REVISTA EDUCAÇÃO NO (CON)TEXTO: DO CURSO DE PEDAGOGIA ISSN 2446-5038 V.5, N.5, 2013 FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE UMA ESCOLA DE ENSINO FUNDAMENTAL DE LONDRINA COM ALUNA SURDA EM PROCESSO DE INCLUSÃO: A PRÁTICA PEDAGÓGICA DOCENTE APÓS A INCLUSÃO DO ESTUDANTE SURDO Elisabete Cristina Pereira Eches1 Carla Cristine Tescaro Lino2 RESUMO A inclusão de alunos surdos em escolas da rede regular de ensino é uma realidade em Londrina e em outras cidades do Brasil. Deste modo, este estudo é apresentado para mostrar as maneiras como os professores da rede regular de ensino que atuaram em uma turma de 7º ano de uma escola estadual da zona sul de Londrina têm se preparado para lecionar para alunos surdos inclusos. Utilizou-se um questionário com perguntas abertas aplicado em quatro professores da referida turma, suas respostas foram comparadas entre si e comparadas à literatura sobre o tema. Utilizou-se referencial teórico nas áreas de educação especial, educação de surdos e formação de professores. Esta pesquisa concluiu que os professores têm buscado por conta própria a formação continuada para trabalhar com a inclusão de alunos surdos, pois sua formação inicial não permitiu esta capacitação. Mesmo assim ainda se julgam despreparados para lecionar nesta modalidade de inclusão. Também nesse caso não houve nenhuma iniciativa do Estado ou da rede de ensino para preparar ou acompanhar os professores, apenas a aluna. Conclui-se que na formação inicial seria necessário um aumento da carga horária da disciplina de educação especial, ou mesmo inclusão de estágio nesta área, ou licenciaturas bilíngues. E na formação continuada, cursos de especialização em educação especial, se possível com habilitação em educação de surdos. Palavras-chave: Formação de Professores. Inclusão Escolar. Inclusão Escolar de Alunos Surdos. ABSTRACT 1 Especialista em Gestão Escolar pela UNICENTRO, Especialista em Educação Especial pela Faculdade Catuaí e Especializanda em Gênero e Diversidade na Escola pela UFPR, Pedagoga no IFPR - Instituto Federal do Paraná. 2 Mestre em Metodologias para o Ensino de Linguagens e suas Tecnologias pela UNOPAR, especialista em Educação Especial LIBRAS, Neuropscopedagoga, Docente na UNOPAR, SEED/PR e Faculdade Catuaí, Tradutora e Intérprete de LIBRAS/Português Português/LIBRAS. REVISTA EDUCAÇÃO NO (CON)TEXTO: DO CURSO DE PEDAGOGIA ISSN 2446-5038 V.5, N.5, 2013 Inclusion of deaf students in schools of the regular schools is a reality in Londrina and other cities of Brazil. Thus this study is presented to show the ways in which teachers from regular schools that operate on a group of 7th grade in a public school in the southern area of Londrina has to be prepared to teach deaf students included. We used theoretical framework in education and special education compared to the answers of a questionnaire with open questions applied to four teachers of that class. This research resulted that teachers have sought on their own continuing education to work with the inclusion of deaf students, because their initial training did not allow this. Yet still claim to be unprepared to teach this type of inclusion. Also in this case there was no initiative from the state or the school system to prepare or accompany teacher, just a student. We conclude that the initial training would require an increase in the workload of the discipline of special education or inclusion of stage in this area, or bilingual degrees. And in the continuing education specialization courses in special education, if possible major in deaf education. Keywords: Formation of the teachers. School Inclusion. School Inclusion of Deaf Students. 