X Semana de Extensão, Pesquisa e Pós-graduação - SEPesq
Centro Universitário Ritter dos Reis
A PRIVACIDADE DO PACIENTE E O ELEMENTO RESPONSABILIDADE NA
FORMAÇÃO MÉDICA.
Leonardo Stoll de Morais
Mestrando pelo PPG em Direitos Humanos e Direitos Fundamentais
Centro Universitário Ritter dos Reis
<[email protected]>
Vinícius Ayub Dargél
Graduando em Medicina
PUCRS/ University of Westminster
< [email protected]>
Juliana Tremper Ribeiro
Graduanda em Direito
Centro Universitário Ritter dos Reis
<[email protected]>
Márcia Santana Fernandes
Pós-doutora em Bioética pelo PPG em Medicina UFRGS, Doutora pelo PPG em Direito
UFRGS.
Centro Universitário Ritter dos Reis
<[email protected]>
José Roberto Goldim
Doutor em Bioética pelo Programa PPG em Medicina UFRGS, Mestre em Educação pelo
PPG em Educação UFRGS. Biólogo graduado pela UFRGS.
UFRGS/PUCRS
<[email protected]>
Resumo: A vinculação de imagens de procedimentos médicos em áreas restritas da atuação
profissional acarreta uma contínua reflexão ética e jurídica. Considerando a publicização de
imagens nesse contexto, dois pontos merecem atenção especial: (1) a proteção do Direito à
privacidade do paciente; (2) a responsabilidade ética e jurídica do profissional da área da saúde
em formação. Objetivo: o presente artigo visa refletir se o Direito à privacidade do paciente tem
sido assegurado durante a formação de profissionais da área da saúde. Método: Utilizou-se o
método quantitativo de Revisão Sistemática de imagens publicadas no canal de rede Instagram.
Resultados e Discussão: Localizou-se na rede social o número de 1.574 imagens públicas
(soma de todas as imagens com diferentes descritores). Das 1574 imagens localizadas, 313
imagens publicadas violam a privacidade do paciente. Considerações Finais: O profissional e o
acadêmico em formação da área da saúde devem considerar que o exercício ético de sua
profissão pressupõe o dever de confidencialidade. Informes à população sobre a disponibilização
de novos procedimentos, com fins científicos e educacionais são permitidos desde que
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SEPesq – 20 a 24 de outubro de 2014
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reconhecidos pelo CFM, e divulgados dentro dos critérios jurídicos. Logo ações não justificáveis
que expõem o paciente a terceiros devem ser evitadas.
Introdução
O episódio de violação à privacidade de um menor de idade durante a realização de
um procedimento cirúrgico de amputação de membro superior dentro do Hospital
Universitário no Estado do Paraná fez emergir ao grande público a discussão acerca da
preservação da privacidade do paciente e o elemento responsabilidade na formação
médica.
A discussão envolvendo violação à privacidade e responsabilidade na atuação
profissional não é restrita a este caso específico, tendo em vista que a sociedade vive, hoje,
como aponta Debord, em um contínuo espetáculo, dando prevalência às relações sociais
mediadas por imagens.
De fato, a sociedade passou a valorizar o compartilhamento da sua própria dimensão
existencial por meio da prática de publicação de imagens privadas. Este fato social exige
uma contínua reflexão sobre a proteção da esfera privada dos pacientes, ganhando
destaque especial o Direito da personalidade voltado à proteção da privacidade.
Aproximando-se do plano, o presente artigo tem por objetivo, refletir se o Direito à
privacidade do paciente tem sido assegurado na atuação médica. Para tanto, realiza-se
uma pesquisa quantitativa de imagens publicadas na rede social Istagram com descritores
utilizados por profissionais da área da saúde (Parte I) para avaliar, em seguimento, (Parte II)
os aspectos éticos e jurídicos relativos ao Direito à privacidade do paciente e ao elemento
responsabilidade no processo de formação médica.
