Seminário LEITURA EXTENSIVA EM PORTUGUÊS LÍNGUA NÃO MATERNA Ana Sousa Martins Lisboa, FCSH - 23 de julho de 2015 I. REVISÃO DA LITERATURA A leitura é a competência mais duradoura e a que se desenvolve logo nos primeiros estádios de aprendizagem de uma L2. Pré-requisitos: ● automatizado o processo de decodificação, adquirido o vocabulário mais frequente; ● assimilados os padrões sintáticos mais regulares. Leitura extensiva em L2? Larga exposição a input compreensível. ≠ desenvolver hábitos de leitura ou instigar ao prazer da leitura junto do aprendente de L2: → Pressupõe-se, em geral, que a competência de leitura: estratégias de inferência, habilidade na projeção de hipóteses de desenvolvimento da informação/ação, etc. Leitura extensiva em L2? • Objetivo: promover a aprendizagem da L2 usando a motivação gerada por uma boa história, um relato interessante ou um ensaio sobre um tópico de relevo, uma biografia sobre uma personalidade marcante, etc. Benefícios • Aumento da fluência de leitura (automatização no reconhecimento de palavras); • Aumento significativo do vocabulário de receção e da consolidação de vocabulário parcialmente conhecido (Nation e Wang, 1999; Waring e Takaki, 2003); Benefícios • Aceleração da deteção de regularidades morfológicas; • Aumento da qualidade do desempenho no processamento sintático; • Reflexos positivos no desempenho da escrita, designadamente, na ortografia, estilo e domínio da gramática (Krashen, 1993). Particular vantagem • Forma de aprendizagem de língua em que o objetivo central é o apuramento do sentido do texto: – Perceber o que o texto diz: criar um modelo mental a partir de proposições ordenadas; – Perceber de que é que o texto trata: criar modelos situacionais de entorno do que é dito (relação entre schemata e scripts na compreensão). II. CRITÉRIOS DE SELEÇÃO DE OBRAS • Para a leitura autónoma poder ter lugar, o aprendente tem de deter um vocabulário de receção/reconhecimento de cerca de 5000 famílias de palavras mais frequentes (Scherer, op. cit in Schulz, 1981); • Os aprendentes necessitam de 98% de cobertura de vocabulário num texto para poderem compreender o seu sentido sem equívocos (Hu e Nation, 2000). Que textos? • A leitura de textos não adaptados requer do aprendente um volume de vocabulário de receção de aproximadamente 7000 a 9000 famílias de palavras (Nation, 2006). Que textos? • PORÉM: – capacidade limitada de processamento; – o reduzido acesso a estruturas sintácticas complexas; – desconhecimento de elevado número de palavras; – o distanciamento conceptual e cultural face ao comunicado. Que textos? • CONSEQUÊNCIA: Grande investimento de tempo e esforço: consulta frequente do dicionário; pausas longas e na constante desagregação da apreensão mental de agregados de sentido do texto. 1- Textos simplificados (breve historial) • Anos 30 (com repercussões mais notórias na década de 60 e 70): aplicação sistemática de princípios de simplificação textual a textos institucionais e jornalísticos: - recurso a vocabulário de alta frequência; - frases curtas, sem estruturas encaixadas; - voz ativa. Exemplos (1) • Exército (Marinha) nos EUA (anos 70): encomenda um estudo de avaliação/aferição do grau de lisibilidade dos textos emanados por esta instituição. • Segue-se a aplicação deste estudo ao ensino superior tecnológico (produção de sebentas e manuais). Exemplos (2) • Em alguns estados dos EUA, as apólices do seguro automóvel têm de estar escritos de modo a serem lisíveis por um público com capacidade de leitura similar à dos estudantes com 9 anos de escolaridade (14/15 anos). Generalização • Progressivamente, nos países anglófonos, a exigência de clareza e brevidade na escrita institucional percorreu rapidamente todas as áreas da vida pública: Governo, Indústria, Comércio, Saúde, Justiça, Jornalismo. • Pressuposto: todo o cidadão tem direito a lidar diretamente com a administração estatal e instituições públicas e privadas e, como tal, os textos emanados por estas instituições devem estar escritos de modo claro, direto, breve e sem recurso a jargão. Avaliação a lisibilidade? (textos institucionais) ● Fórmulas de lisibilidade: → Para o inglês: Flesch Reading Ease Score (1948) ou o SMOG Grading Formula (1969). → Para o alemão: o Lix (1968). → Para o espanhol: Fórmula de Lecturabilidad de Fernández-Huerta (1959). → Para o português do Brasil: o TextMeter http://www.lazarusbrasil.org/textmeter.php Contraexemplos (1) Em carta emanada do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), após pedido de registo de marca: «Motivo da recusa: A falta de capacidade distintiva do sinal registando tal como previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 223.º e alínea b) do n.1 do artigo 238.