desconhecido
30
47
11.
Cobras
30
27
18
Ursos ou Lobos
35
35
20.
Ataques de bombas ou invasões
27
56
23.
Sítios altos, como montanhas
24
9
26.
Ladrão a assaltar a nossa casa
29
53
27.
Andar de avião
21
15
30.
Morcegos ou aves
24
3
32.
Armas
21
47
33.
Andar metido (a) em brigas
41
21
34.
Fogo/Queimar-se
30
53
35.
Cortar-se ou ferir-se
41
21
37.
Trovoadas
27
12
41.
Ser atropelado por um carro
33
59
49.
Pessoas com aparência estranha
41
21
52.
Cães com ar perigoso
47
30
57.
Pesadelos
32
29
58.
Cair de lugares altos
41
47
59.
Apanhar um choque elétrico
21
65
70.
Micróbios ou apanhar uma doença grave
38
56
72.
Terramotos
27
71
76.
Não poder respirar
27
68
77.
Ser ferrado (a) por uma abelha
21
18
Fator 2. Medos do Desconhecido
Item
Variável
% Algum
% Muito
Medo
Medo
6.
Fantasmas ou coisas assustadoras
32
6
17.
Ficar em casa com a ama
6
--
43.
Jogos duros ou violentos
41
21
45.
Quartos escuros
24
9
46.
Ter que fazer alguma coisa em frente
29
12
dos outros
53.
Cemitérios
24
6
56.
Águas profundas ou o oceano
32
21
60.
Ir para a cama às escuras
24
6
61.
Enjoar no carro
32
--
62.
Estar sozinho (a)
27
9
65.
Ter que ficar sozinho (a) depois das
15
6
aulas
67.
Filmes policiais
9
3
68.
Sirenes ruidosas
29
3
69.
Coisas novas
12
--
71.
Espaços fechados
12
24
73.
Terroristas
38
38
74.
Elevadores
27
6
75.
Lugares escuros
27
9
78.
Minhocas ou caracóis
27
3
Fator 3. Criticismo e Insucesso
Item
Variável
% Algum
% Muito
Medo
Medo
1.
Ter que falar na aula
29
6
5.
Parecer estúpido(a)
27
27
15.
Ser castigado(a) na escola
35
24
24.
Ser gozado(a)
47
27
28.
Ser chamado pelo professor
21
6
29.
Tirar más notas
24
47
31.
Ser criticado(a) pelos pais
35
21
40.
Ficar mal num teste
29
32
44.
Encontrar os pais a discutir
50
18
48.
Ser criticado(a) pelos outros
35
24
54.
Receber as notas da escola
27
09
63.
Ter que andar com roupas diferentes
06
--
dos outros
64.
Ser castigado(a) pelo pai
29
12
66.
Cometer erros
47
21
80.
Passar um teste ou fazer um exame
24
27
% Algum
% Muito
Medo
Medo
Fator 4. Medos Relacionados com a Saúde/Acidentes
Item
Variável
2.
Andar de carro ou autocarro
6
3
8.
Ter de ir ao hospital
27
18
12.
Falar ao telefone
15
--
13.
Montanha russa ou carrossel
21
3
16.
Andar de comboio
12
--
19.
Conhecer alguém pela primeira vez
18
6
21.
Levar uma injeção
24
9
22.
Ir ao dentista
29
32
36.
Multidões
21
3
39.
Gatos
21
9
42.
Ter de ir à escola
3
--
50.
Ver Sangue
18
6
51.
Ir ao médico
18
3
55.
Cortar o cabelo
9
6
% Algum
% Muito
Medo
Medo
Fator 5. Outros Medos
Item
Variável
3.
Ser castigado(a) pela mãe
38
15
14.
Adoecer na escola
21
12
25.
Aranhas
30
18
38.
Ter que comer coisas que não gosta
27
15
79.
Ratos e ratazanas
21
32
Após a análise dos resultados apresentados pelo tratamento estatístico, procedeu-se
à interpretação dos mesmos de forma a compreender em que medida estes poderiam dar
resposta aos objetivos estabelecidos relacionados com o propósito da realização deste
estudo.
Resultados
A intensidade dos Medos
A intensidade dos medos permite verificar os medos mais frequentes e os medos
menos frequentes, bem como as diferenças da intensidade dos medos de acordo com o
género Para esta questão os seguintes quadros: referentes a cada um dos fatores de
medo, sendo que cada um deles se refere a cada um dos 5 fatores em que se dividiram
as variáveis que representam cada um dos 80 medos que constituem o Inventário de
Medo para Crianças, FSSC-R.