I. AS REDES SOCIAIS E AS INFORMAÇÕES CONFIDENCIAIS DIVULGADAS
A pesquisa realizada é composta por um estudo de revisão sistemática de imagens
com natureza descritiva, a partir de uma estratégia de pesquisa predominantemente
quantitativa.
O enfoque dado à revisão de imagens neste artigo é justificado por três aspectos
centrais: (1) O primeiro aspecto refere-se ao impacto que as imagens publicadas na rede
social possuem, isto é, as imagens publicadas constituem um registro público das ações
temporais e dos acontecimentos reais – acontecimentos concretos e materiais; (2) O
segundo aspecto diz respeito ao conteúdo dos resultados divulgados. Os dados primários
foram descritos a partir da revisão sistemática, sendo compostos pela soma de cada dado
visual, de forma a possibilitar a observação da freqüência de cada imagem divulgada; (3) O
terceiro aspecto está relacionado ao contexto da pesquisa empírica no atual estado da arte
envolvendo privacidade e dados confidenciais divulgados. A pesquisa é realizada em razão
da crescente influência dos meios de comunicação, e parte de duas considerações: vivemos
na sociedade do espetáculo de Debord, e a imagem, nessa sociedade, desempenha papel
importante na vida social, sendo ela, como aponta Durkheim, um fato social.
Objetiva-se na primeira parte deste artigo esclarecer os aspectos metodológicos
utilizados para o desenvolvimento da pesquisa, bem como divulgar os resultados do estudo
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contidos no banco de dados, a fim de problematizá-los. Divide-se a primeira parte em dois
pontos centrais: A) O Banco de dados e seus descritores: aspectos metodológicos; B)
Análise dos resultados obtidos por meio de associação de palavras e os problemas
relacionados.
A) O Banco de dados e seus descritores: Aspectos metodológicos
O Istagram é uma rede social gratuita que tem por objetivo a publicação de imagens
e vídeos de usuários que possuem aparelho celulares com o software: SO Android, iOS ou
Windows Phone. Neste aplicativo a busca realizada com os descritores pr ecedeu o símbolo
#.
Utilizou-se o método de Revisão Sistemática de imagens publicadas no canal de rede
Instagram, com os seguintes descritores: “#blococirurgico”, “#blococirúrgico”, “#utineo”,
“#utineonatal”, “#utiped”, “#utipediatrica”, “#utipediátrica”.
Os dados foram avaliados de modo quantitativo, a partir dos três polos cronológicos:
a pré-análise; a exploração do material; o tratamento dos resultados, com a ilustração da
freqüência e da interpretação.
A pré-análise é a fase de organização propriamente dita, sendo classificada a partir
de três fatores iniciais: a escolha dos documentos submetidos à análise, a formulação das
hipóteses e dos objetivos.
Na escolha dos documentos procedeu-se à localização das imagens na rede social
do Instagram. As imagens foram localizadas com os sete descritores acima identificados,
sendo a amostra inicial de 4765 (100%) imagens publicadas.
A partir do número expressivo da amostra inicial, formulou-se a hipótese: acredita-se
que as informações publicizadas e disponíveis na rede social do instagram relativas ao
ambiente de formação médica violam a privacidade do paciente e o dever de
confidencialidade.
Na fase de exploração do material, distinguiu-se o número de cada descritor,
localizando-se os seguintes números: “#blococirurgico” 924 imagens, “#blococirúrgico” 354
imagens, “#utineo” 1497 imagens, “#utineonatal” 1030 imagens, “#utiped” 539 imagens,
“#utipediatrica” 309 imagens, “#utipediátrica” 112 imagens.
Os números localizados foram analisados pela regra de pertinência, isto é a análise
dos dados deve ser adequada enquanto a informação é pública e está disponível na rede,
de modo que o acesso a esta informação corresponde ao objetivo que suscita este estudo.