º do CPI.» Contraexemplos (2) Cartaz informativo em Centros de Saúde: «Artrose: pode provocar claudicação.» Aplicação ao ensino Textos adaptados? («Adaptado»/«simplificado»/«modificado») Livros produzidos especificamente para serem lidos por aprendentes de uma língua segunda e têm como características básicas principais a redução do vocabulário e o controlo da sintaxe. Aplicação ao ensino • Textos adaptados: muito populares para o inglês europeu; pertencem hoje à indústria editorial dos materiais de ensino do EN. – Oxford University Press, a Cambridge University Press, a Penguin, a Macmillan oferecem adundantes séries de livros de leituras adaptadas para diferentes níveis – 3182 títulos de livros adaptados: base de dados do Edingurg Project on Extensive Reading (1997) Outras línguas • Espanhol (desde 1987), nas editoras Edelsa, Santillana e Espasa. • Francês (Hachette- Français Langue). • Russo (Biblioteka Zlatoysta). • Japonês (White Rabit Press). Instrumentos ● Rewordify: http://rewordify.com/ ● Reescreve: https://beta.openaire.eu/search/publication?articleId=od ______1714::59bcdd32a39eba7a58d5d31ea69b03c3 ● Wordsmith: http://www.lexically.net/wordsmith/ Exemplo de aplicação: http://users.janssenweb.com/anamartins/?page=vocab& text=1&show=full Textos adaptados: 3 tipos • (i) Textos originais encurtados (abridged texts), sobre os quais apenas se operam supressões de material considerado idiossincrático ou periférico ao enredo ou à intenção comunicativa global. Textos adaptados: 3 tipos • (ii) Textos reescritos (graded readers); • (iii) Textos originais: produzidos originalmente para servirem de material de leitura a aprendentes de uma L2 (pedagogic readers). Avaliação de lisibilidade (textos de leitura extensiva) • Orientações das editoras: – listas graduadas de palavras (▪ constituição a faixa de frequência da palavra na língua; ▪ proporção entre as palavras funcionais e os lexemas e o peso de arcaísmos ou palavras de reconhecimento internacional); – listas graduadas de itens gramaticais; – recomendações quanto ao tamanho e estrutura da frase; – tipo de conexões entre frases; Avaliação de lisibilidade (textos de leitura extensiva) • Orientações das editoras: – Nível macroestrutural: modo de organização da informação; – necessidade de explicitação de informação cultural de pano de fundo, crenças e tábuas de valores. Para o português • Para falantes nativos: → Aquilino Ribeiro, Peregrinação de Fernão Mendes Pinto → António Sérgio, História Trágico Marítima → João de Barros, Os Lusíadas → Amélia Pinto Pais, Os Lusíadas → Luísa Ducla Soares, Seis contos de Eça de Queirós Para o português • Falantes não nativos: ► Coleção Leituras Graduadas, HUB editorial: http://www.hubeditorial.com.br/leiturasgraduadas-ple/ ►Clássicos da literatura adaptados para alunos de PLE , LIDEL https://ciberduvidas.iscteiul.pt/aberturas/classicos-da-literaturaadaptados-para-alunos-de-ple/1645 2. Textos originais • Não ficcional/não literário ≠ Livros de crónicas de jornais => conhecimento contextual/histórico/dialetal (≠ notícias: datados) = Relato de viagem contemporâneo: estrutura paratática (mas: vocabulário específico); = biografias e autobiografias. Níveis iniciais? • • • • • Subordinadas? Estruturas encaixadas? Passivas? Formas verbais compostas? Figuração do discurso? PREFERÍVEL OPTAR POR TEXTOS SIMPLIFICADOS ● Ficcional/ literário ≠ António Lobo Antunes ≠ Pedro Rosa Mendes ≠ Guimarães Rosa Literatura infanto-juvenil: = Fábulas = Contos/ lendas = Sophia de Mello Breyner = Fernando Sabino = Machados de Assis: contos 3. Textos criados propositadamente para leitura extensiva em PL2 • Coleção Ler Português 1, 2 e 3 , LIDEL • Coleção Contos com nível, LIDEL (em preparação) III. MODELOS DE IMPLEMENTAÇÃO EM CURSOS PLNM • Suplemento: possibilidade de escolher autonomamente os exemplares a partir de um acervo disponibilizado. • Curso de leitura: possibilidade de seleção de títulos apenas a partir de uma gama limitada, segundo critérios pré-estabelecidos. • Leitura semi-intensiva: o professor guia a leitura e análise do texto durante a aula (obra) de um nível de proficiência. Avaliação SEM A CONTABILIZA ZAÇÃO DOS RESULTADOS DA AVALIAÇÃO DA LEITURA EXTENSIVA NA NOTA FINAL DO ALUNO, A ATIVIDADE TEM GRANDE PROBABILIDADE DE NÃO SER LEVADA A CABO (PARA MAIORIA DOS ALUNOS). Avaliação • Suplemento: elaboração sumário com tópicos específicos a observar. • Curso de leitura: teste específico constituído por: – Perguntas de compreensão global da obra; – Perguntas incidentes sobre vocabulário; – Perguntas incidentes com a interpretação de excertos. ► Exemplo: http://www.ciberescola.com/index.php?page=test&id=4 76250 III. ANÁLISE DE EXCERTOS 1. Vocabulário 2. Estruturas sintáticas 3. Supressões Resposta à pergunta: OS PREJUÍZOS (ocultação de estilo, composição estética, sentidos, originalidade, etc.) SUPERAM OS GANHOS PARA EFEITOS DE APRENDIZAGEM? Objetivo último dos textos adaptados: preparar o aprendente para a leitura dos textos originais.