1 INTRODUÇÃO Com a propagação da inclusão escolar, o número de alunos surdos frequentando as escolas regulares tem aumentado, assim surge a necessidade de preparação profissional dos professores para lecionarem para estes alunos. Desta forma, sentimos a necessidade de pesquisar de que maneira estes profissionais estão se preparando para esta inclusão de estudantes surdos: se a escola ou o sistema de ensino têm lhes amparado, seja por meio de serviços de apoio ou de cursos de formação, se o professor tem buscado capacitação por conta própria. Diante desta situação, optamos por tentar encontrar resposta para o seguinte problema: O professor da sala de aula do ensino regular de uma escola estadual da cidade de Londrina, que leciona no 7º ano do ensino fundamental, tem se preparado ou vem sendo preparado para ministrar aulas para alunos surdos? “De modo geral, sabemos que historicamente a formação de professores no Brasil foi falha, em alguns momentos enfatizou-se os modelos dos conteúdos culturais-cognitivos, em outros o modelo pedagógico-didático” (SAVIANI, 2009, p. 148-149). Essa não articulação de ambos os aspectos causou grande prejuízo para os professores, que ao adentrarem em sala de aula encontram-se REVISTA EDUCAÇÃO NO (CON)TEXTO: DO CURSO DE PEDAGOGIA ISSN 2446-5038 V.5, N.5, 2013 despreparados em um destes aspectos, e por isso se veem forçados a recuperar o que não foi ensinado em sua formação inicial, ou então, acabam desistindo da docência por não exercê-la efetivamente, ou seja, com domínio do processo ensino aprendizagem que ocorre na sala de aula. Notamos, também, o quão vasta é cada uma das áreas das deficiências, e como é importante o professor aprofundar-se nos estudos para entender qual a melhor maneira de desenvolver o processo de ensino aprendizagem com alunos que têm alguma limitação ou diferenciação, seja física ou intelectual, que possa necessitar de alguma adaptação educacional. Percebemos ainda que além de conhecer um pouco do que é a LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais), o professor deve conhecer a história da comunidade surda, e, ainda os fundamentos legais e pedagógicos para a educação de surdos, entre outros aspectos que precisam ser estudados para então termos mais insegurança ao exercer atividades docentes com este tipo de inclusão. Portanto, trabalhar com alunos surdos será difícil para os professores de modo geral caso não se aprofundarem no tema da surdez. Os cursos de formação de professores apresentam a LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais) como disciplina obrigatória, conforme afirma o decreto nº 5.626 de 2005 que regulamenta a lei 10.436 de 24 de abril de 2002 que dispõe sobre a língua brasileira de sinais: A LIBRAS deve ser inserida como disciplina curricular obrigatória nos cursos de formação de professores para o exercício do magistério, em nível médio e superior, e nos cursos de Fonoaudiologia, de instituições de ensino, públicas e privadas, do sistema federal de ensino e dos sistemas de ensino dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios (BRASIL, 2005). No entanto, esta disciplina não consegue sozinha suprir o ensino que atenda as necessidades do estudante surdo, pois a LIBRAS apesar de ser a língua mais utilizada pelo estudante surdo para se comunicar só é efetivamente aprendida na convivência com alunos surdos e por meio de estudos aprofundados, desta maneira o docente terá um melhor desenvolvimento de sua aula. Também REVISTA EDUCAÇÃO NO (CON)TEXTO: DO CURSO DE PEDAGOGIA ISSN 2446-5038 V.5, N.5, 2013 nem todos os professores tem interesse ou comprometimento em se aprofundar nos conhecimentos sobre a língua brasileira de sinais ou adota práticas metodológicas adequadas aos estudantes surdos. Para afirmar nossa fala, extraímos parte do texto de Silva e Lacerda (2015, p. 25): Programa Interiorizando LIBRAS - curso que visava apoiar professores, instrutores e intérpretes de LIBRAS para atuarem na educação de surdos. O programa teve início em 2003 e formou docentes por todo o Brasil... Todavia, não