O quadro 1 permite então verificar as médias e os desvios-padrão para o Fator
Geral de Medo, Medos do Desconhecido, Criticismo e Insucesso, Medos relacionados
com a Saúde/Acidentes e Outros Medos, no grupo dos rapazes e das raparigas e
independentemente da sua idade. De acordo com o mesmo é possível verificar que as
raparigas apresentam médias na escala de medo significativamente mais elevadas do
que as dos rapazes em todos os 5 fatores e que esta diferença apresenta-se mais
significativa no fator Medo Geral. Estes resultados vão de acordo com os dados que
foram obtidos com o mesmo instrumento na população portuguesa (Fonseca, 1993, pág.
81).
Quadro 1: Distribuição dos medos por sexo
Feminino
Masculino
A prevalência dos Medos
No seguinte quadro encontram-se, por ordem decrescente, os medos com maior
prevalência na amostra estudada, sendo o critério utilizado para a seleção dos medos
pertencentes a esta lista os medos que, na amostra utilizada, foram mais frequentemente
assinalados como provocando Muito Medo, critério que foi igualmente utilizado no
estudo de Fonseca (1993, pág. 83).
Na tabela aparecem ainda destacados a itálico os medos que também se encontram
na lista dos medos mais frequentes do estudo realizado numa amostra da população
portuguesa (Fonseca, 1993, pág. 83) e que segundo o autor do mesmo, representam
também os medos mais frequentes noutros países onde o mesmo instrumento foi
utilizado Ollendick et al. (cit por Fonseca, 1993).
Quadro 2: Medos mais comuns na amostra utilizada
Item
%
72. Terramotos
71
76. Não conseguir respirar
68
59. Apanhar um choque elétrico
65
41. Ser atropelado por um carro
59
20. Ataques de bombas ou invasões
56
70. Micróbios
56
26. Ladrão a assaltar a nossa casa
53
34. Fogo/Queimar-se
53
9. Morte ou Pessoas Mortas
47
10. Perder-se num lugar desconhecido
47
29. Tirar más notas
47
32. Armas
47
58. Cair de lugares altos
47
Discussão dos Resultados
Os dados recolhidos permitem-nos tirar algumas conclusões ainda que
introdutórias. Através da escala FSSC-R, foi-nos possível diferenciar e perceber quais
os medos que predominam nos rapazes e nas raparigas com idades compreendidas 9 e
os 11 anos. O estudo realizado por Fonseca (1993, pág. 78) teve uma amostra mais
ampla, com 676 crianças e adolescentes com idades compreendidas entre 8 e 17 anos,
facto que compreensivelmente apela à possibilidade de se retirarem mais conclusões dos
dados obtidos.
Neste mesmo estudo (Fonseca, 1993, pág. 85) concluiu-se que os medos mais
comuns e intensos nas crianças e nos adolescentes portugueses são muito similares com
os mesmos medos referidos pelas crianças dos restantes países. Entre eles estão: medos
de ataques à bomba, de explosões nucleares, tremores de terra, ser atropelado por
camiões ou carros, assalto à casa, apanhar choques elétricos, perder-se num lugar
desconhecido, entre outros. Em comparação com o nosso estudo, os medos mais
intensos e comuns foram: medo de armas, tremores de terra, apanhar choque elétricos,
morte, perder-se num lugar desconhecido, ataques nucleares, terramotos, tirar más
notas, entre outros.
Concluímos assim que os resultados foram semelhantes entre ambos os estudos,
porém é importante ressalvar que a nossa amostra era muito limitada em comparação
com a amostra estudada por Fonseca. Os medos mais comuns que se diferenciaram nos
estudos foram: armas, tirar más notas, referenciados no nosso estudo.
Os medos aqui representados causam-nos alguma confusão, especialmente os
relacionados com terramotos, ataques nucleares, ataques de bomba, já que Portugal não
tem grandes referências acerca de tais acontecimentos ocorridos recentemente. Já
Fonseca (1993, pág. 85) apresenta-nos uma hipótese em relação a estes acontecimentos,
sendo ela o permanente contacto das crianças com os meios de comunicação e com os
adultos. Salientamos que, como foi referido interiormente neste artigo científico, a
forma mais recorrente (cerca de 90%) de desenvolvimento dos medos é realizada
através da transmissão da informação negativa, como a internet, os amigos e até os
próprios progenitores (Sampaio, Martins & Oliveira, s/d, pág. 254).
