APLICAÇÃO DE INDICADORES QUANTITATIVOS NA DEFINIÇÃO DE UNIDADES DE
PAISAGEM E USO DA TERRA NA BACIA DO RIO CORRENTE -BA
Evandro Klen Panquestor1, Osmar Abílio de Carvalho Júnior2,
Verônica Moreira Ramos1, Renato Fontes Guimarães1 ,
Éder de Souza Martins3 & Érika Klen Panquestor4
1
UnB - Universidade de Brasília - Departamento de Geografia
Campus Universitário Darcy Ribeiro, Asa Norte, 70910-900, Brasília, DF, Brasil.
[email protected]
2
INPE - Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
12201-970 - São José dos Campos - SP, Brasil.
[email protected]
3
Embrapa/CPAC - Centro de Pesquisa Agropecuária dos Cerrados
Caixa Postal 08223, 73301-970, Planaltina, DF, Brasil.
[email protected]
4
IBAMA - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renováveis, Asa Norte, Brasília, DF, Brasil.
RESUMO – O presente estudo consiste na aplicação de indicadores quantitativos, em ambiente
computacional, no estudo sobre a paisagem da bacia do rio Corrente -BA com o objetivo de se
definir unidades diferenciadas quanto a geomorfologia e uso da terra. Inicialmente confeccionou-se
o Modelo Digital de Terreno (MDT) da bacia do rio Corrente a partir de cartas topográficas digitais
(1:100 000). As cartas foram interpoladas pelo módulo TOPOGRID do programa ArcInfo. A partir
do MDT foram gerados mapas de declividade, aspecto e área de contribuição. Os mapas foram
contrapostos a partir da análise de gráficos de dispersão e emprego de técnicas de processamento
digital de imagens. Esse procedimento possibilitou a definição de unidades geomorfológicas
distintas. Em seguida, foram obtidos dados relativos à destinação econômica da terra e sua estrutura
fundiária, a fim de se identificar estatisticamente o padrão de uso a partir dos índices gerados. Os
dados foram padronizados e correlacionados no programa SAEG. Verificou-se, então, que o padrão
de uso está bastante correlacionado às unidades identificadas. Isto indica que o tipo de ocupação da
terra é bastante influenciado pelo fator relevo, interferindo sobre o tipo de atividade econômica
praticada em cada unidade.
Palavras -Chave: Indicadores Quantitativos; Modelo Digital de Terreno (MDT); Unidades de
Paisagem.
1. INTRODUÇÃO
A sociedade moderna com seu avançado processo de industrialização traz consigo a
intensiva transformação do ambiente natural, o que acarreta modificações sobre os padrões de
paisagem em diferentes escalas temporais e espaciais (Allen, et al., 1987; Elkie, et al., 2000;
Holling, 1992; O´Neil, et al., 1992; Rempel, et al., 1997). Esses impactos como o esgotamento e
poluição dos solos, do ar e das águas (Freeman, et al., 2001) despertam para a necessidade do
desenvolvimento de uma consciência ecológica e sua constante reafirmação com vistas a proteger o
capital natural (Lanna, 1995). Esse capital deve ser mantido para as gerações futuras, ou até mesmo,
para as gerações atuais, a partir da minimização dos impactos ao meio ambiente (Lanna, 1995).
A noção de que o uso excessivo dos fatores ambientais traz prejuízos de difícil reparação
estimula pesquisas que indiquem meios mais racionais do homem se relacionar com a paisagem
(Laszlo, 1994). Entretanto, a paisagem possui uma estrutura e uma dinâmica resultantes de uma
relação imbricada de elementos, que interagem entre si, e de processos que os colocam em
movimento (Baudry et al., 2000). A realização dessa análise deve-se levar em consideração
atributos físicos e sociais que relacionam a terra ao uso, ou pelo menos, ao potencial de uso (Guerra
& Cunha, 1998). Isso pode ser realizado por meio da compreensão do ambiente como um sistema,
no qual há a possibilidade de analisar a interação de seus diversos fatores. Consideram-se, assim, os
componentes e as relações interdependentes que fazem parte do meio ambiente, além das interações
que ocorrem regularmente na formação de um todo unificado (Odum, 1995).