se pode esquecer que se trata de um curso de LIBRAS com número finito de horas. Os mais longos com duração de 120 horas, não garantem a proficiência e fluência em uma língua tão necessária aos espaços educacionais. É necessário enfatizar que a simples aprendizagem da Língua Brasileira de Sinais por parte do docente, não lhe possibilitará atuar no processo de ensino aprendizagem do estudante surdo com eficiência, este que possui uma cultura e identidade diferente do estudante ouvinte. No caso do aluno surdo, o educador ainda precisa ter a sensibilidade de aprender no cotidiano e/ou fazer cursos de formação continuada em áreas específicas e ter apoios necessários no atendimento a estudantes surdos. O que é prejudicial nesta situação é que, muitas vezes, o professor não tem nenhum conhecimento sobre a surdez, seja conhecimento biológico ou pedagógico e, muitas vezes, tem encontrado dificuldades em sua atuação em sala de aula, por isso a importância do Intérprete de LIBRAS na sala de aula, por ser um profissional que não é preparado apenas para fazer a interpretação dos sinais da LIBRAS, mas que também conhece a cultura surda: Perlin (2006, p. 137 apud MASSUTI; SANTOS, 2008, p. 150) afirma: Quanto mais se reflete sobre a presença dos intérpretes de Língua de Sinais, mais se compreende a complexidade de seu papel, as dimensões e a profundidade de sua atuação. Mais se percebe que os intérpretes de Língua de Sinais são também intérpretes da cultura, da língua, da história, dos movimentos, das políticas da identidade e da subjetividade surda, e apresentam suas particularidades, sua identidade, sua orbitalidade. REVISTA EDUCAÇÃO NO (CON)TEXTO: DO CURSO DE PEDAGOGIA ISSN 2446-5038 V.5, N.5, 2013 Porém, o intérprete não é o profissional responsável pelo processo de ensino e aprendizagem, pois cabe ao professor essa função, ao intérprete cabe apenas o papel de tradutor de duas línguas em sala de aula. Para tanto, conforme as considerações relatadas almejamos verificar de que forma os Professores do Ensino Regular têm se preparado ou vem sendo preparados para receber alunos surdos, e trabalhar no processo de ensino aprendizagem de uma aluna surda matriculada em uma escola estadual de Londrina cursando o 7º ano do ensino fundamental. 2 INCLUSÃO ESCOLAR E INCLUSÃO DE ALUNOS SURDOS A História da Educação Especial no Brasil se comparada a outros países do mundo ocorreu de maneira atrasada, ou melhor, quase que estagnada. Enquanto em outros países do globo terrestre a fase de negligência ou omissão ocorre até o século XVII, no Brasil esta fase foi estendida até a década de 1950 (MIRANDA, 2003). Sendo apenas na década de 1990 que se iniciam as discussões sobre a Inclusão Escolar, sendo esta fruto de controvérsias quanto ao processo de integração. Tem se reconhecido que trabalhar com classes que acolhem todos os tipos de diferenças traz benefícios para o desenvolvimento de todas as crianças, sejam elas pessoas com necessidades especiais ou não (MIRANDA, 2003). “Porém para que existam classes assim serão necessárias novas concepções de escola, ensinar e aprender”, pois a escola de hoje não vem sendo preparada para trabalhar a Inclusão Escolar de forma efetiva. As questões relativas ao ensino para alunos surdos sempre foram objeto de muita polêmica, situação essa agravada pelos resultados do Congresso realizado em Milão em 1880, os quais indicaram a aquisição de linguagem oral pelos surdos como o modo mais adequado de educá-los (INSTITUTO NACIONAL DE EDUCAÇÃO DE SURDOS, 2015). Muitos professores e alunos que reconhecem a importância da linguagem sinalizada criticaram esta decisão, pois a aprendizagem da língua oral demanda muito tempo para treinamento da fala e da audição (neste caso, resíduos auditivos), o que fazia com que a escolarização formal fosse REVISTA EDUCAÇÃO NO (CON)TEXTO: DO CURSO DE PEDAGOGIA ISSN 2446-5038 V.5, N.5, 2013 abandonada. Por isso, na década de 1980, surgiu um movimento transnacional onde acadêmicos na área de surdez e os próprios surdos tentavam mostrar outros caminhos para esta escolarização (INES, 2015). 