A ESCALADA E SUAS POSSIBILIDADES DE INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR Fabrício Amaral de Souza1, Ronaldo Cesar Santos de Oliveira2 RESUMO Esse texto é uma reflexão sobre as aulas de educação física, do Instituto Federal do Espírito Santo (IFES), em Cariacica, no qual investiguei os limites e as possibilidades no trato/intervenção com o conteúdo escalada. Este conteúdo, por sua vez, não é comumente abordado nas escolas daí a importância de discuti-lo e analisá-lo com relação a aceitação dos alunos, as dificuldades com sua implementação e os benefícios trazidos com essa prática. Considerações iniciais Esse trabalho surgiu a partir das discussões e reflexões proporcionadas durante o Curso de Especialização em Educação Física, para a Educação Básica, realizado no Centro de Educação Física e Desportos, da Universidade Federal do Espírito Santo (CEFD/UFES). Através de trocas de experiências e discussões com os meus colegas de curso entendi que a escalada poderia ser utilizada como conteúdo da Educação Física, além disso, percebi o alijamento de conteúdos alternativos no contexto escolar, geralmente, em detrimento às práticas de conteúdos clássicos como, por exemplo, o futebol, o vôlei, o basquete e o handebol. Diante disso, decidi trabalhar este conhecimento – de forma a incorporá-lo ao conjunto de práticas pedagógicas da escola – e, também investigar quais os limites e as possibilidades no trato com a escalada nas aulas de educação física3 no Instituto Federal do Espírito Santo (IFES), de Cariacica /ES. A descrição da prática pedagógica nesse trabalho está circunscrita às aulas de educação física ministrada no IFES – Cariacica, com os alunos das turmas correspondentes ao 2º ano do ensino médio durante o segundo bimestre do ano letivo de 2010. A referida escola é utilizada para atender a demanda de alunos do ensino técnico integrado e médio, funcionando em um prédio de três andares cedido provisoriamente pela Prefeitura Municipal de Cariacica, situado no Bairro São Francisco, enquanto não concluída a construção das novas instalações definitivas, localizada no bairro Itacibá. Apesar de estar localizada em Cariacica, a maior parcela dos alunos acolhidos são oriundos de outros municípios da região Metropolitana da Grande Vitória4. Educação Física, cultura corporal e escalada: algumas aproximações 1 Esp., Mestrando, Bolsista FAPES, LAEFA/CEFD/UFES Esp. CEFD/UFES 3 Objetivando diferenciar sentidos para um mesmo termo, escrevo educação física referindo a disciplina escolar e Educação Física como o campo de conhecimento. 4 Compreendidos pelos municípios de Vitória, Vila Velha, Cariacica, Serra, Viana e mais recentemente Guarapari. 2 Ao tratar da escalada como conteúdo da Educação Física, julguei imprescindível buscar teorias que norteassem a minha prática pedagógica. Para tal, apresento uma sucinta discussão sobre esse tema. Inicialmente, concordamos com o Coletivo de Autores (1992, p.50) quando cita que a “[...] Educação Física é uma prática pedagógica, que, no âmbito escolar, tematiza formas de atividades expressivas corporais como: jogo, esporte, dança, ginástica, formas estas que configuram uma área de conhecimento que podemos chamar de cultura corporal”. A cultura corporal possui diversas manifestações que significam expressões concretas, históricas, modos de viver, de experienciar, de entender o corpo e o movimento e as nossas relações com o contexto (BRACHT, 2005). Ela integra a diversidade cultural desenvolvida pelo homem, e está incorporada à Educação Física nos seus conteúdos, tornando-se, um importante meio para conhecê-los, entendê-los, resgatá-los e reelaborálos, na medida do possível. As práticas corporais nas aulas de educação física, geralmente estão vinculadas a conteúdos que privilegiam modalidades esportivas tradicionais, como, por exemplo, o futebol, o vôlei, o basquete e o handebol. No entanto, há sinais de saturação e esgotamento, por parte dos alunos, desses temas tradicionais e hegemônicos que geram insatisfações e resistências no cotidiano escolar (OLIVEIRA, 1999). Diante disso, surge a questão: Não seria a escalada um conteúdo capaz de romper com dogmas pré-estabelecidos? Historicamente, a identificação da origem do esporte escalada não é consensual. Para certos autores a escalada tem suas origens no Alpinismo, para outros ela surge no início dos anos 1970, na Califórnia - EUA, em forma de um movimento liderado pelo chamado “Código de ética do Livre” (CORNELOUP, 1993 apud COSTA, 2004). Hoje é possível observar e distinguir com clareza os praticantes dos dois esportes. Entretanto, foram os adeptos do alpinismo que inventaram