O estudo da paisagem constitui-se numa atividade fundamental no processo de análise e
compreensão das inter-relações que ocorrem entre os fatores naturais e as ações humanas. O estudo
diagnóstico do ambiente permite estabelecer critérios para sua melhor utilização, tornando-se
possível à elaboração de cenários, que simulam as conseqüências dos eventos potenciais e políticos
de longo prazo (EMBRAPA, 1994). Nesse sentido, cabe o desenvolvimento de estudos
quantitativos do funcionamento e da dinâmica ambiental, que considerem modelos estatísticos de
suas variáveis espaciais e temporais, com o objetivo de minimizar os custos e os prazos da pesquisa.
Nesta tarefa, o emprego de Sistemas de Informação Geográfica (SIG) e de Sensoriamento
Remoto (SR), torna-se interessante com o fim de se fazer o acompanhamento da realidade local
em períodos de tempo diferenciados e a longas distâncias.
As informações geográficas, constituindo num conjunto de dados que contém associações
ou relações de natureza espacial, podem ser agregados e analisados a partir do SIG (Texeira et al.,
1992). O SIG apresenta a capacidade de inserir e integrar, numa única base de dados, informações
espaciais provenientes de dados cartográficos, dados censitários e cadastro urbano e rural, imagens
de satélite, redes e modelos numéricos de terreno (Câmara & Medeiros, 1996). Dessa forma, o SIG
oferece mecanismos para combinar, visualizar e analisar as várias informações. Assim, os objetos
da superfície terrestre, ou fixos (Santos, 1998) podem ser tratados, armazenados e analisados em
menores intervalos de tempo devido a maior facilidade do processamento de informações (Shary et
al., 2002; Antrop et al., 2000).
De acordo com a apresentação e discussão realizada anteriormente, o objetivo geral da
pesquisa é o de analisar a paisagem da bacia do rio Corrente a partir da evolução dos padrões de uso
do solo com base no monitoramento espaço-temporal realizado por meio do geoprocessamento.
Especificamente buscar-se-á:
1) Definir e analisar unidades de paisagem, a partir do estudo geomorfológico;
2) Estabelecer e analisar indicadores sócioespaciais da destinação agrícola do solo.
2. ÁREA DE ESTUDO
A área de estudo concentra-se na bacia do Rio Corrente (Figura 2.1) localizada a 12º45' e
14º50' S e 43º20' e 46º15' W, com cerca de 35.230 km2, a qual, situada no médio São Francisco,
abrange o oeste e o noroeste do Estado da Bahia e compreende treze municípios distribuídos em
microrregiões homogêneas de menor número. A bacia do rio São Francisco (3.161km) atravessa os
estados de Minas Gerais e Bahia (634.000 km2). Sua posição atual, desviada para leste, a partir do
cotovelo de Joazeiro-Petrolina, deve-se às deformações do macrodomo cristalino da Borborema
(IBGE, 1994). O ecossistema predominante é o cerrado, com suas diversas diferenciações, além de
áreas de tensão ecológica a exemplo do Cerrado/Caatinga/Floresta Estacional (PDC, 1995).
Figura 2.1 – Mapa de Localização da Bacia do rio Corrente - BA
Toda a bacia do rio Corrente se encontra em área de clima tropical semi-úmido, com
características médias praticamente uniformes ao longo do ano, em termos de temperatura, umidade
relativa, evaporação e ventos predominantes que são do quadrante Norte. O índice pluviométrico
médio anual é baixo e a distribuição das chuvas não é uniforme ao longo do ano, ocorrendo
predominância de precipitações nos meses de novembro a março (PDC, 1995). A precipitação
média anual na bacia é de 700 mm a 1.400 mm . As chuvas ocorrem do início de outubro até abril e
estão associadas às correntes atmosféricas de natureza continental no sentido oeste para sudeste. Os
meses de maio a setembro são praticamente secos caracterizando duas estações bem definidas em
termos de chuvas da região: uma chuvosa (51% do total precipitado durante o ano) que vai de
novembro a janeiro e outra seca (4% do total precipitado durante o ano) que vai de maio a
setembro. Nos meses de novembro, dezembro e janeiro, que são os de maior precipitação, ocorrem
as já esperadas trovoadas.