3 METODOLOGIA A metodologia utilizada foi num primeiro momento pesquisa em referencial teórico, para embasar a preparação do projeto. Pesquisou-se livros, leis, decretos, políticas e artigos das áreas de: Educação, Educação Especial, Formação de Professores, Pesquisa Científica, Inclusão Escolar, Inclusão de Pessoas com Deficiência e Inclusão de Alunos Surdos. Em um segundo momento, foi feita a pesquisa de campo por meio de questionários que foram respondidos por professores de uma escola regular que tem uma aluna surda inclusa em sua sala de aula. Foram 4 professores: um de educação física que possui mestrado em educação, uma de biologia com mestrado em biologia e ecologia, uma de matemática especialista em educação especial e uma professora de português especialista em didática e metodologia do ensino. Os entrevistados tinham de 3 a 29 anos de experiência como docente, três deles cursaram a licenciatura em Instituição Pública de Ensino. Aplicamos um questionário composto por 22 perguntas abertas, no qual o professor poderia explicar melhor sua resposta. Em um terceiro momento, as respostas dos questionários foram analisadas e o resultado destas foi comparado ao referencial teórico sobre os temas abordados no início deste tópico, com o objetivo de concluir a pesquisa. A metodologia de pesquisa utilizada foi a qualitativa embasada no autor Julio Cesar Rodrigues Pereira (2004), os dados obtidos nos questionários foram analisados de maneira qualitativa. Foram utilizadas letras para nomear os professores a fim de se preservar suas identidades. REVISTA EDUCAÇÃO NO (CON)TEXTO: DO CURSO DE PEDAGOGIA ISSN 2446-5038 V.5, N.5, 2013 4 RESULTADOS DAS ENTREVISTAS Os professores participantes responderam questões que vão desde a escolha da profissão, passando pelo entendimento sobre a surdez, até sobre o que mudou em sua identidade profissional depois de lecionar para uma estudante surda. Ao dizerem sobre o motivo de escolher a profissão, deram respostas parecidas, no entanto a resposta do Professor R acabou sendo a mais completa: Acredito que o fato de poder ajudar a formar/construir identidades e subjetividades humanas por meio de uma área de conhecimento específica – sendo esta uma das profissões mais dignas e importantes (se não for a) na e para a sociedade que desejamos ajudar a formar. Quando o professor R afirma que escolheu a profissão porque “[...] sendo esta uma das profissões mais dignas e importantes (se não for a) na e para a sociedade que desejamos formar”, está de acordo com a ideia de Fernandes (2012, p. 13) que defende: [...] muito mais que transmitir conteúdos das matérias curriculares organizadas/programadas para o desenvolvimento intelectual da humanidade, é preciso ensinar a ser cidadão, mostrar aos alunos seus deveres e seus direitos, subsidiando-os para que saibam defendê-los. Paulo Freire, no livro Pedagogia da Autonomia, defende que “Ensinar é uma especificidade humana” (1996, p. 102), relacionando esta afirmação à resposta do Professor R, que justifica ter escolhido a profissão porque acredita que “o fato de poder ajudar a formar/construir identidades e subjetividades humanas”, mostra que ambos possuem a mesma opinião sobre o que é o trabalho do professor. Dos quatro professores entrevistados, três afirmaram que durante o curso de graduação não tiveram uma disciplina que os preparasse para a inclusão de estudantes com necessidades educacionais especiais, ou mesmo estudantes com surdez, asseveraram que hoje possuem conhecimento entre razoável e superficial sobre os tipos de deficiência. E ainda assim sentem-se despreparados. 