1 POLÍTICAS SOCIAIS E SUAS RAÍZES NO MODO DE PRODUÇÃO CAPITALISTA: UMA LEITURA NAS CATEGORIAS DO MATERIALISMO HISTÓRICO-DIALÉTICO Celso Hotz1 - UNIOESTE Introdução O homem, em sua constituição histórica através das relações sociais, tem buscado formas diversas de interpretação da realidade, sendo a ciência o processo mais apurado nesta busca, uma vez que “o que define a ciência como tal é a tentativa de conhecimento da verdade (...) a ciência é um processo de produção do conhecimento da verdade” (LOWY, 1985, p.110). O elemento impulsionador na procura pela verdade está na própria existência humana, na sua sobrevivência com/e na natureza, numa relação intrínseca com esta, o que implica na “[...] possibilidade de dominar a natureza, transformá-la, adaptá-la às suas necessidades” (PINTO, 1969, p.13), e como afirma novamente Pinto (1969), “[...] concomitantemente com o processo de domínio cada vez maior da natureza, o homem se vai criando a si próprio (...) o homem se hominiza ao humanizar, pelo domínio, a natureza” (PINTO, 1969, p.27). No processo da interpretação da realidade, o homem constrói o conhecimento, consistindo a pesquisa científica no “[...] momento culminante (...) de extrema amplitude e complexidade” (PINTO, 1969, p.13) neste processo de entendimento da realidade que o cerca, da natureza e das relações com ela exercidas, historicamente constituídas e formativas do ser humano. Assim, “o conhecimento, que é uma propriedade da matéria viva, atinge a forma máxima de perfeição quando, no homem, se eleva ao plano da ciência. Esta se define como saber metódico” (PINTO, 1969, p.30). Na compreensão dos fenômenos naturais e sociais, “[...] a ciência é a investigação metódica e organizada da realidade, para descobrir a essência dos seres e propriedades das coisas e dos processos naturais em beneficio do homem” (PINTO, 1969, p.30). 1 Mestrando em Educação pela UNIOESTE-Universidade Estadual do Oeste do Paraná e membro do GEPPES-Grupo de Estudos e Pesquisas em Política Educacional e Social. E-mail: [email protected] 2 Assim como os conhecimentos científicos desenvolvidos pelo homem se dão de forma cumulativa, a partir de suas necessidades, também são cumulativos os diferentes métodos utilizados para interpretar a realidade, e “[...] aquilo que em cada época se chama de ‘método’ representa os processos de pensamento e de atuação sobre a realidade que se acha em direta e necessária vinculação com os modos de produção da existência, isto é, dependem do desenvolvimento das forças produtivas que determinado grupo social conseguiu alcançar” (PINTO, 1969, p.39). A totalidade que pressupõe a formação do ser social, construída no contato com a natureza através do trabalho e no contato dos homens entre si, representa a complexidade das relações sociais. Para a apreensão dos vários elementos constituintes da realidade, “O conceito de totalidade assume importância primordial porque, embora o todo se constitua a partir dos elementos, estes só se explicam e se tornam possíveis pela precedência da totalidade, que dá origem a cada novo ato de pesquisa” (PINTO, 1969, p.14). A construção do conhecimento trata-se, pois, de um procedimento de superação da dicotomia entre sujeito e objeto, caracterizada pela superação da lógica formal pela lógica dialética, uma vez que a lógica dialética é a única carregada de contradições e conflitos, estes, inerentes à constituição da materialidade que se encontra em permanente transformação. Materialismo Histórico-Dialético e Políticas Sociais Em suas pesquisas, Marx e Engels buscaram a compreensão da sociedade burguesa, sendo que a partir desta compreensão, fosse possível instrumentalizar teoricamente a classe do proletariado para numa ação revolucionária, superar tal sociedade. Neste processo de interpretação da realidade, foi engendrado o método Materialista Histórico-Dialético. A base material da qual parte a teoria de análise social de Marx e Engels, é por eles apontada quando escrevem que “[...] nossas premissas são os indivíduos reais, a sua ação e as suas condições materiais de existência, quer se trate daquelas que encontrou já 3 elaboradas quando do seu aparecimento quer das que ele próprio criou. Estas bases são portanto verificáveis por vias puramente