Apresenta duas províncias geológicas bem distintas: (a) rochas metassedimentares do
Proterozóico Superior, constituindo o grupo Bambuí, e (b) formação Urucuia. Ocorre ainda uma
pequena porção constituída por rochas do embasamento cristalino, pertencentes ao complexo
Caraíba-Paramirim. Sobre estas unidades assentam-se as coberturas detríticas Tércio-Quaternárias
(PDC, 1995).
Os rios que constituem a bacia do rio Corrente apresentam padrões distintos, um sobre a
formação Urucuia e outro sobre o grupo Bambuí. A rede de drenagem que cruza o chapadão central
apresenta-se com entalhe incipiente e padrão de drenagem paralelo. Em vista do relevo do chapadão
ser plano e com pequena inclinação topográfica, a drenagem da área se faz com rios de pouco
gradiente, com fluxo lento de águas (IBGE, 1994; PDC, 1995). O rio Corrente corre na direção
geral de E/NE, sendo mais sinuoso, estreito e com correnteza de maior intensidade, entre Santa
Maria da Vitória (BA) e a localidade de Porto Novo (BA); daí até sua foz, o rio é menos sinuoso.
Sua largura média é de 90 metros e sua extensão navegável é de 108 Km, contados da Foz até Santa
Maria da Vitória (BA).
A área denominada de Oeste Baiano inclui os chapadões e a depressão drenada pelo rio São
Francisco. Os chapadões constituem-se no prolongamento para o sul dos Chapadões do Rio Grande
e de Baianópolis. Com uma área de 23.920km² englobam os interflúvios dos altos cursos dos rios
Corrente e Formoso. Os topos dos chapadões guardam feições planas herdadas da superfície de
erosão que se instalou sobre os sedimentos suborizontalizados da Formação Urucuia. A depressão
do Rio Corrente, com uma área de 5.435km2 compreende planos rampeados para os vales, contendo
depressões fechadas tipo dolinas, com sumidouros, que evidenciam a presença de um carste em
exumação. Na bacia estão presentes as seguintes classes de solos: Latossolo Vermelho-Amarelo;
Latossolo Vermelho – Escuro; Podzólico Vermelho - Amarelo Eutrófico; Areias Quartzosas;
Cambissolo; Vertissolo; Solos Litólicos; Solos Aluviais; Solos Hidromórficos Gleizados. A
predominância é das classes dos Latossolos Vermelho-Amarelos, dos Cambissolos e das Areias
Quartzosas (PDC, 1995).
3. CONFECÇÃO DO MODELO DIGITAL DE TERRENO
O Modelo Digital de Terreno (MDT) da área de estudo foi confeccionado a partir de 23
cartas topográficas digitais na escala de 1:100.000 obtidas na Companhia de Desenvolvimento do
Vale do São Francisco (CODEVASF). O MDT foi gerado, com resolução espacial de 60 metros,
pelo método de interpolação TOPOGRID (programa ArcInfo), utilizando às curvas de nível, os
pontos cotados e a hidrografia. A partir do MDT, foram confeccionados os mapas derivados de
hipsometria (Figura 3.1), declividade, aspecto e fluxo acumulado. A partir do mapa hipsométrico e
do MDT constatam-se quatro grandes unidades: (1) Chapadões, caracterizadas por serem áreas de
maiores altitudes com bastante homogeneidade; (2) Chapadas, caracteriza-se pelos valores
altimétricos expressivos, porém com maior variação; (3) Patamares, caracterizam-se por serem a
transição entre as áreas de chapada e de depressões; e (4) Depressões áreas de menores altitudes.