e difundiram as regras da nova versão, inclusive reconhece-se que a escalada teve suas origens no Alpinismo e que ela e o Alpinismo são hoje dois esportes distintos. Em meados de 1970, na Califórnia (EUA), a escalada ganhou mais conteúdos lúdicos, assumindo uma feição de jogo com algumas regras básicas que deram um novo sentido à prática desse esporte. Por meio de uma evolução tecnológica e técnica a escalada passou a adotar regras que sugerem a utilização mínima dos equipamentos, apenas para garantir a segurança do escalador. Nessa perspectiva, o ideal passa a ser a utilização do próprio corpo para vencer os obstáculos surgidos em uma escalada, denominada de “Escalada Esportiva”. Assim, os escaladores convencionam que para subir só poderiam utilizar os recursos da própria rocha, sendo os equipamentos destinados para segurança no caso de quedas e para rapelar (descer) as vias. Esse ideal de prática foi difundido e adotado pelos adeptos dos esportes de montanha (CORNELOUP, 1993 apud COSTA, 2004). O referido código de ética [...] substituiu os moralismos determinados historicamente pelo Alpinismo como também a ciência da cramponagem e a estética progressista da parede, pelo movimento puro. Este é aqui entendido como a arte de progredir sem o auxílio de meios artificiais, como o uso de equipamentos. A estética passou a ser definida no movimento. A superação e/ou realização pessoal começaram a ser encontradas em um pequeno bloco de pedra ou em uma estrutura artificial. Daí surgiram valores diferentes e deles competições e novos atores envolvidos somente com a prática Escalada (COSTA, 2004, p. 28). As mudanças na tradição causaram a divisão dos dois esportes, gerando muitos conflitos de adaptação e renovação. Na França, houve a resistência de muitos guias em aceitar esta nova prática. O principal motivo foi a ameaça ao mercado cativo de trabalho (STOLZENBERG, 1986). Antes, a formação dos profissionais de montanha se direcionava à aspiração de ser Guia de Montanha. Com o aparecimento deste “novo” esporte e um novo mercado de trabalho, a experiência de alta montanha deixou de ser imprescindível (COSTA, 2004, p. 28). A escalada é mais do que uma atividade de alto risco, praticada em ambientes extremos, por homens e mulheres de excepcional coragem e grande capacidade física, é cada vez mais, uma atividade urbana, uma atividade acessível a todos e de risco controlado. A Escalada hoje é produto de enormes transformações, onde especialmente a juventude afirma o seu gosto pela aventura, pelo desafio, pelo convívio e pela preferência do contacto com a natureza. Mais do que moda, trata-se de uma atitude sadia, ecológica e que preenche as lacunas que não se revêem, exclusivamente no desporto de competição ou de espectáculo. A sua prática oferece condições excelentes no domínio desportivo, quer no lúdico ou recreativo, quer no educativo enquanto actividade de lazer (VIDEIRA, 2008, p.1) E na escola, especialmente nas aulas de Educação Física, seria possível o ensino da escalada? Simões, Gomes e Oliveira (2008) dizem que [...] é necessário considerar a escola como um ambiente onde o aluno tenha a possibilidade de aprender, vivenciar e ‘saborear’, ao máximo, experiências que contribuam a sua formação e possibilitem a diversificação e a significação do conhecimento. Assim, seguindo a “trilha” apontada por esses autores passo a relatar como ocorreu a minha experiência com a escalada nas aulas de educação física do IFES As “vias”5 seguidas Apresentar as características do cenário em que acontece a prática pedagógica dos professores de Educação Física nesta escola é fundamental, pois, a localidade e a especificidade da mobilização e produção dos saberes da cultura pedagógica precisam estar concretamente relacionadas. Neste sentido, a breve descrição do contexto institucional e 5 Nomenclatura utilizada na escalada para identificar caminhos ou rotas à serem seguidas para se chegar ao cume de uma montanha ou ao fim de uma parede de escalada. profissional em que estamos inseridos irá considerar os condicionantes práticos que nos deparamos para desenvolver as nossas práticas pedagógicas. Nesta esteira, Tardif (2002) afirma que “[...] o magistério merece ser descrito e interpretado em função das condições, condicionantes e recursos que determinam e circunscrevem a ação cotidiana dos profissionais” (p. 116). A descrição sobre a forma de organização do trabalho pedagógico para o ensino da escalada está inserido no contexto de ensino da educação física nesta escola. Para isso, foi entendida a necessidade de construção coletiva, entre os professores de Educação Física dessa escola, um