empíricas” (MARX e ENGELS, 1982, p.18). E em nenhum momento, os pressupostos do método Materialista HistóricoDialético elaborado por Marx e Engels distanciam-se da materialidade, pois “parte das premissas reais e não as abandona um único instante. Estas premissas são os homens, não isolados nem fixos de uma qualquer forma imaginária, mas apreendidos no seu processo de desenvolvimento real em condições determinadas, desenvolvimento este que é visível empiricamente” (MARX e ENGELS, 1982, p.26). O aspecto histórico também é inerente ao método Materialista HistóricoDialético, para o qual a ciência constitui-se na “ciência da história”. Desta forma, “Apenas conhecemos uma ciência, a da história. (...) podemos dividi-la em história da natureza e história dos homens. Porém, estes dois aspectos não são separáveis; enquanto existirem homens, a sua história e a da natureza condicionar-se-ão reciprocamente” (MARX e ENGELS, 1982, p.18). Enquanto método que agrega e explora os componentes conflituosos da sociedade capitalista, o Materialismo Histórico-Dialético aponta possibilidades de transformá-la, através das lutas de classes, pois “[...] é a partir da luta de classes que se dão as condições mais favoráveis para um conhecimento científico da realidade, da verdade” (LOWY, 1985, p.110). As categorias da dialética, historicidade e totalidade como algumas das categorias presentes no método Materialista Histórico-Dialético, estão constituídas na realidade concreta, estando presentes, portanto, nos fenômenos sociais, sendo um destes fenômenos as políticas sociais, que na sua existência são permeadas pelas três categorias citadas, inerentes ao Materialismo Histórico-Dialético. Desta forma, ao analisar as políticas sociais a partir do método Materialista Histórico-Dialético, este pode “[...] revelar a política social como parte da estratégia da classe dominante, mais adequadamente da burguesia. Pode mostrar que esta estratégia busca o controle do fluxo de força de trabalho no sistema de posições desiguais, existente na economia de mercado” (VIEIRA, 1992, p.30). Não obstante, tais proposições se justificam, “[...] em análise onde o Estado seja meio e fim, ao representar uma classe social; em análise onde a teoria e a prática sejam 4 aspectos da mesma realidade; em análise onde a história seja dotada de sentido imanente, com possibilidade de evolução e de involução” (VIEIRA, 1992, p.31). Trata-se, pois, de estudar as políticas sociais a partir da materialidade que a engendra, e como tal, passível de contradições e em permanente transformação, com elementos conflituosos presentes desde sua elaboração – nos embates e conflitos que as constituem – até sua implementação através de projetos, programas e estratégias governamentais. Assim, as políticas sociais representam “[...] respostas do Estado burguês do período do capitalismo monopolista a demandas postas no movimento social por classes (ou estratos de classes) vulnerabilizados pela ‘questão social’ (NETTO, 2003, p.15), o que indica, portanto, que as políticas sociais constituem-se em “campos de tensões” (NETTO, 2003, p.16) entre os interesses do proletariado e a burguesia. O modo de produção existente, a partir do qual o homem produz os meios de sobrevivência, é engendrado historicamente a partir das próprias necessidades humanas, e sintetizado, de certa forma, na ciência, somente possível de existência porque “a primeira condição de toda história humana é evidentemente a existência de seres humanos vivos” (MARX e ENGELS, p.18). Historicamente, desde o modo primitivo de produção até a constituição da grande indústria, o homem foi produzindo novas necessidades para sua subsistência, num processo de humanização, o que pressupõe o segundo aspecto da atividade social, qual seja: “[...] uma vez satisfeita a primeira necessidade, a ação de a satisfazer e o instrumento utilizado para tal conduzem a novas necessidades” (MARX e ENGELS, p.34). Estas novas necessidades de sobrevivência humana transformaram-se ao longo da história na força motriz do avanço das forças produtivas, como condição para suprir tais necessidades. Porém, a divisão do trabalho e sua exploração, a concentração dos meios de produção e a propriedade privada, trouxeram como conseqüências diretas a