Figura 3.1 – Mapa Hipsométrico
Após a elaboração do MDT, foram confeccionados os mapas de declividade, aspecto e
direção de fluxo. No mapa de declividade as áreas com maior declividade constituem as áreas de
bordas de chapadas na transição geológica e das Serras Boqueirão e Estreito. Estas áreas
apresentam maior relevância devido a sua maior suscetibilidade aos processos erosivos. O mapa de
aspecto (direção do fluxo) apresenta um padrão da drenagem com orientação preferencial paralela
no sentido SO-NE nas áreas de chapadas e orientação difusa nas áreas de depressões. O Mapa de
área de contribuição revela as porções onde há maior concentração do fluxo de água. Para realçar as
feições foi definido um valor máximo de 500 e foi aplicada uma função logaritmo.
4. A COMPARTIMENTAÇÃO GEOMORFOLÓGICA A PARTIR DOS PARÂMETROS
MORFOMÉTRICOS
A utilização de parâmetros morfométricos e do processamento digital de imagens fornece
uma base ampla para a comparação dos fatores passíveis de mensuração quantitativa, mesmo em
paisagens qualitativamente diferentes. Isso permite ainda a adaptação de métodos a partir da análise
da superfície geomorfológica (Evans, 1972) e de suas relações com seus diferentes usos
determinados por diferentes sociedades (Ihse et al., 2000; Oreszczyn, 2000).
Matematicamente, a superfície da Terra consiste numa cobertura contínua representada,
muitas vezes, por suas unidades menores (Dehn et al., 2001). A fragmentação da paisagem
contínua, por meio do uso dos indicadores quantitativos, permite o estudo do todo a partir de suas
unidades menores. No planejamento espacial, a fragmentação constitui-se num meio eficaz para a
compreensão dos fenômenos relativos ao uso do solo (Hidding et al., 2002).
Com o propósito de realçar as feições de relevo foram empregadas técnicas de
processamento digital de imagens como composição colorida e manipulação de contrastes. Estes
procedimentos permitiram um forte contraste visual das unidades de relevo que adquiriram padrões
tonais e texturais distintos favorecendo a interpretação visual das imagens.
A composição colorida dos atributos hipsometria, declividade e área de contribuição
evidenciou as seguintes unidades de relevo: (a) chapadões: áreas planas com os maiores valores de
altimetria, (b) chapadas: áreas altas com comportamento plano possuindo duas direções
preferenciais de vertente (norte/sul), (c) patamares: localizadas em altitude intermediária da bacia e
com maiores variações da declividade, e (d) depressão: bastante influenciado pela área de
contribuição sendo uma área de acumulação do fluxo.
Com a finalidade de individualizar e caracterizar quantitativamente cada unidade
geomorfológica segundo os atributos morfométricos realizou-se uma análise estatística por
intermédio de histogramas, e medidas de média, desvio padrão, correlação e covariância.
O histograma constitui-se numa representação gráfica da freqüência de distribuição de
valores (Costa Neto, 1978), no caso dos atributos z de uma imagem. No histograma, o eixo X
representa os valores de z, enquanto o eixo Y, representa a freqüência relativa aos intervalos de z. O
histograma de freqüência dos dados altimétricos permitiu distinguir com maior clareza as unidades
definidas anteriormente pela composição colorida. O presente histograma possui um
comportamento bimodal onde as unidades geomorfológicas ficam diferenciadas em determinadas
zonas: (a) depressões (396m a 481m); (c) patamares (481m a 636m); (b) chapadas (636m a 825m);
e chapadões e bordas (825 a 1054) que caracterizam áreas de maior homogeneidade. Desta forma, o
histograma de altimetria permitiu estabelecer um critério para diferenciar as quatro unidades
(Figura 4.1).
