A Questão das Notas Fiscais das Agências de Viagens É sabido que as agências de viagens auferem comissão pelo trabalho de intermediação entre o usuário e as empresas de viagem ou de hotelaria. Por tradição, quando o usuário adquiria, por exemplo, uma passagem aérea através de uma agência de viagem, a empresa aérea seria responsável pelo pagamento da comissão da agência e, para tanto, essa agência emitiria uma nota fiscal contra a companhia aérea, referente ao valor da comissão a que tinha direito. O art. 27 da Lei federal nº 11.771, de 17 de setembro de 2008, que trata da Política Nacional de Turismo, define agência de turismo (ou de viagem) a pessoa jurídica que exerce a atividade econômica de intermediação remunerada entre fornecedores e consumidores de serviços turísticos ou os fornece diretamente. E de acordo com o § 2º do mesmo artigo, o preço do serviço de intermediação é a comissão recebida dos fornecedores ou o valor que agregar ao preço de custo desses fornecedores, facultando-se à agência de turismo cobrar taxa de serviço do consumidor pelos serviços prestados. Sendo assim, era fácil entender que a agência deveria emitir nota fiscal apenas do valor comissionado, deixando a cargo da empresa aérea, da operadora de turismo ou da rede hoteleira a emissão da nota fiscal correspondente aos seus próprios serviços. Ocorre que as companhias aéreas resolveram transferir para os passageiros o custo da comissão, instituindo a chamada Taxa de Repasse a Terceiros por Agenciamento de Viagem (Taxa DU). Assim, quem passou a pagar a comissão da agência foi o passageiro, sendo a DU inserida no preço da passagem. Tal decisão deu início em 2007, por meio de um acordo entre a ABAV (Associação Brasileira de Agências de Viagens) e a TAM. A ideia logo se espalhou por todas as empresas aéreas que a acolheram, é claro, porque transferir custos para os passageiros é sempre uma boa ideia. Neste teor, as empresas aéreas deixaram de exigir a nota fiscal das agências, pois, na verdade, não seriam mais as empresas aéreas as tomadoras de tais serviços, mas, sim, os usuários. E estes, ou não exigiam nota fiscal, ou entendiam que a comprovação do pagamento total estava contida no bilhete da passagem, discriminando o valor da passagem e as tarifas. O resultado é que muitas agências deixaram de emitir nota fiscal, não por que visavam sonegar, mas por não ter mais que emiti-las simplesmente, segundo imaginavam. Todavia, com o advento da nota fiscal eletrônica a situação ficou complicada. Não podiam mais escapar da emissão, pois a evidência do fato seria imediatamente constatada pelo Fisco Municipal, ajudado pelas declarações www.consultormunicipal.adv.br Rua Comendador Manuel Azevedo Falcão, 112, Niterói, RJ CEP 24.358-390 Tel: (21) 2709-8329; 2619-4161 eletrônicas de serviços prestados e tomados. Em diversas cidades uma enxurrada de notificações fiscais abateu sobre as agências. Verdade se diga que as agências já vinham sofrendo impiedosa concorrência na venda de passagens, pelas próprias companhias aéreas com suas vendas diretas via internet. Quando o passageiro compra diretamente a passagem pelo site da empresa aérea, não paga a tal taxa DU, pois não houve intermediação de agência. Por isso, as agências tentam sobreviver agregando serviços para seus clientes, com a personalização do atendimento, vendendo “pacotes” de serviços, recepção nos aeroportos, traslados e outros rapapés. Mas, voltando ao assunto da nota fiscal, diante da complicada situação as agências estabelecidas na cidade de São Paulo resolveram protocolar consulta ao Fisco daquele Município, indagando o seguinte: “É legalmente cabível na espécie objeto da consulta, a emissão de uma nota fiscal pela consulente no montante total dos serviços de intermediação de turismo diretamente ao tomador final dos serviços, deduzindo da base de cálculo do ISS o valor correspondente aos serviços prestados pelo terceiro prestador?” “Se cabível a questão formulada no item anterior, o terceiro prestador deverá emitir uma nota fiscal contra a consulente referente ao valor deduzido, para fechar a cadeia tributária?” Explicando: poderia a agência emitir a nota fiscal sobre o valor total (incluindo, assim, o preço da passagem, a diária do hotel etc.), e deduzir, para efeito de incidência do ISS, os demais valores, deixando apenas o valor da comissão efetivamente recebida pelo serviço de intermediação? Se