CONSIDERAÇÕES SOBRE A QUALIFICAÇÃO DOCENTE PARA EDUCAÇÃO INCLUSIVA EM MANAUS Gabriel Rodrigues do Nascimento Universidade do Estado do Amazonas – UEA José Ricardo Almeida dos Santos Universidade do Estado do Amazonas – UEA Maria Aleluia Cardoso Universidade do Estado do Amazonas – UEA RESUMO: A pesquisa analisa as perspectivas de qualificação docente para a educação inclusiva na cidade de Manaus, na qual um dos principais espaços é a Escola Estadual de Atendimento Específico Mayara Redman Abdel Aziz, responsável por cursos para atendimento de deficientes visuais e auditivos. Nesse sentido, o objetivo geral é conhecer o processo de qualificação, e os específicos são verificar as instalações físicas da referida instituição e averiguar quais estratégias ou necessidades de formação estão sendo contempladas nos programas voltados para a formação de professores na perspectiva da educação inclusiva. Nos procedimentos metodológicos, se adotou a pesquisa bibliográfica para fundamentação teórica sobre educação especial, observação direta e entrevista semi-estruturada. A análise dos dados mostrou os equipamentos eletrônicos em desuso, principalmente computadores, uma vez que o Estado limitou severamente os recursos financeiros da instituição, ao mesmo tempo em que restringiu o público freqüentador composto agora somente por profissionais da educação em atuação. PALAVRAS-CHAVES: inclusão; educação especial; qualificação docente. 1. Introdução A educação é um processo que ocorre na sociedade humana, com a finalidade de tornar os indivíduos participantes do desenvolvimento civilizatório, e responsáveis por levá-lo adiante. Ela também envolve crescimento global da consciência e da comunicação, integrando numa visão de totalidade, os diferentes níveis de conhecimento e de expressão. Educar o ser integral (corpo, mente, sentimentos, espírito) é a meta, buscando as relações entre o pessoal e o grupal (PENTEADO, 1998, p. 30). Porém, essa mesma educação não é o princípio e fim em si mesmo, mas atende as demandas produzidas pelo capital, já que esta fornece os subsídios para o aumento da produtividade e recebe de volta os investimentos oriundos dos resultados obtidos. Isso mostra então, uma incógnita com relação a essa educação pautada no modelo educacional formal, uma vez que os novos processos de ensino e aprendizagem exigem modificações, no sentido de responder às transformações do mundo de trabalho, junto com melhor tratamento as questões da diversidade e inclusão, sem esquecer que a atual reestruturação produtiva ocorrendo paralela a globalização, produz mudanças profundas na sociedade causando incertezas com relação ao seu futuro. Por outro lado, a força dos movimentos sociais durante toda a década de noventa do século XX e os anos iniciais do século XXI mostra uma verdadeira guerra pela redistribuição da riqueza e informação, e também pelo reconhecimento dos direitos das minorias sociais e povos tradicionais no mundo todo. Afirma-se assim que a defesa da cidadania e do direito à educação das pessoas portadoras de necessidades educacionais especiais é atitude muito recente na sociedade brasileira, pois Mazzotta afirma que “manifestando-se através de medidas isoladas, de indivíduos ou grupos, a conquista e o reconhecimento de alguns direitos dos portadores de deficiência podem ser identificados como elementos integrantes de políticas sociais” (2003, p. 15). Uma das discussões centrais na área de educação decorre da atual política nacional de educação que preconiza a educação inclusiva, ou seja, aquela organizada para atender a todos. No Brasil, o debate sobre a inclusão de estudantes portadores de necessidades educacionais especiais em salas regulares provoca uma grande reflexão nos educadores e pais, no sentido de determinar como farão isso sem esses alunos sentirem discriminados ou privilegiados pela sua deficiência. Contudo, dentro de uma retrospectiva histórica, “uma escola igual para todos” está sendo inviável, por razões históricas, culturais e sociais das diferentes parcelas da sociedade. Entretanto, os seguintes documentos de organismos internacionais (Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), Declaração dos Direitos da Criança (1959), Declaração dos Direitos do Deficiente Mental (1971), Declaração dos Direitos do Deficiente Físico (1975), Declaração Mundial sobre Educação para Todos (1990), Declaração de Salamanca (1994), Declaração dos Direitos Indígenas (2007), entre outros), acabam unindo os conceitos de desenvolvimento e direitos humanos. E a educação especial, como paradoxo frente à globalização excludente, acaba assumindo um valioso papel no processo de inclusão dos portadores de deficiência na vida política, econômica e social na sociedade. Como portador de deficiência, Barbosa entende que. O deficiente é uma pessoa com direitos. Existe, pensa e cria. Tem uma limitação corporal ou mental que pode afetar aspectos de comportamento, aspectos estes muitas vezes atípicos, uns fortes e adaptativos outros fracos e pouco