Relativamente ao nosso estudo, o sexo feminino mostrou um nível significativo
em relação ao nível dos medos mais elevado que no sexo masculino. O sexo feminino
demonstra uma média significativamente mais elevada na variável “medos gerais” 32%
enquanto o sexo masculino apenas uma percentagem de 19%. Apenas na variável “
Medo insucesso” ambos os sexos aproximam-se com uma média aproximadamente de
10%.
Epilogamos então que os nossos resultados vão de encontro aos resultados que
Fonseca (1993, pág. 85) obteve e podemos assim verificar que, apesar da discrepância
entre os anos em que os estudos foram realizados, os medos nas crianças e adolescentes
mantêm-se similares, porém, não é demais ressalvar que a nossa amostra foi limitada,
logo as nossas conclusões nunca poderiam ser muito diferentes.
Conclusão
É de facto muito comum haver uma tendência a considerar o medo uma emoção
negativa e incapacitante, porém esta visão é incorreta uma vez que o medo não é
incapacitante, muito pelo contrário impulsiona-nos a uma ação que tem como objetivo
principal a sobrevivência da pessoa e por conseguinte da espécie.
O medo enquadra-se nas emoções primárias ou inatas, sendo por diversos
autores consideradas universais distinguindo-se das secundárias por estas conjugarem as
primárias com fatores culturais (emergindo assim da socialização do indivíduo). Um
facto que poderá ilustrar que o medo é de facto uma emoção primária é a existência de
crianças selvagens, uma vez que a socialização destas é praticamente inexistente, não
era possível que estas conseguissem sobreviver se o medo fosse uma emoção
secundária.
Salienta-se ainda a importância de verificar que os medos variarem consoante
diversos fatores nomeadamente a idade, género, classe sócio-económica, cultura, entre
outros, porém a maioria dos estudos coloca mais ênfase nas variâncias entre géneros e
idades. Em relação ao primeiro fator embora os indivíduos do sexo masculino tenham
medos semelhantes aos dos indivíduos do sexo masculino, nos últimos fatores, estes
tendem a ter uma maior intensidade. Em relação à idade os jovens atribuem uma maior
importância à componente social (por exemplo serem humilhados em público), e as
crianças revelam medos mais físicos (aleijar-se).
No estudo realizado alguns dos medos mais comuns no estudo realizado foram o
medo de armas; de tremores de terra; de apanhar choque elétricos; de morte; de se
perder num lugar desconhecido; ataques nucleares; terramotos; tirar más notas.
Em relação aos resultados obtidos pelos indivíduos do sexo feminino, em todos os
fatores estudados, apresentam uma média superior à dos indivíduos do sexo masculino,
verificando-se a média mais elevada no facto Medo Geral e a mais próxima a do Medo
do Insucesso.
O facto do Medo do Insucesso ser o segundo maior no grupo de rapazes e o
terceiro no grupo de raparigas revela algo interessante, uma vez que, segundo Papalia e
Olds, (ver data, pág. 321) é a partir dos 12 anos até ao início da adolescência que os
jovens temem aspetos mais autoavaliativos (testes e exames).
O facto de as crianças terem apresentado alguns tipos de medo revela-se de
caracter ambíguo, visto que assinalaram Muito Medo em itens como terramotos, ataques
terroristas e acidentes nucleares, referentes a fenómenos pouco frequentes no nosso país
mas que pode ser facilmente explicado pela sua divulgação constante nos meios de
comunicação social.
"Eu aprendi que a coragem não é a ausência de medo, mas o triunfo sobre ele. O
homem corajoso não é aquele que não sente medo, mas aquele que conquista por cima
do medo." (Nelson Mandela, s/d).
Referências Bibliográficas
Batista, A., Carvalho, M., & Lory, F. (s/d). O medo, a ansiedade e as suas perturbações.
Centro de Aconselhamento para estudantes – Departamento de Psicologia da
Universidade Lusófona, 3-4.
Belzung, C. (2007). Biologia das emoções. Instituto Piaget. 16-42.
Ferreira, B., Borges, P., & Seixas, S. (2010). Os medos na 2.ª infância – conceções e
práticas do educador de infância. Revista Interações (versão online), 15, 29-30.
Fonseca, A. (1993). Medo em crianças e adolescentes: um estudo sobre a população
portuguesa. Revista Portuguesa de Pedagogia, 1, 75-92.
Papalia, D., Olds, S., & Feldman, R. (2009). O mundo da criança – da infância à
adolescência. McGraw Hill: São Paulo. 11.ªedição, 321.
Sampaio, F., Martins, A., & Oliveira, T. (s/d). Medos normais de crianças em contexto
hospitalar segundo o Fear Survey Schedule For Children – Revised, FSSC-R. 254255.
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O medo nas Crianças - Revista Psicologia na Actualidade