ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental
III - 002
EMPREGO DO BALANÇO DE MASSA NA AVALIAÇÃO DO
PROCESSO DE DIGESTÃO ANAERÓBIA DOS RESÍDUOS
SÓLIDOS URBANOS
Valderi Duarte Leite(1)
Professor - UEPB Graduação: Engenharia Química - UFPB Mestrado:
Engenharia Civil - UFPB Doutorado: Hidráulica e Saneamento - Escola de
Engenharia de São Carlos - USP.
Jurandyr Povinelli
Professor Titular do Departamento de Hidráulica e Saneamento da Escola
de Engenharia de São Carlos - USP Doutorado: Hidráulica e Saneamento Escola de Engenharia de São Carlos - USP Função Administrativa: Diretor
da Escola de Engenharia de São Carlos - USP.
Virgínia Raquel C. Vazquez
Aluna de pós-graduação do Departamento de Hidráulica e Saneamento da Escola de
Engenharia de São Carlos - USP.
Endereço(1): Rua Vigário Calixto, 1475 - Bairro do Catolé - CEP: 58104-485 - Tel: (083)
337-2793 - e-mail: [email protected].
RESUMO
O emprego do balanço de massa pode ser utilizado como um instrumento de avaliação do
processo de bioestabilização anaeróbia da fração orgânica dos resíduos sólidos urbanos. Para
isto, são necessários a definição de critérios para o monitoramento do sistema e a utilização de
métodos analíticos adequados e representativos. Neste trabalho foi realizada a caracterização
física e físico-química da massa “in natura” compreendendo: fração orgânica dos resíduos
sólidos urbanos, lodo de esgoto sanitário e substrato ; da massa acumulada e da massa efluente
em suas frações líquidas e gasosas. Os resultados da pesquisa, demonstram a viabilidade de se
utilizar o balanço de massa, objetivando principalmente a determinação de modelos para o
controle e avaliação do processo.
PALAVRAS -CHAVE: Balanço de Massa, Resíduos Sólidos, Inoculo, Substrato,
Anaeróbio.
INTRODUÇÃO
O emprego do balanço de massa leva em consideração o princípio da conservação da massa:
“a massa de um sistema fechado permanece constante durante os processos que nele ocorrem”.
Considera-se que a massa alimentada durante o intervalo de tempo a um sistema aberto é igual
à massa que sai, mais a massa que ficou acumulada no sistema durante o intervalo de tempo
considerado. O balanço de massa pode ser aplicado para reatores operando com alimentação
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contínua, semi-contínua ou em batelada, tratando substratos sólidos, semi-sólidos ou líquidos.
De modo simplificado, a equação que expressa o balanço é a do tipo:
Massa que Entra no Sistema - Massa que Sai do Sistema - Massa Acumulada no
Sistema = 0
(Eq. 1.1)
Os procedimentos básicos utilizados para a determinação da massa em substratos de natureza
sólida e líquida são diferentes. Desejando-se expressar o balanço de massa em termos de
massa de DQO, para resíduos sólidos urbanos, recomenda-se: 1) Determina-se a DQO do
Resíduo Sólido Urbano; 2) Conhecendo-se a DQO do resíduo sólido urbano, determina -se a
massa de DQO do resíduo sólido urbano à ser tratado, considerando-se neste caso o método
preconizado na determinação da DQO. Então, tratando-se de resíduo sólido urbano, o balanço
de massa pode ser realizado, empregando-se a equação 1.2.
Massa de DQO afluente - Massa de DQO efluente = Massa de DQO acumulada
(Eq. 1.2)
Considera-se que as diversas frações de massa envolvidas no processo estão submetidas ao
mesmo tempo de operação dos reatores. A base de cálculo recomendada pode ser o
quilograma, respeitando-se, portanto, a escala dos reatores utilizados. No caso específico deste
trabalho, a massa de DQO efluente, compreendia duas frações distintas, a saber: 1) Massa de
DQO do percolado, produzido pelo processo de bioestabilização anaeróbia da matéria
orgânica. 2) Massa de DQO convertida em gás CH4, denominada também de massa de DQO
transformada. A massa de DQO do percolado foi determinada utilizando-se a equação 3.1.