alienação do homem ao trabalho. As políticas sociais vão surgir como uma necessidade do capital, e engendramse, sobretudo, a partir da intensificação do trabalho nas indústrias, pelo avanço das forças produtivas e do modo de produção capitalista, no domínio da cidade sobre o campo (MARX e ENGELS, 1982), acarretando o aumento da população urbana pelas 5 concentrações das indústrias, e “Trata-se do período histórico em que ao capitalismo concorrencial sucede o capitalismo dos monopólios” (NETTO, 1996, p.15). Assim, o advento do capitalismo monopolista “[...] recoloca, em patamar mais alto, o sistema totalizante de contradições que confere à ordem burguesa os seus traços basilares de exploração, alienação e transitoriedade histórica, todos eles desvelados pela crítica marxiana” (NETTO, 1996, p.15). Nesta direção, as análises sobre o desenvolvimento do capitalismo e de suas conseqüências nas relações sociais nos auxiliam no estudo e compreensão das políticas sociais. Uma das contradições inerentes à fase monopolista do capitalismo é que ao mesmo tempo em que aumenta significativamente a produção de mercadorias, pauperiza as condições de sobrevivência, inclusive por meio da intensificação e exploração do trabalho, sendo a acumulação do excedente produzido, o maior impeditivo da socialização da produção. A possibilidade de socialização dos bens produzidos é impedida pelas bases ainda mantidas de sua fase concorrencial, ou seja, a exploração e alienação do trabalho, que se tornam mais complexas na fase monopolista do capitalismo, representando um elemento contraditório no seu desenvolvimento. A contradição no capitalismo se torna mais evidente em sua fase monopolista, uma vez que O processo de acumulação do capital impõe à indústria a necessidade de alargar o mercado e de aumentar o consumo, mas o resguardo e o incremento da rentabilidade do capital já investido exigem de quando em quando limitações de caráter monopolizador, entravando o próprio mercado e tolhendo as novas possibilidades de sua expansão. O abaixamento do nível de vida da população garante ao mesmo tempo uma taxa média de lucro e também a redução do mercado imprescindível à produção (NETTO, 1996, p.25). E em relação às condições de vida do proletariado, estas têm variado de acordo com o avanço da industrialização, que [...] não atinge o mesmo grau de aperfeiçoamento em todas as aglomerações de um mesmo país. Mas este fato não trava o movimento de classe do proletariado, na medida em que os proletários engendrados pela grande indústria se colocam à cabeça desse movimento e arrastam consigo as massas, até porque os trabalhadores excluídos da grande indústria se encontram colocados numa 6 situação ainda pior do que a dos próprios trabalhadores da grande indústria (MARX e ENGELS, 1982, p.75). Ao mesmo tempo em que inclui proletários num contingente formativo de enorme força de trabalho, o modo de produção exclui outra grande quantidade de pessoas, que apesar de não disporem de empregos e salários, continuam fazendo parte da sociedade capitalista, tendo inclusive as políticas sociais como garantidoras do consumo, ao fornecer mínimos aos trabalhadores incluídos ou não no mercado de trabalho. A intensificação da exploração do trabalho em grande escala nas indústrias e a concentração urbana proporciona a constituição das políticas sociais “[...] a partir das mobilizações operárias sucedidas ao longo das primeiras revoluções industriais. A política social, compreendida como estratégia governamental de intervenção nas relações sociais, unicamente pôde existir com o surgimento dos movimentos populares do século XIX” (VIEIRA, 1992, p.19). Os primeiros movimentos populares se deram nas lutas das classes trabalhadoras por melhores condições de trabalho, nos países onde a Revolução Industrial trouxe a intensificação do trabalho em massa, principalmente na Inglaterra, França, Alemanha e Estados Unidos, sendo que “Na Inglaterra do século XVIII a meados do século XIX, a Revolução Industrial traz como conseqüências a urbanização exacerbada, o crescimento da taxa de nascimentos, a mutação na consciência política e social, as primeiras medidas de política social” (VIEIRA, 1992, p.19). Assim, neste processo histórico da mudança estrutural do