O processamento digital de imagens morfométricas demonstrou ser uma importante
ferramenta para descrever e compartimentar a paisagem. Essa metodologia permite fazer um
inventário detalhado e quantificado das formas de relevo, de forma rápida e precisa. Estas análises
permitem auxiliar e compreender a gênese e a dinâmica das paisagens atuais, tão importantes para a
gestão do ambiente.
Figura 4.1 – Compartimentação Geomorfológica
5. ESTUDO SÓCIOESPACIAL DA BACIA DO RIO CORRENTE – BA
A criação de uma nova lógica espacial brasileira provém de uma nova dinâmica social e
econômica, marcadamente realçada nos últimos dez anos. Esta lógica ressalta uma necessidade de
integração entre as dinâmicas internas às dinâmicas externas, procurando-se relacionar o mercado
nacional às necessidades de um mercado global. As diretrizes políticas brasileiras buscam especular
sobre os prováveis impactos na sua dinâmica regional (Araújo, 2000).
Cabe esclarecer que a apropriação espacial feita pelo capitalismo é desigual e, como
conseqüência, apresenta formas diferenciadas de acordo com o modo como a economia regional se
desenvolve relativamente à população, às formas de comercialização dos produtos e às formas de
distribuição. Esse fenômeno traz consigo a caracterização de frações de espaços com maior ou
menor poder de atração agrícola, comercial e industrial (IPEA, 1999).
O processo de ocupação dos espaços brasileiros pode ser considerado como um fenômeno
que se intensificou nos últimos quarenta anos e que apresenta algumas particularidades que devem
ser destacadas, como é o caso de sua complexidade decorrente da própria coexistência do
“avançado” com o “tradicional” (Santos, 1998). Esse fenômeno pode ser exemplificado quando se
observam paisagens marcadamente fragmentadas em relação ao seu entorno, possibilitando a
formação de “ilhas dinâmicas” e modernas que convivem com áreas estagnadas de técnicas
rudimentares (Corrêa, 1998).
O espaço da Bacia do rio Corrente apresenta, então, características diferenciadas em relação
às atividades socioeconômicas praticadas localmente (IBGE, 1994). Com o objetivo de identificar e
analisar essas diferenciações com as unidades de paisagem estabelecidas anteriormente aplicou-se
uma metodologia estatística de normalização, correlação e estabelecimento de fatores sobre as
variáveis relacionadas ao uso do solo, predominantemente agrícola.
A realização da análise sócioespacial da área de estudo foi realizada sobre a base de dados
do IBGE, 2004 selecionadas de acordo com as seguintes variáveis: Destinação Agrícola, Estrutura
Fundiária e a Altimetria média dos municípios que compõem a bacia. Os municípios abrangidos
pela pesquisa foram: Baianópolis, Canápolis, Cocos, Coribe, Correntina, Jaborandi, Santa Maria da
Vitória, São Desidério, Santana, São Felix do Coribe, Serra do Ramalho, Sítio do Mato (Figura
5.1).
Figura 5.1 – Municípios da Bacia do rio Corrente - BA
Inicialmente foram confeccionados mapas-síntese dessas informações para facilitar a
observação e verificar possíveis correlações entre os temas e os dados referentes a altimetria. Para
apurar o processo foram elaboradas sobreposições dos mapas com a compartimentação
geomorfológica realizada anteriormente. Analisando-se os mapas, verificou-se, visualmente, a
correlação entre os temas propostos.
Entretanto, dado que as condições de uso do solo nos
municípios da bacia envolvem variáveis heterogêneas e em grande medida associadas a altimetria
do relevo, optou-se inicialmente por trabalhar com informações descentralizadas por municípios,
que são as unidades de levantamento e agregação de dados usualmente utilizados nesse tipo de
estudo (AAM/SP, 2004).