funcionais, que lhe dão um perfil intraindividual peculiar. Possui igualmente discrepâncias no desenvolvimento bio-psico-social, ao mesmo tempo em que aspira a uma relação de verdade e de autenticidade e não a uma relação de coexistência conformista e irresponsável. (2007, p. 254). Refletindo sobre isso, percebemos que para viabilizar a chamada “escola inclusiva”, todos os profissionais que atuam nesse local devem estar preparados para acolher esses indivíduos durante o processo de reabilitação na escola, a fim de superar o isolamento e, posteriormente, as dificuldades de aprendizagem. Amaral afirma o seguinte: Mais do que criar condições para os alunos com necessidades educacionais especiais, a inclusão é um desafio que implica provocar mudanças na escola, ou seja, no projeto pedagógico, na postura do professor diante dos alunos, na filosofia adotada pela escola, sempre em prol da valorização das peculiaridades de cada um. Na educação inclusiva não é o aluno que se amolda ou se adapta a escola, mas é ela que, consciente de sua função, coloca-se a disposição do aluno, tornando-se um espaço inclusivo” (2007, p. 88). Das ações que a escola deverá promover, está incluída a infra-estrutura dos espaços educacionais, na qual possuem barreiras arquitetônicas que dificultam a locomoção, e que deveriam ser eliminadas ou, no mínimo, adaptadas aos deficientes, para sua liberdade de ir e vir e a qualificação dos funcionários com aprendizagem de cursos sobre as deficiências físicas e mentais, LIBRAS, entre outros. Kassar resume isto dessa maneira: “Esses procedimentos têm tido como defesa a preocupação com a não-estigmatização e com a socialização dessas crianças. No entanto, ressalto que a escola tem uma responsabilidade que nas sociedades modernas é conferida quase que exclusivamente a ela: propiciar as novas gerações o acesso (à) e a apropriação da cultura produzida pela humanidade no decorrer de sua existência (grifo da autora) e esse aspecto não pode ser negligenciado ou apresentado em segundo plano” (2004, p. 63) Isso torna as estratégias de ensino o principal foco de interesse, pois de acordo com as dificuldades específicas apresentadas pelos alunos, se elaborará atividade especialmente programada e, com a possibilidade de receber atendimento de uma equipe multidisciplinar na escola. “Os profissionais da escola, incluindo a equipe de apoio, devem estimular a todos os alunos a tomarem suas próprias decisões, de forma que eles possam se tornar cada vez mais importantes, facilitando assim, um processo de inclusão escolar” (SILVA, 2006, p.27). Fazendo uma reflexão sobre isso, percebemos que a almejada “acessibilidade” se torna à palavra-chave tanto para os alunos ditos “normais” como os portadores de necessidades educacionais especiais, quando enfrentam a falta de acesso a materiais didáticos, novos produtos tecnológicos e uma educação com qualidade para todos. Oliveira escreve o seguinte comentário. “Os termos, acessibilidade e acessível, têm suas origens na palavra “acesso” e estas estão presentes freqüentemente, em vários aspectos, no cotidiano da vida das pessoas deficientes: acesso ao espaço físico, à educação, a certa adaptação, ao computador, entre outros” (2003, p. 62). Como uma das medidas propostas para diminuir esse “fosso”, as NTIC’s podem se tornar à peça fundamental para acesso à informação, pesquisa, documentação, trabalhos, viabilizando a inclusão social, “com a inclusão digital”. Essas tecnologias dispõem de recursos como animação, som, imagem, efeitos especiais que superam as possibilidades didáticas e metodológicas tradicionais, adaptando-os às necessidades e capacidades do aluno com deficiência. Ao lado dessas tecnologias, os docentes devem lembrar que suas práticas pedagógicas influenciarão decisivamente na formação intelectual e pessoal de seus alunos, e por isso, sua capacitação sempre levará em conta a importância dum corpo teórico atualizado com as mais recentes pesquisas científicas, revalorizando por conseqüência o papel social da escola. Dessa forma, o docente dentro do ambiente escolar reelaborará seus saberes junto com seus alunos, no sentido de prepará-los para o mundo do trabalho. Com relação à inclusão de alunos/as surdos/as nas escolas regulares, embora os discursos reconheçam à especificidade lingüística das pessoas surdas, ao valorizarem o uso da Língua de Sinais, as mudanças acontecem de maneira lenta na cidade de Manaus, tendo havido poucos sinais de acesso dessas pessoas às instituições escolares. Entretanto, o Estado promove a qualificação dos docentes em Centros Especializados de Atendimento aos Portadores de Necessidades Especiais, como a Escola Estadual de Atendimento Específico Mayara Redman Abdel Aziz Fomentando a discussão desse tema, o objetivo geral do trabalho é conhecer o processo de qualificação docente para educação inclusiva na cidade de Manaus. E os objetivos específicos são verificar as instalações físicas e pedagógicas da Escola Estadual de Atendimento Específico Mayara Redman Abdel