B) Análise dos resultados obtidos por meio de associação de palavras e os
problemas relacionados
Os dados obtidos indicam que a maioria das imagens publicadas, em qualquer dos
descritores utilizados, tem acesso restrito. Isto não elimina a questão da publicização,
apenas restringe o acesso a menos pessoas, sem garantir que a privacidade das pessoas
envolvidas seja de fato preservada (Tabela 1).
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Tabela 1: Números e frequências relativas das imagens classificadas de acordo com os
descritores.
Resultados
Descritor
#blococirurgico
#blococirúrgico
#utineo
#utineonatal
#utiped
#utipediatrica
#utipediátrica
TOTAL
Imagens
publicadas
N(fr)
Imagens com
restrição de
acesso
N(fr)
924 (19,3%)
354 (7,4%)
1497 (31,4%)
1030 (21,6%)
539 (11,3%)
309 (6,4%)
112 (2,3%)
4765 (100%)
594 (18,6%)
225 (7,0%)
1077 (33,7%)
615 (19,2%)
369 (11,5%)
220 (6,8%)
91 (2,8)
3191 (100%)
Imagens públicas Imagens públicas
N(fr)
que violam a
privacidade do
paciente
N(fr)
330 (20,9%)
9 (2,8%)
129 (8,19%)
81 (25,8%)
420 (26,6%)
99 (31,6%)
415 (26,3)
69 (22,0%)
170 (10,8%)
40 (12,7%)
89 (5,6%)
13 (4,1%)
21 (1,3 )
2 (0,36%)
1574 (100%)
313 (100%)
Fonte: Elaborado pelos autores, com base na pesquisa realizada.
Para identificação das imagens públicas que violam a privacidade do paciente foram
considerados os seguintes critérios de análise: (1) a imagem foi retirada por profissional ou
acadêmico, identificado por estar utilizando roupa específica de bloco cirúrgico ou roupa
hospitalar com identificação institucional; (2) a imagem expôs o paciente em momento de
inconsciência; (3) a imagem expôs tecidos e órgãos do paciente em momento de
inconsciência; (4) a imagem expôs menor de idade em momento de inconsciência durante
tratamento médico; (5) a imagem expôs o ato médico envolvendo paciente em ambiente
restrito aos profissionais atuantes.
A partir dos dados obtidos, classificaram-se em quatro os problemas éticos e
jurídicos: (1) o uso da rede social altera a forma de atuação dos profissionais da saúde,
transformando o padrão cultural e ético de tal profissional; (2) as imagens dos pacientes
divulgadas por profissionais da área da saúde expõem um momento privado e confidencial;
(3) os acadêmicos em formação médica devem ser orientados pelos professores
responsáveis a agir visando o melhor interesse dos pacientes e sempre considerando o
dever de confidencialidade na atuação; (4) Os dados pessoais do paciente não devem cair
em domínio público, devendo o profissional da área da saúde exercer controle do ambiente
restrito em que acontece o procedimento privado, evitando à vinculação desses dados em
canais de rede de acesso universal, i.e, a internet.
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II. ASPECTOS ÉTICOS E LEGAIS ENVOLVENDO OS DADOS OBTIDOS
Os dados obtidos evidenciam uma prática social de publicização de imagens em
momentos privados e restritos da atuação médica. O uso do aplicativo Instagram como rede
social que estabelece a interface usuário e compartilhamento de imagens, aponta novos
rumos e reflete uma série de problemas éticos e jurídicos.
Objetiva-se, na segunda parte deste artigo, abordar os aspectos éticos e jurídicos
envolvendo os dados obtidos na primeira fase da pesquisa. Divide-se, assim, a segunda
parte em dois pontos centrais: A) A sociedade do espetáculo e o Direito à privacidade; B) A
importância ética e jurídica do elemento responsabilidade na formação médica
A) A sociedade do espetáculo e o Direito à privacidade
Guy Debord, filósofo francês criador do conceito “sociedade do espetáculo”, definiu o
espetáculo como o conjunto das relações sociais mediadas pelas imagens. A produção de
imagens, a valorização da dimensão visual da comunicação como instrumento de exercício
de poder, existe, conforme aponta Debord, em todas as sociedades onde há classes sociais
que valorizam as imagens.