A escolha dos municípios como unidade de análise tornou possível um enfoque mais
localizado e o delineamento do seu perfil. Para cada uma das variáveis foi pesquisado o elenco de
dados disponíveis, chegando-se à definição final dos indicadores, tendo como base a altimetria
média dos municípios. Devido a quantidade e complexidade das variáveis selecionadas foi utilizado
o programa SAEG, 2001 para a realização dos procedimentos estatísticos. Por tratar-se de valores
de diferentes grandezas - o que dificultaria a comparabilidade entre as informações - foi realizado
um processo de padronização desses dados mediante o emprego da equação 1:
Zi = (xi - x ) / s
(1)
Onde:
Zi - Informação Normalizada
xi - Informação observada
x - Média das informações observadas nos municípios
s - Desvio-padrão das informações observadas nos municípios
Para chegar ao padrão houve a necessidade de se analisar os valores de acordo com as
medidas de dispersão de variância e desvio padrão. As medidas encontradas foram utilizadas para
se obter o grau de agregação das variáveis (Bussab, 1987, Callegari-Jaques, 2003).
Em seguida, estabeleceu-se a relação existente entre os dados normalizados pelo emprego da
Análise Fatorial que tem como objetivo principal explicar a correlação ou covariância, entre um
conjunto de variáveis, em termos de um número limitado de variáveis. Essas variáveis ou fatores
são calculados pela combinação linear das variáveis originais (SAEG, 2001).
Dessa forma calculou-se inicialmente a correlação existente entre as variáveis selecionadas
(estrutura agrária e destinação agrícola da área com a altimetria). O índice encontrado,
respectivamente 63% e 68% revelam uma alta correlação. Dessa forma, a altimetria condiciona a
ocupação do solo a medida em que nas áreas de relevo menos movimentado, o uso é relacionado à
agricultura intensiva em propriedades de maior extensão territorial.
A partir da correlação de cada variável com o fator de maior explicação encontrou-se o peso
de cada tema analisado, os autovetores (Tabela 1). O Fator Principal de cada município foi obtido
pela somatória da multiplicação dos pesos dos indicadores pelos seus valores padronizados no
respectivo município, gerando uma classificação segundo seu perfil socioespacial em ordem
crescente do pior para o melhor padrão para produção agrícola em grande escala e inversamente o
melhor padrão para a pecuária ou agricultura familiar, de pequena escala de produção.
Tabela 1 – Pesos dos valores padronizados e fator principal de análise
MUNICÍPIOS
VALOR
VALOR
VALOR
PADRONIZADO PADRONIZADO
PADRONIZADO
(P*Padrão) – (P*Padrão) –
(P*Padrão) DESTINAÇÃO ESTRUTURA
ALTIMETRIA
FUNDIÁRIA
AGRÍCOLA
-1,52
-0,31
-0,57
Sítio do Mato
Serra do
-1,35
-0,23
Ramalho
Santana
-1,23
-0,32
S. Félix do
-0,49
-0,2
Coribe
Sta. Ma. da
Vitória
-0,23
-0,24
Canápolis
-0,14
-0,36
Coribe
-0,05
-0,26
Jaborandi
0,82
0,73
Baianópolis
0,91
-0,18
Cocos
1,04
-0,15
Correntina
1,09
-0,36
São Desidério
1,12
1,24
Fonte: PDC, 1995; IBGE, 1998; autor, 2004.
FATOR PRINCIPAL
Σ (MULTIPILICAÇÃO DOS
PESOS PELOS VALORES
PADRONIZADOS)
-2,4
-2,15
-0,57
0,06
-1,49
-1,26
-0,57
-0,41
0,06
-0,57
0,12
0,8
0,34
0,6
0,82
0,94
-1,07
-0,19
2,35
1,07
1,49
1,55
3,3
Para saber a precisão do resultado obtido, optou-se por verificar o coeficiente de variação
(CV), ou seja, expressar a variabilidade dos dados tirando a influência da ordem de grandeza da
variável expresso pela média dos dados ( x ) (equação 2). O CV é adimensional, um número puro
usualmente expresso em forma de porcentagem (Callegari-Jaques, 2003). Quanto menor for o CV
mais homogêneo é o conjunto de dados. Geralmente, um valor CV = 0,25 indicará que o conjunto é
razoavelmente homogêneo. Utilizou-se a seguinte classificação (Manning et al, 1997):
cv =
s
x
(2)
Tabela 2 – Representatividade do coeficiente de variação
COEFICIENTE DE VARIAÇÃO (cv)
REPRESENTATIVIDADE
cv < 10
Baixo
10 <= cv <20
Médio
20 <= cv < 30
Alto
cv >= 30
Muito alto
Fonte: Meanning et al, 1997.