projeto pedagógico da Educação Física que pudesse enunciar as diretrizes pelas quais nos orientamos para fundamentar as nossas práticas pedagógicas. Os conteúdos das aulas de educação física no IFES “Cariacica” são tratados por meio da escolha de temas geradores e considerando a relevância sócio-cultural. A escolha do conteúdo escalada está inserido no tema de Jogos e Brincadeiras desenvolvido durante os dois últimos bimestres do corrente ano letivo. Entendo que o ensino da escalada estaria contemplando o princípio da contemporaneidade (SOARES, 1992). O ensino da educação física nesta escola está distribuído em três aulas consecutivas por semana para cada turma. Os objetivos de ensino foram traçados no sentido de permitir a socialização e ampliação do repertório de saberes dos alunos sobre os elementos da cultura corporal historicamente construída da escalada. Neste sentido, o ensino da escalada procurou contemplar tanto o repertório das técnicas corporais, o saber fazer, quanto ao ensino dos conteúdos formativos de valores e atitudes, o saber sobre o fazer. Os “saberes fazeres” foram delimitados em torno das técnicas de segurança e de utilização dos equipamentos. Quanto aos valores e atitudes foram selecionados o ensino do significado da ética, do mínimo impacto na natureza, do respeito ao próximo e da autoconfiança para vencer as limitações. Para operacionalizar a mediação entre os conteúdos e objetivos de ensino propostos aos alunos foi adotada a concepção de técnica corporal de Mauss (2003) para nortear o ensino da escalada. Este autor entende as técnicas corporais como artefatos culturais constituídos por montagens de série de atos de ordem fisio-psico-sociológicas. São atos montados não simplesmente pelo indivíduo, mas por toda a educação e sociedade da qual faz parte, conforme o lugar que nela ocupa. A técnica corporal constitui-se de um determinado instrumento indissociável de uma engrenagem simbólica sócio-histórica específica. Com estas idéias, podemos perceber que as técnicas corporais não são estáticas e imutáveis, mas inacabadas e carregadas de valores simbólicos de grupos sociais específicos. Neste sentido, o ensino das técnicas da escalada deve considerar tanto os aspectos simbólicos como a possibilidade de serem tratadas como produção de uma expressão dinâmica de cultura, isto é, a reelaboração dos saberes das técnicas corporais de escalada. Nesse sentido, o ensino das técnicas pretendeu considerar o conjunto dos modos de fazer e a tática como as razões do fazer (DAOLIO, 2008). Entendo que para facilitar o processo de apropriação das técnicas o ensino deveria partir de situações-problemas simplificadas do espírito do jogo da escalada6 para que os alunos, aos poucos, possam progredir ao aprendizado em situações mais complexas. A estrutura das aulas foi organizada com as seguintes rotinas: apresentação dos 6 No caso, concebemos o espírito do jogo (imaginário ou real) onde os sujeitos precisam utilizar o próprio corpo como meio para desenvolver técnicas e táticas para superar os obstáculos que estão postos na via (caminho) para alcançarem o seu fim. conteúdos, experimentação, aprendizagem, reelaboração. Na apresentação procurei estabelecer um diálogo com os alunos sobre o assunto proposto deixando-os expressar os saberes e experiências anteriores. Na experimentação coloquei uma situação de ensino para que os alunos pudessem vivenciar um conhecimento da escalada. Na aprendizagem convidei os alunos que apresentaram experiências bem sucedidas para solucionar as situações-problema aos colegas. Neste momento, abri um diálogo entre os alunos para que pudessem interpretar e refletir sobre os modos de fazer em função das razões do fazer. Na fase de reelaboração, os alunos retornaram a experimentação para reconstruir as técnicas e táticas segundo a situação-problema apresentada. Com esta estrutura de aula é fundamental que o professor permita a constante troca de experiências entre os alunos, tanto na fase de experimentação quanto nos momentos de reelaboração. Ao longo do processo, foi desenvolvido um costume nas turmas de fazer uma roda de diálogo no sentido de facilitar a comunicação entre eu e alunos e o controle dos objetivos a serem atingidos nas aulas. Para as avaliações do processo de ensino foi dada a ênfase na valorização das decisões em conjunto e na abertura para os alunos tomarem decisões e desenvolverem esquemas de aprendizagem autônoma e responsável dos conteúdos ensinados. Os termos ensino e a avaliação são entendidos como elementos complementares e interdependentes do ensino, onde os alunos também precisam aprender a tomar decisões, a