O papel desempenhado, hoje, pelas redes sociais, em especial pelo Instagram,
aplicativo que acumula imagens de momentos privados da população, ilustra perfeitamente
o que Debord escreve sobre as relações interpessoais: tudo está mercantilizado e envolvido
por imagens. Além, de qualificar as relações interpessoais, Debord reflete sobre o motivo
pelo qual temos resultado obtido na pesquisa de revisão: vivemos a época do ser visto, e
deixamos de apenas ser.
Em tempos de ser visto, e de simular a realidade os protagonistas do espetáculo
(usuários das redes sociais) esquecem-se das conseqüências éticas e jurídicas ao
publicarem imagens de terceiros em momentos privados.
Na sociedade do espetáculo, os acadêmicos em formação e os profissionais da área
médica perdem, em decorrência da publicação de imagens de pacientes, qualificação ética,
associada à profissão, perdem humanidade na relação médico-paciente, e perdem noções
de privacidade.
Considerando-se esse cenário de desafios, pode-se justificar a partir do
enquadramento filosófico de Debord, a prática comum de publicização de imagens em
redes sociais. Entretanto, independentemente da concepção de sociedade adotada, cabe
ao Direito ordenar esta sociedade.
Judith Martins-Costa classifica o Direito como “ordenamento” justamente por ter o
Direito função típica de “por ordem” (re-arrumar o caos, o vazio), cabendo a ele concretizar
a ordenação da sociedade, primeiramente, por meio de textos normativos que resultam em
normas jurídicas.
Em matéria de Direitos de proteção à privacidade, a CRFB/88, em seu artigo 5º,
inciso X, determina a inviolabilidade do Direito à integridade, à privacidade da vida, à honra
e à imagem. O Legislador optou por dar maior densidade ao conteúdo do inciso X do artigo
5º, com a Lei Ordinária 10.406/2002 – Código Civil Brasileiro (CCB), optando por adotar
normas com natureza de cláusulas gerais, à modelo do artigo 21.
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O Código Civil determina, no artigo 21, ser a vida privada da pessoa inviolável, e o
juiz, a requerimento da parte, deverá adotar as providências necessárias para impedir ou
fazer cessar ato contrário a esta norma.
A norma, conforme leciona Miguel Reale, é uma cristalização do fato + valor, mas o
Direito parte, primordialmente, das normas. Isto porque as normas devem promover uma
justiça geral, para haver segurança jurídica. Desta forma, a regra constitucional que dispõe
sobre a inviolabilidade da privacidade desempenha um importante papel de estabilizar
conflitos morais, reduzir incertezas e arbitrariedade decorrente de um ato ilícito de terceiro.
O arcabouço normativo em matéria de proteção à privacidade do paciente e dever
ético de confidencialidade, por parte do acadêmico em formação médica e por parte do
profissional da área da saúde, está posto, a fim, justamente, de evitar condutas
inadequadas como aquelas relativas às 313 imagens públicas na rede social Instagram.
O legislador fez uma escolha ao dispor sobre os Direitos da personalidade, no Livro I,
da parte geral, do CCB. Esta escolha demonstra a prevalência do princípio da dignidade
humana sobre os demais Direitos relativos às coisas e ao patrimônio.
O princípio da dignidade humana, no Direito Civil, abre um importante caminho à
prevalência da dimensão existencial da pessoa sobre a patrimonial, isto é, de uma
perspectiva patrimonialista e instrumentalizadora de pessoa, considerada como mero sujeito
titular de um patrimônio ou sujeito dotado de capacidade jurídica, para uma perspectiva de
reconhecimento da pessoa humana como valor fonte de sua irredutível subjetividade e
dignidade.
A pessoa humana como valor fonte é uma concepção axiológica de Reale, em que o
ser do homem é o seu dever ser. Reale esclarece que essa concepção situa-se na ideia do
homem como ente que, a um só tempo é e deve ser tendo consciência de sua dignidade.
