Marco Civil da Internet: e eu com
isso?
Entenda o que muda na sua vida com a
aprovação deste projeto.
*Pedro Ekman
Nas próximas horas, uma batalha decisiva pelos seus direitos na internet será travada no Congresso
Nacional. O Marco Civil da Internet (PL 2126/2011) será votado de forma pioneira no Brasil, definindo as
regras de um jogo que está sendo debatido e disputado em todo o mundo.
De onde veio isso?
Esse não é um projeto só do governo brasileiro, ele foi construído coletivamente definindo direitos e
deveres dos cidadãos e empresas na internet. O enorme esforço de diversos setores da sociedade deu
forma ao projeto com o maior consenso possível para a garantia dos principais direitos civis na internet.
1 Liberdade de expressão
O que acontece hoje?
Hoje, o que você escreve na rede pode ser eliminado sem qualquer chance de defesa. A velha e boa
censura, que aterrorizou o país durante a ditadura militar, é uma prática corrente na internet, com a
diferença que não é mais necessário um órgão especializado do Estado autoritário para se retirar textos,
imagens, vídeos e qualquer tipo de conteúdo do ar. Basta um telefonema, ou um email de quem não
queira ver o conteúdo divulgado. A falta de leis que se refiram à internet cria uma insegurança jurídica
para os sites que hospedam os conteúdos e, com o receio de serem responsabilizados pelo que foi
publicado pelos seus clientes como se fossem eles mesmos os responsáveis, simplesmente retiram o
conteúdo do ar. Isso faz, por exemplo, com que prefeitos que não gostam de críticas ameacem processar
por difamação um provedor que hospeda um blog. Ou que corporações da indústria cultural notifiquem o
youtube para retirada de conteúdos que utilizem obras protegidas por direito autoral.
E eu com isso?
Você pode pensar: “Mas é justo que sejam punidos difamadores ou quem o usa indevidamente obras
protegidas de propriedade intelectual privada”. Talvez, mas a pergunta é: “Quem decide isso?” Quem
disse que o uso era realmente indevido? Quem disse quer se tratava de difamação, e não apenas de uma
crítica ou denúncia? Essa decisão não pode ser tomada unilateralmente nem pelo denunciante, nem pelo
denunciado. Por isso, as democracias modernas inventaram um sistema para tentar resolver essa
questão que se chama sistema judiciário, colocando a responsabilidade da decisão na mão de um juiz.
Como não há lei na internet, políticos e corporações se valem do risco econômico que os sites estão
sujeitos e, com simples notificações, criem uma indústria de censura automática na rede, sem respeitar
qualquer processo legal, ou dar o direito de defesa a quem produziu e divulgou os conteúdos
questionados. Você perde liberdade para se expressar na rede e de se informar pelo que foi censurado!
E o que muda com a aprovação do Marco Civil da Internet?
O artigo 20 do Projeto de lei 2126/2011 retira a responsabilidade dos sites sobre os conteúdos gerados
por terceiros, acabando com a insegurança jurídica e com a desculpa utilizada para a censura automática.
E quem joga contra?
A pressão da Rede Globo conseguiu criar no Marco Civil uma exceção para esta regra, ao definir que,
para conteúdos com direito autoral, serão tratados especificamente na Lei de Direito Autoral, o que
mantém a situação atual para esses tipos de conteúdo até que a lei seja reformada. Com isso, a Globo
seguirá censurando o debate acerca de sua obra na internet, mas os outros tipos de conteúdos passam a
ter uma garantia legal contra a censura automática.
2 Privacidade
O que acontece hoje?
A privacidade se transformou, literalmente, em uma mercadoria na internet. Geralmente, nos diversos
serviços gratuitos que podem ser utilizados na rede, o produto a ser comercializado é o próprio internauta
na forma dos seus dados mais íntimos. Plataformas como Google e Facebook utilizam suas informações
pessoais, os dados gerados pelo seu comportamento, tais como buscas, avaliações positivas e negativas
de conteúdos existentes e o próprio conteúdo da sua comunicação para vender para empresas
interessadas no seu padrão de consumo, ou mesmo para fornecer a governos que estejam monitorando a
movimentação política de seu país ou de outros. O ex-agente da NSA, Edward Snowden, revelou ao
mundo que a agência de espionagem estadunidense monitorava a comunicação privada de cidadãos de
forma massiva e não apenas em investigações pontuais. Snowden também revelou que a espionagem
contava com a colaboração de empresas de tecnologia e infraestrutura.
E eu com isso?
A lógica da privacidade como mercadoria compromete a própria liberdade de expressão. Sem regras de
proteção da privacidade, estamos vulneráveis ao humor de um Estado autoritário, vigilante e aos
interesses privados das empresas. Quanto vale o acesso aos dados dos seus exames médicos? E do seu
histórico contábil? Suas preferências políticas, sexuais e culturais?
E o que muda com a aprovação do Marco Civil da Internet?