fosse possível, a companhia aérea, o hotel, a operadora de turismo emitiriam nota fiscal pelo valor do serviço prestado (aquele que foi deduzido na nota fiscal da agência), destinada ao tomador final do serviço. Importante ressaltar que a consulta foi mais direcionada aos serviços de hotelaria, mas é possível estender a resposta às operações de venda de passagens e pacotes de turismo das operadoras. A resposta do Fisco paulistano foi negativa. Na Solução de Consulta SF/DEJUG nº 53, 13 de agosto de 2012, conforme Processo Administrativo nº 2012-0.014.445-3, o Diretor do Departamento de Tributação e Julgamento respondeu o seguinte: “A consulente deverá emitir Nota Fiscal de Serviços Eletrônica – NFS-e relativa aos serviços de intermediação aos hotéis”. www.consultormunicipal.adv.br Rua Comendador Manuel Azevedo Falcão, 112, Niterói, RJ CEP 24.358-390 Tel: (21) 2709-8329; 2619-4161 “Neste caso, os hotéis deverão emitir Nota Fiscal de Serviços aos clientes finais, relativa ao serviço de hospedagem, sendo que o preço do serviço deverá incluir a comissão”. Na referida Consulta, foi dado o seguinte exemplo numérico: A agência fez a reserva no hotel para determinado hóspede no valor total de R$1.000,00, sendo que a importância de R$200,00 refere-se à comissão da agência, e o valor de R$800,00 refere-se às diárias do hotel. A agência queria emitir nota fiscal de R$1.000,00, discriminando a natureza dos serviços, e destacar o valor de R$200,00 para ser tributado pelo ISS. O Fisco Municipal esclareceu que a agência é obrigada a emitir nota fiscal apenas de R$200,00 e o hotel, como vai cobrar o valor integral do hóspede, deve emitir nota fiscal de R$1.000,00, sendo este o valor total para incidência do ISS. Deste modo, pode parecer em princípio que está havendo uma bitributação do ISS relativa às comissões auferidas pela agência. Esta vai pagar o imposto pelos R$200,00 e o hotel também. Da mesma forma, tal fato ocorreria com passagens aéreas e operadoras de turismo. Porém, as empresas aéreas não recolhem ISS, e, sim, ICMS (não vou entrar no mérito se as empresas aéreas pagam ICMS também pela taxa DU ou a deduzem do valor tributável). Já as operadoras de turismo são contribuintes do imposto municipal e, portanto, terão de emitir nota fiscal em função do preço total do serviço, o que incluiria a comissão das agências. Está aí mais um exemplo de que o ISS é um imposto cumulativo. Na verdade, o serviço de intermediação das agências não deixa de compor o custo do prestador do serviço final, embora este repasse o custo ao usuário do serviço. E custo não se deduz da base de cálculo do ISS. Uma solução, talvez mais apaziguadora, seria a agência emitir a nota fiscal em nome do usuário final e enviá-la ao prestador do serviço. E este, quando efetuasse a cobrança, entregaria ao usuário a sua própria nota fiscal, sem incluir a comissão, e entregaria, também, a nota fiscal da agência. Esta solução, porém, seria extremamente complicada em sua operacionalidade, embora perfeitamente legal, pois a agência é um mero intermediador e não atua como representante do prestador final. Ou seja, o serviço de um intermediador pode ser remunerado por qualquer uma das partes envolvidas, tanto quem oferece o serviço quanto quem o toma. A piorar a situação, há também o problema do local de incidência. Assim, por exemplo, se uma agência da cidade de São Paulo “vende” hospedagem num hotel de Fortaleza, a agência vai recolher o ISS em São Paulo, e o hotel em Fortaleza. Mas, se o hotel emite nota fiscal pelo total, Fortaleza, por certo, vai querer o recolhimento integral do ISS, inclusive sobre a comissão da agência. Será que o Fisco de Fortaleza aceitaria uma declaração do hotel de que o valor da comissão será recolhido em São Paulo? www.consultormunicipal.adv.br Rua Comendador Manuel Azevedo Falcão, 112, Niterói, RJ CEP 24.358-390 Tel: (21) 2709-8329; 2619-4161 Este é um assunto que deve ser examinado com o devido cuidado. Em relação ao ISS, nada é mais ilegal, cruel e injusto como a cobrança em duplicidade. Não se trata de bitributação, que se justifica pela cumulatividade, mas pagar duas vezes o imposto em função do local do estabelecimento e local da prestação, isto, sim, é incabível. Roberto A. Tauil Agosto de 2013 www.consultormunicipal.adv.br Rua Comendador Manuel Azevedo Falcão, 112, Niterói, RJ CEP 24.358-390 Tel: (21) 2709-8329; 2619-4161