Doutor e Palhaço José Lopes – Trechos da entrevista de Patch Adams à revisa Veja Quem vê o médico americano Patch Adams com nariz de palhaço e cabelos coloridos pode achar que ele acabou de sair de um circo. É quase isso. Há três décadas, Adams transforma os quartos dos hospitais que visita em um verdadeiro picadeiro. Sua especialidade é animar pacientes com brincadeiras para reduzir o sofrimento deles. A vida de Adams foi retratada em 1998 no filme O Amor É Contagioso, com o ator Robin Williams no papel principal, e serviu de inspiração para o surgimento de vários grupos doutores da alegria, espalhados pelo mundo. O médico é autor de três livros, dois deles publicados no Brasil. Neles, Adams defende sentimentos como humor, compaixão, alegria e esperança no tratamento de pacientes e diz que o medo que os médicos têm de cometer erros destrói a relação médico-paciente. Aos 58 anos, Adams dirige o Instituto Gesundheit (saúde, em alemão), nos Estados Unidos, que atende pacientes de graça. Também dá palestras e cursos em vários países. Veja – O filme O Amor É Contagioso mostra o senhor como um médico que se preocupa muito com os sentimentos dos pacientes. O senhor sempre foi assim? Adams – Nem sempre. No fim da adolescência, não me preocupava com ninguém. Devido à morte de meu pai, ao suicídio de um tio muito querido e ao fim de um namoro, comecei a ficar obcecado pela idéia de morrer. Cheguei a tomar vinte aspirinas de uma só vez, tentei pular de um precipício. Até que um dia pedi a minha mãe que me internasse em um sanatório mental. Lá, conheci gente que estava tão pior que eu que fez minha dor parecer trivial. Eram pessoas que sempre viveram com raiva e desespero. Essa experiência me fez perceber quanto as emoções podem influenciar em nossa vida, seja de forma positiva ou negativa. A partir de então, comecei a dar mais importância aos sentimentos das pessoas. Veja – Em seu livro A Terapia do Amor, o senhor diz que os médicos, em sua maioria, se sentem como se fossem deuses. Adams – Na verdade, é a sociedade que exige do médico que ele aja como se fosse um Deus. Espera-se que ele faça milagres e não erre nunca. Isso é impossível. Como todo ser humano, o médico pode errar. Essa idéia de que o médico tem de ser perfeito também prejudica a relação com o paciente. Faz com que este coloque toda a responsabilidade do que ocorre com ele nas mãos do médico. E isso é errado. O paciente é mais responsável pela própria recuperação do que o médico que o está tratando. Barbacena, 8 de Outubro de 2008. Doutor e Palhaço José Lopes – Trechos da entrevista de Patch Adams à revisa Veja Veja – Como assim? Adams – A maioria dos problemas de saúde ocorre por causa do estilo de vida inadequado do paciente, pelo sedentarismo e pela má alimentação. O médico geralmente só é procurado quando a doença já está em estágio avançado. O grande problema é acreditar que a medicina e a ciência têm a resposta para todos os nossos problemas. Não é verdade. Muitas vezes, a solução está em casa, nos pequenos hábitos do dia-a-dia. Veja – Que conselhos o senhor daria para os médicos se tornarem melhores profissionais? Adams – Medicina envolve relacionamento entre médico e paciente. Um bom médico é aquele que sabe cultivar essa relação por meio da troca de experiências, amizade, humor, confiança. Se existe desconfiança de um dos lados, essa relação vai por água abaixo. O grande problema da medicina é que os profissionais da saúde se sentem cobrados demais, acumulam várias funções e acham que não são devidamente recompensados por isso. A possibilidade de haver processos contra erros apavora os médicos, e a desconfiança destrói a relação médico-paciente. Veja – Em seus livros, o senhor diz que as pessoas não deveriam ter medo da morte. Pelo contrário, poderiam fazer dela uma diversão. Mas lidar com a morte quase nunca é fácil. Como é possível lidar com a morte com menos sofrimento? Adams – Na vida, temos de fazer escolhas. Se não há como mudar o rumo dos acontecimentos, podemos optar por vivenciar cada momento de uma forma alegre, agradecendo por tudo de bom que tivemos durante a vida, por nossa família e nossos amigos. Ou, então, achar que a vida não valeu nada, ver só o lado negativo das coisas, esquecer tudo de bom que nos aconteceu até hoje e morrer de forma miserável. Morrer é uma das poucas coisas que ocorrem com todo mundo, mas quase ninguém suporta pensar nisso. O que estou sugerindo é que a morte não precisa ser exatamente uma experiência horrenda. Barbacena, 8 de Outubro de 2008. Doutor e Palhaço José Lopes – Trechos da entrevista de Patch Adams à revisa Veja Veja – Não é difícil fazer palhaçadas para um paciente que vai morrer no dia seguinte? Adams – Não, porque é o próprio paciente que opta por isso. Eu sempre pergunto: "O que você quer? Você quer ser miserável ou você gostaria de se divertir e ter momentos de alegria?" Se ele quer se sentir miserável no leito de morte, que seja miserável. Se ele não quer ser miserável, nós podemos brincar e rir com ele. É gratificante poder fazer algo de positivo para os pacientes, mesmo os terminais. Barbacena, 8 de Outubro de 2008.