O Marco Civil estabelece uma série de proteções a nossa privacidade na internet. O artigo 7 define que
as fotos e textos que você excluiu há muito tempo do Orkut e que pensa terem sido apagados com a sua
saída desta rede social, finalmente terão que ser efetivamente excluídos com a aprovação da lei. O março
civil não impede a espionagem americana, mas coloca na ilegalidade a cooperação entre empresas e
governos no monitoramento massivo. A lei também não impedirá Google e Facebook de venderem
nossas informações, mas define que isso deve ser autorizado de forma livre, expressa e informada. Isso
sim impede que as empresas de telecomunicação guardem os dados de tudo o que fazemos na rede.
E quem joga contra?
As bancadas policialescas do Congresso Nacional conseguiram a inclusão do artigo 16 ao projeto. Este
artigo define o armazenamento obrigatório de tudo que se fizer em determinados sites para fins de
investigação policial. Esta inclusão vai de encontro a todo espírito de proteção da privacidade ao
estabelecer a vigilância em massa. Inverte o preceito constitucional da presunção de inocência, onde
todos passam a ser considerados culpados até provem o contrário.
3 Neutralidade da rede
O que acontece hoje?
Este é o ponto de maior polêmica entre sociedade civil e empresas de telecomunicações. Com a
aprovação da neutralidade de rede como um princípio, as empresas donas dos cabos por onde trafegam
os pacotes de dados ficam impedidas de favorecer esse ou aquele serviço, esse ou aquele produto no
tráfego. Basicamente, todo conteúdo deve trafegar da mesma forma, com a mesma qualidade. Essa
definição é importantíssima para garantir que a internet se mantenha como um meio democrático, onde
todos têm as mesmas condições de falar e ganhar repercussão. Ter uma rede neutra é definir que o dono
da estrada não pode definir que veículos podem andar mais rápidos e quais tem que enfrentar um
congestionamento. Se nossas estradas não fossem neutras em relação a quem viaja por elas, existiriam
uma larga pista para quem pagasse mais e um pista estrita para quem não tivesse dinheiro. Ou ainda a
administradora da estrada poderia definir, em um acordo comercial com montadoras, que algumas
marcas de automóveis passam sem pagar pedágio, enquanto as outras são obrigadas a pagar. Como não
existem leis obrigando a neutralidade na rede de internet, hoje as estradas digitais são administradas de
forma assimétrica por quem controla os cabos.
E eu com isso?
Sem uma rede neutra, você não tem como saber se o serviço que usa está ruim por um motivo técnico,
ou por um acordo comercial que você desconhece. Você não tem como saber se o serviço de voz do
Skype está ruim por que a Microsoft (dona do Skype) não paga a NET para passar os seus produtos pela
rede. Sem neutralidade, a internet pode ser vendida como uma TV a cabo e você perde dos dois lados. O
seu site não será tão visto na internet quanto o de uma corporação transnacional que poderá pagar por
isso. Além disso, você não encontrará os conteúdos pelos quais não puder pagar. Perde-se dos dois
lados e quem controla a infraestrutura ganha dos dois lados.
E o que muda com a aprovação do Marco Civil da Internet?
O artigo 9 no março civil diz, claramente, que a empresa de infraestrutura deverá “tratar de forma
isonômica quaisquer pacotes de dados, sem distinção por conteúdo, origem e destino, serviço, terminal
ou aplicação”. Ou seja, deve ser neutra em relação ao que passa nos seus cabos vendendo apenas
capacidade de tráfego sem interferir no tráfego em si.
E quem joga contra?
As empresas de telecomunicação, mais conhecidas como Vivo/Telefônica, Claro/Embratel, TIM e Oi, são
as principais opositoras, pois querem poder negociar de todos os lados do balcão e impor condições
assimétricas para o consumidor. Essas empresas depositam no deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ)
suas esperanças de obstruir o projeto de lei que as obriga respeitar direitos civis na rede.
O que pode ser feito?
Para fortalecer a luta em defesa de um Marco Civil da Internet, que seja capaz de estabelecer,
democraticamente, princípios, direitos e deveres para o uso da Internet, ativistas e organizações da
sociedade civil organizaram uma agenda intensa de mobilizações para os próximos dias: Assine a petição
on line: http://www.avaaz.org/po/o_fim_da_internet_livre_gg/?mmc
Formada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais em Dezembro de 2007. É
especialista em Direito Processual pelo IEC-PUCMINAS. Atuou durante 05 (cinco) anos na defesa de
instituições financeira e empresas de médio e grande porte. Em setembro de 2013 decidiu utilizar todo
seu expertise acumulado ao longo destes anos para promover a defesa dos consumidores nas vias
administrativas e judiciais. Acesse http://ferreiradacostaadvbr.blogspot.com.br
Fonte: http://diligenciasbhforumtribunais.jusbrasil.com.br/artigos/113900627/marco-civil-dainternet-e-eu-comisso?utm_campaign=newsletter&utm_medium=email&utm_source=newsletter
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