3 Trabalho não publicado. REVISTA EDUCAÇÃO NO (CON)TEXTO: DO CURSO DE PEDAGOGIA ISSN 2446-5038 V.5, N.5, 2013 As respostas das professoras N e M demonstram este sentimento de despreparo: Fala da Professora N: Não. Porque não tenho curso específico em LIBRAS ou informações que orientem a melhor forma de fazê-lo entender a disciplina” Resposta da Professora M especialista em educação especial: ... não me sinto preparada uma vez que não sei me comunicar em LIBRAS, ... possuo um conhecimento razoável sobre os tipos de deficiência, ... a minha especialização não me preparou especificamente para trabalhar com alunos surdos. Essas professoras, para trabalharem com aluno incluso de acordo com Arantes (2006), precisariam: [...] ser capaz de analisar os domínios de conhecimentos atuais dos alunos, as diferentes necessidades demandadas nos seus processos de aprendizagem, bem como, com base pelo menos nessas duas referências, elaborar atividades, criar ou adaptar materiais, além de prever formas de avaliar os alunos para que as informações sirvam para retroalimentar seu planejamento e aprimorar o atendimento aos alunos (ARANTES, 2006, p.58). Beyer (2003 apud VITALIANO, 2010, p. 52) confirma e justifica o relato dos professores em que se julgam “[...] despreparados para atender alunos com necessidades especiais: falta-lhes a compreensão da proposta, a formação conceitual correspondente, a maestria do ponto de vista das didáticas e metodologias e as condições apropriadas de trabalho”. Mesmo que todos relatem não estar preparados para atender alunos surdos inclusos, alguns deles promovem formas de avaliação adaptadas como a professora E: ...explico individualmente para a aluna. Todos os professores afirmaram que após a inclusão da aluna surda nenhum deles recebeu acompanhamento, seja da equipe pedagógica da escola ou REVISTA EDUCAÇÃO NO (CON)TEXTO: DO CURSO DE PEDAGOGIA ISSN 2446-5038 V.5, N.5, 2013 da rede de ensino para trabalhar com essa aluna a fala da professora N exemplifica bem esse relato: Quando soube da aluna já estava no meio do bimestre A LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais) é de extrema importância para a Educação de Surdos sendo muito enfatizada pela própria comunidade surda e por acadêmicos e professores da área da surdez, como bem coloca Ramos (2012, p. 3): Superando considerações políticas, a ciência manteve-se curiosa com relação às Línguas de Sinais Ferreira Brito (1993:12), aponta os trabalhos de Carrick Mallery, de 1882[...] a respeito das Línguas de Sinais indígenas das Américas e Austrália, como os primeiros estudos linguísticos sobre Línguas de Sinais... Pelo fato de as Línguas de Sinais indígenas serem usadas não só pelos surdos, mas, principalmente, na comunicação intertribal, apesar de terem sido aqueles primeiros estudos extremamente importantes, considera-se como data inicial dos estudos científicos das Línguas de Sinais dos surdos, os trabalhos realizados a partir de 1957 por William C. Stokoe sobre a ASL American Sign Language, financiados pelo governo norte-americano. Sua primeira publicação, Language Structure: An outline of the Visual Communication Systems of the American Deaf, de 1960, é tida como marco, como “prova” da importância lingüística das Línguas de Sinais. Em 1965 ele publica, em co-autoria com D. Casterline e C. Cronoberg, o primeiro dicionário de Língua de Sinais (A Dictionary of American Sign Language), inserindo definitivamente o estudo das Línguas de Sinais na ciência lingüística. Relacionando este trecho à nossa pesquisa de campo entrevistando professores, nenhum destes afirmou ter o curso de LIBRAS, bem como não sabem dizer se caso tivessem esse curso conseguiriam comunicar-se melhor com o aluno surdo, no entanto, afirmaram que nem todos os alunos surdos precisaram da LIBRAS para se comunicar, isso dependerá do grau de surdez do aluno. Como todos eles se formaram há mais de 4 anos