Na perspectiva de Reale, o homem representa um acréscimo à natureza, através de
sua capacidade de síntese, tanto no ato instaurador de novos objetos do conhecimento,
como no ato constitutivo de normas de vida. No centro da concepção axiológica de pessoa
como valor fonte é que nasce a ideia de pessoa não pelo fato de existir, mas pelo
significado ou sentido da existência.
O CCB dedica o Livro Primeiro de sua Parte Geral à disciplina das pessoas humanas
e determina ser inviolável o direito à privacidade na cláusula geral de nº 21. Já, o
constituinte brasileiro, adotou à inviolabilidade ao Direito à privacidade como a regra
constitucional (artigo 5º, inciso X). Ocorre que a regra constitucional possui força cogente e
aplica-se com eficácia plena para os profissionais da área da saúde e aos acadêmicos em
formação médica.
Logo, desconsiderar a privacidade do paciente, para promoção pessoal e
mercantilização de serviços públicos, por meio de publicações de imagens, é
instrumentalizar ato, que por natureza é existencial. Tal prática deve ser afastada da
sociedade, tendo em vista que os profissionais da área da saúde e os acadêmicos em
formação médica possuem um importante papel na assistência e manutenção da vida
humana.
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B) A importância ética e jurídica do elemento responsabilidade na formação médica
Do ponto de vista ético da Educação Médica, são três os documentos de relevância:
as Diretrizes Curriculares para os Cursos de Medicina do Ministério da Educação (MEC); os
documentos de base do Programa de Incentivo às Reformas Curriculares (Promed) do
Ministério da Saúde (MS); e o Código de Ética Médica do CFM (CFM).
Tais documentos possuem natureza de norma administrativa, sem força legal de
prescrição, assim, atuam como diretrizes que apenas vinculam seus destinatários –
médicos, acadêmicos e educadores da formação médica.
Os três documentos evidenciam uma preocupação sobre a conduta ética do
profissional da área da saúde, na medida em que estabelecem normas com fins de formar
profissionais com postura ética, visão humanística, senso de responsabilidade social e
compromisso com a cidadania.
Os documentos de base do Programa de Incentivo às Reformas Curriculares do (MS)
e as Diretrizes Curriculares para os Cursos de Medicina do Ministério da Educação (MEC),
traçam normas de condutas, a fim de orientar a educação do acadêmico em formação
médica. Dentre as normas, os documentos destacam que o futuro profissional deve ser
humanista, crítico e reflexivo, devendo sua formação ser pautada em princípios éticos e
bioéticos, agindo, assim, o futuro profissional da saúde com senso de responsabilidade.
Em relação ao Código de Ética Médica (CEM) do CFM, este estabelece regras para
coibir a publicidade desmedida e sem critérios éticos (capítulo XIII do CEM). O Conselho
optou por conceituar como eticamente inadequadas condutas que visem à autopromoção e
o sensacionalismo.
Considerando os documentos que determinam as condutas éticas tanto dos
profissionais atuantes como dos acadêmicos em formação, o dado obtido de que 313
imagens violam a privacidade do paciente, se enquadra no conceito de sensacionalismo
dado pelo CFM no Código de Ética Médica, e corresponde a um agir sem senso de
responsabilidade, violador do dever de confidencialidade.
A formação do ser humano do ponto de vista ético e moral, como aponta Piaget, deve
ser construída, devendo-se considerar a prática de bons exemplos, pois,segundo ele, o ser
humano não nasce inato aos os valores que devem guiar uma postura ética e moral frente à
sociedade.
Os valores éticos e morais determinados pelas normas de condutas atuam como
orientações ao profissional em exercício. Estas normas não ganham efetividade plena ao
estarem escritas em documentos normativos. As normas que prescrevem valores devem
ser estimuladas pelos professores, e preservadas no ambiente de aprendizagem, devendo o
aluno aproveitar este momento, em prol da construção de uma postura ética profissional.