capitalismo, “a transição ao capitalismo dos monopólios realizou-se paralelamente a um salto organizativo nas lutas do proletariado e do conjunto dos trabalhadores” (NETTO, 1996, p.23). Partindo dos embates e conflitos advindos do modo de produção, as políticas sociais representam reivindicações da classe proletária, e tem no Estado, o seu principal implementador, ao passo que Não tem havido, pois, política social desligada dos reclamos populares. Em geral, o Estado acaba assumindo alguns destes reclamos, ao longo de sua existência histórica. Os direitos sociais significam antes de mais nada a consagração jurídica de reivindicações dos trabalhadores. Não significam a 7 consagração de todas as reivindicações populares, e sim a consagração daquilo que é aceitável para o grupo dirigente do momento (VIEIRA, 1992, p.23). O Estado assume no capitalismo monopolista, no que tange às políticas sociais, o papel de “conciliador” entre os interesses dos burgueses e proletários, pois como afirmam Marx e Engels, “[...] o combate prático destes interesses particulares, que se chocam constante e realmente com os interesses coletivos e ilusoriamente coletivos, torna necessário a intervenção prática e o refreamento através do interesse ‘universal’ ilusório sob a forma de Estado” (MARX e ENGELS, 1982, p.40). Na transição do capitalismo concorrencial para o capitalismo monopolista, o Estado desempenha, através das políticas sociais “[...] a preservação e o controle contínuos da força de trabalho, ocupada e excedente” (NETTO, 1996, p.22), além de funcionar como um mecanismo de intervenção extra-econômico, garantindo concomitante ao capital a “[...] maximização dos lucros pelo controle dos mercados” (NETTO, 1996, p.22). As reivindicações por melhores condições de trabalho e de vida, incluindo saúde, habitação, educação, saneamento, alimentação, transporte e outros, tem como atores principais no jogo de interesses a burguesia e o proletariado, pois constituem as duas classes em constante conflito na sociedade capitalista, apesar do Estado desempenhar uma relação de mediação entre os interesses de ambas as classes, obscurecendo muitas vezes este conflito. As políticas sociais representam uma alternativa ao não suprimento das necessidades básicas numa sociedade burguesa, fornecendo elementos possíveis à libertação do proletariado, inclusive por meio de uma revolução, pois “[...] não é possível libertar os homens enquanto eles não estiverem completamente aptos a fornecerem-se de comida e bebida, a satisfazerem as suas necessidades de alojamento e vestuário em qualidade e quantidade perfeitas” (MARX e ENGELS, 1982, p.28). Por outro lado, as políticas sociais representam “concessões” conquistadas nos embates entre as classes da sociedade capitalista, evidenciando um elemento contraditório, pois ao fornecerem condições mínimas de sobrevivência, sintetizam-se também como o limite de conquistas numa sociedade burguesa, o que não indica em momento algum, alterações estruturais desta sociedade, servindo à manutenção do 8 trabalho vivo e do consumo, essenciais para a continuidade do ciclo do funcionamento do capitalismo. A partir deste pressuposto, as políticas sociais reproduzem a sociedade burguesa, assim como as duas classes principais que a compõem, de maneira que “[...] a personalidade do proletário em particular e as condições de vida que lhe são impostas, quer dizer, o trabalho, é lhes perfeitamente perceptível tanto mais que tem sido sacrificado desde a sua mais tenra juventude e não poderá alcançar, dentro da sua classe, as condições que lhe permitiriam passar para outra classe” (MARX e ENGELS, 1982, p.82). Assim, da mesma forma que as políticas sociais permitem, no limite da sociedade burguesa, as condições mínimas e necessárias de sobrevivência para inclusive uma possível revolução proletária, por outro lado, reforçam a condição de exploração a que os proletários estão susceptíveis dentro desta mesma sociedade. Não obstante, a solução para este impasse está para os proletários, em “[...] derrubar esse Estado para realizar a sua personalidade” (MARX e ENGELS, 1982, p.83). A derrubada da sociedade burguesa somente é possível, segundo Marx e Engels, pela derrubada do Estado que a alimenta, da mesma forma com que a