mobilizar recursos e ativar os seus esquemas, isto é, a desenvolver competências (PERRENOUD, 2001). A avaliação é utilizada para atender, por um lado, o sentido burocrático da exigência escolar para a codificação da aprendizagem dos alunos em valores numéricos. Por outro, o sentido de reorganizar os objetivos do programa de ensino. Para verificar o quanto os alunos estavam se aproximando ou se afastando do processo ensinoaprendizagem foram adotados os seguintes instrumentos de análise: apresentações práticas das situações-problemas, testes escritos, os registros dos alunos e a auto-avaliação a partir de critérios previamente definidos para levar os alunos a refletirem sobre determinados aspectos do seu processo de formação (conhecimentos, atitudes e valores). Desafios e “conquistas”7 Analisando todo o processo pude perceber alguns limites. Numa síntese, posso apontar que esses se referiram, principalmente: a não participação de alguns alunos em determinadas propostas; receios, medos e inibição em participar de atividades que evidenciavam seus próprios movimentos; dispersão durante atividades individuais; certos pré-conceitos. Outro fator limitante está relacionado aos equipamentos de segurança e a sua utilização nas aulas, pois, são equipamentos de alto custo e de difícil manuseio, que exigiram um perfeito conhecimento técnico para garantir o sucesso e a segurança dos alunos. Por outro lado, senti dificuldades em estimular e orientar os alunos que não conseguiam participar das aulas, principalmente, diante da complexidade de alguns movimentos; de convencer aqueles que manifestaram certos pré-conceitos e resistências ao conteúdo; e, mesmo, certa dificuldade inicial de sistematização e organização da proposta na forma de um plano de ensino. 7 Termo utilizado quando um escalador constrói uma nova via para se chegar ao seu objetivo, o cume. Também, foram identificadas algumas contribuições para o processo de ensinoaprendizagem nas aulas de educação física, por meio desse conteúdo. Por exemplo, a apresentação dos equipamentos de escalada aos alunos nos pareceu uma estratégia muito interessante e rica em articulações e aprendizagens dos saberes/conhecimentos. Essa estratégia funcionou como tema disparador, proporcionando a elaborações de questões que direcionaram o planejamento das futuras aulas. As diferentes modalidades e técnicas de escalada, as questões éticas relacionadas ao mínimo impacto e ao respeito quanto autoria da conquista de uma nova via foram temas que surgiram dessa estratégia. Durante o processo, percebi um progressivo desenvolvimento da coletividade e a colaboração mútua entre os alunos, bem como da autonomia, criatividade, responsabilidade e persistência. A cada aula a superação de medos e individualismos e a vivência solidária, alegre e expressiva, com muitos momentos de incentivos e colaborações surgiram. Acredito que houve um processo de ensino-apredizagem contínuo em que, apesar de várias dúvidas e questionamentos, prevaleceu na maioria das vezes, o diálogo entre professor e alunos. Os estudos, as discussões e as reflexões realizados contínua e coletivamente em diferentes momentos da pesquisa/intervenção me possibilitaram sistematizar e compreender melhor a experiência e, ainda, questionar a propalada resistência dos alunos a conteúdos “inovadores”. A resistência, de certa forma é algo comum num processo ainda desconhecido. Por parte dos alunos, ela vem acompanhada de impactos e tensões, imbuída, neste caso, de préconceitos e limitações que de certa forma são construídos ao longo de suas vidas. A falta de um repertório maior de possibilidades de conteúdos da cultura corporal pode causar descontentamentos, insatisfações e resistências. Porém, as resistências são notórias ao mesmo tempo em que existe uma predisposição da parte dos alunos para conteúdos e aulas inovadoras. Uma pesquisa do Laboratório de Estudos em Educação Física - LESEF do CEFD/UFES, realizada entre 1997 e 1998, nas escolas estaduais do Estado do Espírito Santo que visou compreender o imaginário dos estudantes referente à Educação Física, constatou que [...] Entre os alunos do 1º grau, 42,7% entendem não ser necessária nenhuma mudança, contra 57,3% que ao contrário, almejam mudanças nas aulas de Educação Física (EF). Entre os alunos de 2º grau o nível de satisfação é um pouco menor (37,3%), contra 62,7% que estão insatisfeitos com suas aulas. O principal objeto do descontentamento é o conteúdo (21,7%), e isto, fundamentalmente na direção de que deveria haver um leque maior de atividades [...] Este aspecto é interessante porque indica o interesse do aluno em adquirir um