talvez nos currículos de seus cursos de formação ainda não teria sido inserida a disciplina obrigatória de LIBRAS. Visto que a aluna para a qual eles lecionam possui surdez moderada e utiliza-se do português (linguagem oral) para se comunicar, esta atenção descrita pela professora de conversar individualmente com a aluna pode trazer um feedback REVISTA EDUCAÇÃO NO (CON)TEXTO: DO CURSO DE PEDAGOGIA ISSN 2446-5038 V.5, N.5, 2013 que a professora e a aluna não esperavam, e contribuir para o aprimoramento do atendimento à aluna e do trabalho da professora. A aluna tem um pouco de dificuldades na sala de aula, mas seu desempenho tem sido regular, não tem sido muito fraco como muitas vezes acontece. Ela também recebe auxílio no contraturno no CAES (Centro de Atendimento Especializado em Surdez). Devido ao nível de perda auditiva da aluna ser moderado, e ela saber se comunicar oralmente não se fez necessária a presença do intérprete de LIBRAS, e ele realmente não está presente na escola como foi relatado pelos professores da pesquisa. Apesar disso, afirmam conhecer o papel do intérprete, respostas de dois professores: Relato do professor R: Facilitar o ensino por meio da comunicação mais adequada. Resposta da professora M: Sim é um apoio para o aluno. Perguntamos aos professores se conheciam as dificuldades do aluno surdo, todos disseram que sim, porém apenas a professora N relatou de maneira mais específica: Acho que a falta de audição e dificuldade de falar. As dificuldades estão sim relacionadas à falta de audição e dificuldade de falar, mas lendo informações sobre a história da educação de surdos no item Inclusão Escolar e Inclusão de Alunos Surdos logo acima, podemos perceber que as dificuldades muitas vezes estavam relacionadas mais em aceitar e/ou entender que o surdo pode se comunicar por outra língua sinalizada e não a língua oral de seu país. Quanto à legislação da educação especial, temos a LDB nº 9.394 (BRASIL, 1996) como um marco na organização da educação especial no país, ela apresenta a Educação Especial em um de seus capítulos como modalidade de educação oferecida preferencialmente na rede regular de ensino e define também REVISTA EDUCAÇÃO NO (CON)TEXTO: DO CURSO DE PEDAGOGIA ISSN 2446-5038 V.5, N.5, 2013 várias maneiras de ocorrer esta educação conforme os parágrafos 1º e 2º do artigo 58: § 1º Haverá, quando necessário, serviços de apoio especializado, na escola regular, para atender às peculiaridades da clientela de educação especial. § 2º O atendimento educacional será feito em classes, escolas ou serviços especializados, sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não for possível a sua integração nas classes comuns de ensino regular (BRASIL, 1996). Em nossa pesquisa, solicitamos aos professores que respondessem se tinham conhecimento sobre algum serviço de apoio a alunos surdos de sua escola, seja no mesmo local ou em local diverso, três deles disseram que não sabiam da existência deste serviço apenas a professora E respondeu que: Na instituição que trabalho não, mas sei que o estado oferece em uma outra instituição que atende alunos desse colégio no contra turno. Existem no estado do Paraná os Centros de Atendimento Especializado em Surdez cuja sigla é CAES, estes prestam atendimento especializado para estudantes surdos que estão inclusos na rede regular de ensino. Na cidade de Londrina, o CAES está localizado dentro do prédio do colégio Hugo Simas e é lá que a aluna surda é atendida no contraturno conforme relato acima da professora E. O atendimento especializado é garantia da Constituição Federal (BRASIL, 1988) e da LDB 9394/96 (BRASIL, 1996). Os docentes entrevistados afirmaram não ter contato com a comunidade surda e 2 deles afirmaram que o aluno surdo tem sua comunicação e suas potencialidades culturais próprias diferente de um ouvinte. Resposta do professor R: Eles