derrocada do capitalismo encerraria a necessidade das políticas sociais, numa outra sociedade em que os bens produzidos poderiam ser totalmente socializados. A superação das políticas sociais é desta forma, a superação do sistema social promotor da necessidade de sua existência, ou seja, do capitalismo. Nesta lógica, são as políticas sociais integrantes da totalidade que constitui a sociedade capitalista em que vivemos, e segundo Vieira, [...] Não se pode analisar a política social sem se remeter à questão do desenvolvimento econômico, ou seja, à transformação quantitativa e qualitativa das relações econômicas, decorrente de processo de acumulação particular de capital. O contrário também precisa ser observado: não se pode examinar a política econômica sem se deter na política social (VIEIRA, 1992, p.21). Porém, o autor ressalta que “A totalidade, (...) é sempre relativa, embora possa figurar em certo momento como totalidade autônoma, destinada a servir de campo para uma investigação” (VIEIRA, 1992, p.21). 9 A totalidade, se analisada dialeticamente, é sempre contraditória e em permanente transformação, “[...] e somente a partir da compreensão lógica oferecida por esta categoria se chegará a criar a teoria que explica em todos os aspectos a atividade investigadora do mundo” (PINTO, 1969, p.14). E como nos indica novamente Pinto, O pensamento dialético explica-nos que não existe começo absoluto no tempo, não tem sentido perguntar pelo que logicamente vem primeiro, se o todo ou a parte, mas apenas indagar qual dessas categorias, na análise epistemológica, e sob que ângulo particular, tem a primazia. Não se pode falar de ‘começo absoluto’, mas apenas de processo indefinido, sem início assinalável (PINTO, 1969, p.15). Neste aspecto, têm as políticas sociais estreitas ligações com o processo do desenvolvimento do capitalismo, e consequentemente, na constituição das relações sociais. Tanto as revoluções industriais como as políticas sociais fazem parte de uma totalidade, ligadas à evolução processual do capitalismo. Ao afirmamos a origem das políticas sociais a partir do modo de produção capitalista, entendemos que ambos (as políticas sociais e o modo de produção) são fenômenos historicamente construídos, e que apesar de aparentemente resultarem de saltos qualitativos desligados de fatores precedentes, foram construídos na complexidade das relações sociais, em contato com a natureza (modo de produção) e entre si, a partir do modo de produção (relações sociais). Desta forma, as políticas sociais nascem do modo de produção capitalista, e representam somente a distribuição de parte desta produção, conquista ao proletariado por meio de embates e lutas contínuas contra a burguesia. E como o pressuposto inicial o homem precisa manter-se vivo, as políticas sociais servem também a este objetivo, mas dentro da lógica capitalista, onde o mínimo é oferecido, e o máximo representaria a superação da exploração do trabalho e da acumulação, ou seja, representaria a superação do próprio capitalismo. Nesta direção, podemos perceber que o avanço das políticas sociais está relacionado também ao avanço das forças produtivas capitalistas, pois o modo de produção capitalista evolui na sua capacidade de exploração do trabalho. Assim, “[...] desenvolvimento capitalista é produção expansiva de valores, mas é, necessária e 10 simultaneamente, produção expansiva de pauperização relativa ou de pauperização relativa e absoluta” (NETTO, 2003, p.25). E apesar da atividade social ser constituída pela totalidade, “A produção real da vida surge na origem da história, mas aquilo que é propriamente histórico surge separado da vida ordinária, como extra e supraterrestre” (MARX e ENGELS, 1982, p.50). Por outro lado, o entendimento das políticas sociais como autônomas do econômico, favorece o desprendimento da totalidade que a constituem, “descolando-as” de sua base real, ou seja, do modo de produção da qual é constituinte desde sua origem. Da mesma forma, as políticas sociais não podem ser compreendidas fora das relações sociais, uma vez que representam a contradição entre capital e trabalho numa sociedade capitalista. Assim, a visão materialista da história dos homens trás, portanto, “[...] concretamente a produção material