Como pode ser observado na Tabela 2, o coeficiente de variação encontrado situou-se entre
baixo e alto devido, separando-se os dados em grupos. Levando-se em consideração todos os dados
em conjunto, verificou-se uma variação bastante alta entre alguns dados. Esse resultado comprova
que há subdivisões entre os valores, revelando padrões diferenciados.
Agruparam-se, então, os dados de acordo com o menor grau de variabilidade. Disso resultou
a compartimentação socioespacial agrícola em padrões de uso, do pior para o melhor padrão.
Verificou-se, dessa forma, a forte relação existente entre as unidades de paisagem definidas no
quarto capítulo e o tipo de ocupação do solo.
Dessa metodologia, resultou o mapa temático do perfil sócioespacial do uso do solo na bacia
do rio Corrente – BA (Figura 5.2). Verifica-se, nas proximidades da borda dos chapadões e
chapadas, uma extensa área ocupada agricultura intensiva em grandes propriedades. Na transição
entre a Chapada e a Depressão, encontra-se uma área com utilização para agricultura de médio e
pequeno porte, além da pecuária. A leste verifica-se a presença de pequenas propriedades, onde se
destaca a utilização para pecuária e pequena produção agrícola.
Figura 5.2 – Perfil Sócioespacial – Bacia do Rio Corrente – BA
6. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS E CONSIDERAÇÕES FINAIS
A paisagem constituindo-se na fração do espaço que está no domínio dos nossos olhos
abrange o estudo dos componentes sociais e físicos além de suas transformações. Essa linha de
pesquisa consegue identificar, analisar e avaliar o processo de evolução de parte do espaço numa
visão integradora.
Os fenômenos morfológicos podem ser identificados com relativa facilidade, quando
associados a utilização de métodos e instrumentos de interpretação (Vink, 1982). Como afirma
Hobbs, 1997, deve-se procurar utilizar menos estudos descritivos e mais estudos metodológicos e
de modelagem, com quantificação e análises estatísticas dos padrões.
Decisões relacionadas ao uso do solo em nível local favorecem a melhor utilização da
paisagem minimizando os impactos no seu processo de apropriação (Mendoza, et al., 2002). Nesse
sentido, a definição das unidades de paisagem da bacia do rio Corrente – BA, a partir do estudo
geomorfológico, permitiu o estudo com maior grau de detalhe e especificidade sobre os objetos e
ações que a compõe. Cada unidade (chapadões, chapadas, patamares e depressão) apresentou uma
dinâmica que apesar de ser diferenciada faz parte do contexto da bacia hidrográfica como um todo.
No sentido sudoeste – nordeste observa-se a diferenciação das unidades pela diminuição dos valores
altimétricos e índices pluviométricos.
O estudo dos indicadores sócioespaciais da destinação do solo trouxe a confirmação
quantitativa de uma realidade que se desenvolve na localidade em estudo. As unidades de paisagem
e suas características físicas, especialmente o relevo e o clima, são fatores que influenciaram e ainda
influenciam na apropriação das terras de acordo com o perfil determinado e espacializado. No
sentido sudoeste – nordeste verifica-se respectivamente áreas com maior aptidão a agricultura
intensiva, agropecuária de médio porte e lavouras de subsistência.
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Evandro Klen Panquestor, Osmar Abílio de Carvalho