Os acadêmicos em formação médica devem aproveitar as oportunidades das
relações interpessoais estabelecidas durante sua vida, particularmente nos espaços de
formação educacional, tendo em vista que estes espaços devem assegurar o
desenvolvimento de sua capacidade de refletir sobre as condutas eticamente adequadas.
Logo, os profissionais da área da saúde e os acadêmicos em formação médica devem agir
com humanidade e com senso de responsabilidade, na medida em que na relação médicopaciente, a confidencialidade é presumida, pela fidelidade.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
O papel das normas jurídicas, na função que lhe compete ao ordenar a sociedade do
espetáculo, visa garantir a proteção da privacidade do indivíduo, especialmente em
ambiente hospitalar. Isto é, no atual Estado de Direito brasileiro os Direitos estruturais princípios da legalidade, da democracia, da separação dos poderes e da segurança jurídica
– são consagrados em vista de proteger a pessoa e sua dignidade, constituindo essa
proteção o fim último do Estado.
A proteção da pessoa humana como meta-fim a ser perseguida pelo Estado é o que
Miguel Reale aponta como o valor fonte. Assim, temos como valor fonte a pessoa, cabendo
a tarefa do profissional da área da saúde e do acadêmico em formação médica, dentro de
suas competências, atuarem com senso de responsabilidade, aplicando as normas fim do
Estado em prol do paciente, de forma a assegurar o Direito à privacidade.
Visando uma postura eticamente adequada, o acadêmico em formação e o
profissional da área da saúde, devem reconhecer o Direito de proteção à privacidade do
paciente, sendo este reconhecimento capaz de auxiliar a equipe profissional a ponderar
determinadas práticas e posições frente aos problemas éticos gerados pela publicização de
imagens privadas.
O dado obtido, por meio da revisão sistemática do Instagram, de que 313 imagens
publicadas por profissionais e acadêmicos em formação profissional, caracteriza uma
violação do Direito à privacidade e ao valor fonte-fim do Estado brasileiro, bem como,
caracteriza uma violação às normas previstas nos documentos do MEC, do MS e do CFM.
O profissional da área da saúde deve considerar que o exercício ético de sua
profissão pressupõe o dever de confidencialidade. Informes à população sobre a
disponibilização de novos procedimentos, com fins científicos e educacionais são
permitidos, desde que reconhecidos pelo CFM e divulgados dentro dos critérios jurídicos.
REFERÊNCIAS
DEBORD, Guy. A sociedade do espetáculo: comentários sobre a sociedade do
espetáculo. Rio de Janeiro: Contraponto, 1997.
DURKHEIM, Émile. As Regras do Método Sociológico, São Paulo, Martins Fontes, 2007.
Para Durkheim é um “fato social: todas as maneiras de ser, fazer, pensar, agir e sentir
desde que compartilhadas coletivamente. Variam de cultura para cultura e tem como base a
moral social, estabelecendo um conjunto de regras e determinando o que é certo ou errado,
permitido ou proibido”.
GOMES, Andréia Patrícia; REGO, Sergio. “Transformação da educação médica: é
possível formar um novo médico a partir de mudanças no método de ensinoaprendizagem?”. Rev. bras. educ. med. [online]. 2011, vol.35, n.4, pp. 557-566. ISSN
0100-5502.
MARTINS-COSTA, Judith. A universidade e a construção do biodireito. In: Revista
Bioética, v. 8, n. 2, 2009.
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Portal
de
Notícias.
ZH
Notícias.
Disponível
<http://zh.clicrbs.com.br/rs/noticias/noticia/2014/07/crianca-tem-braco-amputado-aposataque-de-tigre-no-parana-4564352.html.> Acesso em: 05 set. 2014
em:
REALE, Miguel. Filosofia do direito. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 1994.p. 211-212.
REGO, Sergio. A educação médica e o Plano Nacional de Educação em Direitos
Humanos no Brasil. Rev. bras. educ. med. [online]. 2010, vol.34, n.4, pp. 479-480. ISSN
0100-5502.
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