Massa de DQO do percolado = Volume do percolado produzido x Concentração de
DQO no líquido percolado
(Eq. 1.3)
A massa de DQO transformada foi determinada utilizando-se a equação 1.4.
Massa de DQO transformada = Massa de DQO afluente - Massa de DQO acumulada
- Massa de DQO do percolada
(Eq. 1.4)
METODOLOGIA
O trabalho foi realizado utilizando-se como substrato a ser tratado à fração orgânica dos
resíduos sólidos urbanos inoculada com lodo de esgoto industrial. O sistema experimental foi
instalado e monitorado nas dependências do Laboratório de Processos Anaeróbios do
Departamento de Hidráulica e Saneamento da Escola de Engenharia de São Carlos - USP.
O trabalho foi realizado, utilizando-se 04 reatores com volume unitário de 50 L. O
monitoramento dos reatores baseou-se nas caracterização físico-química do material afluente,
efluente e acumulado em cada reator. Foram monitoradas as frações sólidas, líquidas e gasosas.
Nas análises realizadas, utilizou-se os métodos preconizados pelo Standard Methods for
Examination of Water and Wastewater, 18 th ed. Washington, APHA - AWWA - WPCF,
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1992. Nas Tabelas 01 e 02 são apresentados os parâmetros operacionais dos reatores e as
características físico-químicas da massa “in natura” alimentada aos reatores.
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TAB. 01 - Parâmetros operacionais dos reatores.
Parâmetro /
Reator
A
B
C
D
Percentagem de
Inoculo (%)
0,0
9,2
18,3
43,6
Teor de
Umidade (%)
70,3
70,6
70,6
70,7
Massa Total (kg)
32,0
31,3
31,3
30,5
Tempo de
Operação (dias)
645,0
645,0
570,
570,0
TAB. 02 - Características físico-químicas da massa “in natura” alimentada aos
reatores.
Parâmetro
/ Reator
A
B
C
D
pH
STV (%)
7,5
6,8
6,5
8,0
47,64
45,45
43,87
44,71
DQO
(mg.L-1)
1010,0
800,0
830,0
1110,0
C:N
20,35
18,03
15,23
11,82
Massa de
DQO (g)
3078,0
2003,0
2471,0
2259,0
g.DQO.kg-1RSU
324,0
218,0
268,0
253,0
RSU = Resíduos Sólidos Urbanos.
RESULTADO E DISCUSSÃO
Na Tabela 03, são apresentados os valores da massa de DQO afluente, efluente, acumulada e
transformada em cada reator. A massa de DQO transformada foi determinada utilizando-se a
equação 1.4.
TAB. 03 - Valores das diversas frações de Massa de DQO.
Parâmetros /
Reator
A
B
C
D
Massa de DQO
afluente (g)
3078,0
2003,0
2471,0
2259,0
Massa de DQO
efluente (g)
449,73
406,56
357,00
121,00
Massa de DQO
acumulada (g)
737,67
586,86
632,72
557,23
Massa de DQO
transformada (g)
1890,60
1009,58
1481,28
1580,77
Na Figura 01, observa-se o diagrama de fluxo do balanço de massa de DQO para o reator D.
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MASSA DE RESÍDUO
“IN NATURA”
30,52 kg
29,30% ST
MASSA DE SÓLIDOS
TOTAIS
8,94 kg
30,5% DQO
MASSA DE DQO
EFLUENTE
0,136 kg
5%
MASSA DE DQO
APLICADA
2,72 kg
25%
MASSA DE DQO
ACUMULADA
0,680 kg
70%
VOLUME DE
CO2
639,69 L
51,5%
MASSA DE DQO
TRANSFORMADA
1,90 kg
MASSA DE
CO2
1,26 kg
48,5%
VOLUME DE
CH4
618,46 L
MASSA DE
CH4
0,444 kg
Massa de DQO (APLICADA)
Massa de DQO (PROCESSADA)
2,72 kg
2,72 kg
Massa de DQO (TRANSFORMADA)
Massa de (CH4 + CO 2)
1,90 kg
1,70 kg + MRESIDUAL
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FIGURA 01- Diagrama de fluxo do balanço de massa de DQO para o reator D.
Na Figura 02 é representado o comportamento da eficiência da transformação da massa de
DQO em função da percentagem (em peso) de inoculo utilizado na preparação do substrato.