Aziz e averiguar quais estratégias ou necessidades de formação estão sendo contempladas nos programas voltados para a formação de professores na perspectiva da educação inclusiva. Nos procedimentos metodológicos, adotaram-se como técnicas de coleta de dados a pesquisa bibliográfica para fundamentação teórica sobre educação especial, pesquisa de campo “que exige um planejamento geral e um plano específico para coleta de dados, bem como um relatório escrito das varias etapas da pesquisa, incluindo os resultados obtidos” (ANDRADE, 1999, p.121), a observação direta durante a visita, e entrevista semi-estruturada com a gestora da referida instituição de ensino. Com relação à observação, Trivinõs (2004, p. 55), comenta que “o fundamento básico para definir o tipo de observação a ser utilizada no processo investigatório vai depender, fundamentalmente, da problematização, dos objetivos do estudo”. Nesse sentido, deve- se ser o mais descritivo possível e tomar cuidado com os chamados “vícios de observação”, que consiste basicamente, naquilo que o pesquisador espera encontrar no meio estudado. Figura 1. Escola Estadual de Atendimento Específico Mayara Redman Abdel Aziz 2. Apresentação dos resultados Após um primeiro contato com a direção da instituição, realizaram-se uma visita as instalações da Escola de Atendimento Especial Mayara Redman Abdel Aziz, mais precisamente para o CAS (Centro de Capacitação de Profissionais da Educação e de Atendimento às Pessoas com Surdez), que se localiza no primeiro andar do prédio. Com relação às instalações físicas, a escola possui salas amplas e arejadas, sendo que algumas possuem computadores e pontos de internet. Atualmente, a Biblioteca está desativada e percebem-se equipamentos eletrônicos em desuso, principalmente computadores, uma vez que o Estado limitou severamente os recursos financeiros da instituição, ao mesmo tempo em que restringiu o público freqüentador composto agora somente por profissionais da educação em atuação. Apesar disso, a gestora da escola, juntamente com a equipe pedagógica, procura criar projetos de parcerias com outras instituições de Manaus, na busca de recursos para a manutenção de suas atividades, como a do SEBRAE/AM, que realiza cursos de pintura voltados para alunos com deficiência auditiva e estudantes estagiárias. As falas da gestora e da estagiária, que nos acompanhou, mostram o seguinte panorama. “ Nós temos que nos virar com os poucos recursos existentes, para tentar dar conta da grande demanda por cursos, principalmente de LIBRAS, já que a procura por professores capacitados nessa língua não pára de crescer, e por isso, existe até lista de espera por vagas!!” – (gestora da escola) “Eu estou aqui já faz quase seis meses e auxilio os professores que ministram esses cursos, e vejo muitos estudantes com deficiências físicas que vem aqui pedir informações sobre realização de novos cursos, sempre querendo vagas para esses cursos”. – (estagiária da escola) Figura 2. Sala de Tecnologia e Adaptação de Material Didático Essas falas apontam a negligência do Estado em não oferecer suporte à qualificação dos sujeitos que irão trabalhar diretamente com portadores de necessidades especiais, evidenciando um grande descaso com a educação na cidade de Manaus. Por outro lado, o comprometimento dos funcionários em desenvolver um bom trabalho, apesar das condições adversas, mostra que o papel social destes torna-se fundamental no engajamento nas atividades sócio-educativas. 3. Conclusão O ato de incluir, não deve significar simplesmente matricular no ensino regular tais educandos, mas assegurar ao professor e à escola o suporte necessário à sua ação pedagógica. Para isso, toda a comunidade escolar deve estar preparada para receber esses estudantes, num processo de reformulação das práticas pedagógicas, com o intuito de combater ações discriminatórias. A proposta inclusiva inaugura uma nova etapa na educação mundial: a educação para todos, diante da construção de uma sociedade inclusiva. Trata-se, desta forma de um novo paradigma em ascensão e que deverá evoluir na direção de sua concretização plena, haja vista ser uma concepção que se desdobra em práticas produtivas, agregadoras, éticas, solidárias e respeitosas e que colaboram com o desenvolvimento da escola (GRANEMANN, 2005, p. 1). Dessa forma, entendemos que a qualificação dos docentes na educação inclusiva passa por espaços que possuem um mínimo de infra-estrutura necessária para implementação de cursos e palestras na área da educação especial, como LIBRAS, entre outros. E no caso de Manaus, o Estado deve operacionalizar as condições necessárias para um atendimento físico, social e educacional na Escola Estadual de Atendimento Específico Mayara Redman Abdel Aziz, para o público-alvo, no caso os docentes. 4. Referências AMARAL, Álvaro Cezar Araújo. Educação Especial: aplicabilidade das propostas preconizadas nas legislações. In: TREVISAN, Patrícia Fantinel & CARREGARI, Júlio. 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