se expressam de modo diferente daqueles considerados “normais” e lidam com a realidade/vêm o mundo de determinada maneira. Utilizam bastante a expressão/comunicação corporal, por meio de outros sentidos/outras percepções. REVISTA EDUCAÇÃO NO (CON)TEXTO: DO CURSO DE PEDAGOGIA ISSN 2446-5038 V.5, N.5, 2013 Resposta da professora M . Os surdos necessitam de uma comunicação espaço-visual. O surdo difere do ouvinte não apenas porque não ouve, mas porque desenvolve potencialidades culturais próprias. Podemos comparar estas duas respostas dos professores com conceitos apresentados no trabalho de Tescaro (trabalho não publicado, p. 9): Alguns aspectos da cultura surda contidos nas narrativas surdas: primeiramente há narrativas pedagógicas onde enfatiza o jeito surdo de ensinar, onde apela por estratégia de ensino visuais, transmissão de conhecimentos em línguas de sinais[...] as narrativas linguísticas que apelam pela diferença e autenticidade da língua de sinais[...]. Todos os docentes afirmaram que, após trabalharem com a aluna surda, passaram a prestar mais atenção nas dificuldades de todos os alunos indistintamente, e também relataram que existem dificuldades para eles mesmos exercerem seu trabalho, mas que tudo isso traz a eles um grande aprendizado. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS O trabalho docente no Brasil sempre foi um trabalho complexo e difícil, pois muitos fatores o influenciam. Papi (2005, p. 72) afirma que o contexto no qual o professor se encontra inserido é “ambíguo, politicamente determinado e nem sempre facilitador”. O professor é pressionado pela escola, pelo aluno, pela família do aluno, pela sociedade para que desenvolva bem a função de ensinar, e nem sempre consegue se desvencilhar dessa pressão, por meio de atividades de lazer, por exemplo, devido ao excesso de trabalho, pois o docente tem trabalhos e provas para corrigir e elaborar fora do horário de aula. Apesar de alguns dos professores entrevistados terem tido uma disciplina de educação especial em sua graduação, ou mesmo um destes é especialista em educação especial, todos afirmaram não se sentirem preparados para trabalhar com inclusão de alunos surdos na rede regular, inclusive a professora que é especialista em educação especial. Como já relatamos, a especialização em educação especial é muito ampla e por isso não pode se aprofundar em todos os REVISTA EDUCAÇÃO NO (CON)TEXTO: DO CURSO DE PEDAGOGIA ISSN 2446-5038 V.5, N.5, 2013 tipos de deficiência. Vitaliano (2010) contempla uma pesquisa que apresenta relatos de professores sobre sua opinião a respeito da preparação recebida na formação inicial (licenciatura) para incluir alunos que apresentam NEE, alguns deles afirmam acreditar que a licenciatura não os preparou para a educação especial. A saída sugerida para este problema seria o fato de as licenciaturas de forma geral terem aumentada sua carga horária e as atividades relacionadas à educação especial nos cursos. Seja por meio de mais conteúdos, de mais disciplinas, de estágios na área, o que ainda não existe como obrigatório, entre outros (VITALIANO, 2010). Acreditamos também que outras saídas precisam ser apontadas, apresentamos a formação inicial como possível solução de melhor preparação destes docentes pelo fato de ser um tempo de formação mais longo o que poderia permitir maior aprofundamento nos conhecimentos sobre educação de surdos. A especialização em educação especial com certeza no atual momento é a melhor opção para quem já cursou uma licenciatura que não lhe preparou para atender estudantes com surdez ou mesmo outras necessidades especiais, pois nela que o professor poderá receber mais conhecimentos sobre as várias deficiências, e depois poderá se aprofundar na deficiência auditiva, que é o caso de nossa pesquisa. Constatamos que da parte do Estado, ou da escola ou da rede de ensino