da vida imediata; concebe a forma das relações humanas ligada a este modo de produção e por ele engendrada” (MARX e ENGELS, 1982, p.48). Algumas considerações finais A análise das políticas sociais a partir das categorias da historicidade, contradição e totalidade, todas inerentes ao método Materialista Histórico Dialético, nos ajuda a compreender a materialidade na qual elas se constituem, constituindo-se as políticas sociais como produto do desenvolvimento do modo capitalista de produção. A existência das políticas sociais é, portanto, uma necessidade engendrada no capitalismo, tendo o capital, o Estado e o trabalho como os principais elementos desde sua gênese até sua implementação. As políticas sociais surgem no capitalismo monopolista, onde a figura do Estado vai se constituindo como imprescindível à manutenção do capitalismo, inclusive fazendo uso estratégico das políticas sociais para a reprodução da força de trabalho e para o consumo. Os embates e conflitos inerentes ao modo de produção capitalista são evidenciados nas reivindicações do proletariado, que ao conquistarem certos direitos no âmbito jurídico-político a partir destas reivindicações, conseguem certos mínimos para 11 sua sobrevivência, incorporando avanços relativos em relação ao capitalismo, o que pode representar forças necessárias ao proletariado, em suas lutas cotidianas contra a exploração capitalista. Porém, como vimos anteriormente neste trabalho, ao mesmo tempo em que as políticas sociais incorporam conquistas à vida do proletariado, elas também funcionam como refluxo na luta contra o capitalismo, uma vez que não alteram a base de exploração e alienação do trabalho, sendo resultado da relação capital/trabalho. Não obstante, as categorias de historicidade, contradição e totalidade (dentre outras) inerentes ao método Materialista Histórico Dialético, podem servir na compreensão dos determinantes formadores das políticas sociais. O processo histórico da interação do homem com a natureza, e concomitantemente das relações entre os homens, deu origem às possibilidades de resolver problemas para a própria manutenção da vida humana, mas por outro lado, trouxe outros problemas como a exploração do homem pelo homem, a concentração de riqueza, a miséria, etc. Neste aspecto, as políticas sociais vão surgir a partir das contradições inerentes ao capitalismo, sobretudo na sua fase monopolista, que trouxe complexidades agregadas à constituição das relações sociais a partir do período do seu surgimento. Representando hoje um elemento de manutenção da força viva de trabalho e de manutenção da dinâmica do capitalismo, as políticas sociais também representam certas conquistas da classe do proletariado, tendo no Estado, o elemento de mediação de interesses burgueses e proletários. Mas como as categorias da historicidade, contradição e totalidade nos ajudam a compreender a gênese das políticas sociais a partir do processo histórico do desenvolvimento capitalista, e das alterações imbricadas por ele nas relações sociais, também apontam para possibilidades que as políticas sociais podem trazer para a classe trabalhadora, uma vez que sintetiza o grau de organização do proletariado para conquistas relativas em relação ao capital, o que pode representar um pressuposto para a luta contra o modo de produção excludente capitalista. 12 Referências Bibliográficas LOWY, Michel. Ideologias e ciências sociais: elementos para uma análise marxista. São Paulo, SP: Cortez, 1985. MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. A Ideologia Alemã. Volume I. Brasil: Livraria Martins Fontes, 1982. NETTO, José Paulo. Capitalismo monopolista e serviço social. 2 ed. São Paulo: Cortez, 1996. NETTO, José Paulo. O Materialismo Histórico como instrumento de análise das políticas sociais. In: NOGUEIRA, F. M. G. e RIZZOTTO, Maria Lucia Frizon (orgs.). Estado e Políticas Sociais: Brasil - Paraná. Cascavel: Edunioeste, 2003. PINTO, Álvaro Vieira. Ciência e Existência. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1969. PIRES, Marília Feitas de Campos. O materialismo histórico-dialético e a Educação in: Revista Interface - Comunicação, Saúde, Educação. Vol. 1. VIEIRA, Evaldo. Democracia e política social. São Paulo: Cortez: Autores Associados, 1992.