80,00
Massa de DQO (%)
Eficiência de Transformação de
100,00
60,00
40,00
y = 0,2859x + 55,094
R2 = 0,473
20,00
0,00
0,0
10,0
20,0
30,0
40,0
50,0
Percentagem de Inóculo (%)
FIGURA 02 - Comportamento entre eficiência de transformação de massa de DQO e
percentagem (em peso) de inoculo.
20
20
18
18
16
16
14
14
AGV (g .L -1)
AGV (g .L -1)
Observa -se que a eficiência de transformação de massa de DQO foi diretamente proporcional
a percentagem (em peso) de inoculo utilizado na preparação do substrato. LEITE (1996),
constatou que a eficiência de transformação de massa de DQO é função do percentual de
inoculo (lodo de esgoto sanitário) utilizado na preparação do substrato, fato este explicado
possivelmente por uma melhor distribuição granulométrica do substrato e a um aumento
acentuado da flora de microrganismos metanogênicos. Ratificando estas constatações, observase na Figura 03 a presença de estreitas correlações entre DQO, Ácidos Graxos Voláteis e
Percentagem de Metano no Biogás.
12
10
r = 0,97
8
6
r = -0,71
10
8
6
4
4
2
0
1,50
12
2
2,50
3,20
7,60
19,20
52,80
0
0,00
DQO (g .L -1)
0,00
9,68
37,94
45,30
52,57
CH4 (% V/V)
FIGURA 03 - Correlação entre DQO e ácidos graxos voláteis, ácidos graxos voláteis e
percentagem de CH 4 no biogás - Reator D.
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Analisando a Figura 03, constata-se que a concentração de DQO é diretamente proporcional a
concentração de ácidos graxos voláteis, enquanto a percentagem de metano no biogás é
inversamente proporcional a concentração de ácidos graxos voláteis no percolado. Isto se deve
aos mecanismos envolvidos no processo de bioestabilização da matéria orgânica realizada pelas
interações entre bactérias hidrolíticas - fermentativas, bactérias acidogênicas, bactérias
acetogênicas e bactérias produtoras de metano. O comportamento da massa de DQO
transformada pode ser representado por uma função exponencial do tempo, resultando em um
modelo do tipo.
MDQOTRANSF. = MDQOAFLUE. ? e-kt (1.5)
Onde: MDQOTRANSF. = Massa de DQO transformada (g)
MDQO AFLUE. = Massa de DQO afluente (g)
k = Constante de bioestabilização de 1 a ordem (dia -1)
t = Tempo de operação (dias)
Trabalhando-se com a fração orgânica de resíduos sólidos urbanos inoculada com lodo de
esgoto sanitário em reatores anaeróbios de batelada com escala de até 50 L, o k estimado foi
de 8,3 x 10- 4 dia-1.Conhecendo-se a massa DQO transformada é possível estimar a produção
de metano resultante do processo de bioestabilização da matéria orgânica. Neste trabalho
foram obtidas as seguintes taxas de produção de metano: 0,20 ; 0,50 ; 0,42 ; 0,33 NLCH4 . g1
DQO TRANSF., para os reatores A, B, C e D respectivamente, com tempo de operação
variando de 570 a 645 dias.
CONCLUSÃO
Empregando-se o balanço de massa, é possível estimar a eficiência de transformação de massa
DQO no sistema e sua respectiva taxa de produção de metano. Neste trabalho, pode-se
concluir ainda que:
?
?
para escala de reatores de até 50 L, é viável o emprego do processo de tratamento
anaeróbio da fração orgânica putrescível dos resíduos sólidos urbanos inoculada com lodo
de esgoto sanitário ;
que ficou evidenciada a viabilidade de se tratar anaerobiamente à fração orgânica dos
resíduos sólidos urbanos, utilizando-se como agente catalisador do processo lodo de esgoto
sanitário na proporção média de 20% em peso da massa de resíduo a ser tratada.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1.
APHA - AWWA - WPCF. Standard Methods for Examination of Water and
Wastewater, 18 th ed., Washington, 1992.
2.
LEITE, V. D. et al. Tratamento de resíduos urbanos mais lodo de esgoto sanitário,
XXV Congresso Interamericano de Ingenieria Sanitária y Ambiental, México, D.F. 1996.
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