não houve nenhuma preparação para estes professores da pesquisa, o que eles sabem é da vivência prática na profissão, ou de algum curso de curta duração ou especialização que fizeram por conta própria. Nem todos eles tiveram essa preparação, porém a maioria, 3 dos quatro professores têm algum curso no qual aprenderam sobre a deficiência auditiva além de sua graduação. Se existe algum auxílio da professora especialista do CAES, os professores entrevistados não demonstraram ter conhecimento. Para atender alunos surdos na sala de aula regular, a LIBRAS é sem dúvida o primeiro passo para uma possível comunicação professor aluno, os próximos passos são: o estudo específico da cultura surda, estudo da gramática da LIBRAS, estudo da história dos surdos, se o docente tiver oportunidade de participar de eventos da comunidade surda também é importante (SILVA; LACERDA, 2015). REVISTA EDUCAÇÃO NO (CON)TEXTO: DO CURSO DE PEDAGOGIA ISSN 2446-5038 V.5, N.5, 2013 Destes conhecimentos relatados, aqueles de nível acadêmico podem ser aprendidos em uma graduação de: Pedagogia bilíngue (LIBRAS), Letras com habilitação em LIBRAS, ou outros existentes no país. Também cursos de especialização em Educação Especial habilitação em LIBRAS. E cursos de LIBRAS de curta duração, nos quais se divide o tempo de estudos em etapas ou módulos como se faz em qualquer outro idioma. O mais importante nesta pesquisa foi perceber que apesar da formação de professores ter sido sempre falha em nosso país (SAVIANI, 2009), os sujeitos pesquisados buscaram por meios próprios tais conhecimentos não apreendidos em sua formação inicial, não ficaram aguardando que aqueles que estão acima deles como governo e secretários de educação pensassem essa preparação. Quanto aos métodos, o único utilizado por eles com a aluna surda foi estarem mais próximos dela, falar de frente, falar individualmente para perceberem se ela entendeu, como ela tem perca moderada da audição, e é uma estudante oralizada, não se fez necessário o uso da LIBRAS para ela, pois tem progredido academicamente conforme afirmação dos professores. Nesta pesquisa, percebemos que em nenhum momento os professores veem a aluna como alguém incapaz, ou que não tem potencial, como uma aluna que não conseguirá alcançar os objetivos propostos para o ensino no 7º ano do ensino fundamental. O tempo todo ela e os demais alunos ouvintes são vistos como iguais no sentido de capacidade cognitiva. Isso demonstra que a visão que eles têm sobre a surdez não é aquela de pessoa desamparada, que precisa ser protegida, que devido à surdez tem deficiência ou perca da capacidade intelectual, como por muitos anos os surdos foram tratados. A identidade profissional destes docentes é daqueles que entendem o quanto o trabalho de um professor é importante para ajudar a formar cidadãos conscientes e propagar o conhecimento para contribuir para a melhora da sociedade. Esta foi apenas uma pesquisa em uma escola de Londrina, tentamos verificar como estes professores se prepararam ou se preparam para a inclusão de estudantes surdos, não podemos de forma alguma generalizar este estudo para a realidade da cidade de Londrina ou de outra região. Concentramo-nos apenas em REVISTA EDUCAÇÃO NO (CON)TEXTO: DO CURSO DE PEDAGOGIA ISSN 2446-5038 V.5, N.5, 2013 uma escola, que apresenta somente uma aluna surda, no entanto, nada impede que este estudo também se realize em outras escolas e assim se possa fazer um mapeamento ou panorama da real situação de formação dos professores que lecionam para alunos surdos na rede regular de ensino contribuindo para um melhor atendimento educacional de estudantes surdos no ensino fundamental. REFERÊNCIAS ARANTES, V. A. (Org.). Inclusão escolar: pontos e contrapontos. São Paulo: Summus, 2006. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 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