amplo repertório esportivo ou dominar várias práticas do âmbito da cultura corporal de movimento o que é muitas vezes negado pelos professores (DIAS et al., 1999). São claras as referências a uma saturação, a um esgotamento, por parte dos educandos, a insistente especialização imposta pela exclusividade dos esportes de quadra, tradicionalmente adotados nas aulas de educação física, que, ainda hoje, geram resistências e insatisfações no interior da escola (OLIVEIRA, 1999). Dessa forma, cabe ao professor buscar novos conhecimentos que possibilitem trabalhar os conteúdos da cultura corporal, de forma prazerosa e estimulante, reconhecendo que diferentes práticas podem provocar a curiosidade e a participação dos alunos e, assim, contribuir para o processo de transformação de atitudes e de comportamentos, bem como para a aprendizagem de novos conhecimentos que contribuam para um autoconhecimento sobre seus limites e possibilidades. A Educação Física tem um saber-fazer constituído de vivências corporais, habilidades, mas também possui um saber-fazer onde está permeado de conhecimentos de diversas ordens. Desta maneira então cabe a Educação Física compreender e discutir os valores e significados que estão por trás das práticas corporais nas aulas (BRASIL, 2006). Nesta perspectiva, o professor e também os alunos tornam-se sujeitos do processo, pois compreendem dentro desta dinâmica os aspectos relacionados: ao saber, ao saber fazer e ao saber ser, pois fazem dos momentos vividos nas aulas artífices no processo (ação/reflexão) de protagonismo dentro de sua cultura. Quando isso acontece, os alunos deixam de ser meros participantes, sendo respeitados e autônomos, pois potencializam e acolhem os desafios advindos durante o processo de ensino e as resistências iniciais enfrentadas tornam-se momento de crescimento, tanto para alunos quanto para professores. Considerações finais Diante desse quadro noto, que a escalada pode possibilitar formas alternativas de trabalho nas aulas que permitam reflexões tanto dos educandos, quanto dos docentes. As reflexões em torno da construção dos saberes didático-pedagógico para o ensino da escalada na escola partiram da premissa de que esta é uma obra provisória e que deve ser socialmente (re)construída pelos interessados da área, os professores de educação física. Isto significa dizer que o nosso desenvolvimento profissional depende, por um lado, da organização sistemática do trabalho que desenvolvemos durante a prática cotidiana e, por outro, da reelaboração. Este texto teve a intenção de tornar pública a maneira singular e local que o processo de partilha de saberes se desenvolve entre professor e alunos de educação física no IFES - Cariacica. Estudar sobre os meus próprios saberes para ensinar a escalada nas aulas de educação física foi fundamental para refletir sobre as próprias possibilidades e limitações que enfrento no cotidiano escolar, mesmo porque os atores que constituem este espaço fazem-no tornar um campo contraditório com constantes conflitos internos que se tencionam mutuamente. A desvalorização social do magistério e da educação física faz parte de uma construção histórico-social a qual fazemos parte. A intervenção sobre esta realidade para transformá-la exige que os próprios profissionais da área mobilizem-se para tornar público os saberes articulados e operacionalizados para atuar neste espaço social. Percebo que as possibilidades do ensino da escalada nas aulas de educação física foram sendo percebidas na medida em que as aulas do ensino das técnicas eram trabalhadas em conjunto com o professor. A construção dos saberes para ensinar os alunos as técnicas utilizadas pelos escaladores foram se consolidando aos poucos quando percebi que havia elementos suficientes para planejar e experimentar com a própria turma. Enfim, posso concluir que, como professores de educação física poderíamos entender que a legitimação e a autonomia pedagógica da área são construídas no processo de reflexão e reelaboração dos saberes profissionais que mobilizamos e operacionalizamos para ensinar na escola e a escalada pode/deve ser um instrumento para isso. Referências BRACHT, V. Educação Física e Aprendizagem Social. Porto Alegre: Magister, 1992. ______. Cultura corporal, cultura de movimento ou cultura corporal de movimento? In: SOUZA JUNIOR, M. (org.). Educação Física Escolar: teoria e política curricular, saberes escolares e proposta pedagógica. Recife: EDUPE, 2005. BRASIL. Secretaria de Educação Básica. Orientações curriculares para o ensino médio. Linguagens, códigos e suas tecnologias. 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